Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa
Processo:
248/22.7YHLSB.L1-PICRS
Relator: LUÍS FERRÃO
Descritores: MARCA
FALTA DE CARÁCTER DISTINTIVO
MOTIVO ABSOLUTO DE RECUSA
Nº do Documento: RL
Data do Acordão: 12/21/2022
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Texto Parcial: N
Meio Processual: RECURSO DE APELAÇÃO
Decisão: IMPROCEDENTE
Sumário: I – Um sinal constituído por vocábulos que correspondem às indicações que serve, no comércio, para designar a espécie do produto e a respectiva proveniência geográfica, carece de carácter distintivo, não podendo ser registado como marca.

II - O facto de, além daquele produto, o registo ser solicitado igualmente para assinalar serviços associados à sua promoção ou com ele relacionados, não altera substancialmente a falta de carácter distintivo do sinal.
Decisão Texto Parcial:
Decisão Texto Integral: Acordam em conferência, na Secção Propriedade Intelectual, Concorrência, Regulação e Supervisão do Tribunal da Relação de Lisboa

I – Relatório
Câmara Municipal de Vizela (recorrente) para o Tribunal da Propriedade Intelectual nos termos do artigo 38º do Código da Propriedade Industrial (CPI) do despacho do Instituto Nacional da Propriedade Industrial (INPI) que recusou o registo de marca nacional nº 67617, por falta de capacidade distintiva do sinal registando.
Formulou o pedido nos seguintes termos:
‘Nestes termos e nos melhores de Direito, deverá ser dado provimento presente recurso, revogando-se o despacho de recusa da marca, e consequentemente, ordenando-se a concessão do registo de marca nacional n.º 656157, concedendo assim proteção jurídica à mesma;
CASO ASSIM NÃO SE ENTENDA, Na hipótese de se entender que o pedido não pode proceder quanto aos produtos da classe 30 da Classificação Internacional de Nice, sempre terá que proceder parcialmente para as seguintes classes da Classificação Internacional de Nice: 16, 35, 41 e 43 – ordenando-se a concessão parcial do registo da marca nacional n.º 656157, concedendo assim proteção jurídica à mesma.

Alegou, em síntese:
A marca registanda subjacente ao pedido em crise destinava-se a assinalar os seguintes produtos/serviços da Classificação de Nice: Classe 16 – Livros de culinária; publicações didáticas; Classe 30 – Bolos; confeitaria; produtos de pastelaria; produtos de confeitaria; Classe 35 – Organização de exposições com fins comerciais ou de publicidade; promoção de vendas [para terceiros]; publicidade; relações públicas; serviços de venda a retalho relativos a doçarias; Classe 41 – Workshops para fins culturais; organização de eventos culturais locais; administração [organização] de atividades culturais; organização de eventos para fins culturais; organização de demonstrações para fins culturais; direção de exposições para fins culturais; serviços de educação relacionados com culinária; consultadoria na organização de competições culinárias; serviços de consultadoria no domínio; dos concursos de culinária; atividades culturais; serviços culturais; realização de eventos culturais; e Classe 43 – Serviços de consultadoria no domínio das artes culinárias; conselhos sobre receitas culinárias”.

Não deve proceder a argumentação do INPI de que a marca registanda é “unicamente constituída por elementos de natureza genérica/descritiva que, aos olhos dos consumidores, poderão limitar-se a indicar e a promover um produto específico e a sua indicação geográfica”.

Com efeito, na análise da distintividade dos sinais, o INPI não pode ignorar que o caráter distintivo das marcas deve ser apreciado por referência aos produtos/serviços para os quais o pedido de registo foi apresentado;

Assim, é patente que a marca “BOLINHOL DE VIZELA” é dotada de eficácia distintiva.

Ainda que assim não se entendesse, ao menos no que concerne aos produtos e serviços assinalados nas classes 16, 35, 41 e 43, sempre seria mandatório reconhecer a distintividade do sinal sub judice,

Pois que, neste âmbito, o sinal marcário não pode ser entendido como descritivo;

Desde logo porque dele não emana qualquer significado originário e próprio dos produtos e serviços assinalados nas classes em apreço.

Pelo que se impunha, nesse caso e nos termos do previsto no art.º 237.º do CPI, proferir, quanto muito, despacho de recusa parcial quanto aos produtos da classe 30, com a consequente concessão da marca registanda quanto a todos os
demais.


A acrescer ao exposto, para além das marcas supra identificadas que compreendem na sua composição o termo “Bolinhol”, a recusa do pedido de registo em crise não pode lograr, uma vez que consubstancia uma clara violação do princípio da igualdade, já que existem no mercado diversas marcas concedidas pelo INPI
para assinalar produtos “sobejamente conhecidos” e parte integrante do património cultural do nosso país, como sejam as marcas nacionais n.º 170914 “Vinho do Porto”
concedida a “ADRIANO RAMOS-PINTO (VINHOS), S.A.”; n.º 520202 “Bordado de Viana do Castelo”, concedida ao “MUNICÍPIO DE VIANA DO CASTELO”; n.º 646856 “Galo de Barcelos”, concedida ao “MUNICÍPIO DE BARCELOS”.


Pelo que, tudo visto e ponderado, importa concluir inexistir fundamento para a recusa de marca, impondo-se, por conseguinte, revogar a decisão do INPI.

Foi proferida sentença, constando do dispositivo da sentença o seguinte:
Termos em que, vistos os princípios e as normas invocadas, se indefere o recurso apresentado, mantendo-se o despacho recorrido que recusou o registo da marca nacional nominativa n.º 676167, com a designação “BOLINHOL DE VIZELA”.

Inconformada, apelou a recorrente, formulando as seguintes conclusões:

1.º Vem o presente recurso interposto da sentença proferida pelo Tribunal da Propriedade Intelectual que mantém o despacho recorrido que recusou o registo da marca nacional n.º 676167, com a designação “BOLINHOL DE VIZELA”;

2º. A decisão em crise, – na medida em que não resolve todas as questões que a Recorrente submeteu à sua apreciação e cuja pronúncia sobre a mesma se afigura absolutamente essencial para salvaguarda dos seus direitos – padece de flagrante nulidade, por manifesta omissão de pronúncia, em violação ao disposto nos artigos 608.º, n.º 2, artigo 615.º, n.º 1, alínea d) do CPC (ex. vi do artigo 668.º, n.º 1, alínea d) do CPC).

3.º A marca registanda subjacente ao pedido em crise destina-se a assinalar os seguintes produtos/serviços da Classificação de Nice: Classe 16 – Livros de culinária; publicações didáticas; Classe 30 – Bolos; confeitaria; produtos de pastelaria; produtos de confeitaria; Classe 35 – Organização de exposições com fins comerciais ou de publicidade; promoção de vendas [para terceiros]; publicidade; relações públicas; serviços de venda a retalho relativos a doçarias; Classe 41 – Workshops para fins culturais; organização de eventos culturais locais; administração [organização] de atividades culturais; organização de eventos para fins culturais; organização de demonstrações para fins culturais; direção de exposições para fins culturais; serviços de educação relacionados com culinária; consultadoria na organização de competições culinárias; serviços de consultadoria no domínio; dos concursos de culinária; atividades culturais; serviços culturais; realização de eventos culturais; e Classe 43 – Serviços de consultadoria no domínio das artes culinárias; conselhos sobre receitas culinárias”.

4.º A Requerente/Recorrente não se pode conformar com a decisão de recusa tal do pedido de registo.

5.º Pois, sendo o “BOLINHOL DE VIZELA”, também conhecido como Bolinhol, um doce centenário que faz parte do património gastronómico de Vizela, concentrando em si caraterísticas históricas, culturais e económicas relevantes que merecem ser protegidas, preservadas, valorizadas e promovidas, a Requerente/Recorrente – no cumprimento das suas atribuições, designadamente a Lei n.º 75/2013, de 12 de Setembro, que instituiu o Regime jurídico das autarquias locais –, e de modo a salvaguardar e zelar pelo património imaterial concelhio, levou a cabo um processo de certificação do “Bolinhol de Vizela”, com a “CERTIS – Controlo e Certificação Lda.”, organismo de certificação;

6.º Ficando ainda responsável pelo financiamento da certificação do Bolinhol de Vizela, por dois anos, dos operadores económicos que, sendo uma unidade de transformação de “BOLINHOL DE VIZELA”, pretendam utilizar e beneficiar da utilização do correspondente certificado.

7.º Por conseguinte, considera-se que não se verifica qualquer inibição ou limitação no uso da designação do produto em apreço por outros agentes económicos, mormente na sua normal e expetável utilização, a saber: a produção e/ou a comercialização do Bolinhol;

8.º Encontrando-se assegurada a normal lealdade da concorrência, o que, na realidade é uma das funções da propriedade industrial, conforme se dispõe no artigo 1.º do CPI;

9.º E, ademais, o que não é de ignorar, atento o próprio processo de certificação, a prevenção da indução em erro dos consumidores.

10º. O que nos leva a concluir que, ainda que o pedido não proceda na sua totalidade (i.e., para os produtos da classe 30 “Doçaria”) – o que não se concede e apenas se concebe para efeitos de patrocínio – sempre terá que proceder parcialmente para as seguintes classes da Classificação Internacional de Nice: 16, 35, 41 e 43.

ISTO POSTO,
11.º Não deve proceder a argumentação do INPI de que a marca registanda é “unicamente constituída por elementos de natureza genérica/descritiva que, aos olhos dos consumidores, poderão limitar-se a indicar e a promover um produto específico e a sua indicação geográfica”.

12.º Com efeito, na análise da distintividade dos sinais, o INPI não pode ignorar que o caráter distintivo das marcas deve ser apreciado por referência aos produtos/serviços para os quais o pedido de registo foi apresentado;

13.º Assim, e considerando o supra exposto, é patente que a marca “BOLINHOL DE VIZELA” é dotada de eficácia distintiva.

14.º Sem se conceder, ainda que assim não se entendesse, o que por mera hipótese académica se coloca, ao menos no que concerne aos produtos e serviços assinalados nas classes 16, 35, 41 e 43, sempre seria mandatório reconhecer a distintividade do sinal sub judice,

15.º Pois que, neste âmbito, o sinal marcário não pode ser entendido como descritivo;

16.º Desde logo porque dele não emana qualquer significado originário e próprio dos produtos e serviços assinalados nas classes em apreço.

17.º Pelo que se impunha, nesse caso e nos termos do previsto no art.º 237.º do CPI, proferir, quando muito, despacho de recusa parcial quanto aos produtos da classe 30;

18.º Com a consequente concessão da marca registanda quanto a todos os demais.

19.º A acrescer ao exposto, para além das marcas supra identificadas que compreendem na sua composição o termo “Bolinhol”, a recusa do pedido de registo em crise não pode lograr, uma vez que consubstancia uma clara violação do princípio da igualdade,

20.º Já que existem no mercado diversas marcas concedidas pelo INPI para assinalar produtos “sobejamente conhecidos” e parte integrante do património cultural do nosso país,

21.º Como sejam as marcas nacionais n.º 170914 “Vinho do Porto” concedida a “ADRIANO RAMOS-PINTO (VINHOS), S.A.”; n.º 520202 “Bordado de Viana do Castelo”, concedida ao “MUNICÍPIO DE VIANA DO CASTELO”; n.º 646856 “Galo de Barcelos”, concedida ao “MUNICÍPIO DE BARCELOS”.

22.º Pelo que, tudo visto e ponderado, importa concluir inexistir fundamento para a recusa de marca, impondo-se, por conseguinte, revogar a decisão do INPI.

Terminou requerendo:
‘Nestes termos e nos melhores de Direito, deverá:
a) Ser declarada nula a sentença recorrida por omissão de pronúncia;
Caso assim não se entenda,
b) Ser revogada a sentença recorrida e, por consequência, o despacho de recusa da marca, e, consequentemente, ordenando-se ma concessão do registo de marca nacional nº 656157, concedendo-se assim protecção à mesma;
Caso assim se não entenda,
c) Na hipótese de se entender que o pedido de registo não pode proceder quanto aos produtos da classe 30 da Classificação Internacional de Nice, sempre terá de proceder para as seguintes classes da Classificação Internacional de Nice: 16, 35, 41 e 43 – ordenando-se a concessão parcial do registo da marca nacional nº 656157, concedendo assim protecção à mesma.’

II. Questões a decidir

Sendo o objeto do recurso balizado pelas conclusões da apelante, nos termos preceituados pelos artigos 635º, nº 4, e 639º, nº 1, do Código de Processo Civil, impõe-se conhecer das questões colocadas pela apelante e as que forem de conhecimento oficioso, sem prejuízo daquelas cuja decisão fique prejudicada pela solução dada a outras, sendo o julgador livre na apreciação e aplicação do direito, nos termos do disposto no artigo 5º, nº 3 do Código de Processo Civil.

Assim, no caso concreto, importa apreciar e decidir:
- se a sentença é nula por omissão de pronúncia, por não ‘resolver todas as questões que a Recorrente submeteu à sua apreciação e cuja pronúncia sobre a mesma se afigura absolutamente essencial para salvaguarda dos seus direitos’;
- se o pedido de registo de marca nacional nº 676167 BOLINHOL DE VIZELA deve ser recusado para a totalidade dos produtos/serviços que visa assinalar, por falta de carácter distintivo enquanto unicamente composto de elementos genéricos que remetem para os ditos produtos/serviços ou a sua proveniência geográfica.
***
III. FUNDAMENTAÇÃO.
III.1. O tribunal recorrido considerou assentes os seguintes factos:
1. Em 18/11/2021, a Recorrente pediu o registo da marca nominativa nacional nº 676167 “BOLINHOL DE VIZELA”. (cf. processo INPI)
2. O pedido destinava-se a abranger os produtos/serviços das seguintes classes:
classe 16: livros de culinária; publicações didáticas.
classe 30: bolos; confeitaria; produtos de pastelaria; produtos de confeitaria.
classe 35: organização de exposições com fins comerciais ou de publicidade; promoção de vendas [para terceiros]; publicidade; relações públicas; serviços de venda a retalho relativos a doçarias.
classe 41: workshops para fins culturais; organização de eventos culturais locais; administração [organização] de atividades culturais; organização de eventos para fins culturais; organização de demonstrações para fins culturais; direção de exposições para fins culturais; serviços de educação relacionados com culinária; consultadoria na organização de competições culinárias; serviços de consultadoria no domínio dos concursos de culinária; atividades culturais; serviços culturais; realização de eventos culturais.
classe 43: serviços de consultadoria no domínio das artes culinárias; conselhos sobre receitas culinárias. (cf. processo INPI)
3. O INPI recusou o registo da marca referida em 1.º, por despacho do Diretor do Instituto, de 5 de abril de 2022. (cf. processo INPI)
4. O aviso do despacho de recusa emanado pelo INPI, foi publicado no Boletim da Propriedade Industrial n.º 071/2022, de 11/04/2022. (cf. Boletim Propriedade Industrial)
5. O Bolinhol faz parte do património gastronómico de Vizela há mais de 13º anos. (cf. documento nº 7 junto com o Recurso)
6. A história do Bolinhol e o seu crescente destaque na doçaria vizelense verifica-se a par do desenvolvimento das Termas de Vizela e, por inerência, da própria localidade. (cf. documento nº 7 junto com o Recurso)
7.
8. Ao longo dos tempos, o reconhecimento da referida arte e da qualidade do produto materializou-se na atribuição de diversos prémios, dos quais se destaca a vitória no concurso nacional “7 Maravilhas Doces de Portugal” em 2019. (cf. documento nº 7 junto com o Recurso)
9. O Bolinhol para além de ser um ícone da gastronomia e, da cultura vizelense, legado de várias gerações, é um produto significativo para a economia local, com impactos positivos diretos e indiretos. (cf. documento nº 7 junto com o Recurso)
10. Em 18 de maio de 2021, a Recorrente, apresentou no INPI um pedido de registo de marca mista, para assinalar produtos das classes 16, 30, 35, 41 e 43 da Classificação de Nice, composta pela expressão verbal “BOLINHOL DE VIZELA DESDE 1884” e pelo seguinte elemento figurativo:

- cf. Site do INPI
11.Tal registo, a que foi atribuído o n.º 666474, veio a ser concedido e publicado no Boletim da Propriedade Industrial n.º 168/2021, de 27/08/2021. – cf. site do INPI
12. No cumprimento das suas atribuições, e de modo a salvaguardar e zelar pelo património imaterial concelhio, o Município de Vizela, aqui Recorrente, iniciou um processo de certificação do “Bolinhol de Vizela”, através da empresa “CERTIS – Controlo e Certificação Lda.”, organismo de certificação, de modo a garantir o controlo e certificação do “Bolinhol de Vizela”, em conformidade com o respetivo “Caderno de Especificações”. (cf. documento nº 7 junto com o Recurso)
13. Ao aludido organismo cabe a responsabilidade de verificar a observância do caderno de especificações, uma vez aferido então o seu cumprimento, qualquer operador económico poderá usar a respetiva designação. (cf. documento nº 7 junto com o Recurso)
14. O INPI atribuiu a Marca nominativa n.º 580269, com a expressão verbal “BOLINHOL ALVORADA”, da titularidade de “Confeitaria Alvorada de Alberto Fernandes e Filhos”, para assinalar produtos da classe 30 da Classificação de Nice (doçarias); – cf. site do INPI
15. O INPI deferiu a Marca mista n.º 404659, com a expressão verbal “CASA DO BOLINHOL MEMÓRIA DO DOCE”, da titularidade de “Casa do Bolinhol - Memoria do Doce de Fátima Salgado, Unipessoal, Lda.”, para assinalar produtos/serviços das classes 30 (doçarias) da Classificação de Nice. cf. site do INPI
16. O INPI deferiu a Marca mista 445670 com a expressão verbal “BOLINHOL DO NUNO”, da titularidade de “Nuno - Industria Panificadora De Vizela, Lda..”, para assinalar produtos/serviços das classes 30 (doçarias) da Classificação de Nice. – cf. site do INPI
17. O Município de Vizela, ao contrário dos titulares das marcas indicadas no artigo antecedente, não produz diretamente os produtos de doçaria. (facto assente por confissão do recorrente.
18. Encontram-se registadas no INPI as seguintes marcas nacionais:
a. Marca n.º 449045 “Ovos Moles de Aveiro, concedida à “APOMA - ASSOCIAÇÃO DE PRODUTORES DE OVOS MOLES DE AVEIRO”, para assinalar produtos da classe 30 da Classificação de Nice (doçarias):

b. Marca n.º 170914 mista “Vinho do Porto”; concedida a “ADRIANO RAMOS-PINTO (VINHOS), SA.”, para assinalar produtos da classe 33 da Classificação de Nice;

c. Marca n.º 520202 “Bordado de Viana do Castelo”, concedida ao “MUNICÍPIO DE VIANA DO CASTELO”, para assinalar produtos das classes 25 (vestuário) e 26 (bordados) da Classificação de Nice.

d. Marca n.º 646856 “Galo de Barcelos”; concedida ao “MUNICÍPIO DE BARCELOS”, para assinalar produtos da classe 21 (estátuas, estatuetas, placas de obras de arte ...) da Classificação de Nice:


Na decisão recorrida foi considerado não provado o seguinte facto:
1. O INPI deferiu a Marca nominativa n.º 673061, com a expressão verbal “PRIMOR BOLINHOL VIZELA”, da titularidade “Biofabics Lda”, para assinalar produtos/serviços das classes 30 (doçarias) e 43 (serviços de alimentação e bebidas em pastelaria) da Classificação de Nice. - cf. site do INPI, do qual foi feito constar “recusado”.


III.2 - Da nulidade da sentença por omissão de pronúncia

Alega a recorrente que ‘A decisão em crise, – na medida em que não resolve todas as questões que a Recorrente submeteu à sua apreciação e cuja pronúncia sobre a mesma se afigura absolutamente essencial para salvaguarda dos seus direitos – padece de flagrante nulidade, por manifesta omissão de pronúncia, em violação ao disposto nos artigos 608.º, n.º 2, artigo 615.º, n.º 1, alínea d) do CPC (ex. vi do artigo 668.º, n.º 1, alínea d) do CPC)’.

Vejamos.
Nos termos do artigo 608º, nº 2, do CPC, ‘O juiz deve resolver todas as questões que as partes tenham submetido à sua apreciação, exceptuadas aquelas cuja decisão esteja prejudicada pela solução dada a outras […]’ (ênfase aditado).

Trata-se de questões, não de argumentos, não tendo o tribunal que se pronunciar sobre todos os argumentos esgrimidos pelas partes em abono da solução que sustentam para cada uma das questões.

No recurso judicial do despacho de recusa do INPI, o recorrente deduz o seguinte pedido:

a) A revogação do despacho de recusa da marca, e consequentemente, ordenando-se a concessão do registo de marca nacional n.º 656157, concedendo assim proteção jurídica à mesma;
Subsidiariamente,
b) Na hipótese de se entender que o pedido não pode proceder quanto aos produtos da classe 30 da Classificação Internacional de Nice, sempre terá que proceder parcialmente para as seguintes classes da Classificação Internacional de Nice: 16, 35, 41 e 43 – ordenando-se a concessão parcial do registo da marca nacional n.º 656157, concedendo assim proteção jurídica à mesma.

O Tribunal decidiu manter a recusa do registo de marca em causa, por considerar que o sinal carece de força distintiva, na medida em que é composto por vocábulos que, no comércio, indicam o produto ou a sua proveniência, pronunciando-se, assim, sobre a pedido principal formulado no presente recurso.

Quanto ao pedido subsidiário (admissão da marca para as classes 16, 35, 41 e 43), pronuncia-se a sentença recorrida do seguinte modo (ênfase aditado):

‘O facto de se pretender registar como marca a designação “Bolinhol de Vizela” para outros serviços (fins culturais; organização de eventos culturais locais; administração [organização] de atividades culturais; organização de eventos para fins culturais; organização de demonstrações para fins culturais; direção de exposições para fins culturais; serviços de educação relacionados com culinária; consultadoria na organização de competições culinárias; serviços de consultadoria no domínio dos concursos de culinária; atividades culturais; serviços culturais; realização de eventos culturais”) e 43ª (“serviços de consultadoria no domínio das artes culinárias; conselhos sobre receitas culinárias) não afasta esta conclusão, na medida em que os serviços em causa estão todos diretamente relacionados com o produto e a sua origem (Bolinhol de Vizela), não se devendo obstar à sua utilização pela generalidade dos agentes económicos, atribuindo-se o seu direito exclusivo de uso ao Município Recorrente. Aliás, por esta razão a utilização deste tipo de vocábulo constitui um motivo absoluto de recusa e não relativo.’

Ficou assim decidido que, por se tratar de um motivo de recusa absoluto em virtude da falta de distintividade da marca (e estarem em causa produtos ou serviços diretamente relacionados com o produto e a sua origem (Bolinhol de Vizela), não é possível o registo da marca para os restantes produtos e serviços requeridos.

Houve, pois, pronúncia do Tribunal a quo sobre o pedido subsidiário, relativamente à questão de saber se o registo deveria ser apenas recusado para produtos da classe 30, mas concedido para as outras classes peticionadas, designadamente de serviços.

Como houve pronúncia sobre a invocada violação do princípio da igualdade, podendo ler-se na sentença recorrida, relativamente às alegadas outras marcas concedidas não obstante incluírem elementos genéricos semelhantes, o seguinte (ênfase aditado):

‘Quanto ao facto de coexistirem as marcas referidas em 18.º não afasta esta conclusão, na medida em que se trata de marcas mistas e não marcas nominativas, tendo elementos distintivos diversos.’

Tendo-se o Tribunal pronunciado sobre todas as questões suscitadas, inexiste, pois, a nulidade apontada, improcedendo o correspondente segmento recursivo.

III.3 - Da falta de eficácia distintiva do sinal peticionado

O pedido de registo de marca nº 676167 BOLINHOL DE VIZELA foi recusado por despacho do INPI por falta de eficácia distintiva, nos termos do artigo 231º, nº 1, alínea b) e 209º, nº 1 alínea a) do CPI, tendo a sentença recorrida mantido a decisão de recusa.
A recorrente alega que o sinal não carece de força distintiva, pelo menos relativamente às classes de serviços que também visa assinalar, e que a sua recusa iria contra o princípio da igualdade, na medida em que outros sinais integrando elementos genéricos foram aceites a registo.

Vejamos.
Nos termos do artigo 208º do CPI (ênfase aditado):
‘A marca pode ser constituída por um sinal ou conjunto de sinais susceptíveis de representação gráfica, nomeadamente palavras, incluindo nomes de pessoas, desenhos, letras, números, sons, cor, a forma do produto ou da respectiva embalagem, ou por um sinal ou conjunto de sinais que possam ser representados de forma que permita determinar, de modo claro e preciso, o objecto da protecção conferida ao seu titular, desde que sejam adequados a distinguir os produtos ou serviços de uma empresa dos de outras empresas.’

Esclarece, em seguida, o artigo 209º, nº 1, do CPI (ênfase aditado):
1 – Não satisfazem as condições do artigo anterior:
a) As marcas desprovidas de qualquer carácter distintivo;
b) Os sinais constituídos, exclusivamente, pela forma ou por outra característica imposta pela própria natureza do produto, pela forma ou por outra característica necessária à obtenção de um resultado técnico ou pela forma ou por outra característica que confira um valor substancial ao produto;
c) Os sinais constituídos, exclusivamente, por indicações que possam servir no comércio para designar a espécie, a qualidade, a quantidade, o destino, o valor, a proveniência geográfica, a época ou meio de produção do produto ou da prestação do serviço, ou outras características dos mesmos;
d) As marcas constituídas, exclusivamente, por sinais ou indicações que se tenham tornado usuais na linguagem corrente ou nos hábitos leais e constantes do comércio.

Por seu lado, dispõe o artigo 231º, nº 1, alíneas b) a d), do CPI (ênfase aditado):
1 – Para além do que se dispõe no artigo 23º, o registo de uma marca é recusado quando esta:
a) […]
b) Seja constituída por sinais desprovidos de qualquer carácter distintivo;
c) Seja constituída, exclusivamente, por sinais ou indicações referidos nas alíneas b) a d) do artigo 209º;
d) Contrarie o disposto nos artigos 208º, 211º e 224º.

O tribunal recorrido, e antes dele o INPI, considerou o sinal registando desprovido de qualquer carácter distintivo, apoiando-se na seguinte fundamentação:
‘Não é legalmente possível registar como marca um sinal que é composto apenas por numa indicação que serve, no comércio, para designar a espécie do produto e a respectiva proveniência geográfica – artigo […] 209º do CPI. A marca pretendida registar (Bolinhol de Vizela) – sinal nominativo composto unicamente por um vocábulo que corresponde ao próprio produto e outro vocábulo que corresponde à sua proveniência geográfica – não cumpre, pois, os requisitos legais da marca.’
E, na verdade, o sinal verbal ‘Bolinhol de Vizela’ é exclusivamente composto por termos genéricos, que designam o conhecido doce regional de Vizela vulgarmente há muito conhecido por ‘Bolinhol’, como a própria recorrente reconhece, ao considerar que ‘O Bolinhol para além de ser um ícone da gastronomia e da cultura Vizelense, legado de várias gerações, é um produto significativo para a economia local […]’ e que ‘O “Bolinhol de Vizela”, também conhecido por Bolinhol, um doce centenário que faz parte do património gastronómico de Vizela […]’ (ênfase aditado).
Trata-se, pois, do nome centenário, correntemente usado no comércio, legado de várias gerações, por que é conhecido o produto de doçaria originário de Vizela, ícone da gastronomia daquela região e parte do seu património gastronómico.
Enquanto tal, na falta de qualquer elemento figurativo ou verbal, não é adequado a distinguir os produtos ou serviços de uma empresa dos de outra empresa, composto como é, exclusivamente, por indicações há muito usadas no comércio para designar o produto em causa e a sua proveniência geográfica.
Nessa medida, apenas remeta para o produto por esse vocábulo (Bolinhol) conhecido e designado, e para a sua proveniência geográfica (Vizela), sem qualquer carácter distintivo nos termos do artigo 209º, nº 1 alíneas a) e c) do CPI, e por conseguinte, insusceptível de satisfazer as condições (‘adequado[s] a distinguir os produtos ou serviços de uma empresa dos de outra empresa’) previstas no artigo 208º do mesmo Código.
O que constitui motivo de recusa do registo de marca, nos termos do artigo 231º, nº 1 alíneas b) e c) do CPI, não só para os produtos peticionados na classe 30 da Classificação de Nice (‘Bolos; confeitaria; produtos de pastelaria; produtos de confeitaria’) mas também para produtos e serviços conexos, como os visados na classe 16 (e.g. ‘Livros de culinária…’), 35 (e.g. ‘serviços de venda a retalho de doçarias…’), 41 (e.g. ‘serviços de educação relacionados com culinária…’) e 43 (e.g ‘serviços de consultadoria no domínio das artes culinárias…’).
Pois a própria recorrente reconhece que o nome Bolinhol se tornou um ícone das gastronomia local e parte integrante do respectivo património cultural e gastronómico, pelo que deve manter-se na disposição dos da generalidade dos agentes económicos, não se atribuindo o correspondente direito exclusivo ao Município recorrente, como bem sublinha a sentença recorrida, que não merece qualquer censura.
Quanto ao facto de outras marcas registadas conterem elementos genéricos, não estando em causa nos presentes autos e ignorando-se as razões que levaram à respectiva concessão, não permitem qualquer extrapolação relativamente ao presente caso, que deve ser apreciado em função das suas próprias circunstâncias.
Improcede, pois, a correspondente pretensão recursiva da apelante.

IV. DECISÃO

Pelo exposto, decide-se julgar improcedente a apelação mantendo-se a douta sentença apelada.
Custas pela apelante.
Lisboa, 21.12.2022
Luís Ferrão
Rute Lopes
Sérgio Rebelo