Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa | |||
Processo: |
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Relator: | CARLOS OLIVEIRA | ||
Descritores: | CONTRATO DE EMPREITADA CONTRATO DE SUBEMPREITADA RESPONSABILIDADE CONTRATUAL CONDENAÇÃO SOLIDÁRIA COLIGAÇÃO DE RÉUS ADMISSIBILIDADE | ||
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Nº do Documento: | RL | ||
Data do Acordão: | 09/27/2022 | ||
Votação: | UNANIMIDADE | ||
Texto Integral: | S | ||
Texto Parcial: | N | ||
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Meio Processual: | APELAÇÃO | ||
Decisão: | PROCEDENTE | ||
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Sumário: | 1.–Subsiste ainda hoje a discussão doutrinária e jurisprudencial sobre a distinção entre o litisconsórcio voluntário e a coligação no que se refere ao dualismo a entre unidade e pluralidade de pedidos, tal como parece decorrer do Art. 36.º n.º 1 do C.P.C., ou o dualismo entre unidade e pluralidade de relações materiais contravertidas, tal como resulta dos Art.s 32.º e 33.º do C.P.C.. 2.–Verificando-se a cumulação de um pedido de condenação solidárias das R.R. fundada em responsabilidade contratual (Art.s 798.º e ss. do C.C.) - esta resultante da prática de factos ilícitos relativos à execução de contrato de empreitada, imputáveis, quer à 1.ª R., enquanto dona da obra, quer à 2.ª R. que, mesmo sendo terceira a esse contrato, interferiu diretamente na sua execução e alegadamente assumiu as responsabilidades da dona de obra (1.ª R.), com conivência desta -, com outros 3 pedidos de pagamento dirigidos apenas à 1.ª R., relativos a retribuições devida pelos trabalhos executados no âmbito do mesmo contrato, verifica-se uma conexão substancial suficientemente relevante entre os vários pedidos para justificar a coligação de réus. 3.–A causa de pedir é fundamentalmente a mesma relativamente aos dois grupos de pedidos considerados, porque todos emergem do modo de execução e cumprimento do mesmo contrato de empreitada, na vertente da pontualidade e proficiência na execução dos trabalhos nele integrados, por um lado, e no da correspetiva retribuição devida pela execução dos mesmos, por outro. 4.–Mesmo eventualmente se pudesse considerar que existiam causas de pedir diversas, na medida em que se poderia sustentar que pedido de indemnização se funda na responsabilidade contratual prevista no Art. 798.º do C.C., enquanto que os restantes pedidos de pagamento seriam apenas pretensões relativas à mera exigência de cumprimento do contrato, nos termos do Art. 406.º n.º 1 do C.C., sempre teríamos de admitir que a procedência de todos esses pedidos depende essencialmente da apreciação dos mesmos factos, que se relacionam sempre com a efetiva execução do mesmo contrato, tal como a relação material controvertida foi configurada pela A.. Ou seja, ainda que a situação concreta dos autos pudesse não preencher a previsão do Art. 36.º n.º 1 do C.P.C., certamente que cairia no âmbito do n.º 2 do mesmo preceito. 5.–O Art. 37.º n.º 4 do C.P.C. permite ao tribunal não autorizar a coligação se entender que, não obstante se verificarem os respetivos requisitos formais e substanciais, há inconveniente grave em que as causas sejam instruídas, discutidas e julgadas conjuntamente. 6.–Não se trata de um poder discricionário, porque não há liberdade de escolha da solução a adotar, mas sim um juízo sindicável sobre a conveniência técnica da separação da instrução, discussão e julgamento das causas, sendo necessário que se verifique “inconveniente grave” quanto a qualquer dessas 3 fases consideradas (instrução, discussão ou julgamento). 7.–Não se verificando esse inconveniente grave, prevalecem as vantagens da coligação de réus que decorrem da circunstância de estarmos perante várias ações que, por razões de economia processual, são todas tramitadas e julgadas no mesmo processo, pois com os mesmos meios garante-se uma administração da justiça mais eficiente e célere, e assegura-se uma maior justiça relativa, através da uniformidade de decisão do essencial das questões jurídicas suscitadas, preservando-se, por esta via, o prestígio dos tribunais. | ||
Decisão Texto Parcial: | ![]() | ||
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Decisão Texto Integral: | Acordam os Juízes na 7ª Secção do Tribunal da Relação de Lisboa: I–RELATÓRIO A veio intentar a presente ação de condenação, em processo declarativo comum, contra B (1.ª R.) e C Atlantisavana, Lda. (2.ª R.), pedindo a condenação das R.R. na restituição da posse do prédio identificado nos autos e no pagamento da quantia de €417.996,00; devendo a 1.ª R. ainda ser condenada na devolução do montante de €66.604,36, por si indevidamente retido; no pagamento de €13.114,90, referentes ao auto de medição de Outubro de 2020; e no pagamento da quantia de €110.051,91, a título de faturas vencidas e não pagas. Para tanto alegou ter celebrado, na qualidade de empreiteira, um contrato de empreitada com a 1.ª R., esta na qualidade de dona da obra, invocando o incumprimento por parte da última e reclamando assistir-lhe o direito de retenção sobre o prédio da obra para garantia do crédito que detém sobre a dona da obra em virtude desse incumprimento. Mais alegou ter celebrado com a 2.ª R. um contrato de subempreitada e um contrato de fornecimento de material para a obra, por indicação da 1.ª R., imputando também àquela a responsabilidade pelos atrasos no desenrolar da obra, sendo que também teria tomado decisões e dado instruções quanto à sua execução, verificando-se uma situação de promiscuidade entre as R.R.. Ambas as R.R. contestaram autonomamente e deduziram pedidos reconvencionais. Findos os articulados, afigurando-se à Mm.ª Juíza que não se verificavam os requisitos da coligação passiva de R.R., nos termos do disposto pelos Art.s 3.º n.º 3, 36.º, e 37.º n.º 4 do C.P.C., e que, mesmo que assim se não entendesse, existiria grave inconveniente na coligação das R.R., foram as partes notificadas para se pronunciarem sobre essa questão. A A. pronunciou-se somente sobre os incidentes de intervenção principal que entretanto deduziu e as R.R. nada disseram. Posteriormente foi a A. notificada, nos termos dos Art.s 36.º , 37.º n.º 4 e 38.º n.º 2 e n.º 3 do C.P.C., para em 10 dias vir indicar quais os pedidos que deveriam continuar a ser apreciados no processo, se aqueles formulados contra a 1.ª R.. B, se aqueles formulados contra a 2.ª R., Atlantisavana, sob pena de, não o fazendo, as R.R. serem absolvidas da instância quanto a todos eles. Em resposta a A. veio consignar que não poderia fazer pedidos diferentes daqueles que já havia feito na petição inicial, dado a promiscuidade existente as R.R. e, como tal, não conseguiria fazer pedidos distintos, apenas podendo pedir a condenação solidária de ambas as R.R. nos termos já efetuados. Logo de seguida é proferida sentença que julgou verificar-se coligação ilegal de R.R., porquanto a responsabilidade civil de ambas emerge de relações contratuais diferentes e factos ilícitos diversos, logo assentando em causas de pedir autónomas. Por outro lado, em qualquer caso, sustentou também que sempre existiria grave inconveniente em ambas as causas poderem ser instruídas, discutidas e julgadas conjuntamente, sendo que a A. também não optou pelas pretensões que deveriam ser apreciadas. Com estes pressupostos julgou que se impunha no caso a absolvição das R.R. da instância, o que decidiu, ficando prejudicada a apreciação dos pedidos reconvencionais, o que teve como consequência a declaração de extinção da lide. É dessa sentença que a A. vem agora recorrer, apresentando no final das suas alegações de recurso as seguintes conclusões: DO OBJETO DO RECURSO 1–Vem a A./Recorrente recorrer da sentença do Tribunal “a quo” por não se conformar com a mesma a qual decidiu absolver as Rés da instância e, por consequência, julgou extinta a presente lide. 2–No entender da Recorrente, o Tribunal “a quo” para além de ter proferido uma sentença que padece de nulidade nos termos da alínea d) do n.º 1 do art. 615.º do C.P.C, fez também uma incorreta interpretação e aplicação dos artigos 36.º, 37.º e 38.º do C.P.C. Senão vejamos: DA NULIDADE DA SENTENÇA- OMISSÃO DE PRONUNCIA NOS TERMOS DA ALÍNEA D) DO N.º 1 DO ART. 615.º DO C.P.C 3–A ora Recorrente intentou uma ação declarativa de condenação contra a sociedade B e a sociedade C. tendo efetuado os seguintes pedidos: – Serem ambas as RRs. solidariamente condenadas a: a.-Restituir a posse à A. do prédio sito na Rua ....., n.º ..., ..., ..., ..., ..., ... e ..., concelho de Lisboa, descrito na Conservatória do Registo Predial de Lisboa, freguesia de S. ....., inscrito na matriz predial sob o artigo ..., freguesia de S. ..... . b.-Indemnizar a A. pelos sobrecustos contabilizados no montante global de 417.996,00€. – Ser a 1.ª R. (B) ser condenada a: a.-Devolver o montante de 66.604,36 retido indevidamente pela 1.ª R. (B) b.-Pagar o montante de 13.114,90€. referente ao auto de medição de Outubro de 2020. c.-Liquidar as faturas vencidas e não liquidadas no montante total de 110.051,91. 4–Ora, o Tribunal “a quo” decidiu absolver as rés da instância sem ter apreciado nenhum dos pedidos formulados pela Recorrente na sua petição inicial. 5–Sem mais, o Tribunal “a quo” não apreciou o pedido efetuado pela Recorrente quanto à condenação da Ré B no pagamento das seguintes quantias: - da quantia de €66.604,36 retido indevidamente pela B; - da quantia de €13.114,90 referente ao auto de medição de outubro de 2020; - da quantia de €110.051,91 referente ás faturas vencidas e não liquidadas. 6–A ação, tal como estava delimitada pela Recorrente, permitia que o Tribunal “a quo” prosseguisse com os presentes autos para, pelo menos, apreciar os pedidos mencionados no ponto anterior. 7–No entanto, lamentavelmente não o fez e decidiu absolver os RRs. da instância. 8–As causas de nulidade da Sentença (e dos restantes despachos – artº 613º nº 3 do Código de Processo Civil) vêm taxativamente enunciadas no artº 615º nº 1 do Código de Processo Civil, onde se estabelece que é nula a sentença (ou despacho) quando: - Não contenha a assinatura do juiz (al. a)). - Não especifique os fundamentos de facto e de direito que justificam a decisão (al. b)). - Os fundamentos estejam em oposição com a decisão ou ocorra alguma ambiguidade ou obscuridade que torne a decisão ininteligível (al. c)). - O juiz deixe de pronunciar-se sobre questões que devesse apreciar ou conheça de questões de que não podia tomar conhecimento (al. d)). - Condene em quantidade superior ou em objeto diverso do pedido (al. e)). 8–Com efeito, resulta do regime previsto neste preceito (art. 608 n.º 2 do C.P.C) que o Juiz na Sentença (e nos despachos) “deve resolver todas as questões que as partes tenham submetido à sua apreciação, excetuadas aquelas cuja decisão esteja prejudicada pela solução dada a outras; não pode ocupar-se senão das questões suscitadas pelas partes, salvo se a lei lhe permitir ou impuser o conhecimento oficioso de outras”. 9–A nulidade prevista na alínea d) do n.º 1 do mesmo artigo 668.º, diretamente relacionada com o comando do art. 660.º, n.º 2, servindo de cominação ao seu desrespeito, só existe quando a sentença deixa de conhecer de questões que devia decidir e não também quando deixa de se pronunciar acerca de razões ou argumentos produzidos na defesa das teses em presença (Ac. STJ, de 5.5.2005: Proc. 05B839.dgsi.Net). 10–O Tribunal “ a quo” estava na posse de todos os factos e de toda a prova que permitia que o processo prosseguisse para que os pedidos formulados pela Recorrente fossem apreciados. 11–Ou seja, a sentença não se pronunciou sobre questões sobre as quais tinha de apreciar o que, a nossa entender, conduz a uma nulidade da sentença, nos termos do art. 615.º n.º 1 alínea d) do C.P.C. DA ILEGALIDADE DA DECISÃO- VIOLAÇÃO DO ARTIGO 36.º DO C.P.C. 12–O Tribunal “a quo” determinou que as questões a apreciar seriam as seguintes: - “Da ilicitude da coligação de Rés face ao disposto no art. 36.º, n.º 1, do C.P.C. - Da ilicitude da coligação de Rés face ao disposto no artigo 36.º, n.º 2, do C.P.C. - Da inconveniência grave da coligação das Rés - Da recusa da A. em escolher o pedido a apreciar.” 13–Dispõe o artigo 36.º do C.P.C o seguinte: i.-É permitida a coligação de autores contra um ou vários réus e é permitido a um autor demandar conjuntamente vários réus, por pedidos diferentes, quando a causa de pedir seja a mesma e única ou quando os pedidos estejam entre si numa relação de prejudicialidade ou de dependência. ii.-É igualmente lícita a coligação quando, sendo embora diferente a causa de pedir, a procedência dos pedidos principais dependa essencialmente da apreciação dos mesmos factos ou da interpretação e aplicação das mesmas regras de direito ou de cláusulas de contratos perfeitamente análogas. iii.-É admitida a coligação quando os pedidos deduzidos contra os vários réus se baseiam na invocação da obrigação cartular, quando a uns, e da respetiva relação subjacente, quanto a outros. 14–O Tribunal “a quo” entende que não estão verificados os requisitos do art. 36.º do C.P.C uma vez que, de acordo com o seu entendimento, a causa de pedir não é a mesma em relação à ré B por um lado e à ré Atlantisavana por outro. 15–Na parte do relatório da sentença, o Tribunal “a quo” refere que a Recorrente alegou ter celebrado na qualidade de empreiteira um contrato de empreitada com a B, esta na qualidade de dona de obra, invocando o incumprimento por parte da última e reclamando assistir-lhe o direito de retenção da obra para garantia do crédito que detém em virtude desse incumprimento sobre a dona da obra, bem como alegou ter celebrado com a Atlantisavana um contrato de subempreitada imputando à mesma responsabilidade pelos atrasos no desenrolar da obra. 16–Ora, o entendimento do Tribunal está completamente errado. Senão Vejamos: 17–Os dois contratos celebrados pela Recorrente (contrato de empreitada celebrado entre a A e a B e o contrato de subempreitada celebrado entre a A e a C apresentam interdependência entre os seus intervenientes quer em termos de execução quer em termos de pagamento. 18–Aliás, consta no contrato celebrado entre a Recorrente e a sociedade C que a A “se compromete a realizar todas as obras projetadas, e na sua execução deve seguir as instruções técnicas que o Proprietário da Obra ou seu representante lhe indicará e todo o trabalho relacionado deverá ser devidamente executado”. - cfr. art. 38.º e documento 2 da petição inicial. 19–Por outro lado, também existia interdependência em relação aos pagamentos dos materiais uma vez que o contrato celebrado entre a Recorrente e a C estabelecia o seguinte: - A C fatura o valor do material entregue e dos serviços prestados à A; - A A cobra o mesmo valor da fatura à B; - A B paga à C o valor das faturas emitidas referente aos materiais e à A e em nome desta; - Após o pagamento da B à C, a A não paga o valor das faturas de materiais à C (o saldo da conta entre a A e a B será “0”- (cfr. artigo 39.º da petição inicial) 20–Para além disso, se é verdade que existe um contrato de empreitada celebrado entre a Recorrente e a sociedade B e um outro contrato de subempreitada celebrado entre a Recorrente e a C, é também verdade que a C, por diversas vezes, atuava como empreiteiro substituindo-se à sociedade B. 21–Ou seja, a C funcionava como dona de obra em conjunto com a sociedade B. 22–Todos estes factos, foram alegados pela Recorrente na sua petição inicial, nomeadamente nos artigos 27.º, 29.º, 30.º, 35.º, 36.º, 37.º, 38.º, 39.º, 40.º a 43.º e 105.º. 23–No entanto, o Tribunal “a quo” fez tábua rasa dos mesmos. 24–Na petição inicial, a ora Recorrente salientou a relação de promiscuidade existente entre ambas as RRs (B e C) uma vez que todas as instruções e decisões eram dadas pela Ré C e não pela R. B tal como seria normal pois era esta efetivamente a dona de obra. (cfr. art. art 181.º da petição inicial). 25–O contrato de empreitada celebrado entre a Recorrente e a B e o contrato de subempreitada celebrado entre a Recorrente e a C foram celebrados e negociados em conjunto entre todos os intervenientes, na mesma reunião e estão numa relação de dependência. Tanto que, na data em que foi celebrado o contrato de empreitada entre a Recorrente e a R. B, a Ré C estava também presente. 26–A R. B, exigiu que a A. celebrasse um contrato de subempreitada com a R. C e a R. C sempre fez parte das negociações de preparação e negociação do contrato de empreitada celebrado entre a A. e a R. B. 27–Elucidativo disso é o facto de que, aquando da assinatura do contrato de empreitada celebrado pelo preço global de €1.905.000,00 (cfr. cláusula décima terceira, n.º 1 do contrato de empreitada - Doc.1 junto pela A. na petição inicial), na cláusula das garantias a A. apenas presta à R. B uma garantia de €1.380.000,00 (um milhão e trezentos e oitenta mil euros). 28– Ou seja, na realidade a A. apenas iria ser paga pela R. B pela quantia de €1.380.000,00 (um milhão trezentos e oitenta mil euros). 29–A quantia remanescente de € 525.000,00 seria paga diretamente pela R. B à R. C, aliás, este valor é exatamente o valor da proposta da R. Altisavana à A. para o fornecimento de materiais e subempreitada. 30–Foi por isto que, nos termos do n.º 4 da cláusula décima primeira estabeleceu-se que a título de garantia do bom e integral pagamento, a R. B apenas iria proceder à retenção de 5 % (cinco por cento) do valor dos pagamentos a efetuar à A. e não pela totalidade da obra como é usualmente efetuado neste tipo de contratos. (cfr. página 11 do Doc.1 junto pela A. na sua petição inicial). 31–Contratualmente, a relação entre a A. e ambas as RRs deveria ter o seguinte esquema: B ------------------------» A ------------------» C (Dono de Obra) contrato de empreitada Contrato subempreitada 32–No entanto, não foi esta realidade que se passou no decurso da obra. Isto porque no decurso da obra quem assumiu o papel de dono de obra foi a R. C e não a R. B como seria suposto ser. 33–Esquematicamente tínhamos o seguinte esquema: Donos de obra: Empreiteiro: B/C ----------------------» A 34–O Tribunal não pode apenas apreciar este processo do ponto de vista da sequência contratual, mas sim da realidade/factualidade efetivamente existente no decurso de toda a obra e que se encontra totalmente alegada pela Recorrente na sua petição inicial. 35–Para além disso, a Recorrente foi esbulhada da posse do prédio por ambos os gerentes das RR. em comunhão de esforços. 36–Por tudo isto, é da mais cristalina evidência que a causa de pedir é a mesma e única relativamente à ré B e à Ré C. 37–Tendo em conta que estamos perante a mesma causa de pedir, estão verificados os requisitos do artigo 36.º do C.P.C e, como tal, teria de ocorrer a coligação das Rés nos termos do n.º 1 do art. 36.º do C.P.C. 38–Mesmo que se entenda que a causa de pedir seja diferente, o que só por mera cautela de raciocínio se admite, nada obsta a que fosse feita a coligação nos termos do n.º 2 do art. 36.º do C.P.C. A norma do n.º 2 do art. 36.º do C.P.C não exige que a causa de pedir seja a mesma e única. A causa de pedir pode ser diferente, se a procedência dos pedidos principais depender essencialmente da apreciação dos mesmos factos ou da interpretação e aplicação das mesmas regras de direito. 39–Ora, é o que se passa no âmbito dos presentes autos. Os factos que integram a causa de pedir contra a Ré B são praticamente os mesmos que integram a causa de pedir contra a Ré C. 40–Desde logo, importa referir que a utilização, pelo legislador do advérbio “essencialmente” na norma inserta no n.º 2 do artigo 36.º do Código de Processo Civil, deve interpretar-se como sinónimo de “principalmente”, “predominantemente”, de modo a justificar a coligação e a finalidade desta figura jurídica. 41–Assim, mesmo que se entenda que a causa de pedir contra a B é diferente da causa de pedir contra a Ré C, a coligação das Rés teria de ocorrer por força da aplicação do n.º 2 do art. 36.º do C.P.C, uma vez que a procedência dos pedidos depende essencialmente da apreciação dos mesmos factos e da interpretação e aplicação das mesmas regras de direito. 42–Conforme resulta de tudo o que acima foi exposto, estão completamente verificados os requisitos do n.º 1 e n.º 2 do art. 36.º do C.P.C e, por consequência, teria de ocorrer a coligação das Rés. 43–Pelo que, o tribunal “a quo” ao absolver os RRs da instância violou o disposto no art. 36.º do C.P.C. DA INCORRECTA APLICAÇÃO DO ART. 37.º N.º 4 DO C.P.C E DO ARTIGO 38.º DO C.P.C 44–Consta ainda da fundamentação da sentença da qual a Recorrente agora recorre o seguinte: “Por ultimo, e mesmo que assim não sucedesse, a diversidade dos factos e a extensão dos articulados, a dedução por cada uma das Rés de pedidos reconvencionais fundados em factualidade diversa, com a possibilidade de cada uma das partes utilizar a faculdade prevista no artigo 510.º do C.P.C de oferecer 10 testemunhas para prova/ contra-prova da ação e da reconvenção e a atividade probatória necessária revela-se complexa e demorada, e por conseguinte sempre existiria grave inconveniente em que ambas as causas sejam instruídas, discutidas e julgadas conjuntamente. Consequentemente, e nos termos preconizados pelos artigos 36.º, 37.º, n.º 4, e 38.º, n.º 2 e n.º 3 do C.P.C. a pretendida coligação de réus e ilegal, e mesmo que assim não fosse julga-se existir inconvenientemente grave em que ambas as causas sejam instruídas, discutidas e julgadas conjuntamente.” 45–Mais uma vez, a ora Recorrente discorda dos fundamentos do Tribunal “a quo”. 46–O Tribunal “a quo” não pode eximir-se a decidir uma causa apenas porque a atividade probatória se revela extensa e demorada. 47–De facto, a atividade probatória irá ser extensa e demorada, mas os pedidos formulados pela Autora terão de ser apreciados numa só ação porque só assim faz sentido. 48–Ora, tendo em conta que estamos perante a mesma causa de pedir contra ambos os RRs, bem como a procedência dos pedidos depende essencialmente da apreciação dos mesmos factos e da interpretação e aplicação das mesmas normas legais, afigura-se que há um manifesto ganho em termos de economia processual que a atividade judiciária se desenvolva num único processo. 49–Com notória economia de meios, é possível apreciar as pretensões deduzidas contra ambos os RRs, salvaguardar a eficiência do contraditório e viabilizar uma decisão uniforme em matéria de direito. 50–O princípio da economia processual exige que em cada processo se resolva o maior número de litígios. 51–Ora, a coligação dos RRs, no caso vertente, traduz-se numa manifesta vantagem de economia processual. Com os mesmos meios, garante-se uma administração da justiça mais eficiente e célere, e assegura-se uma maior justiça relativa, através da uniformidade de decisão do essencial quanto aos factos subjacentes a ambos os pedidos formulados quanto às RRs. preservando-se, por esta via, o prestígio dos Tribunais. 52–Por último, acresce referir que o Tribunal “a quo” é absolutamente competente para todos os pedidos formulados pela Recorrente, nos termos do artº 37º nº 1 do Código de Processo Civil. 53–Por outro lado, a forma de processos é a mesma para todos os pedidos cumulados (1ª parte do artº 37º nº 1 do Código de Processo Civil). 54–Pelo que, também estão verificados os requisitos formais da coligação. 55–A verdade é que, nada obstava a que ambos os pedidos fossem deduzidos nos mesmos autos, o que até se impunha, atento o princípio da economia processual. 56–A Recorrente nunca se recusou a escolher o pedido a apreciar. A Recorrente só não o fez pois não podia fazer pedidos diferentes daqueles que já tinha feito na petição inicial. 57–Aliás, a Recorrente justificou o motivo pelo qual não conseguia escolher os pedidos a apreciar e o motivo pelo qual não intentava ações distintas contra a Ré B e a Ré C. 58–Conforme a Recorrente já acima mencionou, a ação intentada pela ora Recorrente nunca poderia derivar em duas ações distintas pois tal situação prejudica a realização de justiça no caso em concreto. 59–O Tribunal “a quo” ao rejeitar a coligação dos RRs e absolver os RRs da instância, violou os artigos 36.º e 37.º do C.P.C sem fundamento razoável para tal. Pede assim que o recurso seja julgado por procedente, revogando-se a sentença recorrida e ordenando-se a baixa dos autos à 1.ª instância a fim de aí prosseguirem os seus trâmites. Ambas as R.R. responderam ao recurso separadamente, apresentando contra-alegações. A 1.ª R., B, apresentou as seguintes conclusões: 1.–A sentença em crise não padece de qualquer vício invocado pela Recorrente, 2.–Encontra-se bem estruturada e fundamentada, 3.–Não se verificando qualquer nulidade ou ilegalidade da mesma. 4.–Com efeito, as causas de pedir invocadas pela Recorrente contra as Recorridas são distintas e independentes, 5.–Não existindo também qualquer relação de prejudicialidade ou dependência dos pedidos, 6.–E muito menos dos factos que decorrem das diferentes causas de pedir, 7.–E que geraram pedidos distintos e independentes, 8.–Radicados em factos (causa de pedir) distintos, 9.–Aos quais são igualmente aplicáveis regras legais diferentes, 10.–Em nada se confundindo o contrato de empreitada celebrado apenas entre a Recorrente com a aqui Recorrida B, 11.–Ao qual a Recorrida C é completamente alheia, 12.–Com o contrato de compra de material celebrado entre apenas entre a Recorrente e a Recorrida C, 13.–Ao qual a aqui Recorrida B é completamente alheia, 14.–Ignorando quem, e em que eventuais termos, incumpriu este último contrato, no qual nunca, em nenhum momento e a qualquer título, teve qualquer participação. 15.–Não estão, assim, reunidos os requisitos legais para a coligação das Recorridas, 16.–Conforme bem decidiu a Meritíssima Juiz a quo, 17.–Devendo tal decisão ser integralmente confirmada. A 2.ª R., C, não apresentou conclusões, mas defendeu igualmente a confirmação da decisão recorrida. Ambas pediram assim que o recurso fosse julgado improcedente e a sentença recorrida fosse confirmada. Ao admitir o recurso de apelação, a Mm.ª Juíza, debruçando-se sobre a alegada nulidade da sentença recorrida, deixou consignado o seguinte: «A A. veio arguir a nulidade da sentença com fundamento na alínea d) , do nº1 do artigo 615º do C.P.C. , invocando existir omissão de pronúncia. «Fundou a existência da invocada nulidade alegando que o tribunal “ decidiu absolver as rés da instância sem ter apreciado nenhum dos pedidos formulados pela Recorrente na sua petição inicial” . «No entanto o tribunal julgou procedente uma exceção dilatória, a coligação ilegal das Rés. «Ora, conforme estatui o artigo 576º , nº 2 , do C.P.C. , as exceções dilatórias obstam a que o tribunal conheça do mérito da causa e dão lugar à absolvição da instância ou à remessa do processo para outro tribunal. «Indefere-se assim a arguida nulidade». * II–QUESTÕES A DECIDIR Nos termos dos Art.s 635.º n.º 4 e 639.º n.º 1 do C.P.C., as conclusões delimitam a esfera de atuação do tribunal ad quem, exercendo uma função semelhante à do pedido na petição inicial (vide: Abrantes Geraldes in “Recursos no Novo Código de Processo Civil”, Almedina, 2017, pág. 105 a 106). Este Tribunal não pode, no entanto, conhecer de questões novas que não tenham sido anteriormente apreciadas porquanto, por natureza, os recursos destinam-se apenas a reapreciar decisões proferidas (Vide: Abrantes Geraldes, Ob. Loc. Cit., pág. 107). Assim, em termos sucintos, as questões a decidir, tal como suscitadas nas alegações de recurso, são as seguintes: a)-A nulidade da sentença por omissão de pronúncia (Art. 615.º n.º 1 al. d) do C.P.C.); b)-A inexistência de coligação ilegal de R.R. (Art. 36.º n.º 1 e n.º 2 do C.P.C.); c)-A inexistência de obstáculos à coligação por inconveniência do julgamento em conjunto das causas (Art. 37.º n.º 4 do C.P.C. e Art. 38.º do C.P.C.). Corridos que se mostram os vistos, cumpre decidir. * III–FUNDAMENTAÇÃO DE FACTO A decisão recorrida não fixou a factualidade que relevou, mas é patente que ela resulta da mera análise dos articulados das partes que sucintamente sumariou, tal como consta do relatório do presente acórdão, e que se mostram devidamente documentados nos autos. * Tudo visto, cumpre apreciar. IV–FUNDAMENTAÇÃO DE DIREITO Fixadas as questões que fazem parte do objeto da presente apelação, cumpre então delas tomar conhecimento, começando inevitavelmente, por evidente precedência lógica sobre as demais, pela questão da nulidade da sentença recorrida. 1.–Da nulidade da sentença por omissão de pronúncia. A Recorrente veio defender a nulidade da sentença recorrida por entender que o Tribunal a quo tinha todos os elementos necessários ao conhecimento do mérito da causa e não decidiu os pedidos que formulou na sua petição inicial. Ambas as Recorridas realçaram que perante a correção do julgamento sobre a existência de coligação ilegal de R.R., tal como estabelece ao Art. 577.º al. f) do C.P.C., sendo que se trata de exceção dilatória de conhecimento oficioso (cfr. Art. 578º do C.P.C.) que obstaria à apreciação do mérito da ação (cfr. Art. 571.º n.º 2 do C.P.C.), não poderia evidentemente o tribunal conhecer nenhum dos pedidos formulados pela A., até porque esta foi notificada para indicar quais dos pedidos deveriam ser apreciados no processo e não o fez, tendo o Tribunal dado cumprimento estrito ao legalmente determinado, não podendo a decisão de absolvição da instância ser considerada como uma decisão-surpresa. Como vimos o Tribunal a quo, ao abrigo do Art. 617.º n.º 1 do C.P.C., expressou igual entendimento, negando merecimento à arguida nulidade, porquanto apreciou exceção dilatória que conduziu à absolvição da instância e, portanto, não poderia conhecer do mérito da causa. Apreciando, diremos que é evidente que não assiste razão à Recorrente. De facto, resulta do Art. 615.º n.º 1 al. d), 1.ª parte, do C.P.C. que a sentença é nula quando o juiz deixe de pronunciar-se sobre questões que devesse apreciar. Como todas as demais situações previstas nesse preceito, estamos perante um vício formal, em sentido lato, traduzido em error in procedendo ou erro de atividade que afeta a validade da sentença. Ora, esta nulidade está diretamente relacionada com o disposto no Art. 608.º n.º 2 do C.P.C., segundo o qual: «O juiz deve resolver todas as questões que as partes tenham submetido à sua apreciação, excetuadas aquelas cuja decisão esteja prejudicada pela solução dada a outras; não pode ocupar-se senão das questões suscitadas pelas partes, salvo se a lei lhe permitir ou impuser o conhecimento oficioso de outras». Esta nulidade só ocorre quando não haja pronúncia sobre pontos fáctico-jurídicos estruturantes da posição dos pleiteantes, nomeadamente os que se prendem com a causa de pedir, pedido e exceções e não quando tão só ocorre mera ausência de discussão das “razões” ou dos “argumentos” invocados pelas partes para concluir sobre as questões suscitadas (cfr. Ac. do S.T.J. de 21.12.2005 – Relator: Pereira da Silva, acessível em www.dgsi.pt/jstj). Não constitui nulidade da sentença por omissão de pronúncia a circunstância de não se apreciar e fazer referência a cada um dos argumentos de facto e de direito que as partes invocam tendo em vista obter a (im)procedência da ação (Ac. T.R.L. de 23/4/2015 – Relatora: Ondina Alves, Proc. n.º 185/14, disponível em www.dgsi.pt/jtrl). Tal como não há omissão de pronúncia quando a matéria, tida por omissa, ficou implícita ou tacitamente decidida no julgamento da matéria com ela relacionada, competindo ao tribunal decidir questões e não razões ou argumentos aduzidos pelas partes (cfr. Ac. T.R.P. de 9/6/2011, Relator: Filipe Caroço, Proc. n.º 5/11 acessível em www.dgsi.pt/jtrp). Assim, incumbe ao juiz conhecer de todos os pedidos deduzidos, todas as causas de pedir e exceções invocadas e todas as exceções de que oficiosamente deve conhecer (Art. 608.º n.º 2 do C.P.C.) à exceção daqueles cujo conhecimento esteja prejudicado pelo anterior conhecimento de outros, sendo que o conhecimento de uma questão pode fazer-se tomando posição direta sobre ela, ou resultar da ponderação ou decisão de outra conexa que a envolve ou a exclui (cfr. Ac. do S.T.J. de 8/3/2001, Relator: Ferreira Ramos, acessível em www.dgsi.jstj/pt), não ocorrendo semelhante nulidade quando não se conhece de questão cuja decisão se mostra prejudicada pela solução dada anteriormente a outra (cfr. Ac. do S.T.J. de 3.10.2002, Relator: Araújo de Barros, também acessível em www.dgsi.pt/jstj). E foi precisamente isso que aconteceu no caso. De facto, o Tribunal não conheceu do mérito da causa, porque julgou por procedente uma exceção dilatória tipificada na lei processual – a coligação ilegal de réus (cfr. Art. 577.º al. f) do C.P.C.) –, a qual é de conhecimento oficioso (Art. 578.º do C.P.C.), cuja apreciação precede e prejudica inevitavelmente a possibilidade de serem decididos os pedidos formulados na petição inicial, por conduzir à absolvição dos R.R. da instância e consequentemente pôr termo ao processo (cfr. Art.s 278.º n.º 1 al. e), 279.º, 576.º n.º 1 e n.º 2, 577.º al. f) e 578.º do C.P.C.). A recorrente pode não concordar com o sentido dessa decisão, mas a não concordância da parte com a subsunção dos factos às normas jurídicas invocadas de modo algum configuram causa de nulidade da sentença (cfr. Ac. T.R.L. de 17/5/2012, Relator: Gilberto Jorge, Proc. n.º 91/09, acessível em www.dgsi.pt/jtrl). Eventualmente, essa situação pode constituir motivo para revogação da decisão, por haver erro de julgamento, mas certamente que não constitui nulidade da sentença. Razão pela qual se julga que improcedem nesta parte todas as conclusões que defendiam a invalidade da sentença por violação do Art. 615.º n.º 1 al. d) do C.P.C.. 2.–Da coligação ilegal de R.R.. Passando agora às questões centrais do presente recurso, relembramos que a sentença recorrida absolveu as R.R. da instância, julgando extinta a lide, por considerar que no caso concreto se verificava a exceção dilatória de coligação ilegal de R.R., nos termos do Art. 36.º n.º 1 e n.º 2 do C.P.C.. Isto porque, da interpretação aí feita das pretensões formuladas na petição inicial, resultaria que a A. demandava a 1.ª R., B, com base no incumprimento do contrato de empreitada que com ela celebrou, nisso assentando os pedidos de reconhecimento do seu direito de retenção sobre o imóvel a que se reportavam as obras realizadas pela A. e os pedidos de pagamento de quantia certa. Já a 2.ª R., C, teria sido demandada com base na celebração de um contrato de subempreitada, imputando a A. a essa R. a responsabilidade por atrasos no desenrolar da obra. Portanto, as pretensões formuladas contra as R.R. fundar-se-iam em causas de pedir autónomas e os pedidos não estariam numa relação dependência entre si, nem tão pouco a procedência dos mesmos se fundaria na mesma factualidade ou na interpretação e aplicação das mesmas regras de direito. A Recorrente não concorda com esta visão das coisas, porque os contratos em causa apresentam uma relação de interdependência entre os seus intervenientes, quer em termos de execução, quer em termos de pagamento, realçando muito em particular a relação de promiscuidade entre a 1.ª R., dona da obra, e a 2.ª R., subempreiteira, que por vezes se assumia também como dona da obra, dando instruções e tomando decisões sobre o desenrolar dos trabalhos, considerando mesmo que foi esbulhada do prédio por ação concertada dos gerentes das R.R.. As Recorridas sustentaram a decisão recorrida, fundada na autonomia das causas pedir, independência total dos contratos invocados e inexistência de prejudicialidade ou dependência dos pedidos formulados. Apreciando, temos de ter em consideração que o Art. 36.º n.º 1 do C.P.C. estabelece que: «1- É permitida a coligação de autores contra um ou vários réus e é permitido a um autor demandar conjuntamente vários réus, por pedidos diferentes, quando a causa de pedir seja a mesma e única ou quando os pedidos estejam entre si numa relação de prejudicialidade ou de dependência». O n.º 2 do mesmo preceito acrescenta ainda que: «2- É igualmente lícita a coligação quando, sendo embora diferente a causa de pedir, a procedência dos pedidos principais dependa essencialmente da apreciação dos mesmos factos ou da interpretação e aplicação das mesmas regras de direito ou de cláusulas de contratos perfeitamente análogas». Já Alberto dos Reis (in “Comentário ao Código de Processo Civil”, vol. I, 2.ª Ed., pág.s 45 a 45) distinguia a mera cumulação de pedidos, a simples pluralidade de autores e réus e a coligação nos seguintes termos: «Na mera cumulação de pedidos só há um autor e um só réu, mas mais que um pedido (…). Na simples pluralidade, o pedido é só um, formulado por vários autores ou contra vários réus. A coligação tem em comum com a cumulação a circunstância de os pedidos serem múltiplos, e com a pluralidade a circunstância de os autores ou os réus serem mais do que um». A coligação era já então entendida com um direito e não uma obrigação do A. (Ob. Cit., pág. 44) e estava subordinada ao preenchimento de requisitos formais, relativos à forma de processo e competência absoluta do tribunal, e requisitos substanciais, relativos à unicidade da causa de pedir, relação de dependência dos vários pedidos ou, sendo as causas de pedir diferentes, teriam de se fundar essencialmente nos mesmos factos, ou na interpretação e aplicação das mesmas normas ou em cláusulas de contratos análogas (Alberto dos Reis in “Comentário ao Código de Processo Civil”, vol. III, pág.s 410). Estas regras subsistem no essencial no atual e já citado Art. 36.º do C.P.C., que no seu n.º 1 admite a coligação de R.R. em dois casos: a)-quando a causa de pedir é a mesma e única para todos os pedidos; e b)-quando os pedidos estejam entre si numa relação de prejudicialidade ou de dependência. Sendo que o n.º 2 do mesmo preceito admite ainda essa coligação: a)-quando ela implique a apreciação essencialmente dos mesmos factos; ou b)-quando pressuponha a interpretação e aplicação das mesmas regras de direito ou de cláusulas contratuais análogas (vide, a propósito: Teixeira de Sousa in “CPC On Line” em comentário a este normativo). Lebre de Freitas (in “Código de Processo Civil Anotado”, vol. 1.º, 3.ª Ed., pág.s 83 a 84) realça que se mantém como requisito legal da coligação a existência de pluralidade de pedidos – no dizer da lei «pedidos diferentes» –, sem que se tenha feito qualquer opção doutrinária sobre a distinção entre o litisconsórcio voluntário e a coligação no que se refere ao dualismo a entre unidade e pluralidade de pedidos, tal como Art. 36.º n.º 1 inculca, ou o dualismo entre unidade e pluralidade de relações materiais contravertidas, tal como resulta dos Art.s 32.º e 33.º do C.P.C.. Esta última discussão foi colocada em termos muito claros por Castro Mendes (in “Direito Processual Civil”, Vol. II, 1987, AAFDL, pág.s 253 a 254), quando escreveu: «Há litisconsórcio quando há pluralidade de partes e unidade quanto a certo ponto; há coligação quando há pluralidade de partes e pluralidade quanto ao mesmo ponto. «Qual o ponto em que assenta o critério de distinção é que tem sido objeto de dúvida e discussão. Para uns, é diferenciadora a unidade ou pluralidade de interesses; para outros, como o Prof. Palma Carlos, a unicidade ou pluralidade de relações jurídicas controvertidas; para outros ainda (…) simplesmente a unicidade ou pluralidade de pedidos». Para este autor, defensor da última das teses, haveria coligação se Apede xa Be y a C.Mas haveria litisconsórcio quando haja um só pedido com várias partes; quando uma parte formule vários pedidos em conjunto a várias partes (segundo este esquema:A pede xe ya Be C);ou quando mais de uma parte ou contra várias partes se formulem pedidos não diferentes ou essencialmente idênticos em conteúdo e fundamentos (por exemplo: no caso duma obrigação conjunta em que A pede a B, C e D a parcela de cada um na obrigação de restituição emergente do mesmo contrato). Castro Mendes justificava a diferença da previsão legal relativa à coligação nos seguintes termos: «como os pedidos são diferentes e discriminados por partes diversas, a lei tem de zelar pela sua compatibilidade e conexão, a fim de evitar que num mesmo processo se entrecruzem pedidos incompatíveis, o que seria um absurdo, ou totalmente estranhos entre si (…) o que tornaria a administração da justiça desordenada e caótica» (Ob. Cit., pág. 257). Antunes Varela (in “Manual de Processo Civil”, 2.ª Ed., pág.s 160 e 161) também reconhecia que a lei admitia a possibilidade de cumulação objetiva, quando existiam vários pedidos diferentes, e de cumulação subjetiva, quando houvesse pluralidade de partes, ativa ou passiva, realçando que a cumulação pode revestir diversas formas em função da sua natureza (litisconsórcio ou coligação), da sua fonte (voluntária ou legal), ou do tempo (inicial ou sucessiva). Assim, quanto à natureza, escrevia este insigne professor que: «No litisconsórcio há pluralidade de partes, mas unidade da relação material controvertida; na coligação, à pluralidade das partes corresponde a pluralidade das relações materiais litigadas, sendo a cumulação permitida em virtude da unicidade da fonte das relações, da dependência entre os pedidos ou da conexão substancial entre os fundamentos destes» (Ob. Cit., pág. 161). Em anotação a esta afirmação Antunes Varela exemplifica como exemplo de unicidade da fonte das relações a ação instaurada por vários autores vítimas do mesmo acidente de viação. Já quanto às situações de dependência entre pedidos exemplifica-as com a possibilidade da esposa e filho do casal poderem demandar em conjunto o marido e progenitor em ação para fixação de alimentos em que o cônjuge e progenitor abandona o lar. Finalmente, quanto à coligação fundada na conexão substancial entre fundamentos da ação, dá o exemplo de vários segurados demandarem a mesma seguradora, por sinistros distintos, mas que envolvam a interpretação da mesma cláusula contratual de seguro-padrão. Também para Paulo Pimenta (in “Processo Civil Declarativo, 2.ª Ed., pág. 83) a coligação distingue-se do litisconsórcio, porque na primeira há uma pluralidade de partes a que corresponde a uma pluralidade de relações materiais contravertidas, enquanto no litisconsórcio há pluralidade de partes com unicidade da relação controvertida, sendo que a coligação é sempre voluntária, enquanto o litisconsórcio pode ser voluntário ou necessário. Ferreira de Almeida (in “Direito Processual Civil”, Vol. I, pág. 512) entende que: «ao contrário do que acontece com o litisconsórcio, em que existe uma pluralidade de partes e uma unicidade de pedidos, na coligação há uma pluralidade de partes e uma pluralidade de pedidos. Á unicidade da relação material controvertida (do litisconsórcio) corresponde (na coligação) uma pluralidade de relações materiais litigadas ou controvertidas. A coligação é, assim, permitida «em virtude da unidade da fonte das relações, da dependência dos pedidos ou da conexão substancial entre os fundamentos destes»». Já Pais do Amaral (in “Direito Processual Civil”, 14.ª Ed., pág. 131) afirma que: «Diferentemente do litisconsórcio, em que existe uma pluralidade de partes e unicidade de pedidos, na coligação há uma diversidade de partes e pluralidade de pedidos». Mas depois acrescenta: «Na coligação verifica-se uma diversidade de partes e também de relações jurídicas materiais em litígio. A cumulação justifica-se pela unidade da fonte donde promanam». França Pitão (in “Código de Processo Civil Anotado”, Tomo I, pág. 97) sustenta que: «A principal diferença entre as duas situações é que, enquanto no litisconsórcio voluntário há um ou vários pedidos dirigidos conjuntamente contra o mesmo réu, na coligação há pedidos diferentes dirigidos a dois ou mais réus, muito embora todos eles se fundamentem na mesma causa de pedir ou na mesma factualidade, ou os pedidos estejam numa relação de prejudicialidade ou dependência entre si, o que implica a interpretação e aplicação das mesmas regras de direito». Ao nível da jurisprudência, verificamos que o Tribunal da Relação de Lisboa tem vindo a alinhar pela tese de Castro Mendes, no sentido de que o traço distintivo entre o litisconsórcio voluntário e a coligação é o dualismo: unidade versus pluralidade de pedidos (vide: Ac. TRL de 15/10/2019 – Proc. n.º 8561/15.3T8LRS.L1 – Relator: Fernando Barreto Cabanelas), havendo litisconsórcio quando exista pluralidade de partes e unidade quanto ao pedido e coligação quando exista pluralidade de partes e pluralidade quanto aos pedidos (vide: Ac. TRL de 24/5/2018 – Proc. n.º 360/14.6TBVFX.L2-& - Relator: Carlos Marinho e Ac. TRL de 28/3/1996 – Proc. n.º 0013962 – Relator: António Abranches Martins). Mas por exemplo, no Tribunal da Relação do Porto (ac. de 20/4/2010 – Proc. n.º 484/03.5TYVNG-I.P1 – Relator: Ramos Lopes) defendeu-se que a coligação corresponderia a uma situação de pluralidade das relações materiais litigadas. As diferenças assim expressas são subtis e, na aparência, parece que se está sempre a dizer o mesmo por palavras ligeiramente diversas. Na verdade, na maior parte das vezes é normal que à diversidade de pedidos corresponda igualmente a existência de relações materiais litigadas diversas, mas pode acontecer que os vários pedidos possam ser relevados de forma unitária e para essa valoração poderá influir a apreciação sobre a unicidade ou pluralidade de relações jurídicas controvertidas subjacentes, sendo que no primeiro caso poderá estar em causa uma situação de litisconsórcio voluntário e não de coligação. Tudo dependerá da valoração feita em cada caso concreto. Em todo o caso, partindo destas premissas podermos desde já dizer que a existência de pedidos fundados em contratos diversos não é, só por si, obstáculo à coligação em que haja a formulação de vários pedidos contra uma pluralidade de R.R.. Essa realidade pode não ser mais do que um elemento relevante para considerarmos que estamos perante uma coligação e não numa situação de litisconsórcio voluntário. No caso concreto dos autos temos de considerar que foram formulados 2 segmentos de pedidos distintos entre si. Em primeiro lugar, num primeiro grupo, a A. formula 2 pedidos de condenação solidária dirigidos a ambas as R.R., e depois, em segundo lugar, num segundo grupo, formula mais 3 pedidos dirigidos unicamente à 1.ª R.. Dito isto, a questão da ilegalidade da coligação centra-se, numa primeira análise, essencialmente, nos primeiros dois pedidos, porque são eles que poderão justificar a presença da 2.ª R. no processo. Quais são os pedidos aí formulados? Em 1.º, o de restituição da posse à A. do prédio onde foram feitas as obras; e em 2.º, o de condenação (solidária) de ambas as R.R. a indemnizar a A. pelos sobrecustos contabilizados no montante de €417.996,00. O primeiro pedido, desde primeiro grupo, funda-se num alegado “direito de retenção” que assistiria à A., enquanto empreiteira da obra, contratada pela 1.ª R., B, relativamente aos direitos indemnizatórios e pagamentos devidos pela realização dos trabalhos incorporados no prédio que era objeto de contrato de empreitada e que teria sido ilegitimamente resolvido pela dona da obra, a sociedade B. Essa sua pretensão poderia, em abstrato, e sem nos preocuparmos por agora com discussões doutrinárias, merecer acolhimento no disposto na regra geral estabelecida no Art. 754.º do C.C., conjugada com os Art.s 1278.º, 1279.º e 1281.º n.º 2 do C.C.. Para tanto, a A. alegou a celebração do contrato de empreitada com a 1.ª R. (artigos 1.º a 5.º da petição inicial), descrevendo depois ao logo da petição os vários incumprimentos imputáveis, quer à 1.ª R., quer à 2.ª R., que seria subempreiteira da A., mas alegadamente também fornecedora de material de construção a incorporar na obra, sendo que a 1.ª R., depois de resolver o contrato de empreitada por falta de conclusão dos trabalhos por parte da A. (cfr. artigos 191.º a 197.º da petição), arrombou as portas da obra e trocou as fechaduras (artigo 198.º), tendo de seguida entregue a obra à 2.ª R. para a concluir (artigo 200.º), tendo inclusivamente ambas as R.R. aliciado funcionários da A. para irem trabalhar na conclusão dessa obra (artigo 201.º), defendendo no final que lhe assistiria o direito de retenção para garantir o pagamento das faturas vencidas, e não pagas, os sobrecustos, custos financeiros e lucros cessantes incorridos com a realização a obra, por causa imputável à 1.ª R. (artigo 208.º). Diremos assim que, em função do que a propósito foi concretamente alegado pela A. na petição inicial, a 2.ª R. seria parte ilegítima relativamente ao pedido de “restituição da posse” do imóvel, porque, ao contrário do que agora se pretende fazer crer em sede de alegações, não foi sequer alegado naquele articulado qualquer facto diretamente imputável à 2.ª R. relativamente à “apropriação” do imóvel que obsta ao exercício do “direito de retenção” que se pretende salvaguardar com a instauração da presente ação. Todos os comportamentos relevantes, de natureza “apropriativa”, são aí imputáveis apenas à 1.ª R., que é a proprietária do imóvel em causa. Logo, é a 1.ª R. que tem interesse direto em contradizer essa concreta pretensão, porque é só na sua esfera jurídica que se verifica o interesse em contradizer derivado do prejuízo que a procedência da ação para si poderá determinar, tendo em atenção o sujeito passivo da relação controvertida, tal como configurada pela A. na petição inicial (cfr. Art. 30.º do C.P.C.). Portanto, a questão da cumulação de ações relativamente a este pedido poderá ter solução diversa e prévia à consideração duma “coligação ilegal de R.R.”. Passemos então ao segundo pedido, do primeiro grupo, que envolve a condenação solidária da 2.ª R. juntamente com a 1.ª R.. Esse pedido visa que ambas as R.R. respondam pela obrigação de indemnização “pelos sobrecustos contabilizados no montante global de 417.996,00€” (cfr. fls. 31). Esses custos estão resumidos no quadro apresentado no artigo 270.º da petição inicial e desdobram-se em “sobrecustos diretos” (€273.125,00), “sobrecustos indiretos” (€135.881,00), “custos financeiros”(€4.856,95) e “lucros cessantes sobre faturação não realizada” (€4.132,66). Os “sobrecustos diretos” (€273.125,00), calculados de acordo com a tabela constante do artigo 248.º da petição inicial, resultam alegadamente de modificações nas condições de execução subjacentes ao contrato de empreitada que tornaram impossível a realização dos trabalhos de acordo com o inicialmente previsto pela A. (cfr. artigo 246.º da petição) e que esta imputa a ambas as R.R. (cfr. artigo 235.º da petição), evidenciando na petição inicial uma alegada promiscuidade entre estas, que resultaria da prova documental junta, em que as decisões e instruções relativas à obra eram dadas pela 2.ª R. e não pela 1.ª R. (cfr. artigo 181.º da petição). Os “sobrecustos indiretos” (€135.881,00), calculados de acordo com a tabela constante do artigo 263.º da petição inicial, estão alegadamente relacionados com encargos da estrutura montada pela A. para assegurar a execução da obra e com o prolongamento da necessidade da sua manutenção, devido às alterações feitas à sua execução (cfr. artigos 250.º a 262.º da petição), que a A. vai imputando, quer à 1.ª R., quer à 2.ª R., umas vezes de forma mais genérica (cfr. artigos 174.º e 181.º da petição), outras vezes de forma mais concretizada (cfr. artigos 14.º a 151.º da petição). Os “custos financeiros” (€4.856,95) e “lucros cessantes sobre faturação não realizada” (€4.132,66), são calculados tendo por referência os mesmos atrasos e alterações que sustentam todos os demais sobrecustos atrás mencionados. Portanto, em função da causa de pedir, tal como ela é alegada na petição inicial, esses danos, que sustentam o pedido de condenação solidária das R.R., não resultam apenas do incumprimento do contrato de empreitada por parte da 1.ª R., enquanto dona da obra. Eles resultam também do comportamento da 2.ª R., enquanto autora material de atos que alegadamente causaram alteração das condições de execução e planeamento dos trabalhos relativo a esta obra, seja enquanto fornecedora de materiais, seja como executante de obras na qualidade de subempreiteira (embora esta qualidade seja negada na contestação que a 2.ª R. apresentou – cfr. artigos 7.º a 18.º e 22.º da contestação a fls. 728 verso a 729 verso), seja como “auxiliar”, ou “coadjuvante”, ou mesmo alegada “substituta” da dona de obra (1.ª R.), na tomada direta de decisões ou no fornecimento de instruções que modificaram as condições de execução do contrato de empreitada por parte da A., enquanto empreiteira (factos que também foram todos impugnados pelas R.R.). Portanto, tal como foi alegada, na petição inicial, vista isoladamente esta concreta pretensão indemnizatória, quanto ao pedido dirigido a ambas as R.R., o problema não é de “coligação de réus” é de “litisconsórcio voluntário”, porque há unicidade de pedido relativamente a uma pluralidade de partes, estando a condenação solidária das R.R. dependente, evidentemente, de que a A. faça prova desta alegada espécie de “coautoria” dos factos ilícitos que podem obrigar ao pagamento duma indemnização, no quadro duma relação contratual complexa e tríplice, de contornos ainda muito discutíveis. Nessa medida, pode-se dizer que a relação material controvertida em que assenta o pedido de condenação solidária das R.R. no pagamento da indemnização de €417.996,00 é uma única e a mesma, sendo mais larga e abrangente que o mero contrato de empreitada inicialmente celebrado apenas entre A. e 1.ª R., embora também assente nele. Este concreto pedido de indemnização, dirigido a ambas as R.R., é assim cumulado com uma pretensão de restituição da posse, que, como já vimos, tem um claro problema de legitimidade passiva, no que se refere à 2.ª R., e com os restantes 3 pedidos de pagamento de quantia certa, que são dirigidos unicamente à 1.ª R.. Trata-se, portanto, no seu conjunto, duma cumulação real objetiva de ações, para o que não releva por ora a consideração das pretensões reconvencionais formuladas pelas R.R. nas suas respetivas contestações. A questão da “coligação ilegal” propriamente dita só se coloca relativamente à consideração desta cumulação real de pedidos, considerada no seu conjunto. Ora, quanto aos restantes 3 pedidos, temos de reconhecer que eles inequivocamente se fundam apenas no contrato de empreitada celebrado unicamente entre a A., na qualidade de empreiteira, e a 1.ª R., na qualidade de dona da obra. Nessa parte, a 2.ª R. não é demandada, nem tem interesse direto na ação, porque em causa estão unicamente prestações exigíveis apenas à dona da obra (v.g. devolução de €66.604,36 de retenção no pagamento de faturas; pagamento de €13.114,90 relativo a um concreto auto de medição; e €110.051,91 de faturas vencidas e não pagas). Portanto, a relação material controvertida em que se sustentam essas pretensões é mais restrita nessa parte. Assim, em termos de causa de pedir, a diferença entre as pretensões que integram o primeiro grupo de pedidos (a que compreendem os 2 pedidos supra discriminados, mas que, pelas razões já expostas, só relevará o segundo deles) relativamente ao segundo grupo de pedidos (a que compreendem os 3 restantes pedidos) é de mera amplitude da relação material controvertida considerada de onde emergem as obrigações de indemnização, por um lado, e de pagamento, por outro. O 2.º pedido do primeiro grupo, integra uma pretensão que pode fundar-se em responsabilidade contratual (cfr. Art.s 798.º e ss. do C.C.) resultante da prática de factos ilícitos relativos à execução do contrato de empreitada, em que a 2.ª R. pode ser responsável nesses termos, mesmo sendo terceira, por ter tido interferência direta na execução do contrato e por alegada assunção das responsabilidades da dona de obra (1.ª R.), com conivência desta, no decurso do desenrolar da relação contratual em causa. O segundo grupo, integra 3 pretensões que igualmente se fundam em responsabilidade contratual (Art. 798.º do C.C.), embora mais limitada, porque mais ligada à exigência do cumprimento estrito do contrato de empreitada (Art. 406.º do C.C.). Esta diferença de amplitudes na consideração da mesma relação material controvertida não é suficiente para afastar a possibilidade de se verificar uma conexão substancial relevante entre os vários pedidos assim cumulados contra uma pluralidade de partes. No final, a causa de pedir, traduzida no conjunto de atos ou factos de onde emergem as várias pretensões formuladas (cfr. Art. 581.º n.º 4 do C.P.C.), é fundamentalmente, e na sua essência, a mesma relativamente aos dois grupos de pedidos considerados, porque todos emergem do modo de execução e cumprimento do mesmo contrato de empreitada, seja na vertente da pontualidade e proficiência na execução dos trabalhos nele integrados, por um lado, seja da correspetiva retribuição, por outro. Quanto a este ponto temos de realçar que Mariana França Gouveia (in “A Causa de Pedir na Ação Declarativa”, pág.s 242 a 243) defende que: «A causa de pedir é a norma alegada pelo autor que, na sua perspetiva, permite que os factos alegados produzam o efeito jurídico pedido. Se é apenas uma, a causa de pedir será uma. Se são várias, haverá pluralidade de causas de pedir e, em consequência, cumulação». Portanto, segundo esta autora, perece que a unicidade da causa de pedir depende da identidade da norma em que se sustentam os pedidos. Mas mesmo que se considere que existam causas de pedir diversas, na medida em que se poderia sustentar que o 2.º pedido do primeiro grupo de pedidos da petição inicial é tipicamente uma pretensão indemnizatória, fundada na responsabilidade contratual prevista no Art. 798.º do C.C., enquanto que os 3 restantes pedidos de pagamento, constantes do segundo grupo, seriam apenas pretensões típicas de exigência de cumprimento do contrato, nos termos do Art. 406.º n.º 1 do C.C., então sempre poderíamos sustentar que a procedência de todos esses pedidos dependem essencialmente da apreciação dos mesmos factos, que se relacionam, no fundo, sempre com a efetiva execução do mesmo contrato de empreitada, nos termos como a relação material controvertida foi configurada pela A.. Ou seja, ainda que a situação concreta dos autos pudesse não preencher a previsão do Art. 36.º n.º 1 do C.P.C., certamente que cairia no âmbito do n.º 2 do mesmo preceito. Como vimos este preceito admite a coligação quando, sendo embora diferentes as causa de pedir, «a procedência dos pedidos principais dependa essencialmente da apreciação dos mesmos factos». A este propósito, escreveu Alberto dos Reis (in “Código de Processo Civil Anotado”, vol. I, pág. 101): «O advérbio “essencialmente” mostra não ser necessário que os factos sejam precisamente os mesmos, bastando que sejam os mesmos fundamentalmente». No acórdão do Tribunal da Relação de Évora de 14/1/2021 (Proc. n.º 744/20.0T8TMR.E1 – Relatora: Paula do Paço) também se defendeu que: «a utilização do advérbio “essencialmente” na norma inserida no n.º 2 do artigo 36.º do C.P.C. deve ser interpretada como sinónimo de “principalmente”, “predominantemente”, de modo a justificar a coligação, tendo em consideração a finalidade desta figura jurídica». Já no acórdão de 11/4/2019, do mesmo Tribunal (Proc. n.º 1109/14.9T8PTM.E1 – Relatora: Maria Domingas), considerou-se que a coligação seria admissível quando a procedência das diferentes pretensões dependesse da apreciação do “mesmo núcleo factual essencial”. Ora, é isso mesmo que se passa no caso dos autos. Em suma, estando em causa essencialmente a apreciação de factos realizados no quadro da execução da mesma relação contratual, donde emergem os vários pedidos, tal como a relação litigada foi configurada pela A., não podermos deixar de julgar que existe uma conexão substancial suficientemente relevante para, pelo menos nos termos do Art. 36.º n.º 2 do C.P.C., ser processualmente admissível a coligação de R.R.. Em conformidade, julgamos concordar com as conclusões que sustentam que no caso não havia razões para declarar a ilegalidade da coligação de R.R., nos termos do Art. 577.º al. f) do C.P.C., tendo a decisão recorrida violado o Art. 36.º do C.P.C.. 2.–Da inconveniência grave como obstáculo à coligação. Sucede que, a decisão recorrida veio sustentar que, ainda que se verificassem todos os requisitos processuais e de conexão substantiva relativos à coligação de R.R., a mesma não deveria ser admissível, nos termos do Art. 37.º n.º 4 do C.P.C., por haver inconveniência grave para a instrução, discussão e julgamento conjunto das causas. Para tanto, mencionou como factos relevantes: «a diversidade dos factos e a extensão dos articulados, a dedução por cada uma das Rés de pedidos reconvencionais fundados em factualidade diversa, com a possibilidade de cada uma das partes utilizar a faculdade prevista no artigo 510º do C.P.C. de oferecer 10 testemunhas para prova/contraprova da ação e da reconvenção a atividade probatória necessária revela-se complexa e demorada». A Recorrente contrapõe que estes motivos não seriam suficientes para sustentarem a não admissão da coligação, defendendo que deveria prevalecer o interesse da economia processual no julgamento conjunto das causas, com manifestos ganhos para a atividade judiciária para a decisão deste litígio num único processo, de forma coerente e uniforme, seja em termos de direito, seja em termos de facto. As Recorridas limitaram-se a defender a decisão recorrida, nesta parte, nos seus precisos termos. Apreciando, diremos que o Art. 37.º n.º 4 do C.P.C. permite efetivamente ao tribunal, mesmo que por sua iniciativa oficiosa, não autorizar a coligação, se entender que, não obstante se verificarem os todos os seus respetivos requisitos formais ou substanciais, haja inconveniente grave em que as causas sejam instruídas, discutidas e julgadas conjuntamente. Não se trata de um poder discricionário, porque não há liberdade de escolha da solução a adotar, mas sim um juízo sindicável sobre a conveniência técnica da separação da instrução, discussão e julgamento das causas (vide: Lebre de Freitas in “Código de Processo Civil Anotado”, vol. 1.º, 3.ª Ed., pág. 87). Por outro lado, já não basta que seja preferível instruir, discutir e julgar as causas em separado, como Alberto dos Reis sustentava no quadro do Código de 1939 (cfr. “Código de Processo Civil Anotado”, vol. I, pág. 100), mas é necessário que se verifique “inconveniente grave” quanto a qualquer dessas 3 fases consideradas (instrução, discussão e julgamento) - (Lebre de Freitas in Ob. Loc. Cit., pág. 87). A vantagem da coligação de ações decorre precisamente da circunstância de estarmos perante várias ações que, por razões de economia processual, são todas tramitadas e julgadas no mesmo processo (vide: Ac. TRG de 28/5/2020 – Proc. n.º 3050/19.0T8GMR-D.G1- Relator: Afonso Cabral Andrade). Ou, como foi dito no Acórdão do Tribunal da Relação de Évora de 14/1/2021 (Proc. n.º 744/20.0T8TMR.E1 – Relatora: Paulo do Paço): «a coligação traduz-se numa manifesta vantagem de economia processual. Com os mesmos meios, garante-se uma administração da justiça mais eficiente e célere, e assegura-se uma maior justiça relativa, através da uniformidade de decisão do essencial das questões jurídicas suscitadas nos autos, preservando-se, por esta via, o prestígio dos tribunais». Dito isto, não é a circunstância dos R.R. terem deduzido pedidos reconvencionais (cuja admissibilidade processual não foi sequer apreciada), nem a mera extensão dos articulados, nem a consideração da possibilidade de poderem ser arroladas mais testemunhas, nos termos do Art. 511.º n.º 2 (ou até do n.º 4) do C.P.C., que justificará o “grave inconveniente para a instrução, discussão ou julgamento da causa”, pois se a A. tivesse apenas demandado uma das R.R. a extensão dos articulados não diminuiria necessariamente, nem a possibilidade de ampliação dos róis deixaria de se poder verificar. Daí só resulta a constatação de que existem processos cujo julgamento é naturalmente sempre mais moroso, não sendo certo que o não seriam se tivessem sido instauradas 2 ações autónomas, uma contra cada uma das R.R.. Pelo contrário, até seria de adivinhar que haveria uma duplicação de produção da mesma prova, em mais de um processo, com todos os inconvenientes daí resultantes. Assim, a questão central, em função do que foi argumentado na decisão recorrida, resume-se apenas ao grave inconveniente decorrente da alegada “diversidade dos factos”, seja dos relativos à ação, seja dos relativos às reconvenções. Ora, a ação funda-se essencialmente em incumprimentos ou factos ilícitos contratuais praticados pelas R.R. no quadro duma relação contratual definida em termos amplos pela A., mas que tem o seu cerne no contrato de empreitada celebrado entre A. e a 1.ª R., embora implique igualmente com o contrato de fornecimento de bens que a A. celebrou com a 2.ª R., relativamente ao qual alegadamente também se verificaram atrasos imputáveis à fornecedora, com consequências na execução da empreitada. Já o pedido reconvencional da 1.ª R. sustenta-se em incumprimentos da A. relativos ao mesmo contrato de empreitada, seja por atraso na execução dos trabalhos, seja por defeitos na execução da obra (cfr. artigos 137.º a 155.º da contestação a fls. 350 verso a 352). Finalmente, o pedido reconvencional da 2.ª R. funda-se no contrato de fornecimento de bens que celebrou com a A. e no não cumprimento por esta das prestações aí convencionadas (cfr. artigos 65.º a 72.º da contestação a fls. 732 a 733). Assim resumidas as pretensões e os factos em que assentam, não vemos que haja uma diversidade total de factos que justifique o “grave inconveniente para a instrução, discussão ou julgamento da causa”, pois todos eles estão interrelacionados entre si e o seu julgamento conjunto permitirá uma apreciação global mais adequada dos incumprimentos ou ilícitos contrapostos, com base nos quais deverá ser decidido o mérito das pretensões formuladas e das exceções a elas opostas. Em suma, também quanto a esta parte entendemos que não foi feita a devida aplicação da norma estabelecida no Art. 37.º n.º 4 do C.P.C., não se verificando qualquer obstáculo à coligação de R.R., seja de natureza formal, seja de natureza substancial, seja de mera conveniência para a instrução, discussão e julgamento da causa. Em conformidade, concordamos com as conclusões que sustentam que a decisão recorrida deverá ser revogada, devendo os autos prosseguir os seus trâmites normais no pressuposto de que não há coligação ilegal de R.R.. V–DECISÃO Pelo exposto, acorda-se em julgar a apelação procedente por provada, revogando a sentença recorrida, datada de 30 de março de 2022, constante de fls. 873 a 874 verso, que declarou a extinção da lide, absolvendo as R.R. da instância e considerou que ficou prejudicada a apreciação dos pedidos reconvencionais, devendo o processo prosseguir os seus normais trâmites no pressuposto de que não se verifica coligação ilegal de R.R.. - Custas pelas Apeladas (Art. 527º n.º 1 do C.P.C.). * Lisboa, 27 de setembro de 2022 Carlos Oliveira Diogo Ravara Ana Rodrigues da Silva |