Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa
Processo:
3431/24.7T8CSC.L1-7
Relator: CARLOS OLIVEIRA
Descritores: EMBARGO DE OBRA NOVA
DESENTRANHAMENTO DE REQUERIMENTO
RECURSO AUTÓNOMO
PROVA PERICIAL
ANULAÇÃO
Nº do Documento: RL
Data do Acordão: 12/02/2025
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Texto Parcial: N
Meio Processual: APELAÇÃO
Decisão: PARCIALMENTE PROCEDENTE
Sumário: Sumário (art.º 663º nº 7 do CPC – Da responsabilidade exclusiva do relator):
1. Não cabe recurso autónomo do despacho que ordena o desentranhamento de requerimento pelo qual a Requerente de providência cautelar requer prazo para responder ao articulado de oposição e exerce o contraditório relativamente a meios de prova ali requeridos, por não preencher designadamente a previsão da al. d) do n.º 2 do Art. 644.º do C.P.C..
2. O exercício do contraditório ao articulado na oposição, no caso desta providência cautelar, deveria ser exercido na audiência final (cfr. Art. 3.º n.º 4 do C.P.C.). Pelo que, o recurso que tem por objeto a decisão de desentranhamento do requerimento no qual se requeria um prazo para exercer o contraditório à oposição antes da audiência final, perde a sua utilidade com o encerramento da audiência onde, por força da lei, deveria ser exercido esse direito, nomeadamente quando a Requerente não tenha reclamado da nulidade por omissão da prática dessa formalidade prescrita na lei (cfr. Art. 195.º, 196.º e 199.º do C.P.C.), que assim fica objetivamente sanada.
3. Na parte em que o recurso tem por objeto o desentranhamento de requerimento pelo qual se pretende o exercício do direito ao contraditório relativo a meios de prova requeridos pela parte contrária no articulado de oposição, também perde utilidade a instância recursiva com o encerramento da audiência final, nomeadamente quando em causa está um meio de prova constituendo – no caso a realização de prova pericial – que não veio a ser efetivamente produzido, sem que nenhumas das partes tivesse reclamado, oportunamente, da omissão desse ato instrutório requerido (cfr. Art.s 195.º, 196.º e 199.º do C.P.C.).
4. Sendo certo que no âmbito duma providência cautelar não se exige o nível de rigor e certeza na apreciação indiciária dos pressupostos de facto do direito pretendido fazer valer, porque estamos perante um procedimento cautelar de ratificação de embargo de obra em que importava apurar se a implantação da construção nova poderia incidir sobre determinado caminho público, as especificidades próprias do litígio e do direito visado salvaguardar, por assentarem em pressupostos de facto que implicam algum rigor na sua apreciação, justificavam que tivesse sido determinada a realização de prova pericial de levantamento topográfico do terreno, como meio de prova impreterível e absolutamente decisivo, em face das dúvidas que a prova produzida suscitavam.
5. Neste caso, mesmo que o Tribunal “a quo” não se tenha pronunciado sobre o requerimento de prova pericial dos Requeridos – que consistia no levantamento topográfico do terreno –, e mesmo que as partes tenham deixado encerrar a discussão da causa em 1.ª instância sem reclamarem dessa nulidade por omissão (cfr. Art. 195.º e 199.º do C.P.C.), o Tribunal da Relação pode, oficiosamente, por serem razoáveis e fundadas as dúvidas sobre a prova realizada, determinar a produção desse meio de prova omitido produzir (cfr. Art. 662.º n.º 2 al. b) do C.P.C.).
Decisão Texto Parcial:
Decisão Texto Integral: Acordam os Juízes na 7ª Secção do Tribunal da Relação de Lisboa:
I- Relatório:
M, Lda. veio intentar contra LG e esposa, ES, esta última apenas depois de requerida e admitida a sua intervenção principal provocada, um procedimento cautelar de ratificação judicial de embargo de obra nova, alegando ter procedido ao embargo extrajudicial das obras em execução pelo Requerido num caminho que identificou, porquanto as obras realizadas estariam a ocupar indevidamente 1,20 m do caminho pedonal interior da urbanização, que é espaço do domínio público, tal como resulta da respetiva planta do loteamento.
O Requerido marido, com posterior adesão a esse articulado por parte da sua esposa, veio a deduzir oposição sustentando, no que à substância do litígio releva, que a construção embargada contém-se dentro dos limites definidos pelo Município de Cascais para este prédio, através dos atos administrativos titulados, nomeadamente, pelo alvará de loteamento n.º …, de 1998/11/17, e respetivo aditamento, e respeita em toda a sua extensão as dimensões de profundidade, largura e área desse prédio, tal como estas foram estabelecidas nos diversos atos administrativos, com natureza constitutiva de direitos, que permitiram, além do mais, a sua constituição e autonomização registral e matricial, bem como a realização daquela construção (cfr. “Oposição” de 17-11-2024 – Ref.ª n.º 26753842 - p.e. e adesão da Requerida, por “Requerimento” de 06-03-2025 – Ref.ª n.º 27452982 - p.e.).
Nesta sequência, a Requerente terá apresentado vários requerimentos subsequentes com data de 2, 16 e 26 de dezembro de 2024.
Findos os articulados iniciais, veio a ser proferido despacho datado de 21 de janeiro de 2025 (Ref.ª n.º 155340978 - p.e.) que, decidiu, entre outras questões prévias, o seguinte: «Desentranhe e devolva, por ora, os requerimentos de 02.12.2024, 16.12.2024 e 26.12.2024, por não previstos na tramitação legal e nada de superveniente acrescentarem (para além de se reportarem a matéria a ser decidida em momento próprio, que não o atual)». Tendo esse despacho sido notificado às partes por registo datado de 5 de novembro de 2024 (cfr. “Not Despacho Anexo” de 05-11-2024 – Ref.ª n.º 153931332 e n.º 153931329 - p.e.).
Prosseguindo os autos, veio a ser realizada a audiência final, com produção da prova e, nessa sequência, veio a ser proferida decisão final que julgou os embargos à obra nova improcedentes por não provados, indeferindo à providência requerida (cfr. “Despacho Final” de 14-07-2025 – Ref.ª n.º 158699246 - p.e.).
É dessa decisão final, e do despacho de 21 de janeiro de 2025, na parte supra transcrita, que a Requerente da providência cautelar vem agora interpor recurso de apelação apresentando no final das suas alegações as seguintes conclusões:
1ª – Tendo-se a Requerente, no requerimento apresentado em 02-12-2024 limitado a, ao abrigo do princípio do contraditório, pronunciar-se quanto aos meios de prova (incluindo o levantamento topográfico) juntos pela parte contrária, manifestando, nos termos previstos no art.º 467º do CPC, o seu desacordo em relação à realização de perícia (novo levantamento topográfico) pelo perito indicado pelos Requeridos e defendido que a mesma deveria ser requisitada pelo Tribunal a estabelecimento, laboratório ou serviço oficial apropriado ou, caso não fosse possível, nomear-se um técnico idóneo e independente, não podia a Meritíssima Juiz ter proferido o despacho datado de 21-01-2025, através do qual mandou desentranhar este requerimento;
2ª - A Sentença recorrida é nula por omissão de pronúncia, por não se ter pronunciado acerca da perícia (novo levantamento topográfico) requerida por ambas as partes;
3ª – A Sentença recorrida é nula por excesso de pronúncia, porque, apesar de as partes não o terem requerido nem ser de conhecimento oficioso, ordenou que a Sentença fosse notificada à Câmara Municipal de Cascais e ao TAF de Sintra;
4ª – Tendo em conta o teor dos Docs. nºs 3 e 4 do requerimento inicial, o Facto 3 dos factos indiciariamente provados (que manteve a numeração na renumeração efetuada no presente recurso) deve passar a ter a seguinte redação (equivalente à do art.º 3º do requerimento inicial):
Os lotes de ambos, Requerente e Requerido, integram o mesmo loteamento urbano, cujo alvará de loteamento tem o nº …, emitido em 17 de novembro de 1998, conforme Doc. nº 3 junto com o requerimento inicial e planta constante do respetivo anexo II ao alvará, conforme Doc. nº 4 junto com o requerimento inicial;
5ª – Considerando o teor do Doc. nº 3 junto com o requerimento inicial, o Facto indiciariamente provado 4 (que manteve a sua numeração na renumeração efetuada no presente recurso) deverá passar a ter a seguinte redação:
Dali consta, entre o mais, O loteador deverá pavimentar o caminho pedonal com cubos de granito uma vez que a inclinação é bastante acentuada (…) São cedidos à Câmara Municipal para integração no domínio público 151,95 m2 de terreno destinados a arruamentos, conforme planta que constituirá o anexo II ao alvará;
6ª – Atendendo aos Docs. nºs 6, 7 e 8 juntos com o requerimento inicial; aos Docs. n.ºs 10 e 11, juntos com o requerimento de 12-03-2025 (com a refª Citius 27500791), à “Assentada” ditada em resultado da inspeção judicial efetuada ao local (cfr. gravação aos minutos 10:41 a 10:43 da sessão de julgamento de 18-06-2025), na parte correspondente aos minutos 00:30 a 01:11; à planta junta como Doc. nº 4 com o requerimento inicial; ao Doc. nº 13 junto com a Oposição; ao vídeo junto como Doc. nº 8 com o requerimento de 12-03-2025 (com a refª Citius 27500791), exibido em audiência; ao depoimento da testemunha AF (aos minutos 00:11:02 a 00:12); às declarações de parte de FM (aos minutos 00:05:10 a 00:05:54); ao Doc. nº 11 junto com a Oposição; ao Doc. nº 7 junto com o requerimento de 12-03-2025 (com a refª Citius 27500791), o Facto nº 5 dos Factos indiciariamente provados (que manteve a numeração na renumeração efetuada no presente recurso) deverá passar a ter a seguinte redação:
A promotora da referida operação de loteamento – sociedade P… Lda. – pavimentou o caminho pedonal apresentado na planta que constitui o anexo ao alvará de loteamento nº …, de 1998.11.17 com pedra da calçada;
7ª – Considerando a “Assentada” em resultado da inspeção judicial efetuada ao local – cfr. minutos 10:41 a 10:43 da gravação da sessão de julgamento de 18-06-2025, em especial na parte gravada de 02:20 a 02:45 e de 01:11 a 01:35; à fotografia junta como Doc. nº 12 ao requerimento inicial; ao Doc. nº 4 junto com o requerimento inicial, ao depoimento da testemunha JG (aos minutos 00:23:24.1 a 00:25:38.0 e 00:25:38 a 00:26:11.6); ao Doc. nº 4 junto com o requerimento de 12-03-2025 (com a refª Citius 27500791); às fotografias 5 e 6 juntas com o Doc. nº 15 da Oposição; ao Doc. nº 6 junto com o requerimento de 12-03-2025 (com a refª Citius 27500791), deverá o Facto 8 indiciariamente provado ser eliminado e o Facto 13 da Sentença recorrida (correspondente ao Facto 11 na renumeração efetuada no presente recurso) passar a ter a seguinte redação:
As condutas públicas existentes a tardoz do lote, ficam fora da demarcação e dos seus limites físicos e os serviços de saneamento municipal não conseguem intervir no local onde existe uma caixa/grelha de saneamento através da faixa de terreno sobrante (0,80 m);
8ª – Tendo em conta o documento junto aos autos por intermédio do requerimento de 17-06-2025 (com a refª Citius 28116100); ao Facto 3 indiciariamente provado; ao Doc. nº 4 junto com o requerimento inicial; aos Docs. nºs 4 e 6 juntos com o requerimento de 12-03-2025 (com a refª Citius 27500791); ao depoimento da testemunha JG (aos minutos 00.23:38.3 a 00:24:16.9, 00:24:39.0 a 00:25:09.0, 00:30:24.6 a 00:31:01.3 e 00:19:46.7 a 00:20:07.6); às fotografias nºs 5 e 6 juntas com o Doc. nº 15 à Oposição; ao depoimento da testemunha SJ (que, conforme se fez constar da Motivação da decisão de facto, referiu que faltavam “120 cm no caminho de separação dos lotes”), devem eliminar-se os Factos indiciariamente provados (constantes da Sentença recorrida) 9 e 11 e considerar-se indiciariamente provada a matéria da alínea a) da factualidade não indiciariamente provada, acrescentando-se aos indiciariamente provados um Facto com o seguinte teor:
Os requeridos ocuparam indevidamente 1,20m do caminho pedonal existente, pavimentado, e que serve os seis lotes da operação de loteamento acima aludido, implantando no mesmo uma estrutura em betão (anexo à moradia em construção), tendo inclusivamente removido do indicado caminho um dos candeeiros de iluminação pública existente no local e destruído toda a calçada);
9ª – Tendo em atenção que a Requerente se opôs a que a perícia requerida (novo levantamento topográfico) fosse realizada pelo perito signatário – SJ – do levantamento topográfico junto aos autos pelos Requeridos – e que o Tribunal não deferiu (ou sequer sobre ela se pronunciou) a realização de perícia consistente na realização de novo levantamento topográfico, que a Requerente solicitou que fosse requisitado a estabelecimento, laboratório ou serviço oficial apropriado ou a técnico idóneo e isento, não podia a Sentença recorrida ter, como fez, baseado a prova dos factos no depoimento desse mesmo topógrafo;
10ª – Sendo que essa testemunha acabou por admitir ter desconsiderado a necessidade de salvaguardar a existência do caminho previsto no loteamento (referindo até que era o loteamento que estava mal feito (cfr. minutos 00:04:31.1 a 00:04:59.0, 00:19:28.4 a 00:19:37.0 e 00:28:03.6 a 00:28:49.1);
11ª – Atendendo ao Doc. nº 24 junto com a Oposição; à ausência de prova, refletida na motivação da matéria de facto, sobre as razões que pelas quais foram levantados os postes de eletricidade existentes no terreno dos autos; ao depoimento da testemunha JG (aos minutos 00:18:41.1 a 00:21:30.1); às fotografias 3 e 4 juntas com o Doc. nº 15 da Oposição, o Facto que consta da Sentença recorrida como facto indiciariamente provado nº 12 (e que na renumeração efetuada pelo presente recurso passou a ter o nº 10) deverá passar a ter a seguinte redação:
Aquando do início da obra em causa, os Requeridos contactaram os serviços da E-redes e foi removido um poste de eletricidade que se encontrava no terreno cedido à Câmara Municipal de Cascais.
12ª – Considerando o alegado nos arts. 5º e 17º do requerimento inicial; a circunstância de estes factos não terem sido impugnados pelos Requeridos; os Docs. nºs 3 e 4 juntos com a Oposição e os Docs. nºs 4 e 5 juntos com o requerimento de 12-03-2025 (com a refª Citius 27500791), deve acrescentar-se aos factos indiciariamente provados, um Facto (que passa a ter o nº 12), com o seguinte teor:
O Requerido, aquando da submissão do seu pedido de alteração do alvará de loteamento, juntou ao processo que decorreu na Câmara Municipal de Cascais, como anexos, o alvará nº …, bem como a planta de loteamento assinalando o caminho de 2 m de largura, conforme documentos 3 e 4 juntos com a Oposição;
13ª – Tendo em conta o alegado no art.º 7º do requerimento inicial; a circunstância de os Requeridos não terem impugnado que o caminho dos autos tinha acesso por uma escada com 2 metros de largura; os Docs. nºs 3 e 4 juntos com a Oposição; os Docs. nºs 4 a 6 juntos com o requerimento de 12-03-2025 (com a refª Citius 27500791); a “Assentada” em resultado da inspeção judicial efetuada ao local (10:41 a 10:43 da sessão de julgamento realizada em 18-06-2025); os Docs. nºs 3 e 4 juntos com o requerimento inicial; o depoimento da testemunha JG (aos minutos 00:23:24.1 a 00:25:38.0 e 00:25:38.0 a 00:26:11.6); o Doc. nº 6 junto com o requerimento de 12-03-2025 (com a refª Citius 27500791) e as fotografias 5 e 6 juntas com o Doc. nº 15 da Oposição, conjugados com o teor do art.º 16º do DL 448/91 (e posterior art.º 44º do RJUE) e do art.º 17º do DL nº 280/07, deve ser acrescentado aos factos indiciariamente provados um Facto (que passa a ter o nº 13), com o seguinte teor:
O indicado caminho, com acesso por uma escada com 2 m de largura, que se inicia na Av…. , a norte do lote do Requerido, conforme previsto no respetivo alvará de loteamento, tem também 2 metros de largura e estava revestido de cubos de calcário/calçada, servindo os 6 lotes que compõem o loteamento, sendo o mesmo resultado da cedência à Câmara Municipal de Cascais, pelo loteador, para integração no domínio público de 151,95 m2 de terreno destinado a arruamentos.
14ª – Considerando o alegado nos art.ºs. 10º e 11º do requerimento inicial; os Docs. nºs 7 e 8 juntos com o requerimento inicial; as fotografias nºs 5, 6, 7, 8 e 10 juntas com o Doc. n º 15 da Oposição; os Docs. nºs 4 a 6 juntos com o requerimento de 12-03-2025 (com a refª Citius 2700791); o depoimento da testemunha JG (aos minutos 00:23:24.1 a 00:25:38.0, 00:25:38.0 a 00:26:11.6), deve acrescentar-se aos factos indiciariamente provados um Facto (que passa a ter o nº 14) com o seguinte teor:
Sobre o anexo em betão armado que também ocupa o subsolo do caminho, os Requeridos preparavam-se para construir um muro, integrando a toda a largura do seu lote mais 1,20 m retirados do caminho municipal/terreno integrado no domínio público da urbanização, desta forma impedindo a circulação e acesso aos restantes lotes da urbanização, designadamente ao da ora Requerente, para efetuar quaisquer trabalhos que se mostrem necessários na zona que integra e confronta com o indicado caminho, que ficou reduzido a 80 cm de largura;
15ª – Tendo em consideração o alegado no art.º 15º do requerimento inicial e os Docs. nºs 9 e 10 juntos com este, deve acrescentar-se aos factos indiciariamente provados um Facto (que passará a ter o nº 15) com o seguinte teor:
Pelas 9 horas, de dia 14 de outubro de 2024, a mandatária da Requerente, acompanhada da legal representante desta e da testemunha, AM, na ausência do Dono da Obra, notificou verbal e formalmente o diretor de obra, na presença do responsável pela fiscalização da obra, Eng. JG, que acompanhava o indicado Diretor, do embargo extrajudicial dos trabalhos que estavam a ser executados no indicado caminho pedonal/terreno integrado no domínio público da urbanização;
16ª – Ao contrário do decidido na Sentença recorrida, a obra levada a cabo pelos Requeridos ofende o direito de propriedade da Requerente, bem como o direito de uso e fruição do terreno dos autos, integrado no domínio público, tendo esta legitimidade para requerer a presente providência e a faculdade de fazer uso da mesma;
17ª – A base da presente providência é o facto de os Requeridos, ao realizarem a obra dos autos, terem usurpado e ocupado parte desse terreno;
18ª – Contrariamente ao decidido na Sentença recorrida, atenta a respetiva integração no domínio público, é indiferente saber se o terreno dos autos foi ou não pavimentado com cubos de granito ou calcário ou se se encontra atualmente intransitável (o que, para além de não se ter provado, sempre seria da responsabilidade da Câmara Municipal de Cascais);
19ª – Igualmente ao contrário do decidido na Sentença recorrida, provou-se que os Requeridos ocuparam indevidamente 1,20 m de largura do terreno dos autos, integrado no domínio público, que servia os lotes do loteamento nº … (incluindo o da Requerente) e que isso impede ou dificulta seriamente o acesso às condutas de águas residuais e pluviais que servem os lotes aí integrados, bem como a realização de quaisquer trabalhos de reparação ou manutenção das mesmas, dos muros dos lotes e da piscina do lote 4;
20ª – Também contrariamente ao decidido na Sentença recorrida, ficou cabalmente demonstrado que a obra levada a cabo pelos Requeridos causa prejuízo à Requerente;
21ª – Diferentemente do que sucede com as providências cautelares comuns, o prejuízo não é um dos requisitos do embargo de obra nova;
22ª – Bastando a prova de que a obra levada a cabo pelos Requeridos constitui um ato ilícito e viola um direito real ou pessoal de gozo da Requerente;
23ª – Encontram-se preenchidos todos os requisitos necessários ao decretamento da providência requerida;
24ª – Decidindo como decidiu, a Sentença recorrida violou, designadamente, o disposto nos arts. 3º, 5º, 6º, 397º, 415º, 427º, 443º, nº 1, 466º, 467º, 476º, 608.º n.º2, 609.º e 897º do CPC, o art.º 16º do DL 448/91, 44º do RJUE e os arts. 17º e 25º do DL 280/07.
Pede assim a procedência do recurso e, em consequência, que sejam revogados o despacho proferido em 21/01/2025 e a sentença recorrida.
Os Recorridos responderam ao recurso, sobrelevando das suas contra-alegações as seguintes conclusões:
A – DO RECURSO INTERPOSTO DO DOUTO DESPACHO, DE 2025.01.21
AA – Da intempestividade do recurso interposto do despacho, de 2025.01.21
1ª O douto despacho do Tribunal a quo, de 2025.01.21, que decidiu ordenar o (i) desentranhamento do articulado apresentado pela ora recorrente, em 2024.12.02 e a (ii) rejeição do meio de prova que esta então requereu (v. conclusão 1ª e Doc. 1, junto com as alegações de recurso), transitou em julgado, em 2025.02.10, por não ter sido objeto de tempestiva impugnação, mediante o competente e oportuno recurso (v. arts. 620º, 638º/1 e 644º/2/d) do NCPC), não podendo a ora recorrente pretender, por vias obliquas e marginais, desrespeitar e ofender o caso julgado formal daquela decisão judicial (v. arts. 7º, 8º, 620º e 627º e segs. do NCPC) – cfr. texto nºs. 1 a 4;
AB – Da improcedência do recurso interposto do despacho, de 2025.01.21
2ª O douto despacho do Tribunal a quo, de 2025.01.21, não violou de forma alguma o princípio do contraditório ou quaisquer direitos das partes (v. arts. 3º, 4º e 415º do NCPC), como invoca agora a ora recorrente, pois:
a) Limitou-se a dar cumprimento ao disposto nos arts. 293º e 365º a 367º do NCPC, definindo os termos da tramitação subsequente do processo de acordo com as normas aplicáveis e em conformidade com critérios de adequação formal (v. art. 547º do NCPC), pois remeteu para a audiência final a realizar nos termos do art. 367º do NCPC, a apreciação das questões já suscitadas e a suscitar, relacionadas com a (i) resposta às exceções invocadas pelos ora recorridos e com os (ii) meios de prova a produzir, não pondo assim em causa os direitos de qualquer das partes;
b) Confrontada com (i) o primeiro levantamento topográfico apresentado pelos ora recorridos com a sua oposição, de 2024.11.17, e com razões que lhe são exclusivamente imputáveis, e com (ii) a planta do segundo levantamento topográfico, que foi junto aos autos durante o interrogatório da testemunha SJ e na sequência do despacho do Tribunal a quo que consta da ata da segunda sessão da audiência final, realizada em 2025.06.18 (v. Doc. com a referência Citius nº. 158250679), (iii) ao qual não fez qualquer referência ou deduziu qualquer impugnação no texto e conclusões das suas alegações (v. arts. 635º, 639º e 640º do NCPC), a (iii) ora recorrente não exerceu oportunamente os seus pretensos direitos “em momento próprio, que não o atual”, conforme se decidiu no douto despacho recorrido, de acordo com as normas aplicáveis e em conformidade com critérios de adequação formal (v. arts. 3º/4, 367º e 547º do NCPC), ou seja, no decurso de qualquer das três sessões da audiência final;
c) A ora recorrente procura agora simplesmente prevalecer-se das suas próprias omissões no cumprimento de ónus processuais (v. arts. 7º, 8º e 367º do NCPC; cfr. atas das sessões da audiência final realizadas em 2025.05.29, em 2025.06.18 e em 2025.07.10, e gravações respetivas), o que é inadmissível, sendo manifesta a improcedência do presente recurso – cfr. texto nºs. 5 a 8;
BA – Da inexistência de omissão de pronúncia na sentença
3ª A douta sentença recorrida, de 2025.07.14, não enferma de qualquer nulidade por omissão de pronúncia (v. art. 615º/1/d) do NCPC), pois:
a) Nada decidiu e nada tinha que decidir sobre o teor de articulados que já tinham sido então desentranhados do processo, na sequência do anterior despacho do Tribunal a quo, de 2025.01.21, há muito transitado em julgado, como é o caso do requerimento apresentado pela ora recorrente, em 2024.12.02 (v. arts. 619º, 620º, 638 e 644º/2/d) do NCPC);
b) A ora recorrente optou deliberada ou negligentemente por não exercer as faculdades que lhe foram concedidas pelo Tribunal a quo de, na audiência final e em conformidade com o disposto nos arts. 365º a 367º do NCPC, exercer os direitos que lhe assistiam de (i) impugnar os documentos apresentados pelos ora recorridos com a sua oposição e, caso necessário, (ii) requerer novos meios de prova, nomeadamente prova pericial ou outra, o que a ora recorrente nunca fez em momento oportuno, pois:
i. Não deduziu na audiência final qualquer impugnação ao primeiro levantamento topográfico apresentado com a oposição, de 2024.11.17 (v. Doc. 20, junto com a oposição);
ii. Não deduziu na audiência final qualquer impugnação ao segundo levantamento topográfico junto aos autos na sequência de despacho do Tribunal a quo constante da segunda sessão da audiência final, realizada, em 2025.06.18 (v. ata da audiência e Doc. com a referência CITIUS 158250679);
iii. Não requereu na audiência final a realização de qualquer perícia ou qualquer outro meio de prova (v. arts. 3º/4 e 367º/2 do NCPC; cfr. ata da primeira sessão da audiência final realizada, em 2025.05.29, com a ref. 157872582, e gravações respetivas)
iv. E concluiu defendendo nas suas alegações orais produzidas na terceira sessão da audiência final, realizada em 2025.07.10, que não necessitaria de qualquer prova adicional, pois já estava nesse momento “habilitado e decidir com segurança este mesmo procedimento apenas e tão só com base documental que ambas as partes juntaram aos autos” (v. gravação Diligencia_3431-24.7T8CSC_2025-07-10_10-07-41.mp3, minutos 3,40 a 4,20), não podendo agora beneficiar das suas próprias atuações processuais contraditórias, dando o dito por não dito, como decorre das normas e princípios processuais do caso julgado, da preclusão, do dispositivo, da igualdade das partes e da autorresponsabilidade (v. arts. 4º, 5º, 7º, 8º, 619º e 620º do NCPC) – cfr. texto nºs. 9 a 13;
B – DO RECURSO INTERPOSTO DA DOUTA SENTENÇA, DE 2025.07.14
BA – Da inexistência de omissão de pronúncia na sentença
4ª A douta sentença recorrida não enferma de qualquer nulidade por excesso de pronúncia (v. art. 615º/1/d) do NCPC), na parte em que se ordenou a sua notificação à Câmara Municipal de Cascais e ao TAF de Sintra (v. arts. 84º, 238º e 202º/2 da CRP), pois:
a) No presente procedimento a ora recorrente invocou que os ora recorridos estão a ocupar terrenos integrados no domínio público do Município de Cascais, quando será ela própria que o está a fazer, pelo que é evidente que a decisão de notificar esta entidade pública e o TAF Sintra é de “conhecimento oficioso, por estar em causa o respeito por regime imperativo de dominialidade pública, constitucionalmente consagrado (cfr. art. 84º da CRP), pelo que nessa matéria, não está limitado o tribunal ad quem pela iniciativa das partes” (v. Acórdãos do STJ de 2018.06.17, Proc. 2592/16.3T8SNT.L1.S1; de 2022.03.09, Proc. 263/16.0T8CSC.L1.S1, ambos in www.dgsi.pt);
b) No presente processo está em causa a violação de interesses públicos cuja prossecução e defesa se encontra legalmente atribuída ao Município de Cascais (v. arts. 235º e segs. da CRP, arts. 2º, 3º e segs. do RJAL, aprovado pela Lei n.º 75/2013, arts. 18º e segs. do DL 280/2007 e art. 44º/3 do RJUE), como se invocou, nomeadamente, no art. 125º da oposição apresentada em 2024.11.17;
c) Foi precisamente a ora recorrente que, pelo seu requerimento apresentado, em 2025.06.17, suscitou a questão e deu conhecimento ao Tribunal a quo da existência e pendência do litígio pendente no TAF de Sintra, estando nesse específico domínio em causa um pleito ou litígio diretamente relacionado com uma relação jurídico-administrativa – ocupação ou não de bens integrados no domínio público, cuja apreciação compete exclusivamente àquele Tribunal (v. art. 212º/3 da CRP) -, como se invocou e demonstrou, ainda, nos arts. 90º a 94º da oposição apresentada pelos ora recorridos em 2024.11.17;
d) A suscitação da referida questão após já terem sido efetuadas as referidas notificações, como se verifica in casu, integra a prática de um ato absolutamente inútil, e nunca impediria que os ora recorridos obtenham certidão da referida sentença e procedam à sua apresentação no TAF Sintra e no Município de Cascais, pelo que a apreciação desta questão nunca assumiria qualquer relevância ou utilidade (v. art. 130º do NCPC) – cfr. texto nºs. 14 a 16;
BC – Da impugnação da decisão proferida sobre a matéria de facto
5ª A decisão sobre a matéria de facto que foi concretamente proferida pelo Tribunal a quo não merece qualquer censura, pois alicerçou-se no contexto da imediação da prova e da livre apreciação (v. arts. 389º e 396º do C. Civil), e ancorou-se angularmente na análise crítica e circunstanciada dos factos apurados aquando da (i) inspeção judicial realizada ao local, bem como da prova (ii) documental e (iii) testemunhal efetivamente produzida, dando como provados diversos factos que justificam a decisão proferida e especificando, com especial cuidado e clareza, os fundamentos de facto e de direito considerados relevantes ao longo de seis páginas (v. fls. 5 a 10 da sentença recorrida), que aqui se dão por integralmente reproduzidas (v. art. 607º do NCPC), inexistindo e não sendo conjeturável qualquer “erro evidente, na apreciação da matéria de facto” (v. Acs. Rel. Porto de 2015.02.10, Proc. 3795/13.8TBMTS.P1; e de 2014.07.09, Proc. 387/12.2TVPRT.P1, in www.dgsi.pt) – cfr. texto nºs. 17 a 19;
i. Do trânsito em julgado da decisão não impugnada quanto à credibilidade dos depoentes
6ª A ora recorrente não impugnou no presente recurso a decisão expressa e concretamente proferida na douta sentença recorrida quanto à atribuição ou não credibilidade aos depoimentos prestados pelas partes e testemunhas que prestaram depoimento na audiência final, nomeadamente no que respeita à decisão de considerar e julgar não credíveis e desconsiderar por completo os contraditórios depoimentos prestados por FM e AM, pelo que a referida decisão transitou em julgado e nunca poderia ser agora objeto de qualquer alteração, sendo manifesta a total irrelevância de tais desacreditados depoimentos para se introduzir qualquer alteração à matéria de facto considerada indiciariamente provada (v. arts. 607º, 619º e segs., 635º, 639º e 640º do NCPC) – cfr. texto nºs. 20 a 23;
ii. Da não alteração da redação dos factos dados como provados sob os nºs. 3 e 4
7ª As alterações que a ora recorrente pretende introduzir aos factos nºs. 3 e 4 dados como indiciariamente provados na douta sentença recorrida não tem qualquer fundamento ou procedência, pois, além do mais:
a) Aquela decisão cumpriu rigorosamente o disposto no art. 607º/2 do NCPC, não lhe tendo sido imputado qualquer erro de julgamento neste domínio (v. arts. 635º, 639º e 640º do NCPC);
b) A douta sentença recorrida discriminou e deu como os referidos factos nºs. 3 e 4 nos termos em que, após debate e com o acordo expresso de ambas as partes, já tinham ficado assentes na primeira sessão da audiência final (v. ata nº. 157872582), não podendo a ora recorrente não pode dar continuadamente o dito por não dito e assumir permanentemente condutas em contraditio (v. arts. 7º e 8º do NCPC; cfr. art. 334º do C. Civil); e, além disso,
c) As referências aos documentos que a ora recorrente pretende integrar nos factos assentes respeitam à especificação de meros meios de prova e não de qualquer facto (arts. 341º e 362º do Código Civil e arts. 5º e 607º do NCPC), sendo “prática incorreta, na decisão sobre a matéria de facto, remeter para o teor de documentos” (v. Acs. STJ de 2024.01.24, Proc. 22913/20.3T8LSB.L1.S1; e de 2015.04.22, Proc. 2663/10.0TTLSB.L1.S, in www.dgsi.pt) – cfr. texto nºs. 24 a 26;
iii. Da manutenção do facto dado como provado sob o nº 5
8ª A decisão proferida pelo douto Tribunal a quo sobre a matéria que foi integrada no nº. 5 dos factos indiciariamente provados não pode merecer qualquer censura, pois resulta claramente da prova produzida nos presentes autos e que foi objeto de expressa referência e apreciação crítica na douta sentença recorrida (v. art. 607º do NCPC), como decorre nomeadamente:
a) Da Assentada da inspeção judicial realizada, em 2025.06.18 (v. segundos 25 e segs. da gravação da segunda sessão da audiência final, com a referência Diligencia_3431-24.7T8CSC_2025-06-18_10-41-03.mp3;
b) Dos depoimentos prestados pelo Eng. JG (v. gravação da audiência de 2025.06.18, aos minutos 1,50 a 2,33 e aos minutos 15,35 a16), e pelo topógrafo SJ (v. gravação da audiência de 2025.06.18, aos minutos 15,10 a 15,20, e aos minutos 16,20 a 16,26);
c) Dos Docs. 6, 7, 8, 9, 10, 13 a 15 e 22, juntos com a oposição, de 2024.11.17, dos Docs. 6, 7, 8, 9, 12, 13 e 14, juntos com o r.i., de 2024.10.18, dos Docs. 1 a 8, juntos aos autos em 2025.03.12, e em 2025.03.25;
d) Estando neste particular em causa um facto que já tinha sido dado como assente com o acordo de ambas as partes, após amplo debate com o Tribunal e sem qualquer oposição da ora recorrente, na primeira sessão da audiência final, realizada, em 2025.05.29, como resulta da respetiva ata, com a ref. 157872582– cfr. texto nºs. 27 a 29;
iv. Da manutenção dos factos nºs. 8 e 13, dados como provados
9ª A decisão proferida pelo douto Tribunal a quo sobre a matéria que foi integrada nos nºs. 8 e 13 dos factos indiciariamente provados não pode merecer qualquer censura, pois resulta claramente da prova produzida nos presentes autos e que foi objeto de expressa referência e apreciação crítica na douta sentença recorrida (v. art. 607º do NCPC), como decorre nomeadamente:
a) Da Assentada da inspeção judicial realizada, em 2025.06.18 (v. segundos 25 e segs. da gravação da segunda sessão da audiência final - Diligencia_3431-24.7T8CSC_2025-06-18_10-41-03.mp3;
b) Do depoimento prestado pela testemunha JG (v. gravação do depoimento prestado na audiência de 2025.06.18, aos minutos 24,38 a 25, 10, aos minutos 29,05 a 29,22, aos minutos 30,30 a 30,44 e aos minutos 27,10 a 27m22);
c) Dos Docs. 8, 9, 13 a 15, 22 e, muito especialmente, do Doc. 25, todos juntos com a oposição;
d) Estando neste particular em causa um facto que resultou da instrução da causa e de matéria sobre a qual as partes tiveram ampla oportunidade de se pronunciar (v. art. 5º/2/b) do NCPC)–cfr. texto nºs. 30 e 31;
v. Da manutenção dos factos nºs. 9 e 11e do facto dado como não provado
10ª A decisão proferida pelo douto Tribunal a quo sobre a matéria que foi integrada nos nºs. 9 e 11 dos factos indiciariamente provados, bem como sobre o facto dado como não provado, não pode merecer qualquer censura, pois resulta claramente da prova produzida nos presentes autos e que foi objeto de expressa referência e apreciação critica na douta sentença recorrida (v. art. 607º do NCPC), como decorre nomeadamente:
a) Da Assentada da inspeção judicial realizada, em 2025.06.18 (v. segundos 33 e segs. da gravação da segunda sessão da audiência final, com a referência Diligencia_3431-24.7T8CSC_2025-06-18_10-41-03.mp3;
b) Dos depoimentos prestados pelo Eng. JG (v. gravação da audiência de 2025.06.18, aos minutos 1,50 a 2,33), e pelo topógrafo SJ (v. gravação da audiência de 2025.06.18, aos minutos 15,10 a 15,20 e aos minutos 16,20 a 16,26);
c) Dos Docs. 1, 2, 3, 7, 8, 13 , 15, 18, 19, 20, 21 e 22, juntos com a oposição, de 2024.11.17, dos Docs. 6, 7, 8, 12, 13 e 14., juntos com o r.i., de 2024.10.18, dos Docs. 1 a 8, juntos aos autos em 2025.03.12, e em 2025.03.25;
d) Da planta do segundo levantamento topográfico, junta aos autos por determinação do douto Tribunal a quo, em 2025.06.18 (v. ata da segunda sessão da audiência final e Doc. com a referência Citius 158250679), que não foi objeto de qualquer impugnação pela ora recorrente;
e) Sendo evidente que o embargo determinado pelo Sr. Presidente da CMC, de 2024.11.04, é absolutamente irrelevante, pois caducou e não produz quaisquer efeitos jurídicos, pelo menos, desde 2025.05.04 (v. art. 104º do RJUE, aprovado pelo DL 555/99, de 16 de Dezembro), tendo inclusivamente sido objeto de oportuna impugnação judicial pelos ora recorridos, deduzida em 2025.04.21, como a própria recorrente se encarregou de demonstrar (v. art. 413º do NCPC), juntando agora aos presentes autos a respetiva petição inicial completa– cfr. texto nºs. 32 e 33;
vi. Da manutenção da redação do facto nº. 12
11º A decisão proferida pelo douto Tribunal a quo sobre a matéria que foi integrada no nºs. 12 dos factos indiciariamente provados não pode merecer qualquer censura, pois resulta claramente da prova produzida nos presentes autos e que foi objeto de expressa referência e apreciação critica na douta sentença recorrida (v. art. 607º do NCPC), como decorre nomeadamente do (i) Doc. 24, junto com a oposição, conjugado com os (ii) depoimentos prestados pela testemunha JG (depoimento gravado na audiência de 2025.06.18, aos minutos 19,46 a 20,30 da respetiva gravação), bem como pela testemunha SJ (depoimento prestado na audiência de 2025.06.18, aos minutos 13,58 a 16,18), (iii) revelando-se completamente absurda a conjetura avançada pelo ora recorrente, no sentido de que a E-Redes teria retirado ou permitido a retirada de qualquer poste de iluminação do local, caso não reconhecesse que este estava mal implantado e em terreno alheio– cfr. texto nºs. 34 e 35;
vii. Do novo facto nº. 12
12ª A matéria do novo facto nº. 12 que a ora recorrente pretende introduzir aos factos indiciariamente provados foi expressamente (i) analisada e impugnada no art. 35º da oposição apresentada pelos ora recorridos, em 2024.11.17, (ii) não foi objeto de qualquer prova durante as três sessões da audiência final (v. art. 607º do NCPC), o que nem sequer foi alegado pela ora recorrente, pelo que nunca poderia ser agora simplesmente considerada provada por acordo ou falta de impugnação, como a ora recorrente se permite falsamente invocar (v. arts. 7º e 8º do NCPC), (iii) resultando ainda a sua improcedência do que consta do Doc. 21, junto com a oposição (informação dos serviços da CMC proferida no âmbito da apreciação do projeto da construção dos ora recorridos, reconhecendo a inexistência da ocupação de qualquer terreno integrado no domínio público municipal), bem como do teor dos Docs. 1, 2, 3, 18, 19, 20 e 22, juntos com a mesma oposição – cfr. texto nºs. 36 e
viii. Dos novos factos nºs. 13 e 14
13ª Nas conclusões 13º e 14ª das suas alegações a ora recorrente defende a inclusão de novos factos, também com os nºs. 13 e 14, que visam, por vias laterais e marginais, afrontar e contradizer a matéria de facto dada como provada sob os nºs. 5, 8, 9, 11 e 13 da douta sentença recorrida, pelo que ao abrigo do princípio da cooperação e prevenindo-se a prática de atos repetidos e inúteis (v. art. 7º e 130º do NCPC), remete-se e dá-se aqui por reproduzido o invocado nos anteriores textos n.ºs. 27 a 33 das presentes contra-alegações, bem como nas antecedentes conclusões 8ª a 11ª– cfr. texto nºs. 36 e 37;
ix. Do novo facto nº. 15
14ª A matéria invocada no art. 15º do requerimento inicial, apresentado, em 2024.10.17, de que a ora recorrente se pretende agora prevalecer e dar como assente, foi expressamente (i) impugnada nos arts. 64º, 70º e 71º da oposição apresentada pelos ora recorridos, em 2024.11.17, (ii) não foi objeto de qualquer prova na audiência final, (iii) apenas seria suscetível de relevar para efeito da decisão da questão da intempestividade do embargo extrajudicial da obra em causa, conforme se invocou nos arts. 105º a 107º, da oposição deduzida pelos ora recorridos, em 2024.11.17, que foi objeto de decisão proferida na segunda sessão da audiência final, realizada, em 2025.05.29 (v. ata com a referência 158250679), integrando a sua (iv) invocação nesta fase a prática de um ato absolutamente inútil, pois a prova de tal alegação nunca afetaria o restante conteúdo decisório da douta sentença recorrida, nomeadamente a respetiva decisão de mérito quanto à improcedência do presente meio cautelar (v. arts. 130º e 292º do Código Civil e 195º/2 do NCPC) – cfr. texto nº. 38;
BD - DA IMPROCEDÊNCIA DO RECURSO INTERPOSTO DA SENTENÇA
15ª A douta sentença recorrida não enferma de qualquer erro de julgamento, pois, como sempre foi expressamente reconhecido e invocado pela ora recorrente, esta não é titular e nunca declarou, demonstrou ou provou ser titular de qualquer “direito de propriedade ou outro direito real ou pessoal de gozo” sobre qualquer área do prédio ocupada pela obra levada a efeito pelos ora recorridos, como lhe competia (v. art. 5º do NCPC; cfr. art. 342º do C. Civil), afirmando repetidamente e ao longo do presente procedimentos que nele está em causa a ocupação de um terreno público, integrado no domínio público do Município de Cascais (v. conclusões 16ª e 18º das alegações de recurso e art. 16º do requerimento inicial do presente processo) – cfr. texto nºs. 39 a 40.1;
16ª No caso em análise sempre estaria assim em causa o exercício de meio judicial com a finalidade expressa e confessada de assegurar a defesa, manutenção e utilização de bens alegadamente integrados no domínio público (v. arts. 84º e 235º da CRP e arts. 15º e segs. do DL 280/2007, de 7 de Agosto), que não pertencem à ora recorrente e que “estão fora do comércio jurídico, não podendo ser objeto de direitos privados” (v. art. 18º do DL 280/2007, de 7 de Agosto; cfr. art. 16º/3 do DL 448/91, de 29 de Novembro, art. 44º/3 do RJUE), pelo que a alegação de tais interesses públicos nunca poderia fundamentar ou justificar a propositura do presente meio cautelar conservatório de direitos privados (v. arts. 362º e 397º do NCPC), como se decidiu em situação absolutamente idêntica, no douto acórdão do Tribunal da Relação de Guimarães, de 2016.12.07 (v. Proc. 192/16.7T8VPA.G1, in www.dgsi.pt) – cfr. texto nº. 40.1;
17ª Como se deu como indiciariamente provado no presente processo (v. factos provados na sentença, sob os nºs. 2, 3, 9, 10, 11 e 12), a construção levada a efeito pelos ora recorridos realizou-se exclusivamente no interior do lote ou prédio de que estes são proprietários registralmente inscritos e não ocupa qualquer área exterior ao referido lote, pelo que, como se decidiu na douta sentença recorrida, não se verificou e nunca poderia ter-se verificado qualquer ofensa de direito de propriedade, singular ou comum da ora recorrente, ou de qualquer outro direito real ou pessoal de gozo ou, sequer, de qualquer posse ou detenção exercida pela ora recorrente com base nalgum direito de que seja titular (v. art. 397º/1 do NCPC) – cfr. texto nº. 40.2;
18ª Tendo-se demonstrado e provado que já está inteiramente consumada a pretensa lesão dos interesses que a recorrente invoca defender no presente procedimento, através da pretensa redução da largura de um pretenso caminho público que já teria sido destruído pelas obras dos ora recorridos (v. factos nºs. 2, 3, 9, 10, 11 e 12 dados como indiciariamente provados), inexiste neste momento qualquer periculum in mora, sendo evidente a improcedência do presente procedimento, não se verificando os requisitos de que depende a sua concessão (v. arts. 397º e segs. do NCPC), pelo que a douta sentença recorrida nunca poderia merecer agora qualquer censura– cfr. texto nº. 40.2 e 41.
Pede assim que sejam rejeitados, ou julgados totalmente improcedentes, os recursos interpostos do despacho de 21/01/2025 (v. arts. 620º, 638º/1 e 644º/2/d) do NCPC), bem como da sentença de 14/07/2025, mantendo-se as referidas decisões judiciais, com as legais consequências.
O recurso veio a ser admitido, por tempestivo (cfr. “Admissão de Recurso” de 07-10-2025 – Ref.ª n.º 159937184 - p.e.), sendo certo que não se pronunciou sobre as nulidades das decisões recorrida, tal como o Art. 617.º n.º 1 do C.P.C. impõe. Em todo o caso, atento aos termos como essas questões são colocadas e à natureza urgente do processo, não se nos afigura ser imprescindível ordenar a baixa do processo com vista a suprimento dessa falta (cfr. Art. 617.º n.º 5 “a contrario” do C.P.C.).
De referir ainda que, por despacho do relator (cfr. “Despacho” de 04-11-2025 – Ref.ª n.º 23849991 - p.e.), foi ordenado o cumprimento do contraditório relativo à questão prévia da rejeição do recurso relativamente à parte que tinha por objeto o despacho de 21 de janeiro de 2025, tendo a Recorrente sustentado que dessa decisão não caberia recurso autónomo, por não se tratar de decisão de não admissão de um articulado ou de um meio de prova (cfr. “Requerimento” de 20-11-2025 – Ref.ª n.º 788770 - p.e.).
Essa matéria foi relegada, por decisão do Relator, para apreciação em tribunal coletivo.
*
II- QUESTÕES A DECIDIR
Nos termos dos Art.s 635º n.º 4 e 639º n.º 1 do C.P.C., as conclusões delimitam a esfera de atuação do tribunal ad quem, exercendo uma função semelhante à do pedido na petição inicial (vide: Abrantes Geraldes in “Recursos no Novo Código de Processo Civil”, Almedina, 2017, pág. 105 a 106). Esta limitação objetiva da atuação do Tribunal da Relação não ocorre em sede da qualificação jurídica dos factos ou relativamente a questões de conhecimento oficioso, desde que o processo contenha os elementos suficientes a tal conhecimento (cfr. Art. 5º n.º 3 do Código de Processo Civil). Também não pode este Tribunal conhecer de questões novas que não tenham sido anteriormente apreciadas porquanto, por natureza, os recursos destinam-se apenas a reapreciar decisões proferidas (Vide: Abrantes Geraldes, Ob. Loc. Cit., pág. 109).
Assim, em termos sucintos, as questões essenciais a decidir são as seguintes:
a) A rejeição do recurso que tem por objeto o despacho de 21 de janeiro de 2025;
b) A nulidade da sentença por omissão de pronúncia sobre a prova pericial requerida;
c) A nulidade da sentença por excesso de pronúncia quanto à ordem de comunicação da decisão à Câmara Municipal e ao TAF;
d) A impugnação da matéria de facto; e
e) A verificação dos pressupostos da providência cautelar requerida de embargos de obra nova.

Corridos que se mostram os vistos, cumpre decidir.
*
III- FUNDAMENTAÇÃO DE FACTO
A decisão recorrida julgou por provados, os seguintes factos:
1. A Requerente é proprietária e legitima possuidora do prédio urbano localizado em Rua …., n.º …,  Estoril, descrito na Conservatória do Registo Predial de Cascais, sob a ficha … - cfr. Certidão registo predial junta, que aqui se dá por integralmente reproduzido para os devidos e legais efeitos (correspondente ao lote 4 adiante indicado).
2. Os Requeridos são proprietários do prédio sito na Av. …, lote 3, Estoril, descrito na 2.º Conservatória do Registo Predial sob a ficha …, cuja certidão predial se mostra junta aos autos e que aqui se dá por integralmente reproduzido para os devidos e legais efeitos.
3. Os lotes de ambos, Requerente e Requerido, integram o mesmo loteamento urbano, cujo alvará de loteamento tem o n.º …, emitido em 17 de novembro de 1998 e planta constante do respetivo anexo II do alvará, ambos juntos por extrato ao processo.
4. Dali consta, entre o mais, “O loteador deverá pavimentar o caminho pedonal com cubos de granito uma vez que a inclinação é bastante acentuada. (…) São cedidos à Câmara Municipal para integração no domínio público 151,95m2 de terreno destinado a arruamentos”.
5. A promotora da referida operação de loteamento - sociedade P, SA pavimentou uma parte do caminho pedonal com cubos de granito representado na planta que constitui o anexo ao alvará de loteamento nº. …, de 1998.11.17, na zona situada a Norte do Lote 3, e que permite o acesso do Lote 4 à Avenida …, através da porta existente na estrema Noroeste desse mesmo Lote 4, como resulta visível das fotografias juntas do “googleearth” e “geocascais”.
6. Por despacho do então Exmo. Senhor Vice-Presidente da Câmara Municipal de Cascais, Dr. CC, de 2009.02.09, foi indeferido o pedido apresentado pela promotora do loteamento em causa, em 2008.04.03, no sentido de serem levantadas as garantias bancárias, considerando que as infraestruturas previstas no alvará de loteamento nº. …/96 não foram objeto de qualquer receção por parte dos órgãos e serviços municipais, tal como resultada da documentação do respetivo processo administrativo junta aos autos.
7. A sociedade P, SA, nunca obteve sequer a aprovação das telas finais, receção provisória e subsequente receção definitiva das obras de urbanização previstas como condições no alvará de loteamento nº. …, de 1998.11.17.
8. O caminho pavimentado com cubos de granito e existente a Norte do lote 3 serve exclusivamente um portão de acesso pedonal localizado na estrema Noroeste do lote 4, correspondente às traseiras das edificações propriedade da ora requerente – único existente na confrontação Poente daquele lote 4 -, que se mantém inalterado.
9. As obras levadas a efeito no lote 3 nunca ocuparam e não ocupam qualquer espaço ou área que não esteja integrado dentro dos limites do referido lote 3, contendo-se nas dimensões de profundidade e largura; bem como nos 600 m2 (seiscentos metros quadrados) de área total que foram fixados pelo Município de Cascais para aquele lote, através do alvará de loteamento nº. …, de 1998.11.17, e se encontra registral e matricialmente inscrito.
10. Em 2018.12.07, os órgãos do Município de Cascais, na sequência de requerimento apresentado para esse efeito pelo ora requerido e sua mulher, através do processo camarário SPO …/2016, emitiram um aditamento ao alvará de loteamento nº. …, de 1998.11.17, que incidiu apenas sobre o interior do lote 3, propriedade do ora requerido e da sua mulher, manteve a sua área total de 600 m2, registral e matricialmente inscrita, bem como as medidas de profundidade e largura e os limites geográficos anteriormente estabelecidos pelo Município de Cascais – alterando o polígono de implantação específico para varandas, para anexo e alteração da área bruta de construção total, na definição da área de implantação e de cota de soleira, incluindo o piso em cave.
11. As obras estão a ser executadas de acordo com o projeto aprovado pela CMC SPO …/2020, consta expressamente que as áreas ocupadas pela construção projetada e atualmente em execução foram objeto de medição específica, não se assinalando a ocupação de qualquer terreno integrado no domínio público municipal, e de acordo com o alvará de construção n.º … respetivo.
12. Aquando o início da obra em causa, os requeridos contactaram os serviços da E-Redes que, após constatarem que foram indevidamente colocados postes de iluminação dentro dos limites da área do lote 3 (e mesmo do lote 2), procederam voluntariamente e a suas expensas, em 2024.08.21, à remoção daqueles postes, cfr. documentação respetiva junta e que se dá por reproduzida.
13. As condutas públicas existentes a tardoz do lote ficam foram da demarcação e dos seus limites físicos e os serviços de saneamento municipal conseguem aceder ao local onde existe uma caixa/grelha de saneamento através da faixa de terreno sobrante (0,80m).
*
Mais julgou indiciariamente não provada a seguinte factualidade:
a) Os requeridos ocuparam indevidamente 1,20m do caminho pedonal existente, pavimentado, e que serve os seis lotes da operação de loteamento acima aludido, implantando no mesmo uma estrutura em betão (anexo à moradia em construção), tendo inclusivamente removido do indicado caminho um dos candeeiros de iluminação pública existente no local e destruído toda a calçada.

Tudo visto, cumpre apreciar.
*
         IV- Fundamentação de direito:
Delimitadas as questões a apreciar no presente recurso, iremos então delas tomar conhecimento pela sua ordem de precedência lógica, começando pela questão prévia da rejeição do recurso que tem por objeto o despacho datado de 21 de janeiro de 2025.
*
1. Da rejeição do recurso do despacho de 21 de janeiro de 2025.
A primeira questão que se suscita no presente recurso apenas foi suscitada pelos Recorridos nas suas contra-alegações e está relacionada com a sua rejeição, por razões relativas à tempestividade, quanto ao recurso que tem por objeto o despacho de 21 de janeiro de 2025 (Ref.ª n.º 155340978 - p.e.), nomeadamente na parte em que pelo mesmo foram rejeitados requerimentos que a Requerente da providência cautelar havia apresentado em 2, 16 e 26 de dezembro de 2024.
Mais concretamente, a Recorrente pretende pôr em causa pelo presente recurso o segmento desse despacho em que decidiu o específico desentranhamento do requerimento de 2 de dezembro de 2024, que entretanto apresentou como documento n.º 1 das suas alegações de recurso, por forma a se poder apreciar o que objetivamente estaria em causa.
Alegou que, por esse concreto requerimento, solicitou, ao abrigo do princípio da adequação formal, que o Tribunal a quo lhe concedesse prazo para responder por escrito às exceções invocadas pelo Requerido na oposição, por forma a assegurar-se um processo equitativo e o efetivo exercício do contraditório, tendo também aproveitado para se pronunciar sobre os meios de prova apresentados pelo Requerido, impugnando os documentos por este juntos, muito em particular “o levantamento topográfico”, e ainda quanto à realização de prova pericial, com vista à produção de novo levantamento topográfico, ampliando a prova pericial que havia sido requerida na oposição e indicando o logo o seu perito.
Ocorre que, esse despacho de 21 de janeiro de 2025 (Ref.ª n.º 155340978 - p.e.), que ordenou o desentranhamento desse concreto requerimento da Requerente da providência, foi notificado às partes por registo datado de 5 de novembro de 2024 (cfr. “Not Despacho Anexo” de 05-11-2024 – Ref.ª n.º 153931332 e n.º 153931329 - p.e.), que contra ele não reagiram. Por isso, sustentam agora os Recorridos que a interposição do presente recurso, apenas em 11 de agosto de 2025, com esse objeto, deveria ser rejeitado por extemporâneo.
A Recorrente, notificada para o efeito, veio responder a essa concreta pretensão (cfr. “Requerimento” de 20-11-2025 – Ref.ª n.º 788770 - p.e.), sustentando que a decisão recorrida não caberia no âmbito da previsão do Art. 644.º n.º 2 do C.P.C., dela não cabendo recurso autónomo, porque não se trata do desentranhamento de um articulado, tal como o mesmo é definido no Art. 147.º n.º 1 do C.P.C., nem a decisão indeferiu um meio de prova por si requerido.
Apreciando, importa ter em consideração, antes de mais, qual o conteúdo efetivo do “requerimento” de 2 de dezembro de 2024 que foi ordenado desentranhar pelo despacho aqui pretendido recorrer.
Em primeiro lugar, existe um segmento do requerimento, sob a epígrafe “a) Quanto à defesa por exceção”, no qual não se exerce o contraditório à oposição do Requerido, pretendendo-se apenas que seja concedido prazo para esse efeito.
Em segundo lugar, no segmento seguinte, sob a epígrafe “b) Quanto aos Meios de Prova apresentados pelo Requerido”, pretende-se apenas exercer o contraditório relativamente a 25 documentos juntos pelo Requerido e responder ao requerimento de prova pericial que este último havia formulado na oposição, opondo-se ao nome aí indicado para perito e expressando o entendimento de que a perícia deveria ser solicitada a entidade oficial independente, ampliando depois o objeto dessa perícia.
Visto isto, esse requerimento objetivamente não é um articulado no sentido exposto no Art. 147.º do C.P.C., porque estes são aí definidos nos seguintes termos: «1 - Os articulados são as peças em que as partes expõem os fundamentos da ação e da defesa e formulam os pedidos correspondentes».
O requerimento em menção seria certamente um articulado caso a Requerente tivesse respondido às exceções e factos alegados na oposição pelo Requerido. Só que, o que foi efetivamente requerido, nesse contexto, foi um prazo para exercer esse contraditório em articulado. Pelo que, nessa parte, não se ordenou o desentranhamento de um articulado, mas sim o desentranhamento de um requerimento em que se solicitava que pudesse vir a ser apresentado um articulado. O que é algo de substancialmente diverso.
Também não se pode dizer que a Requerente requereu aí a produção de um meio de prova, porquanto a prova pericial, que estaria em causa, havia sido objetivamente requerida pelo Requerido na oposição.
Nesse segundo segmento do requerimento é claro que a Requerente se limitou a exercer o contraditório relativamente a meios de prova que haviam sido requeridos pelo Requerido na oposição, recordando-se aqui que nenhum meio de prova pode ser admitido, nem produzido, sem cumprimento prévio do contraditório (cfr. Art. 415.º n.º 1 do C.P.C.). Sendo que, estando em causa um meio de prova constituendo, como seria o caso da prova pericial pretendida, ela também pressupunha a intervenção ativa da parte contrária na sua preparação e produção (cfr. Art. 415.º n.º 2 do C.P.C.).
Dito isto, não estamos no âmbito da previsão do Art. 644.º n.º 2 al. d) do C.P.C., por não estar em causa recurso «d) Do despacho de admissão ou rejeição de algum articulado ou meio de prova».
Em consequência, da decisão de desentranhamento do requerimento em causa só poderia, eventualmente, caber recurso nos termos do n.º 3 do Art. 644.º do C.P.C., ou seja, em conjunto com a impugnação da decisão que viesse a por termo ao procedimento cautelar previstas na al. a) do n.º 1 do Art. 644.º do C.P.C..
No entanto, não é bem assim, porque há ainda que ter em atenção ao que efetivamente foi decidido no despacho de 25 de janeiro de 2025 (Ref.ª n.º 155340978 - p.e.).
Literalmente foi decidido o seguinte: «Desentranhe e devolva, por ora, os requerimentos de 02.12.2024, 16.12.2024 e 26.12.2024, por não previstos na tramitação legal e nada de superveniente acrescentarem (para além de se reportarem a matéria a ser decidida em momento próprio, que não o atual.
Ou seja, o que foi decidido foi que esse requerimento era intempestivo, por existir um outro momento, posterior (que não foi indicado qual), em que essas questões poderiam ser suscitadas e oportunamente decididas.
Ora, no que se refere ao exercício do contraditório às exceções e factos articulados na oposição, a solução resulta da lei. Isto, porque os procedimentos cautelares não admitem mais articulados para além do requerimento inicial e da oposição (cfr. Art.s 365.º, 366.º e 367.º n.º 1 “ex vi” Art. 376.º n.º 1 do C.P.C.). Pelo que, as exceções deduzidas no último articulado admissível, no caso a oposição, podem ser respondidas pela parte contrária na audiência final (cfr. Art. 3.º n.º 4 do C.P.C.).
Desde modo, caso não tenha sido permitido à Requerente, na audiência final, responder ao articulado na oposição, aí sim, teria sido omitido um ato ou formalidade processual que a lei prevê (v.g. Art. 3.º n.º 4 do C.P.C.) e que poderia influir no exame da causa (cfr. Art. 195.º do C.P.C.).
Ocorre que esse tipo de nulidade secundária tem um regime processual próprio, por estar em causa um mero desvio ao formalismo prescrito na lei.
A este propósito escrevia Alberto dos Reis (in “Comentário ao Código de Processo Civil”, Vol. 2.º , pág. 484) que: «O que (neles) há de característico e frisante é a distinção entre infrações relevantes e infrações irrelevantes. Praticando-se um ato que a lei não admite, omitindo-se um ato ou uma formalidade que a lei prescreve, comete-se uma infração, mas nem sempre esta infração é relevante, quer dizer, nem sempre produz nulidade. A nulidade só aparece quando se ver fica um destes cases: a) quando a lei expressamente a decreta; b) quando a irregularidade cometida possa influir no exame ou na decisão da causa». No segundo caso – continua o mesmo Autor – «é ao tribunal que compete, no seu prudente arbítrio, decretar ou não a nulidade, conforme entende que a irregularidade cometida pode ou não exercer influência no exame ou decisão da causa».
Acrescenta ainda Antunes Varela (in “Manual de Processo Civil”, 2ª Ed., pág. 391) que: «A nulidade de um ato, apesar da cadeia teleológica que liga todos os atos do processo, só arrastará consigo a inutilização dos termos subsequentes que dele dependam essencialmente».
Sendo que, a prática do ato inadmissível ou a omissão do ato ou da formalidade prescrita são considerados como influindo no exame ou  decisão da causa quando se repercutem na sua instrução, discussão ou julgamento (cfr. Lebre de Freitas in “Código de Processo Civil Anotado”, 3.ª Ed., pág. 381).
Por outro lado, estas nulidades secundárias têm de ser arguida pela parte através de reclamação (cfr. Art. 196.º do C.P.C.) no momento em que ocorrer a nulidade, se a parte estiver presente, por si ou por mandatário. Caso não esteja presente, o prazo geral de arguição, de 10 dias, conta-se do dia em que, depois de cometida a nulidade, a parte interveio em algum ato praticado no processo ou foi notificada para qualquer termo dele, mas neste último caso só quando deva presumir-se que então tomou conhecimento da nulidade, ou dela pudesse conhecer, agindo com a devida diligência (cfr. Art. 199.º n.º 1 e Art. 149.º n.º 1 do C.P.C.).
Mantém-se, por isso, o velho brocado segundo o qual dos despachos recorre-se, contra as nulidades reclama-se.
Conforme explicava Alberto dos Reis (in “Comentário ao Código de Processo Civil”, Vol. 2.º, pág. 507): «a arguição da nulidade só é admissível quando a infração processual não está ao abrigo de qualquer despacho judicial; se há um despacho a ordenar ou autorizar a prática ou a omissão do ato ou formalidade, o meio próprio para reagir, contra a ilegalidade que se tenha cometido, não é a arguição ou reclamação por nulidade, é a impugnação do respetivo despacho pela interposição do recurso competente».
Mas, doutro ponto de vista, na explicitação de Luís Mendonça e Henrique Antunes (in “Dos Recursos”, Quid Juris, pág. 52): «A reclamação por nulidade e o recurso articulam-se, portanto, de harmonia com o princípio da subsidiariedade: a admissibilidade do recurso está na dependência da dedução prévia da reclamação.
«Assim, o que pode ser impugnado por via do recurso é a decisão que conhecer da reclamação por nulidade – e não a nulidade ela mesma. A perda do direito à impugnação por via da reclamação – caducidade, renúncia, etc. – importa, simultaneamente, a extinção do direito à impugnação através do recurso ordinário.
«Isto só não será assim no tocante às nulidades cujo prazo de arguição só comece a correr depois da expedição do recurso para o tribunal ad quem e no tocante às nulidades – exceções – que sejam oficiosamente cognoscíveis.»
De igual modo escreve Teixeira de Sousa (in “Estudos Sobre o Novo Processo Civil”, Lex, pág. 372), quando afirma que: «(…) quando a reclamação for admissível, não o pode ser o recurso ordinário, ou seja, esses meios de impugnação não podem ser concorrentes; - se a reclamação for admissível e a parte não impugnar a decisão através dela, em regra está precludida a possibilidade de recorrer dessa mesma decisão».
Abrantes Geraldes (in “Recursos no Novo Código de Processo Civil”, 2013, pág. 162), entende ainda que: «As nulidades que não se reconduzam a alguma das situações previstas no art. 615º, als. b) a e), estão sujeitas a um regime de arguição que é incompatível com a sua invocação apenas no recurso a interpor da decisão final. A impugnação que neste recurso eventualmente se possa enxertar deve restringir-se às decisões que tenham sido proferidas sobre arguições oportunamente deduzidas com base na omissão de certo ato, na prática de outro que a lei não admitia ou na prática irregular de ato que a lei previa».
Em suma, era da decisão proferida sobre a arguição da nulidade que seria suscetível de recurso, o que pressupunha a prévia reclamação tempestiva da mesma perante o tribunal a quo.
No caso, se a Requerente, que estava patrocinada por advogado, que interveio em todas as sessões da audiência final, deixa que se encerre a discussão da causa em primeira instância, sem arguir, por reclamação, a nulidade por omissão da faculdade de exercer o contraditório relativamente ao articulado de oposição (cfr. Art. 3.º n.º 4 do C.P.C.), a nulidade sana-se por falta de reclamação oportuna (cfr. Art. 196.º e 199.º do C.P.C.) e já não pode ser erigida como fundamento de recurso de apelação. Pelo que, nessa parte o recurso perdeu a sua utilidade, devendo com esse fundamento ser rejeitado.
Mas o mesmo se poderá dizer relativamente ao segmento da decisão recorrida que incide, embora só indiretamente, sobre a resposta à prova pericial requerida, que é a única parte a que se reporta a pretensão recursiva aqui formulada, já que nas alegações nada se disse relativamente ao exercício do direito ao contraditório quanto à prova documental.
No que se refere à prova pericial, ela efetivamente apenas foi requerida pelo Requerido da providência cautelar no seu articulado de oposição. A Requerente da providência não formulou semelhante pretensão probatória, tendo-se limitado a exercer o contraditório relativamente a um meio de prova proposto pela parte contrária.
Ocorre que esse meio de prova não foi produzido, não tendo sequer existido um despacho a decidir a sua admissão ou rejeição. Pelo que, houve uma situação objetiva de omissão de decisão sobre um concreto requerimento probatório (relembre-se) do Requerido. Ou seja, quem tinha interesse direto na apreciação desse requerimento e na produção do meio de prova era, primeiramente, o Requerido, no que, entretanto, foi acompanhado pela sua esposa. Pelo que, quem tinha legitimidade para arguir a nulidade por omissão da prática de um ato prescrito pela lei (v.g. Art. 415.º do C.P.C.), relativamente a esse concreto requerimento probatório, eram principalmente os Requeridos.
Em todo o caso, é verdade que a parte que requer a produção de prova pericial não pode dela desistir sem a anuência da parte contrária (cfr. Art. 474.º do C.P.C.). Pelo que, existe aqui também um interesse atendível da Requerente da providência cautelar na produção desse meio de prova requerido pela parte contrária.
Simplesmente, o que aconteceu foi que as partes deixaram encerrar a discussão da causa em 1.ª instância, sem arguirem oportunamente a nulidade por omissão de despacho sobre a admissibilidade e da consequente produção de um concreto meio de prova requerido no articulado de oposição. O que tem como consequência que esse vício na tramitação do processo também se sanou, por falta de reclamação oportuna (cfr. Art. 196.º e 199.º do C.P.C.).
A consequência da sanação desse vício é que, não só não pode ser invocado agora como fundamento de recurso, como prejudica, por tornar supervenientemente inútil, a relevância do exercício do contraditório feito pela Requerente, através do Requerimento de 2 de dezembro de 2024, na parte em que por ele se pretendia responder à prova pericial requerida pelo Requerido na oposição.
Em suma, por estas razões, também nesta parte o recurso sempre teria de ser rejeitado, por manifesta inutilidade da impugnação da decisão que ordenou o desentranhamento do requerimento de 2 de dezembro de 2024, porquanto se consolidou no processo a omissão de produção de um meio de prova, sem oportuna reação das partes relativamente a esse vício na tramitação do processo.
Julgamos pois, por todo o exposto, rejeitar o recurso que tem por objeto o despacho de 25 de janeiro de 2025 (Ref.ª n.º 155340978 - p.e.), embora por razões diversas das alegadas pelos Recorridos, ainda que também assentes na consideração da relevância do tempo na apreciação dos efeitos do que efetivamente foi decidido.

2. Da nulidade omissão de pronúncia em violação do Art. 615.º n.º 1 al. d), 1.ª parte, do C.P.C..
Sustenta a Recorrente que a decisão recorrida violou o disposto no Art. 615.º n.º 1 al. d) do C.P.C., uma vez mais com fundamento na alegada “omissão de pronúncia” sobre o requerimento de prova relativo à prova pericial, considerando que existe uma nulidade que se projeta na sentença proferida, havendo uma decisão surpresa, com violação do princípio do contraditório, por não ter sido garantida a participação plena das partes ao longo do processo de molde a influenciarem a decisão da causa no plano dos factos, da prova e do direito.
Os Recorridos pugnaram pela improcedência desta alegada nulidade.
Apreciando, nos termos temos do Art. 615.º n.º 1 al. d), 1.ª parte, do C.P.C. a sentença é nula quando o juiz deixe de se pronunciar sobre questões que devesse apreciar.
Trata-se de um vício formal, em sentido lato, traduzido em error in procedendo ou erro de atividade que afeta a validade da sentença.
Esta nulidade está diretamente relacionada com o Art. 608.º n.º 2 do C.P.C., segundo o qual: «O juiz deve resolver todas as questões que as partes tenham submetido à sua apreciação, excetuadas aquelas cuja decisão esteja prejudicada pela solução dada a outras (…)».
Para melhor compreender o sentido dos vícios previstos no Art. 615.º do C.P.C., escrevia a propósito Alberto dos Reis (in “Código de Processo Civil Anotado”, Vol. V, pág. 122): «Temos (…) dois tipos de sentença viciada: a sentença injusta e a sentença nula. A primeira enferma de erro de julgamento; a segunda de erro de atividade (erro de construção ou formação)». E, como realçava Antunes Varela, a este respeito (in “Manual de Processo Civil”, 2.ª Ed., revista e atualizada, pág. 686): «não se inclui entre as nulidades da sentença o chamado erro de julgamento, a injustiça da decisão, a não conformidade dela com o direito substantivo aplicável, ou o erro na construção do silogismo judiciário».
Ora, o que no caso é invocado nas alegações de recurso da Recorrente não é que o tribunal não tivesse apreciados as concretas questões que lhe foram suscitadas. O que é invocado é que houve a omissão de decisão prévia sobre a admissibilidade de um meio probatório, a definição do seu objeto e sua consequente produção. Ou seja, o vício não é da própria sentença, que na verdade apreciou todas as questões que lhe foram suscitadas nos articulados como causa de pedir e exceções alegadas pelas partes, debruçando-se no final sobre o pedido formulado.
O vício apontado está a montante da sentença. Trata-se de um vício na tramitação do processo que poderia ter influência na decisão final, segundo a Recorrente sustenta. Só que, esse tipo de nulidades, ditas de secundárias, como vimos no ponto anterior, têm um regime e enquadramento jurídico próprio nos Art.s 195.º, 196.º e 199.º do C.P.C., que é distinto das nulidades previstas no Art. 615.º do C.P.C.. Sobrelevando, desde logo, um aspeto muito relevante, que tem a ver com a possibilidade de, não havendo reclamação oportuna, esses vícios se sanarem e se consolidarem com a subsequente tramitação do processo.
Na verdade não se pode falar, no caso, sequer, de “decisão surpresa”, porque as partes estavam perfeitamente cientes que, uma vez encerrada a discussão da causa, depois de dada a palavra aos mandatários para produzirem as suas alegações orais, o ato subsequente era, necessariamente, que iria ser proferida decisão final, tendo por base a prova que efetivamente havia sido admitida e produzida.
Não é a circunstância de a Recorrente ter ficado desagrada com a decisão sobre a matéria de facto, com a qual discorda, que permite repristinar vícios, já sanados, como causa de nulidade do ato decisório final.
O Art. 615.º do C.P.C. não compreende, em circunstância alguma, o “erro de julgamento”. As nulidades aí previstas referem-se ao procedimento formal interno do ato decisório em si mesmo considerado e não a omissões verificadas na tramitação do processo, que culminam na produção desse ato último.
Em conformidade, improcedem as conclusões que sustentam a nulidade da sentença recorrida.
3. Da nulidade por excesso de pronúncia em violação do Art. 615.º n.º 1 al. d), 2.ª parte, do C.P.C..
A Recorrente veio invocar ainda que haveria excesso de pronúncia na parte em que a decisão final, aqui recorrida, ordenou a comunicação do teor dessa decisão de improcedência da providência cautelar aos serviços de urbanismo da Câmara Municipal de Cascais e ao Tribunal Administrativo e Fiscal de Sintra, considerando a existência de processo de embargo administrativo na Câmara Municipal e dum processo judicial destinado à impugnação desse ato administrativo naquele tribunal, pois nenhuma das partes requereu que assim se procedesse.
Apreciando, com o devido respeito, a nulidade prevista no Art. 615.º n.º 1 al. d) do C.P.C. também não serve para este propósito. Desde logo, porque essa decisão não carecia sequer de requerimento de nenhuma das partes, por resultar do cumprimento de um dever de ofício e de cooperação recíproca entre entidades públicas com responsabilidades manifestas na resolução do caso, embora no quadro dos seus respetivos pelouros e competências, sendo evidentes e atendíveis as razões que justificam a comunicação dessa informação. Pelo que, sem necessidade de maiores considerandos, julgamos desatender à alegada nulidade da sentença com este fundamento.
4. Da impugnação da matéria de facto.
A Recorrente veio impugnar a decisão sobre a matéria de facto constante da sentença recorrida, defendendo que os factos provados nos pontos 3 a 5, 12 e 13 deveriam ter outra redação, que indicou, devendo ser eliminados da factualidade provada os pontos 8, 9 e 11, sustentando ainda que a sentença seria omissa relativamente a factos por si alegados nos artigos 5.º, 7.º, 10.º, 11.º, 15.º e 17.º do seu requerimento inicial, sugerindo a redação que deveria ser dada por provada, tendo para esse efeito indicado a prova documental, por inspeção ao local e por declarações de parte e testemunhal gravadas, que no seu entender suportaria a decisão por si pugnada.
Estabelece o Art. 662º n.º 1 do C.P.C. que a Relação deve alterar a decisão proferida sobre a matéria de facto, se os factos tidos por assentes, a prova produzida ou um documento superveniente, impuserem decisão diversa.
Nos termos do Art. 640º n.º 1 do C.P.C., quando seja impugnada a matéria de facto deve o recorrente especificar, sob pena de rejeição, os concretos factos que considera incorretamente julgados; os concretos meios probatórios constantes do processo ou de registo ou gravação nele realizada, que imponham decisão sobre os pontos da matéria de facto impugnados diversa da recorrida; e a decisão que, no seu entender, deve ser proferida sobre as questões de facto impugnadas.
Nos termos do n.º 2 do mesmo preceito concretiza-se que, quanto aos meios probatórios invocados incumbe ao recorrente, sob pena de imediata rejeição, indicar com exatidão as passagens da gravação em que funda o recurso. Para o efeito poderá transcrever os excertos relevantes. Sendo que ao Recorrido caberá o ónus de designar os meios de prova que infirmem essas conclusões do recorrente, indicar as passagens da gravação em que se funda a sua defesa, podendo também transcrever os excertos que considere importantes, isto sem prejuízo dos poderes de investigação oficiosa do tribunal.
A lei impõe assim ao apelante específicos ónus de impugnação da decisão de facto, sendo o primeiro o ónus de fundamentar a discordância quanto à decisão de facto proferida, o qual implica a análise crítica da valoração da prova feita em primeira instância, tendo como ponto de partida a totalidade da prova produzida em primeira instância.
A este propósito, escreveu-se no Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa de 24/5/2016 (Proc. n.º 1393/08 – Relatora: Maria Amélia Ribeiro) que: «É ao impugnante que cumpre convencer o Tribunal de recurso que a primeira instância violou as regras de direito probatório aquando da apreciação dos meios de prova. Não basta uma mera contraposição de meios de prova (ainda que não constantes dos indicados na fundamentação do tribunal): é necessário que a parte que recorre proceda, ela própria, a uma análise crítica da apreciação do tribunal a quo, demonstrando em que pontos o Tribunal se afastou do juízo imposto pelas regras legais, dos princípios, das regras da racionalidade e da lógica ou da experiência comum».
No Acórdão da Relação do Porto de 6.3.2017 (Proc. n.º 632/14 – Relator: Miguel Morais), afirma-se que: «tal como se impõe que o Tribunal faça a análise crítica das provas (de todas as provas que se tenham revelado decisivas, nos termos do Art. 607º, nº 4), também o recorrente, ao enunciar os concretos meios de prova que devem conduzir a uma decisão diversa, deve fundar tal pretensão numa análise (crítica) dos meios de prova, não bastando, designadamente, reproduzir um ou outro segmento descontextualizado dos depoimentos ou indicar, de forma acrítica, um determinado documento.
«Deste modo, na motivação de um recurso, para além da alegação da discordância, é outrossim fundamental a alegação do porquê dessa discordância, isto é, torna-se mister evidenciar a razão pelo qual o recorrente entende existir divergência entre o decidido e o que consta dos meios de prova invocados.
«Nesse sentido tem sido interpretado o segmento normativo “impunham decisão diversa da recorrida” constante da 2ª parte da al. b) do n.º 1 do Art. 640º, acentuando-se que o cabal exercício do princípio do contraditório pela parte contrária impõe que sejam conhecidos de forma clara os concretos argumentos do impugnante».
Importa ainda ter em atenção que estamos perante um procedimento cautelar que, por regra, tem uma finalidade meramente preventiva ou conservatória relativamente ao direito que se pretenderá ver reconhecido em ação declarativa principal a instaurar. Desse modo, como referia Antunes Varela (in “Manual de Processo Civil”, 2.ª Ed., pág. 24 a 25): «o juiz não poderá exigir, na prova da existência e da violação do direito do requerente, nem na demonstração do perigo de dano que o procedimento se propõe evitar, o mesmo grau de convicção que naturalmente se requer na prova dos fundamentos da ação».
Visto isto, porque no caso foram claramente cumpridos os ónus de impugnação estabelecidos na lei, vejamos do mérito da mesma de forma discriminada, respeitando na medida do possível a sequência dos factos tal como consta das alegações de recurso.
4.1. Dos factos provados nos pontos 3 e 4.
Os primeiros 2 factos visados impugnar pela Recorrente são os que constam dos pontos 3 e 4 dos factos provados na decisão final recorrida. Aí foi dado por assente que: «3. Os lotes de ambos, Requerente e Requerido, integram o mesmo loteamento urbano, cujo alvará de loteamento tem o n.º …, emitido em 17 de novembro de 1998 e planta constante do respetivo anexo II do alvará, ambos juntos por extrato ao processo»; e que: «4. Dali consta, entre o mais, “O loteador deverá pavimentar o caminho pedonal com cubos de granito uma vez que a inclinação é bastante acentuada. (…) São cedidos à Câmara Municipal para integração no domínio público 151,95m2 de terreno destinado a arruamentos».
Encurtando razões, diga-se que, na verdade, a Recorrente concorda com o teor dos factos aí provados, que aliás já haviam sido dados por assentes em ata de audiência final (cfr. “Ata” de 29-05-2025 – Ref.ª n.º 157872582 - p.e.), sem que tenha havido qualquer reclamação das partes. Em todo o caso, o que se pretende agora é aditar à redação assim consignada que o alvará de loteamento aí referido corresponde ao documento n.º 3 do requerimento inicial e a planta que constitui o anexo II corresponde ao documento n.º 4 junto com o mesmo articulado.
Trata-se de um preciosismo de redação inútil, considerando que a sentença claramente acabou também por fundamentar a sua convicção quanto a esses factos precisamente nos documentos juntos aos autos, que incluem os documentos n.º 3 e n.º 4 em menção, não havendo dúvidas sobre ao que se reporta o dado por provado. Nessa medida, não se nos afigura de qualquer utilidade a alteração de redação proposta.
4.2. Dos factos provados no ponto 5.
A Recorrente, de seguida, pôs em causa o julgamento do ponto 5 dos factos provados, que uma vez mais contém matéria de facto que já havido sido dada por assente na ata de audiência final de 29 de maio de 2025 (cfr. “Ata” de 29-05-2025 – Ref.ª n.º 157872582 - p.e.). Nesta parte, tal como relativamente aos factos mencionados no ponto anterior (4.1. do presente acórdão), as partes foram igualmente notificadas dessa decisão e não apresentaram qualquer reclamação no sentido de não aceitarem desde logo esses factos como provados. No entanto, pretende agora a Recorrente alterar a redação desse ponto 5 estripando-a dos pormenores de que o caminho pedonal era feito de “cubos de granito” e que o caminhos se situa “na zona situada a Norte do Lote 3, e que permite o acesso do Lote 4 à Avenida …, através da porta existente na estrema Noroeste desse mesmo Lote 4, como resulta visível das fotografias juntas do “googleearth” e “geocascais””.
Pretende assim que fique apenas provado que: «A promotora da referida operação de loteamento – sociedade P, Lda. – pavimentou o caminho pedonal apresentado na planta que constitui o anexo ao alvará de loteamento nº …, de 1998.11.17 com pedra da calçada».
Antes de avançarmos mais na apreciação das razões que justificam estas pretendidas alterações, temos de referir que, no âmbito dos procedimentos cautelares, ou mesmo até nos processos declarativos comuns, não se exige que se fixem antecipadamente os factos provados antes da produção de qualquer prova. Mas, dito isto, também temos de dizer que a lei processual não proíbe que o juiz o possa fazer, sendo claro que podem existir reais vantagens nesse procedimento em termos de gestão da produção da prova em audiência final, contando que seja respeitado o contraditório, pois é uma forma de simplificação e agilização processual que pode garantir uma justa composição do litígio em prazo razoável e mais célere (cfr. Art. 6.º n.º 1 do C.P.C.), o que se adequa particularmente bem a procedimentos que a lei define como urgentes (v.g. Art. 363.º n.º m1 do C.P.C.).
Em todo o caso, temos de relembrar que, mesmo no quadro do Código de Processo Civil pretérito de 1961, quando no âmbito do processo declarativo comum ainda se previa que os factos devessem logo ser dados por assentes no despacho saneador, em sede da “especificação”, o Supremo Tribunal de Justiça fixou a seguinte jurisprudência, no Assento n.º 14/94, de 4 de outubro (Publicado no Diário da República n.º 230/1994, Série I-A de 1994-10-04, páginas 6067 – 6072): «No domínio de vigência dos Códigos de Processo Civil de 1939 e 1961 (considerado este último antes e depois da reforma nele introduzida pelo Decreto-Lei n.º 242/85, de 9 de Julho), a especificação, tenha ou não havido reclamações, tenha ou não havido impugnação do despacho que as decidiu, pode sempre ser alterada, mesmo na ausência de causas supervenientes, até ao trânsito em julgado da decisão final do litígio».
Portanto, de há muito que se entende, e se tornou prática jurisprudencial corrente e uniforme, que a decisão sobre a fixação da matéria de facto assente, após os articulados e antes da produção de prova, não constitui caso julgado formal, podendo esses factos vir a ser alterados na sentença final, em função da prova que entretanto se veio a produzir em audiência de julgamento.
No caso concreto, a Recorrente acabou por sustentar, na sua motivação de recurso, que se provou que os “cubos de granito” afinal eram “pedras de calçada”, ou seja, pedra de calcário e não de granito. Nada referiu sobre o demais provado no ponto 5, nomeadamente sobre a localização relativa desse caminho, ou sobre as acessibilidades que o mesmo permitiria, embora ponha em causa o segmento de que a pavimentação feita nesse caminho não fosse total e, ao pronunciar-se mais à frente sobre o ponto 8, também ponha em causa a existência duma porta de acesso, pois nas fotografias juntas (v.g. doc. n.º 12 do requerimento inicial) e na inspeção judicial ao local, só se verificou a existência duma janela ou vão com caixilharia.
Em suma, estamos outra vez perante pormenores particularmente irrelevantes para a solução do mérito da causa, embora tenha que se dizer que o que resulta da prova é que estava em causa pedra de calçada, portanto de calcário, e não “blocos de granito”, tal como apenas se provou que ali existia um vão com caixilharia de gradeamento que dava acesso à casa de máquina da piscina do lote da Requerente, como resulta da inspeção judicial ao local, de acordo com o transmitido oralmente pela Mma. Juíza, logo no início da gravação da audiência, constante da ata de 18 de junho de 2025, bem como dos vídeos juntos com o requerimento de 25 de março de 2025 (Cfr. “Ficheiro de Vídeo” - Doc. 7 e Doc. 8  - Vídeo - espaço entre lotes 3 e 4 [Ficheiro de Vídeo] de Ref.ª n.º 27586469 - p.e.) ou do junto com o requerimento de 13 de março de 2025 (cfr. “Vídeo [outro]” de 12-03-2025 – Ref.ª n.º 27500791 - p.e.), ou ainda das fotografias igualmente justas com este último requerimento e o doc. n.º 12 junto com o requerimento inicial.
Pensamos mesmo que nem sequer há verdadeira discussão das partes sobre esses pormenores.
Trata-se assim dum preciosismo que pode justificar uma devida retificação, mas que não pode determinar a alteração de redação proposta pela Recorrente com a extensão por si pretendida.
De facto, quanto à conclusão de que a promotora imobiliária pavimentou toda a área do caminho, isso não resulta da prova documental, seja por fotografias, seja por vídeo, nem do que a Mma. Juíza disse ter visto na sequência da inspeção ao local. Por outro lado, a prova gravada põe em dúvida esse facto, porque foi infirmado pelas testemunhas SJ e JG, que viram esse espaço, antes de ter sido feita a obra no lote 3, e apenas referiram a existência de vestígios de calçada num pequeno segmento do “caminho”, já afastado dos lotes 3 e 4, pois todo esse espaço estaria só coberto por vegetação silvestre. Essa dúvida não foi afastada de forma que se possa ter por segura pelos depoimentos de FM, ou de AF, sendo o primeiro prestou depoimento como legal representante da sociedade Requerente e o segundo foi um dos anteriores gerentes da mesma sociedade e disse ser o pai da sua atual gerente.
Admitimos assim que se possa alterar a redação do ponto 5, por uma questão de rigor, ainda que irrelevante, por forma a corrigir o facto de o caminho ter sido pavimentado com “cubos de granito”, porque efetivamente esse caminho só apresentava vestígios de ter sido pavimentado, pelo menos em parte, com pedras de calçada. Também se provou que não existia uma “porta” de acesso ao lote 4, mas sim um vão em caixilharia gradeada que permite o acesso à casa de máquinas da piscina existente no lote 4, que pertence à Requerente.
Também se poderá aditar, porque sobre isso não existe controvérsia, que o acesso à Rua … pelo lote 4 é feito por uma escadaria que existe no local, como é patente das várias fotografias juntas aos autos.
Deste modo o ponto 5 passa a ter a seguinte redação:
«5. A promotora da referida operação de loteamento – a sociedade P, SA –, pelo menos em parte, pavimentou, com pedras de calçada, o caminho pedonal que corresponderá ao que se mostra representado na planta que constitui o anexo ao alvará de loteamento nº. …, de 1998.11.17, na zona situada a Norte do Lote 3, o qual permite, entre outros, o acesso ao vão em caixilharia gradeada que dá para a casa de máquinas da piscina existente no Lote 4, permitindo esse caminho também um acesso à Avenida … através duma escadaria, como resulta visível das fotografias juntas do googleearth e geocascais».
4.3. Dos factos provados no ponto 8 e 13.
A Recorrente pretende depois impugnar os factos provados nos pontos 8 e 13, pugnando pela eliminação pura e simples do facto 8 e pela alteração da redação do ponto 13, ficando a constar deste último, ao contrário do dado por provado, que: não se consegue intervir no local onde existe uma caixa/grelha de saneamento através da faixa de terreno sobrante (0,80m)”.
Temos de referir, antes de mais, que o ponto 8 não tem correspondência com o que constava ter sido dado por assente em “8.” na ata de audiência final de 29 de maio de 2025 (cfr. “Ata” de 29-05-2025 – Ref.ª n.º 157872582 - p.e.). Agora, na decisão final aqui recorrida, ficou dado por provado que: «8. O caminho pavimentado com cubos de granito e existente a Norte do lote 3 serve exclusivamente um portão de acesso pedonal localizado na estrema Noroeste do lote 4, correspondente às traseiras das edificações propriedade da ora requerente – único existente na confrontação Poente daquele lote 4 -, que se mantém inalterado».
Considera o Recorrente que o ponto 13 nem sequer foi alegado por nenhuma das partes, sendo que o que foi dito oralmente pela Mma. Juíza em audiência, em resultado da inspeção ao local foi que: «Existe, sim, não é bem uma janela, é um vão, existe um vão com caixilharia de gradeamento e que foi indicado pelo, pela Requerente, como sendo a entrada da casa das máquinas da sua piscina». O que, aliás, estaria retratado na fotografia junta como doc. nº 12 com o requerimento inicial, sendo assim claro que o caminho também serve para aceder a esse vão.
Por outro lado, realça que nessa mesma fotografia também se vê um poste de iluminação ao fundo do caminho dos autos, cujo acesso também só pode ser feito por esse caminho.
Defende ainda que, como ficou o espaço sobrante, com apenas 0,80m de largura,  não é possível colocar andaimes para efeito da realização de trabalhos de manutenção e pintura dos muros dos lotes 4 e 5.
Põe ainda em evidência que, em resultado da inspeção judicial, também se verificou que: «ao longo de toda a longitude do lote dos Requeridos não existe qualquer caixa de esgoto ou de saída de águas pluviais mas no lote subsequente, no mesmo onde foi possível delinear a calçada, foi possível verificar a existência de uma grade de escoamento de águas pluviais». O que estaria em consonância com o depoimento da testemunha JG, que admitiu que o caminho em causa foi também executado para aí ser colocada a tubagem das águas domésticas e pluviais, encontrando-se os respetivos sumidouros e tampas de acesso situados no enfiamento do lote 2. Portanto, o caminho em causa não serve exclusivamente o portão do lote 4, sendo irrelevante que as condutas de águas e esgotos se situem fora dos limites do lote 3.
Entende ainda a Recorrente que o depoimento da testemunha JG não é credível e não tem suporte na prova documental quando afirma que as “Águas de Cascais” conseguem aceder à conduta pública existente nesse caminho, porquanto no doc. n.º 4 do requerimento de 12 de março de 2025 (Ref.ª n.º 27500791 - p.e.), consta que: “A rede de esgotos domésticos e pluviais está situada na Av. …. Irá ser criado um caminho pedonal de serventia aos lotes, por onde irão ser ligados os ramais de águas residuais domésticas e pluviais dos lotes com frente para a Rua … de modo a evitar que estas moradias tenham de ter o sistema de esgotos por bombagem, para a Rua … e possam sim, utilizar um sistema por gravidade. Foram consultados os serviços técnicos do SMAS de Cascais, que nos informaram da viabilidade técnica desta solução, bem como da largura mínima deste caminho (2.00 m)».
Acresce que alega que os Requeridos escavaram, e ocuparam o terreno municipal dos autos, mesmo até ao limite das tubagens existentes no local, não tendo deixado qualquer faixa lateral de terreno entre essa construção e conduta, o que impedirá a maioria das intervenções que venham a revelar-se necessárias. Será por isso que consta do projeto de infraestruturas do loteamento dos autos (cfr. doc. nº 6 do requerimento de 12-03-2025 Ref.ª n.º 27500791 – p.e.) que: “Há necessidade de efetuar um acesso pedonal para passagem das redes gerais de águas residuais e esgotos. Este acesso pedonal terá uma plataforma de 2.00 m constituída por uma faixa central de 1.00 m, prolongada para um e outro lado por duas valetas com 0,50 m de largura”. Ou seja, o afastamento de 50 cm de largura era essencial para pode intervir nas condutas em caso de necessidade, sendo evidente que a largura de 0,80m com que ficou o caminho dos autos após as obras não permitirá a passagem das máquinas que eventualmente venham a ser necessárias para proceder à manutenção ou reparação das referidas condutas, dado que os veículos ligeiros de passageiros têm a largura média de 1,75m/1,80m.
Os Recorridos, por seu turno, entendem que não assiste razão à Recorrente, porque da “Assentada” da inspeção judicial resultou que: «dentro do portão da requerente existe, está instalada, metade de uma caixa de esgoto. (…) Verificou-se também que ao longo de toda a longitude do lote dos requeridos não existe qualquer caixa de esgoto ou de saída de águas pluviais. Mas no lote subsequente, no mesmo onde foi possível delinear a calçada, foi possível verificar a existência de uma grade de escoamento de águas pluviais». O que foi confirmado pelo depoimento prestado pelo Eng. JG, assegurando que inexistem quaisquer infraestruturas do loteamento dentro da área do lote dos ora recorridos, localizando-se apenas no espaço exterior, e afirmando que “existem dois tubos que é a tubagem pluvial e o doméstico”; que essa tubagem “está fora do nosso lote”; que o espaço que se manteve livre entre os lotes nºs. 3 e 4 “permite a manutenção da passagem e utilização daquele local para os fins necessários”; e que o “corredor só serve mesmo para aceder às tubagens e aos coletores e às tampas das caixas de esgoto que até nem sequer estão aqui, não, estão só aqui e lá à frente, e consegue-se fazer tudo”.
Por isso, sustentam que ficou claro, como decorre da decisão recorrida, que as condutas ali existentes ficam fora do lote 3, o que foi comunicado à “Águas de Cascais”, tendo por referência a faixa de terreno sobrante a tardoz  de 0,80m, pela qual se consegue aceder à caixa de chamada de conduta pública existente a tardoz do lote 2 e que, em face do ponto 6, decorre indiciariamente, que o caminho, ou não passou do projeto de loteamento ou, a ter sido executado, não existe ali há largos anos, a ponto de aí ter crescido uma palmeira, bem como um matagal de canas e outra vegetação que o deixam, ainda hoje, intransitável.
Finalmente, realçam também que, após a inspeção judicial ao local e tomando o Tribunal a quo contacto direto com os factos, se confirmou que «dentro do portão da requerente existe, está instalada, metade de uma caixa de esgoto», sendo que o complemento do dado como indiciariamente provado sob o nº. 13 resultou da instrução da causa (cfr. Art. 5.º n.º 2 al. b) do C.P.C.).
Contrapostas as posições das partes e apreciando, temos de dizer que o ponto 8 dado por provado deve ser alterado certamente na parte em que se refere à sua pavimentação com “cubos de granito”, pelas razões que justificaram a igual alteração na redação do ponto 5.
Pelas razões aí expedidas só podemos concluir que se provou que esse caminho foi, pelo menos em parte, pavimentado com “pedra de calçada” e não por “cubos de granito”.
Depois temos o segmento provado que refere que o caminho está a norte do lote 3, o que está em coerência com o documentado nos autos e já assente no ponto 5, sendo que as partes também não reclamaram dessa parte da factualidade fixada previamente pela Mma. Juíza a quo.
O problema estará apenas quanto à circunstância desse caminho servir, e “exclusivamente”, um “portão” de acesso pedonal localizado na estrema noroeste do lote 4, que inquestionavelmente corresponde ao lote da Requerente.
Antes disso, temos de dizer ainda que a edificação aí implantada pela Requerente está virada para a rua de cima, identificada na planta junta como doc. n.º 4 do requerimento inicial por “Rua …”, concluindo-se assim facilmente que o caminho em causa nos autos está nas traseiras da edificação da Requerente, confirmando-se assim o acerto do dado por provado nessa parte.
Em todo o caso, naquilo a que as partes se referem, simpaticamente, como “Assentada” – que mais não foi que uma exposição oral, feita pela Mma. Juíza, sobre aquilo que disse que viu na sequência da inspeção ao local, mas que ficou gravado logo no início da audiência de 18 de junho de 2025 –, efetivamente não se menciona nenhum “portão”. Por outro lado, as fotografias juntas aos autos também não retratam nenhum “portão”. Ao que acresce que, ouvidas as gravações dos depoimentos prestados em audiência, também não registámos qualquer menção a um “portão”.
O que as fotografias retratam, nomeadamente o doc. nº 12 junto com o requerimento inicial, é uma espécie de janela gradeada de alumínio, que na “Assentada” é referida como «um vão com caixilharia de gradeamento e que foi indicado pela Requerente como sendo a entrada da casa das máquinas da sua piscina».
Por outro lado, também é claro que esse caminho não serve exclusivamente de acesso ao lote 4, e muito menos a um “portão”.
Nessa medida, esses factos concretamente apurados, porque decorrentes da instrução do processo, designadamente de prova documental junta pela própria Requerente e da inspeção judicial ao local, poderiam perfeitamente ser adquiridos pelo tribunal e incluídos na seleção da matéria de facto provada, nos termos do Art. 5.º n.º 2 al. b) do C.P.C., embora a sua redação deva ser alterada.
Assim, o ponto 8 deve passar a ter a seguinte redação:
«8. O caminho, que foi pelo menos parcialmente pavimentado com calçada, existente a Norte do lote 3, serve de acesso pedonal, entre outros, ao vão com caixilharia de gradeamento que serve de entrada à casa das máquinas da piscina, localizada nas traseiras das edificações do lote 4, propriedade da ora requerente».
Quanto ao ponto 13, a Recorrente somente põe em causa a 2.ª parte do aí dado por provado, com o propósito de concluir que pela parte sobrante desse caminho não se consegue aceder ao local, onde objetivamente se verificou que existe uma caixa de saneamento.
Nesta parte não assiste razão à Recorrente, porque o contrário foi afirmado pela testemunha JG, que é engenheiro civil, responsável pela fiscalização da obra, que confirmou o dado por provado, não se nos oferecendo motivos para pôr em causa a credibilidade do seu depoimento, que nos pareceu razoável e aceitável, até do ponto de vista das regras de experiência comum.
Efetivamente, podermos admitir que 0,80 metros, em vez de 2,00 m de largura, possa eventualmente condicionar algumas soluções técnicas que impliquem o uso de alguns tipos de maquinaria ou aparatos técnicos. Mas, se bem virmos as fotografias juntas aos autos relativamente ao local, verificamos que a inclinação do terreno, a existência de escadarias e a disposição natural do espaço, dificilmente permitiria, por exemplo, que um veículo ligeiro, tal como invocado pela Recorrente, conseguisse chegar àquele local, mesmo que aquele concreto troço do caminho tivesse 2 metros de largura como consta do processo de alteração de pormenor ao P.U.C.S. junto com doc. n.º 4 ao Requerimento de 12 de março de 2025 (Cfr. “Outro” de 12-03-2025 – Ref.ª n.º 27500791 - p.e.).
Em suma, independentemente de parecer ser verdade que no projeto de loteamento se estabelecia que esse caminho deveria ter 2 metros de largura, parece-nos pouco relevante para o caso, para efeitos estritos da mera consideração da possibilidade objetiva de haver acesso à caixa de saneamento – que é o único sentido objetivo dessa parte dos factos dados por provado no ponto 13 – que o caminho tenha apenas 0,80 metros.
Na verdade, desconhece-se efetivamente quais as razões efetivas da imposição da largura de 2 metros a esse caminho, embora do processo de alteração de pormenor ao P.U.C.S. conste que «foram consultados os serviços técnicos do SMAS de Cascais que nos informaram da viabilidade técnica desta solução [criação de um caminho pedonal de serventia aos lotes por onde seriam ligados os ramais de águas residuais domésticas e pluviais], bem como da largura mínima deste caminho (2.00m)» (sic – v.g. sob a epígrafe: “6- Infraestruturas”).
Podem existir razões para ter sido imposta a largura de 2 metros no caminho, mas no que estritamente se refere à acessibilidade à caixa de saneamento, ela continua assegurada, porque a aquela não foi objeto de qualquer ocupação pela obra dos Requeridos e os 0,80m de largura do caminho objetivamente não impedem a sua eventual reparação ou a realização de atos de manutenção ou conservação da tubagem e caixa de saneamento aí existente.
Em conformidade, o facto constante do ponto 13 deve permanecer provado.
4.4. Dos factos provados nos pontos 9 e 11, com referência ainda à alínea a) dos factos não provados.
De seguida a Requerente impugna os factos provados constantes dos pontos 9 e 11, que entende não poderem ser dados por provados, devendo sim ser aditado aos factos provados que os Requeridos ocuparam indevidamente, através duma estrutura de betão, 1,20 metros do caminho existente, pavimentado e que serve os 6 lotes da operação de loteamento, tendo inclusivamente removido um candeeiro de iluminação pública existente no local e destruindo toda a calçada. O que necessariamente implicaria, no mínimo, a eliminação da alínea a) dos factos não provados.
A sentença recorrida entendeu, neste contexto que: “o processo de licenciamento do lote dos requeridos permitiu constatar que o mesmo não altera os limites do lote, tal qual decorrente do alvará de loteamento e das certidões predial e registral, nem tão pouco as dimensões e configuração de profundidade e largura, o que foi patente também nas declarações do topógrafo que fez a demarcação do terreno de acordo com o projeto camarário empreendido, como se verá adiante”.
A Recorrente realça, no entanto, que o Presidente da Câmara Municipal de Cascais proferiu despacho a embargar a obra em causa no presente procedimento cautelar, por considerar que se tratava de obra ilegal (cfr. doc. junto com “Requerimento” de 17-06-2025 – Ref.ª n.º 28116100 – p.e.). O que foi feito em conformidade com a participação elaborada em 23 de outubro de 2024, pela divisão de fiscalização de obras e infraestruturas, reproduzida nesse despacho de embargo, donde consta que: “A obra em execução extravasou os limites do lote a tardoz em cerca de 1.20m (estando a passagem neste momento com cerca de 0.80m quando deveria ter 2.00m), estando neste momento a ocupar o espaço público cedido pelo respetivo alvará de loteamento. Para executar a cofragem do muro em causa, retirou um dos 1 candeeiros que se encontravam nesta passagem/via pública conforme se pode constatar pelo levantamento fotográfico anexo.” (cfr. cit. doc. n.º 1).
Por outro lado, a planta, que constitui o anexo II ao alvará de loteamento dos autos (doc. 4 da p.i.), foi elaborada em fevereiro de 2017 e junta ao processo de alteração do alvará de loteamento dos autos, nela figurando a existência de um caminho com 2 metros de largura entre o muro do lote 4, propriedade da Requerente, e o lote 3, propriedade dos Requeridos. Assim, estes últimos sabiam, necessariamente, quando apresentaram o projeto de construção da sua moradia no seu lote, da existência desse caminho com 2m de largura, como fazendo parte do domínio público. Aliás, a Câmara nunca aprovaria a construção se não fosse contemplado no respetivo projeto esse caminho, com uma largura de 2 metros, para permitir o acesso às tubagens de esgoto e das águas pluviais.
Portanto, a obra dos Requeridos ocupa o terreno cedido à Câmara, porque esse caminho tinha 2 metros de largura (cfr. docs. 4 e 6 do “Requerimento de 12-03-2025 – Ref.ª n.º 27500791 - p.e.), sendo o mesmo aí descrito nos seguintes termos: “acesso pedonal terá uma plataforma de 2.00 m constituída por uma faixa central de 1.0 m, prolongada para um e outro lado por duas valetas com 0,50 m de largura”.
Realça ainda que a testemunha JG, contratado pelos Requeridos como fiscal da sua obra, no seu depoimento, reconheceu que escavaram mesmo até ao limite do tubo, embora deixando-o fora do lote 3, como até resulta das fotografias por si juntas com a oposição (docs. n.º 5, 6 e 15) e, por isso, não respeitaram a distância à faixa central, nomeadamente os 0,50m laterais que deveriam ter sido deixados precisamente para assegurar que, em caso de necessidade, os técnicos do SMAS possam aceder às condutas das redes das águas residuais e assim invadiram o terreno cedido à Câmara, extravasando os limites do seu lote. Acresce que, desse depoimento também resultou que passaram a faltar 1,20m de largura nessa faixa de terreno. O que só se pode justificar com a ocupação resultante da obra levada a cabo pelos Requeridos no seu lote.
Defende ainda a Recorrente que não poderiam ter sido desconsideradas as declarações de parte de FM e o depoimento da testemunha AF, sendo que a testemunha JG nada disse que pudesse fundamentar a prova dos factos ora em apreço, assentando a decisão recorrida, apenas e unicamente, no depoimento da testemunha SJ, que foi o topógrafo que elaborou o levantamento topográfico junto como doc. nº 20 com a oposição, sem que o tribunal se tenha pronunciado sobre a realização de novo levantamento topográfico que havia sido requerido por ambas as partes. Meio de prova esse que se revelou tanto mais relevante, porquanto a testemunha SJ acabou por admitir ter desconsiderado a necessidade de salvaguardar a existência do caminho, que estava previsto no alvará de loteamento, referindo que o loteamento que estava “mal feito”.
Aproveitou ainda a Recorrente para sustentar que a sentença especulou com o facto de uma tampa de esgoto se encontrar metade dentro dos limites do lote da Requerente e a outra metade na área do caminho em causa nos autos, para admitir que o ‘suposto caminho’ poderia ter outra implantação e que poderia ser a Requerente a extravasar a sua área. Ora, a seu ver, a prova só permite concluir que foram os Requeridos quem construiu até às condutas de esgotos e águas pluviais, quando deviam ter deixado um metro ao centro do caminho e mais uma faixa lateral de 0,50 m de distância aos limites do seu lote.
Também quanto ao facto de existirem postes de eletricidade no caminho, entende que não se poderia concluir que houve erro dos serviços de eletricidade, pois tudo indica, pelas regras da experiência e do senso comum, que se aí estavam é porque se trata de um caminho público.
Por isso defende a eliminação dos factos 9 e 11, devendo a matéria da al. a) dos factos não provados passar a figurar como factualidade provada, porque os requeridos ocuparam indevidamente 1,20m do caminho pedonal em causa nos autos.
Os Recorridos, por seu turno, sustentam a correção do julgamento desses factos, tendo em atenção, desde logo, a “Assentada” da inspeção judicial ao local, donde decorre não ter sido possível observar a existência de uma “calçada efetiva” junto ao muro dos lotes das partes, mas apenas no espaço do muro delimitador do lote imediatamente seguinte.
Por outro lado, dos levantamentos topográficos (cfr. doc. 20 da oposição e o junto em audiência pela testemunha SJ - cfr. “Ata” de 18-06-2025 – Ref.ª n.º 158250679 - p.e.), cujas medições foram objeto de apreciação pelos serviços técnicos do Município de Cascais, permitiram a aprovação do projeto de arquitetura dos Recorridos, permitem concluir que as áreas, ocupadas pela construção projetada e em execução, foram objeto de medição específica, sem que se assinale daí a ocupação de qualquer terreno integrado no domínio público municipal (cfr. doc. 21 da oposição), concluindo-se que a construção executada no lote 3 está implantada e contém-se dentro dos limites de profundidade e largura estabelecidos no alvará de loteamento aplicável e respetivo aditamento, não ocupando qualquer área destinada ao arruamento (cfr. doc.s 1, 2, 3, 18, 19, 20, 21 e 22 da oposição). O que é confirmado pelos depoimentos das testemunhas JG e SJ.
Por outro lado ainda, a existência do espaço pavimentado com dois metros, alegadamente ocupados em 1,20 metros, não resulta de qualquer registo fotográfico histórico publicamente disponível ou dos vídeos e documentos juntos, tendo apenas sido referidos pelas desacreditadas testemunhas FM e AM.
A tudo acresce que a obra realizada não impede a circulação, ou o acesso, do lote 4 à Avenida … e ao limite Poente desse lote 4, pois mantém-se inalterado o acesso através da escadaria, resultando da sentença que é evidente que ali não existe qualquer caminho, por existir uma palmeira implantada, imediatamente à direita do fim da escada, que obstaculiza a passagem.
Quanto ao facto de a obra ter sido embargada pela Câmara Municipal, entendem os Recorridos que se trata de facto irrelevante, pois esse ato administrativo caducou e não produziu quaisquer efeitos jurídicos desde 4 de maio de 2025 (cfr. Art. 104.º do RJUE, aprovado pelo DL 555/99, de 16 de Dezembro), tendo inclusivamente sido objeto de oportuna impugnação judicial pelos Recorridos em 21 de abril de 2025, como a própria Recorrente demonstrou na sua petição inicial.
Apreciando, temos de reconhecer que o depoimento da testemunha SJ, topógrafo contratado para proceder aos levantamentos topográficos que se mostram juntos aos autos como doc. n.º 20 com a oposição e na audiência de julgamento de 18 de junho de 2025, demarcando a área de implantação do lote de terreno dos Requeridos, foi particularmente impressionante pela sua segurança, experiência profissional e evidentes conhecimentos técnicos revelados.
Dele resulta que o projeto de loteamento assentava apenas num levantamento cartográfico e não no levantamento topográfico feito no local (cfr. gravação aos minutos 5:40 a 6:21), o que depois tem como consequência que na prática possa faltar espaço na implantação dos lotes nele previstos (cfr. gravação até ao minuto 11:09). Em todo caso, depois de verificar as coordenadas oficiais de georreferenciação, que são reconhecidas por todos (ETRS99), conseguiu delimitar as estremas do lote 3, verificando que o mesmo tinha espaço para a sua implantação naquele local, atestando a demarcação antes do início da obra e confirmando, posteriormente à sua execução no local, que esses limites haviam sido respeitados (cfr. gravação aos minutos 13:39 a 24:20).
Foi esta testemunha que veio a concluir, de acordo com as medições que fez, que o lote 4 (da Requerente), tem uma área de ocupação que excede a prevista no loteamento e que foi esse lote que cresceu para o caminho em discussão nesta ação (cfr. gravação aos minutos 31:41 e 40:25). Isto sem prejuízo de existirem erros de base logo no levantamento cartográfico em que terá assentado o loteamento.
Perante a veemência deste depoimento, é muito difícil suportar, só com base na prova documental, nomeadamente na planta que instruiu o projeto de loteamento do terreno em causa nos autos, a conclusão de que foi a obra dos Requeridos que objetivamente reduziu a largura do caminho em menção, ganhando alguma relevância a circunstância de, objetivamente, o lote 4, que pertence à Requerente, estar implantado sobre metade duma tampa de esgoto, pois tal acentua a ideia de que pode existir uma deficiente implantação desse lote, com ocupação indevida de área que não lhe deveria pertencer.
Por outro lado, as evidências da existência efetiva de um “caminho público”, pavimentado, com infraestruturas públicas e com determinada configuração e implantação local parecem assentar em realidades muito esquivas e imprecisas.
Por exemplo, como resultou da inspeção judicial ao local, os vestígios da existência de pavimentação com calçada só foram identificados em zona que fica muito para lá da dos lotes 3 e 4. O candeeiro de iluminação pública, que existia no local, foi removido a pedido dos Requeridos, porque estava dentro da área de implantação do lote 3, o que parece que foi prontamente feito pelos serviços públicos competentes (E-Redes), aparentemente, sem discussão, aceitando que assim era, conforme foi relatado pela testemunha JG (cfr. gravação aos minutos 18:57 a 20:51). Todas as tubagens públicas de esgotos e escoamento de águas pluviais passam fora da área de implantação atual do lote 3, conforme foi confirmado pelas testemunhas JG e SJ. A vegetação existente no local não permitia concluir que existia efetivamente um caminho, mesmo que ele estivesse previsto no projeto de loteamento, tal como decorre da inspeção ao local, das fotografias e vídeo juntos aos autos e dos depoimentos de SJ e JG, sendo que essa realidade (por referência à atualidade) não foi verdadeiramente posta em causa pelos depoimentos, quer de FM, quer de AF, que se limitaram a responsabilizar a Câmara Municipal pelo estado atual a que chegou esse caminho. Por outras palavras, não é clara a implantação “de facto” que esse caminho previsto no projeto de loteamento efetivamente tinha, se é que alguma vez a teve, fisicamente, no local.
Por outro lado ainda, é provável, em função da prova testemunhal, principalmente assente no rigor técnico do depoimento da testemunha SJ e nos levantamentos topográficos por si realizados (cfr. “Documento junto em audiência” de 18-06-2025 – Ref.ª n.º 158250679 - p.e.; e Doc. n.º 20 da oposição, junto com “Outro” em 17-11-2024 - Ref.ª n.º 26753842 - p.e.), que o lote 3 não tenha ocupado o caminho de 2 metros de largura, com a configuração e implantação que deveria ter, caso tivesse sido feito, no devido tempo, o levantamento topográfico de toda a área de implantação do loteamento aqui em causa.
Ainda assim, não podemos deixar de pôr em evidência que o depoimento desta testemunha também evidencia algumas fragilidades, por ser claro que a sua preocupação inicial, confessadamente, nada tinha a ver com a localização do caminho, mas sim com a verificação de que havia espaço físico no local para implantar o lote 3 no terreno disponível (cfr. gravação aos minutos 3:20 a 5:10). Sendo que desse depoimento também resultou que não foi feito um efetivo levantamento topográfico do lote 4, que pertence à Requerente (cfr. gravação aos minutos 21:14 a 22:00). O que nos permite pôr em dúvida se só o lote 4, pertencente à Requerente, ocupou indevidamente o caminho, com a implantação que deveria ter sido estabelecida na sequência do projeto de loteamento.
É que, uma coisa é certa: neste momento, o caminho pedonal previsto, que deveria ter 2 metros de largura, tem agora apenas 80cm. Ora, isso só pode ser explicado, ou pelo facto de o lote 4 ter ocupado 1,20m desse caminho; ou pelo facto de ser o lote 3 que ocupou indevidamente esses 1,20m; ou então ambos os lotes ocuparam indevidamente uma parte desse caminho por forma a reduzir a sua largura a 80cm.
Perante esta evidência indiscutível, a ter por certo que a implantação do lote 3 está correta, como se indicia, daí não resulta necessariamente a conclusão de que a implantação do lote 4 o não esteja. É que a testemunha SJ admitiu claramente que o problema possa estar no levantamento cartográfico que esteve na base da elaboração da planta de suporte ao projeto de loteamento. Pelo que, assim sendo, há que afastar a dúvida, razoável e subsistente, de que a planta que serviu de base ao projeto de loteamento está incorreta e que o caminho aí delineado, que deveria comprovadamente ter 2 metros de largura, só possa hoje ser configurado de modo tal que objetivamente fique parcialmente consumido pelo espaço ocupado pelos lotes 3 e 4.
É que a mera possibilidade de o lote 3 poder contribuir para a redução, ainda que parcial, mas efetiva, da largura de 2 metros do caminho público que deveria existir entre os dois lotes em litígio, é suficiente para que a providência cautelar possa ser deferida, ainda que a implantação do lote 4 também possa estar a contribuir para a inobservância dessa largura, que serviu de condição imposta pela Câmara Municipal para o loteamento.
Evidentemente, que não está excluída a possibilidade de o projeto de loteamento ser objeto de alterações que venham a ser aceitas pela edilidade, nomeadamente em termos retificação da largura do caminho que está em causa nesta ação. Mas essa possibilidade não está agora em discussão. Por isso, ambas as partes só poderiam construir com base nas premissas desse projeto de loteamento, que eram por si conhecidas, encontrando-se ambas obrigadas a respeitar a existência de um caminho, que deveria ter 2 metros de largura entre os dois lotes, o que, objetivamente, não será observado se os Requeridos concluírem a obra nos termos previstos.
Esta dúvida poderia perfeitamente ser superada caso tivesse sido determinado o levantamento topográfico integral de todos os lotes integrados no loteamento em causa (que apenas compreende 6 lotes), por forma a verificar a efetiva implantação de cada um deles e do caminho de 2 metros de largura, em conformidade com o previsto no projeto de loteamento, por forma a evidenciar, especificamente, se é possível a existência de um caminho com 2 metros de largura entre os lotes 3 e 4 e ainda se estes lotes (3 e 4) podem, ou não, estar implantados sobre a área desse caminho e em que medida.
É certo que, como logo fizemos menção no início, estando no âmbito duma providência cautelar, não se exige o nível de rigor e certeza na apreciação indiciária dos pressupostos de facto do direito pretendido fazer valer. Mas, este procedimento cautelar tem as suas especificidades próprias, porque o direito visado salvaguardar, até ser decidida a ação principal, assenta em pressupostos de facto que impõem algum rigor na sua apreciação, justificando-se um particular cuidado nesse processo.
No caso concreto, efetivamente, havia sido logo requerida a produção de prova pericial pelos Requeridos que tinha genericamente por objetivo o propósito de esclarecer esta factualidade.
É verdade que o requerimento pelo qual a Requerente da providência se pretendia pronunciar sobre esse concreto meios de prova, foi ordenado desentranhar, por decisão que objetivamente se tem por transitada em julgado.
Também é verdade que o Tribunal a quo não se pronunciou sobre o requerimento de prova dos Requeridos, no que estritamente se refere à prova pericial que consistia no levantamento topográfico dos lotes em questão, sendo que a discussão da causa em 1.ª instância encerrou, sem que as partes tivessem oportunamente suscitado essa nulidade por omissão (cfr. Art. 195.º e 199.º do C.P.C.), tendo-se assim precludido o direito de reclamação e sanado o vício verificado (vide pontos 1 e 2 do presente acórdão).
No entanto, mesmo não tendo o Tribunal a quo determinado a realização da perícia, nem se pronunciado sobre o requerimento probatório dos Requeridos, nada obsta que o Tribunal da Relação o possa agora fazer, oficiosamente, por serem razoáveis e fundadas as dúvidas sobre a prova realizada (cfr. Art. 662.º n.º 2 al. b) do C.P.C.).
Não vemos como, só com a prova produzida, e em face das dúvidas que a mesma nos suscita, se possa concluir de forma tão perentória, como foi feito pelo Tribunal a quo, que as obras do lote 3 seguramente não ocuparam, pelo menos em parte, 1,20 metros dos 2 metros de caminho que deveria existir entre os lotes 3 e 4.
O meio de prova adequado e decisivo para o apuramento dessa concreta factualidade, que implica com o julgamento dos factos provados em 9 e 11 e com a alínea a) dos factos não provados, é efetivamente o levantamento topográfico de todo o terreno do prédio objeto do projeto de loteamento, com a específica determinação da exata implantação devida de cada um dos lotes e, bem assim, do caminho de 2 metros de largura previsto existir nesse local.
Tal importa, necessariamente, na anulação do julgamento da matéria de facto relativa aos pontos 9 e 11 dos factos provados no despacho final aqui recorrido e, bem assim, da alínea a) dos factos não provados (cfr. Art. 662.º n.º 2 al. c) do C.P.C.), tendo em vista a produção desse novo meio de prova que se revela impreterível em face dos concretos termos da causa e das dúvidas que a prova produzida suscita (cfr. Art. 662.º n.º 3 al. a) do C.P.C.).
Julgamos que é essa a decisão que importa tomar no caso concreto, com vista ao devido apuramento da factualidade controvertida.
Sem prejuízo, impõe-se ainda esgotar a apreciação dos demais fundamentos da impugnação da matéria de facto.

         4.5. Dos factos provados no ponto 12.
A Recorrente põe de seguida em causa o julgamento do ponto 12 dos factos provados, cuja redação deveria ser alterada por forma a ficar apenas provado que: «Aquando do início da obra em causa, os Requeridos contactaram os serviços da E-redes e foi removido um poste de eletricidade que se encontrava no terreno cedido à Câmara Municipal de Cascais».
Nesse ponto 12 resulta provado que os Requeridos só removeram os postes de iluminação, após contactarem a “E-Redes” e depois de verificarem que um deles estava colocado dentro dos limites da área de implantação do lote 3 e o outro na área do lote 2.
A Recorrente chama a atenção para a circunstância do dado por provado ter sido alegado no artigo 46º da oposição, tendo por base o documentos n.º 24, depois completado pelo doc. n.º 4 do requerimento de 17-11-2024 (Ref.ª n.º 26753843 - p.e.), que consta apenas de um email, de 21 de agosto de 2024, da E-Redes, a referir que foi agendada uma visita técnica, sem especificar as razões dessa deslocação.
Reconhece que a sentença assentou a sua convicção do depoimento da testemunha JG, por este ter sido perentório ao explicar que contactaram a E-Redes no sentido de vir levantar o candeeiro existente dentro da propriedade dos requeridos e que uns dias mais tarde veio uma equipa para o efeito, sendo que os operários da obra auxiliaram aquela equipa na tarefa. Mas entende que, desse depoimento, também não resulta qualquer referência às razões pelas quais foi feito o levantamento do poste elétrico. E, seja como for, sustenta a Recorrente que não existe maneira de concluir que os postes de eletricidade estavam “indevidamente colocados” onde sempre estiveram desde a aprovação do loteamento, pois a testemunha em menção estava errada quanto à localização e limites do terreno cedido à Câmara e, consequentemente, quanto à localização dos postes de eletricidade como estando dentro do lote 3.
Entende ainda que as fotografias n.º 3 e 4 juntas com o doc. n.º 15 da Oposição demonstram que o poste em questão se encontrava no caminho que foi cedido à Câmara Municipal.
Realça ainda que a testemunha SJ (topógrafo) nada disse sobre as razões que levaram à retirada dos postes, e FM asseverou que viu os candeeiros a serem retirados do mesmo caminho, pelos trabalhadores dos Requeridos.
Os Requeridos, da sua parte, vieram invocar que o acerto da decisão resulta da análise do doc. n.º 24, conjugado com os depoimentos prestados pela testemunha JG que referiu que se aperceberam claramente que o poste estava dentro do lote 3, comunicando esse facto à “E-Redes” (cfr. gravação aos minutos 19:46 a 20:30), e ainda pela testemunha SJ, que referiu a existência de erros anteriores e a que a EDP põe os postes onde quer, sem qualquer rigor (cfr. gravação aos minutos 13:58 a 16:18). A isso acresce que a “E-Redes” retirou esses postes, porque certamente reconheceu que estavam mal implantados.
Apreciando, não podemos acompanhar a valoração da prova feita pela Recorrente, porque o que resultou de forma inequívoca da prova produzida foi que os postes de iluminação foram retirados do local, porque, no mínimo, a testemunha JG, Engenheiro Civil e  fiscal da obra dos Requeridos, apercebeu-se, depois do levantamento topográfico feito pela testemunha SJ, relativamente à implantação do lote 3, que pelo menos um dos postes de iluminação pública ali existentes estava sito na área de implantação efetiva do lote 3.
É claríssimo do depoimento da testemunha JG que a “E-Redes” foi contactada para tomar conhecimento desse facto, o que terá justificado a visita técnica mencionada no email junto como doc. n.º 24 da oposição (cfr. “Oficio da E-Redes [Carta]” junta com o Requerimento de 17-11-2024 – Ref.ª n.º 26753843 - p.e.).
Também é claro desse depoimento que a “E-Redes” terá aceitado como verdadeiro que os postes estavam mal implantados e, por isso, aceitou que fosse feita a sua remoção do local, sem qualquer discussão.
A correção da implantação do lote 3 foi confirmada pela testemunha SJ que, nessa parte, foi muito segura e com evidentes conhecimentos técnicos para o certificar e atestar. Sendo também claramente com base nesse levantamento topográfico e nas marcações dos limites físicos da implantação do lote 3, tal como feitos pela testemunha SJ, que a testemunha JG constatou que pelo menos um dos candeeiros de iluminação pública ali existentes estava dentro da área do lote 3.
A localização exata do “caminho” cedido à Câmara Municipal é algo que, pelas razões que já fomos expondo, se mostra obscurecido, por existirem, por um lado, evidências de que a planta do projeto de loteamento possa estar incorreta, por assentar apenas numa implantação meramente cartográfica, e por outro, porque no local não existe uma realidade objetiva e consolidada sobre a sua localização efetiva, como área de facto cedida.
Julgamos assim que motivos não existem para alterar a redação do ponto 12 dos factos provados.

4.6. Dos factos omissos alegados em 5.º e 17.º do requerimento inicial.
A Recorrente entende ainda que a sentença é omissa relativamente a factualidade por si alegada que deveria ser aditada aos factos provados, começando por sugerir o aditamento de um novo ponto “12”, que incluiria matéria dos artigos 5.º e 17.º do requerimento inicial, que a seu ver nem sequer teria sido impugnada pelos Requeridos e decorreria dos documentos n.º 3 e 4 da oposição e documentos n.º 4 e 5 do requerimento inicial.
Entende assim que deveria ser dado por provado que: «O Requerido, aquando da submissão do seu pedido de alteração do alvará de loteamento, juntou ao processo que decorreu na Câmara Municipal de Cascais, como anexos, o alvará nº …, bem como a planta de loteamento assinalando o caminho de 2 m de largura, conforme documentos 3 e 4 juntos com a Oposição».
Os Recorridos referem que impugnaram esses factos no artigo 35.º da oposição e sobre eles não foi produzida qualquer prova em audiência, sendo que os mesmos nem sequer correspondem ao alegado pela Requerente. A tudo acresce que o alegado decorre do que consta do doc. 21, junto com a oposição (que se refere a informação dos serviços da CMC no âmbito da apreciação do projeto da construção do lote dos Recorridos, reconhecendo a inexistência da ocupação de qualquer terreno integrado no domínio público municipal), bem como do teor dos doc.s n.º 1, 2, 3, 18, 19, 20 e 22 da oposição.
Apreciando, a Requerente alegou efetivamente nos artigos 5.º e 17.º que o Requerido, para instruir um pedido de alteração do projeto junto da Câmara Municipal de Cascais, juntou como anexo, o alvará …, com a planta síntese do mesmo.
Os Requeridos aceitam, no artigo 35.º da oposição, o alegado em 5.º do requerimento inicial, mas impugnam, por falsidade ou inexatidão, o alegado em 17.º da oposição.
Ora, a única diferença entre o alegado no artigo 5.º e 17.º do requerimento inicial é que no final deste último se faz menção à existência na planta de loteamento de um caminho de 2 metros de largura.
Por outro lado, o sentido da impugnação feita pelos Requeridos na oposição não se refere ao facto de na planta do projeto de loteamento não estivesse efetivamente assinalado um caminho. O que dizem a esse propósito, no artigo 35.º da oposição, é que: «a) Da planta anexa ao aditamento ao alvará de loteamento, de 2018, como já decorria da planta anexa ao alvará de loteamento nº. …, de 1998.11.17, resulta apenas que naquelas peças desenhadas foi prevista a execução de um caminho pedonal pavimentado entre os lotes 3, 4 e 5». Acrescentando depois que: «b) As referidas plantas integram simples projetos, não demonstrando ou provando minimamente que o caminho pavimentado com blocos de granito, com a localização e características indicadas naquela planta, existisse recentemente ou alguma vez tenha existido de facto».
Mas, assim sendo, não negam que o Requerido submeteu um projeto de alteração do alvará de loteamento; nem que esse processo correu junto da Câmara Municipal de Cascais; nem que a instruir esse processo anexaram o alvará n.º …; nem que com ele ia junta a planta de loteamento, na qual estava desenhado um caminho.
Temos de dizer que essa planta está desenhada à escala e, em princípio, deveria ser rigorosa nas suas medidas, mesmo que, de facto, dela não se mostra especificado que o caminho pedonal tinha 2 metros de largura. É assim possível chegar a essa conclusão através da ampliação do desenho para a escala real, embora o documento n.º 4 junto com a petição inicial, só por si, não especifique essa medida em nenhuma anotação ou legenda anexa.
Em todo o caso, os Requeridos foram devidamente assessorados  por especialistas técnicos para apresentarem os projetos de construção na Câmara Municipal de Cascais e de alteração ao projeto de loteamento e, por isso, não poderiam deixar de saber que deveria existir um caminho entre o lote 3 e o lote 4, podendo perfeitamente saber que esse caminho teria de ter 2 metros de largura, seja pela planta junta ao projeto de loteamento, seja pela consulta devida ao processo de loteamento, do qual certamente constaria o documentação relativa ao processo de alteração de pormenor ao P.U.C.S. (v.g. Doc. n.º 4 junto com o Requerimento de 12 de março de 2025 - Cfr. “Outro” de 12-03-2025 – Ref.ª n.º 27500791 - p.e.), onde é mencionado que nesse projeto de loteamento se estabelecia que esse caminho deveria ter 2 metros de largura, como já vimos.
Portanto, os Requeridos podem pôr em causa se o caminho alguma vez foi executado efetivamente no local, mas não poderiam ignorar que, formalmente, quando entregaram o pedido de alteração do alvará de loteamento – o que, para mais, é um facto pessoal não foi impugnado –, instruíram esse pedido com o Alvará n.º … e com a planta a ele anexa, onde estava assinalado um caminho que deveria ter 2 metros de largura. Ora é isto, e somente isto, que a Recorrente pretende ver dar por provado e com toda a razão, porque os Requeridos, aqui Recorridos, sempre aceitaram isso como verdadeiro.
Julgamos por isso aditar aos factos provados um ponto 10-A com a seguinte redação:
«10-A O Requerido, aquando da submissão do seu pedido de alteração do alvará de loteamento, juntou ao processo que decorreu na Câmara Municipal de Cascais, como anexos, o alvará nº …, bem como a planta de loteamento assinalando um caminho de 2 m de largura, conforme documentos 3 e 4 juntos com a Oposição».
4.7. Dos factos omissos alegados em 7.º do requerimento inicial.
A Recorrente pretende ainda aditar o por si alegado no artigo 7.º do requerimento inicial, passando a estar provado, sob o novo n.º 13, que: «O indicado caminho, com acesso por uma escada com 2 m de largura, que se inicia na Av. …, a norte do lote do Requerido, conforme previsto no respetivo alvará de loteamento, tem também 2 metros de largura e estava revestido de cubos de calcário/calçada, servindo os 6 lotes que compõem o loteamento, sendo o mesmo resultado da cedência à Câmara Municipal de Cascais, pelo loteador, para integração no domínio público de 151,95 m2 de terreno destinado a arruamentos».
Sustenta essa pretensão na circunstância de os Requeridos não terem impugnado que o caminho tinha acesso por uma escada com 2 metros de largura; nos documentos n.ºs 3 e 4 juntos com a Oposição; documentos n.ºs 4 a 6 juntos com o requerimento de 12-03-2025 (Ref.ª n.º 27500791 - p.e.); na “Assentada” resultante da inspeção judicial ao local; nos documentos n.º 3 e 4 juntos com o requerimento inicial; no depoimento da testemunha JG (aos minutos 23:24.1 a 25:38.0 e 25:38 a 26:11); no documento n.º 6 junto com o requerimento de 12-03-2025 (Ref.ª n.º 27500791 - p.e.); e nas fotografias n.º 5 e 6, juntas com o documento n.º 15 da Oposição, conjugados com o Art. 16.º do Dec.Lei n.º 448/91, do Art. 44.º do RJUE e do Art. 17.º do Dec.Lei n.º 280/07.
Os Recorridos entendem que esses factos não podem ser dados por assentes por contradizerem matéria de facto provada ponto nos pontos 5, 8, 9, 11 e 13.
Apreciando, em primeiro lugar, temos de dizer que não parece que haja qualquer discussão sobre a existência duma escadaria que dá acesso ao tal caminho, como já fizemos notar. Isso é patente das fotografias do local juntas aos autos e da inspeção judicial ao local, aparecendo a mesma desenhada na planta anexa ao projeto de loteamento e nos levantamentos topográficos feitas pela testemunha SJ, que se mostram juntos aos autos (doc. n.º 20 da oposição e o junto em audiência, já atrás referenciados).
Também é claro dessa mesma prova que a referida escada tem início da Av.ª … e segue até ao local onde deveria ter sido feito e implantado o caminho em discussão nesta ação.
No entanto, todos esses pormenores já constam da nova redação do ponto 5 dos factos provados (cfr. ponto 4.2. do presente acórdão).
O que não se provou é que, fisicamente, tivesse sido efetivamente construído um caminho com 2 metros de largura, como se pretende aqui dar por provado, pelas razões que já abundantemente foram explicitadas.
A única coisa que é certa é que estava previsto no projeto de loteamento que, entre os lotes 3 e 4, deveria existir um caminho com 2 metros de largura, o qual se estenderia, com a mesma largura, a um espaço que deveria existir entre os lotes 2 e 5, tal como desenhado na planta anexa ao projeto de loteamento (cfr. doc. n.º 4 do requerimento inicial: “planta síntese alvará loteamento n.º … [Planta]” de 18-10-2024 – Ref.ª n.º 26552628 - p.e.). Sendo também verdade que esse caminho, de acordo com essa planta, deveria servir os 6 lotes que compunham esse loteamento.
Quanto à cedência pelo loteador de 151,95 m2 de terreno à Câmara Municipal de Cascais para integração no domínio público, destinados a arruamentos, isso decorre do alvará de loteamento (cfr. doc. n.º 3 do requerimento inicial: “alvará loteamento n.º … e aditamento  [Outro]” de 18-10-2024 – Ref.ª n.º 26552628 - p.e.). Mas também foi confirmado pela testemunha AF, que era acionista da sociedade que promoveu esse loteamento, que tiveram de ceder terrenos à Câmara Municipal para poder ser aprovado o projeto de loteamento. Em todo o caso, isso também já é mencionado no ponto 4 dos factos provados, constituindo uma duplicação desnecessária.
Quanto à pavimentação desse caminho, já nos debruçámos sobre esses factos ao apreciarmos a impugnação aos factos 4, 5 e 8, nada havendo a acrescentar ao que aí já deixámos consignado, refletindo a redação desses factos a prova que efetivamente foi produzida sobre essa matéria, nada mais havendo a acrescentar.
Assim, o único facto que pode ser aditado, com algum interesse, é que o projetado caminho, de 2 metros de largura, previsto no projeto de loteamento, servia os 6 lotes que compunham esse mesmo loteamento.
Em conformidade, julgamos aditar aos factos provados um novo ponto “5-A” com a seguinte redação:
«5-A O projetado caminho, que deveria ter 2 m de largura de acordo com a planta do alvará de loteamento, deveria servir os 6 lotes que compunham esse loteamento».
4.8. Dos factos omissos alegados em 10.º e 11.º do requerimento inicial.
De seguida a Recorrente pretende que seja aditado aos factos provados o que por si foi alegado nos artigos 10.º e 11.º do requerimento inicial, por forma a que fique provado um novo ponto 14, com a seguinte redação: «Sobre o anexo em betão armado que também ocupa o subsolo do caminho, os Requeridos preparavam-se para construir um muro, integrando a toda a largura do seu lote mais 1,20 m retirados do caminho municipal/terreno integrado no domínio público da urbanização, desta forma impedindo a circulação e acesso aos restantes lotes da urbanização, designadamente ao da ora Requerente, para efetuar quaisquer trabalhos que se mostrem necessários na zona que integra e confronta com o indicado caminho, que ficou reduzido a 80 cm de largura».
No entanto, esta matéria claramente que já está compreendida nos factos provados nos pontos nos pontos 5, 8, 9, 11 e 13, como os Recorridos logo fizeram notar, mesmo sendo certo que, pelas razões que já foram expedidas deverá ser anulado o julgamento quanto aos pontos 9 e 11.
Julgamos, por isso, que não existe omissão na matéria de facto, improcedendo nesta parte a impugnação.
4.9. Dos factos omissos alegados em 15.º do requerimento inicial.
Finalmente, pretende a Recorrente que seja aditado um novo ponto 15, com a matéria por si alegada no artigo 15.º do requerimento inicial, por forma a que fique provado que: «Pelas 9 horas, de dia 14 de outubro de 2024, a mandatária da Requerente, acompanhada da legal representante desta e da testemunha, AM, na ausência do Dono da Obra, notificou verbal e formalmente o diretor de obra, na presença do responsável pela fiscalização da obra, Eng. JG, que acompanhava o indicado Diretor, do embargo extrajudicial dos trabalhos que estavam a ser executados no indicado caminho pedonal/terreno integrado no domínio público da urbanização».
Suporta a prova desses factos apenas nos documentos n.º 9 e 10 do requerimento inicial.
Os Recorridos vieram contrapor que impugnaram esses factos nos artigos 64º, 70º e 71º da oposição, sendo que essa matéria não foi objeto de qualquer prova na audiência final e apenas seria suscetível de ser relevante para efeito da decisão da questão da intempestividade do embargo extrajudicial da obra em causa, sendo que essa questão já foi apreciada por despacho proferido em audiência final (cfr. “Ata” de 29-05-2025 – Ref.ª n.º 158250679 - p.e.), constituindo assim a sua integração nos factos provados um ato inútil.
Apreciando, o facto em menção não é inútil, independentemente da questão da tempestividade do embargo já ter sido decidida, considerando que o objeto desta providência cautelar é a ratificação de embargos extrajudicial de obra nova e os documentos em causa materializam o sentido da alegada comunicação verbal de embargo.
Por outro lado, o artigo 64.º da oposição só impugna a parte final do artigo 15.º do requerimento inicial, percebendo-se do seu contexto que, não foi impugnado que «pelas 9 horas, de dia 14 de outubro, a referida mandatária acompanhada da legal representante da Requerente e da testemunha, AM, na ausência do Dono da Obra, notificou verbal e formalmente o diretor de obra, na presença do responsável pela fiscalização da obra, Eng. JG, que acompanhava o indicado Diretor, do embargo extrajudicial dos trabalhos que estavam a ser executados». De facto, só é impugnada a conclusão de que esses trabalhos incidiam sobre o «indicado caminho pedonal interior da urbanização».
Verificamos ainda que no artigo 70.º da oposição acaba por se confirmar essa interpelação, embora se identifique o Diretor de obra como sendo o Eng.º DG, que foi notificado do embargo, argumentando-se que então foi dito que os trabalhos incidiam área integrada no domínio público municipal, numa zona onde estaria um caminho pavimentado com cubos de granito, que designou como sendo um “passeio”. Sendo que no artigo 71.º da oposição é dito que não foi concretizada qual a área do referido caminho pavimentado que teria alegadamente sido ocupada, mas confirmando que tal foi feito nos precisos termos que se encontram consignados no auto que lavrou e subscreveu pelo seu próprio punho correspondente ao documento 9 do requerimento inicial.
Assim sendo, o documento junto com o requerimento inicial reflete os termos exatos do embargo, e justifica-se que seja aditado aos factos provados um novo ponto 14, com a seguinte redação:
«14. Pelas 9 horas, de dia 14 de outubro de 2024, a mandatária da Requerente, acompanhada da legal representante desta e da testemunha, AM, na ausência do Dono da Obra, notificou verbal e formalmente o diretor de obra, o Eng.º DG, na presença do responsável pela fiscalização da obra, Eng.º JG, que acompanhava o indicado Diretor, do embargo extrajudicial dos trabalhos que estavam a ser executados, referindo, nos precisos termos que se encontram consignados no auto que lavrou e subscreveu pelo seu próprio punho, que a obra do lote 3 objeto do embargo ocuparia uma área com “1,20m2 do referido passeio” e que serviria para “utilização dos 6 lotes que compõem a urbanização” (cfr. doc.s n.º 9 e 10 juntos com o requerimento inicial cujo teor se dá por integralmente reproduzido).
4.10. Do resultado final da apreciação da impugnação da matéria de facto.
Em face de tudo o que vem sido exposto, decorre que a impugnação da decisão sobre a matéria de facto procede parcialmente, devendo proceder-se às seguintes alterações:
1- (cfr. 4.2.) É alterada a redação do ponto 5, que passa a ser a seguinte:
«5. A promotora da referida operação de loteamento – a sociedade P, SA –, pelo menos em parte, pavimentou, com pedras de calçada, o caminho pedonal que corresponderá ao que se mostra representado na planta que constitui o anexo ao alvará de loteamento nº. …, de 1998.11.17, na zona situada a Norte do Lote 3, o qual permite, entre outros, o acesso ao vão em caixilharia gradeada que dá para a casa de máquinas da piscina existente no Lote 4, permitindo esse caminho também um acesso à Avenida … através duma escadaria, como resulta visível das fotografias juntas do googleearth e geocascais».
2- (cfr. 4.7.) É aditado à matéria de facto provada um novo ponto “5-A”, com a seguinte redação:
«5-A O projetado caminho, que deveria ter 2 m de largura de acordo com a planta do alvará de loteamento, deveria servir os 6 lotes que compunham esse loteamento».
3- (cfr. 4.3.) É alterada a redação do ponto 8, que passa a ter a seguinte redação:
«8. O caminho, que foi pelo menos parcialmente pavimentado com calçada, existente a Norte do lote 3, serve de acesso pedonal, entre outros, ao vão com caixilharia de gradeamento que serve de entrada à casa das máquinas da piscina, localizada nas traseiras das edificações do lote 4, propriedade da ora requerente».
4- (cfr. 4.6.) É aditado à matéria de facto provada um novo ponto “10-A” com a seguinte redação:
«10-A O Requerido, aquando da submissão do seu pedido de alteração do alvará de loteamento, juntou ao processo que decorreu na Câmara Municipal de Cascais, como anexos, o alvará nº …, bem como a planta de loteamento assinalando um caminho de 2 m de largura, conforme documentos 3 e 4 juntos com a Oposição».
5- (cfr. 4.9.) É aditado à matéria de facto provada um novo ponto 14, com a seguinte redação:
«14. Pelas 9 horas, de dia 14 de outubro de 2024, a mandatária da Requerente, acompanhada da legal representante desta e da testemunha, AM, na ausência do Dono da Obra, notificou verbal e formalmente o diretor de obra, o Eng.º DG, na presença do responsável pela fiscalização da obra, Eng.º JG, que acompanhava o indicado Diretor, do embargo extrajudicial dos trabalhos que estavam a ser executados, referindo, nos precisos termos que se encontram consignados no auto que lavrou e subscreveu pelo seu próprio punho, que a obra do lote 3 objeto do embargo ocuparia uma área com “1,20m2 do referido passeio” e que serviria para “utilização dos 6 lotes que compõem a urbanização” (cfr. doc.s n.º 9 e 10 juntos com o requerimento inicial cujo teor se dá por integralmente reproduzido).
Sem prejuízo destas alterações desde já ordenadas, julgamos anular o julgamento dos factos constantes dos pontos 9 e 11 dos factos provados e, bem assim, os da alínea a) dos factos não provados (cfr. 4.4. do presente acórdão), por forma a que se proceda previamente ao levantamento topográfico de todo o terreno do prédio objeto do projeto de loteamento a que os autos se reportam, com a vista à específica determinação da exata implantação devida de cada um dos 6 lotes que o compreendem e, bem assim, do caminho de 2 metros de largura previsto aí existir nesse local, de modo a que se consiga precisar se é possível a existência de um caminho com 2 metros de largura entre os lotes 3 e 4, por um lado, e 2 e 5, por outro; e ainda se estes lotes (3 e 4) podem, ou não, estar implantados sobre a área desse caminho e em que exata medida isso sucede (cfr. Art. 662.º n.º 2 al.s b) e c) e n.º 3 al. a) do C.P.C.).
4. Do mérito da providência cautelar.
Considerando que a matéria de facto ainda não se encontra estabilizada em termos definitivos, importando apurar factos essenciais de que depende o conhecimento do mérito da causa, fica prejudicada a apreciação do mérito da decisão final produzida sobre a providência cautelar.
Sem prejuízo, restará ainda referir, em termos de responsabilidade por custas do presente recurso que, por um lado, a Recorrente decaiu na parte do recurso que tinha por objeto o despacho de 21 de janeiro de 2025, mas obteve vencimento substancial na apelação que tinha por objeto o despacho final, apesar da decisão deste acórdão não pôr termo definitivo ao procedimento cautelar.
Assim sendo, julgamos que a responsabilidade tributária, no que se refere à presente apelação, deverá ser repartida, em partes iguais, por Recorrente e Recorridos (cfr. Art. 527.º n.º 1 e n.º 2 do C.P.C.).
V- Decisão:
Pelos fundamentos expostos, julgamos acordar na procedência parcial do presente recurso de apelação, nos seguintes termos:
a) Julgamos rejeitar o recurso de apelação na parte que tinha por objeto o despacho de 21 de janeiro de 2025, que ordenou o desentranhamento do requerimento da Requerente de 2 de dezembro de 2024;
b) Julgamos ainda – sem prejuízo das alterações à factualidade provada constantes do ponto 4.10. do presente acórdão, consequentes do deferimento parcial da impugnação da decisão sobre a matéria de facto – anular o julgamento dos factos provados em 9 e 11, e bem assim, os da alínea a) dos factos não provados, por dúvida fundada sobre a prova realizada e necessidade de produção de um novo meio de prova (cfr. Art. 662.º n.º 2 al. b) do C.P.C.) e, em consequência, anular o próprio despacho final que indeferiu a providência cautelar de ratificação de embargos de obra nova, por insuficiência de elementos que poderiam permitir a alteração da decisão sobre a matéria de facto (cfr. Art. 662.º n.º 2 al. c) do C.P.C.), devendo os autos ser remetidos ao tribunal a quo com vista à produção de um novo meio de prova (cfr. Art. 662.º n.º 3 al. a) do C.P.C.), que se tem por impreterível no caso, que passará pela determinação oficiosa da realização de um levantamento topográfico de todo o terreno do prédio objeto do projeto de loteamento a que os autos se reportam, com a vista à determinação da exata implantação devida de cada um dos 6 lotes que o compreendem e, bem assim, do caminho de 2 metros de largura previsto aí existir nesse local, de modo a que se consiga apurar:
1.º Se é materialmente possível existir um caminho com 2 metros de largura entre os lotes 3 e 4, por um lado, e os lotes 2 e 5, por outro, em conformidade com a implantação prevista na planta anexa ao projeto de loteamento; e
2.º Se implantação efetiva dos lotes 3 e 4 se sobrepõe à área de implantação desse caminho de 2 metros de largura e em que medida tal se verifica relativamente a cada um desses dois lotes.
- Custas pela Recorrente e pelos Recorridos na proporção de metade para cada um (cfr. Art. 527º n.º 1 e n.º 2 do C.P.C.).

Lisboa, 2 de dezembro de 2025
Carlos Oliveira
Rute Sabino Lopes
Ana Mónica Mendonça Pavão