Sentença de Julgado de Paz | |
Processo: | 411/2009-JP |
Relator: | PERPÉTUA PEREIRA |
Descritores: | RESPONSABILIDADE CIVIL |
![]() | ![]() |
Data da sentença: | 03/26/2010 |
Julgado de Paz de : | VILA NOVA DE GAIA |
![]() | ![]() |
Decisão Texto Integral: | Sentença I. Identificação das Partes Demandante:A Demandada: B II- Objecto do Litígio O Demandante veio propor contra a Demandada a presente acção declarativa, enquadrada na alínea h) do n.º 1 do art.º 9º da Lei n.º 78/2001 de 13 de Julho, pedindo a condenação desta a pagar a quantia global de €2.150,00 (dois mil, cento e cinquenta euros) pelos prejuízos decorrentes de um acidente de viação. Alegou, para tanto e em síntese, que no dia 2 de Janeiro de 2009, cerca das 23 horas, conduzia o seu veículo automóvel de marca Opel, de matrícula NP pela Rua dos Agros, Vila Nova de Gaia, no sentido Norte/Sul e que, pretendendo virar no entroncamento em direcção à Rua Doutor Castro Correia, imobilizou a viatura e procedeu à manobra de mudança de direcção à direita tendo sido embatido pelo veículo de marca Ford, de matrícula AI, que circulava nessa via, sentido poente/nascente, por circular fora da sua faixa de rodagem. Alicerça a indemnização do valor peticionado em danos patrimoniais de reparação do automóvel (€1.200,00), patrocínio forense (€450,00) e danos morais (€500,00). Juntou documentos. A citação foi efectuada regularmente. Pela Demandada foi apresentada contestação, admitindo alguns factos articulados no requerimento inicial, nomeadamente, a verificação do acidente, local, bem como os veículos envolvidos, impugnado, no entanto, a versão apresentada pelo Demandante, imputando-lhe a responsabilidade pela colisão, alegando, em suma, que este realizou a manobra de mudança de direcção sem parar no entroncamento e repentinamente, circulando sobre o eixo da via, e que foi impossível à condutora do Ford, evitar o acidente, concluindo pela improcedência do pedido. Juntou Documentos. O Julgado de Paz é competente em razão da matéria, do objecto, do território e do valor. O processo não enferma de nulidades que o invalidem na totalidade. As partes gozam de personalidade e capacidade judiciárias e são legítimas. Não há excepções, nulidades ou quaisquer questões prévias que cumpra conhecer. Procedeu-se ao Julgamento com observância das legalidades formais como da acta se infere. III- Fundamentação Fáctica Da matéria carreada para os autos e com relevância para a decisão da causa, resultou provado que: a) No dia 2 de Janeiro de 2009, cerca das 23 horas, o Demandante conduzia o veículo automóvel de marca Opel, de matrícula NP, sua propriedade, pela Rua dos Agros, Vila Nova de Gaia, no sentido norte/sul, atento o seu sentido de marcha; b) Chegado ao entroncamento com a Rua Doutor Castro Correia, Lugar de Murrazedes, da mesma freguesia, o Demandante pretendeu virar à direita para a referida via, c) E quando efectuava a manobra de mudança de direcção para a direita, o Opel foi embatido pelo automóvel ligeiro de passageiros, de marca Ford, de matrícula AI, propriedade de C e conduzido pela filha deste, D. d) O Opel penetrou repentinamente na Rua Doutor Castro Correia; e) O Ford circulava na Rua Doutor Castro Correia, no sentido poente/nascente, atento o seu sentido de marcha. f) O embate ocorre sobre o eixo da via, já na Rua Doutor Castro Correia. g) Quando a autoridade policial chegou, a condutora do “AI” já tinha retirado o carro do local do embate. h) A GNR do posto territorial dos Carvalhos foi chamada ao local e elaborou a respectiva Participação de Acidente. i) Do acidente resultaram danos materiais na viatura do Demandante. j) A condutora do Ford ficou ferida e foi assistida no Hospital de Santos Silva em Vila Nova de Gaia. l) Antes da ida ao centro hospitalar, a condutora prestou declarações à GNR. m) Foi realizada a respectiva participação do acidente e a Demandada ordenou a realização de uma peritagem ao veículo, tendo-se apurado um valor de reparação no montante de €2.156,58, com perda total do automóvel, atento o seu valor venal. n) Considerando o bom estado de conservação da sua viatura, o Demandante assinou uma ”Acta de Acordo” onde foi fixado o valor da indemnização, pelos prejuízos resultantes do acidente e dias de paralisação, em €1.200,00. o) Após a assinatura do referido documento, a Demandada informou o Demandante que considerava ter o acidente ocorrido por responsabilidade de ambos os condutores, na proporção de 50% para cada um, pelo que apenas pagaria o montante de €600,00. p) Na altura do acidente chovia. q) O referido entroncamento da Rua dos Agros para a Rua Doutor Castro Correia, para quem vem daquela, possibilita pouca visibilidade para esta última. r) Em virtude do acidente, ficou danificada a frente lateral esquerda do Ford e toda a parte frontal do Opel. s) O Demandante sofreu inquietude e transtornos que teve que suportar. t) O Demandante recorreu a patrocínio forense com recurso ao tribunal, no sentido de ver solucionado o seu problema. u) A companhia de seguros na qual o veículo do Demandante se encontra segurado, declinou qualquer responsabilidade, sendo da sua opinião que o sinistro se deveu ao outro condutor. v) O proprietário do veículo “AI” havia transferido para a Demandada, a responsabilidade civil por danos causados a terceiros na condução e pelo veículo sua propriedade, através de seguro válido e plenamente eficaz à data do acidente, o qual se encontra titulado pela apólice n.º x. Não resultou provado que: a) Chegado ao entroncamento com a Rua Doutor Correia de Castro, o Demandante tenha imobilizado a sua viatura; b) Que o embate se deu na hemi-faixa de rodagem da esquerda daquela via, atento o sentido poente/nascente; c) O Demandante perdeu muitas horas e dias de trabalho a fim de contactar e escrever para a Demandada; d) Que despendeu o montante de €450,00 no patrocínio forense concernente à presente acção. e) Que o Demandante tenha tido desgaste emocional com toda a situação. Motivação dos factos provados e não provados: Os factos assentes resultaram da conjugação dos documentos constantes dos autos, nomeadamente de fls. 6 a 19 (participação de acidente de viação à Guarda Nacional Republicana, correspondência trocada entre Demandante, Demandada e E, Acta de Acordo) e 33 a 34 (apólice de seguro); das fotografias dos dois veículos após o embate e do local do acidente, do depoimento testemunhal prestado em Audiência de Julgamento. Foram relevantes os depoimentos, que o tribunal considerou credíveis, das testemunhas F e D, esposa do Demandante e condutora do “AI”, respectivamente que, não obstante serem contraditórios quando ao local de embate das viaturas, que a primeira referiu ser na “mão” do marido e a segunda ainda no eixo da via mas que se encontrava na sua faixa de rodagem, foram, contudo, relevantes para apurar a dinâmica do acidente. De salientar do testemunho da esposa do Demandante, que com este seguia na viatura, a afirmação de que quando viraram à direita viram o outro carro a fazer a curva, a testemunha ainda gritou mas que o marido não teve tempo de travar e o outro carro “que vinha um pouco largado a fazer a curva” lhes bateu, o que leva a crer que não terá parado, porque se vinha a arrancar do entroncamento, conforme a testemunha afirma, teria possibilidade de travar uma vez que ia a iniciar a marcha. Não tendo sido possível ao tribunal apurar, com matemática certeza o ponto de embate dos veículos, das declarações destas testemunhas resultou claro que o Demandante não terá empregue de todas as cautelas, designadamente, adequado a velocidade e até parado na entrada do entroncamento/mudança de via e que terá realizado a curva mais sobre o eixo da mesma, porque se trata de um entroncamento muito fechado e sem grande visibilidade para a direita; e bem assim no que se refere à atitude da condutora do Ford que se apurou vir também “um pouco largada”, a fazer a curva à direita que se lhe apresenta, atento o seu sentido de marcha, antes da pequena recta onde entronca a Rua dos Agros e terá entrado na mesma sobre o eixo da via, contribuindo também para a colisão. Quanto aos factos não provados, eles resultaram da ausência de prova ou prova bastante sobre os mesmos. IV- O Direito Pela presente acção pretende o Demandante efectivar a responsabilidade civil emergente de acidente de viação ocorrido em 2 de Janeiro de 2009 que teve como intervenientes o veículo ligeiro de passageiros de matrícula NP (Opel ), sua propriedade e o veículo ligeiro de passageiros com a matrícula AI (Ford), propriedade de C, o qual transferiu a responsabilidade civil para a Demandada. No domínio da responsabilidade civil extracontratual por actos ilícitos, a regra é de que a obrigação de indemnizar só existe, para além dos restantes pressupostos, quando há culpa do agente, tendo carácter excepcional os casos em que dela se prescinde, nos termos do disposto nos nºs 1 e 2 do art.º 483º do Código Civil. São pressupostos deste tipo de responsabilidade: a) a verificação do facto; b) a ilicitude; c) a culpa; d) a existência de danos; e) o nexo de causalidade entre o facto ocorrido e os danos verificados. O facto terá de ser necessariamente aquele que é dominável e controlável pela vontade humana, a ilicitude traduz a reprovação da conduta do agente reflectida na violação do direito de outrem ou de qualquer disposição legal destinada a proteger interesses alheios. De acordo com o art.º 487º do C.C., a culpa é apreciada face às circunstâncias concretas de cada caso pela “diligência de um bom pai de família” (critério de diligência abstracta), ou seja, de acordo com a capacidade e diligência do homem médio colocado na mesma situação do agente. Os danos correspondem ao prejuízo que decorre para quem suporta a actuação ilícita e culposa, ligados pelas regras normais da causalidade. Salvo havendo presunção legal de culpa, é ao lesado que incumbe provar a culpa do autor da lesão, art.º 487 n.º 1. Cabia assim, ao Demandante o ónus da prova dos factos integradores da situação de culpa efectiva por parte da condutora do veículo “AI”, ou seja, a prova dos factos reveladores de que esta deu causa, censuravelmente, com o seu acto de condução do veículo automóvel, ao acidente de viação em apreço. Tendo em conta o contexto em que ocorreu o acidente, de noite de chuva e num local com pouca visibilidade e que o Demandante manobrou o veículo para a via para onde pretendia seguir, repentinamente e sem possibilidade de travar e, por outro lado, que a condutora do “AI” seguia numa via de curvas e contracurvas, próximo de um entroncamento e que vinha com alguma velocidade, ficou demonstrado que terão ambos os condutores encostado ao lado esquerdo da via em que seguiam, concorrendo de igual forma para o embate. O Código da Estrada (D.L. 114/94 de 3 de Maio alterado pelo D.L. 44/05 de 23 de Fevereiro), regula o transito de veículos, nomeadamente quando à posição de marcha; dispõe-se no art. 13º que “o trânsito de veículos deve fazer-se pelo lado direito da faixa de rodagem e o mais próximo possível das bermas ou passeios observando destes, uma distância que permita evitar acidentes” (n.º 1) e que, “quando necessário, pode ser utilizado o lado esquerdo da faixa de rodagem para ultrapassar ou mudar de direcção” (n.º 2). Face ao exposto, entende-se que é de fixar em partes iguais a culpa dos condutores na eclosão do acidente, pois ambos não tomaram as devidas precauções, para circular com segurança, violando a referida norma da legislação estradal. No que toca aos danos que o Demandante pretende ver indemnizados, nos termos do art. 562º do C.C., a obrigação de indemnizar visa a reconstituição da situação que existiria na esfera jurídica do lesado se não se tivesse produzido o acidente, de acordo com a designada Teoria da Diferença, sendo indemnizáveis os danos patrimoniais e de carácter não patrimonial, estes últimos se merecerem a tutela do direito (nºs 1 e 2 do art. 564º e n.º 1 do art. 496). Está assente que o Demandante sofreu danos no seu veículo e pela testemunha F foi afirmado ter sido o veículo já reparado e pelo monta te de €1200,00, pelo que terá direito a ser indemnizado em 50% dessa quantia, atenta a supra referida concorrência de culpas. Dispõe o art.º 496º da referida lei civil que “são indemnizáveis os danos não patrimoniais que, pela sua gravidade, mereçam a tutela do direito”, o que face à matéria de facto assente, não são de relevar no caso do Demandante. Nos termos dos artigos 804º e 559º do C.C., sobre a obrigação de indemnizar incide também a obrigação de pagamento de juros a partir do dia de constituição em mora. Tendo em conta o art.º 805 n.º 3 do mesmo diploma, no caso em apreço, são devidos juros de mora, à taxa legal de 4%, sobre a indemnização, contados desde a data da citação, até efectivo e integral pagamento, conforme peticionado. V- Decisão Face a quanto antecede, julgo parcialmente procedente a presente acção e, em consequência, condeno a Demandada a pagar ao Demandante a quantia de €600,00 (seiscentos euros), acrescida dos juros de mora, à taxa de 4%, contados desde a citação até efectivo e integral pagamento, absolvendo-a do demais peticionado. Custas na proporção do decaimento que se fixa em 50% para a Demandada e 50% para o Demandante. Registe. Vila Nova de Gaia, 26 de Março de 2010 A Juíza de Paz (Perpétua Pereira) Processado por computador - art. 138º/5 do C.P.C. Revisto pela Signatária. VERSO EM BRANCO Julgado de Paz de Vila Nova de Gaia |