Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa
Processo:
4903/21.0T8LRS-A.L1-8
Relator: MARILIA DOS REIS LEAL FONTES
Descritores: OPOSIÇÃO À EXECUÇÃO
PERSI
EXTINÇÃO
COMUNICAÇÃO
Nº do Documento: RL
Data do Acordão: 01/25/2024
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Texto Parcial: N
Meio Processual: APELAÇÃO
Decisão: IMPROCEDENTE
Sumário: I - É lícito à exequente extinguir o PERSI, por falta de colaboração dos devedores, quando, sem invocarem motivo atendível, estes não lhe facultem no prazo de dez dias a que alude o art.º 15, nº 3 do D.L. 70-B/2021, de 06.08, os elementos solicitados ao abrigo do nº 2 do referido preceito.
II - O prazo em questão deve ser contado a partir do momento em que a carta com a comunicação da inclusão no PERSI foi levantada pelos executados nos CTT (desde que dentro dos seis dias úteis seguintes) e, não a partir do momento em que ficou disponível para levantamento.
III – A circunstância isolada de os executados não terem levantado imediatamente a carta com a comunicação “supra” referida, por si só, não legitima a aplicação do nº 2 do art.º 224 do CC, segundo o qual, “é também considerada eficaz a declaração que só por culpa do destinatário não foi por ele oportunamente recebida”.
Decisão Texto Parcial:
Decisão Texto Integral: Acordam as Juízes na 8ª Secção do Tribunal da Relação de Lisboa:

I – RELATÓRIO
1. MM e SM, Apelantes/Embargantes deduziram oposição à Execução que lhes moveu a Apelada/Exequente MPG, por excepção, alegando que o incumprimento pela Exequente das regras do PERSI.
Alegaram, em síntese, que:
- Os Executados foram notificados por carta recebida a 11 de Março de 2021 (ainda que datada de 25 de Fevereiro de 2021) a informar da integração no PERSI;
- Responderam à Exequente juntando os documentos disponíveis por email aos 29 de Março de 2021;
- Foram notificados por carta recebida a 19 de Março de 2021 (ainda que datada de 4 de Março de 2021) da interpelação para pagamento, ignorando a tramitação do PERSI;
- A 29 de Março de 2021 (por email) e no dia seguinte (por carta registada com AR) os Executados dão nota à Exequente de que se encontram ainda a aguardar o resultado da junção dos documentos e, designadamente, uma proposta de solução a apresentar pela Exequente, atentos os procedimentos do PERSI, aliás comunicados pela Exequente aos Executados sob a epígrafe “negociação de soluções”;
- No caso em apreço, atentos os procedimentos do PERSI, “nos 30 dias após a integração do crédito em incumprimento em PERSI (data indicada na presente comunicação), a instituição de crédito deve avaliar a capacidade financeira do cliente bancário, propondo-lhe soluções para renegociar o contrato de crédito ou consolidar dívidas, quando tal seja viável”;
- Não foi dado aos Executados conhecimento de qualquer proposta, sendo que mesmo que se considerasse a data de 25 de Fevereiro de 2021 (que não se aceita pois a carta só foi recebida a 11 de Março), verifica-se que o Exequente escreve em 4 de Março de 2021 a interpelar para pagar;
- Não existiu qualquer violação de deveres pelos clientes bancários;
- Nem ocorreu qualquer circunstância que pudesse/devesse levar à extinção do PERSI e, mesmo que tal tivesse ocorrido, sempre disso deveria a instituição de crédito informar o cliente bancário – o que também não aconteceu;
- Se a execução é instaurada, sem que se mostrem reunidas estas condições, tal implica a ocorrência de uma exceção dilatória inominada ou atípica, que conduzirá à absolvição do executado da instância executiva, exceção esta suscetível de conhecimento oficioso;
Peticionam que seja julgada procedente a excepção dilatória inominada e os Executados absolvidos da instância.
*
Contestou a embargada/apelada do seguinte modo:
- O contrato regista incumprimento desde 2015, circunstância que motivou inúmeros contactos e diligências efetuadas pela ora Embargada, com vista à regularização das quantias em dívida;
- No âmbito da sua atividade bancária, celebrou com os Executados, em 14/10/2014, um "Contrato de Mútuo", ao qual foi atribuído o n.º 347270000420;
- Através do referido contrato, a MPG concedeu aos Executados, a solicitação expressa daqueles, um financiamento no montante de 50.000,00€ (cinquenta mil euros) destinado a "PART-OUTROS CRÉDITOS, obrigando-se a fazer prova dessa aplicação caso a MPG o solicite";
- O contrato foi celebrado pelo prazo de 120 meses;
- Os Executados fizeram suas as quantias financiadas, dando-lhes o destino que entenderam;
- Os Executados registam incumprimento desde 14/01/2015;
- Atento o incumprimento reiterado e sucessivo, e a falta de colaboração dos Embargantes no âmbito do Procedimento Extrajudicial de Regularização de Situações de Incumprimento (PERSI) - previsto no DL n.º 227/2012, de 25 de Outubro - a ora Embargada viu-se obrigada a avançar com a propositura da presente ação executiva, com vista ao ressarcimento dos respetivos créditos;
- O valor em dívida ascende a cerca de 77.000,00 € (setenta e sete mil euros), a que acrescem os respetivos juros e demais despesas judicias e de recuperação de crédito;
- Os Embargantes reconhecem expressamente o referido incumprimento generalizado, sucessivo e reiterado das obrigações assumidas junto da ora Embargada;
- A ora Embargada encetou inúmeras diligências junto daqueles, com o objetivo de encontrar uma solução extrajudicial que permitisse a regularização dos avultados montantes em dívida;
- Uma das inúmeras iniciativas consubstanciou-se na integração dos Executados no Processo Extrajudicial de Regularização de Situações de Incumprimento, em expresso cumprimento do estatuído no artigo 14.º do DL n.º 227/2012, de 25 de Outubro;
- Nesse sentido, a Embargada remeteu aos Embargantes, em 25 de Fevereiro de 2021, carta registada com aviso de receção, através da qual formalizou a respetiva integração em PERSI, nos termos da alínea a), do n.º 2, do mencionado artigo 14.º do mesmo diploma;
- Porém, e ao contrário do referido pelos Embargantes, a carta em apreço foi entregue em 8 de Março de 2021, e não a 11 de Março do mesmo ano, na Loja CTT Alenquer;
- Na referida missiva, a Embargada procedeu a uma explicação clara e sucinta do procedimento em causa, tendo ainda manifestado a sua total disponibilidade para encontrar, com conjunto com os Embargantes;
- Solicitou aos Embargantes, ao abrigo do artigo 15.º, n.º 2 do aludido diploma, a entrega, no seu Balcão, da seguinte documentação:
- Última declaração de IRS e respetiva nota de liquidação;
- Últimos três recibos de vencimento;
- Declaração emitida pelo Instituto de Emprego e Formação Profissional (em caso de desemprego);
- Certidão da Conservatória do Registo Predial ou respetivo código de acesso e Caderneta Predial dos imóveis que garantem o financiamento, se aplicável.
- Conforme resulta expresso do artigo 15.º, n.º 3 do DL n.º 227/2012, de 25 de Outubro: “Salvo motivo atendível, o cliente bancário presta a informação e disponibiliza os documentos solicitados pela instituição de crédito no prazo máximo de 10 dias”;
- Prazo este que, manifestamente, os Embargantes não cumpriram, pois apenas em 29/03/2021 é que os Embargantes remeteram – e só
parcialmente - os documentos solicitados pela Embargada;
Os restantes documentos em falta foram remetidos à Embargada somente no dia 8/04/2021, ou seja, decorridos mais de 20 dias do prazo legalmente previsto para o efeito (10 dias – artigo 15.º, n.º 3 do DL n.º 227/2012);
- Os próprios Embargantes reconhecem expressamente, na comunicação remetida à ora Embargada a 29/03/2021, a extemporaneidade da resposta, ao solicitarem que seja relevado o momento da resposta e do envio da documentação;
- Mesmo que a referida carta apenas tivesse sido rececionada pelos Embargantes a 11/03/2021 (como estes pugnam), o prazo de 10 dias legalmente imposto para remessa da documentação solicitada teria sido igualmente incumprido;
- Considerando que a primeira comunicação eletrónica dos Embargantes apenas foi remetida, como visto supra, a 29/03/2021;
- Atento o incumprimento do prazo legalmente previsto, e nos termos da alínea d), do n.º 2 do artigo 17.º do referido diploma: “A instituição de crédito pode, por sua iniciativa, extinguir o PERSI sempre que: d) O cliente bancário não colabore com a instituição de crédito, nomeadamente no que respeita à prestação de informações ou à disponibilização de documentos solicitados pela instituição de crédito ao abrigo do disposto no artigo 15.º, nos prazos que aí se estabelecem, bem como na resposta atempada às propostas que lhe sejam apresentadas, nos termos definidos no artigo anterior”;
- A Embargada, em escrupuloso cumprimento do disposto no artigo 17.º, n.º 3 do DL n.º 227/2012, de 25 de Outubro, informou os Embargantes, igualmente por carta registada com aviso de receção, da extinção do PERSI, descrevendo que a mesma se deveu a falta de colaboração dos mesmos;
- Os mesmos, interpelados para o efeito, não forneceram, em tempo útil, os documentos solicitados pela Embargada, essenciais para proceder à avaliação da capacidade financeira dos clientes e poder apresentar uma ou mais propostas de regularização adequadas à sua situação, objetivos e necessidades;
- Após o encerramento do procedimento do PERSI, a Embargada foi contactada pelos Embargantes, na pessoa do seu Ilustre Mandatário, que manifestou a intenção de se reunir com a Embargada;
- A ora Embargada, disponibilizou-se para agendar uma reunião, tendo por objetivo a regularização dos respetivos créditos;
- Contudo, e não obstante as inúmeras tentativas de agendamento, a reunião nunca se chegou a realizar por indisponibilidade dos Embargantes;
- Conclui que procurou incessantemente encontrar uma solução extrajudicial, tendo cumprido com todos os procedimentos internos e normativos legais aplicáveis para o presente litígio.
- A eventual integração dos Embargantes em PERSI apenas não foi possível por motivos imputáveis aos mesmos.
Pugna pela improcedência dos embargos.
*
Foi proferido despacho saneador e realizada audiência de julgamento.
Na sequência desta última a Mmª. Juiz “a quo” proferiu sentença que julgou improcedentes os presentes embargos e, consequentemente, determinou a prossecução da execução.
*
1.2. Inconformada com tal decisão, veio a requerente dela interpor o presente recurso de apelação, apresentando no final das suas alegações as seguintes conclusões:

1ª - A Mmª. Juiz a «quo» entende não ter existido qualquer incumprimento pelo Exequente no que se refere à integração dos Executados no PERSI;
2ª – Mais entende a Mmª. Juiz «a quo» que o Banco exequente comunicou quer a integração, quer a extinção do PERSI. E invoca que entendem os embargantes que devia a embargada, depois de ter recebido a documentação, ter apresentado uma proposta. Dos factos provados resulta que os embargantes remeteram a documentação comprovativa da sua situação económica depois de decorridos os 10 dias que dispunha para o efeito (vide artigo 15º n.º 3 do DL 227/2012);
3ª – E que a circunstância da documentação ter sido enviada não significa, porém, que a embargada tivesse, necessariamente de apresentar uma proposta – tal dever apenas se verifica quando conclua (a entidade bancária) que o cliente bancário «dispõe de capacidade financeira para reembolsar o capital ou para pagar os juros vencidos e vincendos do contrato de crédito através, designadamente, da renegociação das condições do contrato ou da sua consolidação com outros contratos de crédito» (vide artigo 14º n.º 4 alínea b) do DL 227/2012).
4ª – E julgou improcedente, assim, e em suma, o peticionado pelos Executados que pugnaram pela absolvição da instância invocando a excepção dilatória inominada de incumprimento das regras do PERSI pela Exequente.
5ª – Considerou a Mmª. Juiz «a quo» provada a alínea H com seguinte redacção:
“H. Através de carta registada com AR datada de 25/02/2021, a exequente comunicou aos embargantes a integração no PERSI”, quando deveria antes ter considerado a seguinte redacção:
“H. Através de carta registada com AR datada de 25/02/2021, mas expedida apenas a 2 de Março de 2021, a exequente comunicou aos embargantes a integração no PERSI”.
6ª - Pois assim resulta do depoimento das testemunhas arroladas pela própria Exequente Embargada, Testemunha HH que, quando questionada sobre os Docs. 1, 2 e 3 juntos pela própria Exequente Embargada diz:
9´37´´: Mandatário dos Embargantes: Esse objecto que está aí recebido a 8 de Março deu entrada nos correios a 2 de Março? Testemunha: Certo.
9´02´´: Mandatário dos Embargantes: Ou seja, a MPG extingue o PERSI a 16 de Março quando a carta enviada a 2 de Março é recebida a 8? No entanto os senhores extinguem o PERSI a 16?
8´50´´: Testemunha: Certo.
7ª Tal como quando questionada a Testemunha RG que diz sobre o mesmo assunto:
13´50´´: Mandatário dos Embargantes: Quando enviam a carta a informar da integração no PERSI, não aferem da data em que a carta é recebida? Para efeitos de contagem do prazo que entendem facultar ao cliente bancário para se pronunciar?
13´40´´: Testemunha: Não necessariamente. Não se faz essa monitorização.
13´28´´: Mandatário dos Embargantes: A MPG pode ter tomado a decisão de extinguir o PERSI, sem aferir da data que a carta foi recebida pelo cliente bancário e, consequentemente, ter ou não ter passado o prazo para o cliente bancário facultar…?
13´12´´Testemunha: Nós fechámos o PERSI cerca de 10/12 dias depois do envio da carta (…) e nós enviámos a carta a 25 de Fevereiro.
8ª - Desta forma, a alínea H da matéria de facto provada deveria passar a ter a seguinte redacção: H. Através de carta registada com AR datada de 25/02/2021, mas expedida apenas a 2 de Março de 2021, a exequente comunicou aos embargantes a integração no PERSI.
9ª - E consequentemente, deveria a Mmª. Juiz «a quo» concluir que a Exequente faculta o prazo de 10 dias aos clientes bancários e aqui Executados, com início a 8 de Março de 2021 e que terminaria a 18 de Março de 2021 quando, simultaneamente ainda antes de tal prazo acabar extingue o PERSI (a 16 de Março de 2021) por alegada falta de colaboração quando ainda nem sequer tinha terminado o prazo por si concedido aos clientes bancários.
10ª - Parece-nos obviamente uma situação de incumprimento do PERSI pela Exequente. Aliás, ainda segundo a alínea K) da matéria de facto considerada provada pela Mma. Juiz «a quo» “através de carta registada com AR data de 04/03/2021, a exequente interpelou os embargantes para procederem ao pagamento do montante vencido de €50.680,25, sob pena de considerarem vencidas todas as obrigações”.
11ª - E ao considerar extinto o PERSI, de nada lhe deverá valer a circunstância de ter mantido negociações com os Executados, pois como é referido na audiência de discussão e julgamento, para tentar alcançar um acordo (fora do PERSI) era necessário entregar de imediato um montante bastante considerável em face do elevado montante em dívida – condição inexigível no âmbito do PERSI.
12ª - Desta forma, deveria a Mmª. Juiz «a quo» entender que o Exequente não respeitou as regras do PERSI o que terá de equivaler ao seu incumprimento e, consequentemente, obstar à instauração da execução. E ter-se assim por verificada a exceção dilatória inominada ou atípica, que deveria ter conduzido à absolvição do executado da instância executiva.
13ª - Pois no caso em apreço, atentos os procedimentos do PERSI, “nos 30 dias após a integração do crédito em incumprimento em PERSI (data indicada na presente comunicação), a instituição de crédito deve avaliar a capacidade financeira do cliente bancário, propondo-lhe soluções para renegociar o contrato de crédito ou consolidar dívidas, quando tal seja viável”.
14ª - Ora, não foi dado aos Executados conhecimento de qualquer proposta, sendo que se verifica que o Exequente escreve em 4 de Março de 2021 a interpelar para pagar e a 16 de Março de 2021 a comunicar a extinção do PERSI quando ainda não tinha terminado o prazo de 10 dias que fora concedido pelo Exequente aos Embargantes por carta expedida a 2 e recebida a 8 de Março de 2021 (v. alínea L da matéria de facto provada).
15ª - Não existiu qualquer violação de deveres pelos clientes bancários, nem ocorreu qualquer circunstância que pudesse/devesse levar à extinção do PERSI e, mesmo que tal tivesse ocorrido, sempre disso deveria a instituição de crédito informar o cliente bancário – o que também não aconteceu.
16ª - Ora, como muito bem decidiu o Acórdão do Tribunal da Relação do Porto no âmbito do Processo 8821/19.4T8PRT-A.P1 de 23 de Fevereiro de 2021:
I - A integração do cliente bancário no PERSI (Procedimento Extrajudicial de Regularização de Situações de Incumprimento), estando em causa contrato de crédito englobado na previsão do art.º 2º do Dec. Lei nº 227/2012, de 25.10. e verificando-se uma situação de mora do mutuário, é obrigatória, uma vez reunidos os respetivos pressupostos, de tal modo que a ação executiva só pode ser intentada após a extinção deste procedimento, recaindo sobre o exequente o ónus de o comprovar.
- Se a execução é instaurada, sem que se mostrem reunidas estas condições, tal implica a ocorrência de uma exceção dilatória inominada ou atípica, que conduzirá à absolvição do executado da instância executiva, exceção esta suscetível de conhecimento oficioso.
Pugnam, pela revogação da Decisão da Mmª. Juiz «a quo» que julgou improcedentes os Embargos e substituição da mesma por outra Decisão que absolva da Instância os Executados Embargantes com as legais consequências.
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A apelada MPG, contra alegou, referindo, em suma que:
A. Decidiu o Tribunal a quo, que “Dos factos provados resulta que os embargantes remeteram a documentação comprovativa da sua situação económica depois de decorridos os 10 dias que dispunha para o efeito (vide artigo 15º n.º 3 do DL 227/2012).”
B. Conforme claramente ficou provado, a Exequente/Recorrida remeteu aos Executados/Recorrentes, em 25 de Fevereiro de 2021, mediante carta registada com aviso de receção, uma missiva através da qual formalizou a respetiva integração em PERSI, nos termos da alínea a), do n.º 2, do artigo 14.º do DL 227/2012).
C. Contudo, em 3 de Março de 2021, não foi conseguida a entrega da missiva na morada dos Recorrentes/Embargantes, porquanto, os mesmos “não atenderam”.
D. Tal devolução foi da total responsabilidade dos Embargantes/Recorrentes.
E. Foi deixado um aviso postal na morada dos Embargantes/Recorrentes, para procederem ao levantamento da carta relativa à integração em PERSI junto da Loja CTT Alenquer, a partir do dia 4 de Março (inclusive).
F. Contudo, os mesmos optaram por proceder ao levantamento da missiva apenas no dia 8 de Março.
G. A este respeito, estatui o n.º 2 do artigo 224.º do Código Civil que: “É também considerada eficaz a declaração que só por culpa do destinatário não foi por ele oportunamente recebida.”
H. A partir do dia 4 de Março a missiva passou a estar disponível para levantamento na loja dos CTT de Alenquer, todavia, optaram os Recorrentes/Embargantes por proceder ao levantamento, apenas a 8 de Março.
I. Na referida missiva, e em clara demonstração da sua posição cooperante e de boa fé, a Embargada/Recorrida teve o cuidado de proceder a uma explicação clara e sucinta do procedimento em causa, tendo ainda manifestado a sua total disponibilidade para encontrar, com conjunto com os Embargantes, uma solução adequada para o incumprimento registado.
J. Para tal, solicitou aos Embargantes/Recorrentes, ao abrigo do artigo 15.º, n.º 2 do aludido diploma, a entrega, no seu Balcão, da seguinte documentação:
- Última declaração de IRS e respetiva nota de liquidação;
- Últimos três recibos de vencimento;
- Declaração emitida pelo Instituto de Emprego e Formação Profissional (em caso de desemprego);
- Certidão da Conservatória do Registo Predial ou respetivo código de acesso e Caderneta Predial dos imóveis que garantem o financiamento, se aplicável.
K. Ora, conforme resulta expresso do artigo 15.º, n.º 3 do DL n.º 227/2012, de 25 de Outubro: “Salvo motivo atendível, o cliente bancário presta a informação e disponibiliza os documentos solicitados pela instituição de crédito no prazo máximo de 10 dias.”.
L. Prazo este que, manifestamente, os Embargantes/Recorrentes não cumpriram!
M. Note-se que, apenas em 29/03/2021 é que os Embargantes/Recorrentes remeteram – e só parcialmente - os documentos solicitados pela Embargada.
N. Os restantes documentos em falta foram remetidos à Embargada/Recorrida somente no dia 8/04/2021, ou seja, decorridos mais de 20 dias do prazo legalmente previsto para o efeito (10 dias – artigo 15.º, n.º 3 do DL n.º 227/2012).
O. Os próprios Embargantes/Recorrentes reconhecem expressamente, na comunicação remetida à ora Embargada/Recorrida a 29/03/2021, a extemporaneidade da resposta, ao solicitarem que seja relevado o momento da resposta e do envio da documentação.
P. Atento o incumprimento do prazo legalmente previsto, e nos termos da alínea d), do n.º 2 do artigo 17.º do referido diploma: “A instituição de crédito pode, por sua iniciativa, extinguir o PERSI sempre que: d) O cliente bancário não colabore com a instituição de crédito, nomeadamente no que respeita à prestação de informações ou à disponibilização de documentos solicitados pela instituição de crédito ao abrigo do disposto no artigo 15.º, nos prazos que aí se estabelecem, bem como na resposta atempada às propostas que lhe sejam apresentadas, nos termos definidos no artigo anterior;”
Q. Neste mesmo sentido, o Tribunal da Relação de Lisboa: “Se na fase de avaliação e proposta, o cliente não colaborar com a instituição de crédito, não lhe facultando os elementos nem prestando as informações solicitados que possibilitariam a avaliação da sua capacidade financeira, a instituição de crédito pode, em alternativa: (i) aguardar o decurso do prazo de 91 dias subsequentes à integração do cliente no PERSI e, por essa via, comunicar a extinção do PERSI (art.º 17º nº 1, al. c)); ou (ii) proceder à extinção do PERSI, por sua iniciativa, ao abrigo do art.º 17º nº 2, al. d), com fundamento na falta de colaboração com a instituição de crédito.”
R. O que sucedeu in casu.
S. Conforme decidiu o Tribunal da Relação de Évora (acórdão de 14-07-2021), para efeitos de extinção do PERSI por falta de colaboração “deve ser considerada não só a total ausência de colaboração, como a colaboração intempestiva e, ainda, a colaboração deficiente/insuficiente que impeça a instituição bancária de proceder à avaliação que a lei
lhe comete.”
T. O que neste caso sucedeu, não só porque, os Recorrentes/Embargantes, optaram por responder fora do prazo legal, mas também, porque quando responderam, fizeram-no de forma incompleta.
U. Neste sentido, a ora Embargada, em escrupuloso cumprimento do disposto no artigo 17.º, n.º 3 do DL n.º 227/2012, de 25 de Outubro, em 16 de Março de 2021, informou os Embargantes/Recorrentes igualmente por carta registada com aviso de receção, da extinção do PERSI, descrevendo que a mesma se deveu a falta de colaboração dos mesmos.
V. A missiva relativa à integração em PERSI, estava disponível para ser entregue aos Embargantes/Recorrentes desde o dia 3 de Março, todavia, nessa data veio a missiva devolvido, porquanto, os mesmos “não atenderam” na sua morada.
W. Ademais, foram os Embargantes/Recorrentes, informados, através de aviso postal, que a missiva relativa à integração em PERSI, estaria disponível na Loja de CTT de Alenquer, a partir do dia 4 de Março de 2023, para levantamento, optaram por apenas proceder ao levantamento no dia 8 de Março de 2021.
X. É imperativo concluir que, a Embargada/Recorrida, ao remeter em 16 de Março de 2021, a carta relativa à extinção do PERSI, cumpriu integralmente o prazo previsto no artigo 17.º, n.º 3 do DL n.º 227/2012.
Y. Destarte, dúvidas não restam de que os Embargantes não se encontram integrados no PERSI por sua única e exclusiva responsabilidade.
Z. Porquanto, optaram por responder à missiva relativa à integração em PERSI, já decorridos vários dias sobre a data da extinção do mesmo por falta de colaboração dos beneficiários.
AA. Assim, é forçoso concluir que bem andou o Tribunal “a quo” ao concluir que resultou provado, que a Recorrida/Embargado, comunicou ao Recorrente/Embargante quer a integração, quer a extinção do PERSI.
BB. Andou, igualmente bem o Tribunal a quo ao considerar que resulta provado, que os Embargantes/Recorrentes remeteram a documentação comprovativa da sua situação económica depois de decorridos os 10 dias que dispunha para o efeito (vide artigo 15º n.º 3 do DL 227/2012).
CC. Assim, provado está, que não se verifica a excepção dilatória inominada, que resulta do incumprimento das regras relativas ao PERSI, e que determinaria a absolvição do Recorrente/Embargante da instância executiva.
DD. Assim deverá o presente recurso improceder de facto e de direito mantendo-se na integra a Sentença agora recorrida.

O recurso foi admitido como sendo de apelação, com subida imediata, nos próprios autos e com efeito devolutivo, nada obstando ao conhecimento do seu mérito.
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Foram colhidos os vistos legais.
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São as conclusões formuladas pelo recorrente que delimitam o objeto do recurso, no tocante ao desiderato almejado por aquele, bem como no que concerne às questões de facto e de Direito suscitadas, conforme resulta das disposições conjugadas dos art.ºs 635º, n.º 4 e 639º, n.º 1 do CPC.
Esta limitação dos poderes de cognição do Tribunal da Relação não se verifica em sede de qualificação jurídica dos factos ou relativamente a questões de conhecimento oficioso, desde que o processo contenha os elementos suficientes a tal conhecimento (cfr. art.º 5º n.º 3 do CPC)[1].
Por outro lado, não pode o Tribunal de recurso, conhecer de questões que não tenham sido anteriormente apreciadas porquanto, por natureza, os recursos destinam-se apenas a reapreciar decisões proferidas[2].

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2. Do objecto do recurso
São questões a decidir:

- Se deve ser alterada a matéria de facto assente no sentido proposto pela apelante;
- Apurar se, no âmbito do presente recurso os executados devem ser absolvidos da instância por verificação de exceção dilatória inominada decorrente da instauração da acção executiva sem integração dos executados no PERSI e subsequente extinção deste procedimento.
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II – FUNDAMENTOS
2.1. Fundamentos de facto
2.1.1. Na decisão recorrida consideraram-se sumariamente provados os seguintes factos:
 A. No âmbito da atividade bancária exercida pela MPG, exequente, foi celebrado em 14/10/2014 um contrato de "Mútuo e Fiança" com os Executados, ao qual foi atribuído o n.º 347270000420.
B. Através do referido contrato a MPG concedeu aos executados, ora embargantes, a solicitação expressa daqueles, um financiamento no montante de €50.000,00 (cinquenta mil euros) destinado a "PART-OUTROS CRÉDITOS, obrigando-se a fazer prova dessa aplicação caso a MPG o solicite" -
C. O contrato foi celebrado pelo prazo de 120 (cento e vinte) meses.
D. Contratualizou-se que o montante em dívida vence juros à taxa “Euribor a três meses”, acrescida de um spread de 5,00%, correspondente a uma taxa anual efetiva (TAEG) de 5,900%.
E. Em caso de incumprimento e se a MPG tivesse de recorrer a juízo para recuperação dos seus créditos, convencionou-se que, além dos juros remuneratórios, seria devida uma indemnização, com a natureza de cláusula penal (sobretaxa) de 3%, calculada sobre o capital em dívida desde a data de constituição em mora.
F. As prestações mensais deixaram de ser pagas a partir de 14/01/2015.
G. Na data da instauração da ação executiva (01/06/2021), estava em dívida:
i) €49.364,93 (quarenta e nove mil, trezentos e sessenta e quatro euros e noventa e três cêntimos), a título de capital;
ii) €15.159,51 (quinze mil, cento e cinquenta e nove euros e cinquenta e um cêntimo), a título de juros devidos sobre o montante de capital em dívida;
iii) €12.456,07 (doze mil, quatrocentos e cinquenta e seis euros e sete cêntimos), correspondentes a cláusula penal calculada desde 14/01/2015, imposto do selo e demais despesas contratualmente previstas
H. Através de carta registada com AR datada de 25/02/2021, a exequente comunicou aos embargantes a integração no PERSI.
I. A carta referida em H, endereçada à embargante SM, foi devolvida ao remetente por não ter sido reclamada.
J. A carta referida em H, endereçada ao embargante MM, foi entregue em 08/03/2021.
K. Através de carta registada com AR datada de 04/03/2021, a exequente interpelou os embargantes para procederem ao pagamento do montante vencido de €50.680,25, sob pena de considerarem vencidas todas as obrigações.
L. A carta referida em K, endereçada à embargante LM, foi devolvida ao remetente por não ter sido reclamada.
M. A carta referida em K, endereçada ao embargante MM foi entregue em 19/03/2021.
N. Através de carta registada com AR datada de 16/03/2021, a exequente comunicou aos embargantes a extinção do PERSI, por “falta de colaboração”.
O. A carta referida em N, endereçada à embargante SM, foi devolvida ao remetente por não ter sido reclamada.
P. A carta referida em N, endereçada ao embargante MM foi entregue em dia ilegível de maio de 2021.
Q. Através de carta registada com AR, datada de 29/03/2021, os embargantes comunicaram à exequente
R. Através de e-mail datado de 29/03/2021, remetido pelo embargante MM para MPG – Bobadela, este comunicou a sua disponibilidade para encontrar uma solução adequada para o incumprimento, informou que não estava numa situação de desemprego e que não existem imóveis que possam garantir o financiamento, juntando parte da documentação solicitada pela carta de 25/02/2021, nomeadamente cópia dos últimos três recibos de vencimento.
S. Através de e-mail de 08/04/2021, remetido pelo embargante MM para MPG – Bobadela, este juntou a documentação que não tinha sido possível com o anterior e-mail (declaração de IRS e nota de liquidação).
T. Posteriormente, a embargada foi contactada pelos embargantes, na pessoa do seu Ilustre Mandatário, que manifestou a intenção de se reunir com a embargada.
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Factos não provados:
Não existem.
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3. Fundamentos de direito
- Alteração da matéria de facto:
A Mmª Juiz “a quo” deu como assente na alínea H. que “Através de carta registada com AR datada de 25/02/2021, a exequente comunicou aos embargantes a integração no PERSI”.
Entendem os apelantes que a redação conforme à correcta valoração da prova produzida em julgamento deveria ser a seguinte:
“H. Através de carta registada com AR datada de 25/02/2021, mas expedida apenas a 2 de Março de 2021, a exequente comunicou aos embargantes a integração no PERSI”.
Ouvida a prova, apurou-se que, resulta, efectivamente do depoimento da testemunha arrolada pela apelada, HH que, quando questionada sobre os Docs. 1, 2 e 3 juntos por aquela, confirmou que a carta registada em questão, apesar de se encontrar datada de 25/02/2012, apenas deu entrada nos correios a 2 de Março do mesmo ano.
No mesmo sentido, a Testemunha RG, confirmou que “quando enviaram a carta a informar da integração no PERSI, não aferiram da data em que a carta foi recebida, mas expedida (… nós fechámos o PERSI cerca de 10/12 dias depois do envio da carta (…) e nós enviámos a carta a 25 de Fevereiro).
E, face ao teor da documentação “supra” referida apurou-se que a carta em questão, não foi recebida pelos apelantes, no dia 3 de Março de 2021, porque estes não atenderam o funcionário dos CTT que a transportava, mas que ficou disponível nos referidos serviços da área de residência dos mesmos, a partir do dia 4.3.2021. Sendo que, a carta só foi levantada no dia 8.3.2021.
Como já referido, os apelantes insistem para que se dê como assente que a carta registada com AR datada de 25/02/2021, através da qual, a exequente comunicou aos embargantes a integração no PERSI”, apenas foi expedida a 2 de Março de 2021.
De facto, nesta parte, há que lhes conceder razão.
Pelo que, se determina que a referida alínea H, passe a ter a seguinte redação:
“Através de carta registada com AR datada de 25/02/2021, mas expedida apenas a 2 de Março de 2021, a exequente comunicou aos embargantes a integração no PERSI”.
Contudo, para que a matéria em causa reflita, na nossa perspectiva, a correcta valoração da prova produzida, deverão ser aditadas mais duas alíneas U) e V), com a seguinte redação:
U) “A missiva referida em H) ficou disponível nos referidos serviços da área de residência dos embargantes, a partir do dia 4.3.2021.
V) Sendo que, os embargantes só a levantaram no dia 8.3.2021”;
O que se decide.
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- Interessa agora, apurar se, no âmbito do presente recurso os executados devem ser absolvidos da instância por verificação de exceção dilatória inominada decorrente da instauração da acção executiva sem integração dos executados no PERSI e subsequente extinção deste procedimento:
Entendem os apelantes, que se a carta em questão apenas foi recebida em 8 de Março de 2021, o prazo que os mesmos tinham para entregar os elementos solicitados pela apelada apenas terminou em 18 de Março de 2021, não sendo lícito à apelada extinguir o PERSI a 16 de Março de 2021, por alegada falta de colaboração quando ainda nem sequer tinha terminado o prazo por si concedido aos clientes bancários.
As exceções dilatórias, nominadas ou inominadas, são de conhecimento oficioso, com ressalva incompetência absoluta decorrente da violação de pacto privativo de jurisdição ou da preterição de tribunal arbitral voluntário e da incompetência relativa nos casos não abrangidos pelo disposto no artigo 104º – vide artigo 578º do Código de Processo Civil.
A nossa jurisprudência vem entendendo que a falta de integração do cliente bancário no PERSI consubstancia uma exceção dilatória inominada, reconhecendo, por isso, a possibilidade do seu conhecimento oficioso, aplicando o regime decorrente dos artigos 576º, n.ºs 1 e 2 e 578º do Código de Processo Civil, sendo, assim, de admitir a sua invocação até ao primeiro ato de transmissão dos bens penhorados, não operando o efeito preclusivo do prazo para deduzir embargos – vide, entre outros, Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa de 09/29/2020, processo 1827/18.2T8ALM-B.L1-7[3].
Pelo regime instituído e regulado pelo DL 227/2012 determinam-se os princípios e regras a observar pelas instituições de crédito na prevenção e na regularização das situações de incumprimento de contratos de crédito pelos clientes bancários, criando-se uma rede extrajudicial de apoio a esses clientes bancários no âmbito da regularização dessas situações.
A integração do cliente bancário, em caso de incumprimento de contrato de crédito, no Procedimento Extrajudicial de Regularização de Situações de Incumprimento (doravante, PERSI), é obrigatória (vide artigos 12º e 14º n.º 1 do DL 227/2012).
E constitui uma garantia do cliente bancário, nos termos do disposto no artigo 18º n.º 1 alínea b) do referido DL 227/2012, a proibição da instituição de crédito intentar ações judiciais tendo em vista a satisfação do seu crédito no período compreendido entre a data de integração do cliente bancário no PERSI e a extinção deste procedimento.
Cabe à instituição de crédito, para além da alegação, a demonstração da implementação e extinção do PERSI.
Como já foi decidido no Acórdão do Tribunal da Relação de Évora proferido no Processo 340/21.5TBBELV-A.E1, EM 16-12-2021, “é entendimento pacífico que compete ao credor alegar e demonstrar que os devedores tiveram conhecimento da sua integração no PERSI, bem como da extinção desse procedimento.
Também não sofre contestação que se tratam de declarações receptícias, constituindo ónus da exequente demonstrar a sua existência, o seu envio e a respectiva recepção pelos executados”[4].
As comunicações em causa foram feitas por carta registada com aviso de recepção, o que preenche para além do exigível o conceito de “suporte duradouro” a que aludem os art.ºs 14, nº 4 e 17, nº 3 do D.L. 227/2012, de 25/10. Efectivamente, tal suporte duradouro, inclui também a carta simples ou um e-mail.
A isto acresce que, devendo as obrigações acessórias dos contratos ser pontualmente cumpridas, cabia à exequente enviar as cartas relativas ao PERSI para a morada constante do contrato e aos destinatários/executados adoptar a diligência devida de molde a que fosse efectivamente assegurada a recepção e o conhecimento das comunicações relevantes, que lhes fossem enviadas pelo credor.
No caso em apreço a apelada logrou provar que as comunicações em causa foram feitas de modo eficaz e recebidas.
A questão que se coloca é se os apelantes devem beneficiar do prazo de resposta a partir do momento em que a carta ficou disponível para recepção nos correios (4.3.2021) ou apenas a partir do momento em que a foram levantar (8.3.2021).
Ora, de acordo com o art.º 224, nº 1 do Código Civil, a declaração negocial que tem um destinatário, torna-se eficaz logo que chega ao seu poder ou dele é conhecida (…).
Mas, acrescenta-se no nº 2 do mesmo preceito, “é também considerada eficaz a declaração que só por culpa do destinatário não foi por ele oportunamente recebida”.
A partir do dia 4 de Março a missiva passou a estar disponível para levantamento na loja dos CTT de Alenquer, todavia, os Recorrentes/Embargantes procederam ao levantamento, apenas a 8 de Março.
O prazo para proceder ao levantamento de cartas registadas na estação dos correios onde tenham sido depositadas é de seis dias úteis (cfr. informação dos próprios CTT).
Pelo que, até ao último dia do prazo indicado como estando a carta disponível para levantamento, é legítimo ao destinatário proceder ao mesmo, não sendo possível formular um juízo de culpa por não a ter levantado logo no primeiro dia.
Ora, o art.º 224, nº 2 do Código Civil exige culpa do destinatário no não recebimento oportuno da declaração que lhe é destinada e, não há nos autos factualidade assente que permita afirmar, sem margem para dúvida, que houve culpa na actuação dos apelantes no levantamento da carta apenas a 8.3.2021.
A ser assim, o prazo de dez dias a que alude o art.º 15, nº 3 do D.L. 70-B/2021, de 06.08, que os executados dispunham para prestar a informação e disponibilizar os documentos solicitados pela instituição de crédito, deve ser contado, a partir do momento em que a carta foi efectivamente recebida pelos apelantes.
Interessa, porém, recordar a seguinte cronologia dos factos apurados:
- A data que consta na carta expedida pela exequente a comunicar aos executados a integração no PERSI é a de 25.02.2021;
- Essa carta foi expedida em 02.03.2021;
- A entrega da mesma não foi bem sucedida, por ausência dos executados no domicílio, em 03.03.2021;
- Em 04.03.2021 a carta em questão ficou disponível para levantamento no balcão dos CTT;
- A mesma carta foi levantada pelos executados em 08.03.2021;
- Em 16.03.2021 a exequente comunicou por carta registada com aviso de recepção aos executados, a extinção do PERSI.
Com estes dados e, na sequência do raciocínio exposto, entendemos que o prazo de dez dias que os executados dispunham para colaborarem com a exequente, fornecendo as informações e elementos por esta requisitados, terminou no dia 18.03.2021, ou seja, dez dias após terem recebido a comunicação de integração no PERSI que lhes foi dirigida.
Por isso se conclui que, em 16.03.2021, quando a exequente lhes comunicou a extinção do PERSI, esse prazo ainda não havia terminado.
De qualquer modo, importa referenciar que, os apelantes apenas enviaram à apelante a totalidade da documentação por esta solicitada em 08.04.2021 (declaração de IRS e nota de liquidação), conforme consta da al. S) dos factos assentes. Ou seja, muito depois do dia 18.03.2021, data em que os próprios apelantes defendem ter terminado o prazo para o fazerem.
Ou seja, no prazo de dez dias após o recebimento da carta, os recorrentes não facultaram ao Banco a documentação solicitada, nem se manifestaram de qualquer modo, nomeadamente, invocando alguma causa ponderosa para precisarem de mais tempo, solicitando alguma prorrogação de prazo (que sempre estaria da disponibilidade do banco conceder). Evidenciando a sua negligência e falta de colaboração com o banco, só enviaram a totalidade da documentação em causa, no dia 08.04.2021, quando já haviam decorrido mais de dez dias sobre a data supra referida (18.03.2021).
Ora dispõe o art.º 17, nº 2, al. d) do D.L. 227/2012, de 25 de Outubro que, “a instituição de crédito pode, por sua iniciativa, extinguir o PERSI sempre que o cliente bancário não colabore com a instituição de crédito, nomeadamente no que respeita à prestação de informações ou disponibilização de documentos solicitados pela instituição de crédito ao abrigo do disposto no art.º 15, nos prazos que aí se estabeleçam.
Resulta do nº 3 do art.º 15 do diploma em análise que, “salvo motivo atendível, o cliente bancário presta a informação e disponibiliza os documentos solicitados pela instituição de crédito no prazo máximo de 10 dias”.
Incumbia aos apelantes alegar e provar que houve “motivo atendível” para a apresentação intempestiva da documentação solicitada. Não o tendo feito, há que concluir que a instituição de crédito poderia ter extinto, como o fez o procedimento do PERSI por falta de colaboração dos devedores.
Improcede, assim, e em suma, o recurso, nesta parte.
III – DECISÃO
Pelo exposto, atentas as disposições legais citadas e as considerações expendidas, julga-se improcedente o presente recurso e, confirma-se a sentença recorrida.
Custas pelos apelantes (art.º 527 nºs 1 e 2 do Código de Processo Civil).
Notifique.
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Lisboa, 25/1/2024
Marilia dos Reis Leal Fontes
Amélia Puna Loupo
Carla Figueiredo

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[1] Neste sentido cfr. GERALDES, Abrantes António, in “Recursos no Novo Código de Processo Civil”, 5ª Edição, Almedina, 2018, págs. 114 a 116.

[2] Neste sentido cfr. GERALDES, Abrantes António, in “Opus Cit.”, 5ª Edição, Almedina, 2018, pág. 116.
[3] Disponível em www.dgsi.pt.
[4] Disponível em www.dgsi.pt.