Sentença de Julgado de Paz | |
Processo: | 144/2018-JPCSC |
Relator: | SÓNIA ISABEL DOS SANTOS PINHEIRO |
Descritores: | AÇÃO DE CONDENAÇÃO |
Data da sentença: | 01/16/2019 |
Julgado de Paz de : | CASCAIS |
Decisão Texto Integral: | SENTENÇA I. Identificação das partes Demandante: A., casado, residente na Rua ......, Tires, S. Domingos de Rana, NIF ..... Demandada: B., com instalações sitas na Torre ..... S. Domingos de Rana, NIPC .... II. Objecto do litígio O litígio reconduz-se ao pedido de condenação da Demandada no pagamento da quantia de €5.028,00 (cinco mil e vinte e oito euros), relativa a prejuízos sofridos em virtude da queda de pernada de uma árvore (al. h) do n.º 1 do art.º 9º da Lei n.º 78/2001, de 13 de Julho, com as alterações introduzidas pela Lei n.º 54/2013, de 31 de Julho (doravante LJP)). Para tanto, o Demandante alegou, em síntese, que no dia 17.10.2015, por volta das 9:00h, estacionou a sua viatura no parque de estacionamento da Demandada, Estrada São Domingos de Rana; Que nessa altura, estacionava aí o seu veículo porque se encontrava a frequentar curso de Farmácia nas instalações da Demandada; Que o parque é ladeado de árvores grandes 15/20 metros de altura aproximadamente; Que neste dia houve uma grande tempestade; Que por volta das 10, 11 horas da manhã uma árvore caiu em cima do veículo, matrícula 00-00-GR, marca ... e outro carro, que estavam estacionados regularmente no parque; Que depois do acontecimento o Demandante falou com o responsável (Administrador D.) que assegurou que a instituição possuía seguro para este tipo de acidentes; Como ninguém lhe dava resposta, passados alguns dias o Demandante começou a ligar directamente ao seguro; Que depois de muita insistência recebeu a confirmação do seguro que a instituição não tinha seguro para este tipo de acidentes; Que a Demandada não tomou nenhuma acção para avisar que naquele dia não se podia estacionar na zona ladeada pelas árvores, nem colocou fitas avisadoras na entrada e zona onde era ladeada pelas árvores para ninguém estacionar; Que a Demandada não fez limpeza e manutenção das árvores; Que passados alguns dias começou a cortar as árvores que estavam podres sem avisar dessa situação; Que o Demandante falou com o representante da Demandada, Sr. E. no sentido de aceitar pagar os danos mas ele respondeu que “dadas as condições climatéricas extremas e excepcionais não é imputável qualquer responsabilidade civil à B.. Que a Demandada sabendo que naquele dia havia rajadas e vento forte não tomou nenhum cuidado para avisar os estudantes que tinham cursos dentro das instalações; Que o carro tem de ser reparado. Por causa do preço elevado para reparação do carro danificado o Demandante foi obrigado a comprar outro carro mais barato no valor de €1.000,00 a gasolina (matrícula 00-00-QD); Que deixou o ...... danificado à frente do prédio onde habita, mas a Policia Municipal tirou o carro quando estava de férias, quando chegou a casa deu conta que o carro não estava à frente do prédio e teve de pagar multa para tê-lo de volta o carro; Que actualmente o carro do Demandante está numa oficina à espera de ser reparado; Que tem de pagar o parqueamento por cada dia que lá está; Que as despesas que peticiona são as seguintes: €3.500,00 para reparação do carro, €1.000,00 relativo ao carro que teve de comprar, €178,00 de multa à Câmara Municipal, €250,00 de multa à Policia Municipal (que ainda está pendente), por não ter seguro, e €100,00 de outras despesas com o processo, juros de mora e parqueamento por cada dia na oficina até quando for reparado o carro. Juntou documentos. Atribuiu à acção o valor de €5.028,00. Válida e regularmente citada, a Demandada apresentou contestação onde, em síntese, alegou que a queda de pernadas de árvores que ocorreu no exterior do Seminário não se deveu a qualquer incúria ou negligência da Demandada, mas apenas e só a uma tempestade, com chuva e vento forte, que ocorreu em 17.10.2015; Tratou-se de uma queda provocada por condições climatéricas extremas e excepcionais, e de uma violência imprevisível, a que a Demandada, de qualquer forma, não tinha como atalhar; Isso mesmo ficou constatado no auto de ocorrência da PSP chamada ao local e está referido na própria petição, em que o próprio Demandante qualifica o sucedido como uma “grande tempestade”; Por esse motivo a Seguradora da Demandada (Z) recusou responsabilizar-se pelo sinistro; por não haver qualquer responsabilidade da Demandada no caso, que se deveu a condições climatéricas severas e imprevisíveis; Na altura o responsável E., disse que iria expor o caso à Seguradora, mas nunca garantiu que a ocorrência estivesse segurada, tendo referido expressamente as suas dúvidas sobre um tal evento estaria incluído no seguro; A Demandada tinha contratado a respectiva manutenção e vigilância das árvores, a qual era realizada periodicamente por prestador de serviços; Nada levava a crer que as árvores em causa se encontravam em risco de queda ou fractura, dado que elas não apresentavam sinais de risco particular nesse sentido; Impugna os danos não só quanto ao nexo de causalidade relativamente ao ocorrido e também quanto à necessidade das despesas invocadas; Que é extraordinário que o Demandante impute à Demandada o valor de coimas que ele próprio teve de pagar por incumprimentos das normas do Código da Estrada. E que pretenda duplicar as indemnizações que pede, pretendendo somar ao alegado valor da reparação do veículo, o valor alegadamente despendido na aquisição de um outro veículo para o substituir; Que o Demandante não apresenta qualquer prova dos valores que invoca seja quanto ao alegado valor da reparação, seja quanto ao alegado valor de aquisição de novo veículo, seja quanto a um alegado dever de pagamento de estacionamento. Peticiona a improcedência da acção. Junta um documento e procuração. Realizou-se a sessão da pré-mediação. Contudo as partes não pretenderam prosseguir para mediação, pelo que o processo seguiu para julgamento. Foi agendada audiência de julgamento, que decorreu com obediência às formalidades legais como da Acta se infere, sendo que o Demandante concretizou os danos sofridos pelo veículo, foram visionadas imagens através de PEN que o Demandante facultou e foram inquiridas duas testemunhas arroladas pela Demandada. Fixo à acção o valor de €5.028,00 (cinco mil e vinte e oito euros - cfr. artºs 306º nº 1, 297º nºs 1 e 2, 299º nº 1, todos do CPC, ex vi artº 63º da LJP. O Tribunal é competente (artigo 7º da LJP). As partes são dotadas de personalidade e capacidade judiciárias e são legítimas. Não se verificam excepções, nulidades ou incidentes processuais que impeçam o conhecimento do mérito da causa. Cumpre apreciar e decidir. III. Fundamentação fáctica Com interesse para a decisão da causa, ficou provado que: 1. No dia 17.10.2015, por volta das 9:00h, o Demandante, que frequentava o curso de Farmácia no Seminário da Demandada, sito na Torre ...., São Domingos de Rana, estacionou o seu veículo matrícula 00-00-GR, marca ......, no parque de estacionamento aí existente; 2. Esse parque de estacionamento da Demandada é ladeado por árvores, com cerca de 15/20 metros de altura; 3. Nesse dia, da parte da manha, ocorreu uma grande tempestade, com chuvas e ventos fortes; 4. Por força do descrito no item anterior, cerca das 10:00h, a pernada de uma árvore caiu em cima do veículo matrícula 00-00-GR, marca ........., e de outro carro, que estavam estacionados no parque; 5. No local não foram colocadas fitas, de modo a ninguém aí estacionar; 6. Depois do acontecido o Demandante contactou o responsável pelo Seminário, E., que se comprometeu a accionar o seguro da Demandada; 7. A Seguradora da Demandada (Z) declinou responsabilidade no ocorrido, por força da ocorrência da tempestade; 8. A Demandada tinha contratado a respectiva manutenção e vigilância das árvores, a qual era realizada periodicamente por prestador de serviços e jardineiro; 9. Nada levava a crer que a árvore em causa se encontrava em risco de queda ou fractura, dado que ela não apresentava sinais de risco nesse sentido; 10. Com a queda da árvore o veículo foi atingido na parte frontal, no lado direito frente, lado do passageiro, vidro da frente, chapa que sustenta o vidro, e lado da porta; 11. O Demandante foi notificado do ofício do Município de Cascais, datado de 18.09.2017, onde consta que o veículo 00-00-GR foi removido pelos Serviços do Município de Cascais para o Parque Municipal de viaturas rebocadas, tendo o mesmo despendido a quantia de €197,00 a título de despesas de remoção e depósito. 12. O Demandante foi notificado de que contra ele foi instaurado processo de contra-ordenação nº ......., por falta de inspecção periódica obrigatória do veículo 00-00-GR, em que a coima mínima aplicável é de €250,00 e a máxima de €1.250,00. 13. Por mensagem de correio electrónico enviada ao Demandante em 28.10.2015, E. referiu que “soubemos ontem à tarde de que a seguradora rejeita responsabilidades, referindo que dadas as condições climatéricas extremas e excepcionais não é imputável qualquer responsabilidade civil à B.; 14. Após o sucedido a PSP deslocou-se ao local e elaborou participação policial, conforme Declaração de flªs 23, cujo teor aqui se dá por reproduzido. Com interesse para a apreciação da causa nada mais ficou provado, considerando-se não provados todos os factos alegados e que sejam de sentido contrário aos provados. Nomeadamente não ficou provado que: a) A Demandada não avisou os alunos que frequentavam o curso que naquele dia não se podia estacionar na zona ladeada pelas árvores; b) Como ninguém lhe dava resposta, passados alguns dias o Demandante começou a ligar directamente ao seguro; c) Passados alguns dias a Demandada começou a cortar as árvores que estavam podres, sem avisar dessa situação; d) O carro sofreu danos na suspensão, fecho central e direcção. e) É necessário despender a quantia de €3.500,00 na reparação do carro; f) Por causa do preço elevado para reparação do carro, o Demandante foi obrigado a comprar outro carro mais barato, no valor de €1.000,00, a gasolina (matrícula 00-00-QD); g) A Policia Municipal removeu o carro que estava estacionado à frente do prédio do Demandante quando este estava de férias; h) Quando chegou a casa de férias o Demandante deu conta que o carro não estava à frente do prédio. i) O carro encontra-se numa oficina para ser reparado; j) O Demandante tem de pagar à Oficina o parqueamento por cada dia em que o veículo lá se encontra; k) Na altura o responsável do Seminário, E, garantiu ao Demandante que a ocorrência estava segurada; l) O Demandante pagou €178,00 de multa à Câmara Municipal, €250,00 de multa à Policia Municipal (que ainda está pendente), por não ter seguro, e despendeu €100,00 em despesas com o processo. Motivação da matéria de facto provada e não provada: Os factos provados resultaram do conjunto da prova produzida, cotejada com as regras da experiência, da posição das partes vertida nos articulados (sendo que a Demandada não coloca em crise a titularidade do veículo pelo Demandante e a ocorrência do sinistro), dos elementos documentais juntos aos autos a seguir discriminados, que aqui se dão por reproduzidos e integrados, conjugados com as declarações das partes, e com o depoimento das testemunhas inquiridas em sede de audiência de julgamento, que se mostraram sérios e credíveis. Mais foram tidos em conta, nos termos das alíneas a) e b) do nº 2 do artigo 5º do Código de Processo Civil, factos instrumentais e factos que complementam ou concretizam os que as partes alegaram e resultaram da instrução e discussão da causa. Assim atendeu-se ao documento de flªs 4 e 5 (factura/recibo e oficio do Município de Cascais), para prova da matéria de facto descrita no item 11, de flªs 6 (ofício do Município de Cascais), para prova da matéria de facto descrita no item 12; de flªs 7, 8 e 24 (troca de mensagens de correio electrónico), para prova da matéria de facto descrita nos itens 6, 7 e 13; de flªs 23 (declaração da PSP) para prova da matéria de facto descrita no item 14, das fotografias visionadas em sede de audiência de julgamento para prova da matéria de facto descrita nos itens 1, 2, 4, 5 e 10. Em conjugação com tais documentos, para a consideração da matéria de facto provada, foram relevantes as declarações das partes e depoimentos das testemunhas. Assim, o Demandante confirmou o alegado no requerimento inicial, referindo que no dia em causa a chuva e os ventos eram muito fortes, o que permitiu desde logo dar como provada a matéria de facto descrita no item 3. Que não se apercebeu da queda da pernada da árvore, pois encontrava-se no interior do Seminário. Por sua vez, o representante da Demandada referiu que as árvores estavam sãs, que têm empresa permanente para tratar do jardim e árvores. Que todos os anos essa empresa desloca-se com um monta-cargas ao Seminário para cortar as árvores e/ou ramos em perigo. Entende que o ocorrido se deve unicamente à tempestade que se verificou no dia em causa, violenta e excepcional. As autoridades alertaram o público em geral nos dias anteriores para a ocorrência da tempestade. O seguro que tinham não cobriu o sinistro por força da verificação da tempestade. A versão apresentada pela Demandada foi corroborada pelo depoimento das testemunhas inquiridas na audiência de julgamento. Assim a testemunha F. referiu que no dia em causa não estava ao serviço da Demandada. Disse recordar-se que durante a manha estava de viagem vinda de Cascais em direcção a Sintra e que viu ”coisas a voar”, até “cadeiras de jardim”, viu “árvores e postes de electricidade caídos”. Que devido às fortes chuvas e ventos foi muito complicado atravessar Sintra. Chegada a casa deparou-se com três Cedros que tinha no jardim caídos, sendo que um deles, com a força do vento “entrou em casa”. Referiu que quando chegou a casa a recepcionista do Seminário, G., aqui testemunha, telefonou-lhe a dizer que a tenda que tinham no exterior tinha “voado” e que árvores tinham caído, nomeadamente no Centro de Acolhimento. No dia seguinte quando regressou ao trabalho pôde constatar o estado da situação, com as árvores e ramos caídos. Sabe que a tempestade afectou Cascais, Abóboda e Sintra. Referiu ter 50 anos mas que nunca viveu um cenário de terror igual, foi uma situação fora do comum, excepcional. Houve alertas públicos acerca da tempestade, recorda-se de ter ouvido através da rádio, sendo que a sua mãe, na altura, avisou-a para tal facto. Falavam sobretudo em ventos fortes e chuva. Esclareceu que na altura o Seminário tinha jardineiro diário que cuidava do jardim e das árvores, chegando a vê-lo a cortar troncos. Para os cortes maiores vinha uma empresa especializada. Tinha uma camioneta com grua, cortavam os ramos e as árvores que estavam doentes quando havia essa necessidade, depois juntavam tudo e vinha outra camioneta triturar essa madeira. Todos os anos tinham esse procedimento. O jardineiro alertava se havia necessidade de virem antes. O jardineiro só fazia esse trabalho. Por fim referiu que está a trabalhar no Seminário há 14 anos e nunca caiu uma árvore. Acrescentou que não foi instaurado qualquer processo disciplinar ao jardineiro ou outro funcionário em virtude da situação dos autos. Por sua vez a testemunha G., referiu ser recepcionista da Demandada. Mencionou que no dia em causa encontrava-se ao serviço. Que o Demandante frequentava um curso no Seminário. Confirmou que se deu uma grande tempestade, com ventos e chuva muito fortes. Foi avisada dias antes pela televisão de que tal ia acontecer. Descreveu-a como sendo um “grande vendaval em que parecia que todas as árvores iam cair”. Lembra-se que as portas de vidro do Seminário abriram todas, e que os ventos fortes e chuva se verificaram durante cerca de 2 horas, da parte da manha. Afirmou que em 13 anos que lá trabalha nunca viu nada assim e que sentiu medo. Confirmou que caiu uma árvore inteira e caíram ramos em cima de dois veículos, um deles o do Demandante. Que a Policia esteve no local. Quanto ao estado das árvores referiu que estavam bem cuidadas, que passa pelo local todos os dias e que nunca se apercebeu de alguma árvore estar em mau estado, doente ou seca. Têm um jardineiro permanente que cuida do jardim e das árvores. Que uma vez por ano vem uma empresa só para cuidar das árvores. Têm camionetas com gruas, e quando há necessidade cortam os ramos e árvores. Que já chegaram a cortar árvores inteiras. Se fosse necessário a empresa ia ao Seminário, e que já tinha acontecido ir mais do que uma vez por ano. Que têm uma tenda montada no exterior e que desde logo precisam que as árvores estejam bem tratadas. Quanto ao carro não se recorda a parte concreta em que foi atingido pela pernada mas que saiu do parque a circular. Quanto aos factos dados como não provados resultam da ausência total de prova e de prova credível e bastante que atestasse a veracidade dos mesmos ou da prova em contrário. IV. O Direito O caso sob apreço prende-se com a ocorrência de um sinistro, envolvendo um veículo ligeiro e uma pernada de árvore, situação regulada pelo artº 483 e sgs do Cód. Civil. No âmbito da responsabilidade civil extracontratual o que importa é averiguar a existência dos requisitos legais deste instituto, apurar os danos, e se for o caso ressarcir o lesado. Vejamos: Constituem pressupostos do dever de reparação resultante da responsabilidade civil por factos ilícitos: a existência de um facto voluntário do agente e não de um facto natural causador de danos; a ilicitude desse facto; a existência de um nexo de imputação do facto ao lesante; que da violação do direito subjectivo ou da lei resulte um dano; que haja um nexo de causalidade entre o facto praticado pelo agente e o dano sofrido pela vítima de forma a poder concluir-se que este resulta daquela, in Antunes Varela, Das Obrigações em Geral, I Vol., 1986, 477/478. Neste instituto, no que concerne à culpa, em regra, pertence ao lesado efectuar a prova (artº 487, nº1 do Cód. Civil), salvo se existir presunção de culpa do lesante, o que implica a inversão do ónus probatório (artº 350, nº 1 do Cód. Civil). Uma dessas situações está consagrada no artº 493º, nº1 do Cód. Civil, segundo a qual é responsável pelos danos aquele que tiver em seu poder coisa, móvel ou imóvel, assim como quem estiver encarregado de a vigiar, salvo se provar que nenhuma culpa de sua parte houve ou que os danos se teriam, igualmente, produzidos, ainda, que não houvesse culpa sua. Para que ocorra esta presunção é necessário que a coisa esteja à guarda ou em poder de pessoa que tenha o dever de a vigiar, ou seja é necessário efectuar a prova da propriedade da coisa, ou se fosse o caso (o que não é) do dever de a vigiar, através de alguma relação negocial, que pudesse existir. Ora, o objecto que provocou os danos materiais no veículo foi uma pernada de árvore. Esta está normalmente ligada estruturalmente à árvore, que, por sua vez, não possui vida sem estar incorporada num imóvel. Assim, a árvore é considerada como coisa imóvel (artº 204, alínea c) do Cód. Civil). No caso sob análise está provado que o veículo encontrava-se estacionado, em zona apropriada (parque de estacionamento). Que esse parque de estacionamento da Demandada estava ladeado por árvores, com cerca de 15/20metros de altura. E não há dúvidas que estas são pertença da Demandada. Sucede que cerca das 10:00h o Demandante deparou-se com a queda da pernada de uma árvore em cima do seu veículo. Desta situação resultaram danos materiais no veículo, situados na parte frontal, nomeadamente no lado direito frente, lado do passageiro, vidro da frente, chapa que sustenta o vidro, e lado da porta. Era obrigação da Demandada, a manutenção dos bens incorporados na sua propriedade, em bom estado de conservação, evitando assim que os mesmos pudessem causar danos (artº 1305º do Cód. Civil). Contudo, provado está que a Demandada cuida habitualmente das árvores. Possuindo uma empresa contratada para, pelo menos uma vez por ano, verificar o estado das árvores. Efectuando a poda de ramos, o corte das copas, e em caso de necessidade: risco de queda, galhos secos ou por motivo de “saúde”, proceder ao abate de alguma árvore, o que é feito por ordem da própria Demandada. Para além do mais tem a Demandada um jardineiro ao seu serviço, que cuida diariamente do jardim e das árvores, incumbindo-lhe nomeadamente visionar o estado das árvores, efectuar poda, cortes, etc. Destes factos extrai-se a conclusão que a Demandada é proprietária diligente, que toma regularmente medidas adequadas para prevenir situações como aquela que sucedeu. Face à prova realizada nenhum juízo de censura lhe há a fazer. Acresce que, no dia em causa, 17.10.2015, ocorreu uma “grande” tempestade, como o próprio Demandante refere no seu requerimento inicial. Essa tempestade, como relatado pelas partes e testemunhas inquiridas foi excepcional e violenta, com fortes ventos e chuva. Na altura foi alertado o público em geral para a sua ocorrência através da comunicação social, nomeadamente pela rádio e televisão. Efectivamente, o próprio Demandante, em declarações de parte, admitiu que estava tempo chuvoso e vento. No próprio dia e dia seguinte, eram visíveis os vários ramos, árvores e postes de electricidade caídos naquela zona e limítrofes, como em Sintra, conforme relataram as testemunhas. No dia em causa verificou-se que a árvore manteve-se no mesmo local, mas a pernada partiu e deslocou-se, acabando por cair em cima da viatura. E, analisando as fotografias, a pernada em causa e também a respectiva árvore não pareciam estar secos. De facto há vários motivos para que uma árvore ou parte dela acabe por cair. Há factores intrínsecos que tem que ver com o seu estado de saúde, e factores externos, que podem levar ao mesmo resultado. Não existindo outra explicação plausível, a queda da pernada da árvore teve origem na tempestade que se abateu na região, nomeadamente nas chuvas e ventos fortes. Trata-se de um factor extrínseco de ordem natural. Juridicamente e tendo em consideração o resultado, danos materiais, é designado pela doutrina como sendo uma causa de força maior, pois embora fosse previsível o seu aparecimento (dado que foi noticiado), a sua evolução e o resultado não podiam ser evitados. Ou seja, se não fossem estes elementos meteorológicos extremos, atípicos e excepcionais, que a Demandada não podia controlar nem minorar, o sinistro, muito provavelmente, se não daria. Aliás as próprias testemunhas referiram trabalhar para a Demandada há mais de 13 anos e que nunca viram uma árvore cair naquele local. A ocorrência de uma situação como a descrita afastaria sempre a ilicitude de qualquer facto, se bem que no caso concreto a Demandada acabou por ilidir a presunção legal prevista no artº 493º do Cód. Civil., levando, por essa via também ao afastamento da sua responsabilidade na ocorrência dos danos. Assim sendo e sem necessidade de mais considerações, terá a presente acção de improceder.
V. Decisão * O Demandante deverá efectuar o pagamento da parcela de custas em falta e de sua responsabilidade, no valor de €35, no prazo de três dias úteis a contar da notificação da presente decisão sob pena de incorrer numa penalização de €10 por cada dia de atraso, e até um máximo de €140 (cf. nº 10 da Portaria nº 1456/2001, de 28.12, na redacção dada pela Portaria 209/2005, de 24.02). * Registe e envie cópia aos ausentes, os quais se consideram notificados na presente data.* Para constar se lavrou a presente ata, por meios informáticos, que, depois de revista e achada conforme, vai ser assinada.Cascais, Julgado de Paz, 16 de Janeiro de 2019 A Assistente técnica A Juíza de Paz |