Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa | |||
Processo: |
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Relator: | JORGE ALMEIDA ESTEVES | ||
Descritores: | EMBARGOS EXTINÇÃO DA EXECUÇÃO AGENTE DE EXECUÇÃO COMUNICAÇÃO LAPSO | ||
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Nº do Documento: | RL | ||
Data do Acordão: | 09/11/2025 | ||
Votação: | UNANIMIDADE | ||
Texto Integral: | S | ||
Texto Parcial: | N | ||
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Meio Processual: | APELAÇÃO | ||
Decisão: | PROCEDENTE | ||
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Sumário: | SUMÁRIO (da responsabilidade do relator) I- Nos termos do artº 732º/4 do CPC, a procedência dos embargos extingue a execução, no todo ou em parte, sendo que o preceito se refere à procedência, efetiva, real. II- Tendo o agente de execução efetuado uma comunicação, ao Tribunal e às partes, onde refere a extinção da execução em virtude da procedência dos embargos, quando, na realidade, os autos de embargos de executado ainda estavam pendentes, não tendo sido proferida qualquer decisão de mérito, tal comunicação não produz qualquer efeito. III- Estamos perante um ato meramente declarativo, pois mesmo que o agente de execução não comunique a extinção com fundamento na procedência dos embargos, essa extinção opera de igual modo. IV- Daí que os exequentes não tinham de deduzir reclamação contra tal comunicação, na medida em que a realidade oficiosamente conhecida pelo Tribunal a quo se encarregava de desmentir o que havia sido comunicado pelo agente de execução. V- O lapso cometido podia – e devia – ser corrigido a todo o tempo, devendo ter sido determinado o prosseguimento da execução em face do requerimento dos exequentes a alertar para tal lapso. | ||
Decisão Texto Parcial: | ![]() | ||
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Decisão Texto Integral: | Acordam os Juízes Desembargadores que compõem este Coletivo da 6ª Secção do Tribunal da Relação de Lisboa RELATÓRIO Recorrentes-exequentes: AA e BB Recorridos-executados: CC, DD e EE Os recorrentes instauraram processo de execução para pagamento de quantia certa contra os recorridos, tendo estes deduzido oposição mediante embargos. Compulsado o processo eletrónico constata-se que tais embargos estão pendentes, constituindo o apenso D. O último ato processual praticado foi a notificação da contestação apresentada pelos exequentes-embargantes aos executados-embargados, efetuada em 02.11.2023. Em 28.03.2024 o agente de execução comunicou aos autos o seguinte: “FF, Agente de Execução nos autos supra identificados, vem, no prosseguimento do despacho proferido com a referência 430644158, foi ordenada a extinção da presente execução nos termos do nº 4 do artigo 732º, expor o seguinte: - Procedeu-se a citação previa dos Executados, tendo sido posteriormente deduzida oposição, que foi considerado procedente; - Nos termos e para efeitos do disposto nos arts. 29º e 25º do RCP, encontra-se assegurado o pagamento ao Agente de Execução e demais custas processuais Pelo que, cumpre decidir: Julgar extinta a presente acção executiva, por procedência dos embargos, nos termos conjugados do nº 4 do artigo 732º e alínea f) do nº 1 do artigo 849º ambos do CPC. Da decisão de extinção será notificada a Exequente e os Executados, nos termos do nº 2 e 3 do art. 849º do CPC”. Essa comunicação foi notificada na mesma data aos mandatários das partes. Em 15.07.2024 o agente de execução dirigiu ao Juiz da causa o seguinte requerimento: “FF, Agente de Execução nomeados nos presentes autos, vem, mui respeitosamente, expor e requerer douta conclusão de V/ Exa. relativamente ao seguinte: - no seguimento da notificação efetuada ao ora signatário no âmbito dos presentes autos com a referência 431348678 datada de 18/12/2023, foi proferida decisão a determinar o levantamento do arresto. - o ora signatário a 19/01/2024 procedeu com notificação, conforme cópia que se junta, à Mandatária do Exequente Dra. GG, da nota discriminativa com vista à extinção da execução face ao despacho proferido nos autos, estando mencionando no conteúdo na referida notificação. - A respetiva notificação foi reiterada a Mandatário do Exequente a 16/02/2024 e a 16/03/2024, conforme se junta, sendo que em ambas as notificações estão mencionadas que se reitera os honorários e despesas do Agente de Execução com vista à devida extinção dos autos. - a 28/03/2024 o ora signatário promoveu a decisão de extinção e notificação a todas as partes, conforme se junta. - face as notificações efetuadas onde se decide a extinção dos autos, não houve qualquer comunicação ou indicação em contrário das partes. - a 10/07/2024 foi recebido pelo Agente de Execução comunicação nos autos por parte da Mandatária do Exequente, conforme se junta, a requerer o levantamento da extinção por não existir ainda conclusão dos embargos existentes nos autos. Face ao exposto e não tendo o ora signatário atualmente acesso, através da plataforma GPESE/SISAAE, dos possíveis processos dependentes (Apensos) existentes nos autos solicita-se a V.Exa., mui respeitosamente, douta conclusão quanto ao levantamento da extinção proferida nos presentes autos, consequente renovação da instância. Pede douta conclusão”. O requerimento dos exequentes a que se reporta o agente de execução na exposição supra é do seguinte teor: “BB e AA, Exequentes nos autos supra mencionados, tendo no dia de se apercebido do lapso constante na presente execução que, ERRONEAMENTE foi declarada extinta por decisão da AE sem qualquer fundamento, tendo inclusive sido pagos os honorários em conformidade, vem muito respeitosamente requerer a V. EXA. se digne LEVANTAR A EXTINÇÃO DA INSTÂNCIA, anulando a decisão de V. Exa. que só por lapso manifesto terá ocorrido, devendo V. Exa. tramitar os presentes autos seguindo os seus termos normais, renovando a instância, DEVENDO A MESMA SEGUIR OS SEUS NORMAIS TRÂMITES, uma vez que não existe ainda qualquer decisão sobre os embargos ao contrário do que é mencionado por V. Exa. enquanto fundamento da decisão de extinção de instância”. Os exequentes haviam também instaurado, por apenso, em 28.06.2023, um procedimento cautelar de arresto contra os executados, que foi julgado procedente. Após oposição dos requeridos-executados, em virtude da procedência desta, foi determinado o levantamento do arresto que havia sido decretado em face do requerimento inicial. Em face do requerimento de 15.07.2024 do agente de execução, foi proferida a seguinte decisão: “Estipula-se no artigo 719º, nº. 1 (sob a epigrafe “Repartição de competências”) do CPC, que “Cabe ao agente de execução efectuar todas as diligências do processo executivo que não estejam atribuídas à secretaria ou sejam da competência do juiz (...).” Decorre daí que a intervenção do AE no processo executivo é subsidiária, em relação à secretaria e ao juiz, constituindo ainda entendimento prevalecente (decorrente do seu Estatuto, aprovado pela Lei nº. 154/2015, de 19/9, e do demais direito positivo) que a relação entre o juiz e o agente de execução não se pauta por uma relação hierárquica do segundo para com o primeiro, inexistindo da parte deste um poder geral de controlo sobre a actuação do segundo, que não se confunde com o controle jurisdicional previsto no artº. 723º. Estipula-se neste no número 1 deste último normativo que “sem prejuízo de outras intervenções que a lei especificamente lhe atribui, compete ao juiz: a) Proferir despacho liminar, quando deva ter lugar; b) Julgar a oposição à execução, e penhora, bem como verificar a graduar em os créditos, no prazo máximo de três messes contados da oposição ou reclamação; c) Julgar, sem possibilidade de recurso, as reclamações de actos e impugnações de decisões do agente de execução, no prazo de 10 dias; d) Decidir outras questões suscitadas pelo agente de execução, pelas partes ou por terceiros intervenientes, no prazo de cinco dias. 2- (…) “. Daí resulta (als. c) e d) do nº. 1 citado artº. 723º) que as partes ou outros terceiros intervenientes, que com eles se sintam afectados, podem reclamar dos actos ou impugnar as decisões dos agentes de execução (no prazo de 10 dias a contar da sua notificação ou conhecimento – artº. 149º, nº. 1, do CPC). E se o não fizerem, qual o efeito do acto ou decisão proferida pelo AE? Abordando esta temática (em excelente artigo publicado no Blog do Instituto Português do Processo Civil – coordenado pelo prof. Miguel Teixeira de Sousa -, sobre o título “O Caso estabilizado dos actos e decisões dos agentes de execução (Contributos para uma teoria geral dos actos e das decisões do agente de execução”)), J. H. Delgado de Carvalho, escreve a dado passo (págs. 8 e 9) “(…) Defendemos, por isso, que a melhor designação para os actos ou decisões do agente de execução consolidados por inimpugnabilidade, tendo em conta as particularidades da sua força ou eficácia vinculativa, é a de caso estabilizado, dando, assim, relevo ao efeito decorrente da sua definitividade. Noutras palavras, os actos e as decisões do agente de execução tornam‐se definitivas sempre que, depois de notificadas às partes, estas não reclamarem do acto ou da decisão perante o juiz, nos termos do art. 723.º, n.º 1, als. c) ou d), do CPC. Disto decorre que, se o acto ou a decisão daquele agente não for objecto de reclamação pelas partes, o acto ou a decisão torna‐se incontestável e inalterável, dado que deixa de ser atacável por iniciativa de qualquer das partes; pode falar‐se a este propósito num efeito semelhante ao trânsito em julgado da decisão judicial, ou seja, esse acto ou decisão torna‐se, em princípio, imodificável. Por seu turno, o juiz de execução não pode impor oficiosamente ao agente de execução, depois de este ter praticado um acto ou tomado uma decisão no processo, uma diferente apreciação da mesma questão. A esta solução se opõe, naturalmente, o caso estabilizado formado pelo acto ou decisão do agente de execução. Com efeito, decorre do que acima se argumentou acerca do quadro de legitimação do exercício dos poderes do juiz no processo executivo que este não pode determinar oficiosamente a revogação (anulatória) de um ato praticado ou de uma decisão tomada pelo agente de execução, substituindo‐os por uma diferente tramitação ou solução – seja na área da actuação discricionária desse agente, seja em matéria vinculada –, a não ser mediante reclamação das partes (cf. art. 723.º, n.º 1, als. c) e d), do CPC) ou nos casos em que especificamente a lei autoriza a intervenção fiscalizadora ex officio do juiz, como sucede no domínio dos pressupostos processuais e das nulidades de processo. Note‐se que tão‐pouco o art. 6.º, n.º 1, do CPC habilita o juiz de execução a revogar ou a declarar nulas ex officio as decisões do agente de execução, mesmo no domínio do procedimento. Quer dizer: o art. 6.º, n.º 1, do CPC não pode ser visto como uma norma habilitante que permite ao juiz de execução anular ou corrigir oficiosamente um ato ou uma decisão tomada pelo agente de execução que entretanto se tenha estabilizado, sem que se deva considerar essa iniciativa oficiosa nula nos termos do art. 195.º, n.º 1, do CPC. Com efeito, os poderes de gestão processual do juiz não podem sobrepor-se às decisões definitivas do agente de execução, porque isso colide com o caso estabilizado.” Prosseguindo depois (pág. 13) “(…) O ónus de impugnação dos actos e decisões do agente de execução encontra a sua justificação na necessidade de garantir a segurança e certeza jurídicas, a tutela dos direitos das partes e terceiros intervenientes, bem como o prestígio do sistema de justiça”. E no final remata com as seguintes conclusões (págs. 25/26/28): “ (…) a) Uma vez que é inadmissível, face ao direito positivo, um poder geral de controlo do juiz de execução exercido sobre a actuação do agente de execução ex post, há que entender que o esgotamento do poder de decisão do agente de execução, quanto à questão por si decidida, impede que o juiz de execução tenha uma intervenção oficiosa no sentido de contrariar o ato praticado ou a decisão tomada por aquele agente, salvo nos casos em que a lei especificamente autorizar o juiz a decidir de forma distinta. Sendo assim, há que concluir que o acto praticado e a decisão tomada pelo agente de execução, embora com algumas particularidades, gozam das mesmas características do caso julgado, nomeadamente a incontestabilidade e a consolidação num processo pendente, quando deixa de ser impugnável, e a intangibilidade, dado que não pode ser revogada, suspensa ou substituída. Devido a estas características, o caso estabilizado do agente de execução, mesmo não constituindo caso julgado em sentido estrito – por não constar de uma decisão judicial – é, no entanto, a ele equiparado, havendo que aplicar, por analogia, o regime previsto para a eficácia vinculativa da sentença (cf. arts. 613.º, 614.º, 619.º, 620.º, 621.º, 625.º e 628.º do CPC), nomeadamente o princípio do esgotamento da competência decisória do agente de execução e a correcção de erros materiais. Noutras palavras, o acto e a decisão do agente de execução tornam‐se definitivos sempre que, depois de notificada às partes, estas não reclamem do acto ou não impugnem essa decisão perante o juiz, nos termos do art. 723.º, n.º 1, als. c) ou d), do CPC. Disto decorre que, se o acto ou a decisão daquele agente não for objecto de reclamação ou de impugnação pelas partes, o acto praticado e a decisão tomada tornam‐se incontestáveis e inalteráveis, dado que se tornam inatacáveis por iniciativa de qualquer das partes; pode falar‐se a este propósito de um efeito vinculativo semelhante ao trânsito em julgado da decisão judicial. Por seu turno, o juiz de execução não pode impor ao agente de execução, depois de este ter praticado um ato ou tomado uma decisão no processo, uma diferente apreciação da mesma questão. A esta solução se opõe, naturalmente, o caso estabilizado formado pelo ato ou decisão anterior do agente de execução. Com efeito, decorre do que acima se argumentou quanto ao quadro de legitimação do exercício dos poderes do juiz no processo executivo, que este não pode determinar oficiosamente a revogação (anulatória) de um ato praticado ou de uma decisão tomada pelo agente de execução, substituindo‐a por uma diferente tramitação ou solução – seja na área da actuação discricionária desse agente, seja em matéria vinculada –, a não ser mediante reclamação das partes (cf. art. 723.º, n.º 1, als. c) e d), do CPC) ou nos casos em que especificamente a lei autoriza a intervenção fiscalizadora do juiz. Note‐se que tão‐pouco o art. 6.º, n.º 1 do CPC habilita o juiz de execução a revogar ex officio as decisões do agente de execução, mesmo no domínio dos actos de procedimento. Quer dizer: o art. 6.º, n.º 1, do CPC não pode ser visto como uma norma habilitante que permite ao juiz de execução anular ou corrigir oficiosamente um ato realizado ou uma decisão tomada pelo agente de execução que se tenha tornado inimpugnável, devendo considerar‐se essa iniciativa oficiosa nula nos termos do art. 195.º, n.º 1, do nCPC. Os poderes de gestão processual do juiz não podem sobrepor‐se aos actos e às decisões definitivas do agente de execução, porque isso colide com a estabilização dos efeitos dessas decisões. Considerando as premissas supra expostas, cumpre concluir que o acto praticado e a decisão tomada pelo agente de execução se tornam incontestáveis – e, por isso, não passível de substituição – depois de não serem susceptíveis de reclamação ou de impugnação, no prazo geral de 10 ( dez ) dias previstos na lei. Ora, o exequente foi notificado da decisão de extinção da execução em Março de 2024, e só no dia 10/07/2024 é que fez um requerimento dirigido ao AE solicitando a renovação da instância executiva, ou seja, tal requerimento nem sequer consubstancia uma reclamação dirigida ao Juiz do processo. Por conseguinte, torna-se um acto inútil convolar aquele requerimento em articulado de impugnação ou reclamação daquela decisão de extinção da execução, já que o mesmo sempre teria de ser considerado extemporâneo. Pelo exposto, resta-nos concluir que a decisão do Sr. AE, por não ter sido impugnada judicialmente no tempo devido consolidou-se e, como tal não pode agora ser alterada pelo Tribunal ( neste sentido ainda se pode consultar o Ac. da RL de 30/06/2020, cuja relatora foi a Drª Cristina Coelho e Ac. da RE de 23/05/2022, cujo relator foi o Dr. José Lúcio )”. * Inconformados com o decidido, apelaram os exequentes, tendo apresentado alegações e conclusões. Neste Tribunal foi proferido o seguinte despacho, nos termos do artº 639º/3 do CPC: “Compulsadas as alegações e conclusões do recurso, constata-se que os recorrentes apresentaram alegações com 61 pontos e apresentaram conclusões com 58 pontos (tendo sido usada a numeração romana nestas últimas talvez para disfarçar a similitude numérica). Obviamente que não estamos perante verdadeiras conclusões na aceção legal do termo, conforme resulta do disposto no artº 639º/1 do CPC, pois não existe qualquer síntese, mas antes uma mera cópia das alegações, o que é inadmissível, sendo que de conclusões têm apenas o nome que os recorrentes lhe deram, pois nestas até reproduzem inúmeras decisões proferidas nos autos, o que não faz qualquer sentido (já estão transcritas nas alegações e as conclusões devem cingir-se ao que consta do artº 639º/2 do CPC). Acresce que só existe uma questão a apreciar, sendo as próprias alegações já por si manifestamente extensas e repetitivas. Assim, nos termos do artº 639º/3 do CPC convido os recorrentes a apresentar requerimento no qual sintetizem as conclusões em 10 pontos, que se afiguram mais do que suficientes, atenta a questão em causa, com as cominações constantes desse preceito, que se aplica ao recurso na sua totalidade”. Em cumprimento do determinado os recorrentes vieram apresentar as seguintes conclusões: i. Ora, temos que a decisão de extinção da instância proferido pelo Ex.mo Sr. Agente de Execução, datada de 28-03-2024, ocorreu apenas por erro grosseiro e negligência grave; ii. Pois que, como se verificou dos autos, a sobredita decisão de extinção da instância que fora proferida, dizia respeito à oposição considerada procedente no apenso – A dos autos (procedimento cautelar), como veio depois esclarecer o agente de execução; iii. Logo, não dizendo respeito aos autos principais e aos apensos C e D, que estão na sua dependência (da ação principal); iv. Como tal, e referindo-se a extinção da instância, proferida pelo Agente de Execução, meramente ao apenso A, procedimento cautelar, é de se considerar nulo o douto despacho proferido pelo tribunal a quo, datado de 09-12-2024, que confirmou que havia ocorrido a extinção da instância principal; v. O referido despacho, violou, assim, o direito dos Recorrentes se socorrerem dos tribunais, com o intuito de verem as suas pretensões de mérito reguladas e apreciadas; vi. Bem como o direito a um processo justo e equitativo, observando-se o contraditório e igualdade de armas, com vista à justa composição do litígio; vii. Pelo que, não poderá ocorrer a extinção da instância executiva quanto aos autos principais, enquanto não ocorrer decisão de mérito transitada em julgado, quanto aos apensos C e D, que estão na dependência da ação principal; viii. E se suceder por erro, como sucedeu in casu, trata-se de uma decisão ferida de nulidade, que pode ser arguida a todo o tempo e que não poderá produzir efeitos na ordem jurídica; ix. Por tal razão, o douto despacho de 09-12-2024, com referência citius 440946354, proferido pelo tribunal a quo, deve ser considerado nulo, porquanto se encontra ferido da aludida nulidade de violação de lei; x. Em consequência, deve o despacho a que se alude, de 09-12-2024, ser revogado e substituído por outro que, com base nos argumentos já aduzidos, que se dão por reproduzidos, ordene o prosseguimento dos presentes autos, bem como que aprecie os embargos de executado e contestação oferecida (apensos C e D) destes autos). * Não foram apresentadas contra-alegações. * FUNDAMENTAÇÃO Colhidos os vistos cumpre decidir. Objeto do Recurso O objeto do recurso é balizado pelo teor do requerimento de interposição (artº 635º nº 2 do CPC), pelas conclusões (artºs 635º nº 4, 639º nº 1 e 640º do CPC), pelas questões suscitadas pelo recorrido nas contra-alegações em oposição àquelas, ou por ampliação (artº 636º CPC) e sem embargo de eventual recurso subordinado (artº 633º CPC) e ainda pelas questões de conhecimento oficioso cuja apreciação ainda não se mostre precludida. Assim, em face das conclusões apresentadas pelos recorrentes, a questão a apreciar é a de determinar se a comunicação efetuada pelo agente de execução a declarar extinta a execução com o fundamento - erróneo - da procedência dos embargos de executado, produziu efeitos e, não tendo sido impugnada no prazo que os exequentes tinham para o efeito, tornou-se definitiva, como se entendeu na decisão recorrida, ou tal comunicação é inválida, podendo ser impugnada em qualquer altura, como pretendem os recorrentes. * A factualidade a atender para a decisão da apelação é a que consta do relatório supra. * Fundamentação jurídica No presente recurso os recorrentes impugnam a decisão que considerou inimpugnável, por extemporaneidade, a comunicação efetuada pelo agente de execução a dar por extinta a execução em virtude da procedência dos embargos. Tal comunicação foi manifestamente errónea, pois na realidade os embargos ainda não foram decididos, estando na fase em que os articulados admissíveis foram apresentados. Vejamos o seguimento processual que, em face da decisão recorrida, teria de ser seguido no que concerne aos embargos de executado. Não sendo admissível a impugnação da “decisão” (na aceção da decisão recorrida) contida na comunicação de extinção da execução, essa extinção operou os seus efeitos. Mas, mantendo-se, na realidade, pendentes os embargos, pois o fundamento invocado para a extinção da execução não existia, qual o destino daqueles? Estando extinta a execução, os embargos perderam interesse, devendo, portanto, ser declarados supervenientemente inúteis em virtude da extinção da execução com fundamento na… procedência dos embargos. Temos aqui, portanto, um círculo vicioso, uma vez que a extinção dos embargos ocorre em virtude de uma comunicação do agente de execução a dizer que eles foram julgados procedentes, indo tudo, portanto, desembocar na mesma “decisão” do agente de execução. Ou seja, sendo válida a interpretação levada a efeito pelo Tribunal a quo, a errónea comunicação efetuada pelo agente de execução extinguiria de uma só vez, quer a execução, quer os embargos. E tudo isto acontecia porque os exequentes, em face da tal comunicação manifestamente errónea, nada fizeram contra ela no prazo para o efeito. Ainda que esta interpretação fosse, eventualmente, admissível em face das normas legais constantes do CPC, seria manifestamente inconstitucional por violação do princípio da reserva de jurisdição ínsito no artº 202º da Constituição da República Portuguesa, o qual estabelece que a função jurisdicional (ou seja, a tomada de decisões em sede de conflitos de interesses públicos ou privados) deve, por imperativo constitucional, ser exercida exclusivamente pelos tribunais, com o objetivo de proteger a administração da justiça e os direitos dos cidadãos contra a interferência de outros poderes do Estado, como a administração ou o legislador. Este princípio garante não só que a decisão seja tomada por um juiz, mas também que o seja através de um processo judicial tipicamente jurisdicional, com o devido procedimento. Este princípio seria violado na medida em que a interpretação acolhida pelo Tribunal a quo redundaria na atribuição ao agente de execução do poder de decidir sobre a matéria dos embargos, a qual, envolvendo um conflito de interesses material, está necessariamente abrangida pela reserva de juiz ou reserva de jurisdição. E é isso mesmo que resulta da lei processual, pois o artº 723º/1, al. b) do CPC, estatui que compete ao juiz julgar a oposição à execução. Mas, em todo o caso, do regime legal resulta a inadmissibilidade da posição assumida pelo Tribunal a quo e plasmada na decisão recorrida. Apesar de, em tese, serem corretos os considerandos relativos à impugnação das decisões do agente de execução, em especial na parte em que cita doutrina e jurisprudência, a sua aplicação ao caso concreto não está de acordo com o regime legal. Nos termos do artº 732º/4 do CPC, a procedência dos embargos extingue a execução, no todo ou em parte. Ora, é a procedência, efetiva, real, que a lei, como é óbvio, está a referir e não uma mera comunicação de uma procedência que não existe, ainda para mais efetuada por um sujeito processual de caráter não jurisdicional. Nem sequer estamos perante um ato vinculado. Estamos perante um ato meramente declarativo, pois mesmo que o agente de execução não comunique a extinção com fundamento na procedência dos embargos, essa extinção opera de igual modo. Por isso é completamente irrelevante a comunicação de extinção da execução com fundamento numa inexistente procedência dos embargos, que o próprio agente de execução veio aos autos reconhecer que se tratou de um mero lapso. Também nem sequer está em causa a inexistência, ineficácia ou invalidade do ato praticado pelo agente de execução. Tais figuras jurídicas pressupõem que o ato seria suscetível de poder produzir alguma eficácia jurídica no que respeita à extinção da execução. Ora, nem mesmo isso acontece. A lei só atribui eficácia extintiva da execução à decisão efetiva que incidiu sobre os embargos, julgando-os procedentes, não é à comunicação do agente de execução. Daí que os recorrentes não tinham que deduzir reclamação contra tal comunicação. Tendo eles sido notificados de uma comunicação manifestamente errónea, pois sabiam que os embargos ainda estavam pendentes, não havendo ainda qualquer decisão, e tendo o Tribunal a quo, como é evidente, também conhecimento dessa pendência, uma vez que a realidade oficiosamente conhecida pelo Tribunal a quo se encarregava de desmentir o que havia sido comunicado pelo agente de execução, nada precisavam de fazer, para além daquilo que fizeram por via do requerimento que dirigiram ao agente de execução, no qual o alertaram para o lapso cometido, pois até aquele momento o Tribunal a quo ainda não o tinha feito. O recurso deve ser julgado integralmente procedente, revogando-se a decisão recorrida e determinando-se o prosseguimento da execução. *** DECISÃO Face ao exposto, acordam os Juízes Desembargadores que compõem este coletivo da 6ª Secção do Tribunal da Relação de Lisboa em julgar o recurso procedente, e, em consequência, determina-se o prosseguimento da execução. Custas pelos embargantes-recorridos em ambas as instâncias (artº 527º/1 e 2 do CPC). TRL, 11set2025 Jorge Almeida Esteves Vera Antunes Adeodato Brotas |