Sentença de Julgado de Paz
Processo: 156/2007-JP
Relator: GABRIELA CUNHA
Descritores: CONDOMÍNIO - PARTES COMUNS
Data da sentença: 10/10/2007
Julgado de Paz de : SANTA MARTA DE PENAGIÃO
Decisão Texto Integral: SENTENÇA

RELATÓRIO:
A, melhor identificado a fls. 1, intentou contra B, melhor identificada a fls. 1, acção declarativa de condenação, pedindo que a Demandada seja condenada a retirar as mesas que tem no logradouro do edifício identificado no artº1º do articulado, deixando de o usar como esplanada.
Para tanto, alegou os factos constantes do Requerimento Inicial de fls. 1 a 4, que se dá por reproduzido. Juntou 5 documentos (fls. 5 a 11 e 47 a 55) que se dão igualmente por reproduzidos.
Regularmente citada, contestou a Demandada impugnando os factos invocados pelo Demandante. Para tanto, alegou os factos constantes da sua contestação de fls. 20 a 24, que se dá por reproduzida. Juntou um documento (fls. 57 a 60) que, igualmente, se dá por reproduzido.
O Julgado de Paz é competente em razão do valor, da matéria e do território.
As partes são dotadas de personalidade e capacidade jurídica e são legítimas.
Não existem excepções ou nulidades de que cumpra conhecer ou outras questões prévias que obstem ao conhecimento de mérito da causa.
Aberta a audiência e estando as partes presentes, foram ouvidas nos termos do disposto no artº 57º da LJP, tendo-se explorado todas as possibilidades de acordo, nos termos do disposto no nº 1 do artº 26º do mesmo diploma legal, o que não logrou conseguir-se, tendo-se procedido à audiência de julgamento, com observância do formalismo legal como da acta se infere.

FUNDAMENTAÇÃO DA MATERIA DE FACTO
Resultaram provados os seguintes factos com relevância para a decisão da causa:
A) A Demandada é arrendatária do Rés-do-chão Direito, fracção designada pela letra B, loja 2, do Edifício, sito em Vila Real.
B) A referida fracção foi ocupada pela Demandada, através de contrato de arrendamento, celebrado pelo período de cinco anos, passando a utilizar o referido local como café/gelataria.
C) Logo no inicio, e sem que pedisse autorização aos condóminos, a Demandada ocupou parte da frente do logradouro do prédio com esplanada, onde existem mesas.
D) O local é bastante movimentado.
E) O local usado como esplanada perturba o descanso dos condóminos.
F) Os condóminos enviaram uma carta à Demandada para que diminuísse o ruído e o número de mesas na esplanada, passando para seis mesas, caso contrário teria que retirar todas as mesas.
G) Em Assembleia de Condóminos realizada em 20 de Julho de 2007, foi deliberado por unanimidade que a Demandada devia cessar a utilização do logradouro como esplanada.
H) A Demandada tomou de arrendamento a loja nº 2, do prédio em causa, a fim de nela instalar um estabelecimento comercial.
I) A loja dá directamente para um logradouro.
J) O local em referencia sempre foi utilizado como esplanada, durante o período de verão, por parte dos anteriores arrendatários da fracção, presentemente arrendada à Demandada, sendo que a tal nunca deduziu o senhorio qualquer oposição, antes com tal utilização se revelando inteiramente concordante.
K) O funcionamento da esplanada limita-se aos meses de verão.
L) O senhorio da Demandada asseverou, aquando da celebração do contrato de arrendamento, da existência de acta da Assembleia de Condóminos do prédio, consentido na utilização do local como esplanada.
Factos não Provados:
Não se provaram quaisquer outros factos alegados pelas partes, com interesse para a decisão da causa.
Motivação:
Os factos assentes resultaram da conjugação dos documentos constantes dos autos a fls 5 a 11 e 57 a 60 e, em particular, a escritura de constituição da propriedade horizontal a fls. 47 a 55, e do depoimento testemunhal prestado em sede de audiência final.
Teve-se em conta o depoimento das testemunhas C e D, residentes no prédio em causa nos autos, que revelaram alguns conhecimentos dos factos aqui em discussão, revelando-se os depoimentos credíveis.
Foi importante o depoimento da testemunha E, que revelou conhecimento dos factos aqui em discussão e, pese embora filha da Demandada, o seu depoimento revelou-se consistente e credível.
Teve-se, ainda, em conta os depoimentos das testemunhas F e G, revelando-se os depoimentos credíveis.
O depoimento da testemunha H não foi considerado, na medida em que, não se revelou nem isento nem credível.
Quanto aos factos não provados, eles resultaram da ausência de prova ou de prova convincente sobre os mesmos.

FUNDAMENTAÇÃO DA MATÉRIA DE DIREITO
A questão a resolver é daquelas que, se houvesse maior espírito de compreensão e de tolerância, teria sido resolvida conciliadoramente. Uma vez que as partes não encontraram esse caminho há que apreciá-la sob o prisma da legalidade.
Vem o Demandante na presente acção pedir a condenação da Demandada a retirar as mesas que tem no logradouro do edifício, deixando de o usar como esplanada. Vejamos se lhe assiste razão.
Nos termos do artº 1420º do Código Civil, a qualidade de proprietário de uma fracção autónoma, independente, confere ao respectivo titular, também, uma parcela na compropriedade das partes comuns do edifício, tornando-se os dois direitos indissociáveis.
São imperativamente partes comuns do prédio, não podendo os interessados acordar em sentido diferente, todas as enunciadas no nº 1 do artº 1421º do mesmo Código.
Por outro lado, presumem-se comuns, se nada resultar em contrário, as partes do prédio enunciadas no nº 2 do mesmo normativo, designadamente, os ascensores, as dependências destinadas ao uso e habitação do porteiro, as garagens e outros lugares de estacionamento.
Como escreve Aragão Seia, Propriedade Horizontal, Almedina, 2001, pág. 77, as partes, referidas neste nº 2, não são partes que integrem a estrutura do prédio nem que afectem a normal utilização de cada fracção e, por isso, podem ser excluídas do regime da comunhão, ou, o mesmo é dizer, podem ser afectadas apenas a determinada fracção ou fracções.
A escritura de constituição da propriedade horizontal é, justamente, o instrumento ou título, através do qual são definidas as partes do edifício correspondentes a cada fracção (artº 1418º, nº 1 do mesmo diploma) ou, melhor dizendo, a individualização de cada fracção e o quinhão das partes comuns do edifício.
É o que sucede no caso dos autos. De facto, como provado, a escritura de constituição de propriedade horizontal inclui nas partes comuns, concretamente, o logradouro, como se transcreve: “São comuns as partes do prédio indicadas no artº 1421º do Código Civil, sem prejuízo das particularidades das partes comuns constantes da mencionada relação de bens, incluindo o logradouro.
Ora, os condóminos têm, sobre as coisas comuns, um direito de compropriedade.
Os condóminos podem usar todas as partes comuns, desde que não as empreguem para fim diferente daquele a que se destinam e não privem os outros consortes do uso a que tem direito.
Nos termos do artº 1430º do Código Civil, nº 1, diz-se expressamente, que a administração das partes comuns de um edifício constituído em propriedade horizontal compete à Assembleia de Condóminos e a um administrador.
No caso em apreço, resultou provado que, a Demandada tomou de arrendamento a loja nº 2, do prédio em causa, a fim de nela instalar um estabelecimento comercial. A referida loja dá directamente para um logradouro.
Apurado ficou que, logo no início do arrendamento, a Demandada, sem que pedisse autorização aos condóminos, ocupou parte da frente do logradouro do prédio com esplanada.
O local em referência sempre foi utilizado como esplanada, durante o período de verão, por parte dos anteriores arrendatários da fracção, ou seja, a Demandada apenas manteve o que até então se vinha praticando.
Mais, resultou provado que, o proprietário da fracção arrendada nunca deduziu oposição à ocupação do logradouro como esplanada, antes pelo contrário, aquando da celebração do contrato assegurou o consentimento do Condomínio para a utilização de tal espaço.
Ora, em Assembleia de Condóminos realizada em 20 de Julho de 2007, foi deliberado por unanimidade que a Demandada devia cessar a utilização do logradouro como esplanada.
A Assembleia de Condóminos é o órgão deliberativo, o que lhe confere poderes de controlo, de aprovação e de decisão final sobre todos os actos de administração. O mesmo é dizer que a Assembleia de Condóminos é soberana quanto a tudo o que respeita às partes comuns do edifício e bem assim ao seu estado de conservação e manutenção.
Sendo a Assembleia de Condóminos o órgão através do qual a comunidade de condóminos forma a sua vontade, devem as suas deliberações ser cumpridas.
Assim, sendo o espaço ocupado pela Demandada um logradouro do edifício, não tendo esta qualquer título que legitime a sua ocupação e, tendo sido deliberado em Assembleia de Condóminos a cessação dessa ocupação, não pode deixar de proceder o pedido formulado pelo Demandante.

DECISÃO
Nos termos e com os fundamentos invocados, julgo a presente acção procedente, por provada e, em consequência, condeno a Demandada - B – a retirar as mesas que tem no logradouro do Edifício sito em Vila Real, deixando de o usar como esplanada.
Declaro a Demandada como parte vencida, correndo as custas por sua conta, em conformidade com os artigos 8º e 9º da Portaria n.º 1456/2001 de 28 de Dezembro, alterada pela Portaria nº 209/2005 de 24 de Fevereiro.

Registe.


Santa Marta de Penaguião, 10 de Outubro de 2007
(Juíza de Paz que redigiu e reviu em computador – artº 138º/ 5 do C.P.C - Verso em Branco)

Gabriela Cunha