Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa  | |||
| Processo: | 
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| Relator: | ANTÓNIO SANTOS | ||
| Descritores: |  VENDA JUDICIAL TEORIA DA RECEPÇÃO DA DECLARAÇÃO NEGOCIAL AGENTE DE EXECUÇÃO REVOGAÇÃO  | ||
| Nº do Documento: | RL | ||
| Data do Acordão: | 10/23/2025 | ||
| Votação: | UNANIMIDADE | ||
| Texto Integral: | S | ||
| Texto Parcial: | N | ||
| Meio Processual: | APELAÇÃO | ||
| Decisão: | PROCEDENTE | ||
| Sumário: |  4.1. -A venda judicial por negociação particular de um imóvel em processo de execução assume a natureza de venda civil, com algumas nuances, estando assim sujeita aos princípios gerais da compra e venda desta última; 4.2.- De acordo com a teoria da recepção da declaração negocial, situada numa posição intermédia entre a da expedição e a do conhecimento, o AE fica vinculado à decisão proferida de aceitação de concreta proposta logo que tal declaração de aceitação chegue ao poder dos proponentes , ou dos mesmos é conhecida; 4.3. – A revogação pelo AE da sua decisão de aceitação de uma proposta de aquisição só é eficaz – em face dos proponentes - se chega ao conhecimento dos proponentes ao mesmo tempo, ou antes da declaração de aceitação que também proferiu.  | ||
| Decisão Texto Parcial: | |||
| Decisão Texto Integral: |  Acordam os Juízes na 6ª Secção CÍVEL Do Tribunal da Relação de LISBOA * 1.- Relatório Em 7/2/2014 foi intentada ACÇÃO EXECUTIVA [ por CAIXA GERAL DE DEPÓSITOS ] contra B e OUTROS, com base em ESCRITURA DE COMPRA E VENDA, MÚTUO COM HIPOTECA E FIANÇA, e com vista à cobrança coerciva da quantia total de 111.789,76 €. 1.2. – Seguindo a execução a respectiva e normal tramitação legal, e , após a venda do imóvel hipotecado, a Execução prosseguiu para pagamento do remanescente em dívida à data de 28.02.2018 [ € 108.497,98 ], tendo em 6/12/2022 sido lavrado AUTO DE PENHORA de Fração autónoma, destinada a habitação, do tipo T2,localizada no 2º andar, Bloco A, com arrecadação e estacionamento, sito na Rua 1. Inscrita na matriz sob o artigo .... e descrita na CRP de Câmara de Lobos, sob a descrição n.º ..../19980514, fração "F", da freguesia e concelho mencionados. 1.3. – Após sentença de verificação e graduação de créditos [ de 24/4/2023 ], decidiu o Agente de Execução proceder à Venda do bem penhorado mediante Leilão Eletrónico, mas, frustrando-se a mesma, seguiu-se a venda – por decisão do Agente de Execução – do imóvel por NEGOCIAÇÃO PARTICULAR [ determinada por “nova” decisão de 16/10/2024 e após frustração de uma anterior venda também experimentada por negociação particular ]. 1.4. – Esgotado o período fixado para a referida venda [ e sendo o maior valor oferecido para a aquisição o de 165.000,00€ ], segue-se em 27/1/2025 a prolação da seguinte decisão judicial : “A proposta ora apresentada situa-se pouco acima dos 70% do valor base pelo que se mostra, neste momento, como longe do valor de mercado. Assim, indefere-se a venda pela oferta mais alta até à data apresentada. Deverá o(a) Ex.mo(a) Sr.(a) Solicitador(a) de Execução continuar a diligenciar pela venda, inclusive notificando o proponente que caso persista no interesse de adquirir o bem que deverá oferecer um valor igual a 75% do valor base que, caso tenha lugar, se autoriza, desde já a venda por esse valor. Qualquer valor inferior será de indeferir neste momento. Notifique.”. 1.5. - Prosseguindo – em face da decisão identificada em 1.4. - as diligências com vista à venda por negociação particular do imóvel penhorado e, conseguida uma proposta de aquisição no valor de 176.300,00€ [ enviada por C e D ] , profere em 4/4/2025 o AE a seguinte decisão : “(…) Terminado a venda por negociação particular verifica-se que a melhor proposta é superior a 75% do valor base, conforme Douto Despacho de fls., estando assim reunidas condições para que se concretize a adjudicação do bem ao proponente, logo que: a) O proponente deposite o preço e demonstre o cumprimento das obrigações fiscais, designadamente a liquidação do IMT (Imposto Municipal Sobre as Transmissões Onerosas de Imóveis) e IS (Imposto de Selo), o que deverá fazer no prazo de 15 dias contados da notificação da presente decisão ( nº 2 do artigo 824º do CPC): b) Não sejam exercidos direito de preferência (no prazo de 10 dias), sem prejuízo de eventuais direito de remissão (artigo 842º do CPC) A demonstração da liquidação do Imposto de Selo e IMT é feita pela entrega ao agente de execução do duplicado da declaração modelo 1 de IMT/IS, a respetiva liquidação e o comprovativo de pagamento. Uma vez que se trata de venda judicial, a liquidação de IMT/IS é feita junto de qualquer serviço de finanças, devendo o adquirente juntar ao serviço de finanças a presente decisão. Adquirente: C, NIF ..., residente na Rua 2 e, D, NIF ..., residente na Rua 3. Executado(s): AA, NIF ... e BB. Valor: 176.300,00 euros. BEM A SER ADJUDICADO: Fração autónoma, destinada a habitação, do tipo T2, localizada no 2º andar, Bloco A, com arrecadação e estacionamento, sito na Rua 1. Inscrita na matriz sob o artigo .... e descrita na CRP de Câmara de Lobos, sob a descrição n.º ..../19980514, fração "F", da freguesia e concelho mencionados. VP de 72.146,20 euros.”. 1.6.- Posteriormente à decisão identificada em 1.5., e porque recebida pelo AE uma proposta de aquisição do imóvel pelo valor de €177.000,00€ [ datada de 9/4/2025 e enviada por CC ….. ], profere o AE a seguinte decisão – datada de 14/4/2025 : “(…) DD, Agente de Execução nos presentes autos, vem remeter os presentes autos para despacho liminar pelo motivo seguinte: - atento o teor de Douto Despacho de fls. 21-01-2025, notificou o aqui signatário o proponente da melhor proposta, tendo o mesmo vindo melhorar a sua proposta, oferecendo o valor de 176.250,00 euros, pelo que, notificou o aqui signatário as partes da melhor proposta; - no decurso do prazo das notificações apresentadas, veio o Proponente C cobrir a proposta de 176.250,00 euros, oferecendo assim o valor de 176.300,00 euros; - face à ultima proposta recebida, notificou o aqui signatário as partes, tendo apenas o Ilustre Mandatário do Exequente vindo pronunciar-se, no sentido de não se opor à aceitação da melhor proposta; - assim, proferiu o aqui signatário a Decisão de Adjudicação, conforme junta, tendo procedido à notificação de todos os proponentes, tendo vindo o proponente CC ….. a oferecer o preço de 177.000,00 euros, cobrindo assim a proposta anteriormente apresentada. Assim, uma vez que se prevê que haja disputa entre os dois proponentes, prevendo-se o prolongamento das diligências de venda, requer se digne ordenar o que tiver por conveniente. 1.6. – Apreciando o Exº Juiz titular da execução a decisão/exposição do AE datada de 14/4/2025, profere em 23/4/2025 a seguinte DECISÃO [ Ref: 57071420 ]: O(a) Ex.mo(a) Sr.(a) Solicitador(a) de Execução vem dar conta de que antecipa que haja disputa entre os dois proponentes pelo que requer ao juiz que ordene o que tiver por conveniente. Não se concebe tal requerimento do agente de execução que parece que pretende que o juiz se substitua às suas funções. O processo de vende é da competência do agente de execução e não do juiz. Tendo sido proferido despacho, a 27.01.2025, a indicar o valor mínimo da venda, cabe ao agente de execução efetuar as diligências de venda. Se existem dois interessados que vão cobrindo as propostas um do outro tal é natural, havendo regras para o efeito previstas na lei que devem ser do conhecimento do agente de execução que é um técnico especializado, daí ser solicitador de execução. Notifique.”. 1.7.- Prosseguindo os autos e, notificando o AE [ em 21/05/2025 e para que os notificados se pronunciassem ] os Executados, Exequente e Credores de que após a decisão de adjudicação proferida havia recebido outra proposta de maior valor [ de 177.000,00€ ], atravessam – em 27/5/2025, refª 52440634 - os proponentes C e D um instrumento dirigido ao Exmº Juiz titular da execução solicitando v.g. que, uma vez considerada/julgada como definitiva a decisão de adjudicação do AE supra identificada em 1.5., seja : i) ordenado que o AE notifique os proponentes da decisão de adjudicação por si proferida em 04/04/2025; ii) ordenado que o AE igualmente os notifique do prazo e meio de pagamento dos impostos devidos pela adjudicação concretizada a seu favor; iii) ordenado que o AE proceda ao agendamento da concretização da venda e respetivo formalismo de modo a efectivar a transmissão da propriedade do imóvel a favor dos proponentes/Intervenientes. 1.8. – Finalmente [ após solicitação de pronúncia pelo AE e relativamente ao requerimento dos proponentes C e D e de 27/5/2025, refª 52440634 ], veio o Exº Juiz titular da execução a proferir em 23/6/2025 a seguinte DECISÃO [ Ref: 57394654]: “ (…) II — Por despacho de 23.4.2025, foi decidido que, no âmbito de venda por negociação particular, havendo proposta que preencha o valor mínimo da venda, mas que existem dois interessados que vão cobrindo as propostas um do outro cabe ao solicitador de execução, que é o encarregado de venda, efetuar as respetivas diligências de venda. Nessa senda, o agente de execução veio, por requerimento de 30.05.2025, dar conta que foi apresentada nova proposta no valor de 177.000€ que foi notificada às partes e que aguarda o decurso do prazo. Todavia, o agente de execução veio dizer que proferiu decisão de adjudicação quanto à proposta de 176.300€, que, por seu turno, foi notificada aos demais proponentes para que possam cobrir a mesma, tendo-se alcançado o valor de 177.000€. Valor que ainda não foi admitido. É de notar que o agente de execução parece empregar indevidamente os termos jurídicos. O despacho de adjudicação consiste em decisão do agente de execução no qual reconhece ser a proposta mais alta e expressamente adjudica o bem ao proponente. Coisa diversa consiste na transmissão do bem, que carece de emissão do respetivo termo e que depende do cumprimento das obrigações fiscais e do depósito da totalidade do preço. A decisão junta pelo agente de execução com a notificação de 04.04.2025 não é uma verdadeira adjudicação, na medida em que faz depender a adjudicação de certas condições. Pela exposição do agente de execução retira-se igualmente que notifica cada nova proposta primeiro às partes e somente, se estes nada obstarem, é que a notifica aos proponentes. Tal acarreta uma morosidade sem que a lei o imponha. Havendo nova proposta, o agente de execução deverá notificá-la aos proponentes em licitação. Somente quando passar o prazo para que um dos proponentes cubra a proposta do outro é que há lugar à emissão de decisão de adjudicação e notificação das partes dessa decisão. Após, deverá diligenciar pelo agendamento da diligência de transmissão do bem, salvaguardando que o proponente saiba que nessa data deverá demonstrar estarem cumpridas as obrigações fiscais e o depósito da totalidade do preço que poderá ser por cheque bancário. Donde, nesta fase, ainda não existe qualquer decisão quanto à venda do bem.”. 1.9.- Notificados e inconformados com o teor do despacho/Decisão identificada em 1.8., da mesma vieram [ em 2/07/2025 ] os proponentes C e D interpor recurso de apelação, formulando na respectiva peça recursória as seguintes conclusões : 1. Vem o presente recurso interposto da sentença proferida no âmbito da ação executiva supra identificada, pela qual o Mm. Juiz a quo considerou que “a decisão junta pelo agente de execução com a notificação de 04.04.2025 não é uma verdadeira adjudicação”. 2. Discorda-se da decisão proferida pelo Tribunal a quo porquanto, após o encerramento da negociação particular, foi proferida decisão de adjudicação pelo AE e notificada ao exequente, executados e credores (cfr. Actos com a referência Citius 6249074, 6249068 e 6249087), e reiterada pelo mesmo AE no requerimento que dirigiu aos autos datado de 30/05/2025, com a referência Citius 6331048. 3. Na sequência de tal notificação, não se verificou reclamação ou impugnação por qualquer parte, nem foi exercida remição. 4. A decisão de que se recorre altera aquela que será a decisão final do processo, com prejuízo para os recorrentes, justificando assim o presente recurso. 5. A decisão recorrida também omite pronúncia quanto aos requerimentos apresentados pelos recorrentes, nomeadamente o apresentado em 27 de Maio de 2025, com a referência Citius nº. 6323466, o que influiu na decisão tomada. 6. O despacho de adjudicação proferido em 04/04/2025 pelo AE titular dos presentes autos executivos, estabilizou o processo, gerando confiança e segurança aos Recorrentes na aquisição do imóvel penhorado. 7. As decisões proferidas por AE são, para os devidos e legais efeitos, equiparadas a decisões judiciais, proferidas por Magistrados, correspondendo a situações juridicamente consolidadas, 8. Não podendo o AE alterar um ato praticado ou uma decisão por si já tomada e a mesma só podendo ser revista, pelo Magistrado titular dos autos, no caso de serem apresentadas reclamações ou impugnações, o que não teve lugar nos presentes autos. 9. Proferida a decisão de adjudicação, como o foi, esgota-se o poder jurisdicional, sendo que isso mesmo é afirmado de forma clara pelo legislador, consistindo “ na necessidade de assegurar a estabilidade da decisão jurisdicional (…) sob pena de se criar a desordem, a incerteza, a confusão.”. 10. O esgotamento do poder de decisão do AE, quanto à questão por si decidida, impede que o juiz de execução tenha uma intervenção oficiosa no sentido de contrariar o ato praticado ou a decisão tomada por aquele agente, não a podendo revogar. 11. Mesmo não constituindo caso julgado em sentido estrito – por não constar de uma decisão judicial – é, no entanto, a ele equiparado, havendo que aplicar, por analogia, o regime previsto para a eficácia vinculativa da sentença, tornando-se definitivos sempre que, depois de notificada às partes, estas não reclamem do ato ou não impugnem essa decisão perante o juiz, nos termos do art. 723º, n.º 1, als. c) ou d), do CPC, tal como sucedeu no caso em apreço. 12. A decisão de adjudicação deveria ter sido notificada aos Recorrentes para que regularizassem os impostos e preço, o que até à presente data não teve lugar, não obstante as inúmeras insistências dos Recorrentes nesse sentido. 13. O Tribunal a quo ao referir que a decisão de adjudicação proferida pelo AE em 04/04/2025 se tratou de “um emprego indevido de termos jurídicos pelo AE, até porque a adjudicação fica dependente do cumprimento de certas condições”, viola o lei e fere a própria decisão de adjudicação, validando actos que não têm cabimento na tramitação processual em causa e que não podiam ter sido praticados, mais violando o princípio da livre apreciação da prova, gerando a nulidade, inutilidade e desadequação da decisão proferida. 14. A decisão de adjudicação não está dependente do cumprimento de qualquer condição. 15. A decisão recorrida coloca em causa a segurança e certezas jurídicas, pois o cidadão deve poder confiar em que a sua atuação de acordo com o direito seja reconhecida pela ordem jurídica e assim permaneça em todas as suas consequências juridicamente relevantes. 16. O princípio da confiança é violado quando haja uma afectação inadmissível, arbitrária ou demasiadamente onerosa de expectativas legitimamente fundadas dos cidadãos. 17. Acrescidamente , todos têm direito a que uma causa em que intervenham seja objeto de decisão em prazo razoável e mediante processo equitativo. 18. É o próprio Tribunal a quo que, na decisão de que ora se recorre, refere que a tramitação (inexplicável e sem suporte legal) que o AE está a dar aos autos executivos “acarreta uma morosidade sem que a lei o imponha.”, sem que, contudo, o corrija. 19. Proferida decisão de encerramento das negociações e decisão de adjudicação, nenhuma outra qualquer proposta deveria ser recebida e nenhum outro acto inútil e desadequado deveria ter sido praticado, o que igualmente não foi corrigido pelo Tribunal a quo, não obstante alegado pelos Recorrentes, no seu requerimento de 27/05/2025 e sobre o qual se verifica omissão de pronúncia do Tribunal recorrido. 20. Violadas ficaram, pois, as normas constantes dos art. 20º da CRP e 3º, nº.3, 613º, 655º e 723º, nº.1 al. c) e d) do CPC. Termos em que, deve ser dado provimento ao presente recurso e, em consequência, determinar-se a revogação da decisão recorrida, substituindo-a por outra em que: a) o Tribunal a quo se pronuncie sobre o requerimento dirigido aos autos pelos Recorrentes em 27/05/2025, com a referência Citius nº. 6323466; b) o Tribunal a quo ordene a notificação do AE para que revogue as notificações ordenadas pelo AE; c) o Tribunal a quo ordene a notificação do AE para, em prazo a fixar pelo Tribunal, notificar os Recorrentes da decisão de adjudicação proferida pelo AE em 04/04/2025, d) Mais ordenando que o AE igualmente os notifique do prazo e meio de pagamento dos impostos devidos pela adjudicação concretizada a seu favor, e) Ordenando também que o AE proceda ao agendamento da concretização da venda e respetivo formalismo de modo a efectivar a transmissão da propriedade do imóvel a favor dos Recorrentes. Assim se fazendo, aliás como sempre, 2.- Com referência à apelação identificada em 1.9. não foram apresentadas contra-alegações. *** Thema decidendum 3. - Colhidos os vistos, cumpre decidir, sendo que, estando o objecto do recurso delimitado pelas conclusões [ daí que as questões de mérito julgadas que não sejam levadas às conclusões da alegação da instância recursória, delas não constando, têm de se considerar decididas e arrumadas, não podendo delas conhecer o tribunal ad quem ] das alegações dos recorrentes ( cfr. artºs. 635º, nº 3 e 639º, nº 1, ambos do Código de Processo Civil, aprovado pela Lei nº 41/2013, de 26 de Junho ), e sem prejuízo das questões de que o tribunal ad quem possa ou deva conhecer oficiosamente, as questões a apreciar e a decidir são as seguintes : I - Decidir se, efectivamente, padece a decisão recorrida do vício de omissão de pronúncia ; II - Aferir se decisão apelada [ que é a identificada em 1.8. supra ,de 23/6/2025 ] se impõe ser revogada, e isto porque para todos os efeitos : a) A decisão proferida pelo AE e identificada em 1.5. supra ,de 4/4/2025, fixa de imediato qual a proposta aceite – a apresentada por C, e D- pelo encarregado da venda/agente de execução, consubstanciando em rigor uma decisão de adjudicação; * 2.- Motivação de Facto A factualidade a atender em sede de julgamento do mérito da apelação interposta por C e Dé a que se mostra indicada no Relatório do presente Acórdão, e para o qual se remete. *** 4.- Motivação de Direito 4.1. – Se, efectivamente, padece a decisão recorrida do vício de omissão de pronúncia. Na conclusão recursória nº5, invocam os recorrentes que “A decisão recorrida também omite pronúncia quanto aos requerimentos apresentados pelos recorrentes, nomeadamente o apresentado em 27 de Maio de 2025, com a referência Citius nº. 6323466, o que influiu na decisão tomada”. Ainda que em termos não assertivos e com arguição da competente NULIDADE, prima facie tudo indica que consideram os recorrente que padece a decisão recorrida do vício a que alude o artº 615º,nº1, alínea d), primeira parte do CPC. Vejamos, pois, se assim é. Diz-nos a alínea d), do nº1, do artº 615º, do CPC, que a sentença é nula quando o juiz deixe de pronunciar-se sobre questões que devesse apreciar ou conheça de questões de que não podia tomar conhecimento ”. O vício/nulidade referida, mostra-se em consonância com o dever que recai sobre o Juiz de, em sede de sentença , resolver todas as questões que as partes tenham submetido à sua apreciação, exceptuadas aquelas cuja decisão esteja prejudicada pela solução dada a outras, servindo de cominação ao seu desrespeito (1). Sobre o Juiz recai, portanto, no dizer de LEBRE de FREITAS e outros (2) , a obrigação de apreciar/conhecer “ todas as questões que lhe são submetidas, isto é, de todos os pedidos deduzidos, todas as causas de pedir e excepções invocadas e todas as excepções de que oficiosamente lhe cabe conhecer (…),sendo que, a ocorrer uma tal omissão de apreciação/conhecimento, e , não estando em causa a mera desconsideração tão só de eventuais “(…) linhas de fundamentação jurídica, diferentes da da sentença e que as partes hajam invocado (…)”, então o “ não conhecimento do pedido , causa de pedir ou excepção cujo conhecimento não esteja prejudicado pelo anterior conhecimento de outras questões, constitui nulidade”. Em rigor, para nós e em termos conclusivos, dir-se-á que as questões a que alude a alínea d), do nº1, do artº 615º, do CPC, mais não são do que as que alude o nº2, do artº 607º, e artº 608º, ambos do mesmo diploma legal, e que ao Tribunal cumpre solucionar, delimitando-se e emergindo as mesmas da análise da causa de pedir apresentada pelo demandante e do seu confronto/articulação com o pedido que na acção é formulado. Ou seja, e dito de um outro modo, não se confundindo é certo as questões a resolver pelo juiz em sede de sentença com quaisquer argumentos e razões que as partes invoquem em defesa das suas posições, o correcto/adequado será em rigor considerar-se que o vocábulo “questões” a que alude a alínea d), do nº1, do artº 615º, do CPC, mostra-se empregado na lei adjectiva com o sentido equivalente a “questões jurídicas” ainda carecidas de resolução, impondo-se que no âmbito das mesmas seja dada prioridade às questões de natureza processual que ainda estejam por resolver (nulidades, excepções dilatórias ainda por apreciar ou outras questões de natureza processual que interfiram no resultado), e , sem embargo da apreciação das questões que sejam de conhecimento oficioso, deve o juiz limitar-se a apreciar as que foram invocadas, evitando, deste modo, a nulidade da sentença por excesso de pronúncia, nos temos do art. 615º, nº 1, al. d), in fine. (3) Postas estas breves considerações, manifesto se nos afigura, desde logo, que a omissão de julgamento pelo tribunal a quo de concretos pontos de facto que integrem os temas da prova - quando a sua enunciação existe -, está longe de consubstanciar vício susceptível de integrar a previsão da alínea d), do nº1, do artº 615º, do CPC, podendo, quando muito, e a verificar-se uma total/absoluta ausência de especificação dos fundamentos de facto [ o que in casu não sucede ] , cair-se sob a alçada da alínea b) do nº1, da mesma disposição legal. Isto dito, e analisando o processado nos autos, é vero que no âmbito da decisão recorrida não se debruça expressamente a Exmª Juiz a quo sobre o requerimento atravessado nos autos pelos recorrentes em 27/5/2025 [ refª 52440634 e supra identificado em 1.7. ], apreciando-o especificamente e deferindo-o ou indeferindo-o. Porém, se atentarmos ao teor do aludido requerimento, manifesto é que a pretensão no mesmo solicitada parte do pressuposto – para os apelantes - de que a decisão proferida pelo AE em 04/04/2025 consubstancia em rigor uma decisão de adjudicação , logo, importava da mesma retirar as devidas e legais consequências, mormente determinar que os proponentes procedessem ao pagamento dos impostos devidos pela adjudicação concretizada e outrossim determinar que o AE procedesse ao agendamento da concretização da venda e respectivo formalismo de modo a efectivar a transmissão da propriedade do imóvel. Ora, ao considerar a Exmª Juiz a quo – no despacho recorrido – que “ A decisão junta pelo agente de execução com a notificação de 04.04.2025 não é uma verdadeira adjudicação, na medida em que faz depender a adjudicação de certas condições”, é ÓBVIO que a Exmª Juiz a quo como que indirectamente indefere o requerimento dos apelantes de 27/5/2025, ou, em última análise, entende estar em causa uma questão que se mostra prejudicada pela solução dada a outra, não se lhe impondo da mesma conhecer expressamente – cfr. artº 608º,nº2, do CPC. Destarte, e em rigor, não existe assim uma qualquer omissão de pronúncia. * 4.2.- Se a decisão proferida pelo AE e identificada em 1.5. supra ,de 4/4/2025, fixa de imediato qual a proposta aceite – a apresentada por C, e D- pelo encarregado da venda/agente de execução, consubstanciando em rigor uma verdadeira decisão de adjudicação. Como decorre do exposto no relatório do presente acórdão, consideram os recorrentes que a decisão proferida pelo AE e identificada em 1.5. supra ,de 4/4/2025, como que consubstancia em rigor uma verdadeira “decisão de adjudicação” do imóvel “penhorado” aos recorrentes/proponentes, pondo definitivamente termo aos trâmites da negociação particular que o AE vinha promovendo. Porque notificada tal decisão aos sujeitos processuais da execução [ exequente, executados e credores reclamantes ] e, não objecto de reclamação, é entendimento dos recorrentes/proponentes que a mesma consolidou-se nos autos, não podendo ser menosprezada, maxime continuando - após a respectiva prolação - o AE a aceitar novas propostas , e como que transformando a venda por negociação particular numa “venda particular em leilão contínuo” e sem fim à vista. Quid Juris ? Para começar, pacífico é que em face da conjugação do disposto nos artºs do CPC nºs 719.º, n.º 1 [ dispondo este sob a epígrafe de “ Repartição de competências”, que “Cabe ao agente de execução efetuar todas as diligências do processo executivo que não estejam atribuídas à secretaria ou sejam da competência do juiz, incluindo nomeadamente, citações, notificações, publicações, consultas de bases de dados, penhoras e seus registos, liquidações e pagamentos. ” ] e 723º, que cabe por regra ao agente de execução efectuar todas as diligências no processo executivo relacionadas com a venda dos bens penhorados, competindo-lhe designadamente garantir e regular o desenvolvimento do processo de venda. Pacífico é também que, praticado/consumado por agente de execução um qualquer acto/diligência inserido no âmbito da respectiva competência [ como o é v.g. uma decisão proferida no âmbito da realização da venda por negociação particular da qual tenha sido encarregado – cfr. artº 833º,nº2, do CPC ] funcional/legal, incumbe doravante ao sujeito [ seja parte, interveniente ou mesmo terceiro – cfr. artºs 631.º, n.º 2 e 30.º, n.º 1., ambos do CPC ] directa e efectivamente pelo mesmo afectado e interessado na respectiva eliminação, do mesmo RECLAMAR para o Juiz [ cfr. artº 723º,nº1, alínea c), do CPC ], cabendo a este último – e só a ele - o poder de revogação dos actos e decisões do agente de execução em termos correspondentes à revogação anulatória. (4) Não o fazendo, ou seja, se depois de notificado às partes, estas não reclamarem do acto notificando ou não impugnarem uma qualquer decisão perante o juiz, nos termos do artigo 723.º, n.º 1, alíneas c) ou d), do nCPC [ obrigatoriamente dentro do prazo peremptório que dispõem para esse efeito - cfr. artigo 149.º, n.º 1, do CPC ], inevitável é que ambos [ o acto e/ou a decisão do agente de execução, sendo que, é a própria alínea c) do n.º 1 do art. 723º do CPC que prevê dois meios distintos de defesa contra a actuação do agente de execução: a reclamação de actos deste e a impugnação das suas decisões ] se tornem definitivos , incontestáveis e inalteráveis, sendo já inatacáveis por iniciativa de qualquer das partes, podendo então falar-se a este propósito de um efeito vinculativo semelhante ao trânsito em julgado da decisão judicial. (5) O entendimento acabado de assinalar, é aquele que, estamos em crer, vem sendo sufragado consensualmente pelos tribunais de 2dª instância, para tanto recordando-se que este mesmo Tribunal da Relação de Lisboa e de resto em recente Acórdão de 12/5/2022 (6), decidiu/conclui nos seguintes termos : “ I - No âmbito do incidente de Reclamação dos Actos Executivos e Impugnação de Decisões do Agente de Execução, a conhecer pelo juiz de execução nos termos da alínea c), do nº. 1, do artº. 723º, do Cód. de Processo Civil, recai sobre o interessado requerente um ónus de concentração de todos os possíveis fundamentos do meio impugnatório ou de oposição, ou seja, deve o interessado, aquando da apresentação da reclamação, concentrar todos os fundamentos susceptíveis de contradizerem o teor do acto ou do decidido pelo agente de execução ; II– Pelo que, não o fazendo, ocorre o denominado efeito preclusivo temporal e consumativo desses fundamentos, conducente à estabilização do até então decidido, ou seja, forma-se caso estabilizado, tornando, neste segmento, definitiva a decisão do Agente de Execução, bem como inviabilizando a tempestividade da sua posterior invocação.(…)”. Em suma, pacífico é portanto que incumbindo ao agente de execução proceder - e quando a lei não disponha diversamente - e assegurar a realização dos actos necessários e dirigidos para a venda dos bens penhorados [ ainda que praticados após ouvidos o exequente, o executado e os credores com garantia sobre os bens a vender - cfr. artº 812º,nº1, do CPC ], e ,padecendo um qualquer dos referidos actos de uma qualquer desconformidade em “prejuízo” v.g. de uma parte, nada obsta a que seja o mesmo objecto de oportuna rectificação a requerimento do interessado, ou até de uma oportuna reclamação deduzida ao abrigo do artº 723º,nº1, alínea c), do CPC . Isto dito, e incidindo de seguida a nossa atenção sobre a decisão proferida pelo AE a 4/4/2025 [ decisão transcrita em 1.5. supra ] , certo é que do respectivo teor/conteúdo não se pode – como assim também o concluiu o Primeiro Grau – concluir estarmos na presença de uma efectiva decisão de adjudicação, e, muito menos, de decisão de adjudicação final e perentória. Na verdade, certo é que dos respectivos termos decorre expressis verbis, não que o bem imóvel é adjudicado, mas antes que estão reunidas as condições para que se concretize a adjudicação do bem ao proponente, o que porém apenas ocorrerá logo que se mostrem reunidas determinadas condições “ suspensivas”. Não é assim merecedora de censura o entendimento do Primeiro Grau no sentido de que “a decisão junta pelo agente de execução com a notificação de 04.04.2025 não é uma verdadeira adjudicação, na medida em que faz depender a adjudicação de certas condições”. Acresce que, o termo de adjudicação, em rigor, apenas se mostra pelo legislador empregue em outras modalidades de venda [ v.g. na venda meduante propostas em cara fechada – cfr. artº 827º,nº1, do CPC ] , que não na venda por negociação particular e, para todos os efeitos, do nº 2, do artº 811º, do CPC , não decorre a aplicação ao disposto no aludido nº1, do artº 827º do CPC às restantes modalidades de venda e , ademais, não existe decisão de adjudicação sem que antes mostre estar integralmente pago o preço e satisfeitas as obrigações dicais inerentes à transmissão. Mas, não configurando a decisão do AE identificada em 1.5. supra ,de 4/4/2025, uma verdadeira “decisão de adjudicação”, qual então o respectivo alcance e significado ? Claramente, a denominada decisão de adjudicação só pode querer querer dizer e/ou manifestar/comunicar qual a proposta que, uma vez “ Terminada a venda por negociação particular ” [ tal como consta expressis verbis da própria decisão de 4/4/2025, o que o mesmo é dizer, esgotado o “tempo” para a apresentação de propostas ], é pelo AE aceite [ termo/expressão empregue v.g. nos artºs 806º,nº1, 821º,nº1, 823º,nº2, 824º,nº2, todos do CPC ], maxime por ser aquela que oferece o maior preço. Neste conspecto, importa atentar que, se é verdade e compreensível que o encarregado da venda deve tentar obter sempre preço superior (7), certo é que o nº1, do artº 796º, do CPC, é peremptório em dizer que “ As diligências necessárias para a realização do pagamento efetuam-se obrigatoriamente no prazo de três meses a contar da penhora, independentemente do prosseguimento do apenso da verificação e graduação de créditos”, ou seja, não se pode manter o processo indefinidamente pendente, na esperança de os compradores/proponentes continuarem a apresentar propostas superiores [ ainda que em meras centenas de euros , como é o caso dos autos ], assim se prolongando as diligências de venda ad infinitum, em prejuízo claro está dos exequentes, que tardam em conseguirem o pagamento do crédito exequendo e obstando em última análise à realização da justiça que se pretende eficaz e em prazo razoável. Mas se assim é, como então analisar o comportamento do AE dos autos quando, logo após a prolação do despacho de 4/4/2025 e, não obstante neste último “comunicar” às partes que “Terminada a venda por negociação particular”, decidia pela aceitação da proposta [ porque a melhor proposta ] apresentada por C, e , D, como que implicitamente “dá o dito pelo não dito” ao equacionar [ perante a chegada de uma nova proposta datada de 9/4/2025 ( volvidos meros 5 dias após a decisão de aceitação ) , enviada por CC e pelo valor de €177.000,00€ - ou seja, mais 700,00€ ] “reabrir” [ porque já havia considerado/decidido que o tempo para o efeito tinha terminado ] novamente o “tempo” para a apresentação de “novas propostas”, como que reiniciando-se um novo ciclo ? Será que, em rigor, a decisão datada de 4/4/2025 e proferida pelo AE não pode já ser revertida – considerando-se que a mesma se consolidou, porque não objecto de impugnação/reclamação, obstando à apresentação posterior de novas propostas ? Vejamos. A venda – ainda que no âmbito da execução - por negociação particular, em rigor, consubstancia uma venda “extrajudicial” (8) , agindo a pessoa encarregue de a efetuar como “mandatário”. Que assim é di-lo – há muito – o Prof. JOSÉ ALBERTO dos REIS (9), explicando que “Assente que os bens devem ser vendidos por negociação particular, tem de designar-se pessoa que fique incumbida de efetuar o negócio (…)”. Esta, como mandatária “…procede como qualquer pessoa particular que se propõe fazer uma venda (…)”.“ O que carateriza a venda extrajudicial é que ela não se faz no tribunal (…)”. ”Não há, pois, que aplicar, uma regra formulada para a venda judicial” . Mais recentemente, vem A.M.FEREIRA CARVALHO (10) alinhar por semelhante entendimento [ outrossim acolhido por ANSELMO DE CASTRO (11) ] que a venda executiva constitui também um contrato de compra e venda, ainda que sui generis . E explica, “ É um contrato de compra e venda porque nela existem duas manifestações de vontade de sentido oposto mas convergente – a do Estado, no exercício de um poder, e a do adquirente, no exercício de um direito subjetivo –, ajustando-se na pretensão de produzir um resultado jurídico unitário - a transmissão da titularidade de um direito em contrapartida à transmissão do preço –, embora com um significado diferente para cada parte”. Mas acaba, adianta A.M.FEREIRA CARVALHO, “por receber características que o apartam do contrato de compra e venda voluntária – daí que se qualifique a venda executiva como uma compra e venda sui generis. De facto, quem aliena é o Estado, e fá-lo no exercício de um poder de jurisdição executiva (poder de autoridade originário), pelo qual vende o bem do devedor em nome próprio e não em representação ou substituição do mesmo, sobrepondo-se à vontade deste. Depois quem adquire fá-lo de livre vontade, no exercício de um direito subjetivo. A venda executiva é independente da vontade do executado, mas não é independente da vontade do adquirente. Quem adquire fá-lo porque quer. Logo, para o comprador, não existe nenhuma diferença entre a venda voluntária e a venda executiva .” Perante o acabado de expor, subscreve-se assim o entendimento já perfilhado por este Tribunal da Relação de Lisboa em Acórdão de 8/11/2012 (12), a saber, que “A venda judicial dum imóvel em processo de execução assume a natureza de venda civil, com algumas nuances, estando assim sujeita aos princípios gerais da compra e venda desta última”. De resto, de entendimento se trata que vem o próprio STJ também acolher, tendo designadamente em doutos Acórdãos de 3/11/2015 e de 7/9/2020 (13) vindo a concluir que : “ I - A venda por negociação particular, efectuada no âmbito da fase de liquidação do activo de um processo de falência, sendo uma modalidade de venda em processo executivo, é levada a cabo sem a participação do tribunal ; é feita "nos termos de uma venda privada", e que “II- “ Tendo sido apresentada proposta de compra do imóvel apreendido, acompanhada do pagamento de importância correspondente a 10% do preço e tendo essa proposta sido aceite, as partes estavam de acordo sobre todo o conteúdo negocial – acordo de facto ( não qualificável, no caso, como contrato-promessa ) cuja validade e eficácia estavam dependentes da formalização exigida por lei ”. Em suma, também na venda por negociação particular não se prescinde da existência de um acordo de vontades , a saber, a existência de uma proposta do interessado na aquisição do bem penhorado, seguida de uma aceitação pelo “incumbido”/encarregado da venda de efectuar a venda [ ainda que autorizado pelo tribunal, partes e juiz titular da acção executiva ], o que equivale a dizer que na execução a venda por negociação particular resulta também de um encontro ou fusão de vontades, e , a existir uma qualquer lacuna a preencher, tal só pode acontecer com o recurso à analogia e por aplicação do regime das alienações entre particulares (14) . Aqui chegados, e “descendo” ao que nos “informa” o processado nos autos , constata-se que no âmbito das diligências pelo AE encetadas com vista à venda por negociação particular do imóvel penhorado nos autos, recebeu o mesmo uma proposta ( de C e D) de aquisição do mesmo imóvel pelo valor de 176.300,00 euros [ o que decorre da factualidade inserta e descrita m 1.6. supra ]. Porque a referida proposta apresentada por C e Dera aquela que “oferecia” o maior valor para a aquisição, e considerando o AE como terminada a venda poe negociação particular, veio o mesmo a proferir decisão em 4/4/2025 de “aceitação” daquela [ o que decorre da factualidade inserta e descrita m 1.5. supra ]. Mais nos informa o processado nos autos, que pelo menos a 23/4/2025 [ cfr. expediente junto aos autos a 23/4/2025, sendo que de requerimento dirigido ao Exmº Juiz titular dos autos decorre o reconhecimento pelos proponentes do conhecimento da decisão de aceitação proferida pelo AE a 4/4/2025 ] têm já os proponentes C e D conhecimento de que a sua proposta foi pelo AE aceite. Isto dito, tendo presente o disposto no artº 224º,nº1, do CC [ “A declaração negocial que tem um destinatário torna-se eficaz logo que chega ao seu poder ou é dele conhecida; as outras, logo que a vontade do declarante se manifesta na forma adequada ” ], normativo este que, aludindo a declarações recipiendas e não recipiendas, certo é que relativamente às primeiras consagra o legislador os critérios da recepção e do conhecimento. Ou seja, “ Não se exige, por um lado, a prova do conhecimento por parte do destinatário ; basta que a declaração tenha chegado ao seu poder. O conhecimento presume-se neste caso júris et de jure . Mas, provado o conhecimento, não é necessário provar a recepção para a eficácia da declaração. (15) Dito de uma outra forma [ v.g. como refere Heinrich Ewald Horster (16) ] , “ é necessário e suficiente que se verifique um dos dois pressupostos enunciados – ou a chegada ao poder ou o conhecimento – para que a declaração se torne eficaz. Consequentemente, esta solução legal dá relevância jurídica, no sentido de originar a perfeição da declaração negocial àquele pressuposto que se verifica primeiro, combinando nesta medida a teoria da recepção (“…logo que chega ao poder …” )com a teoria do conhecimento ( “…logo que ….é dele conhecida )”. Perante acabado de expor, “licito” é então concluir-se que, pelo menos à data de 23/4/2025 [ neste conspecto, certo é que não nos informam os autos se o AE, em algum momento, notificou os proponentes de qualquer decisão por si tomada ] , se deve ter como concluído um negócio , bilateral, ou , um contrato, porque a uma proposta segue-se uma aceitação, existindo como que um consenso contratual, e do mesmo decorrendo para proponentes e AE um “regulamento vinculativo” . (17) Não obstante, certo é que, por despacho de 21/05/2025 [ identificado em 1.7. supra ] , que a 27/5/2025 é já do conhecimento dos proponentes [ cfr. factualidade descrita em 1.7. supra ] que o AE – senão o diz de forma expressa, pelo menos revela-o tacitamente ,cfr. artº 217º, nº1, do CC - não pretende dar seguimento à sua decisão de aceitação datada de 4/4/2025 [ cfr. factualidade descrita em 1.5. supra ] , antes reabre a fase de apresentação e avaliação de propostas. Em suma, prima facie e com o comportamento do AE consubstanciado no despacho que profere a 21/05/2025 , como que revoga [ dando o dito por não dito ] o mesmo a sua anterior decisão de aceitação proferida a 4/4/2025. O que dizer ? Ora, sobre a matéria rege o artº 235º, nº2, do CC, que “ A aceitação pode ser revogada mediante declaração que ao mesmo tempo, ou antes dela, chegue ao poder do proponente ou seja dele conhecida ”. Como ensinam Cfr. PIRES de LIMA e ANTUNES VARELA (18), prevalece no nº2, do artº 235º, do CC a teoria da recepção, nos termos em que se encontra formulada no artigo 224º, e harmoniza-se com a doutrina, já aplicada no nº2 do artigo 230º, de que, recebida ao mesmo tempo, pelo destinatário, ou sendo dele conhecidas simultaneamente, a rejeição e a aceitação, prevalece a última decisão do proponente. Aplicando a referida teoria ao caso dos autos, e considerando que a revogação pelo AE da aceitação da proposta dos ora apelantes/proponentes chega ao conhecimento dos últimos muito depois da última, inevitável é conclui que a declaração de revogação do AE é ineficaz [ porque a proposta é irrevogável , mantendo-se válida ], impondo-se que o AE “respeite” a decisão que tomou a 4/4/2025, designadamente diligenciando pela outorga da escritura de compra e venda [ o que obriga também ao cumprimento pelos proponentes do disposto no artº 833º,nº4, do CPC ] . Destarte, inevitável é a revogar a decisão recorrida, a qual deverá ser substituída por outra que determine que o AE concretize a venda do imóvel penhorado em observância da proposta apresentada – e aceite - pelos apelantes C e D. (19) Tudo visto e ponderado, e em face de tudo o supra exposto, a apelação procede in totum. *** 4 – Sumariando ( cfr. nº 7, do artº 663º, do cpc ) . 4.1. -A venda judicial por negociação particular de um imóvel em processo de execução assume a natureza de venda civil, com algumas nuances, estando assim sujeita aos princípios gerais da compra e venda desta última; 4.2.- De acordo com a teoria da recepção da declaração negocial, situada numa posição intermédia entre a da expedição e a do conhecimento, o AE fica vinculado à decisão proferida de aceitação de concreta proposta logo que tal declaração de aceitação chegue ao poder dos proponentes , ou dos mesmos é conhecida; 4.3. – A revogação pelo AE da sua decisão de aceitação de uma proposta de aquisição só é eficaz – em face dos proponentes - se chega ao conhecimento dos proponentes ao mesmo tempo, ou antes da declaração de aceitação que também proferiu. *** 5.- Decisão. Em face de tudo o supra exposto, acordam os Juízes na 6ª Secção Cível, do Tribunal da Relação de LISBOA, em, concedendo provimento à apelação de C e de D: 5.1. - Revogar a decisão apelada; *** Sem custas . *** (1) Cfr. v.g. o Ac. do STJ de 6/5/2004, disponível in www.dgsi.pt. (2) In Código de Processo Civil Anotado, Vol. 2º, pág. 670. (3) Cfr. ANTÓNIO SANTOS ABRANTES GERALDES, Juiz-Conselheiro do Supremo Tribunal de Justiça, in sentença Cível, texto-base da intervenção efectuada nas “Jornadas de Processo Civil” organizadas pelo CEJ, em 23 e 24 de Janeiro de 2014.). (4) Cfr. J. H. DELGADO DE CARVALHO, em Jurisdição e Caso Estabilizado, Quid Juris, 2017, págs. 158,159 e 187. (5) Cfr. J. H. DELGADO DE CARVALHO, ibidem, págs. 184/187. (6) Acórdão proferido no Processo nº 2554/15.8T8PDL-E.L1-2, e acessível em www.dgsi.pt. (7) Cfr. J.J. Baptista, em Acção Executiva, 3ª Edição, Universidade Lusíada, pág. 169: (8) Cfr. Lopes-Cardoso, em Manual da acção executiva, pág. 574. (9) Em Processo de Execução, vol. II, reimpressão, 1985, pág. 325 e artigo 833º, nºs 1 e 2º., do Código de Processo Civil. (10) Em Efeitos Substantivos da Venda Executiva de Imóvel Arrendado no Ordenamento Jurídico Português Actual, em Dissertação apresentada no âmbito do 2º Ciclo de Estudos em Direito da Faculdade de Direito da Universidade de Coimbra, área de especialização em Ciências Jurídico-Civilísticas/menção em Direito Civil e acessível em https://estudogeral.uc.pt/ . (11) Em a Acção Executiva Singular, Comum e especial, Coimbra Editora, 2ª ed., pág. 210. (12) Proferido no Processo nº 187/03.0TBTVD-C.L1-2 e estando acessível em www.dgsi.pt. (13)Proferidos , respectivamente, nos Processos nº 784/03.4TBTM-AR.C1.S1 e 285/04.3TBVLN-T.G1.S1, e estando ambos acessíveis em www.dgsi.pt. (14) Vide v.g. o Ac. do STJ de 6/7/1976, proferido no Processo nº 066372 e estando acessível em www.dgsi.pt e em BMJ Nº 259 , ANO 1976, Pág. 177. (15) Cfr. PIRES de LIMA e ANTUNES VARELA, em CC Anotado, 2dª Edição , pág. 199. (16)Em“Sobre a formação do contrato Segundo os arts. 217.º e 218º, 224.º a 226.º e 228.º a 235.º do Código Civil, na Revista de Direito e Economia, Ano IX, Nºs 1-2, 1983, a pág.s 135 e 136. (17) Cfr. ENZO ROPPO, em O Contrato, Almedina, pág. 73. (18) Em CC Anotado, 2dª Edição , pág. 207. (19) Apreciando questão algo semelhante com a dos presente autos, vide o Acórdão do tribunal da Relação de Lisboa, de 8/11/2012, Proferido no Processo nº 187/03.0TBTVD-C.L1-2 e acessível em www.dgsi.pt. *** Lisboa, 23/10/2025 António Manuel Fernandes dos Santos Carlos Miguel Santos Marques Nuno Gonçalves  |