Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa  | |||
| Processo: | 
  | ||
| Relator: | PAULA CRISTINA BORGES GONÇALVES | ||
| Descritores: |  REGIME DE PERMANÊNCIA NA HABITAÇÃO FINS DA PENA PRISÃO  | ||
| Nº do Documento: | RL | ||
| Data do Acordão: | 10/23/2025 | ||
| Votação: | UNANIMIDADE | ||
| Texto Integral: | S | ||
| Texto Parcial: | N | ||
| Meio Processual: | RECURSO PENAL | ||
| Decisão: | NÃO PROVIDO | ||
| Sumário: |  Sumário (da responsabilidade da Relatora): I. O regime de permanência na habitação previsto no art. 43º do CP, configura uma forma de execução da pena de prisão que, além do consentimento do condenado e do limite de dois anos de prisão, tem de realizar de forma adequada e suficiente as finalidades da execução da pena de prisão aplicada. II. É de indeferir a execução da pena de prisão em regime de permanência na habitação, mesmo no caso de penas curtas de prisão, quando se concluir que a mesma não acautela as finalidades de execução da pena de prisão aplicada, que consistem na defesa da sociedade e na prevenção da prática de crimes, sempre com a intenção de reintegração social do recluso, preparando-o verdadeiramente para uma atitude conforme ao Direito, sem cometer crimes. III. O tempo de prisão a cumprir pelo arguido, deverá servir os seus propósitos de pena com ressocialização, importando ao arguido reflectir sobre o seu percurso de vida e o que isso tem afectado não só a terceiros, com a prática dos seus crimes, como a sua família e a si próprio.  | ||
| Decisão Texto Parcial: | |||
| Decisão Texto Integral: |  Acordam, em conferência, os Juízes Desembargadores da 9ª secção do Tribunal da Relação de Lisboa: I- RELATÓRIO I.1. Por sentença proferida em .../.../2025, em relação ao arguido AA, foi decidido: 1. Condenar o arguido AA, pela prática, em autoria material e na forma tentada, de 1 (um) crime de furto qualificado, desqualificado pelo valor, p. e p. pelos art.s 203º e 204º, n.º 1, al. b) e n.º 4, do Código Penal, na pena de 6 (seis) meses de prisão. 2. Descontar no cumprimento da pena de prisão 1 (um) dia, nos termos do art. 80º, n.º 1, do Código Penal. * I.2. Recurso da decisão O arguido interpôs recurso da decisão, terminando a motivação com as seguintes conclusões (transcrição total das mesmas): “1. O arguido foi condenado pela prática pela prática, em autoria material e na forma tentada, de 1 (um) crime de furto qualificado, desqualificado pelo valor, p. e p. pelos art.os 203° e 204°, n.° 1, al. b) e n.° 4 do Código Penal, na pena de 6 (seis) meses de prisão. 2. Na opção que a Meritíssima Juiz do Tribunal "a quo" fez pela não aplicação do regime de execução da pena de prisão em permanência na habitação, não apresenta razões de facto, ou de direito, com peso suficiente para justificar a decisão de afastar a aplicação do regime previsto no artigo 43.° do Código Penal. 3. Salvo o devido respeito, entendemos que, no caso sub judice, se encontram preenchidos os requisitos exigidos pelo artigo 43°, n° 1 do CP para cumprimento da pena de prisão, aplicada ao Arguido, em regime de permanência da habitação: a) O Arguido foi condenado em pena não superior a dois anos de prisão efetiva; b) O Arguido consente a execução da pena em regime de permanência na habitação, com fiscalização por meios técnicos de controlo à distância. c) Este meio realiza de forma adequada e suficiente as finalidades da execução da pena de prisão. 4. Não resulta dos factos dados como provados que o arguido tenha demonstrado uma postura de desinteresse pelas condenações anteriores ou não tenha interiorizado do mal da sua conduta, pelo que tal nunca poderia servir de fundamentação para a não aplicação da execução da pena de prisão em permanência na habitação, 5. até porque, os factos constantes da acusação foram dados como provados, porquanto se basearam na confissão integral e sem reservas do arguido, feita de forma livre, espontânea e no decurso das suas declarações prestadas em sede de audiência de julgamento, o que por si demonstra a capacidade de autocritica e desvalor da sua conduta, bem como o arrependimento pela prática dos fatos. 6. No caso concreto, não se teve em conta que o arguido apesar dos consumos aditivos, está integrado em meio familiar que, entendemos nós, certamente apoiará o arguido na sua reinserção social; 7. Se, apesar dos antecedentes criminais que possui, o arguido demonstra capacidade de trabalho, tem suporte familiar, demonstra arrependimento, confessando a prática dos fatos e a sua vontade em efetuar tratamento à sua problemática aditiva, não deverá ser introduzido em ambiente prisional para cumprimento de pena de 6 meses de prisão, pois isso irá constituir um retrocesso no esforço de reintegração social do memso. 8. Pelo que, não se vê, qual a necessidade preventiva geral ou especial de afastar o regime que é o de dar preferência à execução da pena de prisão em permanência na habitação. 9. As suas condições pessoais e familiares do arguido impõem a execução da pena em regime de permanência na habitação, o que realizará de forma adequada e suficiente as finalidades da punição. 10. O contato do Arguido com o meio prisional, para cumprimento de uma pena de 6 meses, em nada beneficiará a sua reintegração, antes trazendo, certamente, sentimentos de desmotivação para refazer a sua vida, colocando assim em risco as necessidades de prevenção especial positiva. 11. Face ao exposto, por se encontrarem reunidos os requisitos, deverá substituir-se o cumprimento da pena de prisão pelo regime de permanência na habitação considerando que, através da aplicação desta medida, se realizam de forma adequada e suficiente as finalidades da punição. Por todo o exposto, deverá o presente recurso ser julgado procedente e, consequentemente, revogar-se a decisão recorrida, substituindo-a por outra que aplique o regime de permanência na habitação ao Arguido. A V. Exas. caberá melhor decisão, como é de JUSTIÇA.”. * I.3. Resposta do Ministério Público O Ministério Público, na resposta ao recurso, pronunciou-se pela sua improcedência, da seguinte forma (transcrição parcial): “Na esteira do entendimento perfilhado pela Mma. Juiz a quo, com o qual concordamos inteiramente, somos de parecer que não se encontram preenchidos os requisitos previstos no artigo 43.º, n.º 1 do Código Penal para aplicação do regime de permanência na habitação, mesmo que sujeito a regras de conduta. A procedência da pretensão do recorrente não salvaguardaria as exigências de prevenção que no caso se fazem sentir. Desde logo, não é possível formular um juízo de prognose favorável quanto ao comportamento futuro do arguido, evidenciando este um grande risco de continuação da atividade criminosa. Ao contrário do alegado pelo recorrente, o tribunal fundamentou a sua decisão nos factos dados como provados, nomeadamente aqueles referentes às condições socioeconómicas, os quais se basearam no relatório social elaborado, bem como nas declarações prestadas pelo arguido. Pois bem, no espaço de um ano, o arguido foi condenado pela prática de vários crimes da mesma natureza. O arguido não demonstra qualquer consciência crítica aos bens jurídicos violados, apresentando sucessivas ameaças de prisão, sem que tenha alterado a sua atitude desconforme ao direito, a qual é persistente e intrínseca. Aliás, tal como consta do elenco dos factos dados como provados, o arguido evidencia dificuldade ao nível da autocrítica, ao contrário do que alega no seu recurso. Neste sentido, e tal como realça, e bem, a Mma. Juiz a quo, “o arguido reincidiu na prática criminosa pelo qual veio a ser condenado nestes autos mesmo depois de lhe ter sido proferido sentença oral, pela aqui signatária, no processo sumário n.º 93/25.8..., onde foi expressamente advertido, por mais do que uma vez, da necessidade de mudar o seu comportamento, da possibilidade de vir a cumprir pena de prisão acaso reincidisse na prática criminosa, sendo indiferente à censura jurídica que então lhe tinha sido feita e não demonstrando qualquer tipo de vontade em reordenar a sua vida para o Direito.” Acresce que o arguido não possui qualquer ocupação profissional, dedicando o seu tempo a deambular pela cidade da ...; é consumidor de estupefacientes desde os 17 anos e apresenta uma conotação social negativa, decorrente tanto do consumo como da associação a indivíduos com problemáticas aditivas semelhantes. Além disso, conforme resulta da factualidade dada como provada, o arguido reside na casa da sua mãe, sendo que a dinâmica familiar se encontra em declínio devido às problemáticas aditivas dos seus descendentes e do seu neto. Tudo isso conjugado conduz à conclusão de que, cumprindo o arguido a pena de prisão em regime de permanência na habitação, tal não seria suficiente para prevenir a reincidência ou a continuidade dos consumos já registados. O cumprimento da pena de prisão em regime de permanência na habitação não se afigura, de modo algum, adequado ou compatível com a realização das finalidades da execução da pena de prisão. Como podemos verificar, a Mma. Juiz a quo ponderou todos os aspetos previstos no artigo 43.º, n.º 1 do Código Penal, de forma exemplar, pelo que nenhuma censura nos merece a sua decisão de cumprimento efetivo da pena de prisão. Assim sendo, concluímos que a aplicação do aludido regime não realiza de forma adequada e suficiente as exigências de prevenção geral e especial, ou melhor, as finalidades da execução da pena de prisão, falhando manifestamente os pressupostos para a sua aplicação. Aliás, a aplicação de uma qualquer pena de substituição revelar-se-ia inadequada. Na nossa perspetiva, as exigências de prevenção geral e especial que no caso se fazem sentir impõem a conclusão de que apenas cumprindo intramuros a pena de prisão que lhe foi irrogada se poderá garantir a realização de forma adequada e suficiente das finalidades da punição e da execução da pena de prisão. Pelo exposto, deve, em nosso parecer, improceder a pretensão do recorrente. *** 4. Conclusões 1. In casu, não se encontram preenchidos os requisitos previstos no artigo 43.º do Código Penal para a aplicação do regime de permanência na habitação. 2. O cumprimento da pena de prisão em regime de permanência na habitação não se afigura, de modo algum, adequado ou compatível com a realização das finalidades da execução da pena de prisão. 3. As exigências de prevenção geral e especial que no caso se fazem sentir impõem a conclusão de que apenas cumprindo intramuros a pena de prisão que lhe foi irrogada se poderá garantir a realização de forma adequada e suficiente das finalidades da punição e da execução da pena de prisão. Em face do exposto, e ao abrigo das disposições legais supracitadas, deve o presente recurso ser julgado improcedente, confirmando-se a decisão judicial recorrida. * V. Ex.as, porém, decidirão como for de JUSTIÇA.”. * I.4. Parecer do Ministério Público Nesta Relação, o Ministério Público emitiu parecer no sentido de improcedência do recurso. * I.5. Resposta ao parecer Foi cumprido o estabelecido no artigo 417º, n.º 2, do Código de Processo Penal (doravante CPP), não tendo sido apresentada resposta ao parecer do Ministério Público. * I.6. Foram colhidos os vistos e realizada a conferência. ** II- FUNDAMENTAÇÃO II.1. Objecto do recurso É consabido e decorre de Jurisprudência pacífica do Supremo Tribunal de Justiça, que é pelas conclusões apresentadas pelo recorrente que se delimita o objecto do recurso, sem prejuízo do conhecimento de questões oficiosas (cfr. o art. 410º do CPP). Assim, da análise das conclusões do recorrente verifica-se que a questão a apreciar e decidir é unicamente de saber se a pena de prisão aplicada ao arguido deve ser cumprida no regime de permanência na habitação. ** II.1.A. Questão prévia Da decisão recorrida, no facto 27 dado como provado, por lapso de escrita manifesto, decorrente do uso de ferramentas informáticas, consta ‘arguido BB’, quando deveria constar ‘arguido AA Assim, nos termos do art. 380º do CPP, determina-se a correcção do facto provado 27 e onde consta ‘arguido BB’, deve passar a constar ‘arguido AA ** II.2. Sentença recorrida (que se transcreve parcialmente nas partes relevantes) “II – FUNDAMENTAÇÃO DE FACTO: II.1. Factos provados: Após ter sido discutida toda a matéria de facto e produzida a prova em julgamento, restaram provados os seguintes factos com relevância para a decisão a proferir: 1. No dia ...-...-2025, cerca das 04h15, o arguido AA, acercou-se do veículo da marca ..., de matrícula ..-IC-.., pertencente a CC e que se encontrava estacionado na ..., com o objetivo de se apoderar de apoderar de bens que no seu interior encontrasse. 2. De modo não apurado, logrou entrar na referida viatura, apoderando-se de: 1 par de botas de cor castanha, da marca ...; 1 casaco da marca ...; 1 casaco da marca ..., 1 lanterna sem marca e 1 canivete, bens esses, cujos valores não se logrou apurar. 3. O arguido agiu de forma livre, voluntária e conscientemente, com o propósito concretizado de fazer seus os bens de que se apoderou. 4. A PSP logrou recuperar na posse do arguido os referidos objetos e que foram devolvidos ao seu proprietário. 5. Sabia o arguido AA que tais bens não lhe pertenciam e que agia contra a vontade e no desconhecimento do seu proprietário. 6. Sabia também que a sua conduta lhe estava vedada e era criminalmente punida e, não obstante, quis levá-la a efeito. * Mais se provou que: 7. O arguido confessou integralmente e sem reservas os factos acima descritos. 8. O arguido é consumidor ativo de estupefacientes (sintética). 9. AA, atualmente com 37 anos de idade, à data da alegada prática dos factos, encontrava-se integrado (contexto que se mantém), no núcleo familiar de origem, composto pela progenitora DD (de 60 anos de idade, doméstica, habilitada com o 5º ano de escolaridade), pelo irmão uterino EE (de 42 anos de idade, ... de profissão, habilitado com o 5º ano de escolaridade), pelo sobrinho FF (18 anos de idade, estudante). Fazem, ainda, parte deste agregado familiar, os tios maternos do arguido, GG (de 65 anos de idade, reformado por invalidez da profissão de ..., habilitado com o 5º ano de escolaridade) e HH (de 68 anos de idade, reformado por invalidez da profissão de ..., habilitado com o 4º ano de escolaridade). 10. Segundo descrito pela progenitora do arguido, a dinâmica familiar atual encontra-se em declínio devido às problemáticas aditivas dos seus descendentes e do neto, no entanto com maior prevalência do filho AA, em especial nos últimos meses. Não obstante integrado no agregado de origem, à data dos factos passou por períodos de indigência, pernoitando nas ruas. 11. A satisfação das necessidades básicas do agregado familiar, de então e atuais é assegurada, de forma precária, através das reformas dos tios maternos, no valor de cerca de 800€ (oitocentos euros). Não obstante o irmão do arguido encontrar-se ativo laboralmente, este não contribui para as despesas fixas mensais que, segundo foi apurado, ronda o valor de cerca de 225€ (duzentos e vinte e cinco euros). 12. A habitação de herdeiros, de tipologia T3, onde reside o agregado familiar foi descrita como dispondo de boas condições de habitabilidade, todavia via esta carece de obras de manutenção. 13. AA é o mais novo de uma fratria de dois elementos, nascido no seio de um agregado familiar monoparental e de precária condição socioeconómico e cultural, cujo processo de crescimento e desenvolvimento decorreu na presença da mãe, do irmão e dos avós maternos, figuras de quem dependia economicamente a sua subsistência, uma vez que a mãe, exercia a profissão de empregada doméstica de forma não permanente. Não obstante as dificuldades económicas, o arguido descreveu a sua infância e adolescência como normal, até ter iniciado os consumos de substâncias psicoativas. 14. AA verbalizou que nunca teve qualquer tipo de contacto com a figura paterna. 15. Ao nível escolar, integrou o sistema de ensino regular em idade própria, contudo, as dificuldades económicas, bem como de aprendizagem, associadas a défices cognitivos, originaram várias retenções, que culminaram no abandono do sistema de ensino, com apenas 15 anos de idade, com o 6º ano de escolaridade. 16. Após ter abandonado o sistema de ensino, trabalhou como ..., durante cerca de dez anos, na empresa de construção civil ..., tendo sido dispensado pela empresa por questões relacionadas, então, com a crise económica ocorrida em ..., que culminou na redução de efetivos. 17. Posteriormente veio a trabalhar como ... de veículos pesados por um período de cerca de cinco anos. Trabalhou, ainda, ao abrigo de um programa de emprego, na ... – ..., durante cerca de dois anos, na qual realizava trabalhos de jardinagem. Com o agravamento dos consumos de substâncias psicoativas, iniciou um percurso de instabilidade ao nível profissional, vivenciando frequentes e longos períodos de desemprego e há cerca de dois anos que se encontra desempregado. Tem a ficha ativa, desde .../.../2022, no .... 18. Relativamente à ocupação dos tempos livres, o arguido não disponha de uma ocupação estruturada do seu quotidiano, passando grande parte do seu tempo a deambular pelas ruas da cidade da ... na companhia do grupo de pares. 19. Relativamente à problemática aditiva, AA iniciou o consumo de canabinóides com cerca de 17 anos de idade e, dois anos mais tarde, o de ... e, aos 30 anos de idade, de ... Por sua iniciativa, integrou, em .../.../2018, o Programa de Redução de Danos com Cloridrato de Metadona, na ... (...), com registo de algumas faltas à toma da terapêutica. Ao nível das consultas médicas, faltou a três consultas, a última das quais agendada em .../.../2024. Não tem sido sujeito a testes de despiste toxicológicos, uma vez que o programa no qual se encontra integrado não o obriga. 20. Embora não tenha sido possível aferir, através de testes de despiste, AA assumiu manter o consumo de estupefacientes. 21. Na comunidade, pese embora não seja considerado um indivíduo agressivo/violento, apresenta conotação social negativa, decorrente do consumo de substâncias psicoativas e na associação a grupo de pares com idêntica problemática aditiva. 22. Da análise da informação que foi possível recolher, não obstante ter passado por um período de estabilidade ao nível profissional, AA denota défices ao nível das competências pessoais, sociais e profissionais, decorrentes da sua problemática aditiva. Denota, igualmente, dificuldade ao nível do controlo dos impulsos e do pensamento consequencial. 23. AA teve o primeiro contacto com o Sistema de Justiça em ... quando, no âmbito do Processo nº 451/24.5..., foi condenado pela prática de um crime de furto simples, na pena de 150 dias de multa, substituída por 150 horas de prestação de trabalho a favor da comunidade. Entretanto o referido processo foi cumulado com processo n.º 371/24.3... (Proc. n.º371/24.3...), tendo sido condenado na pena única de 250 (duzentos e cinquenta) dias de multa à taxa diária de €5,50 (cinco euros e cinquenta cêntimos), num total de 1.375€ (mil trezentos e setenta e cinco euros), substituída por trabalho a favor da comunidade. No âmbito deste processo encontra a cumprir as horas de trabalho a favor da comunidade, na ... (...), o que lhe permitirá ocupar o seu quotidiano durante o período da medida. 24. Por sentença transitada em julgado a .../.../2025, foi AA condenado, pela prática dos factos ocorridos .../.../2025, em autoria material, na forma consumada, de um crime de furto de uso de veículo, previsto e punido pelo art.º 208, nº 1 do Código Penal, na pena de 8 (oito) meses de prisão, suspensa na sua execução por um período de 2 (dois) anos, com regime de prova. 25. Face ao presente processo, AA não se manifestou, nem identificou quaisquer impactos/repercussões, denotando dificuldade ao nível da autocrítica. 26. Por fim, e de acordo com o apurado junto da Polícia de Segurança Pública, o arguido encontra-se indiciado nos NUIPC’s nºs 872/24.3..., 871/24.5..., 653/24.4..., 534/24.1..., 356/24.0..., 278/24.4..., 751/23.1... e 349/22.1..., pela alegada prática de crimes contra a propriedade, contra a reserva da vida privada, estupefacientes e contra a integridade física. 27. Do Certificado de Registo Criminal do arguido II1 resulta que: 27.1. Por decisão de ........2024, transitada em julgado em ........2024, foi o arguido condenado, no processo sumário n.º 451/24.5... que correu termos neste Juízo Local Criminal da ..., pela prática em ........2024 de um crime de furto simples (em veículo motorizado), na pena de 150 dias de multa, à taxa diária de 5,00€, substituída por 750€ de prestação de trabalho a favor da comunidade. 27.2. Por decisão de ........2024, transitada em julgado em ........2024, foi o arguido condenado, no processo comum n.º 371/24.3... que correu termos neste Juízo Local Criminal da ..., pela prática em ........2024 de um crime de furto simples (em veículo motorizado), na pena de 150 dias de multa, à taxa diária de 5,50€. 27.3. Por decisão de ........2024, transitada em julgado a ........2025, foi realizado o cúmulo jurídico das penas anteriormente indicadas no processo n.º 371/24.3..., tendo sido aplicada uma pena única de 250 dias de multa, à taxa diária de 5,50€, substituída por 250 dias de prestação de trabalho a favor da comunidade. 27.4. Por decisão de ........2025, transitada em julgado em ........2025, foi o arguido condenado, no processo sumário n.º 93/25.8... que correu termos neste Juízo Local Criminal da ..., pela prática em ........2025 de um crime de furto de uso de veículo, na pena de 8 meses de prisão, suspensa por 2 anos, sujeita a regime de prova e à obrigação de realizar testes inopinados para despiste de ingestão de estupefacientes, consultas médicas e tratamento clínico/psiquiátrico/psicológico/medicamentoso, sujeitar-se a acompanhamento clínico ou internamento em instituição ou comunidade terapêutica adequada, se necessário ao tratamento da sua problemática do consumo de estupefacientes, a apurar após consulta médica a realizar. * II.2. Factos não provados: Discutida a causa, não ficaram por provar factos com relevância para a presente causa. (…) IV.5.d. Regime da permanência na habitação Nos termos do art.º 43º do Código Penal, perante arguidos condenados em pena de prisão efetiva não superior a dois anos, “sempre que o tribunal concluir que [com o regime de permanência na habitação] (...) se realizam de forma adequada e suficiente as finalidades da execução da pena de prisão e o condenado nisso consentir” a pena será substituída por este regime, o qual será fiscalizado por meios técnicos de controlo à distância. Com este regime, o condenado pode cumprir a pena de prisão fora de estabelecimento prisional, nomeadamente na sua habitação, na qual tem que permanecer, sendo fiscalizado por meios técnicos de controlo à distância, e podendo sair somente se autorizado pelo Tribunal—nomeadamente para frequência de programas de ressocialização; para exercer atividade profissional; para desenvolver formação ou qualquer tipo de estudos; por razões médicas, etc. Para que possa ser aplicado um regime de execução da pena de prisão em permanência na habitação, paralelamente ao preenchimento de todos os pressupostos do artigo 43.º do Código Penal, é igualmente necessário que a residência do arguido (ou qualquer outro onde este possa vir a residir exclusivamente para efeitos de cumprimento de pena) cumpra com certos requisitos necessários para instalação do mecanismo de vigilância eletrónica – cfr. resulta do disposto na Lei n.º 33/2010, de 2 de setembro; vide Ac. do TRL de 3.6.2020, proc. n.º 507/13.0PQLSB.L1-3 (Rel. MARIA DA GRAÇA DOS SANTOS SILVA), disponível em www.dgis.pt. No caso dos presentes autos, o arguido é condenado numa pena inferior a 2 anos de prisão, todavia, o Tribunal entende, de forma manifesta, que este tipo de pena é manifestamente desadequado e suficiente para salvaguardar e garantir as finalidades da execução da pena de prisão. Para tanto, o Tribunal baseia-se naquilo que esteve subjacente à prática dos ilícitos em presença (necessidade de consumo de estupefacientes), que tem vindo a ser a principal causa de preocupação da integração familiar, social e profissional do arguido ao longo dos anos. Resulta das regras da experiência comum que indivíduos com forte nível e grau de adição e dependência de estupefacientes, tendem a recorrer mais aos ambientes familiares e meios sociais conhecidos para suprir as suas necessidades aditivas, não-raro cometendo os mais diversos tipos de crimes. Assim, considerando que esta dependência e sintomatologia ainda ativas e cada vez mais progressivas no arguido, mais considerando o histórico de instabilidade e abandono, os défices ao nível das competências pessoais, sociais e profissionais, decorrentes da sua problemática aditiva, ou a dificuldade ao nível do controlo dos impulsos e do pensamento consequencial; não pode o Tribunal certamente ficar convencido que o cumprimento de uma pena de prisão a cumprir em regime de permanência na habitação, num contexto em que o arguido se apresenta integrado com vários outros familiares e numa habitação que não é a própria, iria contribuir de forma eficiente para prevenir a reincidência do arguido e satisfazer as exigências de prevenção geral que se impõem. Antes pelo contrário. O particular contexto familiar e social, a par do histórico aditivo e situação presente de consumos registado pelo arguido são manifestamente incompatíveis com a aplicação de uma pena a cumprir na habitação. Termos em que, por não se verificarem os pressupostos para que a pena de prisão aplicada possa ser cumprida em regime de permanência na habitação determina-se que o cumprimento da pena de [1 ano e 4 meses]2 de prisão, far-se-á de em regime de prisão efetiva.”. ** II.3. Apreciação do recurso II.3.1. Da pena de prisão aplicada ao arguido e do seu eventual cumprimento em regime de permanência na habitação O tribunal a quo aplicou ao arguido uma pena de prisão efectiva de seis meses, pela prática, em autoria material e na forma tentada, de um crime de furto qualificado, desqualificado pelo valor, p. e p. pelos arts. 203º e 204º, n.º 1, al. b) e n.º 4, do CP (efectuando, ainda, o desconto no cumprimento dessa pena de prisão, de um dia, nos termos do art. 80º, n.º 1, do Código Penal). Fundamentou esta sua opção, como vimos e, além do mais, pelo facto de o arguido ter antecedentes criminais pelo mesmo tipo de crime, já ter sido condenado por duas vezes em penas de multa, que em cúmulo se fixou numa pena de multa substituída por prestação de trabalho a favor da comunidade, que se encontra a cumprir, bem como uma última condenação em pena de prisão suspensa, com sujeição a regime de prova, que se encontra em curso. Concluiu, face à matéria que também deu como provada adveniente do relatório social, que o cumprimento dessa pena curta de prisão através do regime da permanência na habitação não seria adequado, não se podendo olvidar os hábitos de consumo de estupefacientes do arguido, o que tem afectado as relações familiares, sociais e profissionais ao longo dos anos. No fundo, a questão que se pretende dilucidar, é se as finalidades de execução da pena de prisão são atingidas ou não com o seu cumprimento em regime de permanência na habitação. A finalidade das penas (art. 40º do CP), assim como das medidas de segurança, visa a protecção de bens jurídicos e a reintegração do agente na sociedade e, em caso algum, a pena pode ultrapassar a medida da culpa (sendo que, a medida de segurança, quando se coaduna ao caso concreto, só pode ser aplicada se for proporcionada à gravidade do facto e à perigosidade do agente). Acresce que, a determinação da medida da pena (art. 71º do CP), dentro dos limites fixados pela lei, é feita em função da culpa do agente e das exigências de prevenção (quer geral, quer especial). Balizada no limite mínimo de garantia da prevenção e no máximo da culpa do agente, a pena é determinada em concreto, atendendo a todos os factores previstos, nomeadamente, no n.º 2 do referido artigo 71º do CP (que não façam parte do tipo de crime), que relevem para a ajustar à ilicitude da acção e à culpa do agente, contra ou a favor do mesmo, designadamente: a) O grau de ilicitude do facto, o modo de execução deste e a gravidade das suas consequências, bem como o grau de violação dos deveres impostos ao agente; b) A intensidade do dolo ou da negligência; c) Os sentimentos manifestados no cometimento do crime e os fins ou motivos que o determinaram; d) As condições pessoais do agente e a sua situação económica; e) A conduta anterior ao facto e a posterior a este, especialmente quando esta seja destinada a reparar as consequências do crime; f) A falta de preparação para manter uma conduta lícita, manifestada no facto, quando essa falta deva ser censurada através da aplicação da pena. Assim, a culpa (pressuposto-fundamento da pena que constitui o princípio ético-retributivo), a prevenção geral (negativa, de intimidação ou dissuasão e, positiva, de integração ou interiorização) e a prevenção especial (de ressocialização, reinserção social, reeducação mas que também apresenta uma dimensão negativa, de dissuasão individual) representam as três exigências a cumprir na escolha da pena e na sua medida. Actualmente, o regime de permanência na habitação configura uma forma de execução da pena de prisão. Prevê desde logo o art. 42º do CP que a execução da pena de prisão, servindo a defesa da sociedade e prevenindo a prática de crimes, deve orientar-se no sentido da reintegração social do recluso, preparando-o para conduzir a sua vida de modo socialmente responsável, sem cometer crimes (n.º 1). Dispõe o art. 43º do CP (quanto ao regime de permanência na habitação) que: “1 - Sempre que o tribunal concluir que por este meio se realizam de forma adequada e suficiente as finalidades da execução da pena de prisão e o condenado nisso consentir, são executadas em regime de permanência na habitação, com fiscalização por meios técnicos de controlo à distância: a) A pena de prisão efetiva não superior a dois anos; b) A pena de prisão efetiva não superior a dois anos resultante do desconto previsto nos artigos 80.º a 82.º; c) A pena de prisão não superior a dois anos, em caso de revogação de pena não privativa da liberdade ou de não pagamento da multa previsto no n.º 2 do artigo 45.º 2 - O regime de permanência na habitação consiste na obrigação de o condenado permanecer na habitação, com fiscalização por meios técnicos de controlo à distância, pelo tempo de duração da pena de prisão, sem prejuízo das ausências autorizadas. 3 - O tribunal pode autorizar as ausências necessárias para a frequência de programas de ressocialização ou para atividade profissional, formação profissional ou estudos do condenado. 4 - O tribunal pode subordinar o regime de permanência na habitação ao cumprimento de regras de conduta, suscetíveis de fiscalização pelos serviços de reinserção social e destinadas a promover a reintegração do condenado na sociedade, desde que representem obrigações cujo cumprimento seja razoavelmente de exigir, nomeadamente: a) Frequentar certos programas ou atividades; b) Cumprir determinadas obrigações; c) Sujeitar-se a tratamento médico ou a cura em instituição adequada, obtido o consentimento prévio do condenado; d) Não exercer determinadas profissões; e) Não contactar, receber ou alojar determinadas pessoas; f) Não ter em seu poder objetos especialmente aptos à prática de crimes. 5 - Não se aplica a liberdade condicional quando a pena de prisão seja executada em regime de permanência na habitação.” Por sua vez, o art. 44º do CP (relativamente à modificação das condições e revogação do regime de permanência na habitação) dispõe que: “1 - As autorizações de ausência e as regras de conduta podem ser modificadas até ao termo da pena sempre que ocorrerem circunstâncias relevantes supervenientes ou de que o tribunal só posteriormente tiver tido conhecimento. 2 - O tribunal revoga o regime de permanência na habitação se o condenado: a) Infringir grosseira ou repetidamente as regras de conduta, o disposto no plano de reinserção social ou os deveres decorrentes do regime de execução da pena de prisão; b) Cometer crime pelo qual venha a ser condenado e revelar que as finalidades que estavam na base do regime de permanência na habitação não puderam, por meio dele, ser alcançadas; c) For sujeito a medida de coação de prisão preventiva. 3 - A revogação determina a execução da pena de prisão ainda não cumprida em estabelecimento prisional. 4 - Relativamente ao tempo de pena que venha a ser cumprido em estabelecimento prisional pode ter lugar a concessão de liberdade condicional.” A propósito da alteração legislativa operada em relação ao regime de permanência na habitação pela Lei n.º 94/2017, de 23/08, lê-se na exposição de motivos da Proposta de Lei n.º 90/XIII que: “Pretendeu-se clarificar, estender e aprofundar a permanência na habitação, conferindo-lhe um papel político-criminal de relevo. Vinca-se, por um lado, a sua natureza de regime não carcerário de cumprimento da pena curta de prisão e alarga-se, por outro lado, a possibilidade da sua aplicação aos casos em que a prisão é concretamente fixada em medida não superior a dois anos, quer se trate de prisão aplicada na sentença, de prisão resultante do desconto previsto nos artigos 80.º a 82.º do Código Penal, ou de prisão decorrente da revogação de pena não privativa de liberdade ou do não pagamento da multa previsto no n.º 2 do artigo 45.º do mesmo diploma. Fora deste quadro fica a prisão subsidiária prevista no artigo 49.º, atendendo à sua natureza e função peculiares. Não obstante, o procedimento atual em matéria de aplicação de penas à pequena criminalidade não é substancialmente alterado. O juiz continuará a proceder a uma dupla operação. Verificado que tem perante si um crime provado e concretamente punido com pena de prisão até dois anos, começará por determinar se é adequada e suficiente às finalidades da punição alguma pena de substituição (multa, suspensão da execução, trabalho a favor da comunidade) ou se é necessário aplicar a pena de prisão. Nesta última hipótese, ficam à sua disposição duas possibilidades de execução, pela ordem seguinte: ou em regime de permanência na habitação, ou dentro dos muros da prisão, em regime contínuo. Realça-se outrossim que o regime de permanência na habitação não se limita à mera descarcerização do condenado, ao seu confinamento à habitação e à sua vigilância através de tecnologias de controlo à distância, mas visa sobremaneira a prossecução, de um modo próprio, das finalidades cometidas às penas, designadamente a finalidade ressocializadora. O que justifica que não se aplique o instituto da liberdade condicional. O desígnio apontado é realizado através da concessão ao tribunal de alguma flexibilidade na autorização de ausências da habitação e na fixação de regras de conduta; da substituição do regime de progressividade por um plano de reinserção social, a elaborar pelos serviços de reinserção social e a homologar pelo tribunal de execução das penas, sempre que a pena aplicada for superior a seis meses ou o condenado ainda não tiver completado 21 anos de idade, passando a execução do regime de permanência a reger-se pelo princípio da individualização, da salvaguarda do direito do condenado aos benefícios da segurança social previstos na lei e da prestação de apoio social e económico ao condenado e ao seu agregado familiar como instrumento de reforço das condições de ressocialização.” No caso sub judice, em termos de recurso, não se coloca a questão da escolha da pena de prisão ou da sua medida, mas tão-só a forma como a mesma deve ser executada, se em regime de reclusão, prisão em estabelecimento prisional, se no regime de permanência na habitação. Com esta forma de execução da pena de prisão, pretende-se evitar a prática de novos crimes, mas também a preparação do arguido para uma atitude conforme ao Direito e para a sua verdadeira ressocialização. E, se é certo que nem sempre as penas curtas de prisão têm a sua melhor realização em meio efectivo prisional, casos há em que só desse modo se consegue realizar de forma adequada e suficiente as finalidades da punição (e este, adiantámos já, é um desses casos). O tribunal recorrido ponderou as possibilidades de uma e outra forma cumprimento da pena de prisão, discorrendo sobre esta matéria da seguinte forma: “No caso dos presentes autos, o arguido é condenado numa pena inferior a 2 anos de prisão, todavia, o Tribunal entende, de forma manifesta, que este tipo de pena é manifestamente desadequado e suficiente para salvaguardar e garantir as finalidades da execução da pena de prisão. Para tanto, o Tribunal baseia-se naquilo que esteve subjacente à prática dos ilícitos em presença (necessidade de consumo de estupefacientes), que tem vindo a ser a principal causa de preocupação da integração familiar, social e profissional do arguido ao longo dos anos. Resulta das regras da experiência comum que indivíduos com forte nível e grau de adição e dependência de estupefacientes, tendem a recorrer mais aos ambientes familiares e meios sociais conhecidos para suprir as suas necessidades aditivas, não-raro cometendo os mais diversos tipos de crimes. Assim, considerando que esta dependência e sintomatologia ainda ativas e cada vez mais progressivas no arguido, mais considerando o histórico de instabilidade e abandono, os défices ao nível das competências pessoais, sociais e profissionais, decorrentes da sua problemática aditiva, ou a dificuldade ao nível do controlo dos impulsos e do pensamento consequencial; não pode o Tribunal certamente ficar convencido que o cumprimento de uma pena de prisão a cumprir em regime de permanência na habitação, num contexto em que o arguido se apresenta integrado com vários outros familiares e numa habitação que não é a própria, iria contribuir de forma eficiente para prevenir a reincidência do arguido e satisfazer as exigências de prevenção geral que se impõem. Antes pelo contrário. O particular contexto familiar e social, a par do histórico aditivo e situação presente de consumos registado pelo arguido são manifestamente incompatíveis com a aplicação de uma pena a cumprir na habitação.”. Considerou-se, além do mais, a matéria dada como provada, designadamente que: “8. O arguido é consumidor ativo de estupefacientes (sintética). 9. AA, atualmente com 37 anos de idade, à data da alegada prática dos factos, encontrava-se integrado (contexto que se mantém), no núcleo familiar de origem, composto pela progenitora DD (de 60 anos de idade, doméstica, habilitada com o 5º ano de escolaridade), pelo irmão uterino EE (de 42 anos de idade, ... de profissão, habilitado com o 5º ano de escolaridade), pelo sobrinho FF (18 anos de idade, estudante). Fazem, ainda, parte deste agregado familiar, os tios maternos do arguido, GG (de 65 anos de idade, reformado por invalidez da profissão de ..., habilitado com o 5º ano de escolaridade) e HH (de 68 anos de idade, reformado por invalidez da profissão de ..., habilitado com o 4º ano de escolaridade). 10. Segundo descrito pela progenitora do arguido, a dinâmica familiar atual encontra-se em declínio devido às problemáticas aditivas dos seus descendentes e do neto, no entanto com maior prevalência do filho AA, em especial nos últimos meses. Não obstante integrado no agregado de origem, à data dos factos passou por períodos de indigência, pernoitando nas ruas. 11. A satisfação das necessidades básicas do agregado familiar, de então e atuais é assegurada, de forma precária, através das reformas dos tios maternos, no valor de cerca de 800€ (oitocentos euros). Não obstante o irmão do arguido encontrar-se ativo laboralmente, este não contribui para as despesas fixas mensais que, segundo foi apurado, ronda o valor de cerca de 225€ (duzentos e vinte e cinco euros). 12. A habitação de herdeiros, de tipologia T3, onde reside o agregado familiar foi descrita como dispondo de boas condições de habitabilidade, todavia via esta carece de obras de manutenção. 13. AA é o mais novo de uma fratria de dois elementos, nascido no seio de um agregado familiar monoparental e de precária condição socioeconómico e cultural, cujo processo de crescimento e desenvolvimento decorreu na presença da mãe, do irmão e dos avós maternos, figuras de quem dependia economicamente a sua subsistência, uma vez que a mãe, exercia a profissão de empregada doméstica de forma não permanente. Não obstante as dificuldades económicas, o arguido descreveu a sua infância e adolescência como normal, até ter iniciado os consumos de substâncias psicoativas. 14. AA verbalizou que nunca teve qualquer tipo de contacto com a figura paterna. 15. Ao nível escolar, integrou o sistema de ensino regular em idade própria, contudo, as dificuldades económicas, bem como de aprendizagem, associadas a défices cognitivos, originaram várias retenções, que culminaram no abandono do sistema de ensino, com apenas 15 anos de idade, com o 6º ano de escolaridade. 16. Após ter abandonado o sistema de ensino, trabalhou como ..., durante cerca de dez anos, na empresa de construção civil ..., tendo sido dispensado pela empresa por questões relacionadas, então, com a crise económica ocorrida em ..., que culminou na redução de efetivos. 17. Posteriormente veio a trabalhar como ... de veículos pesados por um período de cerca de cinco anos. Trabalhou, ainda, ao abrigo de um programa de emprego, na ... – ..., durante cerca de dois anos, na qual realizava trabalhos de jardinagem. Com o agravamento dos consumos de substâncias psicoativas, iniciou um percurso de instabilidade ao nível profissional, vivenciando frequentes e longos períodos de desemprego e há cerca de dois anos que se encontra desempregado. Tem a ficha ativa, desde .../.../2022, no .... 18. Relativamente à ocupação dos tempos livres, o arguido não disponha de uma ocupação estruturada do seu quotidiano, passando grande parte do seu tempo a deambular pelas ruas da cidade da ... na companhia do grupo de pares. 19. Relativamente à problemática aditiva, AA iniciou o consumo de canabinóides com cerca de 17 anos de idade e, dois anos mais tarde, o de ... e, aos 30 anos de idade, de ... Por sua iniciativa, integrou, em .../.../2018, o Programa de Redução de Danos com Cloridrato de Metadona, na ... (...), com registo de algumas faltas à toma da terapêutica. Ao nível das consultas médicas, faltou a três consultas, a última das quais agendada em .../.../2024. Não tem sido sujeito a testes de despiste toxicológicos, uma vez que o programa no qual se encontra integrado não o obriga. 20. Embora não tenha sido possível aferir, através de testes de despiste, AA assumiu manter o consumo de estupefacientes. 21. Na comunidade, pese embora não seja considerado um indivíduo agressivo/violento, apresenta conotação social negativa, decorrente do consumo de substâncias psicoativas e na associação a grupo de pares com idêntica problemática aditiva. 22. Da análise da informação que foi possível recolher, não obstante ter passado por um período de estabilidade ao nível profissional, AA denota défices ao nível das competências pessoais, sociais e profissionais, decorrentes da sua problemática aditiva. Denota, igualmente, dificuldade ao nível do controlo dos impulsos e do pensamento consequencial. 23. AA teve o primeiro contacto com o Sistema de Justiça em ... quando, no âmbito do Processo nº 451/24.5..., foi condenado pela prática de um crime de furto simples, na pena de 150 dias de multa, substituída por 150 horas de prestação de trabalho a favor da comunidade. Entretanto o referido processo foi cumulado com processo n.º 371/24.3... (Proc. n.º371/24.3...), tendo sido condenado na pena única de 250 (duzentos e cinquenta) dias de multa à taxa diária de €5,50 (cinco euros e cinquenta cêntimos), num total de 1.375€ (mil trezentos e setenta e cinco euros), substituída por trabalho a favor da comunidade. No âmbito deste processo encontra a cumprir as horas de trabalho a favor da comunidade, na ... (...), o que lhe permitirá ocupar o seu quotidiano durante o período da medida. 24. Por sentença transitada em julgado a .../.../2025, foi AA condenado, pela prática dos factos ocorridos .../.../2025, em autoria material, na forma consumada, de um crime de furto de uso de veículo, previsto e punido pelo art.º 208, nº 1 do Código Penal, na pena de 8 (oito) meses de prisão, suspensa na sua execução por um período de 2 (dois) anos, com regime de prova. 25. Face ao presente processo, AA não se manifestou, nem identificou quaisquer impactos/repercussões, denotando dificuldade ao nível da autocrítica. 26. Por fim, e de acordo com o apurado junto da Polícia de Segurança Pública, o arguido encontra-se indiciado nos NUIPC’s nºs 872/24.3..., 871/24.5..., 653/24.4..., 534/24.1..., 356/24.0..., 278/24.4..., 751/23.1... e 349/22.1..., pela alegada prática de crimes contra a propriedade, contra a reserva da vida privada, estupefacientes e contra a integridade física. 27. Do Certificado de Registo Criminal do arguido JJ3 resulta que: 27.1. Por decisão de ........2024, transitada em julgado em ........2024, foi o arguido condenado, no processo sumário n.º 451/24.5... que correu termos neste Juízo Local Criminal da ..., pela prática em ........2024 de um crime de furto simples (em veículo motorizado), na pena de 150 dias de multa, à taxa diária de 5,00€, substituída por 750€ de prestação de trabalho a favor da comunidade. 27.2. Por decisão de ........2024, transitada em julgado em ........2024, foi o arguido condenado, no processo comum n.º 371/24.3... que correu termos neste Juízo Local Criminal da ..., pela prática em ........2024 de um crime de furto simples (em veículo motorizado), na pena de 150 dias de multa, à taxa diária de 5,50€. 27.3. Por decisão de ........2024, transitada em julgado a ........2025, foi realizado o cúmulo jurídico das penas anteriormente indicadas no processo n.º 371/24.3..., tendo sido aplicada uma pena única de 250 dias de multa, à taxa diária de 5,50€, substituída por 250 dias de prestação de trabalho a favor da comunidade. 27.4. Por decisão de ........2025, transitada em julgado em ........2025, foi o arguido condenado, no processo sumário n.º 93/25.8... que correu termos neste Juízo Local Criminal da ..., pela prática em ........2025 de um crime de furto de uso de veículo, na pena de 8 meses de prisão, suspensa por 2 anos, sujeita a regime de prova e à obrigação de realizar testes inopinados para despiste de ingestão de estupefacientes, consultas médicas e tratamento clínico/psiquiátrico/psicológico/medicamentoso, sujeitar-se a acompanhamento clínico ou internamento em instituição ou comunidade terapêutica adequada, se necessário ao tratamento da sua problemática do consumo de estupefacientes, a apurar após consulta médica a realizar.” Do enquadramento factual e legal do caso sub judice, verificamos que o arguido AA manteve a prática de crimes ligados ao património, fruto também da dependência de estupefacientes que tem desde os 17 anos de idade e que, perante o desemprego de longa duração, constituiu a forma que encontrou de obter o produto estupefaciente. A situação familiar do arguido é apontada pela DGRSP como disfuncional, não sendo a progenitora do arguido capaz de exercer autoridade perante o comportamento desviante e aditivo de AA. Todo o seu percurso, inserção social e profissional, têm vindo a ser condicionados pela já referida problemática aditiva, não tendo o arguido conseguido desviar-se da mesma, nem cumprir com regras que já lhe haviam sido impostas no âmbito de outra das penas aplicadas. São ainda referidas situações de impulsividade e a inexistência de uma figura que sobre ele exerça alguma autoridade, o que constituem, sem dúvida, principais factores de risco, quer relativamente aos consumos, quer à prática de novos crimes, inclusive no seio familiar, o que se mostra necessário acautelar. Não podemos, pois, fazer um juízo de prognose favorável de que a execução da pena de prisão em regime de permanência na habitação, primeiro, satisfaça as exigências de prevenção geral e, segundo (e sobretudo) se adeque às exigências de prevenção especial e de ressocialização necessários ao caso concreto (tendo em consideração que são apresentadas fragilidades ao nível das relações familiares, sociais e profissionais, na sequência, também, do consumo de estupefacientes por parte do arguido). Cremos que só com a efectivação da pena de prisão em causa em meio prisional se poderá alcançar o fim desta pena, cumprindo as necessidades de reinserção social, com um eficaz controlo comportamental, um iniciar de nova postura e consciencialização da necessidade de retomar hábitos de trabalho em momento ulterior e um processo de acompanhamento ao nível aditivo e de cumprimento de normas que o levem ao posterior cumprimento das regras em sociedade e da Lei (o que não consideramos que se consiga, de todo, alcançar com o regime de permanência na habitação, sendo apontada a dinâmica familiar como estando em declínio, devido à problemática aditiva de vários elementos do agregado familiar – cfr. o facto 10º dado como provado). O tempo de prisão a cumprir pelo arguido, deverá servir os seus propósitos de pena com ressocialização, importando ao arguido reflectir sobre o seu percurso de vida e o que isso tem afectado não só terceiros, com a prática dos seus crimes, como a sua família e a si próprio. Improcede, pois, o recurso interposto pelo arguido. ** III- DECISÃO Pelo exposto, acordam os Juízes que compõem a 9ª Secção deste Tribunal da Relação de Lisboa em: a. Rectificar, nos termos do art. 380º do CPP, o lapso de escrita constante do ponto 27 dos factos provados e, onde consta ‘arguido KK’, deve passar a constar ‘arguido AA’; b. Negar provimento ao recurso do arguido AA e, em consequência, confirmar a decisão recorrida. Custas pelo recorrente, fixando-se a taxa de justiça em três UC’s (artigo 513º, n.º 1, do CPP e artigo 8º, n.º 9, do RCP, com referência à Tabela III). Notifique. ** Lisboa, 23/10/2025 (Texto elaborado pela relatora e revisto, integralmente, pelos seus signatários) Paula Cristina Borges Gonçalves Ana Paula Guedes Eduardo de Sousa Paiva ___________________________________________________ 1. Lapso de escrita alterado no presente acórdão para ‘arguido AA 2. Manifesto lapso de escrita constante da sentença, devendo entender-se ‘6 meses’, como consta expressamente da demais fundamentação e da decisão condenatória proferida. 3. Lapso de escrita alterado no presente acórdão para ‘arguido AA  |