Sentença de Julgado de Paz | |
Processo: | 281/2023-JPSTB |
Relator: | CARLOS FERREIRA |
Descritores: | INDEMNIZAÇÃO POR DANOS EM BENS MÓVEIS INTEGRANTES DO ARRENDAMENTO |
![]() | ![]() |
Data da sentença: | 06/28/2024 |
Julgado de Paz de : | SETÚBAL |
![]() | ![]() |
Decisão Texto Integral: | Processo n.º 281/2023-JPSTB Sentença Parte Demandante: --- [PES-1], contribuinte fiscal número [NIF-1], residente na [...], n.º 5, 7.º Dt. º, [Cód. Postal-1] [...]. --- Mandatária: Dr.ª [PES-7], Advogada, com escritório na [...], n.º 57, 1.º Dt. º, [Cód. Postal-2] [...]. --- Parte Demandada: ---- 1) [PES-2], contribuinte fiscal número [NIF-2], residente na [...], [...] 7, D-22, [Cód. Postal-3] [...]. 2) [PES-3], contribuinte fiscal número [NIF-3], residente na [...], n.º 12, [Cód. Postal-4] [...]. ---- Mandatária: Dr.ª [PES-4], Advogada com escritório na [...], n.º 121, 1.º A, apartado 67, [Cód. Postal-5] [...]. * Matéria: ações que respeitem a responsabilidade civil contratual e extracontratual, al. h), do n.º 1, do art.º 9.º, da Lei n.º 78/2001, de 13 de julho, alterada pela Lei n.º 54/2013, de 31 de julho, doravante designada por Lei dos Julgados de Paz. ---Objeto do litígio: Indemnização por danos em bens móveis integrantes do arrendamento. --- * Relatório: ---O Demandante instaurou a presente ação, nos termos do requerimento inicial constante de fls. 5 a 9, que aqui se declara integralmente reproduzido, e integrado pela correção constante em ata (de fls. 135 a 138), peticionando a condenação das Demandadas a pagarem-lhe a quantia global de €1.512,90 (mil quinhentos e doze euros e noventa cêntimos), bem como, os juros à taxa legal contados desde a data da citação até integral pagamento, custas e procuradoria condigna. --- Para tanto, alegou em síntese que, cedeu de arrendamento à 1.ª Demandada duas frações destinadas a atividades comerciais, tendo a 2.ª Demandada prestado garantia do pagamento das prestações pecuniárias, por fiança. — O arrendamento incluiu móveis e equipamentos. --- Com a cessação do contrato em 01-08-2023, a 1.ª Demandada entregou as chaves do imóvel ao Demandante. --- Quando o Demandante entrou no imóvel verificou que faltava uma bancada metálica, e que uma das vitrines frigoríficas estava avariada. --- Concluiu pela procedência da ação, juntou documentos e procuração forense. ---- Regularmente citadas, as Demandadas apresentaram contestação de fls. 46 a 51, que aqui se declara integralmente reproduzida. --- Por impugnação, as Demandadas alegaram, em síntese que, o Demandante lhes deu autorização para deitar fora a bancada em inox, e que a mesma tinha um valor muito inferior ao peticionado. Para além disso, a vitrina estava a funcionar normalmente na data da entrega do locado. --- Alegaram, ainda, má-fé processual do Demandante, peticionando a condenação do mesmo em multa e indemnização não inferior a €1.000,00. --- Concluíram pela improcedência da ação, juntaram procurações forenses. --- Em resposta, o Demandante peticionou simétrica condenação das Demandados em multa e indemnização, na quantia de €1.000,00, por litigância de má-fé. --- * Foi realizada sessão de Mediação, na qual as partes não lograram chegar a acordo. ---* Aberta a audiência e estando todos presentes, foram ouvidas as partes nos termos do disposto no art.º 57.º, da Lei dos Julgados de Paz. ----Foi feito o esforço necessário e na medida em que se mostrou adequado, para explorar todas as possibilidades de acordo, nos termos do disposto no art.º 2.º, e n.º 1, do art.º 26.º, ambos da Lei dos Julgados de Paz, o que não logrou conseguir-se. -- Frustrada a tentativa de conciliação, prosseguiu a realização da audiência de julgamento com a observância das normas de processo, como resulta documentado na respetiva ata. ---- ---*--- Nos termos do art.º 60.º, n.º 1, al. c), da Lei dos Julgados de Paz, a sentença inclui uma sucinta fundamentação. ---* Fundamentação – Matéria de Facto: ---Incumbe ao Demandante o ónus de provar os factos que constituem o direito invocado na presente ação (cf., n.º 1, do art.º 342.º, do Código Civil). --- Por outro lado, cabe ao Demandado fazer prova dos factos impeditivos, modificativos ou extintivos do direito invocado pelo Demandante (cf., nº2, do artigo 342º, do Código Civil). --- Com interesse para a resolução da causa, tendo em conta as várias soluções jurídicas plausíveis, ficou provado que: --- 1. O Demandante tem registada a seu favor a aquisição das frações autónomas designadas pelas letras “K”, e “L”, do prédio urbano constituído em propriedade horizontal, descrito na 2.ª Conservatória do Registo Predial de [...], freguesia de [...] (S. Sebastião), ficha xxxx, ambas destinadas a atividades comerciais, sitas na [...], n.º 15, R/C, [...], fls. 10 a 18.--- 2. Por contrato escrito datado de 01-08-2021, o Demandante cedeu de arrendamento as referidas frações à 1.ª Demandada, fls. 19 a 26. --- 3. A 2.ª Demandada subscreveu o referido contrato, no qual declarou que prestava fiança, idem; 4. O referido arrendamento incluía equipamentos, de entre os quais uma bancada em inox e uma vitrina frigorífica, pertencentes ao Demandante, fls. 26; --- 5. O arrendamento terminou em 31-07-2023; --- 6. As chaves das referidas frações foram entregues ao Demandante em 01-08-2023; --- 7. Em data que não ficou concretamente apurada, mas que se sabe ter sido durante a execução do contrato de arrendamento, a 1.ª Demandada deitou a bancada de inox no lixo, fls. 74; --- 8. A referida bancada estava usada; --- 9. Uma bancada em inox nova, com 2,9 metros de comprimento, custa €850,00 mais IVA, fls. 29; --- 10. O motor da vitrina frigorífica estava avariado quando a 1.ª Demandada entregou as chaves das frações ao Demandante; --- 11. Em 28-08-2023, o Demandante suportou o custo de reparação da vitrina frigorífica no montante de €467,40, fls. 30 e 31; --- 12. Quando o contrato foi celebrado os bens estavam em bom estado de conservação, fls. 19 a 26. --- * Factos não provados: ---Não se provaram quaisquer outros factos alegados pelas partes com interesse para a decisão da causa, nomeadamente, que: --- i. O Demandante autorizou a 1.ª Demandada a deitar fora a bancada em inox; --- ii. A vitrina frigorífica estava a funcionar em perfeitas condições na data em que a 1.ª Demandada entregou as chaves das frações ao Demandante; --- ---*--- Motivação da Matéria de Facto: ---Os factos provados resultaram da conjugação da audição de partes, dos documentos constantes dos autos, e do depoimento testemunhal prestado em sede de audiência de julgamento, tendo os vários elementos de prova sido apreciados de forma a compatibilizar toda a matéria de facto adquirida, tendo em conta os dados da experiência de senso comum e as características próprias a relação controvertida vivenciada pelas partes. --- Nos termos do n.º 2, do art.º 574.º, Código de Processo Civil, aplicável ex vi, art.º 63.º, da Lei dos Julgados de Paz, consideram-se admitidos por acordo os factos constantes nos números 5 e 6. ---- O facto vertido em 7, considera-se confessado extrajudicialmente por documento particular escrito oferecido à parte contrária (mensagem de WhatsApp, de fls.74, não impugnada especificadamente), com força probatória plena (cf. segunda parte, do n.º 2, do art.º 358.º, do Código Civil). --- O facto constante em 8, resulta provado por declarações do Demandante. --- Pela prova documental consideram-se provados os factos suportados pelo teor dos documentos indicados de forma especificada, na enumeração do probatório supra. --- O facto constante em 11, resulta provado pela conjugação da fatura respeitante à reparação com o depoimento testemunhal de [PES-5], que se mostrou isento, credível e com razão de ciência nesta matéria. --- O facto constante em 10, presume-se a partir do facto provado em 11, porque, não estando a vitrina a ser utilizada desde a saída da 1.ª Demandada do local, a avaria do referido equipamento, que apenas foi detetada posteriormente quando o locado estava a ser preparado par voltar a ser arrendado, teria de ser anterior à entrega das frações ao Demandante, como resulta da experiência comum, art.º 349.º e ss., do Código Civil.--- À exceção do valor probatório do depoimento testemunhal acima mencionado, os restantes depoimentos não se revelaram determinantes, para prova de factos essenciais da causa, devendo afirmar-se que a única testemunha apresentada pela parte Demandada afirmou ser mãe da 1.ª Demandada, limitando-se a aderir à versão dos factos da mesma, pelo que, o seu depoimento foi considerado como sendo de parte interessada e não isento.--- Consigna-se que, para apuramento da matéria de facto não foi considerado o teor dos articulados, da audição das partes ou das testemunhas com matéria tida por irrelevante, conclusiva ou de direito. Os factos não provados resultam da ausência de elementos que permitam formar convicção positiva sobre os mesmos. --- Em especial, relativamente ao facto não provado em i), a alegação de a 1.ª Demandada ter sido autorizada pelo Demandante a deitar a bancada metálica para o lixo, por causa de uma praga de baratas não deve proceder. Em primeiro lugar, porque não ficou provado que essa autorização tenha sido dada, incumbindo o respetivo ónus à parte demandada. Em segundo lugar, também não é compatível com a experiência de senso comum que o Demandante tenha abdicado, sem mais, por via telefónica, de um equipamento com relativo valor pecuniário, de grande utilidade no tipo de atividade desenvolvida no local, e que sendo um bem feito de inox, particularmente resistente, poderia ser sujeito a tratamentos adequados a debelar a alegada praga, mesmo que isso implicasse a substituição de componentes removíveis (estrado) em madeira.--- Aliás, o facto de o equipamento constar expressamente (ainda que com caraterização incompleta) de um inventário para fazer parte integrante do contrato de arrendamento confere-lhe um caráter suficientemente relevante para não ser descartado de forma liminar e irrefletida. --- Mais, sabendo a 1.ª Demandada que o referido equipamento constava de documento escrito, no referido inventário, ou relação de bens como parte integrante do contrato de arrendamento, impunha-se diligenciar por obter uma autorização por escrito. --- Até porque, a existir a alegada praga de baratas, não se apurou se a mesma era ou não pré-existente ao contrato, nem ficou demonstrado que outros bens existentes no local tivessem de ser descartados pelo mesmo motivo. --- O certo é que a 1.ª Demandada manteve o arrendamento por dois anos, sem que tenha reclamado ao Demandante a falta de condições do local para laborar. --- Deste modo, a referida alegação não foi consubstanciada por elementos objetivos de prova que permitissem formar convicção positiva sobre o facto. --- ---*--- Fundamentação – Matéria de Direito: ---A causa de pedir na presente ação respeita a danos alegadamente causados em bens móveis pertencentes ao Demandante, que estavam incluídos no arrendamento de duas frações cedidas à 1.ª Demandada para a sua atividade comercial. --- Esta matéria remete-nos para o conteúdo do contrato de arrendamento, no que concerne ao conteúdo das obrigações acessórias ao pagamento da renda, e bem assim, no que respeita à extensão da fiança. --- - Se as Demandadas são responsáveis por indemnizar a Demandante pelos montantes peticionados, em consequência dos alegados danos descritos nos autos. --- - A responsabilidade pelas custas da ação. --- Dos pedidos deduzidos pelo Demandante extrai-se que, para além do mais, que o mesmo pretende obter a condenação das Demandadas a pagarem-lhe a quantia global de €1.512,90 (mil quinhentos e doze euros e noventa cêntimos), a título de rendas em atraso e danos patrimoniais, bem como, os juros à taxa legal contados desde a data da citação até integral pagamento. --- Vejamos se lhe assiste razão: --- A responsabilidade civil e a respetiva obrigação de indemnizar dependem da verificação de dos seguintes pressupostos: facto voluntário, ilicitude, culpa, dano, e nexo causalidade. --- Na responsabilidade fundada em contrato, o incumprimento da prestação pelo devedor representa o facto gerador da lesão do direito subjetivo do credor, pelo que constitui o facto voluntário e ilícito. --- Estabelece o art.º 406.º, n.º 1, do Código Civil, que os contratos devem ser pontualmente cumpridos, e só podem modificar-se ou extinguir-se por mútuo consentimento dos contraentes ou nos casos admitidos na lei. --- A lei determina que o devedor cumpre a sua obrigação quando realiza a prestação a que está vinculado, a qual, salvo convenção em contrário, deverá ser realizada integralmente e não por partes (cf., artigos 762.º, e 763.º, ambos do Código Civil). --- Por outro lado, no âmbito da responsabilidade contratual, como no caso dos autos, tem aplicabilidade o disposto no art.º 799.º, do Código Civil, que estabelece uma presunção legal de culpa do devedor, incumbindo-lhe provar que a falta de cumprimento ou o cumprimento defeituoso não procede de culpa sua. --- Assim, na responsabilidade contratual o credor apenas tem que provar o incumprimento da obrigação (incluindo as obrigações acessórias), e o dano, presumindo-se a culpa numa vertente que engloba a ilicitude e o nexo causal, cf. art.º 799.º, do Código Civil. --- Responsabilidade da 1.ª Demandada: --- Pela matéria provada resulta que as partes celebraram um contrato de arrendamento. --- No cumprimento do referido contrato sobressai a obrigação do senhorio proporcionar ao inquilino o gozo temporário do imóvel objeto do arrendamento, mediante o pagamento de uma renda. --- Ora, para além do pagamento da renda, existem diversas obrigações acessórias que o inquilino está obrigado a cumprir. --- Com efeito, o locatário tem a obrigação de utilizar a coisa locada de forma prudente (art.º 1038.º, n.º 1, al. d), do Código Civil), e de a restituir no estado em que a recebeu, presumindo-se que a recebeu em bom estado, nos termos do art.º 1043.º, do Código Civil.--- Ficou provada a falta de uma bancada metálica, em inox, que consta do inventário inicial, anexo ao contrato para dele fazer parte integrante. --- Ora, a lei determina expressamente que o locatário responde pela perda da coisa, nos termos do disposto no art.º 1044.º, salvo se o facto não proceder de facto que não lhe seja imputável. --- Assim, a 1.ª Demandada lesou intencionalmente o património do Demandante, estando verificada existência de culpa no cometimento por ação do facto ilícito, na forma dolosa, sendo o dano equivalente à diferença patrimonial de sinal negativo a que o mesmo ficou sujeito pela falta do referido equipamento, sendo evidente o nexo causal entre o facto e o dano. --- Relativamente ao valor da indemnização, sendo a bancada um equipamento de duração prolongada, e que embora fosse usada, estava em bom estado de conservação à data da celebração do contrato, face ao valor de aquisição de uma bancada nova, conforme consta dos autos, considera-se ajustado o valor correspondente à quantia de €500,00. --- Deste modo, a ação deve proceder parcialmente nesta parte do pedido. --- Tendo em conta tudo aquilo que já foi afirmado, designadamente, que os bens estavam em bom estado de conservação, tendo inclusivamente sido alegado em sede contestação, que a vitrina estava a funcionar, pode adiantar-se que a 1.ª Demandada é ainda responsável pelo pagamento da reparação da vitrina frigorífica, no montante de €467,4, que o Demandante efetivamente suportou, uma vez que aquela estava obrigada a entregar os bens no fim do arrendamento em estado idêntico ao que tinham no início do contrato, salvo as deteriorações lícitas previstas no art.º 1073.º, n.º 1, do Código Civil, as quais, aliás, devem ser “reparadas pelo arrendatário antes da restituição do prédio, salvo estipulação em contrário”.--- Ora, impendia sobre 1.ª Demandada o ónus de demonstrar que a avaria não decorreu de facto que lhe possa ser imputado, o que não logrou nos presentes autos. --- Deste modo, a ação deve proceder nesta parte do pedido. ---- Responsabilidade da 2.ª Demandada: --- Ficou provado que a 2.ª Demandada prestou fiança no contrato de arrendamento dado aos autos. -- O fiador enquanto garante da dívida do inquilino, assume no contrato a posição de devedor, ficando pessoalmente obrigado perante o credor senhorio, nos termos do art.º 627.º n.º 1 do Código Civil.--- É à luz daquilo que se encontra expressamente estabelecido no contrato de arrendamento que se delimita o âmbito da dívida que é assumida pelo fiador, e que tem apenas como limite a dívida principal que não pode exceder, conforme previsto no art.º 631.º n.º 1 do Código Civil.--- Nos termos da cláusula nona, do referido contrato de arrendamento, a 2.ª Demandada declarou-se principal pagadora, renunciando ao benefício da excussão prévia, assumindo solidariamente com a 1.ª Demandada a obrigação de cumprir durante toda a vigência de efeitos do contrato, as obrigações com expressão pecuniária que dele decorram. --- Efetivamente, conforme é doutamente afirmado no Acórdão do Tribunal da relação de Coimbra, de 2024-03-19, Processo 522/20.7T8LMG.C1, a responsabilidade solidária do fiador abrange todas as obrigações decorrentes do contrato de arrendamento, não se limitando ao pagamento da renda. --- Portanto, a 2.ª Demandada constituiu-se como garante do cumprimento pela inquilina, de toda e qualquer obrigação que para esta resulte da execução e da cessação do contrato de arrendamento – e não apenas da fundamental obrigação de pagamento da renda convencionada – responsabilidade que, por força da sua renúncia ao benefício da excussão, é solidária. Assim, findo o contrato, a 2.ª Demandada responde pelo bom e integral cumprimento de todas as obrigações da 1.ª Demandada decorrentes do contrato, incluindo a obrigação de indemnizar o Demandante pela falta de bens e pelas deteriorações patenteadas nas coisas que integram o arrendamento no momento da sua devolução. - Deste modo, verifica-se a responsabilidade solidária de ambas as Demandadas, devendo ser declarada a procedência parcial do pedido, pelo valor da soma das quantias acima reconhecidas a crédito do Demandante. --- Sobre o pedido de condenação nos juros de mora: --- A obrigação de indemnização em dinheiro tem natureza pecuniária (cfr., artigos 566.º, n.º 1 e 550.º, ambos do Código Civil). --- Nos termos do n.º 1, alínea b), e da segunda parte do n.º 2, ambas do art.º 805.º, do Código Civil, se a obrigação provier de facto ilícito, em princípio, o devedor constitui-se em mora a partir da data da citação. --- A simples mora constitui o devedor na obrigação de reparar os danos causados ao credor (cf., art.º 804.º, n.º 1, do Código Civil). --- Nas obrigações pecuniárias a indemnização pela mora no pagamento corresponde normalmente aos juros vencidos, calculados à taxa supletiva dos juros legais, desde a constituição em mora até integral pagamento (cf., artigos 559.º; 805.º e 806.º, todos do Código Civil). --- A Portaria n.º 291/03, de 8 de abril, determina que os juros civis correspondem à taxa de 4%, sendo essa a taxa supletiva, aplicável na falta de convenção das partes em contrário. --- Deste modo, a ação deve proceder nesta parte do pedido, declarando as Demandadas solidariamente responsáveis pelo pagamento dos juros de mora, à taxa legal supletiva, contados sobre a quantia global da indemnização a pagar ao Demandante, desde a data da citação até integral pagamento. --- Sobre o pedido de condenação em custas e procuradoria condigna: --- Relativamente a procuradoria, apesar de constar expressamente no pedido primitivo, não foram alegadas nem demonstradas nos autos despesas em que o Demandante tivesse incorrido com a presente ação. --- Todavia, para além da falta de prova patente nos autos sobre a existência de despesas com a ação, cumpre ter presente que, em processo de julgados de paz, vigora a Portaria n.º 342/2019, de 1 de outubro, não sendo aplicável o Regulamento das Custas Judiciais, pelo que, não há lugar a custas de parte, nem a procuradoria, devendo a ação improceder nesta parte. - Tendo em conta os limites da condenação impostos pelo art.º 609.º, do Código de Processo Civil, aplicável por força do art.º 63.º, da Lei dos Julgados de Paz, a ação deverá improceder nesta parte do pedido, sem prejuízo da decisão sobre custas, tomada adiante. --- Sobre a má-fé processual: ---- Relativamente aos pedidos cruzados e recíprocos de ambas as partes na condenação da contraparte como litigante de má-fé, cumpre dizer o seguinte: --- Para determinar a litigância de má-fé, não releva o facto de a parte ter ou não razão ou o facto de conseguir (ou não) fazer prova dos factos que alegou; mas sim, um determinado comportamento processual censurável e reprovável. por atentar contra o respeito pelos Tribunais e prejudicar a ação da justiça, no sentido em que consubstancie o incumprimento doloso ou gravemente negligente dos deveres de cooperação e de boa-fé processual, a que as partes estão submetidas (cf., art.º 7º e 417.º, do Código de Processo Civil). --- Ora, o que se pode afirmar sobre a conduta de cada uma das partes resume-se a considerar que o Demandante recorreu de forma lícita à instauração da presente ação, no sentido de obter a declaração do seu direito de crédito, dado que, a alternativa seria ficar lesado no seu património.--- Por outro lado, é de considerar que as Demandadas deduziram a defesa que consideraram pertinente sem extravasar os meios normais de atuação na lide. --- O facto de ter peticionado um valor superior ao provado no decurso da ação não representa má-fé, mas sim uma noção superlativa da realidade. --- No que respeita à parte demandada, terá de se admitir a possibilidade de ter havido falsa representação da realidade sobre os factos percecionados pelas Demandados, e que serviram de base às alegações de defesa. --- Assim, ambos os pedidos de condenação em litigância de má-fé devem improceder. --- ---*--- Decisão: ---Atribuo à causa o valor de €1.512,90 (mil quinhentos e doze euros e noventa cêntimos), por corresponder à quantia em dinheiro que o Demandante pretendia obter no momento da propositura da ação (e após correção do requerimento inicial), cf., normas conjugadas dos artigos 306.º, n.º 1; 297.º, n.º 1; e 299.º, n.º 1, todos do Código de Processo Civil, aplicáveis ex vi, art.º 63.º, da Lei dos Julgados de Paz. --- Pelo exposto, e com os fundamentos acima invocados: --- Declaro improcedentes os pedidos cruzados e recíprocos das partes para condenação da contraparte como litigante de má-fé. --- Julgo a presente ação parcialmente procedente, por parcialmente provada, e consequentemente, condeno solidariamente as Demandadas a pagarem ao Demandante a quantia global de €987,40 (novecentos e sessenta e sete euros e quarenta cêntimos), acrescida dos juros de mora contados à taxa legal de 4%, contados desde a data da citação até integral e efetivo pagamento, conforme requerido. --- Mais, decido absolver as Demandadas do restante peticionado na presente ação. Custas: --- Sem prejuízo da isenção da 1.ª Demandada por beneficiar de apoio judiciário, a taxa de justiça no montante de €70,00 (setenta euros), são da responsabilidade de ambas as partes na proporção do respetivo decaimento, que fixo em 64%, para a parte demandada, e 36%, para o Demandante. --- Assim, a 2.ª Demandada deverá proceder ao pagamento da quantia de €44,80 (quarenta e quatro euro s e oitenta cêntimos). --- Por sua vez a Demandante deverá proceder ao pagamento da quantia de €25,20 (vinte e cinco euros e vinte cêntimos). --- * Os pagamentos deverão ser efetuados no prazo de três dias úteis, mediante liquidação das respetivas guias de pagamento (DUC), emitidas pela secretaria do Julgado de Paz. ---* Extraia as guias de pagamento (DUC), e notifique aos responsáveis pelo pagamento das custas juntamente com cópia da presente decisão. ---Após os três dias úteis do prazo legal, aplica-se uma sobretaxa no montante de €10,00 (dez euros), por cada dia de atraso no cumprimento da obrigação, até ao máximo de €140,00 (cento e quarenta euros). --- O valor da sobretaxa aplicável acresce ao montante da taxa de justiça em dívida. --- * Após trânsito, verificando-se a falta de pagamento das custas, mesmo após o acréscimo da referida sobretaxa legal, conclua para emissão de certidão para efeitos de execução fiscal, a instaurar junto dos competentes serviços da Autoridade Tributária e Aduaneira (AT), pelo valor das custas em dívida acrescidas da respetiva sobretaxa.* Registe. ---Notifique pessoalmente em sede de audiência de discussão e julgamento, nos termos do disposto no artigo 60.º, n.ºs 1 e 2, da Lei dos Julgados de Paz. --- Envie cópia da mesma aos intervenientes processuais que, eventualmente, faltarem na data agendada para a prolação da sentença, cf., artigo 46.º, n.º 3, da Lei dos Julgados de Paz. --- * Julgado de Paz de Setúbal, 28 de junho de 2024O Juiz de Paz _________________________ Carlos Ferreira |