Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa | |||
Processo: |
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Relator: | LAURINDA GEMAS | ||
Descritores: | PROVIDÊNCIA CAUTELAR NÃO ESPECIFICADA PRESSUPOSTOS CONCORRÊNCIA DESLEAL | ||
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Nº do Documento: | RL | ||
Data do Acordão: | 10/11/2018 | ||
Votação: | UNANIMIDADE | ||
Texto Integral: | S | ||
Texto Parcial: | N | ||
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Meio Processual: | APELAÇÃO | ||
Decisão: | NEGADO PROVIMENTO AO RECURSO DA REQUERENTE; PROVIDO O RECURSO DAS REQUERIDAS | ||
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Sumário: | (da exclusiva responsabilidade da Relatora - art. 663.º, n.º 7, do CPC): I - Nas sociedades por quotas, a proibição de concorrência é dirigida aos gerentes, e não aos sócios, não estando vedada a estes a participação no capital social de sociedades com idêntico objeto social. II - Não se justifica decretar a providência cautelar não especificada de proibição de exercício, pela sócia e pela sociedade que constituiu, de atividade concorrente com a da sociedade requerente, se não está sequer indiciariamente provada uma atuação, por parte da sócia, de concorrência proibida que possa vir a causar prejuízos a esta sociedade. | ||
Decisão Texto Parcial: | ![]() | ||
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Decisão Texto Integral: | Acordam, na 2.ª Secção Cível do Tribunal da Relação de Lisboa, os Juízes Desembargadores abaixo identificados 1. RELATÓRIO Ac..., Lda. veio instaurar procedimento cautelar comum contra MS... e I..., Unipessoal, Lda., requerendo as seguintes providências cautelares: (1) Proibição de ambas as Requeridas contactarem, seja a que título for, direta ou indiretamente de forma pessoal ou por interposta pessoa, com os condomínios administrados pela Requerente e com os condóminos que integram os referidos condomínios administrados pela Requerente com o propósito de desviá-los, com base na sobredita concorrência desleal e na violação da obrigação de não concorrência, para a carteira de clientes da sociedade Requerida; (2) Proibição de ambas as Requeridas se candidatarem-se à administração dos condomínios administrados pela Requerente; (3) Proibição de ambas as Requeridas administrarem os condomínios que são administrados pela Requerente Ac...; (4) Proibição de ambas Requeridas exercerem, seja a que título for, seja em nome próprio ou por interposta pessoa, a atividade de administração de condomínios nos concelhos do Funchal, de Câmara de Lobos, da Ribeira Brava e de Santa Cruz, por constituírem o âmbito territorial onde a Requerente exerce a respetiva atividade social de administração de condomínios, cuja obrigação de não concorrência desleal e cuja obrigação de não concorrência não podem ser violadas por ambas as Requeridas direta ou indiretamente, pessoalmente ou por interposta pessoa, designadamente através da instrumentalização da empresa Requerida para o efeito através da gerência exercida pela requerida Maria MS.... Mais requerendo que as providências peticionadas sejam decretadas e sejam inscritas no registo comercial na respetiva ficha da sociedade Requerida e que constem da respetiva certidão comercial permanente da sociedade Requerida para que a Requerente possa exibir a dita certidão comercial permanente da sociedade Requerida nas assembleias gerais de condomínio onde ambas as Requeridas se venham a candidatar para exercer as funções de administradora dos condomínios administrados ou a administrar pela Requerente ou relativamente aos quais a Requerente venha a candidatar-se à respetiva administração por ser a única forma de provar aos condóminos a proibição de ambas as Requeridas se candidatarem, com base na sobredita concorrência desleal e na sobredita obrigação de não violação da obrigação de não concorrência, à eleição da administração dos sobreditos condomínios. Foi dispensada a audição da parte contrária, tendo sido prestadas declarações de parte e ouvidas as testemunhas indicadas pela Requerente, após o que foi proferida a sentença constante de fls. 148 a 155, que considerou o procedimento cautelar procedente, tendo sido decretadas as seguintes providências: 1) Proibição de ambas as Requeridas contactarem, seja a que título for, direta ou indiretamente de forma pessoal ou por interposta pessoa, com os condomínios administrados pela Requerente e com os condóminos que integram os referidos condomínios administrados pela Requerente com o propósito de desviá-los para a carteira de clientes da sociedade Requerida; 2) Proibição de ambas as Requeridas se candidatarem à administração dos condomínios administrados pela Requerente; 3) Proibição de ambas as Requeridas administrarem os condomínios que são administrados pela “Ac... - Consultoria de Condomínios, Lda.”; 4) Proibição de ambas Requeridas exercerem, seja a que título for, seja em nome próprio ou por interposta pessoa, a atividade de administração de condomínios nos concelhos do Funchal, de Câmara de Lobos, da Ribeira Brava e de Santa Cruz. Foi ainda determinada a sanção pecuniária compulsória de 100 € (cem euros), para cada uma das Requeridas, por cada ato ou omissão que atente contra as providências decretadas. As Requeridas deduziram oposição, pela forma constante de fls. 162 e seguintes, tendo em suma, impugnado alguns factos, designadamente que pretendem ficar com clientes da Requerente e que tenham dito mal da mesma junto dos clientes da Requerente, invocando que a Requerida MS... tem interesse na continuidade e na prosperidade da Ac..., além do mais para propiciar ao seu sócio Dr. JS... receitas para pagar os empréstimos bancários que contraiu, designadamente o que tem o aval da Requerida MS... e para valorizar a quota da Requerida MS... no capital social da Ac.... Invocaram ainda as Requeridas abuso de direito por parte dos sócios da Requerente, ao tentar pressionar as Requeridas, em particular, a MS... a fazer cedências, sem que o interesse legítimo da Requerente tenha estado em causa. Mais defenderam ser inexigível à Requerida MS... a manutenção do dever de não concorrência, que exige dolo que jamais existiu pois estava convencida que exercia lícita e proporcionalmente o direito constitucional de livre exercício de estabelecimento e iniciativa privada. A Requerente, em 15-06-2018, veio pronunciar-se sobre o articulado de oposição, mediante “requerimento” que foi considerado não escrito, por despacho proferido em audiência final, na sessão de 29-06-2018. Ouvidas as testemunhas indicadas pelas Requeridas, foi proferida decisão final, julgando (parcialmente) procedente o procedimento cautelar e decretando as seguintes providências: 1) Proibição de ambas as Requeridas se candidatarem à administração dos condomínios administrados pela Requerente; 2) Proibição de ambas as Requeridas administrarem os condomínios que são administrados pela “Ac...-Consultoria de Condomínios, Lda.”. Inconformada com esta última decisão, veio a Requerente Ac... interpor recurso de apelação, terminando a sua alegação com as seguintes conclusões: A) Mal andou o Tribunal a quo ao não ter decretado todas as providências requeridas: 1) Proibição de ambas as requeridas contactarem, seja a que título for, direta ou indirectamente de forma pessoal ou por interposta pessoa, com os condomínios administrados pela requerente e com os condóminos que integram os referidos condomínios administrados pela requerente com o propósito de desviá-los para a carteira de clientes da sociedade requerida; 2) Proibição de ambas as requeridas candidatarem-se à administração dos condomínios administrados pela requerente; 3) Proibição de ambas as requeridas administrarem os condomínios que são administrados pela "Ac...-Consultoria de Codomínios, Lda"; 4) Proibição de ambas requeridas exercerem, seja a que título for, seja em nome próprio ou por interposta pessoa, a actividade de administração de condomínios nos concelhos do Funchal, de Cãmara de Lobos, da Ribeira Brava e de Santa Cruz. B) Deveria ter o Tribunal recorrido julgado suficientemente indiciado a violação da obrigação de não concorrência bem como a realização de actos que consubstanciam concorrência desleal levados a cabo por ambas as requeridas. C) Estão preenchidos os requisitos para o decretamento de todas as providências supra identificadas em A: o periculum in mora, o fumus bónus iuris e o respeito pelo princípio da proporcionalidade. D) Incorreu em erro de julgamento o Tribunal a quo ao não ter julgado como indiciariamente provada toda a matéria que foi dada como indiciariamente provada na douta sentença datada 16 de Maio de 2018 (anterior à audição das requeridas) por desconsideração do depoimento de parte e testemunhos indicados no artigo 26.° do presente articulado. E) Incorreu em erro de julgamento o Tribunal a quo ao não ter julgado como factos sem interesse para a decisão da causa por não constituírem fatos extintivos, modificativos ou impeditivos do direito da requerente e, muito menos, factos que contendam com os requisitos do decretamento das providências cautelares todos os factos indicados em 27.° do presente articulado; F) Incorreu em erro de julgamento o Tribunal a quo ao não ter julgado como sumariamente não provados os factos indicados no artigo 28.° do presente articulado. NESTES TERMOS, E NOS DEMAIS DE DIREITO, QUE V/ EXA. MUI DOUTAMENTE SUPRIRÁ, DEVE O PRESENTE RECURSO SER JULGADO PROCEDENTE POR PROVADO E, EM CONSEQUÊNCIA, SER REVOGADA A DOUTA SENTENÇA RECORRIDA E SUBSTITUIDA POR OUTRA QUE DECRETE TODAS AS PROVIDÊNCIAS REQUERIDAS PELA ORA RECORRENTE NO SEU REQUERIMENTO INICIAL.” Também inconformadas com a decisão final, vieram ambas as Requeridas interpor recurso de apelação, terminando a sua alegação com as seguintes conclusões: “Atinentes à falta de periculum in mora 1. O tribunal a quo funda o periculum in mora: Ø Na existência do perigo de algum condómino de prédio administrado pela "Ac...-Consultoria de Condomínios, Lda." sugerir a mudança do condomínio para a administração da "I..., Unipessoal, Lda." por força do prestígio da requerida MS..., ao tomar conhecimento de que a mesma é legal representante de sociedade cujo objecto abranja a administração de condomínios, e tal venha a suceder; Ø Apesar de se afigurar que o perigo de lesão do direito da requerente não chegaria ao ponto de ser concretizado em termos de torná-la inviável, economicamente, as consequências ainda assim poderiam vir a ser graves e de difícil reparação, em face aos rendimentos da requerida MS..., se e quando esta viesse a ser chamada a responder civilmente pela violação do dever de não concorrência; 2. Ora de acordo com o disposto no n.° 1 do art.° 368.° do CPC o receio da lesão do direito aparente da requerente implica uma exigência acrescida que obriga a que seja fundado e portanto claramente demonstrado e só as lesões graves e irreparáveis ou de difícil reparação merecem a tutela provisória do procedimento cautelar; 3. O receio deve ser fundado e por isso suportado e m factos que permitam afirmar, com objectividade e distanciamento, a seriedade e actualidade da ameaça e a necessidade de serem adoptadas medidas tendentes a evitar o prejuízo e não bastam dúvidas, conjecturas ou receios meramente subjectivos ou precipitados; 4. E, para lá de a situação de perigo a defender dever ser actual e não meramente diferido e conjectural, não deve a mesma estar consumada, dado que o procedimento cautelar não visa corrigir situações (para isso serve a pertinente acção declarativa que se seguirá ao procedimento), mas prevenir a lesão grave e de difícil reparação; 5. Acresce que a requerente teve conhecimento da constituição da I... em Novembro de 2017 mas só requereu esta providência no dia 7 de Maio de 2018, o que significa que, mesmo dentro do seu fantasioso quadro expositivo e argumentativo, foi a própria requerente quem, com a promoção tardia desta providência, criou a situação de urgência que agora invoca a seu favor; 6. Das conclusões anteriores resulta a insubsistência da sentença a quo, além do mais porque: Ø Assenta em conjecturas e não nos factos provados; Ø Se existisse qualquer perigo de infrutuosidade da sentença a enunciar na acção principal em consequência da incapacidade da requerida MS... pagar qualquer indemnização futura derivada da violação do dever de não concorrência, então deveria-se permitir o exercício da actividade de gestão de condomínios por ela porque obviamente quanto mais funções remuneradas ou remuneráveis exercer maior será a probabilidade de satisfação do (suposto) crédito da requerente; 7. Mesmo que se verificasse qualquer agravamento dos danos económicos para a requerente decorrente da continuação da actividade das requeridas, o que não se aceita nem tem qualquer arrimo na matéria de facto provada, como é apodíctico, semelhantes prejuízos, pela sua própria natureza, poderiam ser cabal e plenamente ressarcidos por via de uma compensação pecuniária; 8. Na verdade, a requerente alardeia meros prejuízos económicos, os quais, se fossem provados, poderiam ser sempre ressarcidos perfeita e cabalmente mediante a entrega de um quantitativo pecuniário que corresponda ao montante dos danos; 9. É portanto óbvia a inexistência do periculum in mora, o que, por si só, determina o soçobro desta providência cautelar e a revogação da sentença a quo; Atinentes à inexistência de probabilidade séria da existência do direito invocado 10. Quanto à probabilidade séria da existência do direito invocado, há desde logo que notar que a proibição de concorrência estabelecida no artigo 990.° do Código Civil tem ser compatibilizada com o direito de livre estabelecimento e de iniciativa privada, que têm tutela constitucional - arts. 47° e 61° da Constituição da República Portuguesa; 11. Mesmo que existisse qualquer colisão entre o direito de livre estabelecimento e de iniciativa privada da requerida MS... e o da requerente à abstenção daquela exercer actividade igual à sua, é óbvio que, de acordo com o disposto no artigo 335.° do CC, o direito de livre estabelecimento e de iniciativa privada deve prevalecer, até porque a (suposta) violação da proibição de concorrência pode sempre ser cabalmente colmatada por via de uma compensação pecuniária; 12. No atinente à aferição da probabilidade séria da existência do direito invocado a sentença a quo assenta, exclusivamente, na proibição de concorrência ínsita no artigo 990.° do CC, aplicável por força do art. 3° do Cód. Com. e 2° do C.S.C.; 13. É verdade que, de acordo com essa norma, está vedado à requerida MS..., enquanto sócia da requerente, sem o consentimento dos demais, exercer actividade igual à da sociedade requerente; 14. Porém, dessa norma decorre que estão previstas apenas duas sanções para a concorrência proibida: Ø A responsabilidade pelos danos causados; Ø A exclusão de sócio, nos termos da alínea a), do art. 1003.° do CC; 15. Acresce que a responsabilidade se circunscreve ao sócio que tiver praticado o acto de concorrência proibida, não atingindo terceiros, neste caso a requerida sociedade I...; 16. Com efeito, a proibição de concorrência que decorre do art. 990 do Cód. Civil, que é o cerne da argumentação da requerente e da fundamentação da sentença a quo, existe somente no que toca à actividade desenvolvida pelo sócio, donde resulta que nunca a 2.ª requerida poderá ser responsabilizada nesse âmbito, até porque não foi invocada nem há qualquer fundamento para desconsiderar a personalidade jurídica da I...; 17. Noutra óptica, é apodíctico que a requerente não tem o direito de exigir às requeridas ou mesmo apenas à requerida MS... que se abstenha de exercer a actividade de gestão de condomínios; 18. No máximo a requerente poderá pedir e o Tribunal conceder uma indemnização pelas perdas e danos que para ela derivarem da violação, pela requerida MS... , do seu dever de não concorrência para com ela; 19. Nada mais; 20. Daí decorre, sem mais amplas considerações, a inverificação do requisito da probabilidade séria da existência do direito da requerente, mesmo sem entrar em indagações relacionadas com o abuso do direito de acção e a inexigibilidade do dever de não concorrência que, no caso, operaram como verdadeiras causa de exclusão da ilicitude; Atinentes à inadequação da providência à situação de lesão iminente 21. Do exposto decorre ainda a inadequação da providência decretada à situação de lesão iminente, supondo que esta exista, o que se repudia; 22. Na verdade, é óbvio que da violação da proibição da concorrência estabelecida pela norma do artigo 990.° do CC decorreriam apenas e só consequências indemnizatórias para o sócio remisso; 23. Por isso é manifesto que as providências cautelares concretamente requeridas e adoptadas de proibição das requeridas candidatarem-se à administração ou administrarem os condomínios que sejam administrados actualmente pela Ac... são inadequadas à situação de lesão invocada; 24. Note-se que estamos perante providências que antecipam à requerente um direito que o ordenamento jurídico globalmente considerado não lhe concede; 25. Na verdade, reitere-se e sublinhe-se que mesmo que existisse qualquer irremediável e inultrapassável conflito entre o direito da requerente à não concorrência da requerida MS... e o direito desta ao livre estabelecimento e de iniciativa privada que têm tutela constitucional, de acordo com o critério fixado no artigo 335.° do CC aquele teria de ser sacrificado e, quando muito, a requerida MS... teria de indemnizar a requerente pelas perdas e danos daí decorrentes; 26. Se se pretendesse assegurar a garantia patrimonial de qualquer crédito da requerente sobre a requerida MS... emergente da violação do dever de não concorrência - questão que nem sequer foi equacionada -, então a providência cautelar que ao caso caberia seria, por exemplo, a providência cautelar conservatória especificada de arresto; Atinentes à inexigibilidade do dever de não concorrência e do abuso do direito de acção 27. O acautelamento do interesse social não se confina apenas ao interesse societário tout court, ou seja, a uma actividade que vise lucros; 28. A eticização do direito e da vida societária impõem uma actuação honesta, criteriosa e transparente com paginável com a tutela de terceiros que possam ser prejudicados pela actuação do ente societário através da actuação de quem delineia a sua estratégia e é responsável pela actuação da sociedade, o que convoca os princípios da actuação de boa-fé, da confiança e a da proibição do abuso do direito; 29. A inexigibilidade de conduta diversa caracteriza-se pela actuação do agente de maneira típica e ilícita, mas sem merecer ser punido, pois, nas concretas circunstancias fácticas da sua actuação, dentro do que revela a experiência humana, não lhe era exigível um comportamento diverso; 30. Ora essa é a ilação jurídica que se impõe a partir da complexiva ponderação dos factos provados, designadamente dos descritos nos itens xiv., xviii a xxxv., xxxix a xli e xlvii a lv antecedentes acima reproduzidos e numerados, correspondentes aos factos provados descritos nos parágrafos 5° - página 11, 3°, 4°, 5° e 6° da página 12, todos os factos descritos na página 13, 14 e 15, 5°, 6° e 7° da página 16 e nos parágrafos 1° a 5° da página 18 da sentença a quo; 31. Enfim e sem mais amplas considerações, da matéria de facto provada decorre que os demais sócios da Ac... estão a instrumentalizar a sociedade e esta acção em prol dos seus interesses e estratégias pessoais no quadro do seu relacionamento com a consócia e requerida MS... e em clamoroso detrimento da requerente; 32. Daí o abuso da personalidade colectiva e do direito de acção; 33. De todo o exposto decorre também que era e é inexigível à requerida MS... a manutenção plena do dever de não concorrência; 34. A sentença a quo violou os artigos 47.° e 61.° da Constituição da República Portuguesa, os artigos 335.° e 990.° do Código Civil e o artigo 368.° do Código de Processo Civil, os quais devem ser interpretados e aplicados como aqui se propugna. Termos em que, com o sempre mui douto suprimento de V. Exas. Venerandas, deve dar-se provimento a este recurso e, consequentemente, conhecendo do objecto desta apelação e das questões de direito acima equacionadas, revogar-se a sentença a quo e negar-se provimento a esta providência cautelar, porque só desse modo se fará a costumada.” Apenas as Recorridas apresentaram alegação de resposta, concluindo que deve negar-se provimento ao recurso interposto pela Requerente, pelas razões já constantes da alegação de recurso, que, de novo, explana, acrescentando, a respeito da impugnação da matéria de facto feita pela Requerente, o seguinte: “Nos itens 26.°, 27.° e 28.° da sua alegação e nas conclusões D), E) e F) a apelante ensaia uma impugnação da decisão relativa à matéria de facto, com a vaga, genérica e conclusiva justificação de que o tribunal a quo devia atender aos depoimentos prestados pela representante da requerente e pelas suas testemunhas AC... e AR... e desconsiderar as declarações da requerida MS... e os depoimentos das testemunhas indicadas pelas requeridas. Porém: Ø Das alegações e conclusões do recurso decorre que a recorrente não está a impugnar a matéria de facto (…) Acresce que o exame e análise de cada uma das provas e a relacionação de todas elas no seu conjunto são indispensáveis. Por isso, naturalmente e de acordo com o disposto no art. 640.° do CPC, que impugna a decisão sobre a matéria tem de indicar, além do mais: a) Os concretos pontos de facto que considera incorrectamente julgados; b) Os concretos meios probatórios constantes do processo ou do registo ou gravação nele realizada, que impunham decisão sobre os pontos da matéria de facto impugnados diversos da recorrida, com a concretização, prevista pelo n.° 2, de que "No caso previsto na alínea b) do número anterior, observa-se o seguinte: a) Quando os meios probatórios invocados como fundamento do erro na apreciação das provas tenham sido gravados, incumbe ao recorrente, sob pena de imediata rejeição do recurso na respetiva parte, indicar com exatidão as passagens da gravação em que se funda o seu recurso, sem prejuízo de poder proceder à transcrição dos excertos que considere relevantes;". Este inciso impõe uma relação de congruente causalidade entre o meio de prova, a actividade probatória e a prova como resultado. Ora a requerente/apelante postergou completa e absolutamente estes ónus arvorando-se dona de verdades absolutas e apriorísticas. Daí que, pura e simplesmente, esse Venerando Tribunal da Relação não poderá conhecer a impugnação da decisão relativa à matéria de facto, que terá de ser rejeitada mesmo sem convite a aperfeiçoamento - cf. art. 640.°, n.° 1, do CPC. De resto, a prova invocada pela requerente/apelante esgota-se: Ø Nas declarações de parte da gerente da requerente AS...; Ø Nos depoimentos das testemunhas AC... e AR..., que são funcionários da requerente. Deste modo, mesmo nesta óptica de aferição da credibilidade relativa das declarações de parte e dos depoimentos das testemunhas das partes em confronto a partir do critério do interesse, haveria sempre que concluir que a prova produzida pelas requeridas, ora apeladas, é mais credível, além do mais porque está integrada pelos natural e objectivamente distantes e desinteressados depoimentos de três condóminos, mais concretamente a MCC..., residente na Rampa P..., n.° .., Bloco .. ...° C, 9...-... F..., o VS..., residente na Rua de S..., n.° ..., 9...-... R... e a CC..., residente na Rua V... n°..., bloco .. ..°A 9...-... F.... Quanto à (suposta) falta de interesse dos factos novos julgados provados na sequência do contraditório das requeridas - item 2 7.° da alegação e alínea E) das conclusões do recurso Sob a capa da impugnação da decisão sobre a matéria de facto, a apelante pretende efectivamente contornar a circunstância de não ter interposto recurso do despacho do tribunal a quo ditado directamente para a acta da audiência de julgamento do dia 29 de Junho de 2018, que rejeitou a junção aos autos do articulado da requerente de 15 de Junho de 2018 - requerimento de fls. 210 e seguintes. Note-se que esse despacho de rejeição do articulado da requerente de 15 de Junho de 2018 era directa e autonomamente recorrível, por força do disposto no artigo 644.°, n.° 2, alínea d) do CPC. Seja como for a requerente continua a confundir o objecto do requerimento inicial com o objecto do procedimento cautelar, que obviamente é constituído não apenas por aquele mas também pela matéria da oposição e principalmente pelas excepções aí deduzidas.” Questões a decidir 1. Se deve ser alterada a decisão da matéria de facto, nos termos indicados pela Requerente, ou rejeitado o recurso nessa parte; 2. Em função disso, e face aos factos indiciariamente provados, analisar se estão verificados os pressupostos para o decretamento das providências cautelares não especificadas requeridas, designadamente: - se a Requerente é (aparentemente) titular de direito que careça de tutela (e as Requeridas da correspetiva obrigação), concretamente, o direito à “não concorrência” por parte da 1.ª Requerida, em face da atividade desenvolvida pela sociedade, 2.ª Requerida; - na afirmativa, se há o perigo de ocorrência de lesão grave e dificilmente reparável a esse direito no caso das providências requeridas não serem decretadas; - na afirmativa, se tais providências são (ou não) adequadas à efetivação do direito e à remoção do perigo existente; 3. Ainda que verificados os indicados requisitos das providências cautelares, se não pode ser reconhecido o direito de ação à Requerente, por tal constituir um abuso do direito, analisando designadamente se a atuação desta configura um abuso da personalidade coletiva. Colhidos os vistos legais cumpre decidir. 2. FUNDAMENTAÇÃO 2.1. FACTOS QUE FORAM CONSIDERADOS INDICIARIAMENTE PROVADOS NA DECISÃO RECORRIDA (que, embora a ordem lógica e cronológica não seja a melhor, passamos a reproduzir, seguindo a grafia do Acordo Ortográfico e substituindo as referências autora e ré, por Requerente e Requerida, precisando ainda quando se trata da 1.ª ou da 2.ª Requerida, numerando os factos que, do ponto 16. em diante, não se encontravam numerados e retificando o lapso de escrita constante do agora numerado ponto 24. (onde consta “João” deve constar José”); os factos indicados em 1-A, 2-A, 3-A, 3-B e 9-A foram por nós aditados, ao abrigo do art. 607.º, n.º 4, aplicável ex vi do art. 663.º, n.º 2, ambos do CPC) «Permanece sumariamente provada a seguinte factualidade, pelas razões já indicadas a respeito na primeira sentença proferida nos autos: 1. A requerente é uma sociedade comercial por quotas com a firma “Ac... -Consultoria de Condomínios, Lda.”, NIPC 508... e com igual número de matrícula na Conservatória do Registo Comercial do Funchal, com sede na Rua N..., n.º ..., R/C e ...º andar, freguesia de Santa Luzia, concelho do Funchal, com o capital social de cinco mil euros e cujo objeto social é a consultoria e gestão de condomínio. 1-A. A constituição dessa sociedade mostra-se inscrita na referida Conservatória mediante apresentação n.º 2, de 13-11-2007 (documento 1 junto com o requerimento inicial). 2. A Requerente tem como sócios: - AS..., sócia titular de uma quota com o valor nominal de 1.666,66 € (mil seiscentos e sessenta e seis euros e sessenta e seis cêntimos), - JS..., sócio titular de uma quota com o valor nominal de 1.666,68 € (mil seiscentos e sessenta e seis euros e sessenta e oito cêntimos), e - A Requerida MS..., sócia titular de uma quota com o valor nominal de 1.666,66 euros (mil seiscentos e sessenta e seis euros e sessenta e seis cêntimos). 2-A. Sócios e quotas que constam da inscrição 6, efetuada mediante apresentação n.º 14, de 10-01-2012 (documento 1 junto como requerimento inicial). 3. A Requerida Maria MS... constituiu uma sociedade unipessoal por quotas com a firma “I..., Unipessoal, Lda.”, NIPC 514... e com igual número de Matrícula na Conservatória do Registo Comercial do Funchal, com sede no C..., n.º .., M..., Funchal, contendo no respetivo objeto social a administração de condomínios. 3-A. A constituição dessa sociedade, ora 2.ª Requerida, mostra-se inscrita na referida Conservatória mediante apresentação n.º 4, de 22-09-2017 (documento 2 junto com o requerimento inicial). 3.-B. A 1.º Requerida é a única gerente da I..., Unipessoal, Lda. (art. 22.º, parte final, do requerimento inicial e documento 2 junto com o requerimento inicial). 4. A Requerente teve, pelo menos no dia 03-11-2017, conhecimento que a 1.ª Requerida inscreveu a sua empresa ora 2.ª Requerida na cidade do empreendedor. 5. A Requerente teve, pelo menos no dia 03-11-2017, conhecimento que ambas as Requeridas estiveram presentes na cidade do empreendedor. 6. A Requerente teve, no passado recente, conhecimento que as Requeridas pretenderam contratar, para vir a trabalhar na “empresa Requerida”, a Senhora SB..., que foi funcionária da sociedade Requerente. 7. A referida Senhora SB... apresentou à sociedade Requerente a denúncia do respetivo contrato de trabalho celebrado com a sociedade Requerente. 8. A dita ex-funcionária SB... trabalha para a “empresa Requerida”. 9. A Requerida MS... foi, de igual modo, gerente da Requerente. 9.-A Tendo iniciado funções por deliberação de 08-10-2010 (registada mediante apresentação n.º 12, de 22-10-2010) e cessado funções por destituição (em 15-07-2017), o que foi registado mediante apresentação n.º 35, de 18-07-2017 (documento 1 junto com o requerimento inicial). 10. Os condomínios administrados pela Requerente são os seguintes: Edifício AA...; Edifício AV...; Edifício A...; Edifício Bloco ... - Rua A...; Edifício Bloco ... - Z...; Edifício B...; Edifício BG...; Edifício C... - Bloco ...; Edifício C... - Bloco 2; Edifício CP...; Edifício CN...; Edifício CA...; Edifício C...; Edifício CD...; Edifício D... - Bloco C; Edifício EL...; Edifício F...; Edifício G...; Edifício H... em; Edifício I...; Edifício K...; Edifício K... – Garagens; Edifício L... I; Edifício CH... I; Edifício CH... II A-H; Edifício CH... II I-J; Edifício Ma...; Edifício MaP...; Edifício MoP... II; Edifício N... VII; Edifício O...; Edifício P...; Edifício Pe... Lote ...; Edifício P...; Edifício PR...; Edifício QC...; Edifício QJ...; Edifício Quintinha Rib. Alforra; Edifício Quitéria Park III; Edifício Rida; Edifício Rua de São Filipe n.°16; Edifício Saída Leste II; Edifício Santa Clara; Edifício Santa Emília; Edifício Santa Luzia; Edifício São José; Edifício Sidónio Pais - Bloco B; Edifício Vale Verde; Edifício Vista do Carmo; Parques Windsor. 11. Os condomínios supra identificados ficam localizados nos concelhos do Funchal, de Câmara de Lobos e de Santa Cruz. 12. A Requerente rececionou por carta registada com aviso de receção a ata com a deliberação de exoneração da Requerente como administradora do condomínio do edifício Ribeira Country III. 13. Dão-se por reproduzidos os documentos de folhas 11 a 15-frentes e versos. 14. A SB..., BS... e a Requerida Maria MS... tiveram conhecimento dos orçamentos da Requerente ainda quando eram, respetivamente, funcionária, funcionário e gerente da ora Requerente. 15. Não é verdade que a Requerente “roube” os prédios, faça obras nos prédios em bem próprio ou em benefício de empreiteiros amigos da Requerente ou amigos dos demais sócios da Requerente. 16. As Requeridas, na cidade do empreendedor, procuraram angariar clientes para a “empresa Requerida”, tendo-o feito no âmbito territorial onde a Requerente desenvolve o respetivo objeto social. Para além disso, da factualidade nova invocada pela Requerida, com interesse para a decisão da causa, resultaram sumariamente provados os seguintes factos: 17. A Requerida I... tem apenas 3 clientes, a saber, os seguintes condomínios: Edifício Ínsula, com 27 frações autónomas, desde 5 de março de 2018; Edifício Podium, com 35 frações autónomas, desde 1 de abril de 2018, Edifício Quinta do Pilar, com 30 frações autónomas, desde 6 de abril de 2018. 18. O Edifício Quinta do Pilar já era administrado pela empresa Loja do Condomínio, desde março de 2018. 19. A Requerente fez publicações contra os Requeridos em jornal regional no dia 2 de Novembro de 2017, nos termos constantes do documento 4 junto com a oposição, no verso de folhas 180, que aqui se reproduz. 20. A Requerida MS... tem interesse na continuidade e na prosperidade da Ac... para propiciar ao seu sócio Dr. JS... receitas para pagar os empréstimos bancários que contraiu, designadamente aquele em que a Requerida MS... interveio como fiadora e para valorizar a quota da Requerida MS... no capital social da Ac.... 21. A SB... desvinculou-se da Requerente em finais de 2017, ficou desempregada até Abril de 2018, mês em que celebrou com a Requerida I... um contrato de trabalho. 22. A Requerida MS... é funcionária pública integrada nos quadros do Centro de Emprego e Formação Profissional desde 2002, o que lhe proporciona o vencimento líquido de 1.147,52 € por mês e o seu horário de trabalho é entre as 09:00 e as 12:30 e as 14:00 e as 17:30 horas, de segunda a sexta-feira. 23. A Requerida é presidente da Junta de Freguesia de ….., no Funchal, desde Outubro de 2013, o que lhe proporciona um rendimento. 24. A Requerida MS... é cunhada do Dr. JS..., casado com a sua irmã LS.... 25. Em 29 de Agosto de 2011, através da escritura pública lavrada de folhas 8 a folhas 11 do Livro de Notas para escrituras diversas número 233-A do Cartório Notarial de Ernesto C. Santos, no Funchal, a Requerida MS... confessou-se e constituiu-se fiadora e principal pagadora das dívidas contraídas pela sua irmã e ao seu cunhado no quadro do Mútuo Com Hipoteca e Fiança por estes celebrado com a “Unión de Créditos Inmobiliários, S.A., Estabelecimento Financeiro de Crédito (Sociedad Unipersonal)”, pelo qual solicitaram à UCI um empréstimo no montante de 162.000 € (cento e sessenta e dois mil euros) concedido ao abrigo do Regime Geral de Crédito à Habitação, destinado à construção de habitação própria e permanente, cujo reembolso terá de ser efetuado em 480 prestações mensais e sucessivas de capital e juros. 26. A Requerida MS..., a sua irmã LS... e o seu cunhado Dr. JS... adquiriram, o prédio urbano localizado na Rua N..., n.º ..., freguesia de Santa Luzia, concelho do Funchal, inscrito na matriz predial urbana sob o artigo 3... e descrito na competente Conservatória do Registo Predial sob o artigo 1.... 27. Para tanto, contraíram um empréstimo junto do Banif, depois transferido para o Santander Totta, do montante de 220.000 €, o qual teria de ser pago em 371 prestações mensais de 863,07 € cada, a valores de Junho de 2018. 28. Ademais, de acordo com o projeto apresentado pelo Dr. JS..., os encargos bancários emergentes da contração deste empréstimo para a compra do prédio da Rua N... seriam cobertos e pagos pelas rendas que seriam cobradas à Ac... e pelas quantias que ele próprio pagaria pela utilização de parte desse edifício como seu escritório, quantias essas que corresponderiam à renda que ele pagava pelo escritório que tinha na Vila de São Vicente, de 400 € por mês. 29. Foi celebrado contrato de arrendamento do prédio localizado na Rua N... à Requerente Ac... em 1 de Outubro de 2012, com renda mensal de 1.000 €. 30. Porém, ao contrário do prometido, o Dr. JS... nunca pagou qualquer valor pela utilização do último piso e de parte do piso térreo do prédio onde está instalada e funciona a sede da Ac... à Rua N... e até as despesas e consumos de água, luz, telefone e internet do escritório do Dr. JS... são suportadas pela Ac.... 31. A Requerida MS..., o seu cunhado JS... e a irmã deste AS... são os únicos sócios da requerente Ac... desde 2012, data a partir da qual o respetivo capital social passou a estar distribuído por três quotas de 1.666,66 € cada. 32. Por causa do emprego público e do cargo político que a Requerida MS... exerce, a Requerida MS... nunca trabalhou exclusivamente para a Requerente, mesmo no período em que foi sua gerente, nem foi remunerada pelas suas funções de gerente. 33. Foi também por causa do referido contrato de emprego público e do cargo político que a Requerida MS... se manteve relativamente afastada do dia-a-dia da Ac... e dos respetivos detalhes Operacionais, que estavam sob a égide do Dr. JS... e da sua irmã AS.... 34. A confiança da Requerida MS... nos demais sócios da Ac... era plena mas em 2016 já não o era. 35. Isto porque a Requerida se foi apercebendo de factos que apontavam no sentido dos demais sócios estarem a prevalecerem-se dessa confiança e da menor presença da Requerida para seu benefício próprio e pessoal, em detrimento da sociedade e da Requerida MS.... 36. Os sócios JS... e a irmã AS... usavam o cartão multibanco da Ac... para realizarem despesas pessoais, estranhas à atividade da Ac..., designadamente os movimentos e lançamentos sombreados no documento que aqui se reproduz, junto com a oposição com o n.º 10 - Saldo e Movimentos da conta da Ac... aberta no Santander Totta — que reflectem despesas na Incentivaromas, no Dolce Vita Funchal, no Pingo Doce, no restaurante Papa Manuel. 37. A mãe dos sócios JS... e AS... recebia 200 € por mês sem que, pelo menos na perceção da Requerida MS..., fizesse ou produzisse o que quer que fosse que justificasse esse pagamento e sem que esse pagamento fosse de algum modo evidenciado nas contas e na contabilidade da Ac.... 38. Os funcionários da empresa trabalhavam fora do seu horário normal de trabalho, designadamente secretariando as assembleias gerais de condóminos sem receberem qualquer pagamento adicional por isso e sem que ao menos lhes fossem atribuídos dias de descanso suplementar. 39. O custo do patrocínio jurídico e do contencioso dos condomínios era-lhes imputado e era efetivamente por eles suportado sem que estivesse evidenciado no respetivo orçamento e sem que o mandatário emitisse o respetivo recibo. 40. Acresce que começaram a ser apostas nos cheques dos condomínios administrados pela Ac... assinaturas semelhantes à da Requerida MS... mas que não tinham efetivamente sido feitas, conforme documento n.º 11, que aqui se reproduz, junto com a oposição, a folhas 195 a 196, frentes e versos e folhas 197, sendo que as cópias riscadas contêm uma assinatura não aposta pela Requerida MS... e a que está não está riscada ostenta a assinatura genuína da requerida MS..., o que aconteceu, pelo menos, em Julho de 2017, conforme a mesma se apercebeu. 41. Houve inclusivamente cheques que não foram pagos ou depositados no banco porque o gerente do balcão considerou que a assinatura era diferente da Requerida MS.... 42. Essa prática, que começou a ser percebida pela requerida em 2016, persistiu pelo menos até Julho de 2017. 43. A Requerida verificou também que, por exemplo no dia 10 de Novembro de 2016, o sócio Dr. JS... enviou uma mensagem por correio electrónico para a então funcionária da Ac... Le... com o seguinte teor: “Muito boa tarde, Le..., Prepare, por favor, tudo quanto é necessário para que eu, em representação da AS..., possa retirar neste próximo fim-de-semana a receita da Ac.... Obrigado Cumprimentos, JS....” 44. Essas suspeitas fizeram com que a Requerida deixasse de ter confiança nos demais sócios da Requerente, confiança que tinha justificado e determinado a aquisição das quotas da Ac... pelos atuais três sócios. 45. Em 2016 e 2017 a Requerida revelou aos demais sócios que não tinha mais condições para continuar a ser sócia-gerente da Ac... por quebra irreversível da confiança pessoal para tanto necessária, o que implicava a sua renúncia à gerência e a alineação ou transferência da sua quota. 46. Foram apresentadas e recebidas pelos demais sócios propostas para a venda da quota da Requerida MS... da Ac..., as quais não tiveram sequência da parte dos demais sócios. 47. O seu cunhado JS... dizia que ela teria de continuar na Ac... até pelo menos reembolsar-lhe "todo o dinheiro que adiantei por ti, a não ser que arranjes o dinheiro de uma só vez." 48. Porém, o consócio Dr. JS... nunca quantificou o valor do crédito que alardeia sobre a Requerida MS.... 49. O Dr. JS... endereçou à requerida no dia 10 de novembro de 2016 às 15:29 horas, a seguinte mensagem de correio eletrónico: "MS..., Não cometi nenhum crime. A continuares assim a próxima carta que irei escrever é para a UCI no sentido da prestação de que és fiadora ser debitada na tua conta. A continuares assim prepara-te para um queixa crime por difamação. E podes ter a certeza que o farei. A continuares assim prepara-te que irei accionar-te civilmente pelo dinheiro que me deves. E não será nada fácil para uma presidente de junta ser accionada pelo cunhado por dívidas, mas o povo é quem mais ordenará. Se quiseres guerra em vez de paz eu estou preparadíssimo; e digo-te mais: eu vou ganhar e tu vais perder. Queres correr o risco? Se quiseres prepara-te para as consequências da pesada derrota que vais enfrentar. Faz o que entenderes por bem mas prepara-te para as consequências. E sim vais continuar na Ac... até pelo menos reembolsares todo o dinheiro que adiantei por ti, a não ser que arranjes o dinheiro de uma só vez, o que me parece impossível, mas se conseguires tanto melhor e aí então poderemos falar a sério da tua eventual saída. Quanto aos processos que pensas fazer está completamente à vontade porquanto não cometi nenhum crime. Será melhor consultares outro Advogado especialista em direito criminal que te explique bem quais são os elementos subjectivos e objectivos do tipo legal de crime em questão. Boa sorte, porque vais precisar. Abraço, JS..." 50. O Dr. JS... enviou à Requerida no dia 10-11-2016 às 17:29, mensagem com o seguinte teor: "MS..., Não tens dinheiro para sair. Tão simples. Logo, tens de trabalhar. Tão simples." 51. Depois dos acontecimentos acima referidos a Requerida ficou abalada e percebeu que as ameaças do seu cunhado eram para levar a sério. 52. A Requerida concluiu que teria de constituir uma nova fonte de rendimento, por ter ficado com receio de que tivesse de suportar sozinha quer as prestações do empréstimo para com a UCI em consequência da sua intervenção como fiadora quer mesmo as prestações do empréstimo destinado à aquisição do prédio à Rua N..., prestações que representam o encargo total mensal superior a 1.500 €, no confronto com o salário da Requerida como funcionária pública de 1.147,52 € e achou que teria de fazê-lo numa área de atividade que conhecesse e de que gostasse. 53. Quando adquiriu as quotas da Ac... a Requerida foi motivada pelo facto de se inserir num âmbito que implica a direta e intensa relação com as pessoas, o que sempre fez e faz com gosto. 54. A Requerida perguntou ao Dr. João ……., ilustre advogado, se podia constituir uma nova sociedade que, além do mais, tivesse por objeto a gestão de condomínios, ao que este disse que sim, tendo a Requerida MS... agido com a convicção, ao criar a empresa Requerida, de que podia fazê-lo. 55. A I... efetuou promoção junto de condomínios que não eram administrados pela Ac.... 56. A partir do momento em que a Requerida MS... passou a perceber a utilização que os demais sócios da Ac... faziam dos bens e da atividade desta em seu propósito e a colocar entraves a esses comportamentos, estes reagiram e procuraram intimidá-la e cercear toda a sua atuação, designadamente através do temor da perda da sua boa imagem pública, da paz familiar e da integralidade do seu património e solvência pessoal. 57. Pretendem ainda, especialmente o Dr. JS..., fazer com que a Requerida MS... prescinda da sua quota na Ac... e na compropriedade do prédio localizado na Rua N... sem as contrapartidas do ponto de vista económico que a mesma considera como sendo devidas. 58. Desde Julho de 2017, data em que afastaram a requerida MS... da gestão da Ac..., os demais sócios têm até interesse na sua manutenção como sócia porque desse modo podem exigir-lhe a sua quota-parte nas despesas e prevalecerem-se da sua reputação e imagem pública para obterem novos contratos e clientes. 59. Através da deliberação adotada no dia 15 de julho de 2017, à qual se refere a ata número 14 da Requerente, foi decidido pelos sócios AS... e JS... destituir com invocada justa causa do cargo de gerência a gerente MS.... 60. De acordo com as menções da referida ata, a sócia MS... foi convocada por carta registada com aviso de receção sob registo postal RD817617955PT e que foi remetido a 23-06-2017. 61. Essa correspondência tem a menção de não entregue porque o destinatário estava ausente e foi avisado no Posto Livramento Funchal e devolvido ao remetente na Ponta do Sol. 62. A carta em causa foi remetida da Ponta do Sol quando a sede da Ac... localiza-se na Rua N..., n.º ..., R/C e ...º andar, no Funchal. 63. A Requerida não foi notificada da ata da sua destituição, da qual se apercebeu apenas quando foi alertada por uma funcionária do Banco. 64. Os sócios Dr. JS... e AS... endereçaram à Requerida MS..., no dia 28 de novembro de 2017, carta de denúncia do contrato de arrendamento orientada para a respetiva cessação no dia 30 de março de 2018. 65. Porém, a Ac... continua a utilizar o prédio da Rua N... e o Dr. JS... continua com o seu escritório. 66. O sócio JS... é advogado. 67. O edifício onde está instalada e funciona a sede e os serviços administrativos da Requerente pertence à Requerida, ao Dr. JS... e à esposa deste e irmã daquela. 68. Esse prédio foi dado de arrendamento à Requerente. 69. Porém, o Dr. JS... usa o 2.º andar desse prédio para fixar o seu escritório de advogado, que divide com a Colega MB... e a funcionária forense. 70. Esta funcionária forense foi incluída no quadro de pessoal da Requerente e é paga por esta, mas presta serviço ao Dr. JS.... 71. O andar intermédio do prédio está destinado aos serviços da requerente. 72. Porém, o andar térreo do prédio destina-se aos gabinetes dos demais advogados que trabalham por conta o Dr. JS..., mais concretamente o Dr. SD..., e ainda ao arquivo da Ac.... 73. As propostas de orçamento da Ac... e dos condomínios são divulgadas junto dos condóminos dos condomínios. 74. Foi o condomínio do Edifício Ribeira Country III que entendeu prescindir dos serviços da Ac.... 75. A Requerida MS... praticou e contribuiu para a prática dos atos de gestão que exigiam a sua intervenção, embora por vezes tenha sido um colaborador da Requerente a ir ao encontro da mesma Requerida, para o efeito. 76. O Edifício Quinta do Pilar, que já foi administrado pela Requerente, passou a ser administrado pela “Loja do Condomínio” e atualmente é administrado pela Requerida. 77. Os orçamentos praticados pela Requerente são elementos que são disponibilizados a todos os condomínios seus clientes e respetivos condóminos e constam da respetiva ata em que o orçamento é aprovado.» 2.2. FACTOS QUE FORAM CONSIDERADOS NÃO INDICIARIAMENTE PROVADOS NA DECISÃO RECORRIDA (que, nesta parte, se reproduz, alterando a grafia em conformidade com o Acordo Ortográfico): «Não resultou sumariamente provada a seguinte factualidade: Para além da já mencionada na primeira sentença, e pelas razões nela expostas a respeito, isto é: - Que o Edifício Quinta do Pilar seja administrado pela requerente. - Que o valor global dos honorários mensais auferidos pela requerente ascenda ao total de 11.898, 58 euros, após a produção da prova indicada pelas requeridas, não resultou indiciariamente provada a seguinte factualidade: - Que os condomínios do Edifício Q... e do Edifício R... III sejam atualmente administrados pela requerente; - Que as requeridas tenham contactado, por diversas formas e meios, condóminos dos prédios administrados pela requerente, informando-os da existência da empresa requerida e publicitando que pretendem vir a administrar com a empresa requerida os prédios administrados pela requerente por, na respetiva versão, a requerente ser pessoa não séria e por ser pessoa não responsável, por fazer obras nos ditos prédios em benefício próprio ou em benefício de empreiteiros amigos da requerente ou amigos dos demais sócios da requerente, procurando deste modo as requeridas desviá-los da carteira de clientes da requerente; - Que a SB..., juntamente com a requerida Maria MS..., anda a contactar os condóminos dos prédios administrados pela requerente, apresentando orçamentos mais baixos (mesmo sabendo que tais orçamentos serão insuficientes para fazer face às reais despesas anuais dos prédios administrados pela requerente); - Que o ex-funcionário da requerente BS... juntamente com a SB... e com a requerida Maria MS..., anda a contactar os condóminos dos prédios administrados pela requerente, apresentando orçamentos mais baixos (mesmo sabendo que tais orçamentos serão insuficientes para fazer face às reais despesas anuais dos prédios administrados pela requerente) bem como andam a propalar que a requerente "rouba" os prédios, faz obras nos prédios em benefício próprio ou em benefício de empreiteiros amigos da requerente ou amigos dos demais sócios da requerente; - Que foi na sequência dos contactos das requeridas com os condóminos do edifício Ribeira C... IIII que ocorreu a realização de uma assembleia geral de condóminos onde foi deliberada a exoneração da requerente como empresa administradora do edifício R... III; - Que as requeridas andem a contactar condóminos de outros condomínios administrados pela requerente, designadamente que já andam a contactar vários dos senhores condóminos dos condomínios M... II, P..., Ma.. (...), Ma... I (...) e Ma... II, entre outros, sempre com a estratégia de referir que a requerente não é pessoa séria e não é pessoa responsável e que engana e que "rouba" os prédios que administra e consequentemente os respetivos condóminos, "furtando" os prédios, fazendo obras para beneficiar-se com as mesmas e para beneficiar empreiteiros amigos da requerente ou dos demais sócios da requerente; - Que o prédio que MS..., LS... e o Dr. JS... adquiriam esteja descrito na competente Conservatória do Registo Predial sob o artigo 1186; - Que a requerida tivesse dado aval à sua irmã e ao seu cunhado, para a aquisição de um prédio, para os ajudar; - Que a requerida não deva dinheiro ao Dr. JS...; - Que os requeridos, sozinhos ou em parceria com a SB... e/ou com o BS..., tenham contactado, por alguma forma ou meio, condóminos dos prédios administrados pela requerente informando-os da existência da empresa requerida e publicitando que pretendem vir a administrar com a empresa requerida os prédios administrados pela requerente por, na respetiva versão, a requerente ser pessoa não séria e por ser pessoa não responsável, por fazer obras nos ditos prédios em benefício próprio ou em benefício de empreiteiros amigos da requerente ou amigos dos demais sócios da requerente, procurando deste modo desviá-los da carteira de clientes da requerente, designadamente que tivessem contactado para esse fim os condomínios e/ou os condóminos dos edifícios Monumental Place II, Praça das Madalenas, Madalena I ou quaisquer outros administrados pela Ac...; - Que as requeridas tivessem, sozinhas ou em conjugação de esforços com quem quer que seja apresentaram orçamentos a condomínios administrados pela Ac..., que soubessem que tais orçamentos seriam insuficientes para fazer face às reais despesas anuais dos prédios e dos condomínios; - Que o rendimento que aufere como Presidente da Junta de Freguesia do ...., no Funchal, seja o de € 600,00 (seiscentos euros) por mês; - Que a mãe da requerida MS... tenha cerca de 80 anos; - Que a deliberação de destituição da requerida MS... da gerência da requerente tenha sido adotada em 17 de Julho de 2017; - Que a AS... secundasse a afirmação do Dr. JS... de que a requerida MS... teria de continuar na Ac... até pelo menos reembolsar ao mesmo "todo o dinheiro que adiantei por ti, a não ser que arranjes o dinheiro de uma só vez;" - Que a carta de denúncia que os sócios Dr. JS... e AS... endereçaram à requerida MS... mencione como data da cessação do contrato de arrendamento o dia 31 de Março de 2018; - Que a mãe da requerida MS... tenha 80 anos; - Que a requerida MS... sempre tivesse suportado a sua quota-parte nas despesas da sociedade e do prédio em compropriedade; - O propósito com que foram instauradas as ações judiciais contra a requerida MS..., designadamente as que tramitaram com os números 434/11.5TCFUN-C, e os processos 310/2017-JP e 156/2017-JP, ambos do Julgados de Paz do Funchal.» Na decisão recorrida, imediatamente antes do enunciado dos factos que foram considerados sumariamente provados, consta ainda o seguinte: «Da factualidade dada como provada na sentença proferida a 16.05.2018, deixou de estar sumariamente provada a indicada em 11-5 , a partir de "(...) a promover (...)", 6, 9, a partir de (....) e juntamente com a requerida até (...) dos que os da requerente), 10, a partir de "(...) e juntamente (...), 14, 15, na parte que refere "Na sequência desses contactos realizados pelas requeridas" e 17, factualidade que passa para a factualidade que não resultou sumariamente provada.» * 2.3. IMPUGNAÇÃO DA MATÉRIA DE FACTOA Recorrente Ac... alega que a decisão da matéria de facto do Tribunal recorrido enferma de erro de julgamento, concluindo que: D) Incorreu em erro de julgamento o Tribunal a quo ao não ter julgado como indiciariamente provada toda a matéria que foi dada como indiciariamente provada na douta sentença datada 16 de Maio de 2018 (anterior à audição das requeridas) por desconsideração do depoimento de parte e testemunhos indicados no artigo 26.º do presente articulado. E) Incorreu em erro de julgamento o Tribunal a quo ao não ter julgado como factos sem interesse para a decisão da causa por não constituírem fatos extintivos, modificativos ou impeditivos do direito da requerente e, muito menos, factos que contendam com os requisitos do decretamento das providências cautelares todos os factos indicados em 27.° do presente articulado; F) Incorreu em erro de julgamento o Tribunal a quo ao não ter julgado como sumariamente não provados os factos indicados no artigo 28.º do presente articulado. As Recorridas defendem que este Tribunal “não poderá conhecer a impugnação da decisão relativa à matéria de facto, que terá de ser rejeitada mesmo sem convite a aperfeiçoamento”. Importa ter presente o que dispõe o artigo 640.º do CPC sobre o ónus a cargo do recorrente que impugne a decisão relativa à matéria de facto, prevendo que: “1 - Quando seja impugnada a decisão sobre a matéria de facto, deve o recorrente obrigatoriamente especificar, sob pena de rejeição: a) Os concretos pontos de facto que considera incorretamente julgados; b) Os concretos meios probatórios, constantes do processo ou de registo ou gravação nele realizada, que impunham decisão sobre os pontos da matéria de facto impugnados diversa da recorrida; c) A decisão que, no seu entender, deve ser proferida sobre as questões de facto impugnadas. 2 - No caso previsto na alínea b) do número anterior, observa-se o seguinte: a) Quando os meios probatórios invocados como fundamento do erro na apreciação das provas tenham sido gravados, incumbe ao recorrente, sob pena de imediata rejeição do recurso na respetiva parte, indicar com exatidão as passagens da gravação em que se funda o seu recurso, sem prejuízo de poder proceder à transcrição dos excertos que considere relevantes; b) Independentemente dos poderes de investigação oficiosa do tribunal, incumbe ao recorrido designar os meios de prova que infirmem as conclusões do recorrente e, se os depoimentos tiverem sido gravados, indicar com exatidão as passagens da gravação em que se funda e proceder, querendo, à transcrição dos excertos que considere importantes. 3 - O disposto nos n.ºs 1 e 2 é aplicável ao caso de o recorrido pretender alargar o âmbito do recurso, nos termos do n.º 2 do artigo 636.º.” É conhecida a divergência jurisprudencial a respeito da aplicação deste normativo e da sua conjugação deste preceito legal com o que se dispõe no n.º 1 do art. 639.º, atinente ao ónus de alegar e formular conclusões. Sobre a matéria, veja-se, a título exemplificativo, o acórdão do STJ de 06-12-2016 - Revista n.º 2373/11.0TBFAR.E1.S1 - 1.ª Secção, sumário citado na compilação de acórdão do STJ, Ónus de Impugnação da Matéria de Facto, Jurisprudência do STJ, disponível em www.stj.pt, bem como o acórdão do STJ de 01-10-2015, no processo n.º 824/11.3TTLRS.L1.S1, disponível em www.dgsi.pt, cujo sumário, pelo seu interesse para o caso, se passa a citar: “I – No recurso de apelação em que seja impugnada a decisão da matéria de facto é exigido ao recorrente que concretize os pontos de facto que considera incorrectamente julgados, especifique os concretos meios probatórios que imponham uma decisão diversa, relativamente a esses factos, e enuncie a decisão alternativa que propõe. II - Servindo as conclusões para delimitar o objecto do recurso, devem nelas ser identificados com precisão os pontos de facto que são objecto de impugnação; quanto aos demais requisitos, basta que constem de forma explícita na motivação do recurso. III - Não existe fundamento legal para rejeitar o recurso de apelação, na parte da impugnação da decisão da matéria de facto, numa situação em que, tendo sido identificados nas conclusões os pontos de facto impugnados, assim como as respostas alternativas propostas pelo recorrente, não foram, contudo, enunciados os fundamentos da impugnação nem indicados os meios probatórios que sustentam uma decisão diferente da que foi proferida pela 1.ª instância, requisitos estes que foram devidamente expostos na motivação. IV – Com efeito, o ónus a cargo do recorrente consagrado no art. 640º, do Novo CPC, não exige que as especificações referidas no seu nº 1, constem todas das conclusões do recurso, mostrando-se cumprido desde que nas conclusões sejam identificados com precisão os pontos de facto que são objecto de impugnação.” No caso em apreço, nem mesmo à luz da interpretação mais benévola que destes preceitos se possa fazer se poderá considerar que a Recorrente Ac..., Lda. tenha cumprido o ónus a seu cargo ou que o incumprimento possa ser sanado mediante convite ao aperfeiçoamento das conclusões da sua alegação, uma vez que, nem sequer no corpo da alegação, observou as especificações previstas na lei. Vejamos melhor. Quanto aos factos que a Requerente considera que deveriam estar provados (conclusão D e art. 26.º da alegação de recurso), verifica-se que não indicou, nem nas conclusões, nem sequer no corpo da alegação de recurso, os concretos pontos de facto que considera incorretamente julgados, limitando-se a dizer que “deveria ter o Tribunal a quo mantido como factualidade sumariamente provada aquela que consta da douta sentença proferida antes da audição das requeridas.” Ora, não obstante o disposto no art. 372.º, n.º 3, do CPC, estamos perante decisões que não se confundem, vindo a última complementar a decisão primeiramente proferida, da qual faz parte integrante. Na segunda decisão, foi decidido que “Permanece sumariamente provada a seguinte factualidade, pelas razões já indicadas a respeito na primeira sentença proferida nos autos”. Mas também se decidiu acrescentar outros factos alegados pelas Requeridas (não os numerando). Mais se decidiu, de seguida, indicar os factos que não foram considerados indiciariamente provados, referindo “Para além da já mencionada na primeira sentença, e pelas razões nela expostas a respeito, isto é: Que o Edifício Quinta do Pilar seja administrado pela requerente. Que o valor global dos honorários mensais auferidos pela requerente ascenda ao total de 11.898, 58 euros, após a produção da prova indicada pelas requeridas, não resultou indiciariamente provada a seguinte factualidade.” Quanto a esta última factualidade (não indiciariamente provada), que nem sequer se encontra organizada por alíneas, também não se indica, embora tivesse sido conveniente fazê-lo, se os factos constavam do requerimento inicial ou da oposição. A Requerente deveria pois, pelo menos, e não teria sido difícil fazê-lo, para que pudessemos compreender, de forma cabal e com o mínimo de segurança, qual o invocado erro de julgamento, indicar os concretos pontos de facto da decisão que foram considerados não provados e que, no seu entender, deveriam, ao invés, ter sido considerados indiciariamente provados. Ou referir os factos concretos que deveriam ter sido considerados indiciariamente provados, por referência aos artigos do seu requerimento inicial. Não o fez, repete-se, nas conclusões e nem sequer no corpo da alegação, como se impunha - art. 640.º, n.º 1, al. a), do CPC. Não é a a este Tribunal que compete procurar averiguar por confronto das decisões em apreço, quais os factos indiciariamente provados na primeira que não foram também considerados indiciariamente provados na segunda (que terão sido, porventura, aí considerados não provados). É, pois, manifesto que, nesta parte, o recurso deve ser rejeitado. Quanto aos factos que a Recorrente Ac..., Lda. sustenta que deveriam ter sido considerados não provados (alínea F das conclusões e art. 28.º da alegação), verifica-se que não cuidou de os indicar nas conclusões, limitando-se a remeter para o corpo da alegação de recurso (art. 28.º). Sendo, nas palavras do citado acórdão do STJ de 01-10-2015, “as conclusões uma súmula e síntese da indicação dos fundamentos por que se deduz a impugnação relativa à matéria de facto”, é claro que, também neste particular, a Recorrente Ac... não logrou fazer nenhuma síntese ou conclusão propriamente dita, mas uma mera remissão, que é coisa diferente. Admitindo-se que essa remissão possa ser suficiente (face ao teor do art. 28.º da alegação), verifica-se, todavia, que a Recorrente Ac..., Lda. não cuidou de especificar, nem sequer no corpo da alegação, os concretos meios probatórios constantes da gravação que impunham decisão diversa, como determina a alínea b) do n.º 1 do art. 640.º, muito menos de indicar com exatidão as passagens da gravação em que se funda o seu recurso, conforme impõe o n.º 2 do mesmo artigo. Limitou-se a invocar, repete-se, no próprio corpo da alegação, para justificar a alteração pretendida, o seguinte “vista a discrepância relativamente aos depoimentos supra indicados e à supra referida falta de credibilidade dos testemunhos valorados pelo Tribunal”. Não explicitou os depoimentos a que se refere, nem quando tiveram lugar, não concretizou em que consiste a suposta discrepância, nem as razões da falta de credibilidade dos testemunhos. Perguntamos, onde é que foram “supra indicados” os depoimentos a que se refere? Será no art. 14.º da alegação ou no art. 26.º da alegação ou em ambos? Deveria, ao menos, ter remetido para o artigo ou artigos da alegação que tinha em mente. Mais devia, como já se viu, indicar com exatidão as passagens da gravação em que se funda o seu recurso, o que também não fez aqui (nem, aliás, no art. 14.º da alegação). Este Tribunal não pode completar os espaços em branco, nem convidar a aperfeiçoar o próprio corpo da alegação de recurso. A rejeição do recurso impõe-se, também nesta parte. Em suma, não se pode pedir ao Tribunal de recurso que modifique a decisão de facto, formando, pois, distinta convição sobre a prova produzida, quando nem sequer se tem o cuidado de explicar cabalmente por que está errada a decisão recorrida. Não há que sindicar supostos erros de julgamento, se nem a Recorrente foi capaz de os expor. Finalmente, quanto aos factos que a Recorrente considera sem interesse para a decisão da causa, é evidente que não se está aqui perante uma verdadeira impugnação da decisão relativa à matéria de facto, porquanto o que pretende é um juízo de irrelevância jurídica de diversos factos que foram considerados provados. A Requerente não pretende que esses factos sejam considerados (no todo ou em parte) não provados, não colocando a este respeito quaisquer questões de facto a decidir, nesse particular. Assim, será apenas em sede de apreciação jurídica que cumprirá analisar se tais factos se revestem ou não de interesse para a decisão da causa. Nestes termos, não se irá apreciar a impugnação da matéria de facto, rejeitando-se, nesse parte, o recurso interposto pela Requerente Ac..., Lda.. 2.4. ENQUADRAMENTO JURÍDICO Neste momento, passamos a apreciar ambos os recursos, em simultâneo, uma vez que as considerações a fazer valem para ambos. Trata-se de saber se estão, ou não, verificados os pressupostos do decretamento das providências cautelares requeridas. Os procedimentos cautelares, em geral, consistem em medidas que são requeridas e decretadas tendo em vista acautelar o efeito útil da ação, mediante a composição dos interesses conflituantes, mantendo ou restaurando a situação de facto antes da eventual realização efetiva do direito. Neste sentido, como explicava Antunes Varela, “As denominadas providências cautelares visam precisamente impedir que, durante a pendência da acção declarativa ou executiva (e, permito-me acrescentar, antes mesmo da sua instauração), a situação de facto se altere de modo a que a sentença nela proferida, sendo favorável, perca toda a sua eficácia ou perto dela. Pretende-se deste modo combater o periculum in mora (o prejuízo da demora inevitável do processo), a fim de que a decisão se não torne numa decisão puramente platónica” - in Manual de Processo Civil, 2.ª ed., pág. 23. Por sua vez, o art. 364.º, n.º 1, estabelece que “Exceto se for decretada a inversão do contencioso, o procedimento cautelar é dependência de uma causa que tenha por fundamento o direito acautelado e pode ser instaurado como preliminar ou como incidente de ação declarativa ou executiva”. Como decorre deste normativo, salvo nos casos de inversão do contencioso (que não foi requerida, no presente processo) a providência cautelar pressupõe necessariamente um outro processo (principal ou definitivo) já pendente ou que vai ser instaurado; e porque surge para servir o fim deste processo, a relação entre a providência cautelar e o processo é “instrumental”, de “instrumentalidade hipotética”, o que significa que a providência cautelar é emitida na pressuposição ou na previsão da hipótese de vir a ser favorável ao autor a decisão a proferir no processo principal. Daí que as providências cautelares não devam ser utilizadas para resolver questões de fundo, que só nas ações adequadas podem ser decididas, pois o processo cautelar não tem por razão de ser corrigir situações, mas sim prevenir lesão que venha a ser grave e dificilmente reparável. Ora, no presente processo, não descortinamos, pois a Requerente não o indicou, qual a ação principal que pretende intentar. A respeito das providências cautelares não especificadas, preceitua o art. 362.º do CPC que: “1. Sempre que alguém mostre fundado receio de que outrem cause lesão grave e dificilmente reparável ao seu direito, pode requerer a providência conservatória ou antecipatória concretamente adequada a assegurar a efetividade do direito ameaçado. 2. O interesse do requerente pode fundar-se num direito já existente ou em direito emergente de decisão a proferir em ação constitutiva, já proposta ou a propor. 3. Não são aplicáveis as providências referidas no nº 1 quando se pretenda acautelar o risco de lesão especialmente prevenido por alguma das providências tipificadas na secção seguinte. 4. Não é admissível, na dependência da mesma causa, a repetição de providência que haja sido julgada injustificada ou tenha caducado.” O decretamento de uma providência cautelar não especificada depende, assim, da concorrência dos seguintes requisitos: a) que muito provavelmente exista o direito tido por ameaçado - objeto de ação declarativa -, ou que venha a emergir de decisão a proferir em ação constitutiva, já proposta ou a propor (aparência ou verosimilhança do direito do requerente carecido de tutela - fumus boni iuris); b) que haja fundado receio de que outrem antes de proferida decisão de mérito, ou porque a ação não está sequer proposta ou porque ainda se encontre pendente, cause lesão grave e dificilmente reparável a tal direito (perigo de ocorrência de lesão grave e dificilmente reparável se acaso a providência não for decretada - periculum in mora); c) que ao caso não convenha nenhuma das providências tipificadas nos arts. 393.º a 427.º do CPC; d) que a providência requerida seja adequada a remover o periculum in mora concretamente verificado e a assegurar a efetividade do direito ameaçado; e) que o prejuízo resultante da providência não exceda o dano que com ela se quis evitar. Do direito da Requerente (“não concorrência”) Relativamente ao primeiro destes requisitos, o tribunal recorrido considerou o seguinte: “Quanto ao direito da requerente, a partir da factualidade indiciariamente provada, concluímos existir. Com efeito, continua a resultar da factualidade indiciariamente provada que a requerida MS..., não obstante ser sócia da requerente, constituiu a sociedade requerida, a qual tem por objecto social a gestão e administração de condomínios, coincidente, nessa parte, com a actividade social da requerente de gestão e consultoria de condomínios. Tal viola a proibição de concorrência ínsita ao artigo 990.° do Código Civil. Deste modo, ainda que tenha resultado sumariamente provado que a requerida MS..., quando constituiu a sociedade requerida, não tinha noção da existência de proibição de concorrência, ainda assim continua a praticar acto ilícito, violando a proibição de concorrência ínsita ao artigo 990.° do Código Civil. Assim, o direito da requerente (em não como concorrente a sociedade requerida, por a requerida MS... ser sócio de ambas as sociedades) existe, independentemente do grau de culpa (dolo ou negligência) da requerida MS.... Quanto a este último ponto, note-se que decorre da factualidade sumariamente provada que a mesma não sabia que estava a cometer um acto ilícito, já que o ilustre advogado que consultou lhe terá referido que podia constituir a sociedade com o objecto social em causa. No entanto, actualmente já não poderá afirmar desconhecer essa proibição de concorrência, pelo menos a partir da sua citação na presente providência, ao tomar conhecimento da sentença proferida antes da concessão do contraditório da parte passiva (já antes, ao tomar conhecimento da publicação que juntou como documento 4, constante do verso de folhas 180, que faz alusão à obrigação de não concorrência, já se poderia ter informado devidamente sobre o assunto). Certo é que, independentemente desta circunstância, a situação em apreço se enquadra no artigo 990.° do Código Civil, normativo que prescreve que o sócio que, sem autorização de todos os outros, exercer por conta própria ou alheia actividade igual à da sociedade, fica responsável pelos danos que lhe causar (responsabilidade que recai pessoalmente sobre o sócio (veja-se a respeito, a decisão da então 5:° Vara Cível do Porto, disponível em https://blook.pt/caselaw/PT/TRP/252966/). Por outro lado, não se afigura que se possa concluir que a requerente actue em abuso de direito em ordem a concluir que não é exigível à requerida MS... a manutenção do dever de não concorrência. Note-se que a requerente é uma pessoa colectiva, pelo que, independentemente as atitudes pessoas dos respectivos sócios para com a requerida MS... e para com a própria sociedade requerente, não poderá deixar de se considerar, atenta a factualidade sumariamente provada, que o direito da requerente existe, em face ao disposto no artigo 990.° do Código Civil. A Recorrente Ac... pugna pela existência do seu direito (que identifica como “direito de não concorrência” e “direito a uma concorrência leal”), merecedor da tutela requerida, fundamentando da seguinte forma: “Quanto ao fumus bónus iuris (à aparência do direito) em face à factualidade apurada não existem quaisquer dúvidas que está preenchido: a requerente é constituída por 3 quotas sociais sendo que uma delas é pertença da requerida MS... que, por sua vez, é sócia única da requerida I... pelo que está em causa o dever de não concorrência. No entanto, Conforme alegado no requerimento inicial, estão também em causa actos de concorrência desleal designadamente actos que se subsumem à previsão dos artigos 317.° n.° 1, alínea b) e 318.° n.° 1 alínea a), ambos do Código da Propriedade Intelectual.” As Requeridas/Recorrentes, por sua vez, consideram não se verificar o requisito da probabilidade séria da existência de direito ameaçado, porquanto: “a proibição de concorrência que decorre do art. 990 do Cód. Civil, que é o cerne da argumentação da requerente e da fundamentação da sentença a quo, existe somente no que toca à actividade desenvolvida pelo sócio, donde resulta que nunca a 2.ª requerida poderá ser responsabilizada nesse âmbito. (…) Noutra óptica, é apodíctico que a requerente não tem o direito de exigir às requeridas ou mesmo apenas à requerida MS... que se abstenha de exercer a actividade de gestão de condomínios. No máximo a requerente poderá pedir e o Tribunal conceder uma indemnização pelas perdas e danos que para ela derivarem da violação, pela requerida MS..., do seu dever de não concorrência.” Mais fazem notar que “a proibição de concorrência estabelecida no artigo 990.° do Código Civil tem ser compatibilizada com o direito de livre estabelecimento e de iniciativa privada, que têm tutela constitucional - arts. 47° e 61° da Constituição da República Portuguesa. Mesmo que existisse qualquer colisão entre o direito de livre estabelecimento e de iniciativa privada da requerida MS... e o da requerente à abstenção daquela exercer actividade igual à sua, é óbvio que, de acordo com o disposto no artigo 335.° do CC, o direito de livre estabelecimento e de iniciativa privada deve prevalecer, até porque a (suposta) violação da proibição de concorrência pode sempre ser cabalmente compensada e colmatada por via de uma indemnização pecuniária que pressupõe, além do mais, a existência de prejuízos que tenham um nexo de causalidade adequada com a actuação do lesante. Vejamos. A alegação de recurso da Recorrente é parca na indicação das normas jurídicas violadas. Procurando enquadrar juridicamente a sua pretensão, pensamos que a atuação das Requeridas, deverá ser analisada de duas perspetivas distintas, determinando se existe concorrência desleal e se existe uma situação de concorrência que seja proibida, por parte da 1.ª Requerida, enquanto sócia da Requerente e sócia gerente da 2.ª Requerida. Está obviamente arredada a hipótese de concorrência da 1.ª Requerida enquanto gerente da Requerente, uma vez que da factualidade indiciariamente provada resulta que a 2.ª Requerida apenas foi constituída após a 1.ª Requerida ter sido destituída da gerência da Requerente. Pensamos que a invocação dos artigos 317.º, n.º 1, al. b), e 318.º, al. a), do Código da Propriedade Industrial (e não Intelectual, como certamente por lapso, é referido na decisão recorrida e na alegação de recurso), se prende com o primeiro prisma de análise do caso. Com efeito, a “propriedade industrial desempenha a função de garantir a lealdade da concorrência, pela atribuição de direitos privativos sobre os diversos processos técnicos de produção e desenvolvimento da riqueza” (art. 1.º do CPI). Desde já podemos adiantar que, em face da factualidade indiciariamente provada, não nos parece que se esteja perante uma situação merecedora de proteção legal nos termos dos invocados normativos. O art. 317.º, n.º 1, al. b), define como concorrência desleal todo o “acto de concorrência contrário às normas e usos honestos de qualquer ramo de actividade económica, nomeadamente as falsas afirmações feitas no exercício de uma actividade económica, com o fim de desacreditar os concorrentes.” Ora, não se provou que as Requeridas (ou outros a seu mando) estejam a contactar condóminos afirmando ser a Requerente “pessoa não séria” e “pessoa não responsável, por fazer obras nos ditos prédios em benefício próprio ou em benefício de empreiteiros amigos da requerente ou amigos dos demais sócios da requerente” ou que a requerente “engana”, “rouba” ou “furta” os prédios que administra e consequentemente os condóminos. Aliás, estranhamente, até se deu como provado «(N)ão ser verdade que a requerente “roube” os prédios…». Não descortinamos quais factos indiciariamente provados subsumíveis no citado preceito legal. Por sua vez, o art. 318.º, al. a), do mesmo Código, sob a epígrafe, “Protecção de informações não divulgadas”, preceitua o seguinte: “Nos termos do artigo anterior, constitui acto ilícito, nomeadamente, a divulgação, a aquisição ou a utilização de segredos de negócios de um concorrente, sem o consentimento do mesmo, desde que essas informações: a) Sejam secretas, no sentido de não serem geralmente conhecidas ou facilmente acessíveis, na sua globalidade ou na configuração e ligação exactas dos seus elementos constitutivos, para pessoas dos círculos que lidam normalmente com o tipo de informações em questão;” Ora, no caso em apreço, é claro que não se está perante nenhum segredo de negócio. Os orçamentos elaborados pela Requerente para apresentar aos seus clientes não constituem segredo de negócio. Aliás, a ser aplicável o art. 318.º, sê-lo-ia quanto às demais alíneas dele constantes – b) e c) –, pois é da aplicação conjugada dessas normas que se poderá concluir pela existência de segredo de negócio. Sobre a noção de segredo de negócio, veja-se, Nuno Sousa e Silva, UM RETRATO DO REGIME PORTUGUÊS DOS SEGREDOS DE NEGÓCIO, páginas 236 e seguintes do estudo disponível em https://portal.oa.pt Afastada a aplicação destes normativos como fonte do direito que a Requerente se arroga, não podemos acompanhar a decisão recorrida quanto à forma como interpreta e aplica o art. 990.º do CC. Com efeito, a proibição de concorrência é matéria que se encontra regulada no Código das Sociedades Comerciais (CSC), que constitui lei especial, aqui aplicável, uma vez que a Requerente é uma sociedade comercial, por quotas, da qual a 1.ª Requerida é sócia e foi gerente. Não obstante as normas do Código Civil sobre o contrato de sociedade sejam subsidiariamente aplicáveis, tal só se justifica, no que não seja contrário nem aos princípios gerais da presente lei nem aos princípios informadores do tipo adotado (e apenas se também não puderem ser aplicadas as normas do CSC que regulam os casos análogos). Ora, nas sociedades por quotas, a proibição de concorrência é dirigida, não aos sócios (como acontece nas sociedades em nome coletivo – cf. art. 180.º do CSC), mas aos gerentes, nos termos previstos no art. 254.º do CSC, constituindo a infração de tal proibição justa causa de destituição da gerência, obrigando ainda o gerente a indemnizar a sociedade pelos prejuízos sofridos. Quanto ao sócio, o Código das Sociedades Comerciais limita-se a prever, no art. 242.º, que pode ser excluído por decisão judicial o sócio que, com o seu “comportamento desleal ou gravemente perturbador do funcionamento da sociedade”, “lhe tenha causado ou possa vir a causar prejuízos relevantes”. Isto mesmo explica Luís Brito Correia, Direito Comercial, 2.º volume, Sociedades Comerciais, AAFDL, 1989, pág. 470. Refere ainda este autor, citando Avelãs Nunes, que nestes casos não há uma obrigação de não concorrência, mas parece que poderá fazer-se a prova de que o sócio se vale da sua posição de sócio para fazer concorrência à sociedade, impedindo ou dificultando a realização do escopo social, o que pode justificar a exclusão do sócio concorrente (nota de rodapé 25). No caso em apreço, nada tendo sido alegado quanto a um pacto de não concorrência (nos estatutos da sociedade Requerente ou acordo parassocial), a atuação da 1.ª Requerida, ao constituir uma nova sociedade, com o referido objeto social, após deixar a gerência da Requerente, por si só, não basta para que se possa aplicar subsidiariamente o art. 990.º do Código Civil nos termos em que o fez a decisão recorrida, ao concluir de forma automática que o direito da Requerente existe, por violação da proibição de concorrência. Não existe, como decorre do acima exposto, um “direito de não concorrência”. Nem podia existir. Aliás, o próprio acórdão do STJ de 30-09-2014, citado pela Requerente na sua alegação de recurso, quando se debruça sobre situação em que se equacionava a aplicação do do art. 254.º do CSC), explica que “(A) lei não proíbe a concorrência, sob pena de coarctar o direito de livre estabelecimento e de iniciativa privada que têm tutela constitucional – arts. 47º e 61º da Lei Fundamental; proíbe, sim, a concorrência desleal, violadora do dever de lealdade, que é a que um sujeito de direito exerce de modo a afectar, à margem da lei, os saudáveis princípios da concorrência.” Mas analisemos o caso à luz do artigo 990.º do CC. Sob a epígrafe, “Proibição de concorrência”, preceitua que o sócio que, sem expressa autorização de todos os outros, exercer, por conta própria ou alheia, atividade igual à da sociedade fica responsável pelos danos que lhe causar, podendo ainda ser excluído. Escrevem Pires de Lima e Antunes Varela que se pretende evitar com esta proibição, que “o sócio se aproveite dos seus conhecimentos e da sua acção dentro da sociedade para obter lucros para si próprio, em prejuízo dos outros sócios. Mesmo, porém, que não haja concorrência desleal, deve razoavelmente exigir-se de todo o sócio que dirija sua actividade no sentido de obter os melhores resultados para a sociedade, o que é praticamente incompatível com o exercício da mesma actividade em benefício próprio. (…) Estão previstas duas sanções para a concorrência proibida: a responsabilidade pelos danos causados e a exclusão de sócio, nos termos da alínea a), do artigo 1003.º Considera-se, pois, como grave a violação deste dever. As sanções são aplicáveis tanto ao caso de exercício da actividade, a título individual, como ao caso do sócio exercer as funções de administrador noutra sociedade. Mas já não se aplicam à hipótese do sócio assumir apenas a qualidade de sócio, numa sociedade de capitais, desde que nela não exerça nenhum cargo de administração - por conseguinte nenhuma actividade igual à da sociedade.” (sublinhado nosso) – in Código Civil Anotado, Vol. II, 3.ª edição, Coimbra Editora, pág. 324. A este respeito, veja-se o acórdão do STJ de 18-04-2006, no processo n.º 06A745, cujo sumário, por elucidativo, se passa a citar: “I - É proibida a concorrência desleal entre comerciantes, que se pode definir como todo o acto de concorrência contrário às normas e usos honestos de qualquer ramo da actividade económica, com intenção de causar prejuízo a outrem ou de alcançar para si um beneficio ilegítimo. II - O gerente de uma sociedade por quotas não pode, sem consentimento dos sócios, exercer actividade concorrente com a da sociedade, sob pena de ter de indemnizar a mesma sociedade pelos danos que esta sofra. III - Também é proibido ao sócio de uma sociedade por quotas, sem o consentimento dos demais sócios, exercer actividade igual à daquela sociedade onde é sócio, sob pena de responsabilidade pelos danos causados e de exclusão de sócio. IV- Estas sanções são aplicáveis tanto no caso de exercício da actividade, a título individual, como no caso do sócio exercer as funções de sócio-gerente de outra sociedade por quotas.” – disponível em www.dgsi.pt De salientar que a situação de facto em apreço neste acórdão era, contudo, distinta, da que nos ocupa, já que naquele processo se provou que, após ter sido constituída pelo sócio da autora uma nova sociedade, esta passou a ter como clientes algumas empresas que tinham sido clientes da autora, ganhou algumas das empreitadas a que autora também concorreu e três dos empregados da empresa autora saíram diretamente desta para aquela. No caso em apreço, admitindo agora que o art. 990.º do CC possa ser subsidiariamente aplicável, tendo em conta que a 1.ª Requerida, além de sócia, é gerente da 2.ª Requerida, a aplicação desse normativo, sê-lo-á, nos seus precisos termos, isto é, da violação da referida proibição resultará a obrigação de indemnizar. Aceitando-se, pois, que a Requerente tem, em abstrato, o direito a exercer a sua atividade empresarial sem concorrência desleal, a propor a ação de exclusão de sócio se verificada a previsão do art. 242.º do CSC e a ser indemnizada por danos causados por concorrência proibida, certo é que os factos indiciariamente provados não permitem qualificar dessa forma a atuação da 1.ª Requerida. Com efeito, além do que já acima se referiu a respeito das inaplicabilidade das normas do Código da Propriedade Industrial, não é possível considerar que tenha existido um desvio de trabalhadores como ato de concorrência desleal ou concorrência proibida. Está provado apenas que a Requerente teve conhecimento que as Requeridas pretenderam contratar uma ex-funcionária da Requerente (mas não se sabe quando é que as Requeridas pretenderam fazê-lo), que esta funcionária se desvinculou da sociedade em finais de 2017, esteve no desemprego até abril de 2018 e depois celebrou contrato de trabalho com a 2.ª Requerida. Muito menos se poderá afirmar que a viabilidade económica da Requerente está em causa, concordando-se, neste particular, com a decisão recorrida quando afirma, ainda que a propósito do requisito do periculum in mora, ser “pouco provável que a viabilidade económica da requerente possa ser posta em causa por força da actuação das requeridas, atenta a dimensão da carteira de clientes da primeira e a circunstância de já não resultar sumariamente assente que as requeridas actuem com o objectivo de retirar clientes à requerente e por a requerida MS... continuar a ter interesse na viabilidade da Ac...-Consultoria de Condomínios, Lda.”. Do facto de a sociedade Requerida ter a administração de três condomínios (dos edifícios Ínsula, Podium e Quinta do Pilar) não podemos retirar, sem mais, que, se assim não fosse, seria provavelmente a Requerente a administrá-los, auferindo os respetivos proventos. Tanto mais que desses condomínios, dois nunca tinham sido sequer administrados pela Requerente e o outro (Quinta do Pilar), antes de o ser pela sociedade Requerida, era administrado pela Loja do Condomínio. Os factos indiciariamente provados não permitem também formular um juízo de probabilidade séria de verificação de prejuízos decorrentes da perda de clientes (lucros cessantes), nem da verificação de outro tipo de danos indemnizáveis, designadamente os que poderiam advir da violação do bom nome e imagem da Requerente. A decisão recorrida refere, embora a propósito da análise que faz sobre a verificação do requisito do periculum in mora, que “existe o perigo de algum condómino de prédio administrado pela "Ac...-Consultoria de Condomínios, Lda." sugira a mudança do condomínio para a administração da "I..., Unipessoal, Lda." por força do prestígio da requerida MS..., ao tomar conhecimento de que a mesma é legal representante de sociedade cujo objecto abranja a administração de condomínios, e tal venha a suceder.” Mas, na verdade, contrariamente ao que se afirma na decisão recorrida, não resulta “da factualidade sumariamente provada que a requerente beneficiou do prestígio da requerida MS... para angariar alguns clientes”. Ainda que isso possa ter acontecido, o “perigo” a que se refere é uma mera possibilidade, que, atenta a matéria de facto indiciariamente provada, não tem subjacente, nenhuma atuação legalmente censurável por parte da 1.ª Requerida. Não nos parece suficiente para que se possa concluir que existiu concorrência proibida a mera presença das Requeridas, na cidade do empreendedor, onde procuraram angariar clientes para a “empresa Requerida”, no âmbito territorial onde a Requerente desenvolve o respetivo objeto social. É que não está indiciariamente provado que as Requeridas tenham procurado angariar os clientes da Requerente, o que seria, isso sim, relevante. O risco de a 1.ª Requerida, em proveito da 2.ª Requerida, desviar a clientela poderá até existir, mas não dispomos de suporte fáctico bastante para afirmar que existe. É que ainda que a prova possa ser indiciária, os factos que a esse respeito (desvio de clientela) foram efetivamente alegados não resultaram (indiciariamente) provados. Não está, pois, verificado o primeiro pressuposto indispensável para o decretamento das providências cautelares requeridas. Ainda que assim não fosse, sempre faltaria também a demonstração do segundo requisito acima indicado. Senão vejamos. Do periculum in mora A este respeito, escreveu-se na decisão recorrida: “Entendo - em face à resposta do Tribunal à factualidade invocada pelas partes e, particularmente tendo em conta que a factualidade supra elencada nas alíneas a) e b) passou para a factualidade sumariamente não provada, depois da audição das requeridas — que o perigo de lesão grave derivada da violação do direito da requerente não está tão iminente do que o que resultava da factualidade sumariamente provada na sentença proferida nos autos a 16.05.2018. No entanto, afigura-se que tal perigo não deixa de existir e que, a concretizar-se, seria susceptível de produzir efeitos graves e de difícil reparação. Quanto à existência do perigo, realça-se o seguinte: É certo que deixou de resultar da factualidade sumariamente provada que a requerida MS..., por si ou através dos colaboradores da requerida, procurem angariar para administração da sociedade requerida condomínios que sejam administrados pela requerente (designadamente pelo modo descrito nas alíneas a) e b) supra mencionadas), resultando antes da factualidade sumariamente assente que a requerida MS... tem interesse na prosperidade da requerente (seja nível societário, por forma a que a sua quota, de que pretende alienar, seja valorizada, seja a nível pessoal, por forma a não vir a responder, designadamente por dívidas cuja responsabilidade inerente o sócio da requerente, mais precisamente o Dr. JS..., este não consiga suportar). No entanto, os próprios condomínios clientes da requerente, ao tomarem conhecimento da existência da sociedade ora requerida, concorrente da requerente, poderão interessar-se em passarem a ser administrados pela última e passem a sê-lo, como sucedeu relativamente ao condomínio do prédio da Quinta do Pilar, que já fora administrado pela requerente e que depois de ser administrados por outra sociedade (que não a requerente) com esse objecto social, passou para a carteira de clientes da "I..., Unipessoal, Lda." Note-se que resulta da factualidade sumariamente provada que a requerente beneficiou do prestígio da requerida MS... para angariar alguns clientes. Certamente que tal prestígio também contribuiu para que os colaboradores da requerida sociedade aceitassem trabalhar para a mesma (sendo certo que já a conheciam do tempo em que eram colaboradores da requerente), pois de outro modo não tinham acreditado no novo projecto, ligado à actividade da sociedade "I..., Unipessoal, Lda.", que a requerida MS... decidiu constituir. Assim, ainda que já não resulte provado sumariamente que a requerida MS..., por si ou através dos seus colaboradores, actue com vista a que os clientes da requerente passem directamente para a carteira de clientes da requerida, existe o perigo de algum condómino de prédio administrado pela "Ac...-Consultoria de Condomínios, Lda." sugira a mudança do condomínio para a administração da "I..., Unipessoal, Lda." por força do prestígio da requerida MS..., ao tomar conhecimento de que a mesma é legal representante de sociedade cujo objecto abranja a administração de condomínios, e tal venha a suceder. Quanto às possíveis consequências da concretização do perigo, também se afigura, perante a factualidade actualmente provada em termos sumários, pouco provável que a viabilidade económica da requerente possa ser posta em causa por força da actuação das requeridas, atenta a dimensão da carteira de clientes da primeira e a circunstância de já não resultar sumariamente assente que as requeridas actuem com o objectivo de retirar clientes à requerente e por a requerida MS... continuar a ter interesse na viabilidade da Ac...-Consultoria de Condomínios, Lda.". Assim, afigura-se que o perigo de lesão do direito da requerente não chegaria ao ponto de ser concretizado em termos de torná-la inviável, economicamente. No entanto e ainda que não chegasse a esse ponto, as consequências ainda assim poderiam vir a ser graves e de difícil reparação, em face aos rendimentos da requerida MS..., a qual, perante os mesmos e à possibilidade de vir a ser chamada para responder às responsabilidades contraídas (designadamente como fiadora), sentiu necessidade de encontrar outra fonte de rendimentos, tendo, para o efeito, decidido constituir a "I..., Unipessoal, Lda.", que actualmente conta apenas com três clientes. Assim, ainda que a requerida MS... pudesse ser chamada a responder civilmente pela violação do dever de não concorrência, nos termos já mencionados, a reparação efectiva poderia vir a ser de dificil concretização, existindo tal perigo.” A Requerente, na sua alegação de recurso, afirma, a este respeito, que: “Quanto ao periculum in mora (perigo de lesão grave e dificilmente reparável): atendendo a que a requerida I... encontra-se já em pleno funcionamento e a que, como dissemos, é seu propósito desviar clientes e possíveis clientes da requerente, recorrendo a actos de concorrência desleal, o perigo de tornar esta economicamente inviável é efectivo, grave e de difícil reparação.” Já as Requeridas desenvolvem vasta alegação a este respeito, afirmando, além do mais, o seguinte: “Apenas as lesões graves e irreparáveis ou de difícil reparação merecem a tutela provisória do procedimento cautelar. A gravidade deve ser aferida tendo em conta a repercussão na esfera jurídica do interessado. O receio deve ser fundado e por isso suportado e m factos que permitam afirmar, com objectividade e distanciamento, a seriedade e actualidade da ameaça e a necessidade de serem adoptadas medidas tendentes a evitar o prejuízo. (…) E, para lá de a situação de perigo a defender dever ser actual, não deve a mesma estar consumada, dado que o procedimento cautelar não visa corrigir situações (para isso serve a pertinente acção declarativa que se seguirá ao procedimento), mas prevenir a lesão grave e de difícil reparação. Neste domínio sinaliza-se que o recurso à tutela cautelar só é considerado justificado quando o periculum in mora é actual e iminente e não diferido e meramente conjectural. Acresce que apesar de ter conhecimento da constituição da I... em Novembro de 2017, a requerente só promoveu esta providência no dia 7 de Maio de 2018, o que significa que foi a própria requerente quem, com a promoção tardia desta providência, criou a situação de urgência que agora invoca a seu favor. (…) Do exposto resulta a insubsistência da fundamentação e decisão da sentença a quo, além do mais porque: · Assenta em conjecturas e não nos factos provados; · Se existisse qualquer perigo de infrutuosidade da sentença a enunciar na acção principal em consequência da suposta incapacidade da requerida MS... pagar qualquer indemnização futura derivada da violação do dever de não concorrência, então, contraditoriamente ao enunciado na sentença a quo, deveria-se permitir o exercício da actividade de gestão de condomínios por ela porque obviamente quanto mais funções remuneradas ou remuneráveis exercer maior será a probabilidade de satisfação do (suposto) crédito da requerente. Mesmo que se verificasse qualquer agravamento dos danos económicos para a requerente decorrente da continuação da actividade das requeridas, o que não se aceita nem tem qualquer arrimo na matéria de facto provada, como é apodíctico, semelhantes prejuízos, pela sua própria natureza, poderiam ser cabal e plenamente ressarcidos por via de uma indemnização pecuniária. (…) É portanto óbvio, a todas as luzes, a inexistência do periculum in mora, o que, por si só, determina o soçobro desta providência cautelar e a revogação da sentença a quo.” Ainda que pudesse existir um direito da Requerente à exclusão da 1.ª Requerida ou a uma indemnização por danos causados pela concorrência proibida, não vislumbramos como concluir pela existência de fundado receio duma lesão grave e dificilmente reparável desses direitos. Assim, não podemos acompanhar a decisão recorrida quando refere que “existe o perigo de algum condómino de prédio administrado pela "Ac...-Consultoria de Condomínios, Lda." sugira a mudança do condomínio para a administração da "I..., Unipessoal, Lda." por força do prestígio da requerida MS.... Isto nada tem a ver com o “periculum in mora”, já que daí não resultará, sem mais, a gravidade e difícil reparação da ofensa dos direitos que a Requerente poderá fazer valer na ação principal (cujo objeto, aliás, em bom rigor, desconhecemos, por nada ter sido alegado a esse respeito pela Requerente). E muito menos se pode concordar com a decisão recorrida quando afirma que «as consequências ainda assim poderiam vir a ser graves e de dificil reparação, em face aos rendimentos da requerida MS..., a qual, perante os mesmos e à possibilidade de vir a ser chamada para responder às responsabilidades contraídas (designadamente como fiadora), sentiu necessidade de encontrar outra fonte de rendimentos, tendo, para o efeito, decidido constituir a "I..., Unipessoal, Lda.", que actualmente conta apenas com três clientes. Assim, ainda que a requerida MS... pudesse ser chamada a responder civilmente pela violação do dever de não concorrência, nos termos já mencionados, a reparação efectiva poderia vir a ser de difícil concretização, existindo tal perigo.» É que este perigo também nada tem a ver com o “periculum in mora”, pressuposto das providências cautelares não especificadas. Não cabe nos presentes autos questionar se poderá vir a ser de difícil concretização a efetiva reparação dos (meramente hipotéticos) danos emergentes da concorrência proibida por parte da 1.ª Requerida, através da 2.ª Requerida, muito menos com base em factos alegados pelas Requeridas que não visavam esclarecer sobre a garantia patrimonial de eventual crédito da Requerente. Neste procedimento cautelar comum, não sabemos (nem temos que indagar) qual o património das Requeridas. Caso se justifique, será no âmbito de procedimento cautelar de arresto que deverão ser carreados para os autos os factos atinentes a essa matéria. Em conclusão, não obstante se trate de prova indiciária, certo é que, ao aplicar o direito, o tribunal não se pode bastar com meras conjeturas sem suporte fáctico bastante, sendo que era sobre o Requerente que recaia o ónus de alegar e provar todos os factos que integram os pressupostos das providências não especificadas que requereu, o que não logrou fazer, conforme se concluiu (art. 342.º, n.º 1, do CC). Fica, pois, prejudicada a análise das demais questões acima enunciadas. * Custas processuaisVencida a Requerente, vai condenada no pagamento das custas, tanto do procedimento cautelar como dos recursos, sendo a taxa de justiça paga no procedimento cautelar atendida, a final, na ação que vier a ser intentada – artigos 527.º e 539.º, n.º 2, do CPC. 3. DECISÃO Pelo exposto, decide-se: a) Negar provimento ao recurso interposto pela Requerente Ac... - Consultoria de Condomínios, Lda., rejeitando-o no tocante à impugnação da matéria de facto e julgando-o, quanto ao mais, improcedente. b) Conceder provimento ao recurso interposto pelas Requeridas MS... e I..., Unipessoal, Lda., e, em consequência, revogar a decisão recorrida; c) Condenar a Requerente/Recorrente Ac... no pagamento das custas processuais, tanto do procedimento cautelar, como dos recursos. D.N. Lisboa, 11-10-2018 Laurinda Gemas) Gabriela Cunha Rodrigues) Arlindo Crua) |