Sentença de Julgado de Paz | |
Processo: | 261/2018-JPCBR |
Relator: | MARGARIDA SIMPLÍCIO |
Descritores: | AÇÃO DE DIVISÃO DE COISA COMUM/DIVISÃO DO PRÉDIO RÚSTICO POR USUCAPIÃO. |
Data da sentença: | 02/26/2019 |
Julgado de Paz de : | COIMBRA |
Decisão Texto Integral: | SENTENÇA Processo n.º 261/2018-J.P.CBR RELATÓRIO: A demandante, Herança Ilíquida e Indivisa aberta por óbito de MA, representada pelos seus únicos e universais herdeiros: MN, NIF …, na qualidade de cônjuge meeira, e cabeça de casal, residente na rua …; E, CA, casado com MJ, no regime da comunhão de adquiridos, NIF. …, na qualidade de herdeiro de MA, residente na …, no concelho de Coimbra, representados por mandatária constituída. Requerimento Inicial: Alega-se em suma que o falecido MA e a aqui 1ª demandante eram donos e legítimos possuidores de 1/2 do prédio rústico, sito no …, inscrito na matriz predial rústica, da freguesia de Ceira, sob o artigo … e descrito na Conservatória do Registo Predial de Coimbra, sob o nº …, e ali inscrito a favor dos demandados, por o terem adquirido de forma verbal APS, há mais de 40 anos. E desde então sempre exerceram actos de posse sobre a metade do referido prédio, autonomizado da restante metade, posse que exerceram de boa-fé, na convicção de exercerem um direito próprio, como efectivamente sempre exerceram sem lesarem direito de outrem, de forma pública, à vista de toda a gente, pacífica, sem oposição de quem quer que seja, e ininterrupta, sem qualquer hiato, nele semeando e colhendo os respectivos produtos agrícolas e hortícolas. O falecido MA e a sua esposa adquiriram a posse sobre o referido prédio por usucapião, modo de aquisição que expressamente invocam nos termos e ara os efeitos do disposto no artigo 1287.º do CC. Por sua vez, os demandados são donos e legítimos possuidores dos seguintes prédios: a) metade indivisa de terra de semeadura, sita no …, inscrita na respectiva matriz predial da freguesia de Ceira, sob o art.º…, descrito na Conservatória do Registo Predial de Coimbra, sob o nº …, e ali inscrito 1/2 a favor dos demandados; b) terra de semeadura, sita no …, com a área de 760 m2, inscrita na respectiva matriz predial rústica da freguesia de Ceira sob o artigo …, descrita na Conservatória do Registo predial, sob o nº … e ali inscrita a favor dos demandados. No ano de 1987, ou seja, há mais de 30 anos, o falecido MA, autor da herança, representada pelos demandantes permutaram com os demandados a referida metade indivisa do prédio rústico inscrito na matriz rústica da freguesia de Ceira, sob o artigo …, identificada em a), sendo que estes já eram proprietários da outra metade, com uma parcela de terreno com a mesma área de 172 m2, situada no prédio rústico, inscrito na matriz predial rústica da mesma freguesia de Ceira, sob o artigo … de que os demandados são proprietários, melhor identificada na alínea b) desta petição. Com base no acordo de permuta, os demandados passaram a possuir o referido prédio, correspondente a metade do artigo …, de forma pública, pacífica, ininterruptamente e de boa-fé, à vista de toda a gente, que anexaram à outra metade de que já eram donos e legítimos possuidores, passando assim ser donos da totalidade do prédio, sendo-lhes reconhecido o direito de propriedade plena por sentença proferida por este Julgado de Paz. Por sua vez, o falecido AA e a 1ª demandante passaram a usufruir plenamente de forma exclusiva da faixa de terreno com a área de 172 m2, extraída do prédio rústico inscrito na matriz, sob o artigo …, o qual foi demarcado nos seus limites através de marcos, conjuntamente com os demandados, nela construíram uma arrecadação e uma garagem, ocupando a restante área da parcela de terreno que não está incluída nas construções. A posse material desta é reconhecida pelos demandados. A referida parcela de terreno com a área de 172 m2, confronta a Norte e a Nascente com MC, do sul com AC e Poente com Caminho Público, conforme localização melhor definida no levantamento topográfico, junto e delimitado a vermelho. Por força da mencionada permuta, o falecido MA e a sua mulher, aqui demandante, passaram a usufruir de forma exclusiva a dita faixa de terreno com 172 m2, extraída do prédio inscrito na matriz sob o artigo …, que confronta a Norte e a Nascente com MC, do sul com AC e do Poente com Caminho Público, posse que vêm exercendo há mais de 30 anos, de forma pública, pacífica, ininterrupta, sem oposição de quem quer que seja e de boa fé, como de verdadeiros proprietários se tratassem como efectivamente são. A posse exercida sobre a aludida parcela autónoma pelo falecido MA e sua mulher transmitiu-se aos seus sucessores, os demandantes, que nela acederam, adquirindo-a por usucapião. Os demandantes pretendem inscrever a referida parcela na matriz predial e proceder ao respectivo registo na Conservatória do Registo Predial, legalizando a realidade factual o que não lograram conseguir sem que seja proferida sentença que declare a sua individualização como prédio independente e distinto, nos precisos termos em que se mantém há mais de 30 anos, daí o recurso à presente acção. Os demandantes esclarecem que os demandados propuseram acção contra os demandantes neste Julgado de Paz, com o mesmo pedido e causa de pedir, sobre a qual foi proferida sentença, e os demandados foram declarados donos e legítimos proprietários da totalidade do prédio identificado na alínea a), nos termos da sentença proferida no processo nº 271/2017-JPCBR. Concluem pedindo que: A) seja declarado que os demandantes, enquanto herdeiros universais do falecido MA, são os donos e legítimos possuidores do prédio rústico, sito no cabeço, com a área de 172 m2, a confrontar do norte e do nascente com MC, do sul com AC e do poente com caminho público, omisso na matriz predial, melhor identificado no supra artigo 8.º, extraído do prédio inscrito na matriz predial rústica, da freguesia de Ceira, sob o artigo …, e descrito na conservatória do registo predial, sob o nº …, do qual se autonomizou, constituindo um prédio distinto e autónomo, que adquiriram por usucapião; B) e consequentemente, ser ordenado o direito de procederem à declaração do prédio omisso na matriz, bem como a inscrição do mesmo na conservatória do registo predial, ordenando-se as necessárias rectificações na inscrição na matriz e na conservatória, do prédio descrito sob o nº. …, e inscrito na matriz predial rústica da freguesia de Ceira, sob o artigo …, relativamente a sua área, à qual deverá ser abatida 172 m2; C) serem condenados os demandados a reconhecer a constituição do descrito prédio como autónomo e distinto do inscrito na matriz predial rústica da freguesia de Ceira, sob o artigo … e a reconhecer o direito de propriedade da demandante sobre o mesmo. Juntaram 7 documentos.
MATÉRIA: Ação de divisão de coisa comum, enquadrada no art.º 9, n.º1, alínea E) da L.J.P. OBJETO: Divisão do prédio rústico por usucapião. VALOR DA AÇÃO: 5.001€ (cinco mil e um euros, fixados nos termos dos art.º 305, n.º4 e 306,n.º2 ambos do C.P.C.).
Os demandados, MC, NIF. … e marido OS, NIF. …, ambos residentes na rua da …, no concelho de Coimbra. Encontram-se regularmente citados, conforme registos de receção a fls. 28 e 29, mas não apresentaram contestação.
TRAMITAÇÃO: Não se realizou sessão de pré-mediação por recusa da demandante. As partes são legítimas e dispõem de capacidade judiciária. O processo está isento de nulidades que o invalidem na totalidade. O Tribunal é competente em razão da matéria, valor e território.
AUDIÊNCIA DE JULGAMENTO: Foi iniciada dando cumprimento ao disposto no art.º 26, n.º1 da L.J.P., seguindo-se para produção de prova, com declarações de parte nos termos do art.º 57, n.º1 da L.J.P., sendo prescindido a audição das testemunhas, e das alegações finais, como se infere da ata de fls. 40 a 41. -FUNDAMENTAÇÃO- I-DOS FACTOS PROVADOS: 1) MA e a 1ª demandante eram donos e legítimos possuidores de ½ indiviso do prédio rústico, sito no …, inscrito na matriz predial rústica, da freguesia de Ceira, sob o artigo …. 2) O qual está descrito na Conservatória do Registo Predial de Coimbra, sob o nº …, e ali inscrito a favor dos demandados, por o terem adquirido de forma verbal a AS, há mais de 40 anos. 3) Sempre exerceram, actos de posse sobre a metade do prédio, autonomizando-o da restante metade, posse que exerceram de boa-fé, na convicção de o fazerem por direito próprio. 4) Efectivamente, MA e a 1ª demandante, sempre exerceram actos de posse sem lesarem o direito de outrem, de forma pública, à vista de toda a gente, pacífica, sem oposição de quem quer que seja, e ininterrupta, sem qualquer hiato de tempo. 5) Nomeadamente, nele semearam e colhendo os respectivos produtos agrícolas e hortícolas. 6) Os demandados são os donos e legítimos possuidores do prédio rústico, composto por Metade indivisa de terra de semeadura, sita no …, inscrita na matriz predial da freguesia de Ceira, sob o artigo …, descrito na Conservatória do Registo Predial de Coimbra, sob o nº …, e inscrito 1/2 a favor dos demandados. 7) E, também do prédio rústico composto por terra de semeadura, sito no …, com a área de 760 m2, inscrito na matriz predial rústica da freguesia de Ceira sob o artigo …, descrito na Conservatória do Registo predial, sob o nº …, inscrito a favor dos demandados. 8) No ano de 1987, ou seja, há mais de 30 anos, o falecido MA, autor da herança, representada pelos ora demandantes, permutaram com os demandados a metade indivisa do prédio rústico inscrito na matriz rústica da freguesia de Ceira, sob o artigo …. 9) O que fizeram com a parcela de terreno com a mesma área de 172 m2, situada no prédio rústico, inscrito na matriz predial rústica da mesma freguesia de Ceira, sob o artigo … de que os demandados são proprietários, identificada no facto 7. 10) Com base no acordo de permuta, os demandados passaram a possuir o prédio, correspondente a metade do artigo …, de forma pública, pacífica, ininterruptamente e de boa-fé, à vista de toda a gente. 11) Os demandados anexaram à outra metade de que já eram donos e legítimos possuidores, passando assim ser donos da totalidade do referido prédio. 12) O falecido AA e a 1ª demandante passaram a usufruir plenamente de forma exclusiva da faixa de terreno de 172 m2, extraída do prédio rústico inscrito na matriz, sob o artigo …, 13) O qual foi demarcado nos seus limites através de marcos, conjuntamente com os demandados. 14) Neste construíram uma arrecadação e uma garagem, ocupando a restante área da parcela de terreno que não está incluída nas construções. 15) Exercendo assim actos de posse material sobre o prédio, a qual é reconhecida pelos demandados. 16) A referida parcela de terreno com a área de 172 m2, confronta do Norte e do Nascente com MC, do sul com AC e do Poente com Caminho Público, conforme localização melhor definida no levantamento topográfico, junto e delimitado a vermelho 17) MA e a sua mulher, aqui demandante, passaram a usufruir de forma exclusiva a dita faixa de terreno com 172 m2, extraída do mencionado prédio inscrito na matriz sob o artigo …, que confronta do Norte e do Nascente com MC, do sul com AC e do Poente com Caminho Público. 18) O que vêm exercendo há mais de 30 anos, de forma pública, pacífica, ininterrupta, sem oposição de quem quer que seja e de boa fé, como de verdadeiros proprietários se tratassem. 19) Pelo falecimento de MA, a posse sobre o prédio transmitiu-se aos seus sucessores, os aqui demandantes. 20) Decorreu no Julgado de Paz de Coimbra a ação sob o n.º 000/2017, na qual foi proferida sentença sobre o prédio identificado no facto 6.
MOTIVAÇÃO: O Tribunal sustenta a decisão com base na análise crítica dos documentos junto aos autos, conjugado com as declarações de parte dos demandados, proferidas nos termos do art.º 57, n.º 1 da L.J.P., e regras do ónus da prova. Na realidade os demandados admitiram que ocorreu entre eles uma permuta sobre os prédios das partes. Desde aí, têm respeitado a individualidade dos prédios, colocando marcos de forma a individualizarem-nos e vêem, cada um deles, a fruírem o respetivo dos prédios, o que fazem com a concordância dos demais interessados, mas sem procederem formalmente á separação das respetivas parcelas. Procederam ao respectivo levantamento topográfico dos prédios, documento 5 junto aos autos de fls. 9 e 10, de forma a individualizarem as parcelas como unidades individuais e independentes, entre si, do que resultou os factos provados com os n.º 16. Os factos n.º 1 e 2, resultam dos documentos 1 e 2, juntos de fls. 5 e 6. O facto n.º6 resulta dos documentos 1 e 2, juntos de fls. 5 e 6. O facto n.º7 resulta dos documentos 3 e 4, juntos de fls. 7 e 8 O facto n.º 16 resulta do documento 5, juntos de fls. 9 a 10. O facto n.º 20 resulta do documento 6 e 7, juntos de fls. 11 a 15. O facto n.º 19 resulta do documento 8, juntos de fls. 16 a 18. Não se provaram mais factos com interesse para a causa.
II- DO DIREITO: O caso dos autos prende-se com a divisão de um prédio rústico em dois. Existe compropriedade quando duas ou mais pessoas são simultaneamente titulares do direito de propriedade sobre a mesma coisa (art.º 1403 do C.C.). O direito de propriedade adquire-se por contrato, sucessão por morte, usucapião, ocupação, acessão e demais modos previstos na lei (art.º 1311 do C.C.). Nos termos do previsto no art.º 1287 do C.C., “a posse do direito de propriedade (…), mantida por certo lapso de tempo, faculta ao possuidor, salvo disposição em contrário, a aquisição do direito a cujo exercício corresponde a sua atuação, o que se denomina por usucapião”. A usucapião mais não é do que a posse do direito de propriedade ou de outros direitos reais de gozo, mantida por certo lapso de tempo, desde que se revista de determinadas características e durante certo período temporal – (art.º 1287 do C.C.). Por seu turno, a posse, nos termos do art.º 1251 do C.C. é o poder que se manifesta (exercício de poderes de facto) sobre uma coisa, em termos equivalentes ao direito de propriedade ou de outro direito real, traduzindo-se no corpus: elemento material, que mais não é do que a assunção de poderes de facto sobre a coisa e no animus: o exercício de tais poderes de facto como titular do respetivo direito de propriedade ou de outro direito real. A usucapião traduz-se numa forma originária de aquisição do direito, ou seja, reconhece-se que o seu titular recebe o direito, independentemente do direito do anterior titular, pelo que para a mesma poder ser eficaz, é necessário avaliar se existem actos de posse e se os mesmos foram exercidos em moldes conducentes à aquisição do direito, isto é, com a intenção de corresponder ao direito real invocado, in casu, ao direito de propriedade, durante um certo lapso de tempo e com determinadas características. Em relação às características da posse, de acordo com o disposto nos art.º 1258 a 1262, todos do C.C., pode a mesma ser titulada ou não titulada, de boa ou de má-fé, pacífica ou violenta, pública ou oculta, o que tem relevância para a quantificação do prazo reputado como suficiente, para que se verifique a usucapião – (art.º 1294 a 1296 todos do C.C). Para que se possa iniciar a contagem do prazo para a usucapião, é necessário que não ocorra situações de posse violenta ou tomada ocultamente (art.º 1297 C.C), as quais são legalmente excluídas de serem usucapíveis. Para que a posse possa conduzir à usucapião, tem de revestir determinadas características (as descritas no art.º 1258 do C.C), nomeadamente ser uma posse pacífica, que tem de ser complementada com a prática reiterada dos actos de posse, de acordo com o estatuído no art.º 1263, alínea a), do C.C. Para além de que, como referem P. de Lima e A. Varela, in C. C. Anotado, Vol. III, 2.ª Ed. Revista e Atualizada (Reimpressão), Coimbra Editora, 1987, a págs. 25 e 26, sem a prática reiterada e pública dos actos de posse, nos termos do artigo 1263.º, al. a), do C.C., a posse não existe, nem se constitui, valendo esta alínea como um complemento ou uma confirmação do conceito de posse expresso no art.º 1251 do C. C. No caso em apreço provou-se que o falecido, MA e a mulher, a ora demandante eram proprietários de 1/2 do prédio rústico, sito no lugar de …, inscrito na matriz predial rústica, da freguesia de Ceira, sob o artigo …, descrito na Conservatória do Registo Predial de Coimbra, sob o nº …, e ali inscrito a favor dos mesmos, por o terem adquirido de forma verbal a AS, há mais de 40 anos. Sobre a metade do referido prédio prédio sempre exerceram, actos de posse, autonomizando-o da restante metade, posse que exerceram de boa-fé, na convicção de o fazerem por direito próprio. Efectivamente, MA e a 1ª demandante, sempre exerceram actos de posse sem lesarem o direito de outrem, de forma pública, à vista de toda a gente, pacífica, sem oposição de quem quer que seja, e ininterrupta, sem qualquer hiato de tempo. Nomeadamente, nele semearam e colhendo os respectivos produtos agrícolas e hortícolas. Provou-se, ainda, que os demandados, também, eram proprietários de 1/2 do mesmo prédio rústico, assim como do prédio rústico, sito no …, com a área de 760 m2, inscrito na matriz predial rústica da freguesia de Ceira sob o artigo …, descrito na Conservatória do Registo predial, sob o nº …. Sucede que o falecido, MA e a mulher, a ora demandante e os demandados efectuaram entre si uma permuta dos prédios. Nomeadamente, a metade indivisa do prédio rústico inscrito na matriz sob o art.º … da freguesia de Ceira, com uma parcela com a área de 172 m2 do prédio inscrito na matriz sob o art.º … da mesma freguesia de Ceira, ambos do concelho de Coimbra. O que sucedeu no ano de 1987, ou seja, há mais de 30 anos. E, foi com base nesse acordo verbal de permuta que, passou o falecido, MA e a mulher, a ora demandante a possuírem o prédio, com a área total de 172 m2, a qual foi extraída do prédio inscrito na matriz sob o art.º … da freguesia de Ceira. Assim, passou este a ser um prédio autónomo e independente, o qual foi devidamente demarcado com marcos, confrontando a Norte e a Nascente com MC, do sul com AC e do Poente com Caminho Público, conforme localização melhor definida no levantamento topográfico, junto a fls. 9, devidamente delimitado a vermelho. Neste prédio construíram uma arrecadação e uma garagem, e ocuparam a restante área da parcela, na parte que não está ocupada com as construções. O que fazem de forma continua, pública e sem oposição de quem quer que seja. Os descritos actos materiais que a demandante e o falecido marido, e posteriormente, o filho de ambos, o igualmente demandante, CA (art.º 1255 do C.C.), que por óbito de MA, continuou a exercer sobre a coisa, correspondem ao corpus da posse, equivalente ao direito de propriedade sobre a parcela de terreno. Também resulta provado que, praticaram todos os actos com a convicção de exercerem um direito sobre coisa sua e, portanto, com a convicção de serem os donos/proprietários do prédio rústico em causa. Por outro lado, não há dúvidas relativamente ao facto de a posse ser pública e pacífica. Sendo uma posse pública porque sempre foi exercida, de forma continuada e ao longo dos anos, à vista do público em geral e de modo a poder ser conhecida pelos interessados (art.º 1262 do C.C.), nomeadamente os demandados. E é uma posse pacífica porque foi adquirida sem qualquer violência; nomeadamente, pela forma como adquiriram o prédio, negócio verbal, sem qualquer coação física ou moral, e sem qualquer outro tipo de violência (art.º 1261 do C.C.). Está em causa, portanto, uma posse que, sendo pública e pacífica, é suscetível de facultar ao possuidor a aquisição do direito por usucapião (art.º 1287 do C.C.). Quer isto dizer que, os demandantes, há mais de 20 anos, que tratam daquela parcela do prédio rústico, convictos que o fazem por terem adquirido esse direito. Acresce que nada na lei permite negar ao possuidor de parcela inferior à unidade de cultura o direito potestativo de aquisição por usucapião, atendendo a fórmula constante do art.º 1287 do C.C., não autorizando interpretação nesse sentido o disposto no art.º 1376 do C.C. Efetivamente, há que ter presente que a usucapião é uma forma de aquisição originária do direito de propriedade, tornando irrelevantes eventuais vícios, de natureza formal ou substancial precedentes, atinentes à alienação ou transferência da coisa para o seu novo titular. Assim o entende o Prof. A. Varela (vide nota 6 do comentário ao art.º 1379, no C.C. anotado), quando escreve “Se, através de um negócio jurídico nulo (por falta de forma) se realizar um fracionamento ou troca contrários ao disposto nos art.ºs 1376.º e 13768 do C.C. se, na sequência disso, se constituírem as situações possessórias correspondentes, aqueles preceitos, não obviam a que estas situações se consolidem por usucapião, logo que se verifiquem todos os requisitos legais nesse sentido”, in neste sentido AC. do STJ de 6/4/2017, Proc. n.º 1578/11.9TBVNG.P1.S1, acessível na www.dgsi.pt. Por sua vez, os demandados procederam à anexação de 1/2 que pertenceu aos demandantes àquele 1/2 do qual já possuíam passando a serem proprietários da totalidade do prédio inscrito na matriz sob o art.º … da freguesia de Ceira. DECISÃO: Nos termos expostos, julga-se procedente a presente ação, declarando-se que: os demandantes, enquanto herdeiros universais do falecido MA, são os donos e legítimos possuidores do prédio rústico, sito no …, com a área de 172 m2, a confrontar do norte e do nascente com MC, do sul com AC e do poente com caminho público, omisso na matriz predial, o qual é extraído do prédio inscrito na matriz predial rústica, da freguesia de Ceira, sob o artigo …, estando descrito na conservatória do registo predial de Coimbra, sob o nº …, do qual se autonomizou, constituindo um prédio distinto e autónomo, por usucapião. Mais se reconhece que devem proceder à inscrição do referido prédio, até agora omisso na matriz rústica, bem como proceder à inscrição do mesmo na conservatória do registo predial, ordenando-se as necessárias rectificações na inscrição matricial e na Conservatória do registo Predial, referente ao prédio descrito sob o nº. …, e inscrito na matriz predial rústica da freguesia de Ceira, sob o artigo …, relativamente a sua área, à qual deverá ser abatida 172 m2; nos termos dos artigos 8°, 13° e 85 n°1, alínea e) e n°2 do Código de Registo Predial.
CUSTAS: São da responsabilidade dos demandantes, pelo que devem proceder ao pagamento da quantia de 35 (trinta e cinco euros) no prazo de 3 dias úteis, sob pena da aplicação da sobretaxa diária no valor de 10 (dez euros).
Notificada e proferida nos termos do art.º 60, n.º2 da L.J.P.
Coimbra, 26 fevereiro de 2019
A Juíza de Paz
(redigido pela signatária, art.º 131, n.º5 do C.P.C.)
(Margarida Simplício) |