Sentença de Julgado de Paz
Processo: 389/2008-JP
Relator: FERNANDA CARRETAS
Descritores: CONTRATO DE PRESTAÇÃO DE SERVIÇOS - EMPREITADA
Data da sentença: 01/22/2009
Julgado de Paz de : SEIXAL
Decisão Texto Integral: SENTENÇA

RELATÓRIO:
A e B, identificados a fls. 1, intentaram, em 28 de Novembro de 2008, contra C, melhor identificada, a fls. 2 a presente acção declarativa de condenação, pedindo que esta fosse condenada a pagar-lhe a quantia de 4.750,00 € (Quatro mil setecentos e cinquenta euros).
Para tanto, alegaram, em síntese e no que à presente decisão interessa que: Em 13 de Maio de 2007, celebraram um contrato de empreitada com a Demandada para realização de obras de remodelação duma sua propriedade; para o efeito a Demandada, através do seu representante legal – D -, apresentou orçamento relativo aos trabalhos a executar; a Demandada informou os Demandantes que a obra se iniciaria em Outubro de 2007 e finalizaria no prazo de trinta dias; efectivamente a obra iniciou-se na segunda semana de Outubro de 2007; no início da obra a Demandada verificou que eram necessárias algumas alterações ao orçamento inicialmente entregue aos Demandantes, e enviou um e-mail com os novos trabalhos a executar e bem assim com o agravamento do preço da obra; os Demandantes aceitaram o novo orçamento tendo procedido aos pagamentos acordados, ficando apenas por liquidar a quantia de 1.500,00 € (Mil e quinhentos euros), a qual seria liquidada no final da obra em 21 de Junho de 2008; dos trabalhos orçamentados a Demandada não efectuou parte deles e outros foram mal executados; a Demandada não efectuou, ou efectuou deficientemente, os seguintes trabalhos: a)Os contornos das janelas, tipo velux, não estão devidamente rematados do lado de fora; b)Não forneceu nem colocou a manta de lã de rocha para isolamento térmico e acústico nas paredes interiores; c) O rodapé não foi colocado na totalidade; d) Em determinadas áreas do chão a betonilha também não foi aplicada antes de colocar o flutuante, falta pavimento em alguns sítios; e)Não forneceu nem aplicou quatro portas folheadas em faia, mogno ou carvalho e guarnições em aglomerado folheado, incluindo borrachas acústicas, dobradiças, fechaduras, puxadores e batentes no chão; f)Não foram montados a sanita e o autoclismo e a tampa; g) A maior parte da instalação eléctrica, telefónica e TV, não foi montada, não tendo interruptores, tomadas, botão de campainha e fios. Alguns fios montados não estão protegidos com tubos, conforme manda a regulamentação e as pontas destes fios estão soltas, tendo já provocado alguns choques. Os apliques também estão mal colocados; h) Faltou realizar muito trabalho na rede e águas; i)Faltam muitas ligações, incluindo a montagem da torneira do chuveiro, torneiras de esquadria, torneiras do autoclismo; j)A estrutura das escadas não ficou bem localizada, apesar de terem sido previamente combinadas, com o construtor D, as suas medidas e localização. A Demandada tentou rectificar este problema, mais do que uma vez, mas nunca o conseguiu, acabando por desistir da sua correcção. A madeira aplicada é de pinho, quando deveria ser de mogno, como consta do orçamento; k)Não aplicou todos os degraus, e outros rangem quando pisados; l)O rodapé da escada foi mal aplicado pois mostra várias falhas no acabamento; m)A sanca está mal colocada em várias zonas; n)O tecto nas partes mais baixas está torto; o)A parede da empena de um dos lados, no quarto junto á casa de banho ficou desnecessariamente afastada cerca de 15 cm da parede existente apesar de ter sido chamado à atenção para este facto, e o construtor ter prometido a sua correcção; durante os oito meses em que decorreram os trabalhos, diferentes pessoas trabalharam na casa dos Demandantes, fazendo os mesmos trabalhos, que nem o próprio representante da Demandada reconhecia a sua capacidade profissional, visto que por várias vezes, afirmou que estes não queriam trabalhar, e trabalhavam mal, que a culpa do trabalho não estar bem feito não era sua; apesar de prometido a Demandada nunca teve o cuidado de preservar a casa, (as paredes, o chão e os móveis) da sujidade, do pó, dos pingos da tinta, queda de materiais, etc.; quando se chamava a atenção, prometia limpar e proteger, contudo, nunca o fez; a Demandada não recolheu a totalidade dos entulhos, restos de materiais, etc., deixando-os abandonados na obra; como a Demandada não continuou o trabalho, em 4 de Julho de 2008, os Demandantes, através do seu advogado enviaram carta à Demandada, registada com Aviso de Recepção, na qual lhe exigiam a conclusão dos trabalhos, no prazo de 10 dias, a contar da recepção da carta; como a Demandada nada fez relativamente ao que lhe era exigido na carta de 4 de Julho de 2008, os Demandantes em 12 de Novembro de 2008, enviaram-lhe nova carta com aviso de recepção na qual declaravam o contrato resolvido, avisando-a de que iriam recorrer ao tribunal com o pedido de indemnização no valor de 4.750,00 €, pelos prejuízos sofridos; até à data a Demandada não respondeu às cartas dos Demandantes, nem sequer os contactou no sentido de lhes dar qualquer satisfação; como a Demandada não terminou a obra, os Demandantes solicitaram um orçamento para os trabalhos a executar, para conclusão da obra, o qual tem o valor de 6.750,00€ (Seis mil setecentos e cinquenta euros); como do orçamento apresentado pela Demandada os Demandantes deveriam ainda pagar a quantia de 1.500,00 €, o seu prejuízo é de 4.750,00 € (Quatro mil setecentos e cinquenta euros); o pagamento desta quantia é da responsabilidade da Demandada que, não obstante ter recebido o preço acordado, executou vários trabalhos de forma deficiente, não tendo executado outros, tudo conforme o seu Requerimento Inicial de fls. 1 a 6, que se dá por reproduzido.
Juntou 40 documentos (fls.7 a 45) que se dão por reproduzidos.
Regularmente citada a Demandada, para contestar no prazo, querendo, esta nada disse.
Cabe a este tribunal decidir se, tendo sido resolvido o contrato celebrado entre as partes, os Demandantes têm o direito a ser ressarcidos dos prejuízos alegadamente causados pela Demandada e, se sim, em que medida.
Tendo os Demandantes aceite o recurso à Mediação para resolução do litígio, foi agendada data para a realização da sessão de Pré-Mediação para o dia 11 de Dezembro de 2008 (fls.51), não se tendo a mesma realizado por falta, injustificada, da Demandada (fls. 54), pelo que se designou data para a realização da Audiência de Julgamento (fls. 57).
Aberta a Audiência e estando apenas presentes os Demandantes, foi esta suspensa, ficando os autos a aguardar o decurso do prazo para a justificação de falta, por parte da Demandada, nos termos dos n.ºs 2, 3 e 4 do Art.º 58.º da LJP, o que não aconteceu, pelo que se profere sentença.
Cumpre apreciar e decidir:
O Julgado de Paz é competente em razão do valor, da matéria e do território.
Não existem nulidades que invalidem todo o processado.
As partes são dotadas de personalidade e capacidade jurídica e são legítimas.
Não existem excepções de que cumpra conhecer ou outras questões prévias que obstem ao conhecimento de mérito da causa.
FUNDAMENTAÇÃO - MATÉRIA DE FACTO
A convicção probatória do tribunal, ficou a dever-se ao conjunto de prova produzida nos presentes autos, tendo sido tomada em consideração a confissão por parte da Demandada, operada pela ausência de Contestação escrita e falta, injustificada, à Audiência de Julgamento e os documentos de Fls. 7 a 45, considerando-se provados todos os factos alegados pelos Demandantes.
FUNDAMENTAÇÃO - MATÉRIA DE DIREITO
Dispõe o Art.º 58.º, n.º 2 da LJP que, se o Demandado, tendo sido regularmente citado, não comparecer, não apresentar contestação escrita nem justificar a falta no prazo de três dias, consideram-se confessados os factos articulados pelo Demandante.
In casu, a Demandada encontra-se regularmente citada, não apresentou contestação escrita, não compareceu à Audiência de Julgamento e não justificou a sua falta.
Opera, assim, a cominação prevista no supra mencionado normativo, pelo que se consideram confessados os factos articulados pelos Demandantes.
O contrato celebrado entre os Demandantes e a Demandada é uma modalidade do Contrato de Prestação de Serviços, na forma de Empreitada, previsto no Art.º 1207.º do C.C., o qual dispõe que “Empreitada é o contrato pelo qual uma das partes se obriga em relação à outra a realizar certa obra, mediante um preço.”
Está pacificamente aceite que a palavra “obra” contida no normativo supra mencionado está empregada na acepção do resultado material, compreendendo não só a construção ou criação, como também a reparação, modificação ou demolição de uma coisa.
No caso sub judice, a Demandada comprometeu-se a executar diversos trabalhos na casa dos Demandantes, tendo apresentado orçamento que foi aceite por estes.
Foi estabelecido o prazo de trinta dias, com início em Outubro de 2007, para a execução dos trabalhos, resultando provado, todavia, que o referido prazo foi largamente ultrapassado.
Mais resulta provado que, não obstante ter ultrapassado o prazo acordado, a Demandada executou vários trabalhos de forma deficiente e não efectuou outros.
Por tal facto, os Demandantes, através do seu advogado, interpelaram-na para corrigir os defeitos e concluir a obra no prazo de 10 dias, a contar da recepção da carta.
A demandada nada disse ou fez, pelo que os Demandantes lhe enviaram carta a resolver o contrato e a informá-la da sua intenção de recorrer aos tribunais para receberem a indemnização de 4.750,00 € (Quatro mil setecentos e cinquenta euros) pelos danos sofridos, carta que, igualmente, não mereceu qualquer reacção por parte da Demandada.
Ora dispõe o Art.º 1208.º do C.C. que “o empreiteiro deve executar a obra em conformidade com o que foi convencionado e sem vícios que excluam ou reduzam o valor dela, ou a sua aptidão para o uso ordinário ou previsto no contrato.”, instituindo um dever de indemnizar os prejuízos sofridos por responsabilidade contratual, independente de culpa.
Nos termos do Art.º 1221.º do C.C., o dono da obra tem o direito de exigir do empreiteiro a eliminação dos defeitos, citando-se a propósito o douto Acórdão da RC, 17-5-1994:BMJ,437.º-594 “O lesado com a defeituosa execução da obra, para se ressarcir dos prejuízos sofridos terá de actuar por esta ordem: em primeiro lugar, exigir a eliminação dos defeitos, ou não sendo esta possível, exigir nova construção; se tal não for satisfeito, pode obter a redução do preço ou a resolução do contrato, se os defeitos tornam a obra inadequada ao fim a que se destinava; por último pode pedir indemnização, nos termos gerais.”.
Donde decorre que, face à postura adoptada pela Demandada, operou a resolução do contrato celebrado, constituindo-se a Demandada na obrigação de indemnizar os Demandantes pelos danos sofridos.
Neste caso, resulta provado que, para eliminar os defeitos e concluir a obra, os Demandantes têm de desembolsar a quantia de 6.750,00 € (Seis mil setecentos e cinquenta euros).
Resultando igualmente provado que, da totalidade do valor orçamentado, faltava pagar a quantia de 1.500,00 € (Mil e quinhentos euros), pelo que os Demandantes consideram que o seu prejuízo se cifra no valor de 4.750,00 € (Quatro mil setecentos e cinquenta euros).
É indubitável o direito dos Demandantes à indemnização que pedem, a qual, a nosso ver, peca por defeito.
De facto, a observação das fotografias juntas e a constatação do desrespeito manifestado pela Demandada pela sua arte, pelo contrato celebrado e pelos direitos dos Demandantes justificaria um pedido substancialmente superior que punisse de forma exemplar a culpa da Demandada, uma vez que não pode continuar a aceitar-se comportamentos desta natureza.
Todavia, os Demandantes, reiterando a sua postura contratual e processual de extremo respeito e compreensão, apenas pedem aquela quantia e é nesse limite que se deve conter a condenação.
Conclui-se, assim, que a Demandada teve muita sorte com a outra parte contraente pois que, da forma bastante reprovável como encarou o contrato a que se vinculara, poderiam resultar – e resultariam certamente – encargos muito mais pesados para si.
É que não nos podemos esquecer que os contratos devem, nos termos legais, ser pontualmente cumpridos com respeito pelo princípio da boa fé, o que, manifestamente, não aconteceu no caso dos autos.
DECISÃO
Nos termos e com os fundamentos invocados, julgando totalmente procedente, porque provada, a presente acção, decido condenar a Demandada – C - a pagar aos Demandantes – A e B - a quantia de 4.750,00 € (Quatro mil setecentos e cinquenta euros).
Custas a suportar pela Demandada que se declara parte vencida (art.º. 8.º da Portaria n.º 1456/2001, de 28 de Dezembro).
Registe.
Seixal, 22 de Janeiro de 2009
(Juíza de Paz que redigiu e reviu em computador – Art.º 138.º/5 do C.P.C.)
(Fernanda Carretas)

Depositada na secretaria em:
2009-01-22