Sentença de Julgado de Paz
Processo: 48/2012-JP
Relator: JOSÉ HENRIQUE DE ALMEIDA
Descritores: CUMPRIMENTO DE OBRIGAÇÕES - PRESTAÇÃO DE SERVIÇOS; CONFISSÃO DOS FACTOS; OBRIGAÇÃO NÃO VENCIDA
Data da sentença: 07/09/2012
Julgado de Paz de : CASTRO VERDE
Decisão Texto Integral:
SENTENÇA
(26.º/1 da Lei n.º 78/2001, de 13 de Julho)


Matéria: Cumprimento de obrigações (artigo 9.º/1/alínea a) da Lei dos Julgados de Paz (LJP).
Valor da ação: 4 385.60 € (quatro mil trezentos e oitenta e cinco euros e sessenta cêntimos).
Demandante: OM, Lda.
Gerente: OJFCM.
Demandado: M., Lda.
Gerente: ABG.
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Objeto do litígio:
A Demandante instaurou a presente ação declarativa tendo, para o efeito, alegado os seguintes factos:
1 – A Demandante é uma empresa de contabilidade e gestão (doc 1) representada por OM;
2 – Em 1995 celebrou um contrato verbal com a Demandada M., Lda. (doc 2), no qual se comprometia a efetuar a contabilidade organizada desta, pelo valor de 100,00 € mensais, acrescidos de IVA à taxa em vigor, a pagar trimestralmente no mês seguinte a cada trimestre.
3 – Nunca se tendo verificado esta periodicidade nos pagamentos, mas tendo sido feitos vários acordos de pagamento que a Demandada não cumpria, efetuando pagamentos irregulares.
4 – Tendo a Demandada cessado a atividade em IVA em junho de 2007, foi emitida e entregue fatura de dívida até ao momento, no valor de 4610,10 € (quatro mil seiscentos e dez euros e dez cêntimos), com IVA incluído, correspondente à dívida do ano de 2003, no valor de € 1200 (mil e duzentos euros), parte do ano de 2005, no valor de 900 € (novecentos euros), o ano de 2006, no valor de 1080 € (mil e oitenta euros) e o ano de 2007, no valor de 630 € (seiscentos e trinta euros), correspondente ao 1.º e 2.º trimestres e fecho de contas do ano de 2007.
5 – A Demandada pagou posteriormente a quantia de 1110,10 € (mil cento e dez euros e dez cêntimos), ficando em dívida o restante, ou seja, 3500,00 € (três mil e quinhentos euros).
6 – Ao valor referido de 3500,00 € acresce o valor de fiscalização e substituição de declarações de IVA e IRC de 2007, o fecho do ano de 2008, 2009 e 2010, no valor total de 720,00 € mais IVA, a faturar na data do pagamento e comunicado à Demandada, verbalmente e através de cartas registadas com aviso de receção, sendo a última enviada em 28-11-2011 (doc 3).
7 – Todos estes pagamentos se encontram por liquidar.
8 – Até à presente data a Demandada nada disse acerca dos pagamentos em dívida, não tendo efetuado qualquer contacto,
9 – A Demandante não vê outra solução senão a de recorrer a este Julgado de Paz.
10 – Assim, é a Demandada devedora da quantia total de 4385,60 € (quatro mil trezentos e oitenta e cinco euros e sessenta cêntimos), com IVA incluído, à Demandante, acrescida de juros à taxa legal até ao seu efetivo pagamento.
PEDIDO:
Deve a Demandada pagar à Demandante o valor de 4385,60 (quatro mil trezentos e oitenta e cinco euros e sessenta cêntimos), com IVA incluído, à Demandante, acrescida de juros à taxa legal até ao seu efetivo pagamento.
E juntou os documentos de fls. 4 a 12, que se dão por reproduzidos.
Relatório:
O Demandado foi devidamente citado, não tendo apresentado contestação.
O Demandado esteve presente na sessão de pré-mediação e na primeira sessão da audiência de julgamento, mas faltou à segunda sessão, não tendo apresentado qualquer justificação.
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Cumpre apreciar e decidir:
O Julgado de Paz é competente em razão do objeto, do valor, da matéria e do território.
As partes têm personalidade e capacidade judiciária e são legítimas.
Não há excepções dilatórias ou peremptórias, nulidades ou incidentes processuais.
Fundamentação de facto:
Atento o disposto no artigo 58.º/2 da Lei n.º 78/2001, de 13-07, julgo confessados os factos alegados pelo Demandante.
Para fixação da matéria de facto dada como provada concorreram os documentos juntos aos autos e o facto de, apesar de devidamente citado, o Demandado não ter contestado e, embora tendo comparecido na primeira sessão da audiência de julgamento, não ter comparecido na segunda sessão - apesar de devidamente notificado para o efeito – nem ter justificado a respetiva falta, considerando-se, por isso, confessados os factos articulados pela Demandante, ao abrigo do disposto no artigo 58.º/2 da Lei n.º 78/2001, de 13 de Julho.
Fundamentação de Direito:
Dispõe o artigo 484.º/3 do Código de Processo Civil, aplicável por força do artigo 63.º da Lei n.º 78/2001, de 13-07 que, se a resolução da causa revestir manifesta simplicidade, a sentença pode limitar-se à parte decisória, precedida da necessária identificação das partes e da fundamentação sumária do julgado.
A factualidade dada como provada dá conta da existência de um contrato verbal de prestação de serviços de contabilidade celebrado entre a Demandante e a Demandada em 1995, mediante o qual aquela se comprometia a realizar a contabilidade organizada desta, devendo esta pagar, como contrapartida, a quantia de 100,00 € mensais.
O objecto da Demandante constante de certidão do registo comercial junta aos autos consiste em “serviços de contabilidade, fiscalidade, gestão e organização de empresas, projetos e estudos e a prática de outros serviços”.
O objeto da Demandada, constante de certidão do registo comercial também junta aos autos, “consiste no comércio de carnes, peixe e enchidos”.
Isto é, ambas as partes são sociedades comerciais e, por conseguinte, comerciantes (artigo 13.º do Código Comercial). Sendo ambas as partes comerciantes há que ponderar a aplicação dos artigos do Código Comercial, designadamente os seus artigos 2.º e 3.º.
Diz a presente acção respeito ao incumprimento de obrigações pecuniárias emergentes de um contrato de prestação de serviços entre comerciantes.
O contrato de prestação de serviços encontra-se previsto no artigo 1154.º do Código Civil, aplicável por força do artigo 3.º do Código Comercial, como sendo “aquele em que uma das partes se obriga a proporcionar à outra certo resultado do seu trabalho intelectual ou manual, com ou sem retribuição.”, sendo-lhe extensivas, com as necessárias adaptações, as disposições sobre o mandato (artigo 1156.º do Código Civil).
O mandante (a Demandada na presente acção) é obrigado (artigo 1167.º do Código Civil):
a) a fornecer ao mandatário os meios necessários à execução do mandato, se outra coisa não foi convencionada;
b) a pagar-lhe a retribuição que ao caso competir, e fazer-lhe provisão por conta dela segundo os usos;
c) a reembolsar o mandatário das despesas feitas que este fundadamente tenha considerado indispensáveis, com juros legais desde que foram efectuadas;
d) a indemnizá-lo do prejuízo sofrido em consequência do mandato, ainda que o mandante tenha procedido sem culpa.”
Conforme acima se refere, estas disposições são aplicáveis ao contrato de prestação de serviços. Ora, conforme ficou provado, a Demandada solicitou determinados serviços à Demandante, tendo esta prestado esses serviços, os quais deram origem à fatura n.º 1757, de 30-06-2007, no valor de 4610,10 €, a qual respeita aos anos de 2003, 2005, 2006 e 1.º e 2.º trimestres de 2007. Tendo a Demandada pago a quantia de 1110,10 €, falta pagar a quantia de 3500,00 €.
A Demandada não pagou a referida factura nem na data do seu vencimento, nem posteriormente, apesar de devidamente interpelada. Diz o artigo 798.º do Código Civil que “o devedor que falta culposamente ao cumprimento da obrigação torna-se responsável pelo prejuízo que causa ao credor.” Sabendo que a Demandada não pagou o montante peticionado é de presumir que a sua conduta é culposa uma vez que não demonstrou o contrário (artigo 799.º do Código Civil). É, pois, devida a quantia de 3500,00 €, peticionada pela Demandante.
A Demandante prestou também idênticos serviços respeitantes aos anos de 2008, 2009 e 2010. Porém, como ainda não foram faturados, também ainda não se venceu a respetiva obrigação de pagamento. Isto não significa que tais serviços e a inerente obrigação de pagamento não sejam tidos em conta na condenação. Neste caso é possível condenar ao abrigo do disposto nos artigos 472.º/1, 661.º/2 e 662.º/2/alínea a) do Código de Processo Civil, aplicáveis por força do artigo 63.º da Lei n.º 78/2001, de 13-07. O apuramento da quantia em causa será feito assim que a obrigação se vencer, conforme resulta do artigo 662.º/2/alínea a) citado.
Quanto aos juros peticionados:
Havendo um retardamento da prestação por causa imputável ao devedor, constitui-se este em mora e, consequentemente, na obrigação de reparar os danos causados ao credor – Demandante - (artigo 804.º do Código Civil). O devedor só fica constituído em mora depois de ter sido judicial ou extrajudicialmente interpelado para cumprir (artigo 805.º/1 do Código Civil). Tratando-se de obrigações pecuniárias a indemnização corresponde aos juros a contar do dia da constituição em mora (artigo 806.º/1 do Código Civil). Os juros devidos são os juros legais (artigo 806.º/2 do Código Civil). No presente caso, a Demandante limitou-se a peticionar “juros à taxa legal até ao seu efetivo pagamento”, não indicando qualquer quantitativo. Assim, no que se refere à quantia de € 3500,00 devem ser considerados os juros vencidos desde a citação e até integral pagamento, sendo que a citação ocorreu em 13-03-2012. São, pois, devidos juros desde essa data e até efetivo e integral pagamento, os quais devem ser calculados tendo em conta o disposto no parágrafo 3.º do artigo 102.º do Código Comercial e no aviso n.º 692/2012, de 17-01, importando, até à data na quantia de € 90,52.
No que se refere à quantia restante em dívida, uma vez que a obrigação ainda não se venceu, não é possível apurar quaisquer juros.
Dispositivo:
Pelo exposto, julgo a acção totalmente procedente e, em consequência, condeno a Demandada no pagamento à Demandante:
- da quantia de € 3500,00 (três mil e quinhentos euros);
- dos juros já vencidos relativos a esta quantia, no montante de € 90,52, bem como dos que se vencerem desde a presente data e até efetivo e integral pagamento;
- da quantia correspondente aos serviços de contabilidade relativos aos anos de 2008, 2009 e 2010, a apurar na data do respetivo vencimento, bem como dos juros que se vencerem até efetivo e integral pagamento.
Custas:
Condeno a Demandada no pagamento da totalidade das custas. Tendo a Demandada efectuado o pagamento da parcela de 35,00 € deve pagar a segunda parcela de 35,00 € num dos três dias úteis imediatamente subsequentes ao do conhecimento desta sentença, sob pena da aplicação e liquidação de uma sobretaxa de 10,00 € (dez euros) por cada dia de atraso no efetivo cumprimento dessa obrigação (artigos 8.º e 10.º da Portaria n.º 1456/2001, de 28 de Dezembro, alterada pela Portaria n.º 209/2005, de 24 de Fevereiro). O pagamento deverá ser efetuado preferencialmente por depósito a favor do Gabinete para a Resolução Alternativa de Litígios (GRAL) na conta bancária n.º XXXX ou através do NIB XXXX, devendo o comprovativo do mesmo ser remetido a este Julgado de Paz, ou ainda no próprio Julgado de Paz (em dinheiro ou através de multibanco).
Cumpra-se o disposto no n.º 9 da mencionada Portaria em relação à Demandante.
Registe.
Texto processado informaticamente – artigo 18.º da Lei n.º 78/2001, de 13-07.
O Juiz de Paz
José de Almeida