Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa | |||
Processo: |
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Relator: | ANA PAULA A. A. CARVALHO | ||
Descritores: | ACÇÃO DE DEMARCAÇÃO PRÉDIOS CONFINANTES SUBSIDIARIEDADE SUCESSIVA | ||
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Nº do Documento: | RL | ||
Data do Acordão: | 10/11/2018 | ||
Votação: | UNANIMIDADE | ||
Texto Integral: | S | ||
Texto Parcial: | N | ||
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Meio Processual: | APELAÇÃO | ||
Decisão: | IMPROCEDENTE | ||
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Sumário: | I – Numa acção de demarcação, o litígio circunscreve-se à localização da linha de separação entre os prédios confinantes, que deve ser resolvida nos termos de subsidiariedade sucessiva prevista no artigo 1354º do C.C. II – Provando-se o local preciso onde se situam as estremas do prédio dos autores e dos réus, não se aplica o critério preconizado no último segmento do nº 2 do preceito citado. | ||
Decisão Texto Parcial: | ![]() | ||
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Decisão Texto Integral: | Acordam na 6ª Seção do Tribunal da Relação de Lisboa: RELATÓRIO JC… e mulher MI…, residentes na Rua …, n.º …, ..º Dto., Damaia, Amadora; Intentaram a presente ação declarativa sob a forma de processo sumário, contra: 1. ÂJ… e mulher HT…, residentes no Caminho …, n.º …, Cortesia, S. João das Lampas, Sintra; 2. ED…, residente na Rua …, n.º …, Assafora, Sintra; 3. ED..., residente na Rua …, n.º …, Assafora, Sintra; 4. LD…, residente na Rua …, n.º …, Cortezia, Sintra. Alegam os AA., em síntese, que são donos e legítimos proprietários do prédio que identificam, o qual foi destacado do artigo …º da secção … da correspondente matriz cadastral; que os RR. são proprietários e legítimos possuidores do prédio inscrito na matriz cadastral sob o artigo …º da secção …, tendo já sido proferida sentença confirmada por acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa a condenar os RR. a reconhecerem que os AA. são titulares do direito de propriedade relativamente ao prédio identificado. Mais alegam que o prédio dos AA. confronta a norte com o prédio com o artigo …º e que, entre o prédio … dos AA. e o …, existe e sempre existiu uma faixa de terreno com cerca de 3 metros de largura, direcionada de nascente para poente, que desde há mais de 40 anos até outubro de 1994 funcionou como caminho de pé e carro de bois para os possuidores dos prédios identificados e de outros, e cuja entrada estava assinalada há muitos anos por um poste de pedra colocado na estrema norte do prédio … e um marco de pedra do lado oposto, na estrema do prédio …. Alegam ainda que, em finais de 1989/princípios de 1990, o A. colocou junto aos marcos de pedra referidos, estacas de madeira no alinhamento, em reta, definido pelos 3 marcos de pedra, sendo que, passado algum tempo, o poste de pedra que assinalava a entrada da faixa de terreno em causa, situado na estrema Norte do prédio … dos AA. foi arrancado, tendo os RR., em outubro de 1994, colocado um outro poste de cimento desviado mais de 1 metro para dentro da estrema norte do prédio …, vedado o acesso à faixa com pedregulhos e ainda uma corrente e um cadeado que prenderam aos postes, impedindo assim os AA. de acederem ao seu terreno pela referida faixa. Alegam também que os RR., nos últimos 2 anos, têm continuado a usurpar terreno ao prédio dos AA. e, ultimamente, têm vindo a proceder da mesma forma quanto à estrema sul do prédio …, removendo a terra e a vegetação muito para além do poste que implantaram em outubro de 1994, alargando assim a entrada da passagem que mede agora cerca de 5 metros. Alegam ainda os AA. que são os únicos que têm no seu prédio uma casa de habitação e que sentem falta de segurança por não poderem murar ou sequer vedar o seu prédio na confrontação noroeste da sua propriedade, junto à faixa de terreno. Concluem peticionando a condenação dos RR. a verem implantados marcos por peritos a nomear que definam rigorosamente a estrema norte do prédio dos AA. por forma a que tais marcos definam também rigorosamente a linha divisória entre o prédio dos AA. e o prédio com que este confronta a norte nos termos da carta cadastral e dos factos M) e O) dados como provados na sentença proferida no processo n.º …/… que correu termos pelo 1º Juízo Cível do Tribunal de Sintra; a respeitarem as estremas e as linhas divisórias que ficarem judicialmente definidas, bem como o prédio dos AA., abstendo-se de atentar contra ele, implantando-lhe abusivamente pilares, roubando-lhes terreno, revolvendo-lhes a terra e a vegetação, ou de por qualquer forma o violar; a pagarem, cada um deles, uma sanção pecuniária compulsória de valor nunca inferior a €250,00 (duzentos e cinquenta euros) por cada dia que violem a sentença que estes autos venham a merecer; a retirarem a corrente e o cadeado com que vedaram abusivamente a faixa de terreno que desde há mais de 40 anos até outubro de 1994 vinha servindo de caminho para o prédio … dos AA.; a removerem os pedregulhos que ali colocaram para dificultar o acesso dos AA. ao seu prédio e a coloca-los à direita, onde estiveram sempre; a pagarem aos AA. uma indemnização no valor de €5.000,00 (cinco mil euros) a título de danos não patrimoniais de €10.000,00 (dez mil euros) por danos patrimoniais por todos os prejuízos que lhes causaram ao longo de todos estes anos. Na contestação, os RR. aduzem, em síntese, que o anterior processo judicial que identificam e referido pelos AA. faz caso julgado material quanto ao direito de propriedade dos AA. sobre a faixa de terreno em causa nos presentes autos, no sentido em que a mesma não é sua. Excecionam ainda a falta de interesse processual ou interesse em agir dos AA., na medida em que uma ação de demarcação pressupõe a incerteza ou dúvida sobre a linha divisória entre dois prédios contíguos, por falta de sinais visíveis e permanentes que definam as respetivas estremas, sendo que resulta da petição inicial a existência desses sinais. Mais alegam que os AA., há cerca de 20 anos, sem autorização dos RR., fizeram uma vedação com paus e arames, invadindo o prédio dos RR., tendo então os RR. colocado 2 pilares com 3 metros entre si no inicio da faixa de terreno, ligados por uma corrente, sendo falso tudo mais alegado pelos AA.. Contrapõem também os RR. que a sanção pecuniária compulsória é restrita às obrigações de facto infungíveis e não aplicável ao caso, sendo que peticionaram uma indemnização por danos não patrimoniais e patrimoniais e não os factualizam ou quantificam parcelarmente a sua origem, não estando igualmente alegados os pressupostos da responsabilidade civil. Concluem pela procedência da exceção alegada e absolvição dos RR. da instância, ou, caso assim não se entenda, que se proceda à demarcação requerida atendendo-se ao alegado na contestação. Na resposta, os AA. pugnam pela improcedência da exceção invocada, concluindo no mais como na petição inicial. Na pendência da ação faleceu a R. EM…, tendo-se procedido à habilitação dos respetivos herdeiros, os quais eram já primitivos RR. na presente ação. Procedeu-se à realização de audiência prévia, no âmbito da qual as partes acordaram em dar como assente que “a faixa de terreno do caminho pertence ao prédio dos RR.”, ficando prejudicadas a questão da eventual ilegitimidade dos RR., bem como da existência de eventual caso julgado. Realizou-se a audiência de discussão e julgamento com inteiro respeito pelo legal formalismo e foi elaborada a sentença com o seguinte dispositivo: «Em face do exposto, vistas as já indicadas normas jurídicas e os princípios expostos, o tribunal julga a ação parcialmente procedente, e nessa sequência: 1. Determina-se a implantação de marcos, por perito, de acordo com as estremas fixadas no relatório de fls. 276 a 292 dos presentes autos; 2. Absolvem-se os RR. de tudo o mais peticionado. * Fixa-se o valor da ação em €15.100,00 (quinze mil e cem euros), cfr. art. 306º do C.P.C.. * Custas pelos AA.. – art. 527º do C.P.C.» * Não se conformando, os autores interpuseram recurso de apelação, pedindo a revogação da decisão, e se profira acórdão que «determine a implantação de marcos por perito, na estrema norte do prédio … dos Recorrentes, na parte em que este intercepta o Caminho dos Cabecinhos e que essa estrema seja assinalada no alinhamento dos três marcos de pedra antigos enterrados que demarcam (SEM OPOSIÇÃO dos Recorridos) o seu terreno … do terreno … dos Recorrentes. Mais requerem que, em consequência, se dê provimento à sanção pecuniária compulsória e à indemnização por danos peticionadas». Os apelantes formulam as seguintes conclusões das alegações de recurso: «1 - As afirmações dos FACTOS PROVADOS XX e XXI, no que à largura (4,50 m) da faixa de terreno se referem, não podem integrar os factos provados. 2 - Nenhum técnico credenciado mediu a largura da faixa, nem no tempo da BC… (anterior proprietária do prédio … dos Recorrentes), nem quando o proprietário era o VV… (que foi quem vendeu o prédio à BC… e é testemunha dos AA nestes autos), nem a mando dos Recorridos depois de 1994. 3 - Esta dimensão (4,50 m) errada e não confirmada tecnicamente, está apenas referida num desenho tosco e grosseiramente incorrecto, da autoria dos Recorridos, junto à Contestação como DOC. 7, ao qual o Tribunal deu crédito, como se fosse um documento autêntico. 4 - Essa faixa de terreno sempre foi estreita, tal como se infere do FACTO PROVADO VI “Existe e sempre existiu entre o prédio … dos AA e o … uma faixa de terreno … que, desde há mais de 40 anos funcionou como caminho de pé e carro de bois …” . 5 - Ora se esta faixa desde há mais de 40 anos (com referência a 1994) funcionava como caminho de pé e carro de bois, não era muito larga. 6 - Depoimento da testemunha VV… (que o Tribunal não valorizou) e que declara que a faixa de terreno SEMPRE FOI ESTREITA. 7 – V… - (09.35) - “… porque aquela entrada não era daquele tamanho” … 09.38 – “era estreita. Quando tinha os tais pilares da minha sogra, era mais estreita a entrada do que é hoje…”. 8 - De referir que a testemunha V… foi proprietário do prédio … dos AA; V… - (04.20) – “Até ser homem, já com idade foi meu” - antes de o ter vendido à BC…, sua sogra. 9 - Esta testemunha é um senhor com 83 anos (gravação 00.24) e, como aliás ele próprio refere no seu depoimento, conhece o terreno desde pequenino, portanto seguramente há mais de setenta anos; 10 – V… - (gravação 3.56) – “Eu desde pequenino que conheço aquilo”; 04.19 – “Conhecia muito bem”; 05.09 – “Andei aí desde pequenino”. 11 - Termos em que OS FACTOS XX e XXI deveriam ter sido dados como NÃO PROVADOS no que à largura da faixa diz respeito. 12 - O FACTO XVIII que refere quase textualmente o art. 12º da Contestação, diz “A faixa de terreno está delimitada a norte por um muro de pedra solta, do prédio inscrito na matriz sob o art. …º Secção … e a sul com o prédio dos AA inscrito sob o art. … Secção …”. 13 - Como se pode verificar pelo mapa cadastral Secção …, fls. 292 (junto ao relatório), no Facto XVIII, os pontos cardeais não estão bem assinalados. 14 - Tendo como referência o muro de pedra solta, este limita a faixa a NW e o prédio dos AA limita-a a NE. 15 - Termos em que o FACTO XVIII deveria ter sido dado como NÃO PROVADO. 16 - O FACTO VI está mais de acordo com o depoimento da testemunha V…. Senão vejamos. 17 - A instância da mandatária dos Recorrentes (gravação - 5.20): O terreno do sr. Engenheiro dá para esse Caminho dos Cabecinhos? V… – (05.28) “Dá, lateralmente, dá.” A instância da mandatária dos Recorrentes (gravação - 5.30): E a marcar essa estrema com o Caminho dos Cabecinhos, o senhor lembra-se de haver lá algum pilar? V… – (05.43) – “Havia lá uns marcos em pedra antigos, muito antigos. Quando eu comecei a ser alguém já estavam lá esses marcos. Depois a minha sogra, quando comprou, quis vedar aquilo e pôs uns marcos em pedra encostados aos tais marcos.” A instância da mandatária dos Recorrentes (gravação - 6.06): Havia lá uns marcos em pedra - diz o senhor – e a sua sogra quis pôr lá uns pilares em pedra, será isso? V… – (06.12) – “Para vedar”. 18 - Os Recorridos, no art.16 da Contestação confirmam a existência dos supra referidos marcos a assinalar as estremas do prédio … dos Recorrentes. 19 - O FACTO XXII dado como PROVADO, cópia textual desse artigo, diz “Desde tempos imemoriais, nos extremos nordeste e noroeste do mesmo prédio (art. …) existem marcos de pedra”. 20 - O FACTO XXIV refere “Há cerca de 20 anos, os AA, sem autorização dos RR, fizeram uma vedação com paus e arames, invadindo o prédio dos RR.” (sublinhado nosso). 21 - Esta afirmação reflecte ipsis verbis o art. 18º da Contestação. 22 - OS FACTOS XXVII e XXVIII referem também ipsis verbis o que diz o relatório do perito a fls.282 e 283: 23 - FACTO XXVII - “A estrema entre o prédio dos AA e dos RR, ou seja, entre o prédio … e …, materializada no terreno por um muro e uma vegetação está alterada relativamente à sua representação na secção cadastral”; 24 - E no FACTO XXVIII o relatório conclui “De acordo com a estrema existente actualmente no terreno, os prédios … e … pertencentes aos AA ocupam parte do prédio …, pertença dos RR, nomeadamente parte da passagem desse prédio.”(sublinhado nosso). 25 -Se o tribunal tivesse levado em consideração (que não levou) o depoimento da testemunha V…, não dava como provado o FACTO XXVII, admitindo que os Recorrentes invadiram o prédio dos Recorridos. 26 - Nem dava como provado o FACTO XXVIII admitindo que foram os Recorrentes que ocuparam o prédio dos Recorridos. 27 - Porque é TOTALMENTE FALSO. 28 - A testemunha V… nos diz: A instância da mandatária dos Recorrentes (gravação - 06.06): Havia lá uns marcos em pedra - diz o senhor – e a sua sogra quis pôr lá uns pilares em pedra, será isso? V… – (06.12) – “Para vedar”. V… - (06.16) - “E depois, aquilo acho que foi derrubado”. A instância da mandatária dos Recorrentes (gravação – 06.19): O que é que foi derrubado? V… – (06.21) - “O marco em pedra. Os outros foram arrancados. Mas isso já tinha sido há mais tempo. E o marco em pedra foi tirado - que eu fui lá ver – e empurrado para dentro do terreno, que eu julgo que pertence ao sr. engenheiro. Julgo não, tenho a certeza.” A instância da mandatária dos Recorrentes (gravação – 06.38): Julga ou tem a certeza? V… – (06.39) - “Tenho a certeza.” A instância da mandatária dos Recorrentes (gravação – 07.18): O que é que viu lá no local? V… – (07.20) – “Vi lá o pilar em pedra que a minha sogra tinha posto e não reparei se estavam lá os tais pequeninos ou não. Agora o em pedra estava lá, limitava a entrada deles”. A instância da mandatária dos Recorrentes (gravação – 07.35): Mas estava lá, como? Em pé ou estava caído? V… – (07.37) – “Estava deitado no chão com uns furos que era para passar uns arames para vedar a propriedade … do caminho, claro”. A instância da mandatária dos Recorrentes (gravação – 08.06): E … na parte W desse terreno há três marcos de pedra enterrados uns a seguir aos outros … V… – (08.27) – “Esses marcos, a função deles era separar o terreno do sr. Engenheiro do terreno do Â…, do pai do Â…. Chamava-se LD….” A instância da mandatária dos Recorrentes (gravação – 08.48): Na direcção desses 3 marcos … V… – (08.50) – Mas esses estão lá do lado de dentro.” A instância da mandatária dos Recorrentes (gravação – 08.56): Na direcção desses 3 marcos, junto ao Caminho dos Cabecinhos, havia aí um pilar de pedra ou não? V… – (09.00) – “Havia, havia.” V… – (09.11) – Agora estão um marco de pedra metido lá para dentro do terreno.” A instância da mandatária dos Recorrentes (gravação – 09.16): De pedra ou de cimento? V… – (9.18) – “Não o de cimento foi feito depois. Arrancaram o de pedra e puseram um de cimento. Mas não puseram no mesmo local, onde estava o de pedra, porque eu vi que eles tinham feito o pilar mais para dentro do engenheiro. Porque aquela entrada não era daquele tamanho … era estreita. Quando tinha os tais pilares da minha sogra, era mais estreita a entrada do que é hoje, do que está lá posto com cimento e o marco de pedra está metido dentro do terreno do engenheiro, caído lá dentro”. A instância da mandatária dos Recorrentes (gravação – 09.55): E o de cimento está metido onde? V… – (09.57) – Está metido mais para o lado do terreno dele também.” V… – (10.10) – “Em relação àquilo que era antigamente, está metido um bocado dentro do terreno que é do senhor engenheiro.” 29 - Por este depoimento, verifica-se que os FACTOS e), f), i), l), m) e n) (este no que à primeira parte diz respeito) dados como NÃO PROVADOS, deveriam ter sido dados como PROVADOS. 30 - O tribunal valorizou exclusivamente a prova pericial, sem ter em conta as outras provas. 31 - Sem dar qualquer importância ao depoimento lúcido e esclarecedor da testemunha V…, de 83 anos, que foi o primitivo dono do terreno, e conhece o terreno como as suas próprias mãos desde pequenino. 32 - O tribunal preferiu valorizar um relatório elaborado com base em coordenadas gráficas medidas e desenhadas por um aparelho, possuindo “um erro médio quadrático de até 0,9 metros, podendo ter um erro máximo de até 2,5 metros” (fls. 279), portanto um processo técnico falível, do que dar crédito ao que existe no terreno desde tempos imemoriais. 33 - Não foi apresentada prova certificada do bom funcionamento dos aparelhos usados, nem se têm sido objecto da competente manutenção periódica. 34 - AC.REL. COIMBRA – PROC. Nº1785/06 de 05/07/2006: “2 – O valor da prova pericial civil …, não vincula o critério do julgador, porquanto os dados de facto que servem de base ao parecer estão sujeitos ao princípio da livre apreciação da prova, … mas, para não resvalar em arbitrariedade, deve ser apreciada pelo juíz, segundo a sua experiência, prudência e bom senso, embora não vinculado a quaisquer regras, medidas ou critérios.” 35 - AC. REL. LISBOA – PROC. Nº949/05.4 TBOVR – A.L1 – 8 de 11/03/2010 “1 – No nosso direito predomina o princípio da livre apreciação das provas, consagrado no ART.655º Nº1 do CPC … “2 – O que está na base do princípio é a libertação do juíz de regras severas e inexoráveis da prova legal, sem que entretanto se queira atribuir-lhe o poder arbitrário de julgar os factos sem prova ou contra a prova; o sistema da prova livre não exclui, antes pressupõe a observância das regras de experiência e critérios de lógica.” 36 - AC. SJT – PROC.3612/07.6 TBLRA.C2.S1, 1ª Secção de 06/07/2011 “I – O valor da prova pericial civil não vincula o critério do julgador, que a pode rejeitar independentemente de sobre ela fazer incidir uma crítica material da mesma natureza … “II – A necessidade de evitar que o princípio da livre apreciação da prova não conduza à arbitrariedade pressupõe a exigência legal de que a prova pericial seja apreciada pelo juíz com observância das regras de experiência, prudência e bom senso …” 37 - AC. REL. LISBOA – PROC. Nº1585/06.3 TCSNT.L1 – 1 de 10/01/2012 I – À face do nosso direito probatório vigente não há nenhuma imposição legal de que determinados factos só admitam prova pericial, isto é só possam ser provados através de prova pericial. II – Daí que por muito conveniente e adequada que seja a prova pericial para a demonstração de certos factos, nada obsta a que a sua prova seja obtida com recurso à prova testemunhal ou à prova documental.” 38 - Termos em que os FACTOS XXIV, XXVII e XXVIII deveriam ter sido dados como NÃO PROVADOS. 39 - Sobre os marcos de pedra e os pilares, as afirmações feitas nos FACTO XXIII e FACTO XXV dados como provados SÃO FALSAS. 40 - Refletem mais uma vez ipsis verbis os art. 17º e 19º da Contestação que por sua vez remetem para o DOC. Nº7 que é o desenho tosco e grosseiramente incorrecto, da autoria dos Recorridos, supra referido. 41 - Termos em que também os FACTOS XXIII e XXV deveriam ter sido dados como NÃO PROVADOS. 42 - A sentença é ambígua, porque se os FACTOS XIV e XV estão dados, e bem, como PROVADOS, então o FACTO b) que refere exactamente o mesmo, não pode ser dado como NÃO PROVADO. 43 - O marco de pedra antigo enterrado no ponto de intercepção dos prédios …, …, … e … foi comprovado pelo meretíssimo juíz do PROC. Nº…/… e consta do relatório da inspecção ao local que faz parte desse processo. 44 - Esse processo foi indicado pelos Recorridos como prova e esclarecimento para estes autos. 45 - Desde tempos imemoriais que essa intercepção se constata no terreno, 46 - E nunca nenhum dos proprietários dos prédios …, …, nem mesmo os Recorridos, donos do prédio 94, reclamaram esse facto. 47 - O mapa cadastral da Secção …, a fls. 292 também o indica com o Nº5. 48 - Este mapa, como refere a carta dirigida ao tribunal a fls. 227, depois de ter sido facultado à consulta do público, não foi objecto de reclamações. 49 - Sobre os 3 marcos de pedra antigos, enterrados e alinhados na confrontação a SW dos prédios … dos Recorrentes e … dos Recorridos, foram também comprovados pelo juíz do PROC. Nº…/… e constam do relatório da inspecção ao local que faz parte desse processo. 50 - Estes 3 marcos alinhados estão também assinalados no desenho que faz parte da caderneta predial do prédio … dos Recorridos (DOC. Nº7 da Petição inicial). 51 - A testemunha V… também os refere no seu depoimento. A instância da mandatária dos Recorrentes (gravação – 08.06): E … na parte W desse terreno há três marcos de pedra enterrados uns a seguir aos outros … V… – (08.27) – “Esses marcos, a função deles era separar o terreno do sr. Engenheiro do terreno do Â…, do pai do Â…. Chamava-se LD….” A instância da mandatária dos Recorrentes (gravação – 08.48): Na direcção desses 3 marcos … V… – (08.50) – Mas esses estão lá do lado de dentro.” A instância da mandatária dos Recorrentes (gravação – 08.56): Na direcção desses 3 marcos, junto ao Caminho dos Cabecinhos, havia aí um pilar de pedra ou não? V… – (09.00) – “Havia, havia.” 52 - Nestes termos e nos termos do disposto no ART. 615º Nº1 c) do CPC a sentença está ferida de NULIDADE devido à ambiguidade que demonstra. 53 - Ao valorizar exclusivamente o relatório pericial transpondo-o para a decisão a sentença viola o ART. 615º Nº1 e) do CPC, porque o juíz condena em objecto diverso do pedido. 54 - Os Recorrentes não pediram a demarcação da estrema entre o seu prédio … e o prédio … dos Recorridos e o relatório pericial é isso que faz, mormente a partir de fls. 283. 55 - O que os Recorrentes pedem desde o início desta acção é que seja demarcada a estrema norte do seu prédio art…., na parte em que esta intercepta o Caminho dos Cabecinhos, junto à faixa de terreno que os Recorrentes acordaram em sede da audiência prévia pertencer ao prédio dos Recorridos. 56 - E que essa estrema seja marcada no alinhamento dos três marcos de pedra antigos que estão enterrados e que fazem a confrontação do prédio … dos Recorrentes com o prédio … dos Recorridos, e a que estes nunca se opuseram. 57 - Desta forma os Recorrentes impugnam a decisão da matéria de facto supra referida nos termos dos ART. 615º Nº1 c) e e) e 640º do CPC e REQUEREM uma decisão diversa da recorrida. 58 - A Douta sentença violou a norma constante do ART. 1354º do Código Civil (CC). 59 - Nos termos do Nº 1 desse artigo “A demarcação é feita de conformidade … com a posse em que estejam os confinantes ou segundo o que resultar de outros meios de prova”. 60 - A sentença, conforme o supra exposto, apenas valorizou o relatório pericial e não teve em consideração nem outros documentos, 61 - Nem o depoimento da única testemunha credível e que depôs de forma espontânea e isenta em audiência. 62 - Mas se o tribunal, após toda a audiência e ponderadas todas as provas ficasse com dúvidas, só tinha que fazer o que a lei lhe permite, ou seja aplicar o Nº 2 do mesmo artigo “Se … a questão não puder ser resolvida pela posse ou por outro meio de prova a demarcação faz-se distribuindo o terreno em litígio por partes iguais.” 63 - O terreno em litígio no caso sub judice é a estrema norte do prédio 100 dos Recorrentes, no ponto em que intercepta o Caminho dos Cabecinhos e que tem sido deslocada para dentro do seu prédio pelo alargamento sistemático e progressivo da entrada da faixa que os Recorrentes acordaram como pertencente ao prédio dos Recorridos. 64 - A sentença referiu a norma do ART.1354º do CC na sua motivação de direito, mas depois não a aplicou. 65 - TERMOS em que deverá ser proferida uma nova sentença que determine a implantação de marcos por perito, na estrema norte do prédio … dos Recorrentes na parte em que este intercepta o Caminho dos Cabecinhos e que essa estrema seja assinalada no alinhamento dos três marcos de pedra antigos enterrados que demarcam SEM OPOSIÇÃO dos Recorridos o seu terreno … do terreno … dos Recorrentes. 66 - Mais requerem que, em consequência, se dê provimento à sanção pecuniária compulsória e à indemnização por danos peticionadas. 67 - A sentença condenou os Recorrentes nas custas nos termos do ART.527º do CPC. 68 - Também nesta parte andou mal o tribunal a quo. 69 - Se a fls.327 a sentença diz que “ … procede parcialmente a pretensão dos AA …”, 70 - Os Recorrentes apenas deveriam ser condenados na proporção do seu decaimento, nos termos do ART.527º Nº2 do CPC e não ficar com as custas todas a seu cargo. NESTES TERMOS e tendo em conta os fundamentos supra expostos, os Recorrentes requerem a V.EXª que seja proferida uma nova sentença que determine a implantação de marcos por perito, na estrema norte do prédio … dos Recorrentes, na parte em que este intercepta o Caminho dos Cabecinhos e que essa estrema seja assinalada no alinhamento dos três marcos de pedra antigos enterrados que demarcam (SEM OPOSIÇÃO dos Recorridos) o seu terreno … do terreno … dos Recorrentes. Mais requerem que, em consequência, se dê provimento à sanção pecuniária compulsória e à indemnização por danos peticionadas. Requerem ainda a alteração da decisão em termos de custas. Só assim se fazendo JUSTIÇA» Foram apresentadas contra-alegações, pugnando pela manutenção da sentença proferida. * Obtidos os vistos legais, cumpre apreciar. * Questões a decidir: O objeto e o âmbito do recurso são delimitados pelas conclusões das alegações, nos termos do disposto no artigo 635º nº 4 do Código de Processo Civil. Esta limitação objetiva da atuação do Tribunal da Relação não ocorre em sede da qualificação jurídica dos factos ou relativamente a questões de conhecimento oficioso, desde que o processo contenha os elementos suficientes a tal conhecimento (cf. Artigo 5º, nº 3, do Código de Processo Civil). Similarmente, não pode este Tribunal conhecer de questões novas que não tenham sido anteriormente apreciadas porquanto, por natureza, os recursos destinam-se apenas a reapreciar decisões proferidas (Abrantes Geraldes, Recursos no N.C.P.C., 2017, Almedina, pág. 109). Importa apreciar as seguintes questões: a). Se a decisão recorrida incorreu em erro de julgamento (I) da matéria de facto considerada provada nos pontos XX, XXI, no que à largura da faixa diz respeito, XXVII e XXVIII – na parte em que admite terem sido os recorrentes a ocupar o prédio dos recorridos – e XXIII e XV, que deveriam ter sido dados como não provados, e (II) da factualidade não provada das alíneas e), f), i), l), m) e n) (este no que à primeira parte diz respeito) que deveriam ter sido considerados não provados, pelos motivos invocados? b). Se a decisão recorrida padece das nulidades previstas nas alíneas c) e e) do nº 1 do artigo 615º do C.P.C.? c). Se a decisão recorrida incorreu em erro de julgamento pois refere a norma do artigo 1354º do C.C. na motivação de direito, mas não a aplica, e relativamente à condenação em custas dos apelantes, na totalidade, quando apenas deveriam ter sido condenados na proporção do seu decaimento, nos termos do art. 527º nº 2 do C.P.C.? * FUNDAMENTAÇÃO DE FACTO A factualidade provada e não provada consignada na sentença recorrida é a seguinte: A) Factos provados: i. Os AA. são donos e legítimos proprietários do prédio, com área de 2.100 m2, sito no lugar da Assafora, freguesia de S. João das Lampas, concelho de Sintra, que confronta a norte com JS…, a sul e a nascente com caminho e a poente com AV…, descrito na 1ª Conservatória do Registo Predial de Sintra sob o n.º … do livro …, inscrito na respetiva matriz predial urbana sob o artigo …º, o qual foi destacado do artigo …º da secção … da correspondente matriz cadastral. ii. Os RR. são proprietários e legítimos possuidores do prédio rústico que consta de terreno para pastagem e pinhal denominado “Cabecinhos”, com área de 5.640 m2 sito nos limites da Assafora, freguesia de S. João das Lampas, que confronta a norte com JS…, a sul com AJ…, a nascente com VV… e a poente com caminho, descrito na 1ª Conservatória do Registo Predial de Sintra sob o n.º … a fls. 151 do livro … e inscrito na matriz cadastral sob o artigo … da secção … iii. O prédio dos AA. confronta a norte com JS…, atualmente MP…, donos e legítimos possuidores do prédio identificado com o número … na planta cadastral. iv. A sudoeste do prédio …, tomando como referência a planta cadastral, existe o prédio … que também pertence aos AA.. v. O prédio … pertencente aos RR. confronta a sueste com o … dos AA.. vi. Existe e sempre existiu entre o prédio … dos AA. e o …, uma faixa de terreno direcionada de nascente para poente, que desde há mais de 40 anos funcionou como caminho de pé e carro de bois para os possuidores dos supra referidos prédios e de outros, cuja entrada era assinalada por um poste de pedra colocado na estrema norte do prédio … e um marco de pedra do lado oposto, na estrema do prédio … vii. A faixa de terreno do caminho pertence aos RR.. viii. Os AA. intentaram anterior ação declarativa de condenação com processo comum e forma sumária contra os RR., a qual correu termos no 1º Juízo Cível do Tribunal Cível da Comarca de Sintra sob o n.º …/… e no âmbito da qual pediam que fossem os RR. condenados a: a) Reconhecer o direito de propriedade dos AA. sobre um terreno com a área de 2100m2, sito no lugar da Assafora, S. João das Lampas, que confronta do norte com JS…, sul e nascente com caminho e poente com AV…, descrito na Conservatória do Registo Predial de Sintra sob o n.º … do libro …, inscrito na matriz predial urbana sob o artigo … e destacado do artigo … Secção … da matriz cadastral; b) Reconhecer a estrema norte deste terreno de acordo com o alinhamento dos marcos de madeira que lá existem (onde existiam e/ou ainda existem uns marcos de pedras antigos) e no prolongamento dele até ao caminho, conforme a planta cadastral; c) Reconhecer aos AA. o direito de colocarem o marco de pedra a marcar o lado esquerdo da entrada norte para o seu terreno no sítio onde ele sempre esteve; d) Retirar a corrente e o cadeado com que vedaram a entrada norte de acesso ao terreno dos AA.; e) Remover os pedregulhos que ali colocaram para dificultar a entrada dos AA. e coloca-los à direita da entrada onde estavam; f) Indemnizar os AA. pelos prejuízos sofridos, nomeadamente os referidos nos art. 22º e 23º, em montante a determinar em execução de sentença. ix. Foi proferida sentença no processo n.º …/… onde foi reconhecido o direito de propriedade dos AA. sobre o seu prédio e foi declarada constituída, em favor deste prédio, uma co-servidão de passagem para acesso àquele como caminho de pessoas e carros, sobre determinada faixa de terreno ali identificada. x. Esta sentença veio a ser anulada em sede de recurso por, ao declarar um direito de servidão que não integrava o pedido formulado, ter conhecido de objeto diverso do pedido. xi. Na sequência do acórdão proferido pelo Tribunal da Relação de Lisboa, veio a ser proferida nova sentença reconhecendo-se o direito de propriedade dos AA. sobre o prédio identificado no artigo 1º da petição inicial e julgando improcedentes todos os demais pedidos. xii. Esta segunda sentença veio a ser confirmada em sede de novo recurso pelo Tribunal da Relação de Lisboa. xiii. Na sentença proferida no processo n.º …/… foi dado por provado sob a alínea M) que “Desde há mais de 40 anos até outubro de 1994, o terreno delimitado por referência ao documento de fls. 119 (cópia da carta cadastral, que está orientado de Norte para Sul da parte superior da folha para a inferior) pela confrontação Sueste do prédio … e o prolongamento para Nordeste da linha recta definida pelos três marcos de pedra provados na alínea O), a partir da via pública com que aquele confronta a Nordeste, foi utilizado como caminho para pessoas e carros, pelas pessoas que usavam e fruíam dos prédios …, …, … e …, entre as quais de 1976 a 1993, BC…”. xiv. Na sentença proferida no processo n.º …/… foi dado por provado sob a alínea O) que “Há mais de 30 anos relativamente a 4/11/98, por referência ao documento de fls. 119 (cópia da carta cadastral, que está de Norte para Sul da parte superior da folha para a inferior), existem colocados um marco de pedra no ponto de intersecção dos prédios …, …, … e …, um marco de pedra a cerca de 5 metros para Sueste do ponto mais a Sul do prédio …, e um marco de pedra sensivelmente a meio da linha recta que une os dois primeiros.”. xv. Em finais de 1989 / princípios de 1990 o A. colocou junto aos supra referidos marcos de pedra, estacas de madeira no alinhamento do segmento de reta, definido pelos três marcos de pedra, que separa, no terreno, o prédio … do prédio …. xvi. Os AA. utilizavam a faixa de terreno como caminho para passarem para o prédio … e já a anterior proprietária do prédio sempre a utilizou com a mesma finalidade. xvii. Os AA. são os únicos que têm no seu prédio uma casa de habitação. xviii. A faixa de terreno está delimitada a norte por um muro de pedra solta, do prédio inscrito na matriz sob o art. … Secção … e a sul com o prédio dos AA. inscrito sob o art. … Secção …; xix. Desembocando a norte/nascente no Caminho dos Cabecinhos; xx. Tendo uma largura de, pelo menos, 4,50m. xxi. A BC…, anterior dona do prédio inscrito sob o art. …, há mais de 43 anos, colocou na estrema norte do mesmo prédio uma vedação com aus e varas de eucalipto, a, pelo menos, 4,50m do muro de pedra solta referido em xvii.. xxii. Desde tempos imemoriais, nos extremos nordeste e noroeste do mesmo prédio (art. …) existem marcos de pedra; xxiii. Existindo outros 2 nos extremos sudoeste e sudeste do prédio inscrito na matriz sob o art. …, que confronta com a faixa de terreno referida. xxiv. Há cerca de 20 anos, os AA., sem autorização dos RR., fizeram uma vedação com paus e arames, invadindo o prédio dos RR.. xxv. Tendo então os RR. colocado 2 pilaretes, tendo entre si 3 metros, no inicio de tal faixa de terreno, ligados por uma corrente. xxvi. A largura da passagem de acesso para o prédio … pertença dos RR. é de 6,23 metros junto à estrada e de 6,5 metros no fim da referida passagem. xxvii. A estrema entre o prédio dos AA. e dos RR., ou seja, entre os prédios … e …, materializada no terreno por um muro e uma vegetação está alterada relativamente à sua representação na secção cadastral. xxviii. De acordo com a estrema existente atualmente no terreno, os prédios … e …, pertencentes aos AA. ocupam parte do prédio 94, pertença dos RR., nomeadamente parte da passagem desse prédio. xxix. As pedras indicadas pelos AA. como marcos distam 3,06m, 2,50m e 2,10m da estrema do prédio … para dentro da faixa de passagem pertencente ao prédio …. B) Factos não provados: a. Que a faixa de terreno para passagem entre o prédio … e o prédio … tenha e sempre tenha tido cerca de três metros de largura. b. A delimitar nos prédios … e … do lado em que estes confrontam existem enterrados três marcos de pedra antigos, um no ponto de interceção dos prédios …, …, … e …, outro a cerca de 5 metros para sueste do ponto mais a sul do prédio … e outro sensivelmente a meio da linha reta que une os dois primeiros. c. Que o A. colocou as estacas de madeira referidas em xiv. na convicção de que não ofendia os direitos de ninguém, nem mesmo dos RR. d. Que os RR. não tenham manifestado na altura qualquer oposição. e. O poste de pedra que assinalava a entrada da faixa de terreno, situado na estrema norte do prédio … dos AA. foi arrancado e ainda hoje jaz junto ao local onde esteve implantado. f. Em outubro de 1994 os RR. colocaram um outro poste de cimento desviado mais de um metro para dentro da estrema norte do prédio … dos AA., e vedaram o acesso à faixa com pedregulhos e ainda uma corrente e um cadeado que prenderam a este poste assim desviado, e ao outro implantado do lado oposto, mais próximo do prédio ... g. Os AA. instaram os RR. a procederem de outra maneira, solicitando-lhes, com bons modos, que tirassem a corrente e o cadeado. h. Os AA. não obtiveram resultados e ainda foram insultados e ameaçados de agressão pelo R. Ângelo. i. Nos últimos dois anos os RR. têm continuado a usurpar terreno ao prédio … dos AA.; j. Ultimamente os RR. têm vindo a proceder de igual forma quanto à estrema sul do prédio …; k. Têm removido a terra e vegetação bravia muito para além do poste que em outubro de 1994 implantaram para dentro do terreno … dos AA.. l. Os RR. têm vindo a alargar a entrada da passagem que hoje já mede 5 metros em vez dos 3 que sempre mediu antes de outubro de 1994; m. À custa do terreno que os RR. vêm subtraindo ao prédio dos AA.. n. Para além de sistematicamente subtraírem terreno aos AA., os RR. têm-nos impedido de entrarem na sua propriedade utilizando a faixa de terreno, como sempre o haviam feito eles e antes deles a Beatriz, anterior proprietária. o. Os AA. todos os dias sentem falta de segurança por não poderem erguer um muro na confrontação noroeste da sua propriedade, junto à faixa de terreno. p. O prédio dos AA. é muitas vezes devassado por estranhos; q. O jardim dos AA. é muitas vezes estragado, as plantas arrancadas e pisadas, as culturas estragadas, vandalizadas e comidas pelos coelhos bravos. r. As suas alfaias agrícolas e de jardinagem são roubadas. s. Os AA. fizeram um seguro para prevenir danos que possam surgir. t. A corrente referida em xxiv. não tem qualquer cadeado desde pelo menos 1995 por os AA. o terem partido e retirado. * FUNDAMENTAÇÃO DE DIREITO * a). Se a decisão recorrida incorreu em erro de julgamento (I) da matéria de facto considerada provada nos pontos XX, XXI, no que à largura da faixa diz respeito, XXVII e XXVIII – na parte em que admite terem sido os recorrentes a ocupar o prédio dos recorridos – e XXIII e XV, que deveriam ter sido dados como não provados, e (II) da factualidade não provada das alíneas e), f), i), l), m) e n) (este no que à primeira parte diz respeito) que deveriam ter sido considerados não provados, pelos motivos invocados? No nosso ordenamento jurídico vigora o princípio da liberdade de julgamento ou da livre convicção, face ao qual o tribunal aprecia livremente as provas, sem qualquer grau de hierarquização e fixa a matéria de facto em sintonia com a convicção firmada acerca de cada facto controvertido, tendo porém presente o princípio a observar em casos de dúvida, consagrado no artigo 414º do C.P.C., de que a «dúvida sobre a realidade de um facto e sobre a repartição do ónus da prova resolve-se contra a parte a quem o facto aproveita». Conforme é realçado por Ana Luísa Geraldes («Impugnação», in Estudos em Homenagem ao Prof. Doutor José Lebre de Freitas, Vol. I. Coimbra, 2013, pág. 609 e 610), em «caso de dúvida, face a depoimentos contraditórios entre si e à fragilidade da prova produzida, deverá prevalecer a decisão proferida pela 1ª instância, em observância dos princípios da imediação, da oralidade e da livre apreciação da prova, com a consequente improcedência do recurso nesta parte». E mais à frente remata: «O que o controlo de facto em sede de recurso não pode fazer é, sem mais, e infundadamente, aniquilar a livre apreciação da prova do julgador construída dialeticamente na base dos referidos princípios da imediação e da oralidade.» Assim, para que a decisão da 1ª instância seja alterada haverá que averiguar se algo de “anormal” se passou na formação dessa apontada “convicção”, ou seja, ter-se-á que demonstrar que na formação da convicção do julgador de 1ª instância, retratada nas respostas que se deram aos factos, foram violadas regras que lhe deviam ter estado subjacentes, nomeadamente, face às regras da experiência, da ciência e da lógica, da sua conformidade com os meios probatórios produzidos, ou com outros factos que deu como assentes. Os apelantes pretendem alterar a valoração da prova feita pelo tribunal recorrido com recurso ao testemunho de Vicente Veríssimo Lapa (proprietário inicial do prédio que conhece o local há mais de setenta anos), por ter declarado que a faixa de terreno em litígio sempre foi estreita, pois desde há mais de quarenta anos funcionou como caminho de pé e de carro de bois, e porque confirmou que quando «tinha os pilares da minha sogra, era mais estreita a entrada do que é hoje…». Consequentemente, nas alegações de recurso defende-se que o depoimento da aludida testemunha deveria ter servido para refutar as conclusões do relatório pericial, «elaborado com base em coordenadas gráficas medidas e desenhadas por um aparelho, possuindo “um erro médio quadrático de até 0,9 metros, podendo ter um erro máximo de até 2,5 metros” (fls. 279), portanto um processo técnico falível, do que dar crédito ao que existe no terreno desde tempos imemoriais». A fundamentação do tribunal recorrido, a este respeito, é a seguinte no essencial: «A inspeção judicial realizada pelo tribunal aos prédios objeto dos autos foi essencial na formação da convicção do tribunal, porquanto coadjuvada por técnico topógrafo com conhecimentos especiais na matéria objeto dos presentes autos, que se fez acompanhar de um aparelho recetor de GPS, com o qual foram recolhidos pontos de referência no terreno e efetuado levantamento topográfico, posteriormente utilizados na produção de plantas, que por sua vez foram comparadas com as secção cadastral e ainda com as coordenadas gráficas dos marcos que definem as estremas representadas na secção cadastral, previamente solicitadas à Direção-Geral do Território, tendo daí sido retiradas as conclusões apresentadas no relatório de fls. 276 a 292. (…) Na inspeção judicial pôde o tribunal observar in loco a localização dos prédios do AA. e dos RR., quer geograficamente, quer em relação uns aos outros. Observaram-se igualmente as características dos referidos prédios, uso, o caminho, acessos e proximidade das vias públicas em redor. Foram ouvidas três testemunhas: VV…, genro da anterior proprietária do prédio dos AA.; AC…, amigo dos AA. e residente na Assafora e ML…, amiga dos AA.. Todas as testemunhas confirmaram a existência do muro de pedra solta, bem como que este nunca fora mexido desde há muitos anos e que se lembram. Quanto ao mais, relataram a existência do caminho, do uso que lhe era dado e da localização que atribuíam às respetivas estremas, de acordo com o que tinham visto ao longo dos tempos. Cumpre referir que a prova essencial na formação da convicção do tribunal foi a resultante da inspeção ao local, por ser de longe a mais fiável, porque baseada em factos técnico-científicos, devidamente fundamentados e suportados em dados objetivos registados em organismo público por técnicos qualificados. Sempre se dirá ainda que o relatório produzido na sequência da inspeção ao local e levantamento topográfico na mesma realizado é muito completo, claro e extremamente bem fundamentado, não nos deixando margem para dúvidas. Relativamente aos factos dados como não provados e relativos à delimitação dos prédios, justificam-se pela produção de prova em contrário, nos termos supra já referidos.» Conciliando o teor do testemunho de VV…, que se ouviu integralmente, com o relatório do levantamento topográfico realizado, chega-se à mesma valoração que o tribunal recorrido fez, que se mostra lógica e coerente, bem como adequada às regras da experiência. Na verdade, a testemunha em causa no início do depoimento declara que «o seu interesse é que ficasse como era dantes» e, depois de produzir os esclarecimentos reproduzidos nas alegações, a instâncias do mandatário dos réus, explica que a sua sogra colocou o pilar em pedra para separar o terreno dela do caminho, antes de o vender. Consequentemente, o conhecimento do local revelado pela testemunha não é baseado em nenhuma medição rigorosa da sua dimensão, mas tão- somente, tal como as outras testemunhas, quanto à «existência do caminho, do uso que lhe era dado e da localização que atribuíam às respetivas estremas, de acordo com o que tinham visto ao longo dos tempos», conforme se assinala na decisão recorrida. Pelo contrário, o relatório do levantamento topográfico mostrou-se mais fiável, senão o único elemento probatório fiável, sendo ainda certo que o tribunal observou presencialmente a localização dos prédios das partes em litígio, quer geograficamente, quer em relação uns aos outros, na inspecção judicial levada a cabo. Aliás, os apelantes insurgem-se quanto à conclusão retirada no relatório sobre a dimensão da faixa de terreno – 4,50 m -, que foi obtida depois de efectuada «a comparação da situação existente actualmente no terreno com a representação dos referidos prédios na seção cadastral» e se ter procedido ao «levantamento topográfico dos três marcos indicados pelos AA, assim como dos muros, vedações e postes existentes no local», além de que se solicitou «à Direção-Geral do Território o fornecimento das coordenadas gráficas dos marcos que definem as estremas representadas na seção cadastral, de forma a poder compará-las com as coordenadas obtidas pelo levantamento topográfico agora efectuado, a fim de verificar as alterações ocorridas nessas estremas entre a data em que foi realizado o levantamento cadastral do concelho de Sintra e a data actual». Tendo, além disso, o levantamento topográfico sido realizado «com um recetor GNSS Trimble R6, a receber correcções a partir da “Renep”, rede de estações permanentes da Direção-Geral do Território, o que garante a exactidão exigida para o trabalho executado». No fundo, nas alegações de recurso pretende-se refutar a conclusão do relatório e contrapor que a dimensão da faixa de terreno não deve exceder os três metros, com base no depoimento de uma testemunha que referiu tratar-se de «uma passagem estreita», e pela qual circulou um «carro de bois». Ora, fazendo apelo às contra-alegações, por ser uma observação muito pertinente, a apreciação da testemunha é vaga e abstracta, e a circunstância de por lá circularem carros de bois tanto pode indiciar que a largura era de três metros, como de cinco ou seis metros. Nesta sequência, o tribunal recorrido valorou devidamente o relatório pericial, porque no fundo foi o único elemento probatório fiável produzido, não tendo sido rebatido ou refutado por testemunhos ou documentos produzidos pelos autores, que permitissem sustentar a demarcação da estrema tal como é proposta nos artigos 54 a 56 das conclusões recursórias. Os apelantes invocam ainda que o tribunal recorrido se baseou no documento sete, junto com a contestação (a fls. 129), que é um mero escrito e não um documento autêntico. Não se vislumbra na fundamentação fáctica produzida na sentença qualquer tipo de confirmação desta afirmação, mas sim, conforme já assinalado, que o tribunal recorrido considerou crucial a inspecção judicial realizada, coadjuvada por técnico topógrafo com conhecimentos especiais na matéria objecto dos presentes autos. Não há, por conseguinte, fundamento para alterar a decisão sobre a matéria de facto provada e não provada. b). Se a decisão recorrida padece das nulidades previstas nas alíneas c) e e) do nº 1 do artigo 615º do C.P.C.? No despacho de admissão do recurso, é indeferida a arguição de nulidades nos seguintes termos: « Vêm os AA. alegar, em sede de recurso, a nulidade da sentença proferida nos autos: 1. Por “ambiguidade”; 2. Por condenação “em objeto diverso do pedido”. Dispõe o art. 615º, n.º 1 do C.P.C. que: “É nula a sentença quando: a) Não contenha a assinatura do juiz; b) Não especifique os fundamentos de facto e de direito que justificam a decisão; c) Os fundamentos estejam em oposição com a decisão ou ocorra alguma ambiguidade ou obscuridade que torne a decisão ininteligível; d) O juiz deixe de pronunciar-se sobre questões que devesse apreciar ou conheça de questões de que não podia tomar conhecimento; e) O juiz condene em quantidade superior ou em objeto diverso do pedido.”. Relativamente à alegada questão de a sentença estar “ferida de nulidade devido à ambiguidade que demonstra”, entende-se que não assiste razão aos recorrentes, desde logo em virtude de a haver eventual ambiguidade na decisão proferida teria, para ser relevante e suscetível de gerar a nulidade pretendida, que tornar a decisão ininteligível. Ora, do teor do recurso interposto pelos AA. resulta claramente que a decisão proferida é clara e inteligível, apenas não concordado com o seu teor ou sentido da mesma. Igualmente não assiste razão aos recorrentes quando alegam que os factos provados identificados em xiv. e xv. referem exatamente o mesmo que o facto b) dos factos não provados. Assim, entende-se não assistir razão aos recorrentes, indeferindo-se a invocada nulidade da sentença por “ambiguidade” da mesma. Sem prejuízo do que ficou já supra decidido quanto à legitimidade dos AA. para interposição de recurso quanto ao segmento da sentença que decide da demarcação, sempre se dirá o seguinte: O tribunal apreciou a prova produzida nos autos ao abrigo do principio da livre apreciação consagrado no art. 607º, n.º 5 do C.P.C., sendo que, tal como resulta da motivação da decisão proferida, foi essencial na formação da convicção do tribunal a inspeção realizada aos prédios objeto dos autos, a qual foi coadjuvada por técnico topógrafo da Direção-Geral do Território. Atenta a matéria em causa nos autos, não é de estranhar que tenha sido esta a prova determinante na apreciação dos factos, porque mais esclarecida e dotada de um rigor técnico e científico ausente do depoimento das testemunhas e da demais prova produzida. A final, esclarecido, o tribunal determinou, tal como peticionado pelos AA., a demarcação dos prédios com base nos factos apurados e tidos como provados. Independentemente de serem as conclusões obtidas do agrado ou concordância ou não dos ora recorrentes, inexiste a nulidade apontada, já que a decisão proferida corresponde exatamente ao pedido: demarcação dos prédios. Face a tudo o exposto, indeferem-se as nulidades da sentença apontadas pelos recorrentes, mantendo-se esta nos seus precisos termos. Notifique. » Constitui entendimento pacífico da doutrina e da nossa jurisprudência que a nulidade prevista no artº. 615º, nº. 1, al. c) do NCPC (correspondente ao artº. 668º, nº. 1, al. c) anterior à reforma introduzida pela Lei nº. 41/2013 de 26/6) só se verifica quando os fundamentos invocados na sentença devessem, logicamente, conduzir a uma decisão diversa da que a sentença expressa, ou seja, o raciocínio do juiz aponta num determinado sentido e o dispositivo conclui de modo oposto ou diferente (cfr. Prof. Alberto dos Reis, CPC Anotado, Vol. V, Coimbra Editora, pág. 141; acórdãos do STJ de 23/11/2006, proc. nº. 06B4007 e da RE de 19/01/2012, proc. nº. 1458/08.5TBSTB e de 19/12/2013, proc. nº. 538/09.4TBELV, Ac. do T.R.E. de 25/06/2015, Proc. nº 855/15.4T8PTM.E1 todos acessíveis no sítio da internet do IGFEJ). Realidade distinta desta, é o erro na subsunção dos factos à norma jurídica ou erro na interpretação desta, ou seja, quando – embora mal – o juiz entenda que dos factos apurados resulta determinada consequência jurídica e este seu entendimento é expresso na fundamentação ou dela decorre, o que existe é erro de julgamento e não oposição nos termos aludidos – cfr. LEBRE DE FREITAS, A Ação Declarativa Comum, 2000, pg. 298. Ora, examinada a sentença não se verifica qualquer oposição entre os fundamentos e a decisão. O raciocínio exposto na decisão recorrida conduzia logicamente ao resultado alcançado, independentemente da sua correcção jurídica. A sentença proferida é plenamente inteligível, como aliás o demonstram os próprios apelantes nas suas alegações de recurso, que bem a perceberam e com a qual não concordam. Como refere Abrantes Geraldes, in Recursos no Novo Código de Processo Civil, 4ª edição, pág. 170 «A contradição entre os fundamentos e a conclusão e, mais ainda, a invocação de alegadas ambiguidades e obscuridades da sentença, não pode servir para justificar a discordância quanto ao decidido», situação que se verifica no caso em apreço. No tocante à invocada nulidade de condenação «em objeto diverso do pedido», adere-se na íntegra à bem fundamentada apreciação feita pelo tribunal recorrido, acrescentando-se ainda que os autores formularam pedido de condenação dos RR. a verem implantados marcos por peritos a nomear que definam rigorosamente a estrema norte do prédio dos AA. por forma a que tais marcos definam também rigorosamente a linha divisória entre o prédio dos AA. e o prédio com que este confronta a norte. Assim sendo, é perfeitamente natural que a demarcação feita na sentença corresponda à que foi produzida pela prova pericial, por ser a única precisa, e que não foi refutada por outros elementos probatórios. Não se verificam, portanto, as nulidades da sentença suscitadas. c). Se a decisão recorrida incorreu em erro de julgamento pois refere a norma do artigo 1354º do C.C. na motivação de direito, mas não a aplica, e relativamente à condenação em custas dos apelantes, na totalidade, quando apenas deveriam ter sido condenados na proporção do seu decaimento, nos termos do art. 527º nº 2 do C.P.C.? Os apelantes sustentam que a sentença violou a norma constante do ART. 1354º do Código Civil (CC), pois nos «termos do Nº 1 desse artigo A demarcação é feita de conformidade … com a posse em que estejam os confinantes ou segundo o que resultar de outros meios de prova. Ora a sentença, conforme o supra exposto, apenas valorizou o relatório pericial e não teve em consideração nem outros documentos, nem o depoimento da única testemunha credível e que depôs de forma espontânea e isenta em audiência. Mas se ainda assim o tribunal, após toda a audiência e ponderadas todas as provas ficasse com dúvidas, só tinha que fazer o que a lei lhe permite, ou seja o Nº 2 do mesmo artigo Se … a questão não puder ser resolvida pela posse ou por outro meio de prova a demarcação faz-se distribuindo o terreno em litígio por partes iguais.” O terreno em litígio no caso sub judice é tão só a estrema norte do prédio 100 dos Recorrentes, no ponto em que intercepta o Caminho dos Cabecinhos e que tem sido deslocada para dentro do seu prédio pelo alargamento sistemático e progressivo da entrada da faixa que os Recorrentes acordaram como pertencente ao prédio dos Recorridos». A fundamentação jurídica da decisão recorrida é, neste segmento, a seguinte: «No dizer de António carvalho Martins in “Demarcação”, 2ª ed., p. 17 “O legislador não define a demarcação, nem o direito de demarcação. No artigo 1353º do Código Civil diz, apenas, que o proprietário pode obrigar os donos dos prédios confinantes a concorrerem para a demarcação das estremas entre o seu prédio e o deles. A demarcação é a operação material de colocar marcos ou sinais exteriores permanentes e visíveis, que assinalem diversos pontos da linha divisória entre dois prédios contíguos, sendo licito também aproveitar para o mesmo fim sinais já existentes, tais como um rochedo, um combro, uma árvore, na qual podem ser gravadas as iniciais de um dos proprietários. Em regra os marcos são feitos de pedra, na qual podem ser igualmente gravadas as iniciais, o monograma ou qualquer outro distintivo e, neste caso, é costume serem os marcos colocados de modo que os ditos sinais fiquem virados para o terreno do proprietário a quem eles não pertencem.”. No que concerne ao modo de proceder à demarcação, dispõe o art. 1354º, sob essa mesma epígrafe que: “1. A demarcação é feita de conformidade com os títulos de cada um e, na falta de títulos suficientes, de harmonia com a posse em que estejam os confinantes ou segundo o que resultar de outros meios de prova. 2. Se os títulos não determinarem os limites dos prédios ou a área pertencente a cada proprietário, e a questão não puder ser resolvida pela posse ou por outro meio de prova, a demarcação faz-se distribuindo o terreno em litígio por partes iguais. 3. Se os títulos indicarem um espaço maior ou menor do que o abrangido pela totalidade do terreno, atribuir-se-á a falta ou o acréscimo proporcionalmente à parte de cada um.”. Ora, no caso dos presentes autos, logrou produzir-se prova no sentido do local preciso onde se situam as estremas do prédio de AA. e RR.. Resultou da prova produzida que a demarcação nos termos pretendidos pelos AA., ou seja, através de uma linha reta que passe pelas três pedras por estes indicadas como marcos, e que se conclui não serem, implicaria a ocupação de parte da passagem pertencente ao prédio dos RR.. Aliás, da prova produzida nos presentes autos resulta também que a estrema atualmente existente no terreno se traduz já numa ocupação pelos prédios … e … dos AA. de parte da passagem do prédio 94 dos RR., sendo que a largura da passagem de acesso para o prédio … é de 6,23 m junto à estrada e de 6,5metros no fim da mesma. Nesta conformidade, procede parcialmente a pretensão dos AA., devendo proceder-se à demarcação dos prédios … e … dos AA. e do prédio … dos RR., assinalando no terreno as respetivas estremas de acordo com as medidas e plantas constantes do relatório junto aos autos de fls. 276 a 292. » Na acção de demarcação, a causa de pedir traduz-se no facto complexo da existência de prédios confinantes, de proprietários distintos e de estremas incertas ou duvidosas (Alberto dos Reis, Processo Especiais, II, 1982, pág. 13). «É por isso que o direito de demarcação é tido como um direito de natureza pessoal – e, consequentemente, a acção de demarcação é uma acção pessoal – pois que trata, tão-só, de obrigar o proprietário confinante a participar na investigação e marcação dos limites do seu prédio; logo, a uma prestação de natureza pessoal e não real porque não está em causa a propriedade nem o seu desmembramento» (Acórdão do S.T.J. de 10.05.2012, disponível no sítio da internet do IGFEJ). Quando existe controvérsia sobre a linha divisória entre os prédios confinantes, como sucede na situação em apreço, o modo de realizar a demarcação está regulamentada no artigo 1354º do C.C., em termos de subsidiariedade sucessiva, tal como foi equacionado pelo tribunal recorrido, que concluiu terem-se produzido os meios de prova quanto ao local preciso onde se situam as estremas dos prédios. Por consequência, não é aplicável o critério preconizado na última parte do artigo 1354º nº 2, de dividir a área de terreno em partes iguais, entre os proprietários em conflito, pois esta solução só deve ser seguida quando não é possível fazer a delimitação por outro meios. Na elaboração da sentença, há que seguir a metodologia consagrada no artigo 608º, nº2, do Código de Processo Civil, segundo a qual “O juiz deve resolver todas as questões que as partes tenham submetido à sua apreciação, excetuadas aquelas cuja decisão esteja prejudicada pela solução dada a outras; não pode ocupar-se senão das questões suscitadas pelas partes, salvo se a lei lhe permitir ou impuser o conhecimento oficioso de outras.” Se os factos obtidos mediante a prova produzida permitiram ao tribunal recorrido fazer a demarcação, mostram-se prejudicadas ou afastadas as demais soluções preconizadas no citado artigo 1354º nº 3. Finalmente, os apelantes insurgem-se quanto à condenação em custas, que ficaram integralmente a seu cargo, quando a acção foi julgada parcialmente procedente. A decisão que julgue a acção ou algum dos seus incidentes ou recursos condena em custas a parte que a elas houver dado causa ou, não havendo vencimento da acção, quem do processo tirou proveito, por força do disposto no nº 1 do artigo 527º do C.P.C. O valor da causa fixado pelo tribunal diz respeito aos pedidos de condenação pecuniária formulados pelos autores que não obtiveram provimento. Além disso, e tal como se assinala nas contra-alegações, a sentença deu como provada a demarcação tendo por base uma largura da faixa de terreno de, pelo menos, 4,50m (cfr. Artigo 14º da contestação), pelo que os apelados não foram vencidos e foram os apelantes que deram causa à acção. Nesta sequência, as conclusões recursórias não merecem qualquer acolhimento. * DECISÃO Em face do exposto, acorda-se em julgar a apelação improcedente e em manter a decisão recorrida. Custas a cargo dos apelantes. Lisboa, 11.10.2018, Ana Paula Albarran Carvalho Gabriela Fátima Marques Adeodato Brotas |