Sentença de Julgado de Paz | |
Processo: | 390/2008-JP |
Relator: | ANTÓNIO CARREIRO |
Descritores: | DIREITOS E DEVERES DE CONDÓMINOS - NULIDADE OU ANULAÇÃO DAS DELIBERAÇÕES DA ASSEMBLEIA DE CONDÓMINOS - IRREGULARIDADE NA CONVOCAÇÃO FALTA DE “QUORUM” - VIOLAÇÃO DAS REGRAS DA PENALIZAÇÃO- PROPORCIONALIDADE NA COMPARTICIPAÇÃO NAS DESPESAS |
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Data da sentença: | 03/18/2009 |
Julgado de Paz de : | SEIXAL |
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Decisão Texto Integral: | Sentença (N.º 1, do art.º 26.º, da Lei n.º 78/2001, de 13 de Julho) Matéria: Direitos e deveres de condóminos (Alínea c), do n.º 1, do art.º 9.º, da Lei n.º 78/2001, de 13 de Julho) Objecto do litígio: Declaração de nulidade ou anulação das deliberações da Assembleia de Condóminos de 17-09-2008, por irregularidade na convocação, de falta de “quorum” e violação das regras do estabelecimento de penalização e da proporcionalidade na comparticipação nas despesas. Demandante: A Demandados: - 1 - B, 2 - C, 3 - D, 4 - E, 5 - F, 6 - G, 7 - H, 8 - I, 9 - J, 10 - K, 11 - L, 12- M e 13 - N Valor da acção: €: 1.692,50 Do requerimento Inicial A demandante, proprietária da fracção “L”, correspondente ao 1.º andar esquerdo, do prédio constituído em propriedade horizontal, sito na Cruz de Pau, Amora, vem requerer que se declarem nulas ou anuladas as deliberações tomadas em assembleia de condóminos, do mesmo prédio, realizada em 17-09-2008, por irregularidade da convocatória e falta de “quorum”, alegando também que não pode a assembleia decidir sobre a contratação de mandatário para interposição de acções, por desnecessidade uma vez que o administrador representa o condomínio em juízo, e que apenas tem que pagar em função das despesas que lhe sejam apresentadas e não em qualquer outro elemento. Pedido “Nestes termos, e nos demais de direito que doutamente forem supridos por V. Ex.a deve a presente acção ser considerada procedente por provada e por via dela serem declaradas nulas ou anuláveis (leia-se anuladas dada a incorrecção manifesta) todas as deliberações tomadas no dia 17-09-2008, com todas as consequências legais, sendo o Condomínio na Cruz de Pau condenado no pagamento de todas as custas e despesas legais a que der direito.” Contestação Os demandados não contestaram. Tramitação A demandante declarou não pretender recorrer ao Serviço de Mediação. Foi proferido despacho de aperfeiçoamento do requerimento inicial, uma vez que a acção foi interposta contra o condomínio e não contra os condóminos que aprovaram a deliberação/deliberações. Após aperfeiçoamento e citação dos demandados, agendou-se audiência de julgamento para o dia 19-02-2009, pelas 10h00, que se realizou, conforme acta de fls 144 e 145. O juiz de paz ordenou a junção de documentos a ambas as partes e marcou a continuação da audiência de julgamento, para leitura de sentença, para o dia 18-03-2009. Factos provados Com base nos documentos, declarações das partes e testemunhas, dão-se como provados os seguintes factos: 1 – O prédio sito na Cruz de Pau, Amora, está constituído em propriedade horizontal e descrito sob o n.º x, na Conservatória do Registo Predial da freguesia da Amora, Seixal. 2 – A demandante é proprietária da fracção “L” e os demandados são proprietários das fracções “E,C,H,F,J,M,N,R,T,V,D,P”, respectivamente (pela ordem da identificação acima). 3 – Por aviso convocatório, introduzido na caixa de correio de cada condómino, foi convocada uma assembleia de condóminos, do condomínio em causa, para o dia 17-09-2009. 4 – Esta Assembleia de Condóminos teve lugar no “hall” de entrada do prédio, no dia 17-09-2009, pelas 21h00, com a seguinte ordem de trabalhos: - “decisão para elaboração de expediente para tribunal dos condóminos em falta com as quotas ao condomínio”; - “propostas efectuadas pelos condóminos”. 5 – Nesta Assembleia de Condóminos estiveram presentes representantes das fracções indicadas no ponto 2 acima, sendo que os representantes das fracções D e P assinaram a acta, muito embora não tenham estado presentes. 6 – Foi deliberado por unanimidade (por acordo) “elaborar o processo para tribunal contra os condóminos em falta”, descrevendo-se a seguir, na acta, os condóminos que devem por fracção e por meses em falta e quantitativo, no qual se inclui a fracção da demandante, com o débito de 465,00 €, relativos à quota parte de Janeiro a Dezembro de 2006 (12,50 € mensais) e de Janeiro de 2007 a Setembro de 2008 (15,00€ mensais), e concluindo que “ficou acordado que todas as despesas efectuadas com o condomínio serão suportadas com os condóminos em falta com os advogados, solicitadores e expediente.” 7 – A demandante foi notificada da acta desta Assembleia de Condóminos, por carta registada, enviada para a morada da fracção e que recebeu em 01-10-2008. 8 – A anterior administração do condomínio, a sociedade O, em 14-02-2007, enviou uma carta para a demandante para a sua morada em Casal de Santo António, em Paio Pires. 9 – Por não receber a correspondência do condomínio a demandante pediu a reexpedição das cartas que lhe fossem endereçadas para a sua fracção, facto que levou a que recebesse a carta registada com a acta da assembleia de 17-09-2008. 10 – A demandante interpôs a presente acção em 02-12-2008. 11 – A demandante efectuou o pagamento das suas prestações mensais de condomínio até Dezembro de 2005. 12 – Em acta de 24-06-2000, estabeleceu-se uma quota mensal de 2 500$00 para todos os condóminos, não obstante haver permilagens diferentes para diversas fracções. 13 – Esta quota veio a ser aumentada para 15,00€ mensais, em deliberação de 13-02-2007. 14 - Desde 1991 que os condóminos pagam quotas iguais, não obstante as diferentes permilagens. 15 - As administrações realizaram assembleias e aprovaram as contas, no que é relevante, de 2006, 2007, 2008 e 2009. Factos não provados - Não provado que a demandante tenha informado a administração do condomínio do local para o qual deveria ser remetida a correspondência relativa a este. Fundamentação A demandante, na sua qualidade de condómina do prédio sito na Cruz de Pau, Amora, constituído em propriedade horizontal, vem requerer que sejam “declaradas nulas ou anuláveis (leia-se anuladas dada a incorrecção manifesta) todas as deliberações tomadas no dia 17-09-2008, com todas as consequências legais”. Após despacho de aperfeiçoamento, intentou a acção contra os condóminos que assinaram a acta desta assembleia de condóminos, embora dois dos que assinaram a acta não sejam mencionados nesta como presentes. Alegou irregularidade da convocação da assembleia por esta ter sido convocada por aviso convocatório distribuído nas caixas de correio dos condóminos, não tendo recebido o que lhe foi dirigido, a possível falta de “quórum”, que é contra as deliberações tomadas, não concordando com a contratação de advogados ou solicitadores, que não sabe se deve o montante que lhe é atribuído como débito, por não lhe terem sido apresentadas as despesas e ser em função destas que tem de pagar e que já informou várias vezes o condomínio da sua residência para onde lhe deve ser remetida a correspondência. Referiu que já pagou 1 781,17 € desde que é condómina e apresentou os comprovativos. Os demandados não delegaram no administrador actual a sua defesa e não contestaram mas compareceram à audiência de julgamento. Realizada a audiência deram-se como provados e não provados os factos constantes acima das rubricas do mesmo nome. Tais factos assentaram essencialmente nos documentos e declarações das partes, tendo as testemunhas, que foram imparciais, apenas confirmado algumas afirmações das partes e esclarecido procedimentos sem influência para a decisão. O actual administrador do prédio referiu as dificuldades pelo facto da anterior administradora do prédio “O” não ter prestado contas (o Julgado conhece por outros processos que a O se retirou do mercado de forma anormal e com prejuízos para administrados) e que os dois condóminos estiveram na assembleia mas chegaram mais tarde e não foi vertida a situação na acta. Importa explicar que não se deu como provado que a demandante tenha informado a administração do condomínio da morada para a qual lhe deve ser enviada a correspondência deste, porquanto, nos termos do n.º 1, do art.º 342.º do Código Civil, é sobre si própria que impende a obrigação de fazer esta prova, não sendo concludente a carta enviada pela O, uma vez que a própria demandante pediu a reexpedição da correspondência da sua fracção para a sua morada, exactamente por a arrendatária encaminhar os documentos recebidos para uma familiar que depois lhos entregava. Nos documentos também se têm em conta as actas juntas pelos demandados em consequência de despacho do juiz de paz. A demandante pronunciou-se sobre elas e invocou a nulidade (por irregularidade de convocação e de falta de “quorum” e também em algumas por estabelecerem mensalidades iguais sem atender à permilagem) mas não há vício de nulidade (na acepção técnico-jurídica da palavra) o que seria passível de conhecer como questão prejudicial, podendo existir vício de anulabilidade que já não é passível de ser conhecido nesta acção, mas em acção própria para o efeito e se o puderem ser, atentos os prazos que a lei determina para a interposição destas acções, como adiante se verá. Deste modo não tendo sido impugnadas as mesmas são válidas. A questão a resolver é a de saber se as deliberações tomadas na Assembleia de Condóminos de 17-09-2008, devem ou não ser declaradas nulas ou anuladas por irregularidade de convocação, falta de quórum ou falta de competência da assembleia para dispor sobre aqueles conteúdos, e daí extraindo as consequências legais. Antes porém tem de ser analisado se os pressupostos processuais se verificam ou não, designadamente, no caso, se a acção foi ou não interposta contra as pessoas que o deve ser e se no prazo legal. Do direito Ilegitimidade A demandante interpôs a acção contra o Condomínio do prédio sito na Cruz de Pau, Amora. Como, nos termos do art.º 1433.º, do Código Civil e nomeadamente do seu n.º 6, as acções para impugnação de deliberações da Assembleia de Condóminos devem ser propostas contra quem aprovou as deliberações, podendo estes ser representados pelo administrador ou por outrem que a assembleia designe para o efeito, foi o requerimento inicial aperfeiçoado e a demandante propôs a acção contra os condóminos que aprovaram as deliberações – todos os que estiveram na Assembleia de Condóminos – e contra dois condóminos que assinaram a acta mas não estiveram presentes. Muito embora estes dois condóminos, M e N, respectivamente das fracções “D” e “P”, tenham manifestado a sua concordância ao assinarem a acta, os mesmos não estiveram presentes nem representados (pela prova produzida não se demonstrou que tenham chegado mais tarde e isso também não consta da acta) na assembleia, pelo que fora desta não podem exercer o seu direito de voto, porquanto este só pode ser exercido na assembleia e não fora dela. A atestá-lo está a situação excepcional, prevista nos n.ºs 5 a 9, do artigo 1432.º, do Código Civil. Estes dois condóminos não podem ter-se como tendo votado a favor das deliberações e por isso são parte ilegítima nesta acção, pelo que são absolvidos da instância. Caducidade do direito de acção Nos termos do art.º 1433.º, do Código Civil, “as deliberações contrárias à lei ou a regulamentos anteriormente aprovados são anuláveis a requerimento de qualquer condómino que as não tenha aprovado”. A seguir o mesmo artigo estabelece no n.º 2, que os condóminos podem exigir, no prazo de dez dias para os que tenham estado presentes e “da sua comunicação” para os ausentes, a convocação de uma assembleia extraordinária para revogação das deliberações inválidas ou ineficazes, a convocar no prazo de 20 dias. Dispõe depois o n.º 3 deste mesmo artigo que, no prazo de trinta dias contado nos mesmos termos do que se estabelece no n.º 2, isto é contados da deliberação para os presentes e da comunicação para os ausentes, pode qualquer condómino sujeitar a deliberação a um centro de arbitragem. Sobre o direito de propor acção de anulação estabelece-se no n.º 4 que este caduca decorridos que sejam sessenta dias sobre a deliberação. Embora este número deste artigo tenha uma redacção que não deixa dúvidas sobre a forma de contagem deste prazo, há na doutrina e jurisprudência, divergências sobre a correcta contagem do mesmo. O argumento é que o legislador terá dito algo que não queria dizer, por na redacção apenas constar deliberação e não se autonomizar deliberação e comunicação da deliberação. O que leva a esta suspeita (que o legislador terá dito menos do que o pretendido) é que na lógica do artigo se deverá ter presente a forma de contagem do prazo dos dois números anteriores, reconhecendo os autores desta tese que há efectivamente um favorecimento dos condóminos que estiveram ausentes. Com o devido respeito pelas diversas posições adoptadas, não se afigura que o legislador tenha omitido o que quer que fosse na redacção deste número 4 do artigo e bem intencionalmente aí se refere apenas deliberação e não comunicação da deliberação. São concedidas no artigo três possibilidades aos condóminos de agir contra as deliberações: a de convocar uma nova assembleia, a do recurso à arbitragem e a da acção de anulação. Os três prazos estão articulados tendo em conta a enorme necessidade de estabilizar as relações condominiais, com certeza e segurança jurídicas, e estão em crescendo, 10 dias para requerer a nova assembleia, 20 para a convocação desta, trinta para o recurso à arbitragem e 60 para a acção de anulação. É claro que o legislador parte do princípio que o interesse do condomínio é o de comunicar de imediato as deliberações (e até estabeleceu o prazo de 30 dias no n.º 6, do art.º 1432.º do CC) porque essa é a regra da boa gestão, mas pode haver uma demora de mais ou menos dias e neste caso atende ao interesse dos que faltaram. Contudo se o legislador deixasse em aberto o prazo de caducidade do direito, podendo os condóminos desinteressar-se por completo da gestão do condomínio que se nunca lhes fosse comunicada a deliberação sempre a poderiam impugnar, estar-se-ia a introduzir uma regra de total instabilidade que impediria uma boa gestão do condomínio e poderia até por em causa os alicerces da propriedade horizontal por tornar impraticável a sua gestão. O exemplo é que nesta acção foram juntas actas (os demandados juntaram o livro de actas) que a demandante aproveitou para impugnar – desde 1991 – porque, alega, não esteve presente e não lhe foram comunicadas. Vários anos depois haveria condóminos a não pagar as obras do telhado ou outras porquanto conseguiriam que se declarassem anuladas as deliberações por um qualquer vício que gere anulabilidade. O que resulta da coerência, da sistemática, do elemento histórico (o legislador com o DL 267/94, de 25 de Outubro, retirou deste número 4 precisamente a expressão “comunicação da deliberação” para deixar apenas “da deliberação”) e lógico é que a redacção está correcta e perfeita e o que aí se estabelece é que o condómino tem que se interessar pelo seu condomínio e manter-se ao corrente da sua gestão, impendendo sobre ele também o dever de contribuir para o seu bom funcionamento e organização, não sendo beneficiado pela sua inércia e desinteresse, caducando o seu direito de intentar a acção de anulação sessenta dias após a assembleia ter deliberado, que é um prazo curto mas razoável para, mesmo que nada lhe tenha sido comunicado, se ter por si próprio inteirado do que se deliberou e aceitar ou impugnar. Ou seja a contagem do prazo deste n.º 4 é a que resulta da leitura directa da norma. Conta-se desde que foi tomada a deliberação. Deve ainda acrescentar-se que se o vício foi o de omissão da convocação ou outros que firam as deliberações de nulidade, não estão as acções sujeitas a este prazo, uma vez que nos termos gerais (art.º 286.º do Código Civil) são invocáveis a todo o tempo. Por outro lado, também o condómino ausente nunca fica prejudicado, podendo a partir da comunicação pedir a convocação de assembleia extraordinária e impugnar a deliberação desta em 20 dias ou recorrer à arbitragem que já é tribunal e pretere a utilização de outro tribunal. Sobre a matéria, entre outros, poderá consultar-se o Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça, processo n.º 05B018, in www.dgsi.pt. No caso vertente a demandante recebeu, em 01 de Outubro de 2008, a comunicação das deliberações tomadas na Assembleia de Condóminos, de 17-09-2008, e interpôs a presente acção em 02 de Dezembro de 2008. De acordo com o exposto e que resulta com clareza da lei, o prazo para a interposição da acção iniciou-se em 18-09-2008 e terminou em 16-11-2008, Domingo, pelo que a acção poderia ter sido interposta até 17-11-2008, tendo o direito da demandante de impugnar as deliberações pelo vício de anulabilidade caducado nesta data, pelo que não se verificando vícios de nulidade, que é invocável a todo o tempo, a acção improcederá. Irregularidade da convocatória A Assembleia de Condóminos, realizada a 17-09-2009, foi convocada por aviso introduzido na caixa de correio de cada condómino. Conforme estabelecido no n.º 1, do art.º 1432.º do Código Civil “a assembleia é convocada por meio de carta registada, enviada com 10 dias de antecedência, ou mediante aviso convocatório feito com a mesma antecedência, desde que haja recibo de recepção assinado pelos condóminos.” A irregularidade da convocação tanto pode determinar o vício de nulidade, que corresponde à falta de convocação, por não se respeitar a determinação legal que obriga à convocação, como pode afectar as deliberações do vício de anulabilidade quando se trate de um vício menor, como a falta de convocação de um condómino ou, como é o caso presente, se não tenham observado os formalismos legais descritos neste último artigo citado. Uma vez que a convocação da Assembleia não respeitou um dos requisitos previstos quer da exigência de recibo assinado pelos condóminos quer do envio de carta registada, em relação à demandante (e também em relação aos outros condóminos, o que aqui não está a ser analisado) as deliberações aprovadas são anuláveis. Cabe sublinhar que a demandante não provou que tivesse comunicado por escrito ao administrador a morada para a qual deveriam ser remetidas as convocatórias e toda a correspondência do condomínio (o que lhe competia a si demonstrar como já se disse acima). Falta de “quorum” A Assembleia deliberou em primeira convocatória com 480 por mil do capital investido, o que não é permitido pelo n.º 3, do art.º 1432.º, do Código Civil, pelo que também esta irregularidade conduz à anulabilidade das deliberações. Como já se referiu acima, os dois condóminos que assinaram a acta não podem ser contados para a verificação de quórum e para a aprovação das deliberações. A lei até permite deliberações com capital representado bastante inferior mas tem de respeitar-se o período legal de reflexão dos condóminos, de uma semana, para a realização da assembleia, sendo também irregular, o que é uso fazer-se, de convocar a assembleia para meia hora ou uma hora depois se não comparecer o número de condóminos suficientes para que se possa deliberar (“quorum”). É certo que este procedimento é adoptado em muitas associações mas estas não têm um regime legal imposto e são livres de o poder fazer, enquanto em relação à propriedade horizontal o legislador impôs este limite à convocação, a fim de possibilitar a presença de outros condóminos. Poderes da Assembleia Referiu a demandante que não pode a assembleia decidir sobre a contratação de mandatário para interposição de acções, por desnecessidade uma vez que o administrador representa o condomínio em juízo, e que apenas tem que pagar em função das despesas que lhe sejam apresentadas e não em qualquer outro elemento. A assembleia do condomínio tem poder para deliberar sobre todas as matérias que digam respeito às partes comuns do condomínio. Pode deliberar por maioria dos votos representativos do capital investido (que nem sempre corresponde à permilagem, devido aos arredondamentos – n.º 2, do art.º 1430.º do Código Civil – uma vez que cada condómino tem tantos votos quantas as unidades inteiras que couberem na sua permilagem, o que não é relevante neste condomínio por todos os condóminos terem permilagens em unidades inteiras), ou em segunda convocatória desde que esteja presente um quarto do capital investido. Há algumas matérias, e nestas incluem-se todas as que alterem o título constitutivo da propriedade horizontal, que obrigam a que as deliberações sejam tomadas por unanimidade, prevendo-se que, neste caso, a assembleia reúna com pelo menos dois terços do capital investido e que os outros condóminos sejam informados em 30 dias, por carta registada com aviso de recepção, e se pronunciem em noventa dias, valendo o seu silêncio como concordância. A contratação de advogado para interposição de acções contra condóminos que não respeitem as deliberações do condomínio ou para aconselhamento técnico ou representação, é um acto de gestão corrente que não levanta qualquer questão de competência da assembleia. Esta pode fazê-lo sempre que o entenda necessário. O administrador representa o condomínio em juízo quer nas matérias da sua competência própria, uma das quais é a de receber as quotas partes de cada condómino nas despesas, quer quando a assembleia lhe confira poderes de representação, o que por exemplo podia ter feito nesta acção. Tal representação não impede e em alguns casos até obrigará – sempre que seja obrigatória a constituição de advogado - à constituição de advogado. Tem também competência a assembleia para deliberar sobre os débitos dos condóminos e as acções a tomar para os cobrar, como também tem competência para estabelecer os montantes devidos em função das despesas. Ao contrário do que a demandante sustenta o administrador não tem de lhe prestar contas individualmente mas tem de as prestar ao colectivo dos condóminos e à assembleia de condóminos que mediante orçamento anual fixa as despesas previsíveis e, em face da permilagem de cada um se não houver disposição em contrário como legalmente permitido, também o montante que cada um deve suportar para fazer face aos encargos, despesas e serviços de interesse comum do condomínio. Neste quadro as deliberações não ofendem quaisquer normas legais pelo que não haverá qualquer vício. Questão diferente é a de saber se a deliberação que impõe que os condóminos em falta suportem eles próprios os custos com as acções contra eles interpostas. Em princípio tais despesas são de todo o condomínio e a suportar nos termos das quotas-partes de cada um. Contudo, o art.º 1434.º, do Código Civil, permite à assembleia estabelecer penas pecuniárias para a inobservância das normas legais e das decisões da assembleia e do administrador. A fixação destes custos – das despesas de processo com advogado ou solicitador e expediente para cobrança de débitos dos condóminos - pode entender-se como fixação de pena pecuniária prevista neste artigo, sendo legal desde que não ultrapasse o limite previsto no n.º 2 deste mesmo artigo e que é a quarta parte do rendimento colectável anual da fracção do infractor (deve ter-se em atenção que actualmente este limite deve aferir-se em função da aplicação da taxa do Imposto Municipal sobre Prédios Urbanos – art.º 112.º do CIMI - ao valor patrimonial tributário da respectiva fracção art.º 7.º do CIMI), pelo que esta deliberação, tendo sido estabelecida de forma geral e abstracta, isto é abrangendo todos os condóminos que estiverem em falta, e não para um caso em concreto, e não se demonstrando que ultrapassa este limite, é legalmente permitida e não sofre de qualquer vício. Põe a demandante em causa que deva a importância de de 465,00 €, relativos à sua quota parte nas despesas, de Janeiro a Dezembro de 2006 (12,50 € mensais) e de Janeiro de 2007 a Setembro de 2008 (15,00€ mensais), referindo que não sabe de dívida alguma para com o condomínio, que já pagou 1781,17€, que foram referentes à sua comparticipação até Dezembro de 2005, conforme recibos que juntou, queixando-se que nenhum administrador lhe prestou contas e que só tem de pagar com base nas despesas. Aduziu, pronunciando-se sobre as actas juntas pelos demandados (desde 1991), três argumentos que se verificam todos ou alguns em relação às actas juntas: irregularidade na convocação, por aviso ou não ter sido convocada, como já se analisou acima, falta de “quorum”, como também já se analisou acima e repartição igual das despesas pelos condóminos (mensalidades iguais), que não teve em conta as permilagens de cada um, do que resulta prejuízo para a demandante. Sobre este último vício apontado, há que salientar o seguinte: Em primeiro lugar a demandante conformou-se e aceitou desde 1991 até 31 de Dezembro de 2005, a repartição das despesas feitas e pagou-as como demonstrou e se deu provado. A partir desta aceitação, seria manifesto abuso de direito, na modalidade de “venire contra factum proprio” (ir contra aquilo que já se aceitou, em tradução livre) da parte da demandante por agora em causa algo definitivamente aceite e consolidado, mesmo que vícios haja em relação à repartição das despesas. Tal significa que não pode já ser posta em causa a repartição de despesas feitas e por si próprias pagas e aceites. Em segundo lugar que nesta acção não se pode conhecer de eventuais vícios de anulabilidade de deliberações da assembleia não impugnadas no tempo devido, porquanto este vício de anulabilidade se sana pelo decurso do prazo de impugnação das deliberações. Em terceiro lugar, o condomínio efectivamente sempre estabeleceu mensalidades iguais para todos os condóminos desde 1991 (11/1/1991- 750$00), estabelecendo-se em 24-06-2000 a quantia de 2500$00 (depois 12,50 €) que vigorou até 13-02-2007, altura em que se deliberou aumentar a mensalidade para 15,00€ que ainda se mantém. Este procedimento não é o que supletivamente está previsto no n.º 1, do art.º 1424.º, do Código Civil, que dispõe que, salvo disposição em contrário, os encargos, despesas e serviços de interesse comum são pagos na proporção das permilagens de cada fracção. Esta norma não tem natureza imperativa dado que o legislador deixou a possibilidade de se estabelecer critério diferente, embora com algumas limitações. Esta regra pode ser afastada logo no título constitutivo da propriedade horizontal ou poderá sê-lo em assembleia mas com a concordância dos condóminos afectados. Contudo não sendo norma elevada à categoria de interesse e ordem pública não gera a sua violação o vício de nulidade mas tão-somente de anulabilidade, pelo que deste vício também não se poderá conhecer nesta acção. É de realçar, porém, que as sucessivas deliberações sobre a matéria foram aceites por todos os condóminos, não tendo sido as mesmas impugnadas; note-se que nenhuma deliberação além das da assembleia de 17-09-2008, objecto da presente acção, foram impugnadas. Em resumo A presente acção só pode conhecer da legalidade das deliberações e como foi interposta fora do prazo previsto no n.º 4, do art.º 1433.º, do Código Civil, este conhecimento tem de ficar restrito ao eventual vício de nulidade (às violações de normas imperativas e de ordem pública) de que as mesmas padeçam, por este vício ser invocável a todo o tempo, já que em relação ao vício de anulabilidade caducou o direito da demandante como se expôs acima. De todo o exposto conclui-se que as deliberações aprovadas na Assembleia de Condóminos de 17-09-2008 não sofrem do vício de nulidade, enfermando de vícios de anulabilidade mas que já se sanaram pelo decurso do tempo, pelo que a acção improcede na totalidade por não provada. Decisão O Julgado de Paz é competente, as partes têm personalidade e capacidade judiciárias e são legítimas, com excepção das demandadas M e N, e não se verificam quaisquer outras excepções ou nulidades de que cumpra conhecer. Em face do exposto: 1 – Absolvo as demandadas M e N da instância por serem partes ilegítimas, uma vez que não votaram as deliberações impugnadas. 2 – Absolvo os restantes demandados do pedido por ter caducado o direito de impugnação da demandante e as deliberações não sofrerem de qualquer vício de nulidade (em sentido estricto). Custas Nos termos dos n.ºs 8.º e 10.º, da Portaria n.º 1456/2001, de 28 de Dezembro, a demandante é declarada parte vencida, pelo que fica condenada no pagamento de 35,00 € (setenta euros) relativos às custas, a pagar no Julgado de Paz, no prazo de três dias úteis, a contar da data da notificação para o efeito, sob pena do pagamento de uma sobretaxa diária de 10,00 € (dez euros) por cada dia de atraso. Esta sentença foi proferida e notificada às partes presentes, nos termos do art.º 60.º, n.º 2, da Lei n.º 78/2001, de 13 de Julho, ficando as mesmas cientes de tudo quanto antecede. Julgado de Paz do Seixal, em 18-03-2009 O Juiz de Paz António Carreiro |