Sentença de Julgado de Paz
Processo: 405/2016-JP
Relator: MARIA JUDITE MATIAS
Descritores: RESPONSABILIDADE CIVIL - PAGAMENTO REFERENTE À REPARAÇÃO DO VEÍCULO
DIAS DE PARALISAÇÃO E CERTIDÃO DO AUTO DE OCORRÊNCIA.
Data da sentença: 12/15/2016
Julgado de Paz de : LISBOA
Decisão Texto Integral:

Sentença
(n.º 1, do art. 26º, da Lei n.º 78/2001, de 13 de Julho na redação que lhe foi dada pela Lei n.º 54/2013 de 31 de julho).

Processo n.º405/2016-JP
Matéria: Responsabilidade civil.
(alínea H) do n.º 1, do art. 9º, da Lei n.º 78/2001, de 13 de Julho na redação que lhe foi dada pela Lei n.º 54/2013 de 31 de Julho).
Objeto: Pagamento referente à reparação do veículo, dias de paralisação e certidão do Auto de Ocorrência.
Valor da ação: €2.225,47 (dois mil, duzentos e vinte e cinco euros e quarenta e sete cêntimos).

Demandante: A, Lda., com sede na Praça x, nº x, x, xxxx-xxx Lisboa.
Mandatário: Dr. B, Advogado, com domicílio profissional em Av.ª x, x, xxxx-xxx Lisboa, que substabeleceu na Dra. C, Advogada Estagiária, com domicílio profissional na mesma morada.
Demandados: D, Seguros, S.A., com sede na Av. x, x, x, xxxx-xxx Lisboa.
Mandatário: Dra. E, advogada, com domicílio profissional na Rua x, n.º x, x, xxxx – xxx Lisboa, que substabeleceu na Dra. F, Advogada, com domicílio profissional na mesma morada.

Do requerimento inicial: Fls. 1 a 7.
Pedido: Fls.6.
Junta: 9 documentos e procuração forense.
Contestação: a fls. 48 e segs.
Tramitação:
A demandante recusou a mediação.
Foi designado o dia 14 de outubro de 2016, pelas 12h e 30m, para a audiência de julgamento sendo as partes devidamente notificada para o efeito.
Audiência de Julgamento.
A audiência decorreu conforme ata de fls. 83 e 84.
***
Fundamentação fáctica.
Com relevância para a decisão da causa dão-se por provados os seguintes factos:
1 – Em 20 de maio de 2013, cerca das 16h e 25m, ocorreu um acidente de viação na denominada Rotunda da Colina do Sol, que envolveu o veículo automóvel ligeiro de passageiros de matrícula xx – xx – SF, doravante SF e o veículo ligeiro de passageiros de matrícula xx - xx – XO, doravante XO (cfr. doc.3, fls. 11 e segs., cujo teor se dá por integralmente reproduzido);
2 – À data dos factos a demandante era proprietária do SF, veículo licenciado para serviço de táxi na praça de Lisboa (cfr. docs. 1 e 2);
3 - Na mesma data o proprietário do XO transferira para a demandada a responsabilidade civil por danos causados a terceiros com o referido veículo pela apólice n.º n.º x (admitido);
4 - À data dos factos o XO, era propriedade de G, era conduzido por H e o SF era conduzido por I (cfr. doc 3);
5 – Ambos os veículos contornavam a Rotunda da Colina do Sol (admitido);
6 – Em dado momento dá-se a colisão entre ambos os veículos, indo o XO bater no semáforo colocado no lado esquerdo da via de saída para a Avenida Condes de Carnide (doc. 3, fls. 14 dos autos);
7 – Da colisão resultaram danos para o SF, que foram peritados pela demandada, cuja reparação importou em €880,47 (cfr. docs. 5, 6 e 7);
8 – O tempo de reparação foi estimado em três dias, sendo a peritagem efetuada em 22 de maio de 2013 (cfr. doc. 5, relatório de peritagem a fls. 22);
9 – Dado que de permeio ocorreram dois dias de fim de semana o SF esteve paralisado durante oito dias;
10 – O SF laborava em dois turnos sendo um assegurado por um motorista e o outro assegurado pelo sócio da demandante, apurando cerca de cem euros por cada turno (cfr. docs 5 e 6, confirmado pela testemunha J).
Fatos não provados.
Com relevância para a decisão da causa consideram-se não provados os factos não consignados, nomeadamente não se considera provado que a demandante tenha despendido a quantia de €65,00 com a obtenção de certidão.
Motivação.
A convicção do tribunal fundou-se nos autos, nos documentos apresentados e referidos nos respectivos factos e nos depoimentos das testemunhas apresentadas. Com efeito a testemunha I garantiu que o SF fazia dois turnos cabendo-lhe a si o turno da parte da manhã e que o seu apuro médio era €100,00, afirmação confirmada pela testemunha K.

Do Direito.
Com a presente ação pretende a demandante ser indemnizada pela demandada dos danos decorrentes do acidente de viação em causa nos presentes autos, imputando ao condutor do veículo seguro na demandada a culpa na produção do mesmo, por violação dos artigos 3.º n.º 2, 14.º-A e 25.º, todos do Código da Estrada. Por seu turno, a demandada imputa ao condutor do veículo da demandante a violação de normas estradais, nomeadamente as contidas nos artigos 3.º, n.º 2, 14.º e 43.º, todos do Código da Estrada.
O litígio em apreço coloca uma questão subsumível aos normativos que disciplinam a responsabilidade civil extracontratual, contidos nos artigos 483.º e segs. do Código Civil, doravante CC. Estabelece o artigo 483.º do CC, que “aquele que com dolo ou mera culpa violar ilicitamente o direito de outrem ou qualquer disposição legal destinada a proteger interesses alheios fica obrigado a indemnizar o lesado pelos danos resultantes da violação.” A obrigação de indemnizar, resulta do preenchimento dos pressupostos deste instituto, os quais, de acordo com a previsão em causa, se traduzem na constatação de um facto ilícito, com culpa do agente, um dano e o nexo de causalidade entre o dano e o facto ilícito. Vejamos a prova produzida.
A testemunha da demandante, que conduzia o SF no momento da ocorrência do sinistro, não soube explicar de modo credível e convincente em que faixa da rotunda circulava nem qual a saída de destino. Por seu turno, o auto não concretiza o local dos danos nos veículos limitando-se a dizer que se verificaram “danos nas partes embatidas”, o que não concorre em nada para a perceção da dinâmica do acidente, e o mesmo se diga do relatório da peritagem. Das declarações do condutor do XO, constantes do doc. 3, fls. 16, resulta que “circulava o mais à direita possível para sair em direcção a Carnide Pontinha”; “o outro veículo vinha na faixa do meio da rotunda indo sair, segundo o condutor também na saída Carnide/ Pontinha”. “O condutor do outro veículo deu a entender que ia sair na saída Benfica/2.ª Circular, foi aí nessa saída que o outro condutor foi bater na minha porta do condutor atirando-me para cima do passeio onde fui partir um poste e o carro”. Por seu turno, declarou o condutor do SF no referido auto: “ Quando circulava na rotunda no sentido Carnide um veículo da marca Ford com a matrícula (…) embateu na minha direita”. Em audiência disse que “estava a circular sensivelmente a meio da rotunda quando o outro veículo o ultrapassou pela direita e lhe bateu no lado direito, o carro subiu o passeio e foi bater nem semáforo”. Convidado a esclarecer o local exato no croqui junto aos autos, disse que não se conseguia lembrar de tudo porque o acidente já tinha sido há três anos. Deste modo, ficamos sem saber quem bateu em quem, em que ponto da rotunda se deu a colisão, e onde se encontravam relativamente à saída para onde se dirigiam, dado que, se ambos pretendiam sair na mesma saída não se entende porque colidiram; não iam sair na mesma saída, um deles estava mal colocado na respectiva faixa: um porque circulava na faixa mais à direita em contravenção; o outro porque mudou de faixa sem as devidas cautelas. Certezas não temos, porque a prova produzida não teve consistência nem para provar a versão da demandante (n.º 1, do artigo 342.º, do C C) nem para provar a versão da demandada (n.º 2, do artigo 342.º, do C C). Acresce que, ambas as partes alegam, reciprocamente, a presunção de culpa conforme estatuído no n.º 3 do artigo 500.º. Ocorre que nem uma parte nem outra logrou ilidir a alegada presunção de culpa. Mau grado tal circunstância, entendemos ser de resolver o caso em apreço à luz do disposto no artigo 506.º, sendo que, ainda que se optasse pela imputação da culpa em partes iguais o resultado seria o mesmo. Deste modo, face à factualidade provada e não provada, considera-se ajustado a atribuição de responsabilidade em partes iguais aos condutores dos veículos em causa nos presentes autos. Nos termos dos artigos 562.º e seguintes do Código Civil, quem estiver obrigado a reparar um dano deve reconstituir a situação que existiria se não se tivesse verificado o facto gerador do dano e em relação aos danos que provavelmente o lesado não teria sofrido se a lesão não se tivesse verificado, abrangendo-se danos emergentes e lucros cessantes, podendo atender-se a danos futuros previsíveis que se não forem determináveis serão fixados em decisão ulterior, sendo possível a indemnização ser fixada em dinheiro, nos termos do art.º 566.º do CC, tendo como medida a diferença entre a situação patrimonial actual do lesado e a que teria se não se tivessem verificado os danos. No n.º 3, deste artigo, dispõe-se que se não puder ser averiguado o valor exacto dos danos, o tribunal, dentro dos limites dados como provados, julgará equitativamente.
Quanto aos danos peticionados a título de privação do uso do veículo estão os mesmos interligados com a impossibilidade de utilização do mesmo para o fim a que se destinava, ou seja exercício da atividade a que estava adstrito o aludido veículo, danos indemnizáveis em consequência direta e adequada do sinistro. A demandada apela a tabela acordada com a Antral. Porém não pode ignorar que tal tabela é indicativa e visa a sua aplicação na resolução consensual dos litígios, o que não é o caso. Por outro lado, relativamente à paralisação, invoca jurisprudência que defende que a privação de uso de um veículo automóvel não é suficiente para nela se fundar a obrigação de indemnizar, a não serem alegados e provados danos emergentes e (ou) lucros cessantes. É consabido que não é esta a jurisprudência que sufragamos. Porém, ainda que o fosse, no caso não estamos perante um qualquer veículo privado destinado a lazer. Estamos perante um veículo de trabalho, destinado a transporte público e, por via de puro senso comum se alcança que, se não pode circular não pode render, logo há lucro cessante. Podemos discutir quanto. Mas isso é outra questão. Na verdade, é regra fundamental do nosso sistema jurídico em matéria de ressarcimento de danos, que quem estiver obrigado a reparar /indemnizar um dano deve reconstituir a situação que existiria na esfera jurídica do lesado, no caso de não se ter verificado o evento que obriga à reparação, ou seja, a chamada teoria da diferença (art. 562.º do CC). Não sendo possível a reconstituição natural, será a indemnização fixada em dinheiro (art. 566.º, n.º 1 do CC), sendo indemnizáveis os danos patrimoniais (prejuízos emergentes e lucros cessantes). Ocorre que os danos reclamados a título de privação do uso do veículo, estão interligados com a impossibilidade de utilização do mesmo para o fim a que se destinava, danos resultantes de prejuízo decorrente da privação do uso no âmbito do exercício da actividade a que estava adstrito o aludido veículo, como já se disse, danos indemnizáveis porque são consequência directa e adequada do sinistro. Sendo certo que não se provou o valor exato dos danos, o montante indemnizatório deve ser fixado com recurso à equidade, nos termos do nº 3 do art. 566º. Deste modo, atentos os factos provados, afigura-se que a quantia pedida pela demandante é justa e equitativa.
Assim, de acordo com estes critérios, consideramos justo e equitativo o montante de €2.160,47, valor a indemnizar pela demandada na proporção de 50%, devendo esta pagar à demandante o montante de €1.080,24, correspondente a 50% do valor total dos danos que este tribunal considera provados.

Decisão.
Em face do exposto, condeno a demandada a pagar à demandante a quantia de €1.080,24 (mil e oitenta euros e vinte e quatro cêntimos), acrescidos de juros contados da citação até integral pagamento.

Custas.
Nos termos da Portaria n.º 1456/2001, de 28 de Dezembro, alterada nos seus n.ºs 6.º e 10.º pela Portaria n. 209/2005, de 24 de Fevereiro, considero a demandada parte vencida, pelo que deve proceder ao pagamento da quantia de €35,00, correspondentes à segunda parcela, no prazo de três dias úteis, sob pena do pagamento de uma sobretaxa de €10,00 por cada dia de atraso.
Cumpra-se o disposto no n.º 9 da referida portaria em relação à demandante.

Julgado de Paz de Lisboa, em 15 de dezembro de 2016
A Juíza de Paz
Maria Judite Matias