Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa
Processo:
12960/24.1T8LSB-B.L1-6
Relator: ADEODATO BROTAS
Descritores: OBJECTO DA PROVA
MEIOS DE PROVA
DOCUMENTOS
Nº do Documento: RL
Data do Acordão: 10/30/2025
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Texto Parcial: N
Meio Processual: APELAÇÃO
Decisão: IMPROCEDENTE
Sumário: Sumário (artº 663º nº 7 do CPC)
1- Só devem ser objecto da prova os factos pertinentes, isto é, os factos que interessam à solução do pleito e que estão incluídos nos temas de prova, como decorre dos artºs 410º e 596º nº 1 do CPC.
2- O juiz pode/deve impedir a produção de meios de prova irrelevantes, que repute inúteis, recusando o que for impertinente ou meramente dilatório (artº 6º nº 1), como sucede com a junção de documentos inúteis (artº 443º nº 1 CPC) e que se destinem a provar factos irrelevantes, rectius, que não constam dos temas de prova (artº 429º nº 2 do CPC).
Decisão Texto Parcial:
Decisão Texto Integral: Acordam os juízes que compõem este colectivo da 6ª Secção Cível do Tribunal da Relação de Lisboa:

I-RELATÓRIO.
1-CRC Credit Fund, Ltd., CRC Capital Release Fund, Ltd., CRC Concentrated Positions Fund, Ltd., representados por Christofferson Robb & Company, LLC., instauraram esta acção declarativa, com processo comum, contra Novo Banco, SA, pedindo:
a) Devem os contratos de (re)compra dos CRÉDITOS REMANESCENTES LM-2 e 3 ser declarados nulos e, em consequência, deve restituir-se aos AUTORES a diferença entre o valor de mercado dos referidos créditos e o preço pago por eles pelo NOVO BANCO, que se estima em pelo menos € 17.666.183,01, acrescida de juros comerciais desde 16.08.2019 e 17.10.2019, respectivamente, até efectivo e integral pagamento, juros esses que até ao momento se computam em € 6.539.977,07 (€ 1.501.365,70 + € 5.038.611,37);
Subsidiariamente,
b) ser o RÉU condenado a pagar ao AUTORES a quantia correspondente à diferença entre o valor de mercado dos referidos créditos e o preço pago por eles pelo NOVO BANCO, que se estima em pelo menos € 17.666.183,01, acrescida de juros à taxa legal para juros comerciais desde a data de reaquisição dos créditos pelo NOVO BANCO até efectivo e integral pagamento, juros esses que até ao momento se computam em € 6.539.977,07, a título de responsabilidade civil contratual;
Subsidiariamente,
c) ser o RÉU condenado a pagar ao AUTORES a quantia correspondente à diferença entre o valor de mercado dos referidos créditos e o preço pago por eles pelo NOVO BANCO, que se estima em pelo menos € 17.666.183,01, acrescida de juros comerciais desde a data de reaquisição dos créditos pelo NOVO BANCO até efectivo e integral pagamento, juros esses que até ao momento se computam em € 6.539.977,07, a título de responsabilidade civil extracontratual;
E ainda subsidiariamente,
d) ser o RÉU condenado a pagar ao AUTORES a quantia correspondente à diferença entre o valor de mercado dos referidos créditos e o preço pago por eles pelo NOVO BANCO, que se estima em pelo menos € 17.666.183,01, acrescida de juros comerciais desde a data de reaquisição dos créditos pelo NOVO BANCO até efectivo e integral pagamento, juros esses que até ao momento se computam em € 6.539.977,07, a título de enriquecimento sem causa.
Alegaram, em síntese – socorremo-nos da indicação da causa de pedir sintetizada pelo tribunal a quo, no ponto V) dos Factos Assentes e que obteve a concordância das partes - que:
- O “Banco Espírito Santo, S.A.” cedeu créditos hipotecários, do “Banco Internacional de Crédito, S.A.”, ao fundo de titularização de créditos denominado “Lusitano Mortgages no. 2”;
- E, cedeu créditos hipotecários próprios ao fundo de titularização de créditos denominado “Lusitano Mortgages no. 3”;
- Que os respectivos preços foram pagos através de montantes investidos em obrigações, subscritas, entre outros, pelos Autores;
- Que era o Réu quem geria a sociedade gestora desses fundos;
- No seu exclusivo interesse, o Réu instruiu a sociedade gestora para recomprar esses créditos e (em consequência), as emitentes liquidaram as obrigações, pagando um preço abaixo do valor de mercado;
- Em prejuízo do interesse dos Autores.
Na petição inicial os autores requereram, além do mais, os seguintes meios de prova:
a) para esclarecimento e prova dos motivos da decisão de recomprar dos créditos aos fundos de titularização, designadamente do alegado (a título de exemplo) nos artigos 50.º, 51.º, 52.º e 53.º da petição inicial, a notificação ao NOVO BANCO para juntar aos autos cópia das deliberações dos órgãos sociais do NOVO BANCO relativos à recompra dos créditos cedidos aos Fundos Lusitano Mortgages no. 2 e Lusitano Mortgages no. 3 e documentos de suporte a essa decisão, designadamente os pareceres, notas, avaliações e demais documentos internos que instruíram a decisão de recomprar os créditos e, designadamente, os documentos de onde conste o racional da decisão;
b) para prova da gestão dos fundos pela ESAF, designadamente do alegado (a título de exemplo) nos artigos 197.º, 198.º e 203.º da petição inicial, a notificação à Patris – Sociedade Gestora de Fundos de Titularização de Créditos, S.A. (“Patris”) para juntar aos autos cópia do contrato de gestão celebrado com a ESAF;
c) para esclarecimento e prova do valor de mercado (dos) CRÉDITOS REMANESCENTES LM-2 e LM-3, designadamente do alegado (a título de exemplo) nos artigos 311.º a 365.º, a indicação discriminada do valor e activos, entretanto recuperados em créditos recomprados aos FUNDOS Lusitano Mortgages no. 2 e Lusitano Mortgages no. 3 que, à data da recompra, tinham prestações em atraso (overdue loans) ou tinham sido anulados (written-off – WO).
2-Em 12/04/2025, foi proferido despacho saneador no qual, além do mais, foi dado como assente o seguinte conjunto de factos:
i. Em escrito encimado pela expressão «(…) ACORDO QUADRO PRINCIPAL
Relativamente à emissão pela LUSITANO MORTGAGES NO.2 PLC (…)», “Lusitano Mortgages No.2 Plc”, aí designada como "Emitente", “Deutsche Trustee Company Limited”, aí designado como "Trustee", o “Banco Internacional de Crédito, S.A.”, aí designado como "Ordenador" e "Beneficiário" e "Comprador de Obrigações da Categoria F", “Deutsche Bank Ag London”, aí designado como "Principal Agente Pagador", "Banco da Conta Emitente", "Banco da Conta de Reserva de Caixa", “Banco Agente” e "Banco da Conta de Exploração do Fundo”, “Credit Agricole Indosuez”, aí designado como "Contraparte do Swap" e “Prestador da Facilidade de Liquidez”, “Banco Espírito Santo, S.A.”, aí designado como "Depositário", “Deutsche Bank Ag, Londres”, aí designado como "Gestor de Transação" e “Lusitano Mortgages No.2”, aí designado como “Gestor do Fundo”, declararam «(…):
28. Direito aplicável
Todos os documentos do emitente (exceto o acordo de coordenação e o acordo de serviços às empresas) e todas as questões decorrentes ou relacionadas com os mesmos serão regidos pelo direito inglês.
29 Jurisdição
29.1 Os tribunais de Inglaterra têm jurisdição exclusiva para resolver qualquer litígio.
29.2 As partes concordam que os tribunais de Inglaterra são os tribunais mais apropriados e convenientes para resolver litígios entre elas e, consequentemente, não argumentarão em contrário. (…)».
ii. Em escrito encimado pela expressão «ACORDO QUADRO PRINCIPAL Relativamente à emissão pela LUSITANO MORTGAGES NO.3 PLC (…)» “Lusitano Mortgages No.2 Plc”, aí designada como "Emissor", “Deutsche Trustee Company Limited”, aí designado como "Administrador", o, “Deutsche Bank Ag Londre”, aí designado como "Agente Pagador Principal", “Gestor de Transacções”, "Banco da Conta Emitente", "Banco da Conta de Reserva", “Banco Agente” e "Banco da Conta de Exploração do Fundo”, “Banco Espírito Santo, S.A.”, aí designado como "Comprador de Obrigações de Classe E", “Abn Amro Bank”, aí designado como "Contraparte do Swap" e “Lusitano Mortgages NO.3”, aí designado como “Fundo” e “Gestor do Fundo” declararam «(…):
25. Direito aplicável
Todos os documentos do Emitente (exceto o Acordo de Coordenação, o Acordo de Serviços Corporativos e o Acordo de Compra de Unidades de Participação) e todas as questões decorrentes ou relacionadas com os mesmos serão regidos pelo direito inglês.
26 Jurisdição
26.1 Os tribunais de Inglaterra têm jurisdição exclusiva para resolver qualquer litígio.
26.2 As partes concordam que os tribunais de Inglaterra são os tribunais mais apropriados e convenientes para resolver litígios entre elas e, consequentemente, não argumentarão em contrário. (…)».
iii. Em escrito encimado pela expressão «(…) CONTRATO FIDUCIÁRIO Relativamente à emissão pela Lusitano Mortgages No. 3 plc de (…) 10.800.000 € em Obrigações de Classe E com Garantia Hipotecária, com vencimento em 2047», a “Lusitano Mortages No. 3 Plc”, aí designada como “Emitente” e a “Deutsche Trustee Company Limited”, aí designada como “Fiduciário”, declararam
«(…) 15 Lei Aplicável e Jurisdição (a) Lei aplicável: O Contrato Fiduciário e as Obrigações são regidos e devem ser interpretados de acordo com a lei inglesa.
(b) Jurisdição: O Emitente, no Contrato Fiduciário, (i) submeteu-se irrevogavelmente à jurisdição dos tribunais de Inglaterra para efeitos de ouvir e determinar qualquer processo, acção ou procedimento ou resolver quaisquer litígios decorrentes de ou em relação ao Contrato Fiduciário ou às Obrigações (…)».
iv. Em prospecto encimado pela expressão «(…) Lusitano Mortgages No.2 plc (…) relativamente à emissão pelo Lusitano Mortgages No. 2 plc (…) de Euro 6.000.000 Obrigações de Taxa Variável Garantidos por Hipotecas de Classe E devidas em 2046 (…)», exarou-se «(…) Lei aplicável e jurisdição (a) O Trust Deed e as Obrigações da Classe F regem-se e serão interpretados de acordo com a lei inglesa.
(b) O Emitente, na Escritura Fiduciária:
(i) submeteu-se irrevogavelmente à jurisdição dos tribunais de Inglaterra para efeitos de julgamento e determinação de qualquer processo, acção ou procedimento ou para a resolução de quaisquer litígios decorrentes ou relacionados com a Escritura Fiduciária ou com as Obrigações da Classe F (…)».
v. A título de causa de pedir, os Autores invocam, em resumo, que o “Banco Espírito Santo, S.A.” cedeu créditos hipotecários do “Banco Internacional de Crédito, S.A.” ao fundo de titularização de créditos denominado “Lusitano Mortgages no. 2” e, cedeu créditos hipotecários próprios ao fundo de titularização de créditos denominado “Lusitano Mortgages no. 3”, que os respectivos preços foram pagos através de montantes investidos em obrigações subscritas, ademais, pelos Autores, que era o que Réu geria a sociedade gestora desses fundos e que, no seu exclusivo interesse, o Réu instruiu a sociedade gestora recomprar esses créditos e as emitentes a liquidarem as obrigações, pagando um preço abaixo do valor de mercado e em prejuízo do interesse dos Autores.
vi. Os Autores peticionam, a título principal, que «(…) os contratos de (re)compra dos CRÉDITOS REMANESCENTES LM-2 e 3 (…)» sejam «(…) declarados nulos e, em consequência, deve restituir-se aos AUTORES a diferença entre o valor de mercado dos referidos créditos e o preço pago por eles pelo NOVO BANCO, que se estima em pelo menos € 17.666.183,01, acrescida de juros comerciais desde 16.08.2019 e 17.10.2019, respectivamente, até efectivo e integral pagamento, juros esses que até ao momento se computam em € 6.539.977,07 (€ 1.501.365,70 + € 5.038.611,37) (…)»;
E foram enunciados os seguintes Temas da Prova:
1) O “Banco Internacional de Crédito S.A.” e o “Banco Espírito Santo de Investimento, S.A.” adquiriram para venderem no mercado secundário as obrigações referidas nas alíneas E) e J).
2) A “Lusitano Mortgages No. 2 Plc” e a “Lusitano Mortgages No. 3 Plc” foram criadas para a realização das operações aludidas nas alíneas C) a E) e H) a J), não exercem qualquer actividade, não têm um local de trabalho e não têm trabalhadores.
3) Os accionistas da “Lusitano Mortgages No. 2 Plc” e da “Lusitano Mortgages No. 3 Plc” foram indicados por advogados e os respectivos gestores nelas não exerciam qualquer actividade.
4) As contas dos fundos aludidos nas alíneas C) e H) eram preparadas pelo “Banco Espírito Santo, S.A.” e, depois, pelo Réu, através da “GNB Gestão de Ativos, Sociedade Gestora de Organismos de Investimento Coletivo, S.A.”
5) O “Banco Espírito Santo, S.A.”, por intermédio da “Espirito Santo Activos Financeiros SGPS, S.A.” e, depois, o Réu, através da “GNB Gestão de Ativos, Sociedade Gestora de Organismos de Investimento Coletivo, S.A”, geria e gere a actividade da “Portucale - Sociedade Gestora de Fundos de Titularização de Créditos, S.A.” e, ao assinarem documentos, os membros do respectivo conselho de administração seguiam e seguem instruções daqueles.
6) O Autor “Crc Credit Fund, Ltd.” - na proporção de 38,42% -, o Autor “Crc Capital Release Fund, Ltd.” - na proporção de 21,47% - e o Autor “Concentrated Positions Fund, Ltd.” - na proporção de 40,11% - subscreveram 98,3% das obrigações de classe F referidas no escrito parcialmente reproduzido na alínea C).
7) O Autor “Crc Credit Fund, Ltd.” - na proporção de 46,25% -, o Autor “Crc Capital Release Fund, Ltd.” - na proporção de 12,50% - e o Autor “Concentrated Positions Fund, Ltd.” - na proporção de 41,25% - subscreveram 74,1% das obrigações de classe F referidas no escrito parcialmente reproduzido na alínea H).
8) A “Lusitano Mortgages No. 2 PLC” e a “Lusitano Mortgages No. 3 PLC” actuaram da forma descrita nas alíneas U) e V) na sequência de instruções do Réu.
9) Em virtude do facto referido na alínea R), o Réu deu instruções à Patris - Sociedade Gestora de Fundos de Titularização de Créditos, S.A.” para que esta liquidasse os fundos aludidos nos escritos parcialmente reproduzidos nas alíneas C) e H).
10) Por indicação do Réu, a “Patris - Sociedade Gestora de Fundos de Titularização de Créditos, S.A.” não encetou qualquer prospecção de mercado para que fossem efectuadas ofertas por investidores pelos créditos remanescentes dos fundos aludidos nos escritos parcialmente reproduzidos nas alíneas C) e H).
11) Por indicação do Réu, a “Patris - Sociedade Gestora de Fundos de Titularização de Créditos, S.A.” retransmitiu para aquele os créditos referidos no escrito parcialmente reproduzido na alínea V).
12) O Réu transmitiu à “Deutsche Trustee Company Limited” - depositária das obrigações referidas nas alíneas E) e J) - que os valores das avaliações dos créditos referidos nas alíneas não seriam transmitidos aos Autores.
13) A “Tocha, Chaves & Associados, SROC, Lda.” não avaliou, por si, os créditos indicados no escrito parcialmente reproduzido na alínea V) e seguiu, para o efeito, as indicações da “Ernst & Young Audit & Associados, SROC, S.A.”.
14) A “Ernst & Young Audit & Associados, SROC, S.A.” audita o Réu.
15) No mercado, a avaliação média dos créditos com prestações em atraso por período superior a 90 dias e dos créditos “written off” - genericamente designados como “NPL” - corresponde a uma percentagem entre 50% a 65% do seu valor nominal.
16) Tendo em conta o historial de recuperação de créditos “NPL” do fundo referido na alínea C) e o facto do respectivo montante ascender a € 11.675.869,67, o valor de mercado dos mesmos corresponderia a € 6.304.969,62.
17) O Réu avaliou os créditos “NPL” do fundo referido na alínea C) em 25,83% do seu valor nominal.
18) Na ocasião referida na alínea V), o fundo referido na alínea C) tinha, como potencial receita, a quantia de € 1.094.905,06, por conta de empréstimos hipotecários pagos através da entrega dos imóveis.
19) O Réu conseguiria recuperar 61% do valor referido no tema da prova n.º 18) através da venda dos imóveis ali mencionados.
20) Tendo em conta o historial de recuperação de créditos “NPL” do fundo referido na alínea G) e o facto do respectivo montante ascender a € 27.488.440,74, o valor de mercado dos mesmos corresponderia a € 16.493.064,44.
21) O Réu avaliou os créditos “NPL” do fundo referido na alínea G) em 14,4% do seu valor nominal.
22) Na ocasião referida na alínea V), o fundo referido na alínea G) tinha, como potencial receita líquida, a quantia de € 2.175.797,05 por conta de empréstimos hipotecários pagos através da entrega dos imóveis.
23) O Réu conseguiria recuperar 54% do valor referido no tema da prova n.º 22) através da venda dos imóveis ali mencionados.
24) O Réu fez sua a diferença entre a soma dos valores inscritos nos temas da prova n.os 16) a 19) e 20) a 23) e os valores referidos no escrito parcialmente reproduzido na alínea V).
***
25) A Autora tem conhecimento dos factos referidos nos temas da prova n.os 16) a 19) e 24) desde 16 de Julho de 2019.
26) A Autora tem conhecimento dos factos referidos nos temas da prova n.os 20) a 24) desde 16 de Outubro de 2019.
Mais foram as partes informadas (serem possíveis de serem) considerados provados os seguintes factos:
A) Os Autores são fundos de investimento sedeados nas Ilhas Caimão, sendo a Autora a respectiva gestora com experiência no ramo.
B) Desde 1997 até 2005, o capital social do “Banco Internacional de Crédito S.A.” era integralmente detido pelo “Banco Espírito Santo, S.A.”.
C) Em escrito encimado pela expressão “CONTRATO DE VENDA DE HIPOTECA relativamente à emissão pelo Lusitano Mortgages No. 2 plc de Euro 920.000.000 obrigações de taxa variável garantidos por hipotecas de classe A devidas em 2036 Euro 30.000.000 obrigações de taxa variável garantidos por hipotecas de classe B devidas em 2046 Euro 28.000.000 obrigações de taxa variável garantidos por hipotecas de classe C devidas em 2046 Euro 16.000.000 obrigações de taxa variável garantidos por hipotecas de classe D devidas em 2046
Euro 6.000.000 obrigações de taxa variável garantidos por hipotecas de classe E
devidas em 2046 euro 9.000.000 obrigações de taxa variável garantidos por hipotecas de classe F devidas em 2046 e datado de 4 de Novembro de 2003, o “Banco Internacional de Crédito S.A.”, aí designado como “Originador e Gestor”, o “Lusitano Mortgages No. 2 Fundo”, aí designado como “Comprador” e a “Finantia-Sociedade Gestora de Fundos de Titularização de Créditos, S.A.” (por si e enquanto representante deste) declararam «(…) A entidade cedente exerce, entre outras, a atividade de comercialização e originação de empréstimos hipotecários garantidos por imóveis residenciais em Portugal.
(B) O Ordenador é uma instituição de crédito devidamente autorizada e registada
no Banco de Portugal, detentora de uma carteira de créditos hipotecários.
(C) O Comprador é um fundo de titularização de créditos devidamente autorizado CMVM termos do Código das Titularizações.
(D) O Comprador tenciona adquirir ao Autor alguns desses empréstimos hipotecários a serem financiados através da emissão das Unidades.
(E) O Ordenador concordou em vender e o Comprador concordou em adquirir alguns desses empréstimos hipotecários, juntamente com o benefício da garantia colateral para esses empréstimos e direitos acessórios, em conformidade com os termos do presente Acordo. (…)
Venda da carteira de activos hipotecários
3.1 Sujeito aos termos e condições deste Contrato e à receção pelo Gestor do Fundo dos documentos referidos nas Condições Precedentes, o Ordenador cede ao Comprador, e o Comprador, sujeito às disposições da cláusula 3.3, na Data de Encerramento adquire, a Carteira de Activos Hipotecários, incluindo, na medida do possível ao abrigo da lei aplicável, o benefício total e o direito, título e interesse de:
3.1.1 cada Ativo Hipotecário; e
3.1.2 contas a receber, e o pleno benefício do direito do Ordenador a e ao abrigo de cada Contrato de Activos Hipotecários, em cada caso incluído ou resultante da Carteira de Activos Hipotecários.
3.2 O valor total a pagar pelo Comprador ao Originator pela aquisição do Portefólio de Activos Hipotecários (sendo o Preço de Aquisição) será de €1.002.100.000.
8. Aplicação (…)
Apenas o Fiduciário pode fazer cumprir as disposições deste Contrato e das Obrigações e nenhum Titular da Obrigação terá o direito de proceder directamente contra o Emitente, a menos que o Fiduciário, tendo-se tornado obrigado a proceder, não o faça dentro de um prazo razoável e essa falha seja contínua. (…)
D) Para financiar a aquisição a que se refere o escrito parcialmente reproduzido na alínea C), a “Finantia-Sociedade Gestora de Fundos de Titularização de Créditos, S.A.” emitiu 100% das unidades de titularização do fundo “Lusitano Mortgages No. 2” as quais foram adquiridas pela “Lusitano Mortgages No. 2 Plc”, constituída, por razões fiscais, na Irlanda.
E) Para financiar a aquisição referida na alínea D), a “Lusitano Mortgages No. 2 plc” emitiu, ademais, as obrigações de classe F referidas no escrito parcialmente reproduzido na alínea C), as quais, sendo apenas pagas após serem liquidados o capital e juros pré-determinados das restantes classes de obrigações, poderiam propiciar um rendimento superior àquele que seria auferido por um detentor de obrigações destoutras classes.
F) No prospecto referente às obrigações referidas na alínea E) fez-se constar que
«(…)
Ativo Hipotecário Abatido: significa, em qualquer dia, qualquer Crédito relativo a uma Hipoteca Ativo:
(a) que seja um Ativo Hipotecário em Incumprimento; ou
(b) em relação ao qual o Produto da Liquidação foi realizado; ou
(c) que o prestador de serviços classifica como um ativo hipotecário amortizado, de acordo com os procedimentos operacionais. (…)
Reembolso facultativo na totalidade
O Emitente pode, sujeito a e de acordo com as Condições e o Trust Deed, por sua opção e com 30 dias de aviso prévio por escrito ao Trustee e aos Obrigacionistas da Classe F, aplicar os Montantes de Distribuição Disponíveis para resgatar todas (mas não apenas algumas) das Obrigações da Classe F pelo seu Montante de Capital em dívida, juntamente com os juros acumulados antes da data fixada para o resgate em qualquer Data de Pagamento de Juros (…)
Nenhum detentor de Obrigações da Classe F terá o direito de proceder direta ou indiretamente contra o (…) o Originador (…) ao abrigo das Obrigações da Classe F. (…)».
G) O fundo “Lusitano Mortgages No. 2” passou a ser gerido pela “Portucale - SGFTC, S.A.”, actualmente denominada “Patris - Sociedade Gestora de Fundos de Titularização de Créditos, S.A.”.
H) Em escrito encimado pela expressão “CONTRATO DE VENDA DE HIPOTECAS relativamente à emissão pelo Lusitano Mortgages No. 3 plc de Euro 1.140.000.000 de Obrigações de Taxa Variável com Garantia Hipotecária de Classe A, com vencimento em 2047 Euro 27.000.000 de Obrigações de Taxa Variável com Garantia Hipotecária de Classe B, com vencimento em 2047 Euro 18.600.000 de Obrigações de Taxa Variável com Garantia Hipotecária de Classe C, com vencimento em 2047 Euro 14.400.000 de Obrigações de Taxa Variável com Garantia Hipotecária de Classe D com vencimento em 2047 Euro 10.800.000 Obrigações com Garantia Hipotecária de Classe E, com vencimento em 2047” e datado de 19 de Novembro de 2004, o “Banco Espírito Santo, S.A.”, aí designado como “Originador e Gestor”, o “Lusitano Mortgages No. 3 Fundo”, aí designado como “Comprador” e a “Portucale - SGFTC S.A.” (na qualidade de “Gestor do Fundo”) declararam «(…) A entidade cedente exerce, entre outras, a atividade de comercialização e originação de empréstimos hipotecários garantidos por imóveis residenciais em Portugal.
(B) O Ordenador é uma instituição de crédito devidamente autorizada e registada
no Banco de Portugal, detentora de uma carteira de créditos hipotecários.
(C) O Comprador é um fundo de titularização de créditos devidamente autorizado CMVM termos do Código das Titularizações.
(D) O Comprador tenciona adquirir ao Autor alguns desses empréstimos hipotecários a serem financiados através da emissão das Unidades de Participação.
(E) O Ordenador concordou em vender e o Comprador concordou em adquirir alguns desses empréstimos hipotecários, juntamente com o benefício da garantia colateral para esses empréstimos e direitos acessórios, em conformidade com os termos do presente Acordo. (…)
Venda da carteira de activos hipotecários
3.1 Sujeito aos termos e condições deste Contrato e à receção pelo Gestor do Fundo dos documentos referidos nas Condições Precedentes, o Ordenador cede ao Comprador, e o Comprador, sujeito às disposições da cláusula 3.3, na Data de Encerramento adquire, a Carteira de Activos Hipotecários, incluindo, na medida do possível ao abrigo da lei aplicável, o benefício total e o direito, título e interesse de:
3.1.1 cada Ativo Hipotecário; e
3.1.2 contas a receber, e o pleno benefício do direito do Ordenador a e ao abrigo de cada Contrato de Activos Hipotecários, em cada caso incluído ou resultante da Carteira de Activos Hipotecários.
3.2 O valor total a pagar pelo Comprador ao Originador pela aquisição do Portefólio de Activos Hipotecários (sendo o Preço de Aquisição) será de €1.200.001.453,43
8. Aplicação (…)
Apenas o Fiduciário pode fazer cumprir as disposições deste Contrato e das Obrigações e nenhum Titular da Obrigação terá o direito de proceder directamente contra o Emitente, a menos que o Fiduciário, tendo-se tornado obrigado a proceder, não o faça dentro de um prazo razoável e essa falha seja contínua. (…)».
I) Para financiar a aquisição a que se refere o escrito parcialmente reproduzido na alínea H), a “Portucale - SGFTC S.A.” (actualmente denominada “Patris - Sociedade Gestora de Fundos de Titularização de Créditos, S.A.”) emitiu 100% das unidades de titularização do fundo “Lusitano Mortgages No. 3” as quais foram adquiridas pela “Lusitano Mortgages No. 3 plc”, constituída, por razões fiscais, na Irlanda.
J) Para financiar a aquisição referida na alínea I), a “Lusitano Mortgages No. 3 plc” emitiu, ademais, as obrigações de classe E referidas no escrito parcialmente reproduzido na alínea G), as quais, sendo apenas pagas após serem liquidados o capital e juros pré-determinados das restantes classes de obrigações, poderiam propiciar um rendimento superior àquele que seria auferido por um detentor de obrigações destoutras classes.
K) No prospecto referente às obrigações referidas na alínea J) fez-se constar que «(…)
Ativo Hipotecário Abatido: significa, em qualquer dia, qualquer Crédito relativo a
uma Hipoteca Ativo:
(a) que seja um Ativo Hipotecário em Incumprimento; ou
(b) em relação ao qual o Produto da Liquidação foi realizado; ou
(c) que o prestador de serviços classifica como um ativo hipotecário amortizado, de acordo com os procedimentos operacionais. (…)
Reembolso facultativo na totalidade
O Emitente pode, sujeito a e de acordo com as Condições e o Trust Deed, por sua opção e com 30 dias de aviso prévio por escrito ao Trustee e aos Obrigacionistas, aplicar os Montantes de Distribuição Disponíveis para resgatar todas (mas não apenas algumas) das Obrigações pelo seu Montante de Capital em dívida, juntamente com os juros acumulados antes da data fixada para o resgate em qualquer Data de Pagamento de Juros (…)
Nenhum titular de quaisquer Obrigações terá o direito de proceder direta ou indiretamente contra o Originador (…) ao abrigo das Obrigações (…)».
L) Nos regulamentos de gestão dos fundos “Lusitano Mortgages No. 2” e fundo “Lusitano Mortgages No. 3” referidos nas alíneas C) e H) lê-se:
«(…) Artigo 7º - Depositário
As funções de depositário do Fundo, tal como previstas na lei e no Contrato de Prestação de Serviços de Depositário, serão exercidas pelo Novo Banco, S.A., (anteriormente Banco Espírito Santo, S.A.) (…) na qualidade de depositário (“Depositário”) (…)
Artigo 9º - Detentores
1. A aquisição da qualidade de Detentor no Fundo é feita na data de subscrição e
pagamento das Unidades. (…)
Artigo 11º - Obrigações da Sociedade Gestora
No exercício da sua função de entidade gestora e representante legal do Fundo, a Sociedade Gestora actua por conta dos Detentores e no interesse exclusivo destes, competindo-lhe, em geral, a prática de todos os actos e operações necessários à boa administração do Fundo e do seu património, de acordo com critérios de elevada diligência e competência profissional, e, em especial: (…)
Artigo 12º - Obrigações do Depositário
No exercício da sua função de instituição depositária nos termos do Contrato de Prestação de Serviços de Depositário compete ao Depositário:
(d) executar as demais instruções que lhe sejam transmitidas pela Sociedade Gestora, sem prejuízo do dever de, previamente à execução, verificar a conformidade de todas as instruções recebidas da Sociedade Gestora com a lei e o presente regulamento de gestão; (…)
h) assumir uma função de vigilância e garantir perante os Detentores de Unidades o cumprimento do regulamento de gestão do Fundo.
Artigo 13º - Responsabilidade da Sociedade Gestora e do Depositário A Sociedade Gestora e o Depositário respondem solidariamente perante os Detentores por todos os compromissos assumidos nos termos da lei e do presente regulamento bem como pelo rigor da informação constante no presente regulamento de gestão. (…)
Artigo 15º - Liquidação e Partilha (…)
3. O Fundo poderá ser liquidado e partilhado antes do termo acima referido nos seguintes casos:
(b) por determinação da Sociedade Gestora caso apenas um Detentor detenha a totalidade das Unidades; (…)
6. Aplicam-se às liquidações referidas nos números 3 (a), (b) e (c) do presente artigo as regras seguintes:
(a) Os Créditos que integram o património do Fundo serão transmitidos, nos termos do n.º 5 do artigo 12.º e n.º 5 do artigo 38.º da Lei de Titularização de Créditos;
(b) O preço da transmissão dos Créditos deverá ser objecto de relatório de auditor registado na CMVM; (…)».
M) Em 2005, o “Banco Espírito Santo, S.A.” integrou, por fusão, o “Banco Internacional de Crédito S.A.”.
N) A “Portucale - SGFTC, S.A.” estava sedeada no mesmo local onde a “Espírito Santo Activos Financeiros SGPS, S.A.” tinha a sua sede.
O) No dia 3 de Agosto de 2014, o Conselho de Administração do “Banco de Portugal” exarou «(…) Deliberação:
Considerando que: (…)
7. Os factos descritos nos números anteriores colocaram o Banco Espírito Santo,
SA, numa situação de risco sério e grave de incumprimento a curto prazo das suas obrigações e, em consequência, dos requisitos para a manutenção da autorização para o exercício da sua atividade, nos termos do nºs 1 e 3, alínea c) do artigo 145.º-C do Regime Geral das Instituições de Credito e Sociedades Financeiras (RGICSF), pelo que, não sendo tomada, com urgência, a medida de resolução ora adoptada, a instituição caminharia inevitavelmente para a suspensão de pagamentos e para a revogação da autorização nos termos do artigo 23.º do RGICSF, com a consequente entrada em processo de liquidação, o que representaria um enorme risco sistémico e uma séria ameaça para a estabilidade financeira.
8. Tal situação tomou imperativa e inadiável uma medida de defesa dos depositantes, de forma a evitar uma ameaça a segurança dos fundos
depositados. (…)
Estes dados comprovam o papel primordial desempenhado pelo Banco Espírito Santo, SA no domínio do financiamento à economia e, consequentemente, o significativo efeito sistémico que uma interrupção na prestação dos seus serviços financeiros poderia causar. (…)
11. Na falta de soluções imediatas viáveis de alienação da atividade do Banco Espírito Santo, SA, a outra instituição de crédito autorizada, a criação de um banco para o qual e transferida a totalidade da atividade prosseguida pelo Banco Espírito Santo, SA., bem como um conjunto dos seus ativos e passivos, elementos extrapatrimoniais e ativos sob gestão, revela-se como a única medida que garante a continuidade da prestação dos seus serviços financeiros e que permite isolar, em definitivo, o novo banco dos riscos criados pela exposição do Banco Espírito Santo, SA. a entidades do Grupo Espírito Santo.
12. O banco assim constituído, libertado da exposição que conduziu as perdas registadas nos resultados semestrais do Banco Espírito Santo, SA., bem como a uma acentuada desvalorização das suas ações em bolsa, permitirá aos seus depositantes manter um relacionamento estável com a sua instituição e a continuidade do acesso aos serviços por ela prestados. (…)
Ponto Um
Constituição do Novo Banco, SA
É constituído o Novo Banco, SA, ao abrigo do n.º 5 do artigo 145.º-G do Regime Geral das Instituições de Credito e Sociedades Financeiras, aprovado pelo Decreto-Lei n.º 298/92, de 31 de Dezembro (…).
Ponto Dois
Transferência para o Novo Banco, SA, de ativos, passivos, elementos extrapatrimoniais e ativos sob gestão do Banco Espirito Santo, SA
São transferidos para o Novo Banco, SA, nos termos e para os efeitos do disposto no n.º 1 do artigo 145.º-H do Regime Geral das do Regime Geral das Instituições de Credito e Sociedades Financeiras, aprovado pelo Decreto-Lei n.º 298/92, de 31 de Dezembro, conjugado com o artigo 17. º-A da Lei Orgânica do Banco de Portugal, os ativos, passivos, elementos extrapatrimoniais e ativos sob gestão do Banco Espirito Santo, SA, que constam dos Anexos 2 e 2A a presente deliberação.
(…)
Anexo 2 (…)
b) As responsabilidades do BES perante terceiros que constituam passivos ou elementos extrapatrimoniais deste serão transferidos na sua totalidade para o Novo Banco, SA, com excepção dos seguintes ("Passivos Excluidos"): (…)
(v) Quaisquer responsabilidades ou contingências decorrentes de dolo, fraude, violações de disposições regulatórias, penais ou contraordenacionais; (…)
No que concerne as responsabilidades do BES que não serão objeto de transferência, estes permanecerão na esfera jurídica do BES. (…)».
P) A 29 de Dezembro de 2015, o Conselho de Administração do “Banco de Portugal” exarou «(…) DELIBERAÇÃO: (…)
O Conselho de Administração do Banco de Portugal, ao abrigo da competência conferida pelo RGICSF para selecionar os ativos e passivos a transferir para o banco de transição e do disposto no n.º 2 do Anexo 2 da Deliberação de 3 de agosto, delibera o seguinte:
A) A subalínea (vii) da alínea (b) do n.º 1 do Anexo 2 passa a ter a seguinte redação:
“Quaisquer obrigações, garantias, responsabilidades ou contingências assumidas na comercialização, intermediação financeira, processo de contratação e distribuição de instrumentos financeiros emitidos por quaisquer entidades, sem prejuízo de eventuais créditos não subordinados, cuja posição devedora não seja
excluída por alguma das subalíneas anteriores, designadamente as subalíneas (iii) e (v), que (a) fossem exigíveis à data da medida de resolução em virtude de o respetivo prazo já se ter vencido ou, sendo os créditos condicionais, em virtude de a condição (desde que apenas desta dependesse o respetivo vencimento) já se ter verificado, e cumulativamente (b) resultassem de estipulações contratuais (negócios jurídicos bilaterais) anteriores a 30 de junho de 2014, que tenham cumprido as regras para a expressão da vontade e vinculação contratual do BES e cuja existência se possa comprovar documentalmente nos arquivos do BES, em termos que permitam o controlo e fiscalização das decisões tomadas.” (…)».
Q) A 29 de Dezembro de 2015, o Conselho de Administração do “Banco de Portugal” exarou «(…) DELIBERAÇÃO: (…)
O Conselho de Administração do Banco de Portugal, ao abrigo da competência conferida pelo RGICSF para selecionar os ativos e passivos a transferir para o banco de transição, delibera o seguinte:
A) Clarificar que, nos termos da alínea (b) do número 1 do Anexo 2 da deliberação de 3 de agosto, não foram transferidos do BES para o Novo Banco quaisquer passivos ou elementos extrapatrimoniais do BES que, às 20:00 horas do dia 3 de agosto de 2014, fossem contingentes ou desconhecidos (incluindo responsabilidades litigiosas relativas ao contencioso pendente e responsabilidades ou contingências decorrentes de fraude ou da violação de disposições ou determinações regulatórias, penais ou contraordenacionais), independentemente da sua natureza (fiscal, laboral, civil ou outra) e de se encontrarem ou não registadas na contabilidade do BES (…)».
R) Entre o terceiro trimestre de 2015 e o terceiro trimestre de 2019, o preço médio da habitação teve uma subida de 42,7%.
S) A “GNB Gestão de Ativos, Sociedade Gestora de Organismos de Investimento Coletivo, S.A.” é participada do Réu e deteve 4,96% do capital da “Patris - Sociedade Gestora de Fundos de Titularização de Créditos, S.A.”.
T) Em 16 de Agosto de 2019, a “Lusitano Mortgages No. 2 PLC” resgatou as obrigações referidas na alínea E).
U) Em 16 de Setembro de 2019, a “Lusitano Mortgages No. 2 PLC” resgatou as obrigações referidas na alínea J).
V) Em relatórios da “Tocha, Chaves & Associados, SROC, Lda.” remetidos à Autora pelo Réu em Setembro de 2020, fez-se constar que
«(…) Em 2019, o Novo Banco, S.A. (…), decidiu exercer o resgate antecipado dos créditos, previsto no contrato inicialmente celebrado, recomprando a carteira pelo valor do crédito vivo e vencido em dívida à data de 31 de Julho de 2019, acrescido de 962.217,93 euros (…) pelo dos créditos total dos writte-offs Mortgage Asset ascendendo a 161.415.544 euros (…) Em 2019, o Novo Banco, S.A. (…), decidiu exercer o resgate antecipado dos créditos, previsto no contrato inicialmente celebrado, recomprando a carteira pelo valor do crédito vivo e vencido em dívida à data de 31 de Julho de 2019, acrescido de 2.614.408,39 (…) pelo dos créditos total dos writte-offs Mortgage Asset ascendendo a 241.342.370,66 euros (…)».
W) Na ocasião referida na alínea V) o capital e juros respeitantes às obrigações das classes A a E referidas no escrito parcialmente reproduzido na alínea C) estavam integralmente pagos.
X) Na ocasião referida na alínea V) o capital e juros respeitantes às obrigações das classes A a D referidas no escrito parcialmente reproduzido na alínea G) estavam integralmente pagos.
Y) O valor nominal dos créditos “written-off” e dos créditos com prestações em atraso da carteira do fundo referido no escrito parcialmente reproduzido na alínea C) e mencionados no escrito parcialmente reproduzido na alínea V) ascendia a € 9.622.179.30.
Z) O valor nominal dos créditos “written-off” e dos créditos com prestações em atraso da carteira do fundo referido no escrito parcialmente reproduzido na alínea G) e mencionados no escrito parcialmente reproduzido na alínea V) ascendia a € 26.144.083.88.
AA) A “Lusitano Mortgages No. 2 PLC” e a “Lusitano Mortgages No. 3 PLC” foram liquidadas.
BB) Em 28 de Abril de 2023, o Réu recebeu uma notificação judicial avulsa por intermédio da qual os Autores lhe deram conta de que pretendiam exercer «(…) direito indemnizatório através do recurso de via judicial (…)».
CC) O Réu foi citado para a presente acção em 20 de Maio de 2024.
3-Ainda no despacho saneador, com relevo para o objecto deste recurso, foram proferidos os seguintes despachos:
“21.
Os Autores requereram que a “Patris - Sociedade Gestora de Fundos de Titularização de Créditos, S.A.” fosse notificada para juntar o contrato que manterá com a “Espirito Santo Activos Financeiros SGPS, S.A.”.
Observa-se, por um lado, que consta já de documento junto aos autos a alusão a esse contrato e ao seu teor em documento elaborado pela “Portucale - SGFTC, S.A.” e o Réu não negou a sua existência. Por outro lado, o invocado exercício efectivo da gestão daquela sociedade pelo Réu não é susceptível de ser demonstrado por via dessa junção, interessando antes apurar a materialidade dos pertinentes factos que se acham vertidos nos temas da prova.
Perfila-se assim a desnecessidade da diligência em questão, o que determina a rejeição desta pretensão (cfr. n.º 1 do artigo 436.º do mesmo diploma).
Pelo exposto, indefiro o requerimento em apreço.”
“22.
Os Autores requereram a notificação do Réu para juntar «(…) cópia das deliberações dos órgãos sociais do NOVO BANCO relativos à recompra dos créditos cedidos aos FUNDOS Lusitano Mortgages no. 2 e Lusitano Mortgages no. 3 e documentos de suporte a essa decisão, designadamente os pareceres, notas, avaliações e demais documentos internos que instruíram a decisão de recomprar os créditos e, designadamente, os documentos de onde conste o racional da decisão (…)», indicar «(…) quais os trabalhadores e administradores envolvidos no processo de decisão, preparação da decisão e execução da decisão de recompra dos créditos, com referência ao papel de cada um, para efeitos de futura notificação como testemunhas (…)», informar quem «(…) contactou da PATRIS ou das sociedades dos administradores ou funcionários da PATRIS e das sociedades Lusitano Mortgages no. 2 PLC e Lusitano Mortgages no. 3 PLC, no âmbito do processo de recompra das carteiras dos fundos Lusitano Mortgages no. 2 e Lusitano Mortgages no. 3 (…)» e indicar o «(…) valor e activos entretanto recuperados em créditos recomprados aos FUNDOS Lusitano Mortgages no. 2 e Lusitano Mortgages no. 3 que, à data da recompra, tinham prestações em atraso (overdue loans) ou tinham sido anulados (written-off – WO)».
O Réu opôs-se.
Como se sabe, a actividade instrutória deve ser orientada para factos concretos enunciados nos temas da prova (artigo 341.º do Código Civil e artigo 410.º do Código de Processo Civil).
Desse modo, analisemos em particular cada uma dessas pretensões.
Como decorre do elenco supra, é um dado adquirido que o Réu retomou os créditos cedidos aos fundos “Lusitano Mortgages No. 2” e “Lusitano Mortgages No. 3” pelos seus antecessores, interessando apenas averiguar se, em proveito próprio, o fez por um valor abaixo do valor de mercado dos mesmos e num contexto factual que configura a violação de disposições legais e contratuais. Daí que seja irrelevante obter os documentos que consubstanciam essa decisão - tanto mais que não se aventa que neles se espelhe aquela que, de acordo com os Autores, terá sido a real intenção do Réu, nem tal, de resto, seria plausível - ou determinar quem foram as pessoas concretas que nela intervieram.
Por seu turno, sendo conhecida/cognoscível a identidade dos membros do conselho de administração da “Patris - Sociedade Gestora de Fundos de Titularização de Créditos, S.A.” e os representantes da “Lusitano Mortgages No. 2 Plc” e “Lusitano Mortgages No. 3 Plc”, a demonstração dos factos vertidos nos temas da prova n.os 8 a 11 por via testemunhal não se pode considerar dependente da diligência em questão.
Por fim, observa-se que, na esteira do aventado na petição inicial, os temas da prova reflectem apenas o potencial de recuperação de créditos com base no histórico registado por cada um dos fundos. Não tendo, naquela sede, os Autores feito qualquer alusão à efectiva recuperação de valor/activos, é patente que a requisição dos elementos aludidos na parte final do requerimento não ostenta efectivo relevo probatório.
Nessa medida, não se divisa que requisição venha a revestir efectiva utilidade instrutória para a causa (n.º 2 do artigo 429.º do Código de Processo Civil).
Pelo exposto, indefiro o requerimento em apreço.”
***
4- Inconformados com esta decisão, dela interpuseram recurso os autores, formulando as seguintes CONCLUSÕES:
1. Na presente ação os AUTORES requereram, entre outras, três diligências importantes:
a) que o NOVO BANCO apresentasse documentos que fundamentaram a decisão de recompra dos créditos hipotecários aos fundos Lusitano Mortgages n.º 2 e n.º 3;
b) que a Patris apresentasse o contrato de gestão celebrado com a ESAF, para comprovar a gestão dos fundos por esta sociedade; e
c) que fossem discriminados os valores e ativos recuperados relativos aos créditos
recomprados, especialmente aqueles com prestações em atraso ou anulados.
2. Estas três diligências de prova foram rejeitadas, mas não deveriam ter sido porquanto, embora não sendo decisivas, não são impertinentes e, pelo contrário, são idóneas para provar os factos alegados.
3. Como refere o acórdão da Relação de Guimarães, de 20.10.2011 (processo n.º 3361.0TBBCL- B.G1: «uma diligência de prova só pode considerar-se impertinente se não for idónea para provar o facto que com ela se pretende provar, se o facto se encontrar já provado por qualquer outra forma ou se carecer de todo de relevância para a decisão da causa».
4. Assim, e em primeiro lugar, relativamente às deliberações de recompra dos créditos e
respetivos documentos de suporte, a verdade é que tais documentos devem refletir a análise do valor de recompra em comparação com o valor de mercado dos créditos.
5. Não se crê possível que uma instituição recomprasse créditos por um determinado preço, assumindo risco, sem comparar o preço de compra o valor de mercado dos créditos.
6. Nos termos do Aviso 5/2008, os bancos devem «recolher e manter toda a informação de suporte à decisão e que documenta de forma objetiva as decisões tomadas», incluindo a «informação financeira e de gestão, completa, pertinente, fiável e tempestiva (objetivos de informação), que suporte as tomadas de decisão».
7. Além do mais, tais documentos também deveriam esclarecer como surgiu a oportunidade de recompra.
8. Sendo certo que tais documentos podem não espelhar a real intenção do RÉU, pelo menos deveriam fazê-lo, já que é suposto, por lei, que as decisões tomadas sejam suportadas de forma objetiva.
9. Por conseguinte, o meio de prova é idóneo e não deveria ter sido rejeitado.
10. Em segundo lugar, os AUTORES alegaram que o NOVO BANCO controlava os fundos através da ESAF, sendo este controlo exercido por meio de um contrato de gestão celebrado entre a ESAF e a Portucale (anterior Patris), conforme consta da página 23 do Relatório e Contas da Portucale de 2010.
11. Ao contrário do entendimento do Tribunal recorrido, o contrato de gestão é o meio de prova mais adequado – e, por conseguinte, idóneo – para demonstrar a amplitude dos poderes de gestão conferidos à ESAF sobre a Portucale.
12. De facto, o aludido contrato de gestão é um documento de evidente relevância para provar a extensão dos poderes de gestão atribuídos e, por conseguinte, o controlo efetivo exercido pelo NOVO BANCO.
13. Aliás, não existe outro meio de prova tão direto e adequado para demonstrar o controlo exercido pelo NOVO BANCO sobre a Portucale (e Patris), pelo que o mesmo deveria ter sido admitido.
14. Por último, sem prejuízo de os AUTORES não terem alegado expressamente a efetiva
recuperação de valor dos créditos remanescentes LM-2 e LM-3, os mesmos alegaram que
estes créditos, mesmo não produtivos, possuem um valor de mercado relevante, estimado
entre 50% a 60% do seu valor nominal.
15. O despacho recorrido entende que, uma vez não ter sido alegada a efetiva recuperação de valor/ativos, a requisição de elementos sobre créditos recuperados não tem relevo probatório para os factos em discussão.
16. Todavia, a verdade é que a efetiva recuperação de créditos, embora seja um acontecimento futuro em relação ao momento relevante, demonstra que esses créditos tinham valor intrínseco, fornecendo indícios importantes sobre o valor de mercado à data relevante.
17. De facto, a informação sobre a recuperação de créditos é relevante e idónea para a demonstração do valor de mercado dos créditos à data relevante, não sendo impertinente.
18. Além do mais, a referida prova foi requerida ao próprio NOVO BANCO, que detém e pode facilmente disponibilizar essa informação, tornando o meio de prova útil, pertinente e de fácil obtenção para o processo.
19. O tribunal deveria, assim, nos termos do disposto no artigo 410.º do CPC, ter ordenado as diligências probatórias requeridas, desse modo respeitando o direito dos AUTORES à prova – direito esse que é, desde logo, uma concretização do direito fundamental de acesso ao direito e tutela jurisdicional efetiva previsto no artigo 20.º da Constituição.
Termos em que deve o recurso ser julgado procedente, e, em consequência, ser o despacho saneador parcialmente revogado, na parte em que indeferiu os meios de prova referidos nas alíneas a), b) e c) do supra artigo 20.º, ordenando-se a produção da prova ali requerida.
***
5- O réu contra-alegou, pugnado pela improcedência do recurso, apresentando as seguintes CONCLUSÕES:
A. Os meios de prova requeridos pela CRC – e que foram indeferidos pelo Tribunal a quo no Despacho Saneador e que são objeto do presente recurso – são desnecessários e irrelevantes para a boa decisão da causa e demonstram que aquilo que a CRC pretende é levar a cabo diligências de indagação de uma factualidade que julga existir.
B. A CRC procurar tomar conhecimento de factualidade nova que lhe venha a permitir completar e/ou aperfeiçoar a sua alegação inicial, facto que a própria admite nas suas alegações de recurso.
C. A CRC requereu que o Novo Banco fosse notificado para juntar aos autos uma cópia das deliberações dos respetivos órgãos sociais e correspondentes documentos de suporte de onde constasse a decisão do Novo Banco de recompra dos créditos cedidos às Emitentes.
D. Quanto a este pedido, a CRC não cumpriu o ónus que sobre ela impendia, nos termos e para os efeitos do disposto no artigo 429.º, n.º 1, do CPC.
E. A CRC não identificou (e parece nem sequer conhecer) os documentos que concretamente pretende que o Novo Banco venha juntar ao processo: não identifica os órgãos sociais em causa e alude, vaga e genericamente, a documentos de suporte, listando, a título meramente exemplificativo, uma vasta lista de documentos potencialmente relevantes.
F. A CRC também não especificou os factos que pretende provar com aqueles documentos, limitando-se a remeter – a título meramente exemplificativo – para alguns artigos da sua petição inicial sem providenciar qualquer contexto que pudesse justificar a necessidade e pertinência dos documentos cuja junção requereu.
G. Não existe factualidade controvertida que pudesse ser esclarecida com recurso a tais documentos.
H. A CRC não sabe se tais documentos existem, não sabe se os documentos refletem o racional de recompra dos créditos, se tal racional inclui o valor ou não, se tais documentos refletem como surgiu a oportunidade de recompra.
I. Cabe à CRC, nos termos do artigo 342.º do Código Civil, o ónus de fazer prova dos factos constitutivos dos direitos cuja tutela reclama na presente ação judicial.
J. Os pedidos de informação e/ou documentação à contraparte (ou terceiros) não podem servir o propósito de efetuar diligências investigatórias que visam obter informações adicionais com vista a alegar factos desconhecidos da CRC aquando da propositura da ação, naquilo que constituiria numa transmutação da presente ação declarativa num processo impróprio de inquérito judicial.
K. O pedido de junção das deliberações dos órgãos sociais do Novo Banco e respetivos documentos de suporte (ainda que a CRC não identifique quais) não tem qualquer pertinência para a decisão da causa, já que o que se pretende apurar, nos termos dos temas da prova definidos, é se o Novo Banco adquiriu abaixo do valor de mercado, em proveito próprio e em violação de disposições legais ou contratuais, os créditos que haviam sido cedidos aos Fundos LM2 e LM3 pelos então BIC e BES e não qual seria o racional do Novo Banco na tomada da decisão de recompra.
L. A CRC também não cumpriu os requisitos previstos no artigo 432.º ex vi 429.º do CPC a respeito do seu pedido de junção, pela Patris, do contrato de prestação de serviços (contrato de gestão) celebrado entre esta e a ESAF.
M. A CRC não identificou os factos relativamente aos quais pretende fazer prova, limitando-se a remeter exemplificativamente para artigos da petição inicial sem apresentar qualquer contexto ou justificação quanto à pertinência e necessidade do que requereu.
N. A existência de um contrato de prestação de serviços entre a Patris e a ESAF não é um facto controvertido nos autos, conforme decorre do alegado pelo Novo Banco no capítulo III.D(iv) da contestação, pelo que não carece de prova (cf. artigo 410.º do CPC).
O. O contrato de gestão em causa foi celebrado entre a Patris e a ESAF, o que significa que mesmo que o Novo Banco exercesse a gestão efetiva da Patris por intermédio da sua participação no capital social na ESAF (e não exercia), nunca tal facto seria suscetível de ser demonstrado através da junção do contrato de gestão, por dizer respeito a uma putativa gestão indireta.
P. No que respeita ao pedido de esclarecimentos a dirigir ao Novo Banco para prova do valor de mercado dos créditos remanescentes do LM2 e LM3, a configuração da ação não levou em consideração quaisquer dados relativos à recuperação efetiva dos créditos, pelo que, mesmo que em tese se pudesse admitir a pertinência da obtenção da informação requerida (sem conceder), essa informação de nada serviria para corroborar a alegação da CRC.
Q. A CRC não fez qualquer alusão na sua petição inicial à efetiva recuperação de valor/ ativos, pelo que o requerido pela CRC não tem relevo probatório.
R. A tese da CRC na ação assenta num cenário de potencial de recuperação e não num cenário de recuperação efetiva.
S. O pedido da CRC extravasa o âmbito de aplicação do artigo 429.º do CPC, por implicar a preparação de um conjunto de informações tendentes a responder àquele pedido.
Termos em que, com o douto suprimento de V. Exas., deve o presente recurso ser julgado totalmente improcedente e confirmada a decisão proferida pelo Tribunal a quo.
***
II-FUNDAMENTAÇÃO.
1-Objecto do Recurso.
1-É sabido que o objecto do recurso é balizado pelo teor do requerimento de interposição (artº 635º nº 2 do CPC) pelas conclusões (artºs 635º nº 4, 639º nº 1 e 640º do CPC) pelas questões suscitadas pelo recorrido nas contra-alegações em oposição àquelas, ou por ampliação (artº 636º CPC) e sem embargo de eventual recurso subordinado (artº 633º CPC) e, ainda pelas questões de conhecimento oficioso cuja apreciação ainda não se mostre precludida.
Assim, em face das conclusões apresentadas pelos recorrentes, é a seguinte a questão que importa analisar e decidir:
-Se há fundamento para revogar o despacho sob impugnação em termos de deferir os meios de prova solicitados pelos apelantes.
***
2- Matéria de Facto.
Com relevo para a apreciação e decisão da questão objecto do recurso, importa considerar a factualidade referida no RELATÓRIO supra.
***
3- A Questão Enunciada: se há fundamento para revogar o despacho sob impugnação em termos de deferir os meios de prova solicitados pelos apelantes.
Os apelantes entendem que os meios de prova que solicitaram, e estão em causa neste recurso, de junção de documentos, em poder da parte contrária e, documentos em poder de terceiro, devem ser deferidos, concretamente:
a)-A notificação do réu para juntar aos autos cópia das deliberações dos seus órgãos sociais relativos à decisão de recompra dos créditos cedidos aos Fundos LM2 e LM3 e, os documentos que suportaram essa decisão incluindo onde conste o racional dessas decisão; invocam que essa junção se destina a provar o que alegou nos pontos 50, 51, 52 e 53 da petição inicial (p.i.), designadamente que na base da decisão de recompra dos créditos aos Fundos de Titularização, não existiu qualquer racional para os Fundos revenderem os créditos pelos preços por que o fizeram; que essas deliberações e documentos de suporte devem revelar o valor de mercado que o réu atribuiu às carteiras, a intenção do réu com a recompra e, o controlo dos Fundos.
b)- A notificação da Patris para juntar cópia do contrato de gestão celebrado com a ESAF; junção essa, para prova dos pontos 197, 198 e 203 da p.i e, demonstração do efectivo exercício da gestão de facto da Patris pelo réu através da ESAF;
c)- Para prova do valor de mercado dos Créditos Remanescentes LM2 e LM3, a notificação do réu para indicar, discriminadamente, o valor e activos entretanto recuperados em créditos recomprados aos Fundos LM2 e LM3 e, que à data da recompra, tinham prestações em atraso, ou tinham sido anulados; junção para prova dos factos alegados nos pontos 311 a 365 da p.i., para permitir a determinação do seu valor e fornecer indícios sobre o valor de mercado.
O réu defende que os documentos pretendidos pelos autores são irrelevantes e desnecessários e, que a verdadeira finalidade dessa junção reside na intenção de os autores realizarem diligências de indagação com vista a aperfeiçoarem e complementarem a sua alegação com factos novos. Além de os autores não cumprirem os ónus que o artº 429º nº 1 do CPC lhes impõe, visto que não identificaram, minimamente, os documentos cuja junção requerem, nem especificam os concretos factos que pretendem provar, dado que os referem exemplificativamente.
A 1ª instância, indeferiu a requerida notificação do réu para junção de documentos fundamentando que: “Como se sabe, a actividade instrutória deve ser orientada para factos concretos enunciados nos temas da prova (artigo 341.º do Código Civil e artigo 410.º do Código de Processo Civil).
Desse modo, analisemos em particular cada uma dessas pretensões.
Como decorre do elenco supra, é um dado adquirido que o Réu retomou os créditos cedidos aos fundos “Lusitano Mortgages No. 2” e “Lusitano Mortgages No. 3” pelos seus antecessores, interessando apenas averiguar se, em proveito próprio, o fez por um valor abaixo do valor de mercado dos mesmos e num contexto factual que configura a violação de disposições legais e contratuais. Daí que seja irrelevante obter os documentos que consubstanciam essa decisão - tanto mais que não se aventa que neles se espelhe aquela que, de acordo com os Autores, terá sido a real intenção do Réu, nem tal, de resto, seria plausível - ou determinar quem foram as pessoas concretas que nela intervieram.
Por seu turno, sendo conhecida/cognoscível a identidade dos membros do conselho de administração da “Patris - Sociedade Gestora de Fundos de Titularização de Créditos, S.A.” e os representantes da “Lusitano Mortgages No. 2 Plc” e “Lusitano Mortgages No. 3 Plc”, a demonstração dos factos vertidos nos temas da prova n.os 8 a 11 por via testemunhal não se pode considerar dependente da diligência em questão.
Por fim, observa-se que, na esteira do aventado na petição inicial, os temas da prova reflectem apenas o potencial de recuperação de créditos com base no histórico registado por cada um dos fundos. Não tendo, naquela sede, os Autores feito qualquer alusão à efectiva recuperação de valor/activos, é patente que a requisição dos elementos aludidos na parte final do requerimento não ostenta efectivo relevo probatório.
Nessa medida, não se divisa que requisição venha a revestir efectiva utilidade instrutória para a causa (n.º 2 do artigo 429.º do Código de Processo Civil)”.
E mais fundamentou, a 1ª instância, a sua decisão quanto ao indeferimento da pretensão de notificação a Patris, escrevendo: “Os Autores requereram que a “Patris - Sociedade Gestora de Fundos de Titularização de Créditos, S.A.” fosse notificada para juntar o contrato que manterá com a “Espirito Santo Activos Financeiros SGPS, S.A.”.
Observa-se, por um lado, que consta já de documento junto aos autos a alusão a esse contrato e ao seu teor em documento elaborado pela “Portucale - SGFTC, S.A.” e o Réu não negou a sua existência. Por outro lado, o invocado exercício efectivo da gestão daquela sociedade pelo Réu não é susceptível de ser demonstrado por via dessa junção, interessando antes apurar a materialidade dos pertinentes factos que se acham vertidos nos temas da prova.
Perfila-se assim a desnecessidade da diligência em questão, o que determina a rejeição desta pretensão (cfr. n.º 1 do artigo 436.º do mesmo diploma).
Pelo exposto, indefiro o requerimento em apreço.”
Vejamos, então, se pode ser dada razão aos autores.
Pois bem, em matéria de dogmática básica da “Prova” em Processo Civil, é conhecida a dicotomia “Questão de Direito” e “Questão de Facto”. A questão de direito resolve-se por consulta dos textos legais para permitir encontrar a solução correcta do caso. A questão de facto, por sua banda, exige investigação com vista a determinar uma solução ou resposta fáctica verdadeira.
Porém, a investigação dos factos não é uma actividade de investigação livre, antes “…é uma actividade de investigação limitada e restrita a saber se certos factos são verdadeiros. A investigação processual não se destina à aquisição de conhecimentos sobre novas realidades, mas antes à demonstração da verdade de factos já alegados em juízo e que apenas importa confirmar…” (Castro Mendes/Teixeira de Sousa, Manual de Processo Civil, Vol. I, AAFDL, 2022, pág. 467).
E continuando a seguir a lição destes Autores “A prova judicial destina-se a formar a convicção do juiz sobre a verdade de um facto, mas nem toda a prova é relevante para a demonstração dessa verdade e nem toda a prova deve ser admitida para a demonstração daquela verdade. Pode assim concluir-se que a prova tem dois valores específicos: a relevância e a admissibilidade.” (AA e ob. cit., pág. 469).
Interessa-nos a relevância.
Um meio de prova relevante é aquele que permite a formação da convicção sobre o facto probando. Por isso, a relevância da prova é um conceito relacional: a prova diz-se relevante ou irrelevante em relação a um certo facto probando.
Por outro lado, importa salientar que a relevância da prova não deve ser confundida com a relevância do facto probando para a decisão da causa. A prova pode ser relevante para a prova de um facto probando, mas ser completamente irrelevante para a decisão da causa.
A prova irrelevante não deve ser produzida em juízo. A irrelevância da prova é um desvalor jurídico que justifica a sua não aceitação pelo tribunal.” (Castro Mendes/Teixeira de Sousa, Manual de Processo…cit., pág. 470). * (sublinhado nosso).
Em cada processo é, rectius, só pode ser objecto de prova, um número limitado de factos que se encontram circunscritos pelos temas de prova; ou seja, só devem ser objecto da prova os factos pertinentes, isto é, factos que interessam à solução do pleito e que estão incluídos nos temas de prova, como decorre dos artºs 410º e 596º nº 1 do CPC. O mesmo é dizer: “…o objecto da prova são os factos que constam dos temas da prova”. (Castro Mendes/Teixeira de Sousa, Manual de Processo…cit., pág. 471). * (sublinhado nosso).
A esta conclusão acresce a circunstância de, fixados os temas de prova, o juiz poder/dever impedir a produção de meios de prova irrelevantes, que repute inúteis, recusando o que for impertinente ou meramente dilatório (artº 6º nº 1), como sucede com a junção de documentos inúteis (artº 443º nº 1 CPC) e que se destinem a provar factos irrelevantes, rectius, que não constem dos temas de prova. (artº 429º nº 2 do CPC).
Destas considerações decorre que as provas apresentadas ou requeridas pela parte devem ser recusadas pelo juiz se forem impertinentes, ou seja, a irrelevância destes meios de prova para os temas da prova, designadamente a prova por documentos (artº 443º nº 1 do CPC). Este preceito, de resto, regula o dever de o juiz controlar a pertinência e a necessidade dos documentos. O documento é impertinente quando o facto pretendido demonstrar não for relevante para a apreciação e decisão da causa. Ou seja, quando o facto pretendido demonstrar não integra os temas de prova.
Este entendimento, além da doutrina, tem aceitação na jurisprudência, como o ilustra o acórdão do TRP (de 04/04/2024, Proc. 17171/21, Ana Luísa Loureiro), com o seguinte sumário:
I - O direito à prova desenvolve-se dentro dos limites da sua necessidade e pertinência: só são admitidos os documentos pertinentes para prova de factos relevantes para a decisão a proferir, sendo que, no âmbito do regime previsto no art. 432.º do Cód. Proc. Civil, a apresentação de documentos em poder de terceiro pressupõe ainda o preenchimento das exigências previstas no art. 429.º, ex vi art. 432.º, ambos do Cód. Proc. Civil, ou seja:
a) que sejam documentos em poder de terceiro que a própria parte não consiga obter;
b) a identificação do concreto documento cuja junção se pretende obter;
c) a indicação dos concretos factos que com tal documento se pretende provar (ou efetuar contraprova).
III - A instrução do processo visa produzir prova de factos afirmados pela(s) parte(s) e negados por falsos pela parte contrária ou desconhecidos desta, sem obrigação de os conhecer. O processo civil declarativo não é um processo de inquérito, não se destinando à descoberta de factos hipotéticos desconhecidos pela parte, mas sim à prova de factos (positivos ou negativos) por esta conhecidos, e pela mesma claramente afirmados (alegados) – desconhecidos, isso sim, pelo tribunal: daí a necessidade de produção de prova sobre tais factos.
IV - Atenta a subordinação do direito à prova à finalidade que o exercício de tal direito visa satisfazer – pertinência do meio de prova requerido para a prova de factos relevantes para a decisão a proferir –, a necessidade de preenchimento dos requisitos previstos no art. 429.º, ex vi art. 432.º, ambos do Cód. Proc. Civil, não limita qualquer direito de defesa nem o direito à prova. O direito à prova incluído na previsão legal do art. 20.º da CRP é o direito à prova nos termos, meios e para as finalidades, no caso, previstas no Cód. Proc. Civil.”
Feitas estas considerações, voltemos ao caso dos autos.
Assim:
Quanto à pretendida notificação da Patris para juntar cópia do contrato de prestação de serviços entre a ESAF e a Portucale, alegadamente com vista à demonstração do efectivo exercício da gestão de facto da Patris, pelo réu, através da ESAF.
Como salienta/fundamenta a 1ª instância para indeferir esta pretensão de notificação à Patris, por um lado, já consta de documento junto aos autos a alusão ao contrato de gestão e ao seu teor - conforme documento nº 40 junto com a petição inicial; além disso, o réu não contestou a existência desse contrato entre a ESAF e a Patris; e, acrescenta (na fundamentação do ponto 22 do saneador), que o suposto exercício efetivo da gestão de facto da Patris pelo Novo Banco não é suscetível de ser demonstrado pela junção daquele documento; por último, acrescentou (na fundamentação do ponto 22 do saneador) ser apenas relevante apurar a materialidade dos pertinentes factos que se mostrem vertidos nos temas da prova.
Pois bem, concordamos com a decisão e fundamentação da 1ª instância quanto a este indeferimento da notificação à Patris.
Na verdade, sem qualquer sombra de dúvida, que a existência de contrato de prestação de serviços entre a ESAF e a Patris não constitui matéria controvertida nestes autos. E, como se disse acima, fixados os temas de prova, o juiz pode/deve impedir a produção de meios de prova irrelevantes, que repute inúteis, recusando o que for impertinente ou meramente dilatório (artº 6º nº 1), como sucede com a junção de documentos inúteis (artº 443º nº 1 CPC) e que se destinem a provar factos irrelevantes, rectius, que não constem dos temas de prova. (artº 429º nº 2 do CPC).
Tanto bastaria para manter a decisão da 1ª instância de indeferir a notificação da Patris para juntar cópia do contrato de prestação de serviços ente esta e a ESAF.
Acrescenta-se que, igualmente, se concorda com a 1ª instância quando invoca o argumento de a junção do contrato celebrado entre a ESAF e a Patris não ter a virtualidade de demonstrar os concretos actos de gestão que terão sido praticados. Com efeito, uma coisa são as estipulações contratuais e, coisa diversa, são os concretos actos de gestão praticados, com eventuais desvios, ou não, às estipulações contratuais. A esta vista, o contrato não provaria os concretos actos de gestão praticados nem o controlo da Patris pelo réu.
Em suma, mantém-se a decisão da 1ª instância de indeferimento na notificação à Patris.
Quanto à notificação do réu para juntar cópias das deliberações dos seus órgãos sociais acerca da decisão de recompra dos créditos cedidos aos Fundos LM2 e LM3 e, dos documentos onde conste o racional dessa decisão, para, alegadamente, demonstrarem qual a intenção que esteve na base da decisão de recompra dos créditos aos Fundos de Titularização, e demonstrarem o valor de mercado que o réu atribuiu às carteiras.
Como vimos, a 1ª instância, decidiu pelo indeferimento desse pedido de junção, fundamentando ser um dado adquirido (nos autos) que o réu retomou os créditos cedidos aos fundos pelos seus antecessores, interessando apenas averiguar se o fez em proveito próprio, por um valor abaixo do valor de mercado e, se em violação de disposições legais e contratuais; e acrescentou que a actividade instrutória deve ser orientada para factos concretos enunciados nos temas da prova; acrescentando, ainda, ser irrelevante obter os documentos que consubstanciam essa decisão, até porque neles não se espelhará qual terá sido a intenção do réu.
Pois bem, mais uma vez somos a entender que deve ser mantida a decisão da 1ª instância.
Na verdade, conforme já acima dissemos e ora se reitera, fixados os temas de prova, o juiz pode/deve impedir a produção de meios de prova irrelevantes, recusando a junção de documentos inúteis (artº 443º nº 1 CPC) e que se destinem a provar factos irrelevantes, rectius, que não constem dos temas de prova (artº 429º nº 2 do CPC). No caso, a intenção do réu com a retoma, não faz parte da factualidade constante dos temas de prova e, como salienta a 1ª instância, apenas interessa que se apure se a retoma foi feita por um valor inferior ao do valor de mercado contrariando a lei e estipulações contratuais.
Tanto bastaria para manter a decisão de indeferimento da 1ª instância.
A esse argumento acresce um outro: no ponto 18 do despacho saneador, foi deferida a notificação da Patris para juntar cópia das deliberações de liquidar os fundos LM2 e LM3 e de retransmitir ao Réu os créditos remanescentes e, os documentos de suporte dessas decisões, designadamente os pareceres, notas, avaliações e demais documentos internos que instruíram as decisões.
A esta vista, por serem irrelevantes e inúteis para o apuramento da verdade relevante em discussão nos autos, mantém-se a decisão que indeferiu a notificação do réu para juntar deliberações dos seus órgãos de gestão acerca da decisão da retoma dos créditos cedidos aos Fundos LM2 e LM3 e, dos documentos onde conste o racional dessa decisão.
Quanto ao indeferimento da notificação ao réu para indicar, discriminadamente, o valor dos activos, entretanto recuperados nos créditos retomados aos Fundos (LM2 e LM3) que, à data da recompra tinham prestações em atraso ou sido anulados, com vista a permitir a determinação do valor de mercado dos créditos remanescentes e fornecer indícios sobre o valor de mercado.
A 1ª instância, indeferiu esta pretensão de prova dos autores, fundamentando que na sequência do alegado na petição inicial, os temas de prova refletem, apenas, o potencial de recuperação de créditos com base no histórico registado por cada um dos fundos, não tendo os autores alegado, na petição inicial, a efectiva recuperação dos valores/activos e, por isso, é patente que a requisição dos elementos aludidos na parte final do requerimento não tem efetivo relevo probatório.
Ou seja, a 1ª instância indeferiu a produção deste meio de prova por os elementos pretendidos pelos autores não permitirem a demonstração do que alegaram na petição inicial: uma potencial recuperação dos créditos, como foi levado aos temas de prova; sendo que, esses elementos pretendidos juntar se reportariam à demonstração de uma recuperação efectica dos créditos. E remata, a 1ª instância, a sua decisão de indeferimento desse meio de prova salientando que a pretendida requisição não revestiria efectiva utilidade instrutória para a causa.
Pois bem, mais uma vez se concorda com a decisão da 1ª instância e com os fundamentos que utiliza.
Na verdade, basta atentar que a factualidade pretendida demonstrar não consta dos temas de prova e, por isso, não é susceptível de produção de prova porque seria irrelevante e, por isso, inútil.
Tanto basta para manter a decisão da 1ª instância quanto ao indeferimento da notificação do réu para discriminar o valor de mercado dos créditos remanescente.
Em face do que se expôs, conclui-se pela improcedência do recurso.
Finalmente, quanto a custas nesta instância de recurso.
Apesar da complexidade do tema em discussão nos autos, as questões que se colocam neste recurso são de menor complexidade e resumem-se a matéria de direito processual probatório. Por isso, apesar do valor da acção (24 206 160,08€), entendemos não se justificar o pagamento de taxa de justiça remanescente além da taxa de justiça correspondente a causas de 275 000€.
***
III-DECISÃO.
Em face do exposto, acordam os juízes que compõem este colectivo da 6ª Secção Cível do Tribunal da Relação de Lisboa, julgar o recurso improcedente e, por consequência, confirmam a decisão impugnada.
Custas, nesta instância de recurso, pelos autores apelantes, dispensando-se o pagamento do remanescente da taxa de justiça além da taxa correspondente a causas de 275 000€.

Lisboa, 30/10/2025
Adeodato Brotas
Maria Teresa F. Mascarenhas Garcia
Vera Antunes