Sentença de Julgado de Paz | |
Processo: | 68/2016-JP |
Relator: | IRIA PINTO |
Descritores: | RESPONSABILIDADE CIVIL - ACIDENTE DE VIAÇÃO - DÚVIDA |
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Data da sentença: | 07/05/2016 |
Julgado de Paz de : | TROFA |
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Decisão Texto Integral: | SentençaRelatório O demandante X, melhor identificado a fls. 3, intentou, em 11/4/2016, contra a demandada X, actualmente designada X, melhor identificada a fls. 3, ação declarativa relativa a responsabilidade civil, formulando o seguinte pedido: - Ser a demandada condenada no pagamento da quantia de €1.272,12, sendo €1.072,12 pelo valor de reparação do veículo AI, no pagamento da quantia de €200,00 a título de danos por privação do uso, além do pagamento de juros vincendos sobre a quantia indemnizatória à taxa de 4% desde a citação até integral pagamento, além de custas. Tendo, para tanto, alegado os factos constantes do requerimento inicial, de folhas 3 a 9 dos autos, que aqui se dá por integralmente reproduzido. Juntou 3 (três) documentos. * O demandante declarou prescindir da realização de sessão de pré-mediação (fls. 3). * Regularmente citada a demandada (fls. 26), apresentou contestação, de folhas 30 a 32, que se dá por integralmente reproduzida, impugnando os factos constantes do requerimento inicial e peticionando a absolvição da demandada. Juntou 1 (um) documento. * Cumpre apreciar e decidir O Julgado de Paz é competente, as partes têm personalidade e capacidade judiciárias e são legítimas e não se verificam quaisquer outras exceções ou nulidades de que cumpra conhecer. Fixo à causa o valor de €1.272,12 (mil duzentos e setenta e dois euros e doze cêntimos). Fundamentação da Matéria de Facto Factos provados Com interesse para a decisão da causa ficou provado que: 1 – No dia 28 de julho de 2015, na Rua da Igreja, em Muro, concelho da Trofa, ocorreu um acidente de viação entre o veículo ligeiro de mercadorias, matrícula xx-xx-xx, propriedade do demandante e conduzido por xxx e o veículo ligeiro de passageiros com a matrícula xx-xx-xx, propriedade de xxx e conduzido pelo próprio. 2 – À data do acidente, o proprietário do veículo TS havia transferido a sua responsabilidade civil automóvel para a demandada, através da apólice nº xxx. 3 – No dia e hora indicados, o veículo AI circulava no sentido ascendente da Rua da Igreja. 4 – A referida Rua da Igreja é inclinada e é composta por duas vias de trânsito de sentidos opostos. 5 – O veículo TS circulava também na Rua da igreja, mas no sentido descendente. 6 – No local do acidente, a Rua da Igreja, é uma via muito estreita, com a largura de 3,20m e não permite o cruzamento de dois veículos. 7 – Quando os dois veículos se aproximaram, deu-se o embate entre a parte lateral esquerda do TS e a parte frontal esquerda do AI, daí resultando danos. 8 – E nomeadamente o veículo AI sofreu danos na parte frontal esquerda, que foram orçados pela demandada em €1.072,12. 11 – Sendo que o período para a reparação do veículo AI é de 2 dias. * A fixação da matéria dada como provada resultou da audição da parte demandante, dos factos admitidos, dos depoimentos das testemunhas de demandante e demandada. As testemunhas da demandante, uma delas presencial, por ser o condutor da viatura AI, propriedade do demandante e seu filho, expôs a sua versão do sinistro, atribuindo responsabilidades ao outro condutor, o que foi reiterado pelo mediador de seguros do demandante, X, que não presenciando o sinistro disse conhecer o local que é propício a acidentes e que, em certas partes da rua em causa, não tem espaço para cruzamento de dois veículos. As testemunhas da demandada, uma delas presencial, xxx, proprietário do veículo TS seguro na demandada, também expôs a sua versão do sinistro, atribuindo igualmente responsabilidades ao outro condutor e o guarda principal da GNR xxx, expôs não ter presenciado o acidente e ter chegado após o mesmo, tomando conta da ocorrência, estando o veículo AI já fora do local de embate, expondo ainda a impossibilidade de cruzamento de dois veículos na parte estreita da rua, que tem inclinação e curva à direita na fase ascendente. À prova mencionada acrescem os documentos de fls. 10 a 16, 33 juntos aos autos, o que conjugado com a descrição unânime das testemunhas do local do sinistro bem como das suas particularidades, com sendo uma via de dois sentidos, sem sinalização, sendo estreita em algumas zonas aí não permitindo o cruzamento de dois veículos, com inclinação, com curva à direita na fase ascendente da rua, provindo da EN 14, veio complementara prova e alicerçar a convicção do Tribunal. Não se provaram quaisquer outros factos, com interesse para a decisão da causa, dada a inexistência ou insuficiência de prova nesse sentido. Fundamentação da Matéria de Direito O demandante intentou a presente ação peticionando a condenação da demandada no pagamento da quantia de €1.272,12, sendo €1.072,12 a título de valor de reparação por danos no veículo AI, além do valor de €200,00 a título de privação do uso do mesmo, alegando em sustentação desse pedido a ocorrência de um acidente de viação, cuja responsabilidade pertence ao segurado da demandada, para a qual transferiu a respetiva responsabilidade civil. Da Responsabilidade: Determina o artigo 483º do Código Civil que “Aquele que, com dolo ou mera culpa, violar ilicitamente o direito de outrem ou qualquer disposição legal destinada a proteger interesses alheios fica obrigado a indemnizar o lesado pelos danos resultantes da violação.” Para que se conclua pela existência de responsabilidade civil por factos ilícitos é, então, necessário um comportamento voluntário do agente; a ilicitude, ou seja, a violação de direitos subjectivos absolutos ou normas que visem tutelar interesses privados; a imputação do facto ao agente ou um nexo causal que una o facto ao lesante, com a apreciação da culpa como regra em abstracto, segundo a diligência de “um bom pai de família”; o dano e o nexo de causalidade entre o facto e o dano. Analisemos o caso dos autos, donde resulta ter ocorrido um acidente de viação em que foram intervenientes, o veículo automóvel propriedade do demandante com a matrícula xx-xx-xx, doravante denominado AI e o veículo automóvel segurado pela demandada com a matrícula xx-xx-xx, doravante denominado TS. Acrescente-se que a responsabilidade foi transferida, através de adequado contrato de seguro titulado pela apólice n.º xxx para a demandada. Da factualidade provada, considerando o local e demais circunstancialismos, nomeadamente a configuração da via, resulta ser possível determinar que o acidente ocorreu porque os condutores dos veículos em causa não tiveram em consideração a medida da via no local do embate que não permitia o cruzamento de dois veículos. Veja-se que enquanto o veículo TS desce a rua da igreja em direcção à EN 14, estando numa fase adiantada da rua, por sua vez o veículo AI sobe a rua, deparando-se-lhe uma curva à direita, tendo tanto um como o outro condutor visto o outro veículo a poucos metros de se cruzarem, precipitando-se ambos nesse cruzamento e tendo vindo a embater um no outro, não tendo tido em consideração as particularidades da via. Dispõe o artigo 13º, nº 1 do Código da Estrada que o trânsito de veículos deve fazer-se pelo lado direito da faixa de rodagem e o mais próximo possível de bermas e passeios. Por outro lado, preceitua ainda o artigo 24º, nº 1 do Código da Estrada que o condutor deve regular a velocidade do veículo e atender às características e estado da via e do veículo e a todas as outras circunstâncias relevantes de forma a, em condições de segurança, ser possível parar o veículo no espaço livre à sua frente. Ainda preceitua o artigo 33º, nº 1, alínea b) do mesmo código, a respeito do cruzamento de veículos, que se não for possível o cruzamento entre dois veículos que transitem em sentidos opostos, quando a faixa de rodagem for demasiadamente estreita, deve ceder a passagem o condutor do veículo que chegar depois ao troço ou, se se tratar de via de forte inclinação, o condutor do veículo que desce. No caso dos autos, atendo à factualidade descrita, considera-se que é de aplicar o preceituado no artigo 506º, nº 2, 2ª parte, do Código Civil, que regulamenta os casos de não apuramento do grau de contribuição de culpa. De acordo com esse preceito legal, em caso de dúvida, considera-se igual a contribuição da culpa de cada um dos veículos para os danos, bem como a contribuição de culpa de cada um dos condutores para o sinistro. Dos Danos: Nos termos do disposto no artigo 562º do Código Civil, a obrigação de indemnizar visa a reconstituição da situação que existiria, se não tivesse ocorrido o evento que obriga à reparação. Para cálculo da indemnização considera-se o prejuízo causado ou os danos patrimoniais, como prevê o artigo 564º do Código Civil. Dos factos provados resultou que o veículo AI do demandante sofreu danos na parte frontal esquerda, especificados no Relatório de Peritagem elaborado a pedido da demandada e junto pelo demandante, de fls. 15 e 16, sendo o valor da reparação no montante de €1.072,12. Assente que o demandante sofreu danos no veículo que ascendem à quantia de €1.072,12 e dada a concorrência de culpas, terá direito a ser indemnizado em metade dessa quantia, isto é, em €536,06, a esse título. Dos danos patrimoniais a título de privação de uso: Relativamente a danos patrimoniais sofridos a título de privação de uso do veículo AI, peticionados pelo demandante, atento o Relatório de Peritagem elaborado a mando da demandada (fls. 15 e 16), entende-se como razoável e apropriado o período de imobilização do veículo para peritagem e reparação de 2 dias. Ora hoje é, comum e maioritariamente aceite na nossa jurisprudência, que o simples uso constitui uma vantagem patrimonial suscetível de avaliação pecuniária. Defende-se que, a utilização dos bens faz parte dos interesses patrimoniais inerentes ao próprio bem, e que a simples possibilidade de utilização ou não utilização constitui uma vantagem patrimonial que, uma vez afetada, deve ser ressarcida. Razão pela qual, se fixa equitativamente, o valor de €50,00 por dia, como valor adequado considerando ser o AI um veículo ligeiro de mercadorias, fixação nos termos dos artigos 4º e 566º nº3, ambos do Código Civil, pelo dano indemnizável pela privação de uso do veículo automóvel AI, considerando o correspondente a 2 dias a esse título, isto é, o valor de €100,00, que resulta no valor de €50,00, uma vez que o demandante deverá ser ressarcido pela metade, nos termos do anteriormente exposto. Pelo exposto, deve o demandante ser ressarcido pela demandada do valor total de €586,06 (€536,06+€50,00). Decisão Em face do exposto, julgo a ação parcialmente procedente, por parcialmente provada e, consequentemente, condeno a demandada a pagar ao demandante a quantia de €586,06 (quinhentos e oitenta e seis euros e seis cêntimos), indo no mais absolvida. Custas Nos termos da Portaria nº 1456/2001, de 28 de dezembro, sendo devida pelo presente processo a taxa única de €70,00 (setenta euros), condeno o demandante e a demandada no pagamento de custas em partes iguais, sendo da responsabilidade de cada um o valor de €35,00 (trinta e cinco euros). Pelo que, na medida em que demandante e demandada liquidaram as respetivas taxas de justiça no valor de €35,00 (trinta e cinco euros), nada a pagar pelas partes. * A sentença (processada em computador, revista e impressa pela signatária - artº 18º da Lei nº 78/2001, de 13 de Julho) foi proferida nos termos do artigo 60º, da Lei nº 78/2001, com a alteração da lei 54/2013. A leitura de sentença foi agendada para o dia 5 de julho de 2015, pelas 16H30, pelo que não estando presente demandante e mandatários das partes, procede-se a notificação postal. * Notifique e Registe. Julgado de Paz da Trofa, em 5 de julho de 2016 A Juíza de Paz (em acumulação), (Iria Pinto) |