Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa
Processo:
6213/24.2T8ALM.L1-2
Relator: JOÃO PAULO VASCONCELOS RAPOSO
Descritores: CONTRATO PROMESSA
DIREITO DE RETENÇÃO
TRADIÇÃO
CONSUMIDOR
Nº do Documento: RL
Data do Acordão: 10/23/2025
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Texto Parcial: N
Meio Processual: APELAÇÃO
Decisão: PROCEDENTE
Sumário: Sumário (da responsabilidade do relator):
I. Goza de direito de retenção o promitente comprador de imóvel, com tradição do bem, pelo seu crédito de sinal;
II. A tradição corresponde a uma transferência de domínio material efetivo sobre o bem, que pode assumir múltiplas formas, mas implica sempre uma renúncia ao bem de quem o cede e uma apreensão por quem o recebe;
III. Para que exista uma efetiva tradição, o domínio material do bem tem que ser efetivo, mas pode ser exercido de mão própria ou por meio de terceiros, em nome daquele a quem o bem foi entregue;
IV. O direito de retenção do promitente comprador não exige uma qualidade de consumidor quando as partes no negócio sejam ambas particulares ou não atuem com propósitos lucrativos, assim devendo ser interpretada a doutrina dos AUJ n.º 4/2014 e n.º 4/2019.
Decisão Texto Parcial:
Decisão Texto Integral: Decisão:
I. Caracterização do recurso:
I.I. Elementos objetivos:
- Apelação – 1 (uma), nos autos;
- Tribunal recorrido – Juízo Central Cível de Almada - Juiz 3;
- Processo em que foi proferida a decisão recorrida – procedimento cautelar n.º 6213/24.2T8ALM;
- Decisão recorrida – Sentença.
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I.II. Elementos subjetivos:
- Recorrentes (oponentes):
- AA;
- BB;
- Requerida (não recorrente):
- CC
- Recorridos (requerentes):
- DD;
- EE. --
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I.III. Síntese dos autos:
- Instauraram os requerentes supra referidos procedimento cautelar não especificado contra AA; -BB e CC.
- Pedem que seja entregue ao requerente EE o prédio urbano sito na ---, freguesia de Cova da Piedade, concelho de Almada, descrito na Segunda Conservatória do Registo Predial de Almada sob o nº --- da aludida freguesia e inscrito na matriz predial urbana sob os ---, da União de Freguesias de Laranjeiro e Feijó;
- Alegam, em síntese:
- Que a requerente adquiriu o prédio supra referido por sucessão hereditária;
- Que os requerentes celebraram entre si contrato-promessa de compra e venda do prédio;
- Que, em 26 de julho de 2024, foi celebrada escritura pública definitiva;
- Que o requerente, após a compra, dirigiu-se ao imóvel e verificou que este estava ocupada pela requerida CC, tendo esta afirmado encontrar-se ali a residir com autorização dos requeridos AA e BB, a quem pagaria uma prestação mensal no valor de € 500,00 (quinhentos euros);
- Os requeridos são perentórios em não restituir o imóvel ao seu proprietário, impedindo a entrada do mesmo mediante a aposição de um cadeado, tendo o requerido, inclusivamente, proferido ameaças aos requerentes.
- Foi dispensada a realização de contraditório antecipado e determinada produção de prova arrolada pelos requerentes;
- Na sequência, foi proferida decisão, cujo dispositivo tem o seguinte teor:
- Em face do exposto e tudo ponderado, o Tribunal decide julgar o presente procedimento cautelar procedente, por provado, e em conformidade ordena aos Requeridos AA, BB e CC que procedam à entrega ao Requerente EE do prédio urbano (...).
- Citados os requeridos, vieram os 1.ª e 2.ª (AA e BB) deduzir oposição, concluindo do seguinte modo:
- Ser declarada a ilegitimidade do requerente EE;
- Ser procedente a oposição e, consequentemente, ser revogada a providência decretada, com imediata execução da sentença que ordenou a entrega do imóvel, e ser restituído o mesmo aos requeridos agora opoentes.
- Sustentam a sua pretensão dizendo:
- A requerente só recentemente adquiriu o prédio em partilha, na qualidade de herdeira única do anterior proprietário;
- Nessa qualidade, celebrou com os requeridos contrato-promessa de compra e venda do imóvel;
- Conluiada com o requerente, incumpriu-o, vendendo a este o imóvel;
- O requerente EE tem pleno conhecimento de que o referido imóvel tinha sido prometido vender aos requeridos e se encontrava ocupado, por cedência à requerida CC;
- Os requeridos acordaram a venda do imóvel com a requerente e foram pagando mensalmente o preço acordado, tendo adiantado também valores para satisfação de obrigações da requerente;
- Em 13 de janeiro de 2022, estando pago o valor global de €24.000 por conta do preço, foi outorgada procuração a favor do requerido marido concedendo-lhe poderes em relação ao imóvel, tendo, a partir de então, começado a administrá-lo;
- Foi no exercício desses poderes que cederam o imóvel, a título precário, à requerida CC;
- Deixaram de conseguir contactar a requerida e vieram depois a saber que celebrara escritura de compra e venda com terceiro (o requerente).
- Foi proferido despacho declarando improcedente a suscitada exceção de ilegitimidade;
- Apresentado documento registal atualizado e verificando-se o averbamento de recusas de inscrição, determinou o tribunal que se oficiasse à Conservatória competente solicitando informação sobre as causas de tais recusas;
- Oficiou em resposta a 2.ª Conservatória do Registo Predial de Almada, enviando cópia de escritura pública de doação do prédio objeto dos autos, celebrada entre a requerente e terceiro, de nome FF;
- Foi designada data para audiência final, que se realizou;
- Na sequência da mesma, foi proferida decisão, cujo dispositivo tem o seguinte teor:
- Decide-se manter, nos seus exatos termos, a decisão cautelar já proferida.
- Desta decisão, não se conformando, apelaram os recorrentes, pelo presente recurso;
- Os recorridos pronunciaram-se pela extemporaneidade do recurso e não apresentaram alegações;
- Foi admitida a apelação e subiram os autos a esta Relação. –
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II. Objeto do recurso:
II.I. Conclusões apresentadas pela recorrente nas suas alegações (assinalando a negrito as questões indicadas):
A. Oposição dos agora Recorrente visava uma reapreciação da manutenção da providência Cautelar movida pelos Requerentes DD como ante possuidora e vendedora e EE como novo proprietário que justificavam a restituição imediata do imóvel objeto por escritura de compra e venda do imóvel identificado nos autos realizada no dia 26706/2024 no notário da Dra., --- em Setúbal, alegando que os requeridos CC, AA e BB ocupavam ilegalmente o imóvel e que afetavam gravemente o património de EE e a possibilidade de DD vir a ter o seu negócio anulado.
B. O Tribunal realizou a audiência de julgamento sem audiência dos Requeridos, tendo decretado de imediato a restituição do imóvel ao Requerente EE, tendo, por consequência de tal decisão, CC e todo o seu agregado familiar sido expulsa do locado, conforme consta do auto de entrega.
C. Os Recorrentes deduziram oposição juntaram provas que não constavam dos autos arrolando testemunhas tendo sido proferida decisão que manteve a providência "in totum”.
D. Não podem os mesmos concordar com tal decisão, porquanto da prova produzida a decisão seria de revogar a providencia cautelar primeiramente decidida
E. Consideram os Recorrentes que a douta sentença violou os artigos 604 e 607 ambos do C.P.C., porquanto foi produzida prova testemunhal e documental que não foi levada em conta e não foi feita a análise crítica da prova quanto ao depoimento de parte dos requerentes e do Opoente AA, bem como da testemunha CC que a ter sido levada em conta na douta sentença.
F. deveriam ter sido como provados, não tendo a julgadora levado em consideração na sua decisão, violando o disposto no artigo 645 do C.P.C., não se pronunciando sobre questões que devia conhecer não fazendo a análise critica da prova
G. O depoimento de Parte da Requerente DD é esclarecedor quanto ao Requerente EE tinha conhecimento de que a casa estava ocupada quando se dirigiu ao imóvel, tanto mais que no seu depoimento a DD entra em contradição quando diz que não sabia se estavam lá pessoas, pensava que se tinham ido embora o que denota que sabia que tinha passado uma procuração ao AA e que o mesmo tinha poderes para arrendar o imóvel e estavam lá pessoas dia 29/8/2024 Minutos 00.10.57 a 00.12.21.
H. Conforme se pode constatar o depoimento de DD é eivado de falsidades porquanto a mesma nega ter assinado vários documentos, apenas assume a procuração, justificando que não consegui ler e que assinada conforme indicações da advogada que o AA arranjou, quando a mesma assinou pelo menos cinco documentos todos assinados pelo seu próprio punho conforme consta da matéria provada nos nºs 24 26 designadamente Contrato promessa de compra em venda em 1/07/2021, declaração de 6/01/20222;procuração em 13.01.2022 e contrato promessa de Doação em 10/05/2023, Doação a favor de FF em 13/6/2024 e por ultimo escritura pública a favor do requerente em 26/06/2024 a escritura de compra e venda ao requerente EE.
I. Perante tal depoimento toda a versão da Requerente DD deveria ter sido dada como provada a matéria dada como não provada em xv- e xvi a Requerente DD assinou vários documentos todos reconhecidos por advogados e cuja autenticidade foi apreciada pela juíza a quo e que autorizavam o opoente AA a usar e fruir do imóvel mediante contrato promessa de doação e procuração para arrendar o imóvel.
J. Que perante a analise do dos vários documentos e depoimento da advogada Dra., GG em audiência de julgamento confirmou que todos os documentos por si reconhecidos foram lidos e explicado o seu conteúdo á Requerente DD tendo a mesma assinado de livre e espontânea vontade, conforme consta da douta sentença.
K. A Requerente DD deu poderes de representação e de usufruto ao Opoente AA que tomou posse do imóvel com autorização expressa da Requerente que tinha conhecimento do teor da procuração que autorizava o opoente a tratar de toda a documentação referente ao imóvel bem como arrendar o mesmo conforme resulta plasmado no documento
L. A Requerente nunca se opôs nem sequer quando faz o negócio com o Requerente EE acabando por reconhecer nas suas declarações “que não tinha dado autorização e que pensava que as pessoas se tinham ido embora se pensava que tinham ido embora é porque reconhecia que o opoente AA tinha cedido o imóvel a terceiros”.
M. Com o devido respeito e atenta á decisão de que agora se recorre incorre num juízo de valor dando a entender que o imóvel objeto dos autos foi” assaltado” pelos Opoentes.
N. porquanto não resulta provado que a posse tenha sido transmitida voluntária e conscientemente pela Requerente DD aos Opoentes, a sentença deu como provado que a mesma outorgou contratos promessa, declarações, procurações promessa de Doação com o Opoente AA que a mesma veio a negar em audiência de Julgamento acabando como seria lógico seria condenada como Litigante de má-fé.
O. A a douta sentença levou em conta na apreciação da matéria o depoimento do Requerente EE que confessa nas suas declarações de parte que tinha ido ao local no dia 24 e 25 que tinha constatado que estava ocupado, mas que já tinha entregue o sinal e que estava marcada a escritura.
Declarações Parte EE (quase impercetível!) Dia 29/08/2024 00.24 a 30.00;
P. Devendo assim dar como provado:
- "O Requerente EE tinha conhecimento de problemas no imóvel em data anterior á escritura porque se tinha deslocado ao mesmo pelo menos nos dias 24 e 25 de junho e ainda assim quis realizar a escritura de compra e venda com a requerente DD no dia 26 /6/2024, tendo a na mesma declarado na referida escritura que os imóveis não tinham ónus ou encargos”
Q. Mais confessou e resulta provado que as duas advogadas a da Requerente DD e do próprio EE tinham ido inteirar-se da situação no local junto da CC e telefonando para o Requerente AA insistido para a entrega do imóvel em data anterior a 24 de junho, altura em que surge EE no local tinha o contrato promessa e escritura marcada declarações dia minutos
- A versão do mesmo não colhe para o cidadão médio que o mesmo desconhecesse se o imóvel estava ocupado e as condições do mesmo só o fazendo pessoalmente dos dias antes da realização da escritura
R. De acordo com a prova produzida nos seus depoimentos conjugados com os documentos vide participações da polícia no dia 25/06/2024 resulta que o Requerente EE tinha perfeito conhecimento do litígio que existia entre a Requerente DD e os Opoentes porquanto neste dia lhe foram exibidos os documentos pelo opoente AA.
S. Que o Requerido EE ignorou acabando por outorgar a escritura no dia seguinte 26/06/2024 que conforme resulta plasmado que o imóvel” é transmitido livre de ónus ou encargos” bem sabendo O Requerente EE que nessa mesma data se encontrava a situação de opoente AA por resolver e a CC e família a ocupar a casa.
T. Não se aceita a motivação da douta sentença como válida quando refere que o Requerente queria assinar contrato com a D. CC de arrendamento e a mesma não quis.
U. Quando fez tal proposta ainda não tinha adquirido o imóvel, foi em data anterior á escritura, logo a sua proposta não era seria nem credível além de que a CC respondeu que o assunto seria com o Sr. AA.
V. Com efeito tal análise da prova pela juíza a quo é seriamente duvidosa se o mesmo queria celebrar contrato porque é que o Requerente EE após ter realizado a escritura, e já na qualidade de proprietário não contatou com a CC para regularizar a situação e optou pela providencia cautelar pedindo a desocupação imediata do imóvel da CC e de todo o seu agregado familiar.
W. A confirmar que o Requerente EE tinha conhecimento que o imóvel estava ocupado e havia litígio as declarações de AA do dia 29/01/24 minutos 00.28,08 - 00.30.00 AA
da matéria da Oposição dada como provada “A advogada da Requerente entre junho julho de 2024 tentou aferir a situação do imóvel.
da matéria da Oposição dada como provada “A Mandatária da Requerente igualmente contatou com a Requerida CC. da matéria dada como provada da Oposição-Em meados de junho de 2024 o Requerente EE, acompanhado de duas advogadas, dirigiu-se á CC com intenção de que a mesma pudesse explicitar o motivo do uso do imóvel e eventual necessidade de celebrar outro contrato e sair do imóvel.
da matéria dada como provada da Oposição-Nessa altura a CC contatou os Opoentes tendo o Opoente AA no local exibido documentos dos elementos da P.S.P que compareceram no local.
Nessa altura, os Requeridos AA e esposa declararam que não entregavam o imóvel por considerarem ter título.
Tal matéria ao invés deveria ter sido dada como provada segundo a analise lógica dos depoimentos análise dos documentos e as regras da experiência comum, que conduziriam á dar como provado que tinha os Opoentes tinham a posse do imóvel transmitida pela Requerente DD e que a mesma tinha outorgado procuração ainda válida para arrendar o imóvel.
Também e pelo mesmo raciocínio devia a seguinte matéria dada como provada.
xv) -Tendo o Requerente EE pleno conhecimento que o imóvel tinha sido prometido vender aos Opoentes e que o mesmo se encontrava ocupado por cedência dos últimos á Requerida CC.
xvi) O requerente tinha pleno conhecimento que o imóvel dos autos se encontrava ocupado, que os opoentes haviam celebrado contrato promessa com requerida procuração e declaração de usufruto e ainda assim acabou por realizar a escritura do imóvel.
xvii) Ambos os Requerentes moveram o presente procedimento cautelar de entrega do imóvel, sabendo que os oponentes tinham título válido para usar e fruir do mesmo, na qualidade de promitentes compradores e da procuração que conferia poderes para dar de arrendamento o imóvel.
X. É patente a contradição entre a matéria dada como provada e a matéria dada como não provada porquanto tanto no que toca ao conhecimento do requerente EE da situação do imóvel em data anterior á escritura 26 de junho de 2024
Y. a mandataria da Requerente DD já tinha questionado o Opoente AA como também a mandatária do Requerente EE também já tinha conhecimento do litígio como da ocupação do imóvel pela CC e sua família, pois já se tinham deslocado ao imóvel tendo questionado a D. CC sobre a sua permanência no imóvel
Z. Aliás, no dia 25 de junho 2024 o Requerente EE deslocou-se ao local tendo comparecido o Opoente AA onde exibiu os documentos na presença da P.S.P. -Tendo ainda assim e não obstante tal informação e constatação que o imóvel se encontrava ocupado, avançado para a escritura no dia seguinte dia 26 de junho 2024
-Tendo assim perfeito conhecimento que à data da celebração da escritura o imóvel se encontrava ocupado e com um diferendo entre a vendedora DD e o Opoente AA e dos riscos da aquisição do imóvel, que não se encontrava livre de ónus ou encargos conforme consta da escritura de compra e venda.
AA. À data da escritura realizada entre os Requerentes 26/6/2024 os imóveis não se encontravam livres de ónus ou encargos pelo que as declarações de ambos os Requerentes são falsas.
1 - Tanto mais que quando o Requerente EE pretendeu registar o Contrato Promessa tendo tal pedido sido recusado, conforme consta da análise da certidão permanente.
2 - Ambos os Requerentes tinham conhecimento que o imóvel se encontrava ocupado tendo-se apresentado no dia 24 e 25 de junho de 2024 o Opoente AA no local a 1º Ré estando ambos os Requerentes acompanhado pelas advogadas que de antemão já tinham contatado com a CC e contatado com o AA por telefone in loco que o imóvel.
3 - Os Autores são titulares do direito de compra dos imóveis vendidos pela 1ª Ré ao 2º Réu, tendo intentado Ação de Anulação que corre os seus termos no Tribunal da Comarca de Lisboa Juízo Central de Almada - J2com o nº 8376/24.8TBALM.conforme certidão que se junta (.Doc. 1)
4 - Opoente marido era usufrutuário do imóvel e tinha a posse livre e pacífica de boa-fé dos imóveis e assente nos títulos outorgados pela Requerente DD.
5 - A Requerente DD não revogou o contrato-promessa outorgado com os Opoentes e o Requerente EE tinha conhecimento anterior à realização da escritura de 26 de julho de 2024, que existia título suficiente dos autores para a posse dos imóveis e que o mesmo estava ocupado por CC e sua família obstante o imóvel estar registado a favor do 2º Réu, a presunção do Registo a favor do mesmo é ilidível face ao previsto nos artigos do Código do Registo Predial, pois ambos os Réus procederam com má-fé negocial com o intuito de enganar os Autores.
6 - Sabendo de antemão dos ónus ou encargos do imóvel e a posse do mesmo pelos Requerentes posse pública pacifica e de boa-fé.
7 - Ficou provado que pelo menos os Opoentes entregaram valor de 6.000.00 de sinal e pelo menos 8 prestações no valor de 500.00 euros mensais no cumprimento do contrato promessa
8 - A Douta sentença desconsiderou todos estes fatos não relevando que os opoentes vieram aos autos e na sequência do despacho da Sra. juíza informar e juntar certidão predial que em 13/06/2024 a Ré DD celebrou escritura de Doação a favor de FF no Cartório Notarial da Dra. --, requerimento este com a referência 411262061 de 19/12/2024, tendo solicitado a presença do beneficiário, o que veio a ser indeferido, por despacho violando o disposto no artigo 611 do C.P.C.
9 - Com o devido respeito, tal questão deveria ter sido decidida nos presentes autos pois que o contrato de Doação do imóvel transmite a posse do mesmo.
10 -A Requerente DD em resposta não nega a existência de tal escritura de Doação, alegando que iria intentar Ação de anulação.
11- Como podia ter a Requerente a posse do imóvel em 26/6/2024 data em que foi outorgada a escritura de compra e venda com o Requerente EE, se tinha celebrado escritura em 13 dias antes com FF escritura de Doação
12- Pelo que ao não apreciar tal questão a douta sentença violou os artigos 4,5 e 6 e 607 e 611 todos do C.P.C.
13- Ainda que se admita que o contrato de arrendamento não tenha sido formalizado cumprindo o disposto no art. 1069.º, n.º 1 do CC, tal não obstava a reconhecer que a CC como legitima possuidora do imóvel por se encontrar autorizada pelo Opoente AA que tinha procuração válida.
14 - Ambos os Requerentes ao intentarem a presente Providência atuaram fora dos ditames da boa-fé num manifesto abuso do direito conforme o dispõe o art.º 334.º do CC.
15 - O art. 1275.º do CC dispõe o seguinte: “A posse mantém-se enquanto se verificar a possibilidade de continuar a atuação correspondente ao direito”.
Estava assim perfeitamente justificada a legitimidade dos opoentes como possuidores do imóvel usando o direito de retenção previsto no art. 733.º do CC por incumprimento definitivo dos contratos promessa por banda da Requerente.
Se no contrato promessa as partes acordarem no pagamento de uma quantia, pelo promitente comprador a título de sinal, e se tal sinal for efetivamente pago e houver tradição da coisa prometida vender estes fatos e circunstâncias fazem nascer na esfera jurídica na esfera do promitente comprador, e em caso de incumprimento do promitente vendedor um direito real, desta vez com natureza de direito real de garantia. O Direito de retenção, tal é o que resulta do art. 755.º, n.º 1 alínea f) do CC que estabelece que goza do direito de retenção o beneficiário da promessa de transmissão ou constituição do direito que obteve a tradição da coisa a que se refere o contrato prometido, sobre essa coisa, crédito resultante do não cumprimento imputável á outra parte, nos termos do art. 442.º do CC.
No caso dos autos, o direito de retenção por parte dos Requeridos/Opoentes, é ilícito, atento ao incumprimento do contrato promessa pela Requerente DD que nunca revogou o contrato o contrato promessa nem a procuração.
Na decisão deste Procedimento Cautelar não foi tido em conta o incumprimento do contrato promessa por parte da Requerida circunstância relevante para aferir o direito dos opoentes de retenção do imóvel de acordo com o art. 755.º do CC, garantia que os opoentes podiam fazer valer e pretendem ainda, por não lhes ter sido dado o contraditório.
O Tribunal devia ter conhecido da questão do incumprimento do contrato promessa por parte da Requerida, antes ateve-se apenas e só ao interesse dos Requerentes, ambos tendo conhecimento de que o imóvel se encontrava ocupado com o agregado de CC e ao contrário dom Princípio da boa-fé negocial realizaram o negócio.
No caso dos autos existindo o contrato promessa e estando em vigor, até á sua revogação ou cessação-subsiste a convicção da traditio e concomitantemente o direito dos promitentes compradores a habitar a fração, (no caso sub judice a usufruir).
Também o Tribunal não deveria ter proferido tal decisão porquanto os fundamentos dos Requerentes não preenchem os requisitos do periculum in mora, e nos graves prejuízos, pois dos documentos apresentados pelos mesmos, designadamente a escritura de compra e venda efetuada apenas em 26-07-2024, cujo fundamento o Requerente invoca como proprietário não seria um prejuízo considerável atendendo ao prejuízo que a habitante do imóvel sofreu ao ser obrigada a desocupar a fração, neste caso uma pessoa com grave carência económica e sem teto para viver.
- Bem como ao prejuízo dos Opoentes que entregaram á requerida pela aquisição do imóvel.
-Ao contrário do referido na douta sentença, os opoentes juntaram prova documental e testemunhal na sua Oposição, que deveria revogar a decisão provisória, tendo provado que tinham a posse do imóvel porque titulada pelos documentos particulares assinados e reconhecidos pela Opoente DD, bem como toda a prova que evidenciou que o Requente EE tinha conhecimento da permanência no locado pela família de CC e informado antes da realização da escritura e ainda assim outorgou a mesma intentando procedimento cautelar decorrido 1 mês.
16 - Não existindo o fundamento do periculum in mora previsto no Artigo que justificasse a restituição do imóvel ao Requerente EE de acordo com o disposto no artigo 388 do C.P.C
17 - O Requerente sabia que estava a comprar e a Requerida o que estava a vender.
18- Os Requerentes interpuseram o Procedimento Cautelar decorrido pouco mais de um mês da escritura dos imóveis, atentas às circunstâncias da posse do imóvel não lhe ser transmitida no ato da compra, num autêntico Abuso do Direitos tendo perfeito conhecimento se que o imóvel estava ocupado.
19 - Pela Requerente DD que já havia transmitido ao Opoente AA como Usufrutuário do imóvel e por contrato Promessa e posteriormente por Contrato de Doação realizado a favor de FF em 17/6/2024. Não estendo assim anulada a Doação a favor de FF é questionável se o Requerente EE para além de ter adquirido de má-fé o imóvel tem a posse do imóvel adquirida por escritura pública de 26/6/2024
20 -A douta sentença mostra-se contraditória ao considerar que a Requerente agiu de má-fé ao negar a assinatura de todos os documentos em que interveio documentos esses que titulavam a posse do Autor mantendo a providência anteriormente decretada pois dispunha de meios de prova que impunham a restituição dos imóveis aos Opoentes.
Nestes termos e nos melhores de direito deve a apelação ser procedente e consequentemente ser a douta sentença revogada, devendo ser o imóvel valor ser restituído aos opoentes nos legais termos.
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Colhidos os vistos legais, cumpre decidir --
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II.II. Questões a apreciar:
Sem prejuízo do conhecimento de questões de conhecimento oficioso, são as conclusões de recurso que delimitam as questões a conhecer.
Como configuradas pelos recorrentes, cumpre começar por apreciar se a decisão enferma do apontado vício de omissão de pronúncia, por não consideração de escritura pública de doação feita a terceiro.
Verificando-se a existência de tal vício, impõe-se determinar se se pode conhecer da apelação, ou, sendo a decisão ser anulada nessa parte, deve o vício ser suprido na instância da decisão recorrida.
Ultrapassada esta questão, impõe-se conhecer da admissibilidade do recurso da decisão de facto e, na sequência do que for decidido, estabelecer a base definitiva da mesma e, a partir dela, apreciar as questões jurídicas suscitadas quanto à consistência e prevalência da posse dos requerentes; à existência de direito de retenção dos oponentes; à existência de eventual abuso de direito e à verificação do requisito de periculum in mora.
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II.III. Apreciação do recurso:
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II.III.I. A suscitada invalidade da decisão, por omissão de pronúncia:
Sustentam os recorrentes que o tribunal a quo não conheceu de questão que deveria ter conhecido, que se refere à apreciação do valor e eficácia de escritura de doação relativa ao imóvel objeto dos autos, celebrada entre a requerente e terceiro aos autos, de nome FF.
Sustentam que tal escritura tem relevância na determinação da posse dos requerentes, cuja sustenta a presente providência.
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A invocada nulidade da sentença por falta ou excesso de pronúncia, prevista e estatuída pela al. d) do n.º 1 do art.º 615.º do Código de Processo Civil (CPC) - o juiz deixe de pronunciar-se sobre questões que devesse apreciar ou conheça de questões de que não podia tomar conhecimento equivale ao chamado erro de atividade ou erro na construção da decisão, não se confundindo com um erro de julgamento, de facto ou direito, que se refere ao próprio conteúdo da decisão (cfr., a propósito, por todos, acórdão do Supremo Tribunal de Justiça STJ - de 11/10/2022, Isaías Pádua, dgsi.pt)1.
Não se trata, portanto, de uma decisão de uma dada matéria factual de modo desconforme com a prova ou de fazer um enquadramento jurídico do caso que não possa ser sustentado, trata-se apenas de não seguir um iter de avaliação e decisão que pondere devidamente todo o objeto do litígio, que é o mesmo que dizer, que resolva todas as questões submetidas a decisão, mas apenas aquelas que o são.
Disse-se no anteriormente referido acórdão do STJ, a propósito do que deva entender-se por "questão a resolver na sentença", que o conceito de “questão”, deve ser aferido em função direta do pedido e da causa de pedir aduzidos pelas partes ou da matéria de exceção capaz de conduzir à inconcludência/improcedência da pretensão para a qual se visa obter tutela judicial, dele sendo excluídos os argumentos ou motivos de fundamentação jurídica esgrimidos/aduzidos pelas partes (neste sentido, veja-se também o acórdão STJ de 8/2/2024, Nuno Pinto de Oliveira, loc. cit)2.
Esta ligação direta entre o conceito de questão, para este efeito, e os de pedido e causa de pedir, é uma ideia essencial a reter, como o é, pela negativa, a independência da mesma face aos argumentos ou motivos esgrimidos pelas partes – sendo certo que o tribunal não está também vinculado à qualificação jurídica feita por estas.
Uma questão é aquilo que o tribunal tem que decidir para verificar da sustentação do pedido, tendo por base a causa de pedir apresentada. Não são questões os meros argumentos apresentados no processo.
Depurando esta análise, pode concluir-se, portanto, que será irrelevante a circunstância de as partes terem valorizado ou desvalorizado um determinado elemento dos autos. O que releva será saber se, estando esse elemento no processo, é ou não importante para a apreciação do pedido, nos termos delimitados pela causa de pedir apresentada pelo autor/requerente.
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Estabelecida esta base, para apreciar da existência de uma falta de pronúncia há que partir, necessariamente, do teor da decisão.
Desta, extrai-se que, em nenhum momento, a aludida escritura pública de doação outorgada com terceiro foi referida, seja na fundamentação de facto, isto é, no elenco de factos dados por provados e não provados; seja na motivação da convicção apresentada; seja ainda na fundamentação de direito,
É fundada, portanto, a asserção inicial que o tribunal não conheceu desta questão.
Chegando a este ponto está-se ainda longe, todavia, da verificação de algum vício na construção da decisão.
Para o afirmar não basta, obviamente, demonstrar que uma questão não foi conhecida na sentença. É essencial estabelecer que deveria tê-lo sido.
A este nível impõe-se enquadrar devidamente o tema em apreço, considerando o seu valor substantivo, de um lado, e a própria estrutura deste procedimento, de outro.
Em termos substantivos, é manifesto que a questão tem relevo para o pedido e relaciona-se diretamente com a causa de pedir.
Este procedimento tem por objeto uma tutela possessória, com invocação de uma posse correspondente ao direito de propriedade de um imóvel, derivada de aquisição por meio de contrato de compra e venda. Neste contexto, é claro que a invocação de um contrato real incompatível com esse direito, neste caso de transmissão gratuita da propriedade do mesmo bem em data anterior, tem importância na decisão.
Vendo mais em concreto o teor da decisão recorrida, é a seguinte a matéria dada por provada relativa à aquisição de propriedade do bem objeto dos autos nesta constante:
1. A Requerente DD adquiriu, na qualidade de única herdeira e interessada nas heranças de HH, II, JJ, o prédio urbano com a área total de 160 m2, e com a área coberta de 110,75 m2, composto por três casas de ré-do-chão destinadas a habitação, sito na ---, freguesia de Cova da Piedade, concelho de Almada, descrito na Segunda Conservatória do Registo Predial de Almada sob o número --- da aludida freguesia e, inscrito na matriz predial urbana sob os --- da União de Freguesias de Laranjeiro e Feijó.
2. Tendo outorgado a escritura pública de compra e venda do imóvel, livre de quaisquer ónus ou encargos, a favor do Requerente EE, pelo preço de € 55.000,00, no dia 26 de julho de 2024, aquisição esta que veio a ser insc-- no registo predial sob a Ap. -, de 26.07.2024.
Deve, assim, considerar-se como data relevante a de 26 de julho de 2024, aquela em que a requerente DD outorgou com o requerente EE escritura pública de compra e venda.
Assente este ponto, verifica-se da informação enviada pela Conservatória do Registo Predial de Almada (ofício de 2 de dezembro de 2024) que, por escritura datada de 13 de junho desse mesmo ano de 2024, a requerente DD declarou doar a FF o prédio objeto dos autos e este declarou aceitar tal doação.
Quer isto dizer, portanto, que cerca de um mês e meio antes da escritura pública de compra e venda entre os requerentes, a aqui requerente DD doara o prédio a terceiro.
É certo que os requerentes, pronunciando-se sobre este documento, vieram dizer que tal doação é nula, porque foi celebrada sob coação e nada interfere com a decisão dos autos (requerimento de 26/12).
Como é também certo que foi requerida e indeferida a inquirição do terceiro beneficiário da escritura, tomando o tribunal a quo, nesse despacho interlocutório, posição direta sobre o interesse desta questão na decisão (despacho de 8/1/2015), aí dizendo:
Cumpre referir que não se olvida a existência de uma escritura de doação a terceira pessoa.
Todavia, considera-se que basta a junção da aludida escritura, não cabendo nestes autos de providência cautelar vir a aquilatar do fundamento ou circunstancialismo que esteve na origem da sua celebração, pois que aqui interessa antes a relação existente entre os Requerentes no que se reporta á sucessão por venda e a causa invocada pelos Opoentes para legitimar a posse do imóvel em causa nos autos.
Assim, indefere-se a pretendida inquirição de FF.
Em termos jurídicos, é também linear a consideração que a compra e venda e a doação são dois contratos com aptidão de transmissão da propriedade do seu objeto por seu mero efeito (art.º 408º, nº 1 do Código Civil – CC) e, por consequência, concluído o primeiro deles (a doação), o respetivo efeito transmissivo impõe que o segundo traduza um verdadeiro negócio de bem alheio, no caso, uma venda.
Importa considerar, por outro lado, que, sendo o registo obrigatório, por princípio, tem uma mera função de publicidade, ligada à segurança jurídica da situação real, e não, portanto, uma natureza constitutiva de direitos.
Quer isto dizer que, a despeito do registo a favor do requerente, dos elementos existentes nos autos parece retirar-se que este não é proprietário do bem cuja propriedade reclama e, pelo contrário, tal propriedade caberá a um terceiro (que, por não ter apresentado o ato aquisitivo a registo antes da apresentação posterior do requerente, viu o seu pedido recusado).
Na sua pronúncia dizem os recorrentes que a doação é nula, que foi obtida sob coação e que irreleva.
Basta considerar o documento predial atualizado do prédio, onde se verifica que também a validade da própria escritura de compra e venda está em discussão judicial (em ação interposta pelos requeridos contra os requerentes), para retirar razão a este argumento (documento apresentado com o requerimento de 16/1/2025).
Neste ponto, ganha absoluta pertinência o constante no despacho antes referido – não cabe nestes autos de providência cautelar vir a aquilatar do fundamento ou circunstancialismo que esteve na origem da celebração (de qualquer das escrituras).
Enquanto nada for declarado em sentido contrário, o que releva é, portanto, o teor dos negócios transmissivos da propriedade.
Em termos substantivos, a importância da questão é, portanto, clara, porque diretamente relacionado com a determinação da propriedade e, consequentemente, da posse, sobre o bem imóvel dos autos.
Quer isto dizer que, em qualquer caso, a decisão deveria ter tratado esta questão, por ser diretamente relacionada com o estabelecimento da posse afirmada pelo requerente (posse correspondente ao direito de propriedade), independentemente do sentido em que o fizesse (dando prevalência à situação substantiva ou à situação registal do prédio).
Quer isto dizer também que poderia a decisão a quo ter feito prevalecer o registo de propriedade a favor do requerente, mas não poderia, em qualquer caso, desconsiderar da sua análise o facto de existir nos autos um documento autêntico que atesta a aquisição da propriedade por terceiro e, por consequência, que retira aptidão de produção de efeito jurídico ao ato pretensamente transmissivo da propriedade a favor do requerente.
Esta é, portanto e sob qualquer prisma, uma questão substantiva incontornável. –
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Se esta avaliação substantiva leva a concluir que se trata de uma efetiva questão a conhecer, porque se relaciona diretamente com um elemento central da causa de pedir – a posse do requerente, a estrutura dos autos faz emergir outras pontos estritamente procedimentais a ter em conta, que podem ser assim apresentadas:
a. O facto de ser um terceiro, não interveniente nos autos, que celebrou o negócio incompatível permite o conhecimento da questão neste procedimento?
b. A circunstância de as partes não terem tratado expressamente desta questão nos articulados e terem-se pronunciado apenas em requerimentos autónomos (e depois nas alegações dos recorrentes) constitui exercício adequado do contraditório sobre a questão?
Neste quadro procedimental, a escritura de doação com terceiro, elemento objetivamente constante dos autos, mas não discutido pelas partes nos seus articulados, será sempre uma questão que o tribunal deveria conhecer.
Voltando ao que antes ficou dito, deve partir-se da base orientadora conferida pelo dispositivo, que estabelece o dever de conhecimento das questões suscitadas pelas partes, considerando a estrutura da ação (ou do procedimento), estabelecida por pedido e delimitada pela causa de pedir.
Além destas, o tribunal deve conhecer e decidir, independentemente de alegação, questões de conhecimento oficioso, que podem ser genericamente referidas como todas as referentes à validade intrínseca do processo e à avaliação de atos jurídicos não dependentes de arguição.
Este procedimento contém um pedido de providência de restituição da posse, com invocação de direito de propriedade.
Porque a causa de pedir relativa à posse se estriba diretamente na alegação da propriedade, fica claro que a questão da titularidade do bem constitui o primeiro e essencial fundamento da providência (e objeto do procedimento) – a definição da posse e do direito de propriedade são indissociáveis no caso.
Se um documento constante do processo, aliás a expresso pedido do tribunal, estabelece que o direito substantivo em que assenta a posse se encontra na esfera jurídica de um terceiro (e não do requerente da providência), esta é uma questão de conhecimento essencial e diretamente ligada à sustentação da causa de pedir e, por consequência, à procedência do pedido cautelar.
Importa considerar, por outro lado, algo que decorre da posição dos recorrentes, mas não foi expressamente aludida por estes – o relevo substantivo do registo predial.
Como se disse acima, a função do registo é, essencialmente, a de dar publicidade a situações jurídicas, neste caso relativas a direitos reais, para efeitos de segurança da ordem jurídica e correção do comércio respetivo (cf. art.º 1.º do Código de Registo Predial – CRP).
Importa não esquecer, porém, que a lei, em determinadas circunstâncias, confere excecionalmente verdadeiros efeitos aquisitivos ao registo e, para a generalidade das situações, o registo produz também efeitos que podem ser qualificados de substantivos – o chamado efeito presuntivo do registo.
O registo definitivo faz presumir que o direito existe e pertence ao titular inscrito, nos termos em que o registo o define (artº 7º do CRP) – a propósito desta presunção e do seu carater juris tantum, veja-se o acórdão uniformizador do STJ de 23/2/2016 (DR I série de 22/2/2017)3.
Neste contexto de relevo de presunções, importa também considerar o quadro legal estabelecido pelo art.º 1268.º n.º 1 do Código Civil (CC): - O possuidor goza da presunção da titularidade do direito, excepto se existir a favor de outrem, presunção fundada em registo anterior ao início da posse.
No caso, de acordo com a matéria provada:
a. A requerida CC ocupava o imóvel, na sequência de cessão onerosa determinada pelo requerido e recorrente AA;
b. Os requeridos recorrentes, AA e BB, celebraram com a requerente contrato-promessa de compra e venda, pagaram parte do preço, foi emitida a seu favor uma procuração relativa ao imóvel; foi também emitida a favor do requerido uma declaração de cedência de usufruto e, por último, um contrato-promessa de doação;
c. O requerente EE celebrou com a requerente, em momento posterior escritura de compra e venda do bem e registou-o a seu favor.
Estes elementos provados permitem estabelecer, pelo menos prima facie, uma situação possessória ou de mera detenção a favor dos requeridos (decorrente de diversos e sucessivos atos jurídicos).
Caso se entenda estabelecer uma verdadeira posse a favor dos requeridos, existirá um verdadeiro conflito de presunções relativas à propriedade – a presunção possessória e a presunção registal, o que impõe também que se verifique se alguma, ou ambas, destas presunções subsistem ou deve(m) cair e, caso cedam ambas, abrindo necessariamente campo à conclusão que o verdadeiro titular do direito relevante não está nos autos e, nesse caso, retirando as consequências que se tiverem por adequadas relativamente à providência.
Quer isto dizer, concluindo, qualquer que seja a perspetiva em que se analise a questão, a consideração da escritura pública de doação é essencial à decisão do procedimento e, portanto, independentemente de ter sido tratada nos articulados, consta nos autos e foi nestes debatida, devendo ser conhecida.
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Diferente será saber se o contraditório realizado sobre este ponto se deve considerar suficiente.
Atente-se que, nos termos do art.º 665.º do CPC, caso se verifique omissão de pronúncia, a regra de suprimento de tal nulidade é que este deve ser feito em sede de decisão da apelação, sem prejuízo da necessidade de fazer atuar o contraditório.
Quer isto dizer que, estando reunidos nos autos os elementos necessários a decidir (e estarão, na medida que se trata apenas da apreciação de um documento), o que poderia impor-se seria um exercício complementar do contraditório nesta instância (cf. n.º 3 do referido art.º 665.º).
Verificando-se que as partes se pronunciaram expressamente sobre a questão (por requerimentos autónomos e em sede de recurso, nas alegações dos recorrentes, não se tendo pronunciado os recorridos, por terem decidido não apresentar contra-alegações), deve entender-se que o contraditório sobre a questão está adequadamente realizado, não se impondo repeti-lo.
A sua repetição constituiria, neste contexto, um verdadeiro ato inútil e, por isso, não permitido (neste sentido, veja-se o acórdão desta Relação de 16/1/2025, Arlindo Crua, dgsi.pt)4.

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Se o que fica dito conduz à conclusão da necessidade de conhecimento do documento autêntico existente nos autos, não se pode, todavia, tratar a questão com um vício no processo decisório, mas uma falta da própria decisão ou erro de julgamento.
Na verdade, repescando o que se disse acima, não parece que se trate de um erro na construção da decisão, na medida que o tribunal tratou diretamente a questão da propriedade e da posse, tratou-a, todavia, desconsiderando um elemento essencial dos autos e, nessa medida, é o próprio conteúdo da decisão, quanto ao estabelecimento da propriedade, que fica em causa pela omissão (sobre nulidade da sentença, por omissão de pronúncia, vejam-se, designadamente, os acórdãos do STJ de 30/11/23, Sousa Lameira5 2/3/2021, Ricardo Costa6; de 10/12/2020, Rosário Morgado7 e de 26/10/2016, Oliveira Mendes8).
Seguindo este caminho, a solução a dar a este fundamento recursório será a de desconsiderar uma nulidade da sentença, por omissão de pronúncia em sentido próprio (na medida em que o tribunal conheceu a questão da propriedade), tratando a omissão de tratamento da escritura de doação como relativa à própria substância da decisão.
Em termos práticos, o efeito será, todavia, equivalente.
Considerando a questão como uma falta da própria decisão, uma vez colocada a questão em recurso, impõe-se conhecê-la (independente da qualificação que o recorrente lhe atribua) e, portanto, tomar-se-á em conta a escritura de doação.
Caso se considerasse a existência de uma nulidade por omissão de pronúncia propriu sensu, sempre levaria a que a apelação fosse decidida nesta sede, por estarem reunidos os elementos necessários a fazê-lo.
Quero isto dizer, concluindo este ponto, entende-se que não procede a invocação de nulidade da sentença, mas decide-se tomar conhecimento do teor da escritura pública de doação a terceiro enquanto elemento de avaliação da posse de requerentes e requeridos, em discussão nos autos. –
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II.III.I. Recurso da decisão de facto:
Admissibilidade do recurso – os requisitos do art.º 640.º do CPC:
De acordo com o disposto no n.º 1 do art.º 640.º do Código de Processo Civil (CPC), para admissão da impugnação de facto o recorrente deve obrigatoriamente especificar, sob pena de rejeição, os concretos pontos de facto que considera incorretamente julgados (al. a); os concretos meios probatórios, constantes do processo ou de registo ou gravação nele realizada, que impunham decisão de facto diversa (al. b) e a decisão que, no seu entender, deve ser proferida sobre as questões de facto em causa (al. c).
A interpretação destas exigências legais tem sido objeto de debate, nem sempre isento de dúvidas.
A razão e a teleologia destas normas, e dos específicos requisitos que estabelece, pode considerar-se sintetizadas na noção que a lei processual confere duplo grau de jurisdição de facto, mas não estabelece um qualquer direito a um segundo julgamento, antes modelando as faculdades que concede à parte vencida em primeira instância à capacidade de resposta do sistema de justiça.
Sendo este o quadro básico de análise, não podem deixar de ser considerados os princípios que enformam estas regras, que serão, de um lado, a prevalência da verdade material sobre a formal e, genericamente, o direito a um processo equitativo e, de outro, razões de proporcionalidade, adequação e razoabilidade.
Considerando estes vetores de análise, a jurisprudência tem preenchido os conceitos legais de forma a tornar operativas as garantias legalmente estabelecidas e enquadrá-las em relação às suas exigências.
Especificamente, o Supremo Tribunal de Justiça (STJ) tem procurado estabilizar entendimentos nesta matéria, o que fez também em acórdão uniformizador.
Pode dizer-se que a base da doutrina do STJ fica resumida pelo acórdão de 3/10/2019 – Rosa Tching, ecli.pt - jurisprudencia.csm.org.pt), ao estabelecer dois grandes critérios de análise.
De um lado, o que pode qualificar-se como afastamento do formalismo excessivo. Assim, diz-se que na verificação do cumprimento dos ónus de impugnação previstos no citado artigo 640º, os aspetos de ordem formal devem ser modelados em função dos referidos princípios da proporcionalidade e da razoabilidade.
De outro lado, com a criação de uma doutrina qualificável de segmentação dos ónus impugnatórios. De acordo com a mesma, há dois ónus que a parte deve cumprir: - um primário, traduzido no cumprimento das exigências do art.º 640.º n.º 1, e um secundário, traduzido na indicação das passagens relevantes da prova gravada.
Os ónus primários têm por função delimitar o objeto do recurso e fundamentar a impugnação da decisão da matéria de facto.
O ónus secundário terá um cariz operativo, tendente a possibilitar um acesso mais ou menos facilitado aos meios de prova gravados relevantes para a apreciação da impugnação deduzida.
Sendo diferentes as naturezas e funções de cada um dos ónus, o seu desrespeito terá diferentes consequências - enquanto a falta de especificação dos requisitos enunciados no nº1, alíneas a), b) e c) do art.º 640º implica a imediata rejeição do recurso (na parte infirmada), a falta da indicação das passagens da gravação dos depoimentos a que alude o nº 2, alínea a), só justificará tal consequência nos casos em que essa omissão ou inexatidão dificulte, gravemente, o exercício do contraditório pela parte contrária e/ou o exame pelo tribunal de recurso.
É uma doutrina que se estabeleceu e que vem sendo sucessivamente repetida (vejam-se entre tantos, os acórdãos do STJ de 16/12/2020, Bernardo Domingos, e 2/2/22, Fernando Samões, ambos em ecli.pt - jurisprudencia.csm.org.pt).
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No caso, os recorrentes pretendem pôr em causa a decisão de facto relativamente a um único ponto de facto, ainda que o desdobrem em diversas questões, que pode ser assim resumido: - os requerentes, ao celebrarem escritura pública relativa ao imóvel objeto dos autos e ao instaurarem esta providência sabiam que estavam a afetar os direitos dos oponentes ao uso e fruição do bem?
Pode dizer-se que, a despeito do carater manifestamente prolixo, algo desorganizado e confuso das alegações, cumprem a sua obrigação de especificação do objeto de recurso.
O mesmo se dirá quanto à indicação dos meios de prova em que assenta a impugnação e sua especificação (declarações da requerente e do oponente e documentos) e sentido da decisão alternativa (passarem os factos impugnados do elenco dos não provados para os provados).
A este nível não existe, portanto, óbice à apreciação da impugnação.
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Admissibilidade do recurso de facto - a questão da utilidade ou adequação da impugnação para a pretendida modificação da decisão do processo:
A avaliação de admissibilidade do recurso da decisão de facto em apreço deve também ser também feita à luz da sua pertinência, ou utilidade, para a finalidade pretendida que é, em primeiro lugar, de alteração da decisão do próprio pleito.
Mesmo nos estritos termos do disposto no n.º 1 do art.º 640.º do CPC, a referência a decisão diversa que no mesmo consta, remetendo apenas para a decisão de facto, não afasta, pelo contrário, que uma interpretação racional e teleológica deva ser feita considerando também essa decisão de fundo, isto é, do processo/procedimento.
Quer isto dizer que, mesmo considerando apenas a boa interpretação do art.º 640.º n.º 1 do CPC, deve concluir-se que este não permite o seguimento de impugnações recursórias de facto que sejam inócuas, ou inúteis, para a decisão jurídica do próprio recurso.
Além desta consideração normativa restrita, idêntica conclusão decorre de considerações relativas à utilidade dos atos processuais e dos princípios operativos de economia e celeridade processuais.
Neste sentido, acolhe-se o que foi dito em acórdão desta Relação e secção de 11/5/2023 (Carlos Castelo Branco, dgsi.pt)9:
- A reapreciação da matéria de facto não constitui um fim em si mesma, mas um meio para atingir um determinado objetivo, que é a alteração da decisão da causa, pelo que sempre que se conclua que a reapreciação pretendida é inútil – (...) – a reapreciação sobre matéria de facto não deve ter lugar, por constituir um acto absolutamente inútil, contrariando os princípios da celeridade e da economia processuais - art.ºs 2.º, n.º 1, 130.º e 131.º do CPC.
No mesmo sentido se pronunciaram recentemente a Relação do Porto, por acórdão de 11/12/24 (Carlos Gil, dgsi.pt)10 e a Relação de Coimbra, por acórdão de 25/10/22 (João Moreira Carmo, trc.pt)11.
É um entendimento que o Supremo Tribunal de Justiça (STJ) acolheu, designadamente por acórdão de 19/10/2021 (Fátima Gomes – jurisprudencia.pt)12.
O recurso da decisão de facto, como qualquer meio processual, só deve ser admitido, portanto, quando seja suscetível de produzir algum efeito na decisão do processo, não devendo ser admitido e apreciado quando se refira a pretensões de afirmação de uma verdade inócua ou irrelevante para a decisão.
É este o contexto de análise que deve também ser considerado na análise de admissibilidade deste recurso.
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Avançando, a primeira referência a fazer ao avaliar a utilidade da impugnação é o manifesto excesso de matéria factual em discussão, excesso esse que abrange as alegações (cujo teor, repete-se, é manifestamente prolixo e algo confuso), mas, sobretudo, que emerge da alegação dos oponentes e se repercute no teor da própria decisão recorrida.
Impulsionada por uma alegação factual que exorbitou a matéria relevante, a decisão acabou por verter um conjunto de factos conexos com o litígio, que, sobretudo, retiram clareza de avaliação numa situação já de si algo nebulosa.
Importa, em primeiro lugar, levar em conta a orientação cardial, que impõe que a decisão de facto deve conter, como provados ou não provados, apenas os factos essenciais ao litígio, nestes se integrando os factos-complemento (que podem enquadrar, contextualizar, precisar ou acrescentar algo de relevante aos essenciais strictu sensui); podendo incluir também factos instrumentais que tenham sido alegados ou resultem da prova, devendo estes ser entendidos como factos diretamente relacionados com os essenciais, mas que não sejam estruturais aos direitos em discussão.
A decisão dos autos, pelo contrário, apresenta, além da matéria relevante, um conjunto indistinto de elementos que, podendo ser relevantes para outros litígios entre as mesmas partes, ou entre estas partes e terceiros, introduzem sobretudo confusão na decisão deste procedimento cautelar de defesa da posse.
Desenvolvendo esta ideia, este procedimento cautelar não especificado de restituição da posse (havendo alegação de atos qualificáveis como violência, mas na defesa da posse e não no esbulho), assenta apenas na invocação de duas situações jurídicas, incompatíveis entre si, uma positiva e outra negativa:
a. Uma posse do requerente, válida e prevalecente sobre um dado bem;
b. Uma detenção material pelos requeridos, incompatível e não prevalecente, sobre esse mesmo bem.
O requerente invoca uma qualidade de proprietário, na sequência de celebração de compra e venda com a requerente, ficando claro da sua alegação, por outro lado, que não invoca alguma detenção material do prédio.
Invoca, portanto, uma posse jurídica correspondente ao seu direito de propriedade, sem domínio material do bem, pretendendo com a providência, precisamente, pôr fim a uma detenção incompatível e não consentida.
Perante esta invocação, os recorrentes defendem-se dizendo:
a. Que celebraram contrato-promessa de compra e venda sobre o mesmo prédio, na qualidade de futuros compradores;
b. Que pagaram o preço acordado;
c. Que lhes foi também conferida procuração para que celebrassem negócios relativos ao imóvel;
d. E que, por via de uma declaração, o oponente passou a usufrutuário do imóvel, assim o possuindo;
e. Que cederam o imóvel à 3.ª requerida, a título oneroso, mas sem celebração de contrato de arrendamento, por dificuldades burocráticas;
f. Que a requerente também doou o imóvel a terceiro;
g. Requerente e requerido conheciam estes factos quando celebraram a escritura de compra e venda.
Desta alegação retiram as seguintes conclusões jurídicas:
a. O requerente não tem a posse do imóvel;
b. O requerido é o legítimo possuidor do bem;
c. Os 1.ºs requeridos têm direito de retenção, como promitentes-compradores;
d. Os requerentes atuaram com abuso de direito ao exigir a posse do bem.
Desta síntese fica imediatamente patente a confusão (hoc sensu) que a matéria de facto traduz, sendo que, em rigor, o que interessa para este procedimento é apenas determinar quem é o verdadeiro possuidor legal do bem imóvel e se existe uma detenção incompatível e causadora de danos (que careça de tutela cautelar).
A despeito disto, não se pode olvidar que a própria situação de facto é pouco linear e pouco transparente, dando lugar a diversas pretensões incompatíveis e que se traduziram na multiplicação de litígios judiciais.
Também por isso é importante manter este litígio nos seus contornos certos, não o alargando a questões estranhas além das pertinentes à sua própria solução.
Feito este introito, para compreender o sentido e utilidade desta impugnação, importa por começar por considerar a base factual estabelecida nos autos.
Traçando uma bissetriz entre a decisão de facto e a matéria que não é objeto de impugnação, pode considerar-se que está assente o seguinte:
a. A requerente DD adquiriu o imóvel objeto dos autos em sucessão por morte;
b. É uma pessoa vulnerável, pela sua idade avançada, pelo facto de ser viúva e viver sem qualquer apoio familiar e ter uma situação económica precária;
c. Celebrou sucessivos negócios relativamente ao imóvel, com pessoas diferentes, obtendo contrapartidas pecuniárias pelos mesmos (algo que pode ser compatível com sucessivos atos de aproveitamento dessa vulnerabilidade por terceiros ou, pelo contrário, traduzirá uma vulnerabilidade meramente aparente, com ostensivos comportamentos lesivos de terceiros);
d. Celebrou contrato-promessa de compra e venda com os oponentes;
e. Emitiu uma declaração concedendo ao oponente usufruto do imóvel e emitiu uma procuração concedendo-lhe autorização para tratar dos assuntos relativos a esse bem;
f. Fez ainda um outro negócio com o requerido que intitulou contrato-promessa de doação;
g. Celebrou, em data posterior ao da promessa com o requerente, escritura pública de compra e venda do imóvel objeto dos autos com o requerente;
h. O requerente registou o bem a seu favor;
i. O prédio foi ocupado pela 3.ª requerida (CC), por lhe ter sido cedido onerosamente pelo oponente (AA).
Esta estrutura básica da matéria de facto, que está assente, pode dizer-se que deixa uma margem para controvérsia factual reduzida.
É evidente que o requerente é proprietário inscrito, por via de uma escritura de compra e venda celebrada com a requerente e, tendo demonstrado que o prédio está ocupado contra sua vontade, facto que não é posto em causa, grande parte da sustentação do pedido cautelar está feita (sem prejuízo do supra referido quanto à anterior escritura de doação).
Acresce a esta análise prima facie que os fundamentos de posse invocados pelos requeridos também decorrem de matéria absolutamente indisputada nos autos.
Assim, a sua invocação assenta numa posição de promitentes-compradores, numa promessa definitivamente incumprida pela venda a terceiro (o requerente), sem detenção material do prédio (que os próprios cederam onerosamente a terceiros), mas com o domínio efetivo do bem, por tradição da requerente.
Toda a matéria relativa a estes temas jurídicos está estabelecida e a divergência coloca-se a nível jurídico e não factual.
Numo outro nível impõe-se delimitar negativamente esta apreciação tendo em conta a alegação e prova (facto também assente) que o requerido e recorrente AA cedeu onerosamente o prédio à requerida (e não recorrente) CC.
Não está em causa neste recurso alguma posse desta 3.ª requerida, incompatível com a do requerente, designadamente por via de uma posição de verdadeira arrendatária.
Diga-se que os próprios oponentes excluem a existência de um arrendamento, por falta de condições formais para o concluir (afirmando que o requerido AA cedeu o bem, contra um pagamento).
É certo que, independentemente da sua formalização por escrito, poderia, em tese, provar-se a existência de um contrato desse tipo com base noutros elementos de prova, algo que, em todo o caso, não foi invocado nos autos e não é questão em apreço neste recurso.
A simples existência de uma procuração conferida pela requerente DD a favor do requerente AA, se a situação assim tivesse sido configurada, poderia conduzir à conclusão de que a requerente se teria constituído numa verdadeira senhoria da 3.ª requerida, por via dos poderes conferidos ao requerido AA, posição essa que teria transmitido ao comprador, tendo este, por consequência, que respeitar a posição de tal possuidora-arrendatária.
Não tendo a questão sido assim apresentada, nem sequer tendo, aliás, esta detentora efetiva recorrido da decisão de entrega, esta questão não releva neste momento.
De certo, o que se pode retirar dos autos é a existência de uma cessão onerosa irregular do imóvel, de contornos indeterminados, nada se sabendo sobre a sua constituição ou comunicação à requerente
Acresce que a confusão que afeta as relações estabelecidas nestes autos também dificilmente permitiria, em qualquer caso, sustentar uma posse correspondente ao arrendamento, se se considerar que o contrato teria sido celebrado pelo requerido, mas em nome próprio, com base num usufruto concedido por uma mera declaração, não em nome da proprietária, com base na referida procuração.
Estas são, em todo o caso, considerações laterais, que se deixam por mera razão de clareza, sendo certo, repete-se, que a questão de uma eventual posse da requerida CC com base em arrendamento não está em causa nesta apreciação.
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Que subsiste, então, de relevante para a decisão do pleito?
Como referido, as questões centrais quanto a propriedade, posse e detenção estão estabelecidas.
Porque os recorrentes estribam o seu recurso também na invocação de abuso de direito, a matéria impugnada pode apresentar relevância, mas apenas neste contexto.
O estabelecimento do conhecimento e intencionalidade dos requerentes e recorridos, sobretudo no momento de celebração da escritura de compra e venda, pode sustentar o fundamento recursório relacionado com o abuso de direito, com a demonstração de uma intencionalidade, direta ou necessária, de prejudicar a posição dos promitentes-compradores.
Nessa medida, a impugnação tem alguma margem de pertinência para a decisão, devendo ser admitida.
É neste quadro que deve ser apreciada.
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c) Apreciação do recurso de facto:
i) Matéria de facto estabelecida na sentença:
Para efeitos de apreciação, há que começar por considerar a matéria de facto dada por provada no procedimento, que é a seguinte:
Factos indiciariamente provados:
(...)
Do requerimento inicial:
1. A Requerente DD adquiriu, na qualidade de única herdeira e interessada nas heranças de HH, II, JJ, o prédio urbano com a área total de 160 m2, e com a área coberta de 110,75 m2, composto por três casas de ré-do-chão destinadas a habitação, sito na ---, freguesia de Cova da Piedade, concelho de Almada, descrito na Segunda Conservatória do Registo Predial de Almada sob o número --- da aludida freguesia e, inscrito na matriz predial urbana sob os --- da União de Freguesias de Laranjeiro e Feijó.
2. Tendo outorgado a escritura pública de compra e venda do imóvel, livre de quaisquer ónus ou encargos, a favor do Requerente EE, pelo preço de € 55.000,00, no dia 26 de julho de 2024, aquisição esta que veio a ser inscrita no registo predial sob a Ap. -, de 26.07.2024.
3. A Requerente DD não residia no indicado prédio há cerca de dois anos.
4. Antes da realização do negócio que levou à outorga da escritura pública de compra e venda, o Requerente EE dirigiu-se ao imóvel, a fim de aferir das condições do mesmo, tendo verificado todas as habitações, com exceção de uma primeira, à qual não conseguiu aceder, constatando necessitar de colocação de telhado.
5. No final do dia 24 de julho de 2024, o A. EE dirigiu-se ao imóvel, tendo observado que no mesmo havia sido colocado um cadeado no portão.
6. Portão esse que dá acesso a todas as habitações, sendo aliás, o único acesso às habitações.
7. Atentos os factos descritos, no dia 25 de julho de 2024, os Requerentes solicitaram a intervenção da PSP do Laranjeiro, a fim de serem identificadas todas as pessoas que se encontravam no imóvel.
8. Foi solicitada a presença do Requerido AA, cuja mulher, a Requerida BB, compareceu também, tendo aquele transmitido às autoridades policiais que está munido de uma procuração assinada pela Requerente DD, que lhe confere o usufruto do imóvel por dois anos, findos os quais a opção de compra, pelo que se intitula como o legítimo proprietário ou futuro proprietário da casa.
9. Nesse dia, pelos agentes da PSP foram devidamente identificadas todas as pessoas no local.
10. O Requerente EE e as demais pessoas que o acompanhavam declararam ter sido ameaçadas e injuriadas pelo Requerido AA e que iriam apresentar a competente queixa, o que tudo ficou consignado no auto de notícia que deu origem aos autos com o NUIPC 908/24.8PGALM.
11. O Requerido AA cobra de terceiros quantias em dinheiro para ocupação de um rés-do-chão cujo telhado está a ruir.
12. A Requerente é uma pessoa com dificuldades económicas, com cerca de 80 anos de idade, sem familiares vivos, carecendo de meios financeiros que lhe permitissem executar as obras necessárias no imóvel.
13. Os Requeridos são perentórios em não entregar o imóvel ao Requerente EE.
14. Os Requerentes temem, por já ter havido ameaças, algum tipo de represálias por parte dos Requeridos.
15. O Requerido AA apresentou queixa crime contra o Requerente EE, alegando ter celebrado com a Requerente DD contrato promessa de compra e venda e contrato promessa de doação relativos ao imóvel, além de outros.
16. Em 13.01.2022, a Requerente DD outorgou procuração a favor do Requerido AA, conferindo-lhe poderes para, designadamente, outorgar contratos de arrendamento relativamente ao prédio de que se cura e intentar processo judicial ou procedimento especial de despejo.
Da oposição
17. Por via sucessória, a Autora seria proprietária do imóvel dos autos, e ainda juntamente com outros herdeiros, do imóvel prédio urbano composto por um prédio destinado a pavilhão gimnodesportivo sito na ---, Av. --- inscrito na matriz sob o artigo --- da União de Freguesias de Laranjeiro e Feijó.
18. Foi outorgada escritura de compra e venda do imóvel identificado em 17), entre a aqui Requerente e outros herdeiros, datada de 11.06.2024.
19. A Opoente mulher é cabeleireira e a Requerente DD frequentava o seu salão, há largos anos, ainda quando o marido da requerente era vivo.
20. Quando ficou viúva a requerente pretendeu vender o imóvel.
21. A Requerente tinha celebrado no passado um acordo com KK, relativo ao anexo que faz parte do prédio em causa nos autos, a qual mais tarde deixou de residir no mesmo, em data não apurada.
22. Os Requeridos tomaram também conhecimento que a Requerente tinha recebido a quantia de 7.000,00 € (sete mil euros) de uma terceira pessoa, de nome LL, e que não era possível outorgar a escritura por existirem questões burocráticas pendentes referentes ao imóvel.
23. Os Requeridos acordaram com a Requerente a compra futura do imóvel em causa nos autos, para o que entregaram o valor de € 6.000,00 a título de sinal.
24. A Requerente e os Requeridos assinaram o documento denominado “contrato promessa de compra e venda”, datado de 1.07.2020, junto a fls. 103 e ss, pelo preço de € 30.000,00 e cujo teor e clausulado se dá por integralmente reproduzido.
25. A Requerente assinou a declaração datada de 6.01.2022, junta aos autos a fls. 68 e ss na qual a mesma declara que “pretende doar no prazo de 2(dois) anos, o prédio (…), a AA (…). Declara que enquanto não for celebrada a escritura de doação entre as partes identificadas, que cede o usufruto dos imóveis supra identificados à pessoa supra identificada, que passa a ser o usufrutuário, concedendo-lhe assim o gozo dos imóveis identificados, durante o prazo de 2 anos, tendo recebido daquele, a este título, o montante de € 24.000,00”.
26. A Requerente DD, assinou o documento denominado “procuração”, datado de 13.01.2022, na qual declarou constituir seu “bastante procurador”, o aqui Requerido, AA, para com referência ao prédio dos autos, poder atuar nos termos aí consignados e cujo teor se reproduz – fls 106 e ss.
27. A Requerente DD e o Requerido AA assinaram o documento denominado de “contrato promessa de doação”, de 10.05.2023, constante de fls. 176 e ssm e cujo teor se dá por integralmente produzido.
28. A Requerente e os Requeridos concordaram no pagamento mensal de € 500,00, desde data não aferida, por conta da promessa de compra e venda.
29. A Requerente recebeu alguns pagamentos, em valor não aferido por parte dos Requeridos.
30. A Requerente DD a dado momento começou a viver em quartos alugados.
31. Os Opoentes em data não apurada cederam o imóvel em causa nos autos à requerida CC, mediante a contrapartida de pagamento da quantia de € 500,00 mensais.
32. Não obstante, o Opoente marido ter na sua posse procuração, a situação do imóvel continuava num impasse.
33. A Requerente fez propostas a potencial interessado para a venda do imóvel.
34. A advogada da Requerente, entre junho e julho de 2024 tentou aferir a situação do imóvel.
35. A mandatária do Requerente igualmente contactou a requerida CC.
36. Em meados de junho de 2024, o Requerente EE, acompanhado de duas advogadas, dirigiu-se à D. CC com a intenção de que a mesma pudesse explicitar o motivo do uso do imóvel, e eventual necessidade de celebrar outro contrato ou de sair do imóvel.
37. Nessa altura a CC contactou os opoentes tendo o Opoente AA no local exibido documentos dos elementos da PSP que compareceram no local.
38. Nessa altura, os Requeridos AA e esposa declararam que não entregavam o imóvel por considerarem ter título.
39. A Requerida ao declarar que nunca tenha assinado contrato promessa de venda ou de doação, quando a mesma o assinou pelo seu punho e perante advogado/a, alterou a verdade dos factos.
*
Factos indiciariamente não provados
Com relevo para a boa decisão da causa não resultou indiciariamente provada a seguinte factualidade:
i. Mercê de tal relação de confiança a Requerente confidenciava com a mesma que tinha de arranjar pessoa de confiança, que não tinha filhos e necessita de apoio na velhice para si e para o seu marido e que já apresentava muitos problemas de saúde.
ii. Mas que tinha património que pretendia vender uma casa independente e que no referido imóvel existia um anexo onde a mesma pretendia ficar a viver com o marido.
iii. A Opoente mulher deu a conhecer ao marido a pretensão da Requerente DD e acordaram que a ajudariam aceitando a compra do imóvel com a obrigação da mesma viver no anexo enquanto fosse viva e que fariam as obras necessárias nas referidas habitações, dado que as mesmas se encontravam degradadas e sem qualquer manutenção.
iv. Os Opoentes, ficaram sensibilizados com a Requerida que, entretanto, tinha ficado viúva, mas que segundo a mesma não tinha dinheiro sequer para fazer a Habilitação de Herdeiros propuseram-se a pagar tais despesas, fazendo posteriormente o acerto de contas quando a requerida conseguisse legalizar a situação e realizar a escritura de compra e venda.
v. A Requerente como forma de devolver o sinal recebido da promitente compradora D. LL sugeriu aos opoentes que pagassem tal valor assumindo a posição da compradora, afiançando que a mesma tinha os documentos do imóvel (que a requerente lhe entregou) que permitiam a legalização do imóvel.
vi. Quando entregaram á Requerente o montante de € 6000,00, como sinal, os opoentes acreditaram na versão da Requerente e não verificaram antes os documentos, que após o recebimento e analise dos mesmos, constaram que eram meras fotocópias e que a situação do imóvel não permitia a legalização do imóvel para poder ser celebrada escritura.
vii. A Requerente para convencer os agora Opoentes de que seria celebrada escritura pública a favor dos mesmos entregou toda a documentação do imóvel que ainda tinha na sua posse documentos originais que não tinham sido entregues pela promitente, enquanto por sua iniciativa consultava advogados do seu conhecimento assinando contratos, declarações e procuração para que os opoentes confiassem que a mesma cumprisse com a sua palavra.
viii. Os Requeridos procederam ao pagamento total do preço acordado no contrato promessa de compra e venda, mormente € 24.000,00 em prestações.
ix. Tendo a Requerente entregue o imóvel aos opoentes de forma livre e espontânea em consonância com a declaração contrato promessa de doação e procuração já referidas, para que os mesmos usufruíssem do mesmo e dele irassem proventos.
x. A cedência do imóvel á Requerida CC foi do conhecimento e autorização da Requerente -DD.
xi. Ao mesmo tempo que os opoentes iam realizando obras de beneficiação do imóvel, cujo valor ascende a 8.000,00 €.
xii. Os Opoentes deixaram de ter contato com a Requerente que mudava constantemente de residência, estando impossibilitados de conseguir a regularização do imóvel, e proceder à marcação de escritura.
xiii. O Requerente pretendia expulsar a Requerida CC, embora soubesse que a mesma tinha título para aí permanecer.
xiv. A Requerente DD e o Requerente EE celebraram contrato promessa com o intuito e combinados entre si por forma a que a requerente DD não cumprisse com o contrato promessa de compra da referida fração que tinha outorgado com os Opoentes.
xv. Tendo o Requerente EE pleno conhecimento de que o referido imóvel tinha sido prometido vender aos agora Opoentes e que o mesmo se encontrava ocupado por cedência dos últimos à Requerida, CC.
xvi. O Requerente tinha pleno conhecimento que o imóvel dos autos se encontrava ocupado, que os opoentes haviam celebrado contrato promessa com a requerida procuração e declaração de usufruto e ainda assim acabou por realizar a escritura do imóvel.
xvii. Ambos os Requerentes moveram o presente procedimento cautelar de entrega do imóvel, sabendo que os opoentes tinham título válido para usar e fruir do mesmo, na qualidade de promitentes compradores e da procuração que conferia poderes para dar de arrendamento o imóvel
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Fazendo nova síntese, os autos têm a seguinte base em termos de matéria de facto:
a. O requerente EE é proprietário registado do imóvel objeto dos autos;
b. Tal propriedade adveio-lhe por compra e venda, realizada em julho de 2024, à requerente DD;
c. A requerente DD adquiriu o imóvel objeto dos autos em sucessão por morte;
d. É uma pessoa vulnerável, pela sua avançada idade, pelo facto de ser viúva e viver sem qualquer apoio familiar e ter uma situação económica precária;
e. Esta requerente celebrou diversos negócios incompatíveis relativamente ao imóvel, obtendo contrapartidas pecuniárias pelos mesmos, sendo a compra e venda a favor do requerente o último deles;
f. Assim, designadamente, celebrou contrato-promessa de compra e venda do mesmo com os recorrentes, no ano de 2020;
g. Desse negócio recebeu sinal e parte do preço;
h. Mais tarde, em 2022, emitiu uma declaração prometendo doar ao recorrente o prédio e, enquanto tal não fosse feito, concedendo-lhe usufruto do mesmo;
i. Ainda nesse ano de 2022 conferiu procuração ao recorrente dando-lhe poderes para tratar de assuntos relacionados com o prédio;
j. E no ano de 2023 fez um novo escrito a favor do recorrente intitulado contrato-promessa de doação;
k. O recorrente AA cedeu o gozo do prédio à 3.ª requerida, CC;
l. Esta ocupou-o até à execução da decisão de entrega.
É neste quadro que cumpre conhecer o objeto concreto da impugnação. –
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ii) Os pontos de facto impugnados:
O conhecimento do requerente da situação de ocupação do imóvel, aquando da aquisição:
Dizem os recorrentes que o depoimento de Parte da Requerente DD é esclarecedor quanto ao Requerente EE tinha conhecimento de que a casa estava ocupada quando se dirigiu ao imóvel, tanto mais que no seu depoimento a DD entra em contradição quando diz que não sabia se estavam lá pessoas, pensava que se tinham ido embora o que denota que sabia que tinha passado uma procuração ao AA e que o mesmo tinha poderes para arrendar o imóvel e estavam lá pessoas dia 29/8/2024.
Consta do elenco de factos provados o seguinte:
- (facto 36):
Em meados de junho de 2024, o Requerente EE, acompanhado de duas advogadas, dirigiu-se à D. CC com a intenção de que a mesma pudesse explicitar o motivo do uso do imóvel, e eventual necessidade de celebrar outro contrato ou de sair do imóvel.
Compaginando este facto com o n.º 2 (que estabelece que a escritura pública de compra e venda entre os requerentes foi celebrada a 26/7/24) e com o facto 5, cujo teor é:
- No final do dia 24 de julho de 2024, o A. EE dirigiu-se ao imóvel, tendo observado que no mesmo havia sido colocado um cadeado no portão.
a conclusão a tirar é que a impugnação não tem qualquer conteúdo útil nesta parte, estando estabelecido, de facto, que, à data da escritura o requerente EE, comprador e proprietário, sabia que o prédio estava ocupado e sabia até que aí fora colocado um cadeado (há um mês que sabia da ocupação e na véspera da escritura soube da existência de um cadeado).
Os recorrentes pretendem, portanto, nesta parte, que se dê por provado algo que já está.
--
O conhecimento da posição dos oponentes face ao prédio e dos escritos com estes celebrados.
Neste ponto, pretendem os recorrentes que se deem por provados os factos xv. e xvi. do elenco dos não provados.
Têm estes factos não provados o seguinte teor:
xv. Tendo o Requerente EE pleno conhecimento de que o referido imóvel tinha sido prometido vender aos agora Opoentes e que o mesmo se encontrava ocupado por cedência dos últimos à Requerida, CC.
xvi. O Requerente tinha pleno conhecimento que o imóvel dos autos se encontrava ocupado, que os opoentes haviam celebrado contrato promessa com a requerida procuração e declaração de usufruto e ainda assim acabou por realizar a escritura do imóvel.
Sustentam esta pretensão impugnatória no depoimento da Requerente DD, invocando que contém contradições, conjugando-o com o teor dos documentos existentes nos autos, relativos aos atos celebrados pela requerente a favor dos oponentes.
É claro que assiste razão aos recorrentes na invocação de uma contradição parcial entre esta matéria não provada e a matéria dada por provada.
Assim, está provado que:
Facto 36 - Em meados de junho de 2024, o Requerente EE, acompanhado de duas advogadas, dirigiu-se à D. CC com a intenção de que a mesma pudesse explicitar o motivo do uso do imóvel, e eventual necessidade de celebrar outro contrato ou de sair do imóvel.
Facto 37 - Nessa altura a CC contactou os opoentes tendo o Opoente AA no local exibido documentos dos elementos da PSP que compareceram no local.
Facto 38 - Nessa altura, os Requeridos AA e esposa declararam que não entregavam o imóvel por considerarem ter título.
Facto 39 - A Requerida ao declarar que nunca tenha assinado contrato promessa de venda ou de doação, quando a mesma o assinou pelo seu punho e perante advogado/a, alterou a verdade dos factos.
Facto 5 - No final do dia 24 de julho de 2024, o A. EE dirigiu-se ao imóvel, tendo observado que no mesmo havia sido colocado um cadeado no portão.
Facto 6 - Portão esse que dá acesso a todas as habitações, sendo aliás, o único acesso às habitações.
Facto 7 - Atentos os factos descritos, no dia 25 de julho de 2024, os Requerentes solicitaram a intervenção da PSP do Laranjeiro, a fim de serem identificadas todas as pessoas que se encontravam no imóvel.
Facto 8 - Foi solicitada a presença do Requerido AA, cuja mulher, a Requerida BB, compareceu também, tendo aquele transmitido às autoridades policiais que está munido de uma procuração assinada pela Requerente DD, que lhe confere o usufruto do imóvel por dois anos, findos os quais a opção de compra, pelo que se intitula como o legítimo proprietário ou futuro proprietário da casa.
Em suma, o sentido desta impugnação é para que fique estabelecido nos autos que ambos os requerentes, ao celebrarem a escritura de compra e venda, sabiam:
- Que o prédio estava ocupado pela requerida CC;
- Que os requeridos AA e BB se arrogavam possuidores do bem, em virtude de uma procuração e promessa de doação;
O que é certo é que já está provado nos autos, algo que os pontos dados por não provados não consideraram, que:
- O requerente EE sabia que o prédio estava ocupado pela requerida CC desde junho de 2024;
- A requerente também o sabia, pelo menos desde 24 de julho desse ano (dois dias antes da escritura);
- O requerente sabia desde junho que os recorrentes arrogavam ter direitos sobre o prédio;
- A requerente também o sabia, necessariamente, desde logo porque consta dos factos provados que mentiu ao declarar serem falsas as assinaturas apostas com o seu nome nos documentos na posse do oponente.
Quer isto dizer que esta impugnação sempre deveria ser atendida, por forma a dar coerência e sentido à decisão de facto.
Assim, deve ficar claro que o conhecimento dos requerentes (ora recorridos) não se ateve ao simples conhecimento de uma ocupação do prédio (algo que, como anteriormente referido, já se mostrava expressamente estabelecido), mas a um conhecimento específico da ocupação de CC, por cedência do oponente AA, e dos direitos anteriores sobre o prédio arrogados pelos recorrentes.
Para chegar a esta conclusão não é sequer necessário considerar a prova, mas o simples teor global da decisão de facto.
O ponto que carece de esclarecimento é o do efetivo conhecimento do requerente da posição dos oponentes.
Como referido, está assente que o requerente EE sabia da existência do requerido AA, por tê-lo encontrado em duas deslocações ao imóvel, uma em junho e outra em julho, dias antes da escritura, tendo este expressamente arrogado direitos sobre o bem.
Questão diferente é saber se deu, ou não, alguma consistência à invocação do requerido AA relativa à uma posse do bem.
Decorre de elementares juízos de experiência que a recorrente DD, pretendendo vender o imóvel e sabendo dos negócios que celebrara quanto ao mesmo, necessariamente transmitiu alguma informação, rectius, deu alguma justificação sobre a ocupação ao requerente e futuro comprador.
A questão é, assim, a de saber se este, que, num primeiro momento estaria interessado em concluir o negócio e, num segundo, estava à beira de celebrar escritura, atuou conluiado com a vendedora ou foi também enganado por esta (possivelmente com a invocação de uma qualquer ocupação ilegítima).
Analisando a questão, deve dizer-se que prova de qualquer conhecimento se refere ao apuramento um domínio mental de uma certa informação que, se não for reconhecida pelo próprio, obviamente, não pode ser diretamente apurada por outro meio – trata-se de facto de natureza puramente interna da pessoa que só pode ser inferido de elementos externos de onde possa resultar (analisados de acordo com as regras de experiência e as circunstâncias do caso).
Pretendem os recorrentes que tais elementos sejam:
a. Os documentos existentes nos autos, que conferem aos oponentes diferentes posições de vantagem sobre o prédio (como procuradores, como "usufrutuários" e como promitentes-compradores);
b. As declarações da requerente DD, na sua contradição.
Quanto aos documentos, é claro que a sua simples existência, sem prova objetiva de uma comunicação, não permite estabelecer o seu conhecimento por pessoa que não teve participação na sua elaboração.
Quanto às declarações da requerente DD, a despeito das apontadas incongruências, que são das suas declarações, mas são, sobretudo, do seu comportamento de sucessiva celebração de negócios relativos ao mesmo objeto e de expressa denegação de ter assinado documentos que assinou (facto provado), a análise é menos direta.
Analisado o teor das declarações da recorrente, não se retira qualquer prestação de informação ao requerente EE dos negócios antes celebrados com os oponentes, pelo contrário, tendo afirmado expressamente que achava que as pessoas que lá estavam (...) já tinham saído.
Em nenhum momento a requerente afirmou, portanto, ter informado o requerente da pretensão dos requeridos e, ao invés, negou-o perentoriamente.
É certo que as suas declarações e o seu comportamento não são de molde a afastar dúvidas sustentadas quanto ao sentido do que diz e do que faz, mas, precisamente porque a dúvida existe, caberia aos recorrentes removê-la com meios de prova concludentes. Não o conseguiram fazer com a simples invocação das declarações da requerida.
Deve dizer-se que, de acordo com máximas de experiência, o requerente EE necessariamente conhecia a pretensão possessória dos requeridos e recorrentes, pelo menos desde junho de 2024, altura em que se deslocou ao imóvel.
Alguém que se desloque a um imóvel e o veja ocupado, que suscite intervenção de força policial e, nesse contexto, seja confrontado com documentos apresentados, necessariamente toma conhecimento de uma pretensão possessória.
Não se pode, todavia, concluir que tenha tomado conhecimento efetivo conhecimento do teor dos documentos (por não resultar de qualquer prova que lhes tenham sido pessoalmente entregues ou apresentados), mas pode inferir-se, pelo menos, que a invocação de posse veio associada a uma justificação, devendo presumir-se que traduziu, no mínimo, a informação relativa a um contrato-promessa de compra e venda.
Conclui-se que, se o requerente EE desconsiderou esta informação, fê-lo por interesse próprio, possivelmente cativado pela aquisição e, eventualmente, por entender que a sua posição de proprietário registado estaria devidamente estribada contra pretensões incompatíveis, mas não por desconhecer as posições dos recorridos.
É possível, com um grau de probabilidade razoável, que a requerente tenha agido conluiada com o requerente EE, contando-lhe toda a história do prédio e dos negócios a ele relativos (o facto de aparecerem coligados nesta providência poderá reforçar esta ideia), tendo este aceitado comprar o imóvel sabendo fazê-lo em detrimento de promitentes-compradores; como é igualmente possível, e com um grau de probabilidade igualmente razoável, que a requerente vendedora tenha apresentado ao requerente comprador alguma justificação, falsa mas plausível, que o tenha levado a querer prosseguir com o negócio convencido do que lhe foi dito.
O facto de a requerente celebrar sucessivos negócios, com sucessivas pessoas, atesta um tipo de comportamento pouco estável da sua parte.
Máximas de experiência levam a concluir que, para que tais sucessivos negócios lucrativos tenham sucesso, alguma capacidade de convencimento de potenciais interessados a requerente DD terá.
Como quer que tenha sido, o que se deve concluir é que, quer a requerente vendedora quer o requerente comprador conheciam os argumentos básicos dos requeridos AA e BB e decidiram ignorá-los.
Sabiam que o prédio estava ocupado pela requerida CC, que os requeridos AA e BB tinham celebrado contratos promessa de compra e venda e se arrogavam possuidores do mesmo.
O tipo de conhecimento que tinham é que, com um grau de certeza, não se pode afirmar que fosse equivalente entre os dois requerentes.
A requerente sabia necessariamente que estava a prejudicar a posição de promitentes compradores aqui requeridos-recorrentes.
O requerente é possível que tenha agido convicto do mesmo ou, pelo contrário, tenha acreditado nalguma justificação apresentada pela vendedora quanto ao desconhecimento dos ocupantes e à falsidade dos documentos que invocaram.
A conclusão, em todo o caso, é que procede a impugnação, nessa parte, devendo a redação do facto provado ser mais precisa e não se limitando a fazer transitar os pontos xv. e xvi. dos factos não provados para os provados.
Estes pontos passam, assim, a integrar os factos provados, com a seguinte redação:
40. O Requerente EE tinha conhecimento que o referido imóvel se encontrava ocupado por CC, cedido pelo opoente AA, e que este invocava a sua qualidade de promitente comprador, com entrega do bem e autorização de cedência a terceiros dada pela requerente;
41. O Requerente tinha conhecimento que os oponentes eram possuidores de documentos que invocavam terem sido assinados pela requerente DD, designadamente de um contrato-promessa de compra e venda, uma procuração e uma declaração a conceder ao requerido AA o "usufruto" do prédio.
--
3) O conhecimento de "ónus ou encargos" no momento da escritura:
Pedem os recorrentes que se dê como provado que:
- "O Requerente EE tinha conhecimento de problemas no imóvel em data anterior á escritura porque se tinha deslocado ao mesmo pelo menos nos dias 24 e 25 de junho e ainda assim quis realizar a escritura de compra e venda com a requerente DD no dia 26 /6/2024, tendo a na mesma declarado na referida escritura que os imóveis não tinham ónus ou encargos”
Esta impugnação é parcialmente impertinente e parcialmente repetida da anteriormente apreciada.
Assim, no que concerne ao teor do declarado em escritura pública, bem como no que concerne a deslocações do requerente ao imóvel antes da mesma, trata-se de meras repetições de matéria provada, nada acrescentado a impugnação (quer a escritura, quer a deslocação anterior ao imóvel estão provadas).
O mesmo se dirá quanto ao conhecimento de "problemas" no imóvel.
Se esses "problemas" se referiam, genericamente, à ocupação do prédio por terceiros, está dada por provada.
Se com tal referência geral a problemas os recorrentes pretendem referir-se ao conhecimento dos documentos outorgados a favor dos oponentes, trata-se de uma mera repetição do ponto antes apreciado.
O que resultou provado, mantendo-nos neste contexto manifestamente incorreto à luz do princípio da substanciação, é que se apurou que o requerente sabia que havia "problemas com a ocupação do prédio pela requerida CC e sabia do problema que era haver outras pessoas, os recorrentes AA e BB, que se arrogavam promitentes-compradores e usufrutuários do prédio".
Neste ponto, por estar incluído no anterior, nada há a decidir, estando prejudicado e sem objeto útil.
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4) Conhecimento dos requerentes de estarem a prejudicar os oponentes com a instauração deste procedimento cautelar:
Pretendem os recorrentes que figure como provado o ponto xvii. Do elenco dos factos não provados:
Tem este o seguinte teor:
- Ambos os Requerentes moveram o presente procedimento cautelar de entrega do imóvel, sabendo que os oponentes tinham título válido para usar e fruir do mesmo, na qualidade de promitentes compradores e da procuração que conferia poderes para dar de arrendamento o imóvel.
Também este ponto, em larga medida conclusivo, abrange grandemente o anteriormente apreciado.
Aquilo que o não foi, não tem objeto útil, exceto para a questão da litigância de má-fé – trata-se de um conhecimento relativo ao acionamento judicial, não à substância da matéria.
No que respeita ao conhecimento do requerente, não se pode dizer que resulte dos autos um propósito direto de prejudicar os recorrentes ao instaurar esta providência.
É coerente com a posição de proprietário pleno e devidamente registado "reivindicar" a posse do imóvel de qualquer pessoa que lhe impeça a posse do prédio, sejam ou não promitentes compradores.
No que respeita ao conhecimento da requerente, esse resulta diretamente do teor dos documentos que assinou e que não foram postos em causa (pelo contrário, o que se apurou mesmo foi que proferiu declarações falsas perante a autoridade policial, quando negou a autenticidade da sua assinatura).
Estabelecido isto, é irrelevante para o objeto do procedimento a intenção que presidiu à sua propositura.
Chegando a este ponto, outra referência se deve fazer à circunstância de estarem nos autos vendedor e comprador, i.e., anterior e atual proprietário, quando, em rigor, não se vê que devesse figurar na providência mais que o requerente, proprietário inscrito.
Estando ambos, a intenção da requerente na propositura da providência será menos clara, sendo que a do requerente é, manifestamente, de afirmação da superioridade da sua posse face a detenções ou interesses incompatíveis.
Porque a questão não tem relevância, deve manter-se omitida nos factos provados, como agora se encontra.
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Quer isto dizer, concluindo, procede a impugnação da matéria de facto, nos exatos termos supra referidos.
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II.IV. Recurso de direito:
Face ao antes decidido, cumpre elencar a matéria de facto que se deve dar por definitivamente assente nos autos:
1. A Requerente DD adquiriu, na qualidade de única herdeira e interessada nas heranças de HH, II e JJ, o prédio urbano com a área total de 160 m2, e com a área coberta de 110,75 m2, composto por três casas de ré-do-chão destinadas a habitação, sito na ---, freguesia de Cova da Piedade, concelho de Almada, descrito na Segunda Conservatória do Registo Predial de Almada sob o número --- da aludida freguesia e, inscrito na matriz predial urbana sob os artigos --- da União de Freguesias de Laranjeiro e Feijó.
2. Tendo outorgado a escritura pública de compra e venda do imóvel, livre de quaisquer ónus ou encargos, a favor do Requerente EE, pelo preço de € 55.000,00, no dia 26 de julho de 2024, aquisição esta que veio a ser inscrita no registo predial sob a Ap. ---, de 26.07.2024.
3. A Requerente DD não residia no indicado prédio há cerca de dois anos.
4. Antes da realização do negócio que levou à outorga da escritura pública de compra e venda, o Requerente EE dirigiu-se ao imóvel, a fim de aferir das condições do mesmo, tendo verificado todas as habitações, com exceção de uma primeira, à qual não conseguiu aceder, constatando necessitar de colocação de telhado.
5. No final do dia 24 de julho de 2024, o A. EE dirigiu-se ao imóvel, tendo observado que no mesmo havia sido colocado um cadeado no portão.
6. Portão esse que dá acesso a todas as habitações, sendo aliás, o único acesso às habitações.
7. Atentos os factos descritos, no dia 25 de julho de 2024, os Requerentes solicitaram a intervenção da PSP do Laranjeiro, a fim de serem identificadas todas as pessoas que se encontravam no imóvel.
8. Foi solicitada a presença do Requerido AA, cuja mulher, a Requerida BB, compareceu também, tendo aquele transmitido às autoridades policiais que está munido de uma procuração assinada pela Requerente DD, que lhe confere o usufruto do imóvel por dois anos, findos os quais a opção de compra, pelo que se intitula como o legítimo proprietário ou futuro proprietário da casa.
9. Nesse dia, pelos agentes da PSP foram devidamente identificadas todas as pessoas no local.
10. O Requerente EE e as demais pessoas que o acompanhavam declararam ter sido ameaçadas e injuriadas pelo Requerido AA e que iriam apresentar a competente queixa, o que tudo ficou consignado no auto de notícia que deu origem aos autos com o NUIPC 908/24.8PGALM.
11. O Requerido AA cobra de terceiros quantias em dinheiro para ocupação de um rés-do-chão cujo telhado está a ruir.
12. A Requerente é uma pessoa com dificuldades económicas, com cerca de 80 anos de idade, sem familiares vivos, carecendo de meios financeiros que lhe permitissem executar as obras necessárias no imóvel.
13. Os Requeridos são perentórios em não entregar o imóvel ao Requerente EE.
14. Os Requerentes temem, por já ter havido ameaças, algum tipo de represálias por parte dos Requeridos.
15. O Requerido AA apresentou queixa crime contra o Requerente EE, alegando ter celebrado com a Requerente DD contrato promessa de compra e venda e contrato promessa de doação relativos ao imóvel, além de outros.
16. Em 13.01.2022, a Requerente DD outorgou procuração a favor do Requerido AA, conferindo-lhe poderes para, designadamente, outorgar contratos de arrendamento relativamente ao prédio de que se cura e intentar processo judicial ou procedimento especial de despejo.
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17. Por via sucessória, a Autora seria proprietária do imóvel dos autos, e ainda juntamente com outros herdeiros, do imóvel prédio urbano composto por um prédio destinado a pavilhão gimnodesportivo sito na ---, Av. --- inscrito na matriz sob o artigo --- da União de Freguesias de Laranjeiro e Feijó.
18. Foi outorgada escritura de compra e venda do imóvel identificado em 17), entre a aqui Requerente e outros herdeiros, datada de 11.06.2024.
19. A Opoente mulher é cabeleireira e a Requerente DD frequentava o seu salão, há largos anos, ainda quando o marido da requerente era vivo.
20. Quando ficou viúva a requerente pretendeu vender o imóvel.
21. A Requerente tinha celebrado no passado um acordo com KK, relativo ao anexo que faz parte do prédio em causa nos autos, a qual mais tarde deixou de residir no mesmo, em data não apurada.
22. Os Requeridos tomaram também conhecimento que a Requerente tinha recebido a quantia de 7.000,00 € (sete mil euros) de uma terceira pessoa, de nome LL, e que não era possível outorgar a escritura por existirem questões burocráticas pendentes referentes ao imóvel.
23. Os Requeridos acordaram com a Requerente a compra futura do imóvel em causa nos autos, para o que entregaram o valor de € 6.000,00 a título de sinal.
24. A Requerente e os Requeridos assinaram o documento denominado “contrato promessa de compra e venda”, datado de 1.07.2020, junto a fls. 103 e ss, pelo preço de € 30.000,00 e cujo teor e clausulado se dá por integralmente reproduzido.
25. A Requerente assinou a declaração datada de 6.01.2022, junta aos autos a fls. 68 e ss na qual a mesma declara que “pretende doar no prazo de 2(dois) anos, o prédio (…), a AA (…). Declara que enquanto não for celebrada a escritura de doação entre as partes identificadas, que cede o usufruto dos imóveis supra identificados à pessoa supra identificada, que passa a ser o usufrutuário, concedendo-lhe assim o gozo dos imóveis identificados, durante o prazo de 2 anos, tendo recebido daquele, a este título, o montante de € 24.000,00”.
26. A Requerente DD, assinou o documento denominado “procuração”, datado de 13.01.2022, na qual declarou constituir seu “bastante procurador”, o aqui Requerido, AA, para com referência ao prédio dos autos, poder atuar nos termos aí consignados e cujo teor se reproduz – fls 106 e ss.
27. A Requerente DD e o Requerido AA assinaram o documento denominado de “contrato promessa de doação”, de 10.05.2023, constante de fls. 176 e ssm e cujo teor se dá por integralmente produzido.
28. A Requerente e os Requeridos concordaram no pagamento mensal de € 500,00, desde data não aferida, por conta da promessa de compra e venda.
29. A Requerente recebeu alguns pagamentos, em valor não aferido por parte dos Requeridos.
30. A Requerente DD a dado momento começou a viver em quartos alugados.
31. Os Opoentes em data não apurada cederam o imóvel em causa nos autos à requerida CC, mediante a contrapartida de pagamento da quantia de € 500,00 mensais.
32. Não obstante, o Opoente marido ter na sua posse procuração, a situação do imóvel continuava num impasse.
33. A Requerente fez propostas a potencial interessado para a venda do imóvel.
34. A advogada da Requerente, entre junho e julho de 2024 tentou aferir a situação do imóvel.
35. A mandatária do Requerente igualmente contactou a requerida CC.
36. Em meados de junho de 2024, o Requerente EE, acompanhado de duas advogadas, dirigiu-se à D. CC com a intenção de que a mesma pudesse explicitar o motivo do uso do imóvel, e eventual necessidade de celebrar outro contrato ou de sair do imóvel.
37. Nessa altura a CC contactou os opoentes tendo o Opoente AA no local exibido documentos dos elementos da PSP que compareceram no local.
38. Nessa altura, os Requeridos AA e esposa declararam que não entregavam o imóvel por considerarem ter título.
39. A Requerida ao declarar que nunca tenha assinado contrato promessa de venda ou de doação, quando a mesma o assinou pelo seu punho e perante advogado/a, alterou a verdade dos factos.
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40. O Requerente EE tinha conhecimento que o referido imóvel se encontrava ocupado por CC, cedido pelo opoente AA, e que este invocava a sua qualidade de promitente comprador, com entrega do bem e autorização de cedência a terceiros dada pela requerente;
41. O Requerente tinha conhecimento que os oponentes eram possuidores de documentos que invocavam terem sido assinados pela requerente DD, designadamente de um contrato-promessa de compra e venda, uma procuração e uma declaração a conceder ao requerido -- o "usufruto" do prédio.
Além destes, há que considerar o supra referido elemento constante dos autos e cujo teor não foi incluído na fundamentação:
- Por escritura pública datada de 13 de junho de 2024 a requerente DD declarou doar a FF o prédio objeto dos autos e este declarou aceitar tal doação, tudo nos termos da cópia enviada em anexo ao ofício da Conservatória de Registo Predial de Almada apresentado em 2/12/2024.
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Estabelecida a matéria de base, há que apreciar as diversas questões de direito suscitadas.
A posse do requerente:
Assentou a decisão na declaração que o requerente EE é titular da posse do bem, por ser seu proprietário.
Remetendo-se para o que acima se disse, os autos não atestam que a compra e venda tenha sido um ato jurídico transmissivo da propriedade, pela simples razão que esta já não se encontrava na esfera jurídica do vendedor.
Trata-se de uma verdadeira de bem alheio, cuja sanção é a nulidade.
Esta nulidade estabelecida pelo art.º 892.º do CC tem sido qualificada de atípica ou mista, traduzindo um verdadeiro desvalor do ato entre os contratantes (vendedor e comprador), mas não podendo ser oposta pelo vendedor ao comprador de boa-fé, assim como o comprador doloso não a pode opor ao vendedor de boa-fé (traduzido o dolo no mero conhecimento da natureza alheia do bem) – a propósito, vide acórdão do STJ de 24/6/2006, Fonseca Ramos13).
Mais relevante será que o negócio é ineficaz em relação ao verdadeiro proprietário do bem, por ser-lhe objetiva e subjetivamente alheio - res inter alios acta.
Porque vendedor e comprador de bem alheio figuram ambos do lado ativo do procedimento cautelar e os terceiros ao negócio não são os proprietários efetivos, mas meros promitentes-compradores, a solução tem que ser a de fazer operar nos autos a presunção registal a favor do adquirente a non domino.
Esta presunção é derrogável pelo proprietário, terceiro aos autos, mas não pode ser derrogada por uma detenção emergente da posição de promitente-comprador, feita de mão própria ou cedida na sua execução a uma terceira pessoa, neste caso à requerida CC, por meio do arrendamento irregular.
A posse do promitente-comprador deverá sempre ser considerada em nome alheio, uma mera posse ou detenção em nome da promitente-vendedora.
Esta mera posse, em confronto com uma posse que beneficia da presunção registal, mesmo que se saiba a non domino, terá que ceder.
Diversamente, caso seja discutida a posse entre o proprietário inscrito, aqui requerente, e o proprietário efetivo (o beneficiário da doação), seria a presunção registal que teria que ceder.
Não sendo esse o quadro subjetivo do litígio, a conclusão a tirar é que a posse do requerente EE, por beneficiar da presunção de propriedade oponível aos meros detentores, é juridicamente mais forte que a mera posse dos requeridos AA e BB, emergente da sua posição de promitentes compradores.
Assim sendo, a conclusão a tirar, nesta sede cautelar de avaliação provisória, é a verificação de uma posse do requerente justificativa da decisão tomada. –
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b) O invocado direito de retenção dos promitentes compradores:
Invocam os recorrentes serem titulares de direito de retenção sobre o bem.
A sentença recorrida pronunciou-se sobre esta questão da seguinte forma:
Por outro lado, vinham os opoentes invocar a existência de direito de retenção, previsto no art. 733º CC “por incumprimento definitivo dos contratos promessa por banda dos Requerentes”, sendo que a primeira decisão não teve em conta o incumprimento dos contratos promessa celebrados e “direito de retenção do imóvel de acordo com o art. 755º CC”, defendendo que ocorreu a “traditio”.
Nos termos do art. 755º, n.º 1, f) CC: 1. Gozam ainda do direito de retenção: f) O beneficiário da promessa de transmissão ou constituição de direito real que obteve a tradição da coisa a que se refere o contrato prometido, sobre essa coisa, pelo crédito resultante do não cumprimento imputável à outra parte, nos temos do artigo 442.º”.
Assim, constituem pressupostos do reconhecimento do direito de retenção previsto no citado dispositivo:
A existência de promessa de transmissão ou constituição de um direito real.
A entrega ou tradição da coisa objeto de contrato-promessa.
A titularidade, por parte do beneficiário, de um crédito sobre a outra parte, decorrente do incumprimento definitivo do contrato promessa.
Desde logo, da análise do primitivo contrato promessa de compra e venda, do ponto 4 da cláusula terceira refere-se que a traditio se dará com a celebração da escritura de compra e venda.
Por outro lado, a menção no acordo de 10.05.2023, de que a Requerente “cede o usufruto e habitação dos imóveis”, tal adveio desconsiderado tendo em conta que os Opoentes não provaram a efetiva entrega a seu favor para efeitos de “usufruto”.
Ora,
“I - a traditio consubstancia-se como um poder de facto sobre a coisa que o promitente-vendedor confere ao promitente-comprador, traduzindo-se num conjunto de atos materiais ou simbólicos demonstrativos do controlo da coisa.
II - Pode manifestar-se através de múltiplos comportamentos, cuja significação social e de acordo com as regras gerais da experiência, revelem o elemento negativo consubstanciado no abandono da coisa pelo seu anterior detentor, e que tenham como correspondência a apprehensio pelo novo detentor, enquanto elemento positivo.
III- No caso da entrega das chaves do imóvel, enquanto tradição simbólica, não deve entender-se que por si só se consubstancia em tal tradição da coisa, importando sim atender ao respetivo contexto, não só circunstancial, mas e sobretudo o que resulta dos termos negociados entre as partes”. – acórdão do STJ, de 3.05.2023, processo n.º 4183/16.0T8VNG-E.P1.S1, www.dgsi.pt.
Por seu turno, não há direito de retenção, segundo o art. 756.º do CC: a) a favor dos que tenham obtido por meios ilícitos a coisa que devem entregar.
Não tendo os Opoentes logrado provar ter sido realizada efetivamente a traditio da coisa, nos termos previstos no citado normativo, e ainda dando como não provado o consignado na alínea ix), cumpre concluir que não beneficiam os Opoentes do invocado direito de retenção sobre o imóvel em apreço nestes autos.
Quer isto dizer, sintetizando, a decisão recorrida, assentou num juízo de inexistência de uma efetiva tradição do bem objeto de contrato-promessa para afastar o direito de retenção.
É este juízo que cumpre reapreciar.
O direito de retenção constitui uma garantia especial e real, de pendor nem sempre linear, mas a que o legislador atribuiu até preponderância face à hipoteca (o debate relativo ao equilíbrio destas garantias é estranho ao caso – cf. art.º 754.º e 752.º n.º 2 do CC)
Trata-se de um direito funcional ao cumprimento de uma obrigação, permitindo ao credor que detenha o bem não só recusar a entrega dela enquanto o devedor não cumprir, mas também de executar a coisa e se pagar à custa dela, com preferência sobre os demais credores14.
No caso do credor promitente-comprador, estabelece a lei um direito especial de retenção (art.º 755.º, n.º 1, al. f) - o beneficiário da promessa de transmissão ou constituição de direito real que obteve a tradição da coisa a que se refere o contrato prometido, sobre essa coisa, pelo crédito resultante do não cumprimento imputável à outra parte, nos termos do art. 442º.
Estabelecida a existência de uma promessa e decorrendo diretamente da celebração de escritura de compra e venda entre os requerentes o seu incumprimento, resta em análise, como feita a quo, a determinação de uma tradição para pode afirmar este direito.
Repescando dos factos provados a matéria relevante para a questão, teremos:
- A existência de um contrato-promessa outorgado com os recorrentes;
- O pagamento de sinal e pagamento de parte do preço (€6.000,00 a título de sinal expressamente declarados no contrato-promessa e, com finalidade dúbia, mais €24.000 aquando da declaração de promessa de doação feita em 6 de janeiro de 2022);
- Além de tais valores, ou computados nestes, requerente e requeridos acordaram no pagamento mensal de €500,00, desde data não aferida, por conta da promessa de compra e venda, tendo sido concretizados alguns pagamentos, em valor global não apurado;
- A declaração, feita nesse momento (6/1/2022), que a promitente vendedora cede o usufruto dos imóveis supra identificados à pessoa supra identificada, que passa a ser o usufrutuário, concedendo-lhe assim o gozo dos imóveis identificados, durante o prazo de 2 anos;
- Que os recorrentes, em data não apurada, cederam o imóvel à requerida CC, mediante a contrapartida de pagamento da quantia de € 500,00 mensais;
- Foi colocado um cadeado no portão de acesso ao prédio, que ali se encontrava na data da escritura de compra e venda.
Como referido no acórdão citado na decisão recorrida, o ato de tradição pode manifestar-se através de múltiplos comportamentos, cuja significação social e de acordo com as regras gerais da experiência, revelem o elemento negativo consubstanciado no abandono da coisa pelo seu anterior detentor, e que tenham como correspondência a apprehensio pelo novo detentor.
Em termos objetivos e concretos, a tradição corresponde a uma entrega do bem, do promitente vendedor ao comprador, traduzida no referido abandono, ou abstenção de prática de atos materiais pelo vendedor, associada a um comportamento de apreensão do comprador. Essa apreensão traduzir-se-á na assunção de um controlo material sobre o bem.
Como sintetizado em acórdão do STJ de 16/2/2016 (Clara Sottomayor)15, a tradição configura como o poder de facto sobre a coisa que o promitente-vendedor conferiu ao promitente-comprador, ou seja, como um conjunto de atos materiais ou simbólicos demonstrativos do controlo sobre a coisa.
Ao contrário do que sustenta a decisão recorrida, afigura-se claro que a requerente concretizou uma efetiva traditio do bem a favor dos requeridos e recorrentes e que estes tinham um efetivo controlo material sobre o bem.
O momento em que tal tradição se teria concretizado não é certo e, como consta da decisão, não terá coincidido com o contrato-promessa, uma vez que aí consta expressamente que tal não ocorreria, mas ter-se-á verificado mais tarde, presumivelmente aquando da declaração de usufruto emitida a favor do recorrente (janeiro de 2022).
Essa declaração traduz até uma afirmação expressa da intenção de entregar o bem ao recorrente, que só por si seria irrelevante, mas que se corporizou materialmente (algo que se extrai diretamente da conjugação dessa declaração com a circunstância de o bem estar indubitavelmente ocupado, na sequência de cedência onerosa feita pelos recorrentes a favor da requerida CC, sendo que tal ocupação estava até materialmente defendida pela instalação de um cadeado no portão).
Tratar-se-á, portanto, de uma tradição feita pela promitente vendedora aos promitentes compradores, em data indeterminada, mas posterior à do contrato-promessa.
Uma vez apreendido o bem pelos promitentes-compradores, estes, mantendo o controlo material sobre o mesmo, entregaram o domínio direto e efetivo a uma "arrendatária irregular", mas fizeram-no em nome próprio e na qualidade de possuidores efetivos do bem.
Em termos conclusivos, desde que o bem foi entregue aos requeridos, estes assumiram e mantiveram controlo material sobre o mesmo, diretamente ou por meio de terceiros, e com isso foi concretizada a traditio da coisa.
Está, assim, preenchido o conceito de tradição, pela entrega e alheamento do proprietário e apreensão e detenção pelos requeridos.
Questão diversa é se tal permite, neste quadro, considerar verificado o quadro legal conferidor de direito de retenção.
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As questões que se podem colocar, verificada a promessa, a entrega de sinal (ainda que de montante global não apurado) e o seu incumprimento pelo vendedor, serão:
i) A oponibilidade de tal direito ao requerente comprador;
ii) A qualidade de não consumidores dos promitentes compradores.
Quanto à primeira, a resposta é linear – decorre da natureza erga omnes do direito real de retenção a sua oponibilidade ao comprador e, portanto, pode este ser exercido não apenas em relação à contratante na promessa, mas também à adquirente, ou a qualquer outra pessoa.
A segunda questão tem merecido amplo debate jurisprudencial, na sequência da aprovação do acórdão de uniformização de jurisprudência (AUJ) n.º 4/201416, que firmou entendimento jurisprudencial pelo seguinte segmento:
"No âmbito da graduação de créditos em insolvência, o consumidor promitente-comprador em contrato, ainda que com eficácia meramente obrigacional com traditio, devidamente sinalizado, que não obteve o cumprimento do negócio por parte do administrador da insolvência, goza do direito de retenção nos termos do estatuído no artigo 755º nº 1 alínea f) do Código Civil".
Este acórdão uniformizador foi depois concretizado por outro, o AUJ n.º 4/201917, que firmou entendimento da seguinte forma:
"Na graduação de créditos em insolvência, apenas tem a qualidade de consumidor, para os efeitos do disposto no Acórdão n.º 4 de 2014 do Supremo Tribunal de Justiça, o promitente-comprador que destina o imóvel, objeto de traditio, a uso particular, ou seja, não o compra para revenda nem o afeta a uma atividade profissional ou lucrativa"
O debate que se seguiu é o de saber se esta uniformização restringe, de forma generalizada, a retenção do promitente à sua posição de consumidor, ou se o seu sentido não chega à tanto, referindo est--mente à situação típica em apreço nestes arestos (processo de insolvência e incumprimento pelo administrador de insolvência, ou promessas de venda por empresas a consumidores).
Em acórdão anteriormente referido (STJ de 16/2/2016) a questão é amplamente tratada e pode dizer-se que tem feito caminho o entendimento jurisprudencial no sentido que a doutrina da jurisprudência uniformizada não se aplica genericamente a todas as situações de contrato-promessa com tradição – vejam-se, designadamente, além dos citados, os acórdãos STJ de 19/9/2024 (Ferreira --)18; 22/2/2022 (Barateiro Martins)19;10/1/2019 (Tomé Gomes)20 e 11/9/2018 (Graça Amaral)21.
Ainda que a matéria de facto seja escassa, dir-se-á que, seja pela natureza não profissional da alienante, seja pela cedência onerosa do bem feita pelos requeridos recorrentes à requerida CC, que será de afastar a sua qualificação como consumidores para este efeito.
Perfilhando o entendimento que a norma é de aplicação geral e dispensa a demonstração dessa qualidade. Verificados os demais requisitos legais, a questão irreleva e impõe-se a conclusão que os recorrentes têm efetivo direito de retenção sobre o bem, para garantia de satisfação do seu direito de crédito de sinal emergente do contrato-promessa.
Tal direito, porque foi posto em causa pela decisão recorrida, deve levar à revogação desta, reinstalando-se os recorrentes na detenção do bem, na qualidade de promitentes compradores e retentores.
É o que se decide, concedendo-se a apelação. --
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Face a esta decisão, considera-se prejudicado o conhecimento do invocado abuso de direito e da inexistência de periculum in mora no decretamento da providência. –
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III. Decisão:
Face ao exposto, decidindo:
Concede-se parcialmente a apelação relativa à decisão de facto, passando os pontos XV. e XVI. do elenco de factos não provados a ficar vazios e aditando-se ao elenco dos provados dois novos factos, com o seguinte teor:
40. O Requerente EE tinha conhecimento que o referido imóvel se encontrava ocupado por CC, cedido pelo opoente AA, e que este invocava a sua qualidade de promitente comprador, com entrega do bem e autorização de cedência a terceiros dada pela requerente;
41. O Requerente tinha conhecimento que os oponentes eram possuidores de documentos que invocavam terem sido assinados pela requerente DD, designadamente de um contrato-promessa de compra e venda, uma procuração e uma declaração a conceder ao requerido AA o "usufruto" do prédio.
Concede-se a apelação, declarando-se que os recorrentes têm direito de retenção sobre o imóvel objeto dos autos, para satisfação do seu crédito emergente do contrato-promessa celebrado com a recorrida, revogando-se a decisão de entrega do bem ao recorrido e determinando-se a sua entrega aos recorrentes.
Custas pelos recorridos.
Notifique-se e registe-se. –
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Lisboa, 23 de outubro de 2025
João Paulo Vasconcelos Raposo
Inês Moura
Arlindo Crua
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12. jurisprudência.pt - Pesquisa de jurisprudência Portuguesa
13. 08A1736 - Jurisprudência - STJ
14. Antunes Varela, Das Obrigações em Geral, Tomo II, 7ª ed., p. 579.
15. Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça
16. De 20/03/2014, DR, I Série, n.º 95, de 19/05/2014.
17. De 12/2/2019 DR, I Série, n.º 141, de 25/7/2019.
18. Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça
19. Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça
20. 3595/16.3T8GMR.G1.S1 - Jurisprudência - STJ
21. 25261/11.6T2SNT-D.L1.S2 - Jurisprudência - STJ