| Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa | |||
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| Relator: | AMÉLIA ALVES RIBEIRO | ||
| Descritores: | CONTRATO DE CONCESSÃO COMERCIAL OBRIGAÇÕES INDEMNIZAÇÃO DE CLIENTELA MONTANTE DA INDEMNIZAÇÃO JUROS | ||
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| Nº do Documento: | RL | ||
| Data do Acordão: | 11/05/2019 | ||
| Votação: | UNANIMIDADE | ||
| Texto Integral: | S | ||
| Texto Parcial: | N | ||
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| Meio Processual: | APELAÇÃO | ||
| Decisão: | PARCIALMENTE PROCEDENTE | ||
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| Sumário: | I. A diversidade de espécies negociais abrangidas pela designação de contratos de distribuição conduz a que não lhes seja aplicável um regime jurídico uniforme, tudo dependendo do conteúdo específico das obrigações assumidas pelas partes e que, no seu conjunto, integram a função económico-social do contrato. II. Neste domínio, apenas o contrato de agência está tipificado na lei, não obstante estarmos em presença de contratos socialmente típicos. III. É entendimento jurisprudencial e doutrinário que o núcleo essencial do contrato de concessão comercial traduz-se, por um lado, na compra e venda dos produtos destinados a revenda pelo concessionário – entidade independente e autónoma - e, por outro, na obrigação deste promover a venda desses mesmos produtos junto de terceiros, sendo, à partida, responsável pelos riscos da comercialização. IV. É nesse contexto negocial que se desenrola a vinculação típica do contrato-quadro que põe em relação e dá corpo aos interesses do fornecedor em escoar os seus produtos e ao distribuidor que, independente e autónomo, é responsável pelos riscos da comercialização. V. Com essas obrigações típicas podem coexistir outras obrigações que visam, em diferentes graus de intensidade, a integração do distribuidor na rede comercial do fornecedor, como acontece, por um lado, com aquelas que se prendem com a definição dos objectivos e prossecução da política comercial do concedente (expressas através da fixação de: quotas de compra e revenda; directrizes sobre publicidade; condições de exposição dos produtos e assistência pós-venda) e, por outro, com as obrigações de informação e de apoio ao concessionário, a cargo do concedente, necessárias à organização e promoção das vendas. VI. A indemnização de clientela obedece ao cálculo segundo os critérios postos no artigo 34º do contrato de agência, o qual remete para a fixação equitativa, sem poder exceder um valor equivalente a uma indemnização anual, calculada a partir da média anual das remunerações recebidas pelo agente durante os últimos cinco anos. VII. Salvo melhor opinião, isto significa que, em regra, apenas após o trânsito em julgado da decisão que fixa o valor indemnizatório é que esse mesmo valor se torna efectivamente líquido (artigo 805º nº3 do Código Civil). | ||
| Decisão Texto Parcial: |  | ||
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| Decisão Texto Integral: | Acordam na Relação de Lisboa I. RELATÓRIO 1. Pretensão sob recurso: ser revogada a sentença objeto do presente recurso, com a consequente absolvição das RR.. 1.1. Pedidos: condenação das RR. no pagamento à A. das seguintes quantias: a) € 2.870.730,00 (dois milhões, oitocentos e setenta mil e setecentos e trinta euros), a título de indemnização em virtude da cessação, por iniciativa das RR., do contrato de distribuição exclusiva; b) € 267.077,45 (duzentos e sessenta e sete mil, setenta e sete euros e quarenta e cinco cêntimos), a título de juros de mora vencidos sobre a quantia referida na alínea anterior, desde 26 de julho de 2004 até 8 de julho de 2005, à taxa supletiva legal; e ainda os juros de mora vincendos até integral pagamento; c) A título subsidiário relativamente ao pedido formulado na alínea a) supra, com fundamento no instituto do enriquecimento sem causa, € 2.870. 730,00 (dois milhões, oitocentos e setenta mil e setecentos e trinta euros), a ser adotado pelo Tribunal o juízo de equidade proposto nos artigos 76.° a 81.° da petição inicial; d) € 268.515,09 (duzentos e sessenta e oito mil, quinhentos e quinze euros e nove cêntimos), a título de indemnização pelos prejuízos sofridos pela A. com os investimentos feitos entre outubro de 2002 e 19 de agosto de 2003, conforme se alegou no ponto 4 (i) da petição inicial; e) € 672.031,06 (seiscentos e setenta e dois mil, trinta e um euros e seis cêntimos), a título de indemnização pelos prejuízos sofridos pela A. com os investimentos feitos em 2001 e 2002 (até outubro), conforme se alegou no ponto 4 (ii) da petição inicial; f) € 227.517,65 (duzentos e vinte e sete mil, quinhentos e dezassete euros e sessenta e cinco cêntimos), a título de indemnização pelas despesas promocionais e publicitárias dos produtos das RR., suportadas pela A. no ano de 2003; g) € 134.507,00 (cento e trinta e quatro mil e quinhentos e sete euros), a título de custos de armazenagem, conforme se alegou no ponto 5 da petição inicial; h) Juros de mora vincendos sobre as quantias referidas nas alíneas c), d), e), f) e g) supra, à taxa supletiva legal, desde a data da citação das RR. para esta ação até integral pagamento. Tudo com custas, procuradoria e o mais que for de lei a cargo das RR.. Para tanto, alegou a A., em síntese, que: Em 1977, Autora e Rés celebraram um contrato de produção e distribuição exclusiva dos produtos das Rés, o qual foi sendo renovado sucessivamente por períodos de cinco anos, sendo o último com efeitos a partir de 22 de outubro de 1997. Este contrato permaneceria em vigor até 22 de outubro de 2002, salvo se fosse renovado por mútuo acordo. Em 11 de outubro de 2002, o contrato foi prorrogado por mais um ano, até 22 de outubro de 2003. Nos termos do contrato, a Autora obrigou-se a promover e a vender os produtos das Rés no Arquipélago da Madeira, mediante retribuição constituída pelas margens de lucro conseguidas com a venda dos produtos das Rés. A Autora produzia e distribuía os produtos elaborados a partir de xaropes concentrados fornecidos por empresas do grupo C… e distribuía produtos finais fornecidos pelas Rés ou empresas por estas indicadas. Desde o início e até 2001, a Autora estruturou a sua atividade de distribuição de produtos das Rés através de uma empresa por si detida a 100 % para colocação dos produtos C… no mercado, D…, Lda., o que era do conhecimento das Rés, que nada opuseram. Em fevereiro de 2002, a atividade da D…, Lda., foi integrada por meio de trespasse na Autora. A Autora executou o contrato satisfazendo as exigências das Rés no que respeita a equipamentos, parâmetros de qualidade e metas comerciais. A Autora era responsável pela promoção dos produtos das Rés naquela zona, pela prospeção do mercado e angariação de clientela para os mesmos. Tinha obrigação de informar as Rés sobre as vendas e clientes. A Autora cumpriu estas obrigações. Em 7 de abril de 2003, a Autora solicitou a renovação do contrato até outubro de 2008. Em 19 de agosto de 2003, a 1.ª Ré comunicou à Autora que o contrato cessaria nos termos da sua cláusula 26.ª (c), ou seja, por caducidade. O contrato de distribuição é um contrato atípico, devendo ser-lhe aplicado o regime do contrato que lhe está mais próximo, isto é, o contrato de agência regulado pelo Decreto-Lei n.° 178/86, de 3 de julho, alterado pelo Decreto-Lei n.º 118/93, de 13 de abril, para além dos princípios e regras do ordenamento jurídico. Assim, nos termos do disposto no artigo 33.°, n.° 1, do diploma referido, a Autora tem direito a receber uma indemnização de clientela (se assim não se entender, com base no instituto do enriquecimento sem causa). Antes do contrato em apreço, as Rés não comercializavam os seus produtos em Portugal. A rede de clientes criada pela Autora cobria praticamente todo o Arquipélago da Madeira. Em 2003 havia angariado mais de 3000 clientes. As Rés reconheceram tal mérito da Autora. Decorridos 26 anos, as Rés beneficiaram significativamente da atividade de distribuição da Autora. Os produtos das Rés, de uma quota de 0 %, passaram para uma quota de 40,3 % no mercado de refrigerantes com gás, o volume de vendas diminuiu 11 % em relação a 2002, numa altura em que a concorrência de produtos como a P. e 7 UP era mais forte. Em 2002 a Autora comercializou 9 426 273 milhões de litros de produtos das Rés. Cessando o contrato, as Rés continuam a beneficiar da atividade de angariação de clientela desenvolvida pela Autora. As Rés continuam a vender os seus produtos na Madeira através da R... Madeira, sociedade subsidiária da R…, S.A., que já detinha um contrato de engarrafamento e comercialização de produtos C… para Portugal continental. A atual rede de clientes de produtos das Rés no Arquipélago da Madeira é baseada na rede de clientes angariada pela Autora até à cessação do contrato. A Autora comunicou às Rés, em 26 de julho de 2004, a sua pretensão de receber a indemnização de clientela, bem como de ser compensada a outros títulos (cfr. artigo 33.°, n.° 4, do citado diploma). Tais comunicações foram recebidas pelas Rés, mas estas não pagaram tal indemnização alegando, em 30 de setembro de 2004, não estarem reunidos os pressupostos. A indemnização de clientela ascende a € 2 870 730,00 (cfr. artigo 34.º do mesmo diploma), média de margem bruta da Autora, sendo que a média do produto de vendas das Rés pela Autora, nos cinco anos anteriores à cessação do contrato, ascende a € 8 723 765,00. Àquela quantia de € 2 870 730,00 acrescem juros de mora vencidos contados desde a interpelação para pagamento (26 de julho de 2004) e juros vincendos. A Autora não recebeu qualquer retribuição por contratos negociados ou concluídos relativos a produtos C… após a cessação do contrato. Subsidiariamente, tal quantia é devida a título de enriquecimento sem causa (cfr. artigo 473.º, n.º 1, do Código Civil). É, ainda, devida à Autora uma indemnização por as Rés não terem agido de boa fé no exercício do seu direito de não renovarem o contrato com a Autora, tendo violado os deveres de zelo, de lealdade e de informação a que estavam adstritas e, assim, causado prejuízos à Autora, nomeadamente na medida dos investimentos inúteis que levaram a Autora a fazer entre outubro de 2002 e agosto de 2003. Em outubro de 2002, as Rés fixaram determinados objetivos para que a renovação do contrato tivesse lugar, referentes aos níveis de qualidade da fábrica da Autora no Funchal e aos níveis de vendas atingidos, sendo que estavam cientes de que a Autora, para os atingir, teria de proceder a elevados investimentos e que estes investimentos teriam retorno a médio e longo prazo, o que pressupunha a renovação do contrato por mais anos. Mas as Rés não renovaram o contrato. E não informaram cabalmente a Autora acerca do seu entendimento sobre a verdadeira probabilidade de renovação do contrato, fazendo crer que a relação de 26 anos iria continuar. Nunca antes da carta das Rés, de 19 de agosto de 2003, estas transmitiram à Autora qualquer reserva ou comentário que fizesse crer poder a renovação estar em causa, nem pressionaram a Autora ou lhe deram prazo para concluir o que poderia estar em atraso. Assim, a Autora tem direito a ser indemnizada pelos investimentos feitos que ascendem a € 290 000,00. A Autora considera desaproveitados, por aplicação das regras contabilísticas relativas à amortização do imobilizado, € 268 515,09. Tem igualmente direito a ser indemnizada pelos investimentos feitos em 2001 e 2002. Em 2001, a Autora procedeu a elevados investimentos na perspetiva da renovação do contrato por um período não inferior a cinco anos, tanto mais que a relação durava há mais de 20 anos sem que lhe tivesse sido dada nota de que a renovação poderia estar em risco. Em 2002, a Autora prosseguiu tais investimentos, sendo que apenas em maio de 2002 as Rés comunicaram à Autora algum descontentamento e, em outubro de 2002, a intenção de não renovar. As Rés violaram os deveres de boa fé na execução do contrato, pois, conhecedoras da natureza e do custo dos investimentos que a Autora ia realizando, nada lhes disseram. A Autora despendeu, no ano de 2001, € 444 979,77, tendo considerado desaproveitados € 284 514,92, e despendeu, em 2002, € 520 413,00, tendo considerado desaproveitados € 387 516,24. Assim, cabe às Rés indemnizarem a Autora pela quantia de € 672 031,06, a título de investimentos desaproveitados nesses anos. A Autora não teria feito tais investimentos se tivesse sido informada pelas Rés, atempada e corretamente. A Autora despendeu em publicidade e marketing, no ano de 2003, a quantia de € 200 136,40, sendo certo que, em regra, o retorno é obtido a curto prazo (um ano). Efetuou, igualmente, gastos com um evento ocorrido em 23 de agosto de 2003. Em consequência da não renovação do contrato, a Autora, após 23 de outubro de 2003, ficou impedida de comercializar qualquer produto das Rés, pelo que estas ficaram obrigadas a adquirir todos os produtos e embalagens em stock, mas apenas concluíram a compra de tais stocks em junho de 2004. Por parte da Autora, todas as condições para a libertação dos stocks estavam preenchidas em 22 de outubro de 2003. Assim, suportou a Autora custos de armazenagem, em armazéns próprios e arrendados, até maio de 2004, que contabilizou em € 134 507,00, que as Rés também devem reembolsar. As RR. apresentaram contestação que foi mandada desentranhar por extemporaneidade, pelo que os factos articulados pela A. foram considerados confessados (cfr. artigo 484.º, n.º 1, do pregresso Código de Processo Civil). A. e RR. apresentaram as suas alegações de direito. Foi interposto pela empresa “R…, S.A.” recurso de agravo do despacho que indeferiu a intervenção principal espontânea desta, (e que deu origem ao apenso A.), tendo essa decisão sido confirmada nos Tribunais Superiores. As RR. deduziram articulado superveniente, juntando quatro documentos, tendo sido proferido despacho liminar de indeferimento. Interposto recurso deste despacho, foi proferido Acórdão que revogou a decisão liminar e mandou que o articulado superveniente fosse apreciado. A A. apresentou resposta. Foi proferido despacho que não admitiu o articulado superveniente. Por Acórdão de 2 de Julho de 2015, foi revogado tal despacho e substituiu-se por outro, no sentido da admissão do articulado superveniente em causa, ordenando-se o prosseguimento do incidente com as consequências daí advenientes. Havia sido, entretanto, proferida sentença de mérito, em 20 de fevereiro de 2012, que julgara a ação parcialmente procedente e condenara as RR. no pagamento à A. da quantia de € 1.000.000,00, a título de indemnização de clientela, acrescida de juros de mora a partir da prolação da referida sentença, tendo as RR., no mais, sido absolvidas. Com o referido Acórdão de 2 de julho de 2015, deu-se por prejudicada a apreciação das duas apelações interpostas relativamente à dita sentença de mérito, e questões implicadas, ficando, consequentemente, sem efeito a referida sentença. Já no domínio da vigência do novo Código de Processo Civil – entrado em vigor no dia 1 de setembro de 2013 – determinou-se o prosseguimento dos autos, conforme superiormente ordenado. I.2. Foi proferida decisão, do seguinte teor: “Atento o circunstancialismo factual assente e a fundamentação jurídica invocada, o Tribunal julga a presente ação parcialmente procedente, por parcialmente provada, e, em consequência, condena as Rés no pagamento à Autora da quantia global de € 2 000 000,00 (dois milhões de euros), a título de indemnização de clientela, acrescida de juros de mora a partir da prolação desta sentença, calculados à taxa legal dos juros comerciais; e absolve as Rés do restante peticionado. Custas a cargo da Autora e das Rés, na proporção dos respetivos decaimentos (cfr. artigos 527.º, n.ºs 1 e 2, e 607.º, n.º 6, ambos do Código de Processo Civil) – fixando-se à presente causa o valor atribuído de € 4 440 384,25 (cfr. artigo 297.º do mesmo código). Registe e notifique.”. 1.2. Inconformadas com aquela decisão, as RR. apelaram, tendo formulado as seguintes conclusões: 1. O presente recurso é interposto da decisão proferida pelo Tribunal a quo que condenou as RR., ora Recorrentes, no “pagamento à A. da quantia de € 2.000.000,00, a título de indemnização de clientela, acrescida de juros de mora a partir da prolação desta sentença, calculados à taxa legal dos juros comerciais.” 2. A decisão ora recorrida baseou-se num conjunto de factos carreados para os autos apenas pela A, ora Recorrida (factos 1 a 91), tendo apenas sido objeto de produção de prova em sede de audiência de discussão e julgamento a matéria factual constante de quatro factos (factos 92 a 95). 3. Impugna a Recorrente a decisão do Tribunal a quo sob a matéria de facto relativa aos factos não provados sob os números I. II. 4. Várias foram as testemunhas - TLSL, SRS, RMD, ADSA, MMC e até das declarações de parte do legal representante da Recorrida - que prestaram declarações sobre ambos os factos que, revelando conhecimento direto dos mesmos, deram explicações claras as quais impunham uma apreciação crítica cuidada e conjugada entre todos estes depoimentos prestados que impunham uma valoração por parte do Tribunal a quo que determinaria necessariamente uma decisão diferente. 5. Quanto ao facto não provado sob o número I. a testemunha TSL, responsável de relações públicas das Recorrentes, que com toda a segurança e clareza confirmou a existência de benefícios e vantagens retiradas pela Recorrida do relacionamento comercial que manteve com as Recorrentes, concretizando essas vantagens no facto de as Recorridas terem um conhecimento e uma visão global do mercado que aproveita e é utilizado por todos os engarrafadores de produtos das Recorrentes para promover as suas vendas, a transferência do know how, de ensinamento, de outros mercados que podiam ser aplicados a um mercado como o do Arquipélago da Madeira, a transferência destes conhecimentos comerciais, designadamente de práticas comerciais, promoções, embalagens, tipo de embalagens, tipo de ponto de venda, política de preços, estratégias de venda e a existência de reuniões com a Recorrida para o efeito [minutos 24:22 a 27:43 e de minutos 28:06 a 28:57 da 3ª sessão no dia 14.02.2018]. 6. Quanto ao facto não provado sob o número I., a testemunha SRS, que há data dos factos desempenhava as funções de secretário-geral da C…Ibéria, para Espanha, Portugal e França, nessa mesma sessão de audiência de discussão e julgamento, pode concluir-se que, o relacionamento comercial entre as Recorrentes e a Recorrida implicou uma transferência de know-how, de conhecimentos técnicos ao nível comercial, expressamente referindo que ao longo dos anos aos engarrafadores, como é o caso da Recorrida, são-lhes ensinadas as técnicas de marketing, técnicas de vendas, técnicas de fabricação aos níveis ótimos [minutos 23:58 a 27:14]; que para a Recorrida resultaram vantagens resultantes do relacionamento comercial que existiu com as Recorrentes, designadamente ao nível do conhecimento de técnicas de marketing, técnicas e estratégias de venda [minutos 31:26 a 33:00], técnicas de fabricação; que existiam visitas à Recorrida das equipas de marketing das Recorrentes e a existência de planos anuais ao nível estratégico e comercial, bem como, em lançamentos de novas marca ou embalagens, a existência de apresentações e ensinamentos de estratégias para que seja possível aos engarrafadores terem as maiores vendas [minutos 50:59 a 52:57]. 7. Ainda quanto ao facto não provado sob o número I. a testemunha ADSA , gestor comercial na empresa R… Madeira confirmou a existência de formações por parte de empresas do grupo das Recorrentes ao nível de marketing, técnicas e estratégias de promoção, a existência e importância de planos estratégicos, vagas promocionais, plano de marketing e de uma grande parte operacional, planos para cada marca comercializada e a importância deste conhecimento como uma vantagem adquirida para as empresas que distribuem as marcas das Recorrentes [minutos 28:07 a 30:34 da sessão de audiência de discussão e julgamento de 28.02.2018]. 8. Também no que respeita à matéria factual do ponto I. dos factos não provados se pronunciou a testemunha MMC , que desempenhou as funções de gerente de operações de marketing para Portugal entre 2001 e 2005, confirma que, durante o relacionamento comercial entre as Recorrentes e a Recorrida, existiu efetivamente um amplo envolvimento amplo ao nível de toda a cadeia logística, que vai desde a produção, à distribuição, à conexão com os clientes finais, processos cujo conhecimento foi transmitido à Recorrida que passou a distribuir os produtos que são os principais concorrentes das Recorrentes, declarando que as Recorrentes têm «um processo de distribuição que envolve toda a cadeia logística, desde a produção, à distribuição, à conexão com os clientes, isso a gente tinha por uns 25 anos desenvolvido com a E…da Madeira, quando isso foi cancelado muitas coisas aconteceram, pelo que eu entendi eles começaram a distribuir P…, C.., S…, outros produtos que não eram da companhia, mas todo esse know how eles tiveram conhecimento, foi um processo, a E... Madeira desenvolveu os clientes, equipamentos que a gente colocava em mercado, não é só o marketing da C... , uma parte é o marketing mas é a produção, a distribuição, tudo o que a gente chama de cadeia logística» [minutos 9:32 a 11:20] e, referindo-se às Recorrentes: «Mas o valor da companhia não é gerado somente pelos consumidores ou pelos clientes, é como a gente faz toda a rede de distribuição e esse aprendizado, os equipamentos todos, como colocar, como lidar com clientes, todo esse processo em 25 anos, foi transferido esse conhecimento para a E...Madeira.» [12:10 a 12:29] e referindo-se ao mercado da Madeira afirma que «era até melhor na Madeira que no continente «(...) porque o mercado era bem desenvolvido, eu me lembro que em termos de distribuição de equipamentos a Ilha da Madeira foi muito bem desenvolvida ao longo destes 25 anos.» [minutos 19:36 a 19:52 na 4ª sessão de audiência de discussão e julgamento em 28.02.2018]. 9. No que diz respeito à transferência de equipamento, e em sede de declarações de parte, na sessão de 14.03.2018, o próprio legal representante da Recorrida MJLS , após confirmar que a Recorrida tem produção própria que as instalações da Recorrida passaram também a ser usadas para a comercialização da P., admite que não tinham outra coisa (a nível de equipamentos eram os que dispunham desde os tempos em que produziam C... ), bem como que não só as instalações, mas também os seus equipamentos industriais de que já dispunham como as linhas de enchimento e as cubas de produção passaram a ser utilizadas para a produção de P. e SU [do minuto 15:49 ao 17:38 da sessão de 14.03.2018], chegando mesmo a afirmar que tais equipamentos haviam sido utilizados para a produção da BC, produto próprio da Recorrida, [minutos 27:04 a 27:52]. 10. Existiu, pois, poucos anos volvidos após a cessão do contrato entre as Recorrentes e a Recorrida, uma transferência de know how e investimentos que foram efetivamente transmitidos à distribuição dos produtos que são os maiores concorrentes dos produtos das Recorrentes. 11. No que diz respeito ao facto julgado como não provado sob o número II. que tal daquela transferência não resultou qualquer benefício para as Recorrentes que tiveram que começar do zero no mercado da Ilha da Madeira, pronunciou-se a testemunha TSL, responsável de relações públicas das Recorrentes há data dos factos, o técnico mais qualificado, pela natureza das funções que desempenhava, para se pronunciar sobre as dificuldades de implementação da R... Madeira no arquipélago em termos de comercialização dos produtos das marcas das Recorrentes. 12. Confirmou esta testemunha ter a Recorrida lançado, logo após ter cessado o contrato que a vinculava às Recorrentes, um produto sucedâneo da C... , a BC, e a criação da R... Madeira que passara a distribuir os produtos das Recorrentes que começam do zero no mercado da Madeira [minutos 5:11 a 6:53], que a implementação no mercado da Madeira não foi um período fácil, já a partir de 2005, a fusão C. com a S. , permite-lhes ter um portfolio de oferta de produtos muito alargado e bastante forte no mercado e junto dos clientes, sendo que refere que a Recorrida tinha vantagem comercial por ser uma empresa local com uma implementação muito forte e um relacionamento muito próximo com os clientes do mercado em causa, tendo tido a nova empresa tido uma implementação gradual e não de um momento para o outro, seja a nível de clientes seja a nível de visibilidade das marcas em cada ponto de venda [minutos 10:19 a 20:18 todos na sessão de 14.02.2018]. 13. Quanto a facto II. pronunciou-se também a testemunha SRS. , secretário-geral da C... Ibéria, para Espanha, Portugal e França, confirmando que, após a cessação do acordo existente entre as Recorrentes e a Recorrida, a nova empresa constituída com a responsabilidade de comercializar os produtos das Recorrentes no Arquipélago da Madeira, ficou com a responsabilidade de criar uma nova rede de distribuição, sem ter tido acesso a qualquer acesso a clientes ou conhecimentos específicos comerciais da Recorrida, tendo efetivamente começado do zero [minutos 33:09 a 34:18, todos da sessão de 14.02.2018]. 14. Ainda no que respeita ao Ponto II. dos factos não provados, a testemunha RMD. , analista financeiro na C... Espanha desde 2003, e entre 2004 e 2006 gerente das finanças da C... em Portugal, confirmou a existência de uma queda dos volumes de vendas resultante da perda da rede de distribuição no Arquipélago da Madeira após a cessação do acordo entre as Recorrentes e a Recorrida, rede de distribuição a qual teve que ser reconstruída pelo novo engarrafador R... Madeira [minutos 12:03 a 13:35, sessão de 14.02.2018]. 15. Finalmente, quanto ao ponto II. da decisão de facto impugnada, entendem as Recorrentes terem sido decisivas as declarações da testemunha ADSA, gestor comercial na empresa R... Madeira desde o início da sua atividade no Arquipélago da Madeira, empresa que sucedeu as Recorrente e que começou a comercializar os produtos das Recorrentes a partir de 23 de Outubro de 2003, data em que cessou o contrato de engarrafamento em vigor com a Recorrida, que com toda a espontaneidade, segurança e clareza explicou as dificuldades iniciais da atividade comercial daquela empresa n a reconquista do mercado do Arquipélago da Madeira por parte dos produtos comercializados pelas Recorrentes. 16. Efetivamente, esta testemunha, que desempenhava e desempenha funções de gestor de cliente na R... Madeira, pelo que tinha contacto direto com os clientes deste mercado na comercialização dos produtos das marcas das Recorrentes, descreveu o início da atividade comercial da R... no arquipélago como terrível, tendo encontrado um mercado com as portas todas fechadas, encontrando-se todos os equipamentos de frio com publicidade da marca da Recorrida, a BC e, que após a data em que cessou o contrato entre as Recorrentes e a Recorrida não existia qualquer publicidade às marcas dos produtos por aquela comercializados nos clientes; [4:00 a 8:55], caracterizou a Recorrida como sendo um “empresa que tem um portfólio musculado, muito forte, tem uma vantagem em relação” à R... Madeira, ou seja, caracterizando a recorrida como tendo uma grande influência no mercado da Madeira com vantagens ao nível da implementação devido à capacidade que lhe conferia o grande portfolio de marcas que representavam, sendo uma empresa comercialmente agressiva [9:41 a 10:23], referiu existirem acordos comerciais entre a Recorrida e os clientes que conferiam exclusividade à Recorrida e aos seus produtos âncora [9:38 a 10:23; 14:00 a 15:15 e 17:54 a 18:10], dificultando as vendas da R... Madeira, bem como que, enquanto gestor de clientes, a partir da cessação do contrato em causa, em 23:10.2003 foi para o terreno “perder clientes, sem imagem nenhuma C... ”, “os clientes fechavam as portas” [31:00 a 31:49]. 17. A testemunha em causa demonstrou, ainda, ter conhecimento dos volumes de vendas dos produtos comercializados pela R... Madeira, desde 2004, primeiro ano de atividade, até 2010, sendo que no primeiro ano de atividade os volumes de venda ficaram muito aquém do volume de vendas da Recorrida, que em 2002 (facto provado 59) fora de 9.426.273 litros, não passou de cerca de 7 milhões de litros, conferindo ter existido uma grande quebra nas vendas [10:23 a 14:00 e 17:23 a 17:26], referindo que a partir de 2009, data a partir da qual a Recorrida passou a comercializar os produtos P., SU e Lipton, diretamente concorrentes com os das Recorrentes a situação comercial da R... Madeira ficou dramática, nas suas próprias palavras, existindo acordos fechados com clientes nos quais os produtos das Recorrentes nem sequer podiam ser adquiridos pelos clientes face ao portfolio alargado de produtos oferecidos pela Recorrida [17:27 a 21:08], atribuindo essa situação à preponderância comercial da Recorrida e dos seus produtos no mercado do Arquipélago da Madeira [21:08 a 24:33 todos da sessão de 28.02.2018]. 18. Os factos 1 a 91 apenas foram considerados provados pelo Tribunal a quo na sequência do desentranhamento da contestação apresentada pelas Recorrentes e consequente desencadeamento dos efeitos da revelia. 19. Sucede que a regra constante do artigo 484º do Código de Processo Civil, segundo a qual os factos alegados são dados como provados em caso de revelia do Réu, não é absoluta, prevendo a lei expressamente as excepções constantes do artigo 485º do Cód. de Proc. Civil. 20. A sentença objecto do presente recurso fundamentou-se, entre outros, nos factos constantes dos pontos 4, 5, 60, 67, 68, 69 e 84 da Motivação, que considerou provados. 21. No que respeita aos pontos 4 e 5 da Motivação, julgou o Tribunal a quo como provada a existência de um contrato de produção e distribuição exclusiva dos produtos das Recorrentes, que terá sido celebrado em 1977 e que terá sido objecto de renovações sucessivas por períodos de 5 anos. 22. Tal juízo funda-se apenas na mera alegação da Recorrida que dá por reproduzido o contrato, sem sequer o juntar aos autos, o que impede tal conclusão por parte do Tribunal a quo pois desconhece totalmente os termos e condições desse primeiro Contrato. 23. Da factualidade dada como assente resulta apenas terem sido celebrados dois acordos distintos entre a Recorrida e as Recorrentes, um que terá sido celebrado em 1977 - cujo conteúdo se desconhece e não pode ser pressuposto ou presumido - e outro, esse sim junto aos autos, que terá sido celebrado em 1997, tendo vigorado apenas durante 6 anos. 24. Carece de fundamento, atenta a prova produzida nos autos, extrapolar desta circunstância que terá existido entre as partes apenas uma relação contratual que terá durado 26 anos, como se dá por assente no facto sob o número 84., sem que se tenha demonstrado os moldes em que tal relação assentou durante as duas primeiras décadas. 25. No caso presente, apenas poderá estar em causa a relação contratual consubstanciada neste último contrato, o qual vigorou somente entre os anos de 1997 e 2003. 26. Andou mal o Tribunal a quo ao considerar como provado, com base tão-somente na alegação conclusiva da Recorrida, que a relação contratual entre as partes se manteve durante 26 anos, fazendo ainda derivar deste raciocínio um dos pressupostos para determinar o quantum indemnizatório em que as Recorrentes vieram a ser condenadas. 27. No facto sob o número 60. deve ser eliminada a referência a “como distribuidora” que contém uma conclusão de índole jurídica, devendo ser alterada a sua redacção para: “60. Cessado o contrato as RR continuam a vender os seus produtos no Arquipélago da Madeira tendo substituído a A por uma outra empresa, a R... Madeira, sociedade subsidiária da R. , S.A. que já detinha contrato de engarrafamento e comercialização de produtos C... para Portugal continental.”. 28. Por outro lado, os factos vertidos nos números 67. a 69. foram considerados como provados não obstante carecerem de prova documental, como resulta da conjugação dos artigos 29º e seguintes do Código Comercial com o artigo 364º do Código Civil - artigo 485º, d) do Cód. de Proc. Civil. 29. O facto dado como provado sob o número 67: “a média do produto das vendas das RR pela A, nos 5 anos anteriores à cessação do contrato (i.e., de 1998 a 2003), ascende a € 8.723.765”, padece de um erro de cálculo, pois que o valor de € 8.723.765 não corresponde à média dos últimos 5 anos já que são considerados neste cálculo 6 anos, de 1998 a 2003. 30. No cálculo daquele valor médio o Tribunal a quo socorre-se dos “volumes de vendas de produtos das RR (arredondados): 1998: 5.478.635; 1999: 6.511.215; 2000: 6.944.143; 2001: 8.172.369; 2002: 8.731.553; 2003 (até 22/10): 7.780.910”, isto é, os volumes de vendas dos últimos 6 anos e não dos últimos 5 anos; pelo que o facto vertido sob o número 67. nunca poderia ter sido dado como assente. 31. No que respeita à qualificação do Contrato celebrado em 1997, e que se encontra junto aos autos, considerou a sentença ora em crise, que se tratava de um contrato de concessão comercial. 32. Antes de mais, é abusiva, por carecer de fundamento, a conclusão de que o primeiro contrato celebrado entre as partes em 1977 poderia também ser qualificado como um contrato de distribuição, quando aquele primeiro Contrato nem consta dos autos. De facto, tal conclusão, abusiva, só foi possível retirar da análise do teor do Contrato de 1997. 33. Já a qualificação do Contrato celebrado em 1997 que o Tribunal a quo considerou ser um contrato de concessão comercial careceu da devida apreciação de direito, tendo em conta os factos provados. 34. O Contrato junto aos autos é um Contrato de Engarrafador (e não um Contrato de Distribuição) e, como tal, um contrato legalmente atípico. 35. O seu conteúdo foi definido pelas partes no exercício da sua autonomia privada, pelo que não se mostrando expressamente regulado na ordem jurídica portuguesa, ser-lhe-ão aplicáveis não só as cláusulas estipuladas pelas partes, bem como os princípios e as regras gerais dos contratos e do negócio jurídico. 36. Ao contrário do pretendido pela Recorrida, não só não faz sentido como não resulta ser automática a aplicação analógica do regime do contrato de agência ao contrato celebrado entre as partes, designadamente a do artigo 33º do DL 178/86, de 3 de Julho, alterado pelo DL nº 118/93, de 13 de Abril, no caso sub judice, atenta a natureza do contrato em causa e a forma como a relação se configurou na realidade, tendo em conta os factos alegados pela Recorrida para descrever tal relação contratual. 37. A relação contratual entre Recorrida e Recorrentes é uma relação que se encontra bastante afastada de um Contrato de Agência, como, aliás, desde logo se pode constatar pela análise das obrigações assumidas pelas partes no Contrato. 38. O Contrato de Engarrafador in casu tem como pontos essenciais a produção, engarrafamento e venda por parte da Recorrida de bebidas das Recorrentes, tendo como âmbito territorial o Arquipélago da Madeira. 39. Ao abrigo do contrato em causa a Recorrida não vendia, nem distribuía os produtos das Recorrentes da marca C... em nome e representação desta última – características possíveis num Contrato de Agência, mas nunca num contrato segundo o qual o Engarrafador age como agente económico independente e em nome próprio, como no caso em apreço, sendo remunerado pelo lucro e não por comissão. 40. Não só a actividade promocional era também efectuada pelas próprias Recorrentes como a natureza dos produtos vendidos e a notoriedade das respectivas marcas são tão significativas que conduzem ao necessário afastamento da aplicação, ainda que analógica, do regime legal da indemnização de clientela. 41. A natureza do contrato, no qual o Engarrafador (Recorrida) é independente, remunerado pelo lucro da revenda dos produtos de certa marca, impede, assim, a aplicação do regime legal do contrato de agência: as suas características são, por exemplo, mais próximas do contrato de franchising do que do de agência. 42. De facto, a actuação da Recorrida no âmbito da relação contratual estabelecida com as Recorrentes foi, tão só, a colocação no mercado dos produtos por si produzidos, sendo remunerada em conformidade pelo respectivo lucro – ao contrário de um Contrato de Agência, a Recorrida não actuou em nome e representação das Recorrentes, nem concluiu contratos em seu nome. 43. Foram as Recorrentes que criaram a procura dos seus produtos, limitando-se a Recorrida a atender a essa procura perante os pontos de venda, sendo esta quem estabeleceu, de forma independente, as margens de lucro e os respectivos benefícios, sem qualquer intervenção das Recorrentes neste ponto. 44. O Tribunal a quo entendeu que em casos de contratos legalmente atípicos, como seria o caso do contrato dos autos, dever-se-ia atender às regras dos contratos mais próximos que tenham a sua disciplina legalmente fixada e que se pudessem aplicar por analogia. 45. Contudo, é fundamental ter em conta que a aplicação analógica não se trata de uma aplicação automática de tal regime a qualquer contrato atípico, mas sim de uma aplicação condicionada a certas premissas, nomeadamente ao tipo de Contrato em causa e à relação contratual efectivamente estabelecida entre as partes em obediência ao princípio da autonomia privada. 46. Ficou também por demonstrar a relação de dependência técnica e económica que a Recorrida teria perante as Recorrentes, sendo este um ónus que sobre si impendia já que constitui a base da sua pretensão. 47. Efectivamente, a Recorrida, a par daquela actividade, continuou a desenvolver o seu negócio, em clara concorrência com o das Recorrentes, como consta expressamente na sentença recorrida: “é do domínio público que a A. é uma empresa que tinha e tem um outro negócio de bebidas para além dos produtos da marca C... ”. 48. A cessação da relação comercial entre a Recorrida e as Recorrentes não justifica idêntica protecção àquela que a lei confere ao agente ao atribuir-lhe uma indemnização de clientela. 49. A Doutrina e Jurisprudência têm entendido que a indemnização de clientela é devida a um distribuidor quando se prove que, no caso concreto, o distribuidor agiu como se fosse um agente, nomeadamente quanto às obrigações que assumiu e quanto à força impulsionadora e condicionadora do principal na sua atividade. 50. A indemnização de clientela atribuída ao agente, aquando da cessação do contrato de agência, surge para partilhar com o agente os benefícios que o principal venha a retirar da actividade exercida por aquele durante a vigência do contrato. 51. Não se pretende, portanto, ressarcir danos causados ao agente, nem punir, por qualquer forma, o principal. Os requisitos do mecanismo da indemnização de clientela são expressivos quanto à sua função criadora de equilíbrio na distribuição dos proveitos, tornando necessária a existência de um nexo de causalidade entre os proveitos do principal e a actividade do agente, ainda que esses proveitos sejam substanciais e consideráveis. 52. Ora, a relação causa-efeito entre o labor da Recorrida e o benefício que as Recorrentes dele retiraram após o termo do contrato é, no caso concreto, extremamente mitigada e difusa, aliás, não está de todo evidenciada nos autos. 53. A própria sentença objecto do presente recurso reconhece, considerando assente, a notoriedade e globalização da marca das Recorrentes, pelo que dizer-se que a carteira de clientes de que as Recorrentes passaram a beneficiar desde a cessação do contrato celebrado com a Recorrida resultou exclusivamente da actividade por esta desenvolvida é uma asserção incongruente com a realidade. 54. A inexistência de analogia entre o caso dos autos e o contrato de agência resulta ainda reforçada se se atender aos requisitos a que a indemnização de clientela obriga. 55. Para que tal indemnização seja devida, recaía sobre a Autora, ora Recorrida, o ónus de alegar e provar factos que inequivocamente demonstrassem que (i) angariou novos clientes ou aumentou substancialmente o volume de negócios com a clientela já existente; (ii) as RR. continuam a beneficiar, mesmo após a cessação do contrato, da actividade da A.; (iii) a A. ficou privada de qualquer retribuição pelos negócios que vieram a ter lugar com os clientes por si anteriormente angariados, já que é esse o espírito da indemnização de clientela, baseada no instituto do enriquecimento sem causa. 56. Em parte alguma dos factos provados resulta de forma clara e objetiva o número de clientes angariados durante a vigência do contrato junto aos autos como doc. 1, o volume de negócios ao longo deste contrato ou o seu crescimento, nem em que medida a actuação comercial da Recorrida durante o Contrato beneficiou as Recorrentes. Efectivamente, os factos dados como provados a este respeito são, além de genéricos, insuficientes para cumprir os requisitos de que depende a aplicação do artigo 33.º do referido diploma. 57. Em primeiro lugar, a Recorrida teria que ter alegado e provado que angariou novos clientes ou aumentou substancialmente o volume de negócios com a clientela já existente (al. a) do art. 33º do DL 178/86, de 3 de Julho). 58. A sentença limita-se a indicar que a Recorrida angariou 3 mil clientes, onde se incluirão, naturalmente, os seus próprios clientes das suas marcas próprias, isto é, os clientes a quem vendeu, e vende, os produtos que comercializava de forma independente, sendo remunerada pelo lucro respetivo. 59. Aquela realidade não foi devidamente apreciada pelo Tribunal a quo, pois esta conclusão parte do pressuposto que a relação contratual entre as partes se manteve “ao longo de 26 anos”, quando o Contrato junto aos autos e cuja cessação está em causa foi celebrado em 1997 e cessou em 2003, tendo vigorado apenas durante 6 anos. 60. A sentença recorrida deveria ter aferido, em face dos factos carreados para o processo, se desde 1997 e até ao termo do contrato em causa, se verificou um aumento substancial do volume de negócios com a clientela já existente, o que não se verificou. 61. Haverá que ter em conta ainda o facto de muitos, senão a maioria dos clientes ali listados pela própria Recorrida, se terem mantido como seus clientes, pois que em lado algum esta alega ou produz qualquer prova do número de clientes que pretensamente teria perdido com a cessação do contrato que a vinculava às Recorrentes. Portanto, não pode haver lugar a uma indemnização por perda de clientela, sem se saber ou ser possível apurar se esta foi efectivamente perdida e em que medida. 62. Não foram pela Recorrida alegados ou provados quaisquer factos, nem da sentença resultam factos que permitam estabelecer um nexo causal entre a quota de mercado da C... e a atividade da Recorrida. 63. O facto de a marca C... ser uma marca mundialmente conhecida é um facto do conhecimento geral, notório (cfr. o art.º 514º do Cód. Proc. Civil), e que teria sempre que ser tomado em consideração na decisão proferida, como foi, embora dele não se retirando todas as conclusões com a amplitude que se impunha. 64. Por força dessa notoriedade, grande parte dos Clientes que compravam produtos C... à Recorrida tê-los-iam comprado independentemente de ser a Recorrida ou qualquer outra empresa a co-contratante dos Recorrentes. 65. Não se pode estabelecer um nexo causal directo entre a actividade da Recorrida e a angariação de 3.000 clientes num universo desconhecido, ou entre a actividade da Recorrida e a quota de mercado detida pelas Recorrentes, já que devia ter sido atribuída à notoriedade da marca grande parte da responsabilidade pelo sucesso alcançado. 66. Em segundo lugar, incumbia à Recorrida provar que as Recorrentes beneficiaram consideravelmente, após a cessação do contrato, da actividade desenvolvida por si (al. b) do art. 33º) do DL 178/86, de 3 de Julho). 67. As Recorrentes não beneficiaram – nem enriqueceram – com a clientela que possa ter sido angariada pela Recorrida. Em nada resulta dos autos ter a Recorrida perdido qualquer cliente a favor das Recorrentes. 68. Por outro lado, não demonstrou a Recorrida que as Recorrentes – ou sequer o seu novo engarrafador (de que nunca poderia sequer existir o benefício indirecto a que se alude no final da página 22 da sentença) - conhecessem essa clientela, que é requisito fundamental para a concessão da indemnização de clientela. 69. Para haver lugar a indemnização de clientela seria necessário que as Recorrentes se apropriassem da clientela da Recorrida, ou seja, que retirando a Recorrida do circuito fossem contactar directamente essa clientela, o que não se verificou, sendo que as Recorrentes não tinham como o fazer, porquanto por um lado desconheciam quem fossem esses clientes (não podendo por isso transmitir tal informação ao seu novo Engarrafador) e por outro, porque não actuam directamente no mercado. 70. A isto acresce que a Recorrida não curou de alegar factos – e não conclusões – sobre a transferência da sua clientela. 71. Para a atribuição de uma indemnização de clientela seria necessário que constasse dos factos dados como provados que a clientela se havia transferido ou para as Recorrentes, ou para a dita R... Madeira. Não o fez, nem é possível concluir-se que a rede de clientes da R... é só baseada nos clientes angariados pela Recorrida até porque se conclui igualmente na sentença sob recurso que a Recorrida produzia e comercializava produtos de marcas próprias. 72. Acresce que sempre devia ter o Tribunal a quo julgado como provado que, anos volvidos após a cessação do contrato de produção e distribuição existente entre as Recorrentes e a Recorrida, o know how e os investimentos realizados foram efetivamente transmitidos à sua maior concorrente – a P. –, sem qualquer benefício para as Rés, que tiveram de começar do zero no mercado da Ilha da Madeira, tendo tido grandes dificuldades de implementação neste mercado, a própria sentença recorrida refere ser a Recorrida «uma empresa centenária no mercado ilhéu». 73. Mais, exige a norma ter existido um benefício considerável a favor do principal, neste caso as Recorrentes. Não é, pois, suficiente um qualquer benefício, este terá que ser qualificado, o que não está também demonstrado nos autos. 74. Em terceiro lugar, seria à Recorrida que incumbia provar que deixou de receber qualquer retribuição por contratos negociados ou concluídos, após a cessação do contrato, com os clientes angariados (al. c) do art. 33° DL n° 178/86, de 3 de Julho). 75. Não havendo prova efectiva da transferência de antigos clientes da Recorrida, também não há prova de que haja contratos concluídos – após a cessação do contrato – com esses clientes, pelo que também este requisito ficou por preencher. 76. No número 70 dos factos dados como provados, dá-se por assente que a Requerida “não recebeu qualquer retribuição por contratos negociados ou concluídos, após a cessação do contrato relativamente a produtos C... ”. 77. O que significa que a Recorrida continua a receber remuneração de tais clientes, relativamente a outros produtos, concorrentes das Recorrentes, que vende no mercado do Arquipélago da Madeira. 78. Pelo que não existe qualquer enriquecimento ilegítimo das Recorrentes à conta da atividade da Recorrida. 79. Acresce que a Recorrida não alegou em concreto qualquer facto relativamente aos putativos benefícios que as Recorrentes haviam retirado da cessação do contrato, pelo que tal indemnização não poderia ter sido arbitrada nos moldes fixados e tidos por adequados na sentença em crise. 80. Mais, a Recorrida não alegou factos que permitam apreciar o suposto benefício considerável que adveio para as Recorrentes após a cessação do contrato, pelo que inexiste qualquer facto dado como provado nesse sentido e do qual seja possível fundamentar uma indemnização de clientela adequada. 81. No que respeita ao requisito negativo previsto no nº 3 do art. 33º do DL 178/86, de 3 de Julho - a cessação do contrato por razões imputáveis ao agente - a decisão do Tribunal a quo desconsidera completamente esta realidade, justificando-se até a sua ponderação para efeitos de determinação do quantum indemnizatório quando o mesmo é fixado com recurso a um juízo de equidade. 82. A revelia do Réu não exime o Tribunal do seu dever, nos termos do art. 515º do Cód. de Proc. Civil, de “tomar em consideração todas as provas produzidas, tenham ou não emanado da parte que devia produzi-las (...)” (cfr. também o art. 659º n.º 3 Cód. de Proc. Civil). 83. Resultam dos autos factos assentes e suficientes para demonstrar à saciedade que a cessação do contrato se deveu única e exclusivamente à Recorrida. A este respeito vejam-se nomeadamente os factos dados como provados nos números 16, 27 a 31, 43, 49, 76 a 78 dos quais resulta claramente que a não renovação do contrato, por outras palavras a sua cessação, foi imputável à Recorrida, que não cumpriu as condições que as Recorrentes tinham estabelecido para a continuidade da relação contratual. 84. Para a cessação do contrato que vigorou entre as partes, pese embora ter sido causada por efeito da caducidade por decurso do tempo de vigência acordado, concorreram as razões que se invocam como fundamento na sentença objecto de recurso, e que se encontram na carta enviada pelas Recorrentes à Recorrida, em 14.11.2002 e junta aos autos. 85. Note-se que só a existência destas razões poderia fundamentar a cessação do contrato por factos imputáveis à própria Recorrida, situação esta que afastaria, conforme se prevê na norma contida no n.º 3 do art. 33º do DL 178/86, de 03.07, a possibilidade de vir a ser arbitrada à Recorrida qualquer montante a título de indemnização de clientela. 86. Ora, este facto não é considerado na sentença objecto do presente recurso como causa de exclusão da atribuição de uma indemnização de clientela, nem tão pouco no momento de fixação do quantum indemnizatório. 87. No que diz respeito à fixação do valor da indemnização de clientela, a atribuição desta implica a verificação de uma série de requisitos que não se encontram preenchidos. 88. Em primeiro lugar, que exista uma relação de agência, ou uma relação substancialmente análoga àquela, o que não se verifica nos autos. 89. Em segundo lugar, que tenha sido pago pelo principal/representado/empresário ao agente/intermediário algumas quantias no passado, o que igualmente não se verifica. 90. Acresce que o art. 34º do DL 178/86, de 03.07, dispõe que a indemnização de clientela tem um limite máximo e deverá ser fixada com recurso à equidade. 91.Entendeu o Tribunal a quo existirem nos autos elementos suficientes para fixar o quantum indemnizatório, enumerando, sem qualquer explicação adicional, sete critérios. 92. Relativamente ao primeiro dos critérios enunciados – a duração da relação contratual -o Tribunal a quo fez concorrer erradamente para a fixação do valor da indemnização a duração de uma relação contratual que pretensamente terá durado 26 anos e da qual apenas existe suporte documental para 6 anos. 93. Também no que toca ao segundo critério – a extensão do território exclusivo da A. – arquipélago da Madeira - não se justifica qual o sentido a atribuir a tal área territorial. 94. Os “milhares de clientes angariados” é o terceiro critério enunciado, porém, sempre haveria que especificar e concretizar o número de clientes efectivamente angariados pela Recorrida em execução do contrato junto aos autos. 95. Por outro lado, dificilmente se pode calcular uma indemnização de clientela, com base na média anual dos valores recebidos nos últimos 5 anos, quando não se tenham recebido quaisquer remunerações nos últimos 5 anos, ainda mais quando a própria Recorrida se dispensou de juntar aos autos todos os documentos de suporte contabilístico por, e nas suas palavras, comportarem um volume excessivo (cfr. os arts. 68º e 69º Petição Inicial). 96. Para que os valores alegados se pudessem dar como provados, como foram, repete-se, seria necessário que aqueles valores tivessem sido objecto de prova documental, como se impunha pela conjugação dos artigos 29º e seguintes do Código Comercial com o artigo 364.º do Código Civil, pelo que nunca essa matéria poderia ter sido dada como confessada, nos termos do artigo 485º d) do Cód. Proc. Civil. 97. O cálculo da indemnização arbitrada assenta, ainda, num critério que padece de um incontornável erro de cálculo aritmético, é que o valor de € 8.723.765 não corresponde à média dos volumes de vendas das Recorridas dos últimos 5 anos de duração do contrato. 98. O Tribunal a quo fundamenta-se erradamente, e conforme resulta do facto assente sob o número 67., nos “volumes de vendas de produtos das RR (arredondados): 1998: 5.478.635; 1999: 6.511.215; 2000: 6.944.143; 2001: 8.172.369; 2002: 8.731.553; 2003 (até 22/10): 7.780.910”, isto é, os volumes de vendas dos últimos 6 anos, e não dos últimos 5 anos. 99. No que diz respeito à “média das vendas dos últimos 5 anos” e “média da margem bruta”, sempre se refere que o montante da indemnização de clientela é calculado com recurso à equidade. 100. O valor da indemnização anual, calculada a partir da média anual das remunerações recebidas é um limite máximo. 101. O valor da margem líquida, do lucro, ou seja, da «retribuição» é facto constitutivo do direito da Recorrida à indemnização, pelo que lhe cabia alegar a factualidade relevante (artigo 342.º do Código Civil), o que não fez. 102. Considera, ainda, o Tribunal a quo no concurso para a fixação do montante indemnizatório “a notoriedade e globalização da marca das RR. e sua situação patrimonial”, nada existindo nos autos que permitisse ao Tribunal a quo concluir sobre a situação económico-financeira das Recorrentes, não sendo este um facto notório. 103. Ponderados todos os factores enunciados, entendeu o Tribunal a quo fixar como montante adequado de indemnização o valor de € 2.000.000,00, sem qualquer outra justificação. 104. A indemnização de clientela, a ser atribuída, sê-lo-á mediante um critério de equidade e a este propósito não poderão deixar de ser atendidos os argumentos invocados. 105. No caso sub judice, existem não só sérios entraves à atribuição de uma indemnização de clientela, como, caso assim não se entenda (o que não se admite), existem evidentes obstáculos à condenação das Recorrentes no pagamento da indemnização atribuída em Primeira Instância. 106. Aliás, uma indemnização nos termos peticionados consubstanciaria, necessariamente, um enriquecimento injustificado repudiado pelo juízo de justiça individualizada exigido pelo critério de equidade. 107. De facto, e pese embora não ter sido admitida a contestação, a circunstância de os factos da Petição Inicial não terem sido contestados não significa que os mesmos devam ser considerados de forma absoluta para uma decisão do mérito da causa, ou que através deles a Recorrida venha a alcançar um efeito jurídico que sempre seria ineficaz através da vontade das partes expressa no contrato. 108. As Recorrentes não beneficiaram, após a cessação do contrato, de lucros decorrentes da actividade desenvolvida pela Recorrida, pelo contrário, a actuação da Recorrida posterior a essa data inutilizou de forma assinalável qualquer efeito benéfico que a sua actuação anterior pudesse ter tido sobre os produtos das Recorrentes. 109. Com efeito, a Recorrida é uma centenária e conhecida empresa de comercialização de bebidas cujo objecto não se esgotava na relação que mantinha com as Recorrentes, uma vez que tem marcas próprias que concorriam diretamente com as das Recorrentes. 110. Os seus produtos gozam, no mercado territorialmente relevante, de uma popularidade transversal a classes sociais e faixas etárias, cuja estratégia de marketing assume a proveniência regional como um trunfo em relação a bebidas produzidas fora da Região. 111. A circunstância de a Recorrida ter um conjunto de bebidas que gozam de notável sucesso permite, obviamente, um aproveitamento do círculo de comercialização destas bebidas para a promoção da sua nova bebida. 112. Qualquer esforço de promoção das bebidas próprias da Recorrida, já fora dos termos do “Bottler’s Agreement”, significa uma ingerência sua na quota de mercado das Recorrentes, e nessa medida, uma compressão de um dos vectores a considerar na atribuição da indemnização de clientela – os ganhos auferidos pelo alegado Principal após a celebração do contrato. 113. Face ao exposto, também aqui entendem as Recorrentes que os factos dados como provados sob os números 1 a 91 são insuficientes para sustentar os critérios invocados pelo Tribunal a quo, para mais com um evidente défice de fundamentação, na fixação do valor indemnizatório. 114. Entendeu o Tribunal a quo ter ficado «provado, in casu, que, em 30 de dezembro de 2008, a Autora assinou um contrato de produção e distribuição com a sociedade “S. + C”, com início dos seus efeitos em fevereiro de 2009, sendo que esta sociedade detém os direitos de produção e comercialização da marca P. em Portugal (juntamente com as marcas S. , S… e L…). As instalações da Autora, para além da sua produção própria, passaram, em fevereiro de 2009, a ser utilizadas para a comercialização da P.. Esta marca é a maior concorrente direta das Rés (nos refrigerantes..”); as marcas …, L… e S. concorrem, respetivamente, com Sp.., N.. e F…. Nenhum destes (supervenientes) factos provados pôde colocar em crise o prévio preenchimento dos requisitos previstos no citado artigo 33.º (...)», não obstante sempre deveriam ter sido considerados como relevantes para a ponderação da determinação do quantum indemnizatório com recurso à equidade, sob pena de a sua desconsideração levar a uma clamorosa injustiça no caso concreto. 115. Mas mais, exatamente com base nos mesmos critérios que este Tribunal já havia enumerado na sentença que nestes autos havia sido proferida em 12.02.2012, e que havia entendido como adequado fixar uma indemnização de clientela no montante de € 1.000.000,00, entendeu agora, o Tribunal a quo, fixar o montante de indemnização de clientela no dobro daquele valor, sem justificação, fundamentação ou ponderação de qualquer outro critério adicional que justifique a divergência quanto ao montante a atribuir a título de indemnização de clientela. 116. No caso sub judice, não só não estão reunidas as condições para a atribuição de uma indemnização de clientela, como, caso assim não se entenda (o que não se admite), existem evidentes obstáculos à condenação das Recorrentes no pagamento da indemnização atribuída em Primeira Instância. Aliás, uma indemnização nos termos da sentença objeto do presente recurso consubstanciaria, necessariamente, o enriquecimento injustificado repudiado pelo juízo de justiça individualizada exigido pelo critério de equidade. 117. Finalmente, vêm, ainda, as Recorrentes condenadas a pagar à Recorrida os juros moratórios contados desde a data da prolação da decisão. 118. Nos termos do disposto no artigo 34.º da Lei nº 178/86, de 3 de Julho, a indemnização é fixada equitativamente, pelo que nesse juízo de equidade haverá necessariamente que considerar, quer o tempo decorrido, quer quaisquer outros factores que o Tribunal entenda relevantes. 119. O pagamento de uma indemnização de clientela não consubstancia o cumprimento de uma obrigação certa nem o cumprimento de uma obrigação proveniente de facto ilícito ou pelo risco, nos termos do disposto na alínea a) do n.º 2 do art. 805.º do Código Civil, não consistindo, igualmente, no cumprimento de uma obrigação proveniente de facto ilícito ou pelo risco, conforme estipulado na alínea b) do n.º 2 e no n.º 3 do mesmo artigo. 120. Apenas são devidos juros de mora a partir da data de uma decisão final condenatória transitada em julgado. 121. Não são pois devidos juros contados a partir da data da prolação da decisão, mas apenas após o trânsito em julgado da eventual decisão final condenatória que venha a ser proferida em sede de recurso. 122. Não se encontrando a sentença objecto do presente recurso transitada definitivamente em julgado, nesta fase do processo, nada é devido a título de juros pelas Recorrentes (cfr. n.º 3 do art. 805.º do Código Civil). 123. A sentença objecto do presente recurso procede, pois, a uma incorrecta interpretação e aplicação das normas constantes nos arts. 10º, 342º, 364º, 805º, nº 2, als. a) e b) e nº 3, todos do Código Civil, dos arts. 29º e seguintes do Cód. Comercial, dos arts. 33º e 34º do DL 178/86, de 3 de Julho, e dos arts. 484º e 485º, d) e 514º do Cód. de Proc. Civil. A A. contra-alegou, tendo formulado as seguintes conclusões: A. Vem o presente recurso interposto da sentença proferida pelo Tribunal a quo, em 6 de Abril de 2018, que, na parte que na parte que é objecto do presente recurso, “condena as Rés no pagamento à Autora da quantia global de € 2.000.000,00 (dois milhões de euros), a título de indemnização de clientela, acrescida de juros de mora a partir da prolação desta sentença, calculados à taxa legal dos juros de mora comerciais”, impugnando, para tanto, determinados pontos da matéria de facto e, outrossim, propondo uma diferente interpretação e aplicação do direito, nomeadamente quanto à verificação dos pressupostos da indemnização de clientela e (subsidiariamente) quanto ao quantum dessa indemnização. B. Sendo este o objecto do recurso, tal como delimitado pelas Recorrentes, a Recorrida requer a sua ampliação, de modo a que o mesmo abranja: (a) O conhecimento dos pressupostos da atribuição da mesma indemnização com fundamento em enriquecimento sem causa, que ficou prejudicado em 1á instância pela procedência do fundamento principal, prevenindo a hipótese de procedência de algum dos fundamentos de direito do recurso interposto, no que toca à (não) verificação dos pressupostos de que depende a atribuição de uma indemnização de clientela; (b) A questão, em que a Recorrida decaiu, sobre se para determinação do tecto máximo da indemnização de clientela a arbitrar, deve fazer-se tendo por referência (como constituindo a “retribuição” do concessionário) o valor médio da margem bruta (ou vendas líquidas) referente aos últimos 5 anos de duração do contrato; (c) A questão, em que a Recorrida decaiu, sobre se o dies a quo da contagem dos juros de mora sobre o montante da indemnização fixada, é o da interpelação das Recorrentes para o pagamento da indemnização de clientela ou, no limite, o dia da citação destas para a presente acção (i.e. o dia da interpelação judicial das Recorrentes). E, nos termos e para os efeitos do artigo 636.º, n.º 1, do CPC, que o objecto do recurso abranja também: (d) O aditamento à matéria de facto assente de factos que resultaram da instrução da causa e que à cautela se requer, prevenindo a hipótese de procedência das questões suscitadas pelas Recorrentes. C. Delimitado e ampliado o objecto do recurso, vejamos porque é que a Sentença recorrida não merece – de facto e de direito, qualquer censura ou reparo, devendo ser mantida na íntegra. Começando pela impugnação da decisão do Tribunal a quo sobre a matéria de facto: QUANTO À FACTUALIDADE INDEMONSTRADA SOB O PONTO I D. Pretendem as Recorrentes – sem razão – que seja dado como assente que “poucos anos volvidos após a cessação do contrato de produção e distribuição existente entre Autora e Rés, o know-how e os investimentos realizados foram efectivamente transmitidos à P.”, fruto da celebração, pela Recorrida, de um contrato celebrado em Dezembro de 2008 com a S. +C.que detém os direitos de produção e comercialização da “P.”. E. Antes de mais, este facto é irrelevante para a decisão sobre o aspecto jurídico da causa: ele reporta-se à celebração de um contrato pela Recorrida com um terceiro (e eventuais consequências dessa celebração), que ocorreu mais de 5 anos depois do fim da relação contratual que está na génese da indemnização arbitrada, pelo que jamais teria a virtualidade de beliscar o direito aqui peticionado. Em qualquer caso, F. A prova produzida infirmou totalmente o facto que as Recorrentes pretendem ver assente. G. De um passo, resultou da prova testemunhal produzida que o know how da Autora (que esta pudesse ter “transmitido à P.”) foi adquirido pela própria, a expensas suas, e já não pelas Recorrentes – estas não lhe transmitiram qualquer know how específico que, depois, pudesse ter beneficiado terceiros: (a) Assim disse IF , que depôs no dia 7 de Fevereiro de 2018, com início pelas 14:24 horas, concretamente entre os minutos 00:16:01 - 00:19:50, que “A C... não fez investimentos na EM… que depois a P. podia ter aproveitado”; (b) O mesmo disse o representante legal representante da Recorrida, Miguel de Sousa, em declarações de parte que tiveram lugar no dia 14 de Março de 2018, com início pelas 14:15 horas, concretamente entre os minutos 00:45:55 - 00:47:07, a saber que: “Chegámos aqui à nossa custa, porque existimos no mercado há 146 anos, e, portanto, durante 146 anos acumulámos mais do que know-how sobre todo o nosso negócio”. H. De outro passo, não houve qualquer testemunha que tivesse afirmado que algum know how tenha sido transmitido à P., o que, na verdade, é a única conclusão possível do facto de nenhum know how ter sido adquirido. E que, de facto, nenhuma das testemunhas pôde afiançar se houve essa transmissão resultou do conjunto da prova, tendo, não obstante, o representante legal da Recorrida, negado esse facto: (a) Nesse sentido é esclarecedor – e revelador da falta de razão de ciência – o depoimento da testemunha das Recorrentes, TL. , prestado na sessão de 14 de Fevereiro de 2018, com início pelas 15 horas, concretamente entre os minutos 00:42:42 – 00:43:10, quando perguntado sobre se o know how foi transmitido disse “Não tenho provas para demonstrar que isso aconteceu”. (b) E que essa transmissão não aconteceu, disse-o o legal representante da Recorrida, António Prada, em declarações de parte que tiveram lugar no dia 14 de Março de 2018, com início pelas 15:39 horas, concretamente entre os minutos 00:11:33 - 00:12:10: “Nem sei se aprendemos alguma coisa, mas não creio que se tenha transmitido, estamos a falar 6 anos depois”. I. Portanto, não só a prova produzida infirma o facto que as Recorrentes pretenderem que seja dado como assente, que, por isso, deve manter-se como não provado, como ademais, dessa prova, resultou o seguinte facto instrumental com relevância para a decisão do aspecto jurídico da causa e que, nos termos dos artigos 5.°, n.° 2, al. b) e 636.°, n.° 2, do CPC, se requer seja aditado ao elenco dos factos assentes, a saber: “Era a Autora que investia, ela própria, em acções de formação e especialização, cujo custo suportava.” QUANTO À FACTUALIDADE INDEMONSTRADA SOB O PONTO II J. Como complemento ou consequência do facto que antes analisámos (e, já vimos, não foi provado), pedem as Recorrentes que seja dado como assente que “as Rés não tiraram qualquer benefício da actividade da Autora, e tiveram de começar do zero no mercado da Ilha da Madeira”. Mais uma vez, sem qualquer razão ou suporte na prova coligida. K. Desde logo, este facto não pode, sequer, ser dado como assente sob pena de gerar uma contradição insanável na matéria de facto da causa: ele contradiz ostensivamente aqueloutros factos já assentes sob os pontos 60. e 61. da fundamentação de facto, segundo os quais, após a cessação do Contrato com a ora Recorrida, as Recorrentes continuaram a vender os seus produtos no Arquipélago da Madeira e a actual rede de clientes dos seus produtos é baseada na rede que a Recorrida angariou. L. E, de resto, a prova produzida nos autos foi justamente no sentido de infirmar o facto que as Recorrentes pretendem que seja dado como provado, confirmando a realidade diametralmente oposta e que já consta da matéria de facto assente sob os pontos 60 e 61. Com efeito, M. Da prova produzida resultou, primeiro, que os produtos refrigerantes das Recorrentes continuaram a ser vendidos no Arquipélago da Madeira sensivelmente nos mesmos pontos de venda onde, na pendencia da relação com a Recorrida, esta os vendia. (a) Assim disse MGO. , que depôs no dia 7 de Fevereiro de 2018, com início pelas 10:19 horas, concretamente entre os minutos 00:09:41 – 00:12:01: “Acho que não faltou C... na Madeira. Eu, como consumidora de C... , sempre consumi C... ”; (b) No mesmo sentido depôs IF , no mesmo dia 7 de Fevereiro de 2018, com início pelas 14:24 horas, concretamente aos minutos 00:19:57 – 00:20:48, explicando que: “A Empresa de Cervejas colocou, se a memória não em falha, produtos C... em 100% de pontos de venda (...) a R. deu continuidade ao trabalho que a EM. fez até agora, portanto, do ponto de vista da presença de produto no mercado, não começaram do zero de certeza absoluta”; (c) Assim depôs também NF, no dia 28 de Fevereiro de 2018, com início pelas 14:37 horas, concretamente aos minutos 00:37:32 – 00:37:51, dizendo que: “Sim, continuou, continuou a encontrar C... em todos os lados como encontrava, com a mesma facilidade”. N. Depois, mais resultou da prova produzida em julgamento sobre o aproveitamento, pelas Recorrentes, do trabalho da Recorrida, que, após a cessação do contrato entre as Partes, a nova distribuidora dos produtos daquelas na Madeira – a R. – contratou trabalhadores que ocupavam funções comerciais na EM. , que lhe permitiu começar a operar conhecendo toda a informação que necessitava sobre pontos de venda. (a) Confirmou isso mesmo TL. , testemunha das Recorrentes, que foi inquirido em juízo no dia 14 de Fevereiro de 2018, com início pelas 15 horas, concretamente aos minutos 00:06:54 - 00:07:03 e, depois novamente, aos minutos 00:49:27 - 00:51:17, dizendo: “Alguns quadros recordo-me que foram para... da E..M foram para a R.-Madeira.”; (b) O mesmo foi dito, com detalhes de nomes e funções – MB, vendedor, e DM. , director comercial –, por IF , que prestou depoimento na sessão de julgamento de 7 de Fevereiro de 2018, com início pelas 14:24 horas, concretamente aos minutos 00:22:43 - 00:25:36; (c) Também assim depôs NF, inquirido em juízo no dia 28 de Fevereiro de 2018, com início pelas 14:37 horas, concretamente aos minutos 00:34:33 - 00:36:29, explicando que: “o MB. , no âmbito das suas funções, de vendedor, tinha o conhecimento das práticas comerciais todas e dos clientes da EM; o DM. , tinha sido diretor comercial da EM..”. O. Por fim, resultou igualmente da instrução da causa que as Recorrentes aproveitaram de tal forma (e efectivamente) da actividade antes desenvolvida pela Recorrida que o distribuidor seguinte – a R. -, no primeiro ano de distribuição, vendeu cerca de 9 milhões de litros (mantendo o volume de vendas anterior da EM) e conserva até hoje os pontos de venda angariados pela Recorrida. (a) Assim disse DA – trabalhador da R... –, cujo depoimento teve lugar a sessão de julgamento de 28 de Fevereiro de 2018, com início pelas 15:55 horas, concretamente aos minutos 00:35:58 - 00:36:30 e, depois, 00:42:08 - 00:42:42, a saber que: “Totais são em 2004 8.9 milhões” distribuídos por “entre 2.000 e 2.500. Não temos mais. Não existem mais pontos de venda.” (b) O que, quanto ao volume de vendas pela R., no primeiro ano após a cessão do Contrato das Recorrentes com a Recorrida, foi igualmente confirmado por RD, que prestou depoimento no dia 14 de Fevereiro de 2018, com início pelas 17 horas, concretamente aos minutos 00:22:00 - 00:22:46. P. Em conclusão, não só a prova produzida infirma o facto que as Recorrentes pretendem que seja dado como assente, que, por isso, deve manter-se como não provado, como ademais, dessa prova, resultaram os seguintes factos instrumentais com relevância para a decisão do aspecto jurídico da causa e que, nos termos dos artigos 5.º, n.º 2 al. b) e 636.º, n.º 2 do CPC, se requer sejam aditados ao elenco dos factos assentes, a saber: a. A R. Madeira no primeiro ano completo de distribuição (2004), após a cessação do contrato da TCCC com a EM. , manteve o volume de vendas antes feito pela EM. ; b. A R. Madeira conserva, até hoje, os cerca de 2.500 pontos de venda angariados (em linha com o que está assente, já por referência à data da propositura da acção, nos pontos 52. a 54. e 61. da fundamentação de facto); c. A R. Madeira contratou DM. e MB. , que eram, respectivamente, director comercial e vendedor na EM, que, pelas funções que exerceram na EM, tinham contacto com os clientes, listas de clientes e conhecimento do mercado. Depois, QUANTO À IMPUGNAÇÃO DA MATÉRIA DE FACTO ASSENTE POR EFEITO DA CONFISSÃO DAS RECORRENTES Q. Além da reapreciação dos factos que acabamos de ver, pedem as Recorrentes que sejam emendados e eliminados os factos que, por efeito da ficta confessio operante em resultado da revelia das Recorrentes (e nos termos do artigo 574.º, n.º 2 do CPC), foram dados como assentes tal como alegados e que constam dos pontos 4., 60., e 84 (para correcção) e dos pontos 67. a 69. (para eliminação) da fundamentação de facto da Sentença recorrida. R. Não assiste razão às Recorrentes. Senão vejamos: QUANTO AOS FACTOS CONSTANTES DOS PONTOS 4., 60. E 84. DA FUNDAMENTAÇÃO DE FACTO S. Pretendem as Recorrentes que este Venerando Tribunal desatenda, na análise do objecto do processo, à relação contratual de distribuição mantida entre Autora e as Rés, que teve início em 1977, encurtando-a, e dando-lhe começo apenas em 1997, pelo facto de a Autora apenas ter juntando aos autos a última versão da renovação do contrato celebrada em 1997. T. Só que resultou à saciedade do processo – sendo por isso, e bem, facto provado – a existência de uma relação comercial entre as Partes desde de 1977, que revestiu o conteúdo de um contrato de distribuição. U. Desde logo, foi esse o sentido da alegação da Autora, ora Recorrida, na Petição Inicial – em particular nos artigos 5.°, 6.°, 10.° e 20.° desse articulado – e que as Rés, ora Recorrentes confessaram ao não apresentar Contestação. V. Donde, alterar o sentido daquela alegação – confessada – no sentido agora proposto pelas Recorrentes violaria o disposto no artigo 574.º, n.º 2, do CPC). W. Em qualquer caso, as alterações propostas pelas Recorrentes não encontram o mínimo respaldo na restante prova produzida nos autos, que foi justamente no sentido de confirmar a existência de uma relação de distribuição entre as Recorrentes e a Recorrida, ao longo de cerca de 26 anos. X. Aliás, todos os depoimentos prestados em juízo – mesmo sendo de testemunhas arroladas pelas Recorrentes, funcionários ou ex-funcionários destas – confirmaram ou deram como adquirido e incontestado o facto de as Partes terem mantido uma relação de distribuição de mais de 26 anos. Assim: (a) Depôs nesse sentido o Senhor TL. , testemunha arrolada pelas Rés, que prestou depoimento no dia 14 de Fevereiro de 2018, pelas 15 horas, concretamente aos minutos 00:03:40 - 00:04:09 e, depois, 00:24:22; (b) No mesmo sentido disse o SS, testemunha arrolada pelas Rés, no dia 14 de Fevereiro de 2018, pelas 15:54 horas, concretamente aos minutos 00:07:02 - 00:07:28 “não sei exatamente a duração exata do contrato, não sei se terá 23 ou 26, mas aproximadamente foi isto, foi portanto engarrafador e distribuidor nosso na Madeira”; (c) Também assim depôs NF, testemunha arrolada pela Autora, que prestou depoimento no dia 28 de Fevereiro de 2018, pelas 14:37 horas, concretamente aos minutos 01:13:50 - 01:14:27. (d) Igualmente, disse MC testemunha arrolada pelas Rés, que prestou depoimento no dia 28 de Fevereiro de 2018, pelas 16:44 horas, concretamente aos minutos 00:07:46 - 00:09:02, que: “contrato com a companhia por 20 anos ou 25 anos que eles tinham contrato e cancelaram o contrato”. (e) Também MS, representante legal da Autora, que prestou declarações de parte no dia 14 de Março de 2018, pelas 14:15 horas, aos minutos 00:45:07 - 00:45:23, confirmou a duração e configuração dessa relação nos mesmos termos em que as testemunhas inquiridas. Y. Por conseguinte, seja por força da ficta confessio, seja porque resultou igualmente da produção de prova que i) A relação contratual entre as partes iniciou-se em 1977; ii) manteve a sua identidade e contornos ao longo dos vários anos; iii) e desenvolveu-se como uma única e coerente relação comercial, não pode este Venerando Tribunal alterar os factos assentes sob os pontos 4., 60., 84. da fundamentação de facto, ademais sob pena de violação do artigo 574..°, n.° 2 do CPC. QUANTO AOS FACTOS CONSTANTES DOS PONTOS 67. A 69. DA FUNDAMENTAÇÃO DE FACTO Z. Pedem as Recorrentes a sua eliminação do elenco dos factos assentes porque – dizem - não podiam ter sido dados como assentes por confissão, por se tratar de “factos para cuja prova a lei exige um documento escrito”. AA. Este argumento não tem suporte legal, nomeadamente no 364.º do CC: nestes pontos de facto estão assentes os resultados da actividade comercial da Recorrida – e já não qualquer declaração negocial ou negócio –, pelo que o referido preceito não é, sequer, aplicável a esta realidade. BB. Seja por isso, seja pelo próprio regime legal da escrita comercial – do qual resulta que o próprio comerciante pode invocar outros meios de prova contra o que constar da sua escrita (cfr. artigo 380.º do CC) – é evidente que a confissão das Recorrentes é prova bastante para dar como assente o resultado dessa actividade (que, aliás, estas conheciam). CC. Donde, não pode proceder a eliminação pretendida pelas Recorrentes, dos pontos 67. a 69. da fundamentação de facto, sob pena de violação do disposto no artigo 574.°, n.° 2 do CPC e, outrossim, do artigo 380.° do CC. No que respeita à decisão do Tribunal a quo sobre a matéria de direito, temos que, dos factos assentes com os aditamentos subsidiariamente requeridos, resulta inelutavelmente a manutenção da Sentença recorrida, conforme as seguintes conclusões de direito: DD. É ponto assente entre as Partes deste litígio – assim alegou a Autora ora Recorrida e nunca foi isso contestado ou questionado agora em sede de Alegações pelas ora Recorrentes – de que a relação contratual entres as Partes cessou e que daí podem (e devem) ser extraídas consequências. Aliás, consequências essas que o Tribunal a quo bem extraiu, e que devem ser mantidas na íntegra. EE. A operabilidade da indemnização de clientela depende da verificação de um primeiro pressuposto negativo - "Não é devida indemnização de clientela se o contrato tiver cessado por razões imputáveis ao agente (...)" (n.º 2 do artigo 33.° do Regime do Contrato de Agência). FF. Tratando-se de um pressuposto negativo, a alegação e prova dos factos susceptíveis de preencher a facti species deste preceito cabia às Rés, ora Recorrentes (cfr. artigo 342.°, n.° 2, do CC) – o que não fizeram. GG. Pelo contrário, a Autora ora Recorrida demonstrou que o denominado Bottler’s Agreement em vigor entre as Partes cessou em 22 de Outubro de 2003, por caducidade – o que alegou na Petição Inicial, juntando o Documento n.° 6, e que as Recorrentes confessaram, não impugnando. HH. Assim, bem andou o Tribunal a quo ao dar como provado que “por carta datada de 19 de agosto de 2003 foi comunicada à Autora a cessação do contrato, por caducidade, ao abrigo do estipulado na sua cláusula 26.ª (a)” (cfr. ponto 49 da fundamentação de facto) – que, de resto, não foi impugnado pelas Recorrentes neste recurso. II. Pelo que a conclusão do Tribunal a quo quanto à causa de cessação do contrato – sendo a única compatível com aquele facto assente – é de manter sob pena de, decidindo em contrário, a decisão assim tirada – além de entrar em contradição insanável com a fundamentação de facto assente (como já vimos) – violar o disposto nos artigos 342.º, n.º 2, do CC, 33.º, n.º 3, do Regime do Contrato de Agência e, outrossim, nos artigos 801.º, 432.º, n.º 1, e 436º.º, n.º 1, do CC. JJ. Donde, está, eliminado o primeiro obstáculo ao arbitramento da uma indemnização de clientela. Resta saber se a convocação desse instituto tem cabimento no caso em apreço, como forma de preencher a lacuna de regulação do conflito de interesses gerado pela cessação do contrato que existiu entre as Recorrentes e Recorrida. KK. Sendo um parêntesis, importa notar que, para efeitos de integração analógica de uma lacuna detectada, é irrelevante o nomen juris da relação contratual para cujo conflito de interesses se equaciona uma solução por analogia. Em todo o caso, dos caracteres da relação havida e da forma como ela se desenvolveu resulta sem escolhos que se tratou de uma concessão comercial, modalidade de contrato de distribuição. LL. Isto porque é na “teleologia imanente” da lei, ou de determinado complexo normativo, que se concluirá pela necessidade de, por razões de coerência e unidade do sistema, aplicar a o mesmo complexo a certo caso “omisso” - e, neste caso, essa aplicação faz sentido e é necessária por razões de coerência e igualdade. MM. Justamente porque a teleologia imanente do instituto da indemnização de clientela materializa a preocupação do sistema jurídico em corrigir a situação de súbito desaproveitamento, pelo agente, de excedentes produtivos que fez por gerar, removendo o diferencial de ganho decorrente da falta de equivalência, entre o principal e o agente, quanto à possibilidade de aproveitamento futuro das vantagens que vierem a surgir pela existência passada daquela relação contratual. NN. E, no caso presente, a cessação do contrato de havido entre as partes faz surgir uma situação de conflito de interesses paralelo ou isomorfo que justifica a adopção do mesmo critério valorativo como solução: (a) Porque a Recorrida esteve integrada na rede de produção e de distribuição das Recorrentes, durante mais de 25 anos – fazia investimentos exigidos por estas e tinha metas de qualidade a atingir fixadas por estas; (b) Porque a Recorrida não só angariou clientela, como criou, a partir do zero, um mercado para os refrigerantes do grupo C... , conquistando para esses produtos uma quota de mercado de 40,3% e mais de 3.000 clientes; (c) Porque logo que o contrato cessou e a nova distribuição se iniciou por mão da nova concessionária, esta manteve os mesmos níveis de venda que antes a EM havia alcançado, tendo por base – até hoje – a rede de clientes angariada por aquela; (d) E, por seu turno, que a Recorrida, com essa cessação, deixou de auferir qualquer retribuição por contratos negociados ou concluídos após a cessação do contrato, relativamente a produtos das marcas das Recorrentes, ficando todo o excedente produtivo gerado pelos frutos do seu trabalho até então nas mãos (e disponibilidade) destas. OO. Portanto, a cessação desta relação gera uma situação de conflito de interesses em tudo semelhante à que para o agente resulta da cessação do contrato de agência e que, por isso, reclama que a composição desse [deste!] conflito se faça segundo o critério valorativo adoptado pelo legislador para aquele caso análogo (da agência): i.e. mediante a atribuição ao concessionário de uma indemnização de clientela. PP. Sob pena de, assim não se concluindo, se violar o disposto no artigo 10.º, n.º 2, do código civil e, outrossim, os artigos 33.º e 34.º do Regime do Contrato de Agência. Prosseguindo, QQ. Demonstrada a ratio in concreto para a sua aplicação analógica, certo é que estão também verificados os pressupostos legais de que depende o arbitramento da indemnização de clientela, tal como eximiamente constatou a Sentença recorrida. Concretizando cada um deles: RR. Quanto ao requisito do artigo 33.º, n.º 1 do Regime do Contrato de Agência, de que a Recorrida “tenha angariado novos clientes para a outra parte”, os factos assentes e não contestados pelas Recorrentes e outrossim os factos resultantes da instrução da causa preenchem inelutavelmente essa facti species. SS. Porque, com início em 1977, a EM. foi a primeira distribuidora de produtos C... no Arquipélago da Madeira, e criou e desenvolveu um mercado ex novo para aqueles produtos. TT. Porque a EM conseguiu conquistar uma quota de mercado de 40,3% em 2003 (face a uma quota de 0% no início da relação). UU. Porque a Recorrida EM angariou e fidelizou para as Recorrentes 3000 clientes (que estas mantém até hoje), e conseguiu colocar o produto destas em praticamente todos os pontos de venda existentes no Arquipélago da Madeira. VV. Porque, em suma, toda a clientela da C... no Arquipélago da Madeira foi angariada pela EM, e devido ao trabalho desenvolvido unicamente por ela, WW. Assim tendo concluído, e bem, a Sentença recorrida pela verificação do primeiro requisito do artigo 33.º, n.º 1 do Regime do Contrato de Agência. XX. Depois, quanto ao requisito da alínea b) do artigo 33.º, n.º1 do Regime do Contrato de Agência) exige-se que “[a] outra parte venha a beneficiar consideravelmente, após a cessação do contrato, da actividade desenvolvida” – o que igualmente se demonstrou ter acontecido. YY. Sendo que, para efeitos do seu preenchimento (ou não) é irrelevante que o aproveitamento da posição de vantagem no mercado e da respectiva Clientela, se faça pela mão própria das Recorrentes ou, indirectamente, através de uma nova concessionária, como sucedeu no caso dos autos. ZZ. Assim como não tem cabimento na hipótese legal pelas Recorrentes a necessidade de demonstração de um prejuízo na esfera da Recorrida: a indemnização não é por perda de clientela. AAA. Por outro lado, e ainda, é totalmente irrelevante para obstar ao preenchimento da previsão da norma a circunstância de ora Recorrida continuar a exercer actividade própria de distribuição de bebidas, refrigerantes e outras – tanto mais que não foi acordado aquando da cessação qualquer pacto de não concorrência. Assim – no que importa - as Recorrentes beneficiaram consideravelmente, após a cessação do contrato, da actividade desenvolvida pela Recorrida BBB. Porque, após a cessação do contrato a marca C... detinha uma força tal que reunia 40,3% de quota de mercado: com uma preponderância e resistência que foi um ponto de partida vantajoso para a nova distribuidora. CCC. Porque, no ano de 2004 - primeiro ano completo posterior à cessação do Contrato – a nova concessionária R... teve um volume de vendas idêntico àquele obtido pela EM no último ano completo de distribuição por esta. DDD. E porque após a cessação do Contrato com a EM, a nova concessionária R... manteve – e mantém até hoje – a rede de clientes angariada pela Recorrida, a quem continuou, sem rupturas, a vender os produtos das marcas das Recorrentes. EEE. Por conseguinte, os números conquistados põe em evidência a “«continuidade de clientela» susceptível de «continuar» a beneficiar o concedente”, gerador de um benefício considerável – e efectivo (não só prognóstico) a favor das Recorrentes, preenchendo a hipótese legal do artigo 33.º, n.º 1 do Regime do Contrato de Agência. Por fim, FFF. Como último requisito da atribuição de uma indemnização de clientela, terá o concessionário – a ora Recorrida EM. –, que não receber “retribuição por contratos negociados ou concluídos, após a cessação do contrato” (alínea c) do artigo 33.º, n.º1 do Regime do Contrato de Agência). GGG. Sendo que obsta ao preenchimento da factis species deste preceito a alegação das Recorrentes de que a Recorrida, sim, beneficiou posteriormente do Contrato, por ter ficado ligada à marca C... . Os rendimentos mencionados são totalmente alheios ao contrato de concessão que existiu entre as Partes. HHH. Ademais, e de qualquer forma, nem pode o Venerando Tribunal relevar a referida alegação das Recorrentes: é matéria de facto que não foi alegada e, por isso, não existe no processo – dele não se podem extrair quaisquer conclusões de direito. O que importa e preenche a previsão da norma é que III. Não houve lugar a pagamento de qualquer compensação por parte das Recorrentes após a cessação do Contrato, nem mesmo após a comunicação nesse sentido feita pela Recorrida, que lograsse obter o referido efeito de reposição do equilíbrio pós-contratual. Em face do exposto, JJJ. E preenchidos que estão todos os requisitos de que depende o arbitramento da indemnização de clientela – como, aliás, bem decidiu o Tribunal a quo – forçoso é que este Venerando Tribunal mantenha essa mesma conclusão, sob pena de violação do disposto no artigo 33.º, n.º 1, do Regime do Contrato de Agência e, outrossim, no artigo 10.º, n.ºs 1 e 2, do CC. Prosseguindo, KKK. No contrato de concessão comercial, valor relevante para a determinação do montante máximo da indemnização de clientela, previsto no artigo 34.º do Decreto-Lei n.º 178/86, corresponde ao lucro bruto da actividade de distribuição comercial desenvolvida pelo concessionário (ou as vendas líquidas dos custos das mercadorias vendidas) – neste sentido se tem pronunciado a doutrina e a jurisprudência (vejam-se, por exemplo, os acórdãos do Tribunal da Relação de Lisboa de 21.04.2005 e de 09.03.2006, disponíveis em www.dgsi.pt, e dos acórdãos do Tribunal da Relação de Coimbra de 26.11.96, disponíveis na Colectânea de Jurisprudência, Ano XXI, Tomo V, 1996, pp. 31-34, e de 10.01.2006, disponível em www.dgsi.pt). LLL. A aplicação analógica do regime da agência impõe que se considere, no caso da concessão comercial, que o valor relevante para a determinação do limite máximo da indemnização de clientela corresponde ao lucro bruto da actividade do concessionário, pois que, no caso da agência, o valor relevante para esse efeito, corresponde, também, às retribuições auferidas sem qualquer dedução. MMM. No caso dos autos, a Recorrida, além da distribuição, tinha também a produção de alguns produtos para revenda. Neste caso, a ser considerado o lucro líquido da actividade, a Recorrida seria prejudicada no seguinte: quanto mais produzisse mais custos de produção teria a deduzir ao lucro da actividade logo, menor seria o montante de referência para efeitos do artigo 34.º do Decreto-Lei n.° 187/86. NNN. Ao ter considerado que, para efeitos de determinação do montante máximo da indemnização de clientela, releva apenas o lucro líquido da actividade da Recorrida, a sentença recorrida enferma de erro de julgamento por violação do disposto no artigo 34.º do Decreto-Lei n.º 187/86. OOO. Pelo que, diferentemente, este venerando Tribunal (deve?) considerar como tecto máximo do montante da indemnização de clientela peticionada a média dos últimos cinco anos do lucro bruto da actividade da Recorrida (ou, o mesmo é dizer, das vendas líquidas do custo das mercadorias vendidas). E mesmo que assim não se entenda, PPP. Nenhuma razão assiste às Recorrentes quando alegam que a prova das rubricas financeiras consideradas pelo Tribunal a quo careciam de ser provadas por documento, prova essa que não foi carreada para os autos. QQQ. Não resulta do Código Comercial, ou de qualquer outro normativo, que as rubricas financeiras (i.e., as margens brutas) só possam ser provadas por documento. Ora, inexistindo formalidade ad probationem que se imponha in casu, o meio de prova usado – a confissão – não só é possível, como de resto sempre seria admissível (cfr. artigo 364.º, n.º 2, do CC), pelo que bem foram dados como provados nos termos do artigo 574.º, n.º 2 do CPC, aqueles factos relativos às margens. RRR. Por outro lado, as respectivas margens relevam tão-somente como tecto máximo da indemnização de clientela; não são pressuposto do direito à referida indemnização nem consubstanciam o critério aferidor do específico quantum indemnizatório, o qual é apurado com recurso à equidade. Nisto, alegações das Recorrentes também em nada beliscam o direito da Recorrida já garantido e que, como bem aferiu o Tribunal a quo, se cifra no valor de € 2.000.000,00. Adiante, SSS. A determinação do quantum, em concreto, da indemnização de clientela deve ser feita com base na equidade, tendo como limite máximo a média anual do lucro bruto do concessionário nos últimos cinco anos. Da determinação segundo a equidade não resulta, porém, que o julgador possa decidir como entender, sem observar bitolas prefixadas de decisão. TTT. No caso, a remissão para a equidade não pode extravasar os pressupostos do artigo 33.º do Decreto-Lei n.º 187/86, devendo, pois, ser consideradas as perdas sofridas pelo concessionário e os benefícios que o concedente continua a auferir em resultado da actividade do primeiro, considerando, nessa equação, os factos que ao longo do contrato façam pender o quantum indemnizatório para o seu limite mínimo e, bem assim, aqueloutros que o façam aproximar do tecto máximo. UUU. Quanto às perdas, para a Recorrida, fruto do terminus da relação, de um passo, e aos benefícios para as Recorrentes, em exclusivo, fruto da anterior actividade da Recorrida, de outro passo, provou-se que: (a) Com excepção do ano de 1998, a Recorrida nunca recebeu menos de € 2.200.000,00 por ano como retribuição da sua actividade (por referência às margens brutas), sendo que a média anual dos últimos anos correspondia até ao montante de € 2.870130,00; Com toda a probabilidade, é essa a retribuição que deixou de receber por ano em virtude da cessação do contrato; (b) A actual rede de clientes das Recorrentes no Arquipélago da Madeira, por via da nova concessionária, mantém-se praticamente inalterada e bem assim, o volume de vendas alcançado logo em 2004, pelo que se deve pressupor que esta beneficia de uma margem anual média também de € 2.870.130,00; VVV. Depois, ficaram provados vários factos que forem – e devem continuar a ser –, e bem, ponderados em benefício da Recorrida: (a) O contrato durou mais de 26 anos. (b) À média das margens brutas da ora Recorrida nos 5 anos anteriores à cessação do contrato corresponde um total de € 2.870130,00 (cfr. pontos 67., 68. e 69. da fundamentação de facto). (c)A Recorrida foi a primeira distribuidora dos produtos C... em Portugal, mormente, no Arquipélago da Madeira (cfr. ponto 51. da fundamentação de facto). (d) A Recorrida desenvolveu uma rede de clientes que cobria praticamente todo o território da região atribuída, angariando mais de 3000 clientes (cfr. pontos 52., 53. e 54. da fundamentação de facto). (e) Os produtos da marca C... tornaram-se crescentemente reconhecidos e desejados naquele território numa altura em que as marcas concorrentes estavam também com forte presença naquele mercado; destaque-se o R. rante C... que, em 2003, logrou conquistar uma quota de mercado de 40,3% (cfr. pontos 56., 57. e 58. da fundamentação de facto). (f) Assim que cessou o contrato com a ora Recorrida, a distribuição dos produtos C... foi imediatamente assegurada por uma nova concessionária – a R.. – e cuja rede de distribuição sempre se baseou na clientela angariada pela Recorrida (cfr. pontos 60. e 61. da fundamentação de facto). Ficou ainda demonstrado, tal como resulta da Sentença recorrida – e cujo aditamento à matéria de facto assente se requereu à cautela, que: (g) Alguns valiosos recursos humanos da AM. transitaram, nesse altura, para a equipa da nova concessionária; (h) Nunca se verificou uma interrupção de vendas dos produtos C... nos pontos de venda onde eles já haviam sido colocados pela AM. ; (i) De tal modo que as Recorrentes não sentiram qualquer corte abrupto no volume de vendas nos anos posteriores. (j) Mas, pelo contrário, a actividade operacional da ora Recorrida sofreu um significativo decréscimo nos anos seguintes, com prejuízos na ordem dos 20%. VVV. Em face de toda a referida matéria assente e dos factos instrumentais que resultaram da instrução da causa, a par da necessária análise dialogada desses factos, própria do julgamento de equidade, bem resolveu o Tribunal a quo em definir o quantum indemnizatório devido à Recorrida AM. em € 2.000.000,00. Por fim, XXX. Sendo devida uma indemnização de clientela como vimos que é, as Recorrentes constituíram-se em mora quanto à obrigação de pagamento da indemnização de clientela desde a interpelação para pagamento feita pela Recorrida às Recorrentes, nos termos do artigo 33.º, n.º 4 do Decreto-Lei n.º 187/86. É desde essa data – in casu, 26 de Julho de 2004 – que a obrigação de pagamento da indemnização de clientela vence juros, nos termos dos artigos 805.º, n.º 1, 804.º, n.º 1, e 806.º, n.º do Código Civil. Neste sentido veja-se o acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa, de 06.12.2011, disponível em www.dgsi.pt. YYY. Ainda que assim não se considere sempre serão devidos juros desde a citação das Recorrentes para a acção, nos termos do artigo 805.º, n.º 3 do Código Civil, porque, in casu, a falta de liquidez é imputável às Recorrentes: a elas cabia o ónus de alegação e prova de que a falta de cumprimento da obrigação de indemnização de clientela não procede de culpa sua - ónus que não cumpriram porque nem sequer contestaram. É, pois, desde a citação que se vencem juros sobre a indemnização de clientela. Neste sentido veja-se o Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça, de 13.05.2004, disponível em www.dgsi.pt. ZZZ. A sentença recorrida, por assim não ter decidido, violou, em primeira linha, o disposto no artigo 33.º, n.º 4 do Decreto-Lei n.º 187/86 e nos artigos 805.º, n.º 1, 804.º, n.º 1, e 806.º, n.º do Código Civil. Subsidiariamente, a sentença recorrida violou o disposto nos artigos 805.º, n.º 3, 799.º, n.º 1, 804.º, n.º 1, e 806.º, n.º 1, todos do Código Civil, padecendo, em qualquer caso, nessa parte, de erro de julgamento. I.3. Como é sabido, o âmbito objectivo do recurso é definido pelas conclusões dos recorrentes, importando, assim, decidir as questões nelas colocadas e, bem assim, as que forem de conhecimento oficioso, exceptuando-se aquelas cuja decisão fique prejudicada pela solução dada a outras, nos termos dos arts. º 608.º, 635.º e 639.º, do CPC. Assim, considerando as conclusões das apelantes, as questões essenciais a decidir consistem em saber: A. No contexto da apelação (i) quanto ao recurso de facto, se deveriam ter sido considerados provados os pontos I e II da matéria não provada e se os pontos 4, 5, 67, 68, 69 e 84 dos factos provados deveriam ter sido considerados não provados; [4, 60 e 84 para correcção e 67 a 69 – para eliminação] relativamente ao facto 60, deve ser eliminada a referência a “como distribuidora”; (ii) A. no contexto da apelação, se (a) no âmbito do recurso de direito, como deve qualificar-se o contrato celebrado entre as partes e se (b) estão preenchidos os pressupostos da indemnização de clientela; (c) se há défice de fundamentação do quantum indemnizatório fixado pelo tribunal e se (d) os juros devem ser contados a partir não da data da prolação da decisão, mas apenas após o trânsito em julgado da eventual decisão final condenatória que venha a ser proferida em sede de recurso; B. no contexto da ampliação do objecto da apelação (iii) se é de ampliar a matéria de facto com factos que resultaram da instrução da causa e se (iv) (a) é de conhecer dos pressupostos da atribuição da indemnização com fundamento em enriquecimento sem causa; (b) para determinação do tecto máximo da indemnização de clientela a arbitrar, deve fazer-se tendo por referência (como constituindo a “retribuição” do concessionário) o valor médio da margem bruta (ou vendas líquidas) referente aos últimos 5 anos de duração do contrato; (c) o dies a quo da contagem dos juros de mora sobre o montante da indemnização fixada, é o da interpelação das Recorrentes para o pagamento da indemnização de clientela ou, no limite, o dia da citação destas para a presente acção (i.e. o dia da interpelação judicial das Recorrentes). II. FUNDAMENTAÇÃO II.1. Dos factos Em primeira instância foram dados como provados os seguintes factos: 1. A Autora dedica-se ao fabrico e comércio por grosso de bebidas; 2. As Rés são sociedades comerciais de direito americano constituídas sob as leis do Estado de Delaware, que se dedicam, além do mais, à produção e comercialização de bebidas; 3. As Rés fazem parte do grupo económico C... ; 4. Em 1977, A. e RR. celebraram um contrato que, mutatis mutandis, corresponde ao que consta dos pontos 6 e seguintes da matéria de facto[1]; 5. O contrato foi sendo sucessivamente renovado, por períodos de cinco anos; 6. Em 22 de outubro de 1997, Autora e Rés assinaram o denominado “Contrato de Engarrafador” (cfr. documento de fls. 56 a 78 / 79 a 120, cujo teor aqui se dá por integralmente reproduzido); 7. Dispõe a cláusula 26.ª (a) deste contrato: “Este contrato produzirá efeitos a partir de 22 de Outubro de 1997 e cessará, sem pré-aviso, em 22 de Outubro de 2002, excepto se tiver sido rescindido nos termos aqui estabelecidos. (...)”; 8. Nos termos do contrato, a Autora obrigou-se a promover e vender os produtos das Rés, fazendo-o de modo estável e autónomo, através da sua estrutura empresarial, numa zona determinada – o Arquipélago da Madeira – mediante uma retribuição, constituída pelas margens de lucro conseguidas com a venda dos produtos das Rés; 9. A distribuição dos produtos C... no Arquipélago da Madeira era feita do seguinte modo: a) Produção e distribuição de produtos a partir de xaropes concentrados fornecidos por empresas do Grupo C... (AI e VC): C... , C... L. S., FL, FLI e FA, sendo que o preço dos xaropes concentrados vendidos à Autora era fixado pelas empresas vendedoras do Grupo C... ; e b) Distribuição de produtos finais fornecidos pelas Rés ou outras empresas por elas indicadas: todos os enlatados e PET de C... , C... L., C... Sem Cafeína, NM, N., AM., FSO, FM e Aq., cujo preço era fixado pelas Rés e pelas empresas do Grupo C... ; 10. A Autora colocava os produtos no comércio retalhista e nos estabelecimentos hoteleiros ou de restauração; 11. Desde o início da relação contratual com as Rés e até 2001, a Autora estruturou a sua atividade de distribuição dos produtos das Rés através de uma empresa, por si detida a 100 %, para colocação dos produtos C... no mercado: D… do Funchal, Lda., a qual adquiria os produtos à Autora e os colocava no mercado; 12. Este procedimento foi seguido ao longo dos anos com o conhecimento e sem oposição das Rés; 13. Em fevereiro de 2002, a atividade da D. , Lda., foi integrada, por meio de contrato denominado de trespasse, na Autora; 14. A Autora, sendo responsável pela promoção dos produtos das Rés no Arquipélago da Madeira, pela prospeção do mercado e angariação de clientela para aqueles produtos, estava obrigada a informar as Rés sobre a situação desse mesmo mercado, nomeadamente sobre as vendas e sobre clientes; 15. Em 28 de janeiro de 2002, a Autora enviou uma carta ao Presidente da Divisão Ibérica da C... , solicitando a renovação do contrato, à semelhança do que sempre sucedera (cfr. documento de fls. 121, cujo teor aqui se dá por reproduzido); 16. As Rés responderam através da carta de 18 de março de 2002 (cfr. documento de fls. 225 a 229, cujo teor aqui se dá por integralmente reproduzido), na qual manifestaram descontentamento sobre o modo como a Autora estava a executar o contrato, tendo condicionado a renovação do mesmo à apresentação por parte da Autora, no prazo de 60 dias, de uma proposta com as ações adequadas a satisfazer as exigências das Rés; 17. Esta carta das Rés, datada de 18 de março de 2002, foi recebida pela Autora em 20 de maio de 2002; 18. Por carta datada de 31 de maio de 2002 (cfr. documento de fls. 230, cujo teor aqui se dá por integralmente reproduzido), a Autora respondeu a tal carta; 19. As questões suscitadas pelas Rés na carta referida no ponto 17 eram relativas aos níveis de qualidade da fábrica da Autora no Funchal e aos níveis de vendas atingidos; 20. Para dar resposta à primeira das questões, a Autora, de imediato, solicitou os serviços de uma entidade externa especializada, a empresa espanhola Co.., que elaborou um Estudo de Qualidade denominado “Estudio Calidad Planta do Funchal Madeira”, datado de 25 de junho de 2002 (cfr. documento de fls. 213 a 224, cujo teor aqui se dá por integralmente reproduzido); 21. Nesse estudo concluiu-se, nomeadamente, que desde outubro de 2001 se observava ”uma melhoria e tendência positiva no Índice de Qualidade do Produto que deve levar a Fábrica a alcançar os valores do Índice de acordo com os objectivos fixados pela C... ”; 22. Igualmente se concluiu que a execução das ações sugeridas pelo estudo ajudaria a manter e melhorar os referidos índices de qualidade; 23. Que a Autora estava a realizar um ”grande esforço” para acabar de implantar todo o sistema documental necessário para poder dar execução ao Sistema de Qualidade da C... . 24. E que se constatava e comprovava uma disposição muito adequada de todo o pessoal técnico para melhorar todo o sistema de qualidade, com a finalidade de poder cumprir com todas as exigências da C... ; 25. A Autora remeteu às Rés a carta datada de 19 de julho de 2002 (cfr. documento de fls. 238 a 240, cujo teor aqui se dá por integralmente reproduzido), juntando a esta carta o mencionado Estudo de Qualidade efetuado pela CO.., tendo aí rebatido as críticas das Rés quanto aos níveis de vendas, evidenciando, nomeadamente, que a Autora atingira os objetivos de volumes de vendas da C... no ano anterior (2001), bem como a Autora detinha o mais elevado índice de consumo per capita de produtos C... , em Portugal, e que os produtos C... eram a primeira marca no ranking das bebidas vendidas pela Autora; 26. As Rés responderam à Autora através da carta datada de 2 de agosto de 2002 (cfr. documento de fls. 241 e 242, cujo teor aqui se dá por reproduzido), na qual solicitaram um compromisso à Autora para atingir os objetivos quanto aos índices de qualidade, bem como informação mais detalhada sobre o volume de vendas; 27. Em 4 de outubro de 2002, teve lugar em Madrid uma reunião entre representantes da Autora e das Rés; 28. Dessa reunião resultou um acordo sobre as ações e objetivos que a Autora teria de desenvolver e cumprir; 29. Por carta datada de 11 de outubro de 2002, as Rés comunicaram à Autora a prorrogação do contrato por mais um ano, até 22 de outubro de 2003 (cfr. documento de fls. 123, cujo teor aqui se dá por reproduzido); 30. As Rés enviaram à Autora a carta datada de 14 de novembro de 2002 (cfr. documento de fls. 243 a 248, cujo teor aqui se dá por integralmente reproduzido), na qual precisaram os objetivos a prosseguir pela Autora com vista à renovação do contrato, sendo o primeiro ponto suscitado pelas Rés o relativo às alterações havidas na estrutura acionista da Autora, o segundo ponto relativo aos parâmetros de qualidade e o terceiro relativo ao volume de vendas e, no final da carta, as Rés informaram a Autora da renovação do contrato até 22 de outubro de 2003, juntando a respetiva comunicação; 31. Estabeleceram as condições objetivas para a renovação do contrato: ”A avaliação será baseada na informação recebida relativamente aos detentores das acções da AM. e nos resultados do vosso empenho em gerir com sucesso a qualidade e os negócios da C... na Madeira, nos termos referidos nesta carta”; 32. A Autora respondeu através das cartas datadas de 22 de novembro de 2002 e 25 de novembro de 2002, aceitando a renovação do contrato nos termos propostos pelas Rés e reiterando o seu empenho na execução do contrato (cfr. documentos de fls. 249 e 250, cujos teores aqui se dão por reproduzidos); 33. As Rés estavam cientes de que a Autora, para atingir os objetivos propostos, teria de proceder a investimentos com retorno a médio e longo prazo; 34. Quanto ao ponto relativo à composição acionista da Autora, esta deu o esclarecimento na carta enviada às Rés e datada de 8 de janeiro de 2003 (cfr. documento de fls. 251 a 254, cujo teor aqui se dá por integralmente reproduzido); 35. Tal esclarecimento já tinha sido dado verbalmente, nomeadamente na reunião de Madrid em 4 de outubro de 2002; 36. Na mesma carta datada de 8 de janeiro de 2003, a Autora informa as Rés do seguinte: ”In our commitment to achieve the quality goals set by the C... Iberian Division, we have implemented an investment program with the objective of improving our operational conditions and which are in conformity with the program presented in Madrid on October 4, 2002, as well as the eight points of your letter of November 14, 2002”; 37. Com essa carta, a Autora juntou um “Plano de Acções Corrigido” (“Corrective Actions Plan”) evidenciando todas as ações já concluídas e as ações em curso; 38. As Rés e as empresas do Grupo C... foram sendo informadas destas suas ações, bem como da realização das despesas tidas; 39. A Autora conseguiu obter, no primeiro semestre de 2003, a certificação ISO 14001 e ISO 9001; 40. As Rés autorizaram a Autora, em 18 de março de 2003, a produzir e distribuir mais um produto C... – a FA…; 41. A Autora enviou às Rés a carta datada de 7 de abril de 2003, na qual expressou que reforçava o seu comprometimento com os mais elevados padrões de qualidade pretendidos pelas Rés e solicitou a renovação do contrato até 22 de outubro de 2008; 42. As Rés não responderam a esta carta de imediato; 43. Faltava à Autora ainda obter as certificações requeridas pelo Grupo C... , as denominadas “T…S” e “aK…”; 44. A Autora prosseguiu o seu programa de investimentos para obter tais certificações; 45. Em maio de 2003, teve lugar uma primeira auditoria, promovida pelo Grupo C... , com o objetivo de avaliar a situação da fábrica e dos procedimentos seguidos pela Autora para efeitos das certificações em falta; 46. Nessa ocasião, foi transmitido pelos técnicos das Rés à Autora as ações que havia ainda a fazer; 47. E ficou acordado que uma última auditoria teria lugar em outubro, sendo consensual que, até outubro, era possível à Autora concluir os procedimentos que ainda se encontravam em falta, havendo até algumas das ações projetadas com data de conclusão prevista para 2004 e 2005; 48. Em nenhuma circunstância as Rés pressionaram a Autora ou lhe deram um prazo para concluir o que, no seu entender, poderia estar em atraso; 49. Em 19 de agosto de 2003, por carta dirigida pela 1.ª Ré à Autora, aquela comunicou a esta que o contrato cessaria, para tanto invocando o disposto na cláusula 26.ª (c), isto é, a caducidade (cfr. documento de fls. 135 a 137, cujo teor aqui se dá por reproduzido), na qual adianta, como motivos da sua decisão de não renovação do contrato, o facto de a Autora não ter solicitado consentimento prévio às Rés para a alteração da sua composição acionista, alude igualmente à obrigação da Autora em obter o certificado T…S no primeiro trimestre desse ano e, ainda, que o desempenho comercial da Autora havia sido insuficiente; 50. A Autora respondeu à carta das Rés, através da carta de 17 de outubro de 2003, dirigida à 1.ª Ré, na qual rebate as acusações que a 1.ª Ré lhe fizera ao comunicar a caducidade do contrato (cfr. documento de fls. 138 a 141, cujo teor aqui se dá por reproduzido); 51. Antes da celebração do contrato com a Autora, as Rés não comercializavam, por si ou por intermédio de agentes ou distribuidores, os seus produtos em Portugal, sendo que a C... chegou primeiro ao Arquipélago da Madeira do que ao território continental; 52. A rede de clientes que a Autora criou para os produtos das Rés cobria praticamente todo o Arquipélago da Madeira; 53. A Autora angariou os clientes constantes do documento de fls. 142 a 199, cujo teor aqui se dá por integralmente reproduzido; 54. Em 2003, ano em que cessou o contrato, a Autora havia angariado mais de 3000 clientes para os produtos das Rés; 55. O mérito da atividade da Autora foi expressamente reconhecido pelas Rés por mais do que uma vez; 56. Os produtos das Rés passaram a ser conhecidos e consumidos no Arquipélago da Madeira de modo crescente relativamente à data de início da execução do contrato; 57. Os produtos das Rés, em especial a “C... ”, de uma quota de 0 %, passaram, ao fim de 26 anos, a deter uma quota de mercado de 40,3 % no mercado dos R. .. com gás (cfr. dados da Consultora AC N…); 58. Numa altura em que a concorrência de produtos como a P. e 7UP era mais forte e em que todo o mercado de R. …, em especial dos R. … com gás, diminuiu o volume de vendas (11 % em relação a 2002); 59. Em 2002, a Autora comercializou cerca de 9 426 273 (milhões) de litros de produtos das Rés; 60. Cessado o contrato, as Rés continuam a vender os seus produtos no Arquipélago da Madeira, tendo substituído a Autora por uma outra empresa, a R. Madeira, sociedade subsidiária da R. , S.A., que já detinha contrato de engarrafamento e comercialização de produtos C... para Portugal continental[2]; 61. A atual rede de clientes dos produtos das Rés no Arquipélago da Madeira é baseada na rede de clientes que a Autora angariou até à cessação do contrato; 62. A Autora comunicou às Rés, por faxes datados de 26 de julho de 2004, a sua pretensão de receber a indemnização de clientela a que tem direito, bem como a de ser compensada a outros títulos; 63. Reiterou o teor daquela comunicação por carta registada com aviso de receção datada de 26 de julho de 2004; 64. As Rés receberam os referidos faxes e carta em 26 de julho de 2004 e 29 de julho de 2004, respetivamente; 65. As Rés não pagaram à Autora aquela indemnização, nem na data da cessação do contrato, nem posteriormente; 66. Tendo respondido, via fax, em 30 de setembro 2004, que consideravam não estarem reunidos os pressupostos do artigo 33.° do Decreto-Lei n.º 178/86, de 3 de julho (cfr. documento de fls. 211 e 212, cujo teor aqui se dá por reproduzido); 67. A média do produto das vendas das Rés pela Autora, nos cinco anos anteriores à cessação do contrato (isto é, de 1998 a 2003), ascende a € 8 723 765,00, para tanto se considerando os seguintes volumes de vendas de produtos das Rés (arredondados): 1998: € 5 478 635,00; 1999: € 6 511 215,00; 2000: € 6 944 143,00; 2001: € 8 172 369,00; 2002: € 8 731 553,00; 2003 (até 22 de outubro): € 7 780 910,00; 68. A que correspondem as seguintes margens da Autora: 1998: € 1 390 548,00; 1999: € 2 236 949,00; 2000: € 2 747 695,00; 2001: € 3 160 393,00; 2002: € 3 253 622,00; 2003 (até 22 de outubro): € 2 723 233,00; 69. A média de margem bruta da Autora para aquelas vendas é de € 2 870 730,00 (apurada relativamente aos produtos adquiridos na forma final a AI. e VC. pela diferença aritmética entre o valor de venda líquido de descontos, abatimentos e devoluções e o custo dos produtos vendidos, onde se inclui o preço de compra da mercadoria, bem como os custos para a colocar no seu estado atual, no local de armazenagem, nomeadamente custos com transportes, desalfandegamento, impostos de importação, seguros e outros); 70. A Autora não recebeu qualquer retribuição por contratos negociados ou concluídos após a cessação do contrato relativamente a produtos C... ; 71. Em julho de 1996 as Rés convidaram o Sr. Dr. DP, como sócio da AM. (Autora), a integrar a comitiva VIP da C... aos Jogos Olímpicos de Atlanta; 72. A certificação T…S era concedida pelas próprias Rés; 73. A certificação T…s só estava aprovada para seis das 15 distribuidoras integradas na Divisão Ibérica da C... ; 74. O próprio distribuidor para a Região de Lisboa não tinha ainda obtido tal certificado; 75. Em agosto de 2003 a Autora tinha um índice de qualidade da embalagem de 93 % para um objetivo de 91 %; 76. E tinha um índice de qualidade do produto de 92 %, quando o objetivo a atingir era de 95 %, mas apenas no final desse ano de 2003; 77. Em novembro de 2002 a Autora assumiu perante as Rés o compromisso comercial de obter um crescimento de vendas de 10 %; 78. Em agosto de 2003 o crescimento de vendas dos produtos das Rés era de 7 %, superior ao crescimento dos produtos C... registado em Portugal continental (cerca de 4 %); 79. O consumo per capita, a distribuição numérica e a quota de mercado era, em agosto de 2003, superior no Arquipélago da Madeira relativamente a Portugal continental; 80. Entre novembro de 2002 e 19 de agosto de 2003, com o objetivo de satisfazer as exigências fixadas pelas Rés na carta de 14 de novembro de 2002, a Autora investiu, nomeadamente em equipamento de redução de dureza da água, filtros purificadores, medidor de oxigénio, um contentor cisterna de C02 e edificação de uma sala de tratamento, no valor de cerca de € 290 000,00; 81. Em 2001 a Autora procedeu a investimentos de médio e longo prazo; 82. Em 2002 a Autora prosseguiu tais investimentos; 83. A Autora despendeu quantias em equipamentos e serviços destinados a satisfazer as exigências das Rés com vista ao engarrafamento e distribuição dos produtos da marca C... , valores esses que, líquidos de IVA, ascendem a: no ano de 2001: € 444 979,77; no ano de 2002 (até outubro): € 520 413,00; 84. A Autora investiu, ao longo dos 26 anos que durou o contrato, quantias em publicidade e promoção dos produtos das Rés; 85. Atendendo à especificidade dos investimentos em publicidade e marketing, o retorno, em regra, é obtido a curto prazo, um ano; 86. A Autora investiu, por imposição das Rés, no patrocínio da iniciativa “Portugal a Cantar”, tendo suportado os custos com a produção do espetáculo no Funchal, no valor de € 23 871,25, bem como com o alojamento dos participantes, no valor de € 3 510,00, e com a promoção do espetáculo, incluindo anúncios na imprensa, no valor de € 3 243,56; 87. O evento referido teve lugar no dia 23 de agosto de 2003; 88. As Rés não hesitaram em exigir que a Autora suportasse estes custos; 89. Para além desta ação, a Autora, durante o ano de 2003, gastou ainda € 200 136,40 em diversos produtos e serviços de marketing e publicidade, nomeadamente cartazes, copos, t-shirts, expositores, etc.; 90. Por força da não renovação do contrato, a Autora, a partir de 23 de outubro de 2003, ficou impedida de comercializar qualquer produto das Rés, ficando estas obrigadas a adquirir todos os produtos e embalagens em stock; 91. As Rés apenas concluíram a compra dos stocks em junho de 2004, sendo que, por parte da Autora, todas as condições para a libertação dos stocks estavam preenchidas no final do contrato (22 de outubro de 2003); 92. Em 30 de dezembro de 2008, a Autora assinou um contrato de produção e distribuição com a sociedade “S. + Compal”, com início dos seus efeitos em fevereiro de 2009; 93. Esta sociedade detém os direitos de produção e comercialização da marca P. em Portugal (juntamente com as marcas S. , ..UP e Lipton); 94. As instalações da Autora, para além da sua produção própria, passaram, em fevereiro de 2009, a ser utilizadas para a comercialização da P.; 95. A P. é a maior concorrente direta das Rés (nos RC); as marcas ..UP, L.. e S. concorrem, respetivamente, com S.., N.. e F…. Este tribunal considera ainda provado que: 96. No âmbito do contrato, cumpria a A., nomeadamente: (a) Preparar, embalar, distribuir e vender as quantidades de cada uma das bebidas que satisfaçam integralmente, em todos os aspectos, cada pedido relativamente a cada uma das Bebidas dentro do Território; (b) Desenvolver todos os esforços e empregar todos os meios testados, práticos e aprovados de desenvolver e explorar todo o potencial do negócio de preparação, embalagem, comercialização e distribuição de cada uma das Bebidas em todo o Território através da criação, promoção e expansão permanente da procura futura relativamente a cada uma das Bebidas e da satisfação integral e em todos os aspetos da procura existente; (c) Investir todo o capital e incorrer a todas as despesas necessárias à organização, instalação, operação, manutenção e substituição dentro do Território das instalações e equipamentos de fabrico, armazenagem, comercialização, distribuição, entrega, transporte e outros que sejam necessários ao cumprimento (…do) Contrato; (d) Proporcionar gestão competente e bem preparada, e recrutar, formar, manter e dirigir todo o pessoal necessário, e suficiente em todos os aspetos, ao cumprimento de todas as obrigações dos Engarrafador ao abrigo (…do) Contrato; (e) Não vender e/ou distribuir as Bebidas sem o consentimento prévio da Sociedade, fora do Território ou a qualquer pessoa que pretenda revender as Bebidas fora do Território; esta proibição não será aplicável se o Território for um Estado-Membro ou dentro de um Estado-Membro da Área Económica Europeia e a venda resultar de uma encomenda de um cliente em outro Estado-Membro ou para exportação para outro Estado-Membro; (f) Não procurar ativamente clientes nem manter uma sucursal fora do Território; contudo o Engarrafador terá o direito de satisfazer encomendas espontâneas de Bebidas de qualquer cliente situado dentro de outro Estado-Membro ou para a exportação para outro Estado-Membro da Área Económica Europeia (cláusula 6ª). 97. No tocante às condições de venda, cumpria ao Engarrafador, nomeadamente, de acordo com as disposições do contrato, comprar as Bases de Bebidas necessárias à preparação e embalagem das Bebidas unicamente à Sociedade ou aos Fornecedores Autorizados (cláusula 24ª). Em primeira instância foram dados como não provados os seguintes factos: I. Poucos anos volvidos após a cessação do contrato de produção e distribuição existente entre Autora e Rés, o know how e os investimentos realizados foram efetivamente transmitidos à P.; II. Sem qualquer benefício para as Rés, que tiveram de começar do zero no mercado da Ilha da Madeira; III. Os clientes institucionais da Autora na Madeira e Porto Santo passaram a abranger as marcas da “S. + C..” (incluindo a P.); IV. A Autora apresentou lucros nos últimos três anos (por referência à data de entrada do articulado superveniente – 3 de março de 2009). II.2. Fundamentação II.2.1. Recurso de facto A apelante insurge-se contra a matéria de facto, sustentando que deveriam ter sido considerados provados os pontos I e II da matéria não provada e não provados os pontos 4, 5, 67, 68, 69 e 84 dos factos provados e relativamente ao facto 60, considera que deve ser eliminada à expressão “como distribuidora”. A recorrida opôs-se. Quanto aos factos não provados sob os números I. e II. São do seguinte teor os mencionados factos não provados: I. Poucos anos volvidos após a cessação do contrato de produção e distribuição existente entre Autora e Rés, o know how e os investimentos realizados foram efetivamente transmitidos à P.; II. Sem qualquer benefício para as Rés, que tiveram de começar do zero no mercado da Ilha da Madeira. Quanto ao ponto I As recorrentes convocam o depoimento das testemunhas TSL, responsável pelas relações públicas das recorrentes à data dos factos e SRS. , que desempenhava as funções de secretário geral da C... Ibérica, para Espanha, Portugal e França; ADSA, que foi gestor comercial na empresa R... Madeira, desde o início da sua actividade no arquipélago, e que sucedeu às recorrentes, tendo começado a comercializar os produtos das recorrentes desde Outubro de 2003; MMC , que desempenhou as funções de gerente de operações de marketing para Portugal entre 2001 e 2005 e MJLS, legal representante da recorrida. Todavia, não assiste razão às recorrentes. Com efeito e começando pelo depoimento de TSL, verificamos que esta testemunha não foi categórica ao referir-se à transferência de know how. Neste âmbito, limitou-se a fazer uma mera conjetura, como o inculca a seguinte passagem do interrogatório da mesma testemunha: “Mandatário das recorrentes: Olhe é possível que esse know how adquirido ao longo de vinte cinco anos depois tenha sido aproveitado para distribuir produtos que são os vossos principais concorrentes.” “Testemunha: Eu diria que sim” (fls. 3385). Idêntica leitura fazemos do depoimento da testemunha SRS. que, perante o interrogatório do ilustre mandatário das recorrentes, respondeu em castelhano do qual foi feita a seguinte tradução: “Eu penso que sim porque ao longo destes anos aos engarrafadores é-lhes ensinado as técnicas de marketing, técnicas de vendas, técnicas de fabricação aos níveis óptimos assim como dá-lhes acesso a um conjunto de compra conjunta de matérias primas com açúcar, as latas, os vidros, os plásticos, tudo isto é feito para que os engarrafadores tenham a melhor posição relativamente ao mercado de vender os nosso produtos é-lhes passado e ensinado as nossas estratégias de venda, as nossas estratégias de marketing” (fls. 3387) . Ora deste depoimento resulta claramente que a testemunha se limitou a conjeturar uma realidade, a partir do conhecimento de alguns factos que, a nosso ver, não legitimam qualquer inferência por parte do tribunal nesse sentido. Saber se a A. operou a questionada transferência de know how, é precisamente a questão que temos de investigar. Às testemunhas cumpre depor com objetividade, cabendo ao tribunal retirar as ilações pertinentes. Quanto ao depoimento da testemunha ADSA, o mesmo assenta no desconhecimento, como o demonstra a seguinte resposta à pergunta do ilustre mandatário das recorrentes sobre o aproveitamento da vantagem das formações e know how passado pelas recorrentes à recorrida: “Não sei, mas o know how não é um estalar de dedos. A formação técnica e isso tudo não é um estalar de dedos. As pessoas quando, como é que hei-de dizer, quando aprendem, sempre ficam algumas partes agora, não sei se aplicaram ou não aplicaram, está a perceber?”. É verdade que se limitou a responder à pergunta do ilustre mandatário dos recorrentes no sentido de que: “Sim, o que eu lhe estou a perguntar era que se acontecesse no seu caso, não é se aproveitaria ou se não aproveitaria, no fundo é isso, não é?”(fls. 3390). Ora, como se vê a pergunta está formulada em termos conjeturais, como o denota o tempo de verbo no conjuntivo e, além disso, temos de concluir que se trata de uma resposta sem qualquer espontaneidade. Por estas duas razões, não será de valorizar este depoimento no assinalado contexto. Por seu turno, a testemunha MMC , quando depôs sobre o processo de distribuição da C... e sobre a logística que isso envolve, a mesmo fê-lo de forma genérica e não referente ao caso em concreto. E neste caso é muito importante a concretização do know how que foi efectivamente transferido pelas recorrentes para a A. visto que esta é uma empresa que já operava no mercado dos refrigerantes na R.A.M., havia largas décadas. Por isso, era necessário concretizar que tipo de know how foi efectivamente transferido para a A.. Ora, a testemunha limitou-se, como se disse, a depor de forma genérica (fls.3392). Diferentemente da pretensão das recorrentes, aliás, a este propósito a testemunha IF depôs no sentido de que quem era a criadora de know how era a própria AM. (fls.3531). No mesmo sentido depôs a testemunha MJLS, quando referiu que a A. opera no mercado há cerca de 146 anos, período em que “acumulámos mais do que know how sobre todo o nosso negócio (…). E, portanto, ninguém nos podia levar isso, nós é que temos isso. Por sua vez, no âmbito do depoimento desta mesma testemunha, as recorrentes pretendem retirar que a recorrida “utilizou equipamento para a produção do produto próprio BC (sucedâneo da C... ) entre pelo menos 2005 e 2010 e, a partir de 2009 para a produção de P. e …Up (os principais concorrentes dos produtos das recorrentes)”. Ora, a testemunha sobre esta matéria, limitou-se a confirmar que “Entre 2003 e 2009 ficámos com uma folga muito grande de instalações” e “nós tínhamos oito milhões e seiscentos mil litros de C... e F… e, portanto ficamos com o espaço livre, o espaço e as linhas de enchimento e as cubas de produção e o pessoal”. E perguntada, a testemunha, sobre se “procuraram, então, preencher com estes novos produtos”, a mesma respondeu: “Não procuramos, nós fomos obrigados a ficar com eles para não perder a Compal”. Ora, a ideia de transmissão de know how, expressa no ponto I dos factos não provados, não se pode confundir com a transferência de know how alegada pelas recorrentes. O conceito de know how é, aliás, um conceito complexo, conforme nos dá conta, nomeadamente, Maria Gabriela de Oliveira Figueiredo Dias[3], na busca dum conteúdo mínimo desta manifestação da vida social, com base na empiria. Entre as pistas apontadas por esta autora, sempre com a reserva de que se trata de um conceito aberto, sobressaem os conhecimentos transmitidos e o seu carácter reservado, por respeitar ao conteúdo do negócio de uma determinada empresa. Pode desdobrar-se em conhecimentos de carácter industrial, organizativo e tecnológico ou comercial[4]. Como se vê, os depoimentos das referenciadas testemunhas não permitem concluir pela transferência de know how nem pela transferência de investimentos da recorrida para empresas concorrentes das RR., uma vez que o representante da recorrida contextualiza o depoimento no âmbito de uma folga muito grande de instalações que foram aproveitadas posteriormente. De modo algum é, pois, aceitável que este aproveitamento se possa confundir com uma transferência de investimento para uma empresa concorrente. Quanto ao ponto II As recorrentes convocam o depoimento das testemunhas TSL, SRS. , RMD., que exerceu as funções de analista financeiro da C... desde 2003 (com exceção dos anos que decorreram entre 2004 e 2006) e ADSA. Adiante-se desde já que não pode ser reconhecida razão às recorrentes. Vejamos porquê. As recorrentes pretendem não ter tido qualquer ganho com a actividade da recorrida após a cessação do contrato entre as partes e que tiveram de começar do zero para se relançarem no mercado da R.A.M.. No entanto, afigura-se-nos que a pretensão das recorrentes, a proceder, entraria em colisão com os factos 60 e 61 dados como provados e não objeto do presente recurso (a não ser como se viu o facto nº 60, mas, ainda assim, numa parte que não belisca a matéria aqui em causa). Com efeito, por comodidade de leitura, transcrevem-se aqui estes mencionados factos: 60. Cessado o contrato, as Rés continuam a vender os seus produtos no Arquipélago da Madeira, tendo substituído a Autora, como distribuidora, por uma outra empresa, a R... Madeira, sociedade subsidiária da R. , S.A., que já detinha contrato de engarrafamento e comercialização de produtos C... para Portugal continental; 61. A atual rede de clientes dos produtos das Rés no Arquipélago da Madeira é baseada na rede de clientes que a Autora angariou até à cessação do contrato. Ora, perante estes factos intocados[5] e, tendo em atenção a conexão entre os pontos I e II da matéria não provada, tendo-se dado como não provado o ponto I, naturalmente que, não estando demonstrado o objeto (ponto I), esvaziado fica necessariamente o ponto II. Contudo, não deixarão de se apontar, neste âmbito, algumas fragilidades aos depoimentos das testemunhas supra indicadas. Com efeito, começando pelo depoimento da testemunha TSL nenhuma passagem do depoimento é propriamente reveladora de um recomeço por parte das recorrentes, após a cessação do contrato, como se até aí não tivesse havido qualquer implantação no mercado dos produtos em questão. Com efeito, perante a pergunta do ilustre mandatário das recorrentes acerca do que é começar do zero, a testemunha explicou que: “começa por constituir uma empresa, a R... Madeira, contratar pessoas, contratar um armazém, começar a ir aos pontos de venda e abrir os clientes, ou seja, no fundo é quase como entrar num mercado de novo, isso foi o que aconteceu” (fls.3397) e a testemunha referiu não ter sido fácil o período inicial (fls.3398). Como se vê, desta mesma passagem retira-se que subsistiram os “pontos de venda”. Ora, após cessação do contrato, da iniciativa das RR., é lógico que as coisas não poderiam permanecer como até aí, a menos que o contrato desse cobertura a alguma obrigação que se projetasse para além da sua vigência – o que não é o caso. Também no que tange a testemunha SRS., segundo a tradução, referiu que: “a responsabilidade de criar uma nova rede de distribuição e também de venda porque a AM. a nós não nos deu portanto o know how que devíamos saber para essa rede de distribuição”. Esta afirmação é desdita pelo consignado nos citados pontos 60 e 61 que, como se disse, no essencial, não foram questionados e que aqui não poderão ser objeto de qualquer alteração por este tribunal, por não haver suporte na pretensão expressa formulada por qualquer uma das partes. Esta inalterabilidade sai aqui reforçada, até porque há que salvaguardar as consequências do efeito cominatório semipleno que deriva do desentranhamento da contestação. Por seu turno, no que refere à testemunha RMD. , é verdade que a mesma, segundo a tradução, referiu que: “parte desta caída [redução dos volumes de vendas] é directamente imputável à perda de uma rede de distribuição em que o engarrafador teve que reconstruir essas relações depois, por outro lado, é certo que ouve também uma crise e também nos afetou tanto em Espanha como em Portugal e isso também afetou as vendas. No entanto, esta testemunha acaba por dar duas explicações para a redução do volume de vendas das RR.: a perda de uma rede de distribuição mas também a crise que afetou o mercado em Espanha e em Portugal, o que retira peso à explicação das recorrentes para a perda da rede de distribuição. Por fim, no que refere à testemunha ADSA, é verdade que a mesma aludiu à situação das recorrentes após a cessação do contrato, referindo que: “estávamos com as portas todas fechadas, os equipamentos de frio que eram da C... estavam transformados em B…, depois lançaram a BC… e a BC L. , os clientes fecharam-nos as portas”. Esta testemunha, perante a pergunta sobre se os frigoríficos não tinham sido devolvidos à C... , esclareceu não saber (fls.3409). A mesma referiu dificuldades de reconquista do mercado mas respondeu afirmativamente à pergunta sobre se os postos de venda se mantêm estáveis e se é só uma questão de menos litros (fls. 3584). Acresce que aquelas afirmações não são corroboradas pelos depoimentos de outras testemunhas que depuseram sobre esta matéria, como é o caso da testemunha MGO. que respondeu afirmativamente à pergunta sobre se “a R. passou a distribuir C... nos pontos de venda onde antes a AM. tinha distribuído” (fls. 3538). No mesmo sentido depôs a testemunha IF , que referiu que: “os produtos estavam lá (…) produtos C... em 100% de pontos de venda, praticamente não havia um único ponto de venda que não tinha C... . Quando a empresa monta a (…) R. (…esta) deu continuidade ao trabalho que a AM. deu até agora, portanto, do ponto de vista da presença de produtos no mercado, não começaram do zero de certeza absoluta (fls.3539). Em idêntico sentido depôs a testemunha NBF. (fls.3540). Acresce que sempre valeriam aqui as razões atrás expostas: o depoimento não teria potencial para neutralizar o efeito cominatório semipleno que deriva do desentranhamento da contestação. Neste âmbito, como é sabido, são considerados como confessados os factos alegados pelo autor (art.567º/1, in fine, CPC), considerando-se no nº2 in fine que a causa será julgada conforme for de direito. Quanto à crítica dos pontos 4, 5, 60, 67, 68, 69 e 84 que a sentença considerou provados. Antes de avançarmos e, como de resto é também assinalado pela decisão recorrida, uma vez que foi desentranhada a contestação, a consequência é a prevista nos arts. 567º nº1 in fine e 574º nº2, uma vez que não estamos perante qualquer das exceções previstas pelo art.568º do CPC, importando, pois, manter presentes as consequências do cominatório semipleno. Vejamos então os factos sob crítica. Quanto ao facto nº 4 É do seguinte teor o facto nº4 Em 1977, Autora e Rés celebraram um contrato de produção e distribuição exclusiva dos produtos das Rés. Entendem as recorrentes que tal matéria não tem um teor factual, antes sendo de qualificação jurídica, pelo que não poderia o tribunal ter dade como aprovado o facto nº4 qua tale, antes devendo cingir-se a que “Em 1977, A. e RR. celebraram um contrato” (fls. 3423 e 3424). Concorda-se inteiramente com o entendimento de que a matéria consignada pelo ponto 4 é em parte matéria de direito, constituindo qualificação jurídica a asserção de que estamos perante um contrato de produção e distribuição. De todo o modo, também nos parece curta a formulação sugerida pelas RR., porquanto a matéria de facto não é estanque, podendo e devendo haver articulação entre os vários pontos em que ela se desdobra. É verdade que os pontos 6 e seguintes apenas se referem a uma das sucessivas renovações quinquenais da versão inicial do contrato. Todavia, não está o tribunal impedido de inferir factos não diretamente provados, a partir de outros que se encontram provados. Ora estando provado que “o contrato foi sendo sucessivamente renovado por períodos de cinco anos” (ponto 5) e não tendo sobrevindo nada que contrarie este entendimento, é de aceitar que a renovação que teve lugar em 1997 e para que remetem os pontos 6 e seguintes, é, no essencial, o decalque da formulação do contrato celebrado em 1977. Aliás, o termo renovação inculca a ideia de uma repetição, quando muito, com alteração de pontos que não atingem o núcleo base que qualifica o contrato, como sejam as cláusulas que atualizam preços. Nesta conformidade, e partindo da aceitação das RR., como vimos, de que o contrato foi celebrado em 1977, é legítimo, a nosso ver, inferir que: “Em 1977, A. e RR. celebraram um contrato que, mutatis mutandis, corresponde ao que consta dos pontos 6 e seguintes da matéria de facto”. Será, pois, esta a redação alterada do ponto 4. Quanto ao facto nº 5 O contrato foi sendo renovado sucessivamente, por períodos de cinco anos. Não obstante as RR. no corpo das alegações convocarem o ponto 5 dos factos, a verdade é que, além de não terem tratado especificamente desta matéria, não a levam às conclusões. Consequentemente, nada há a decidir sobre este ponto. Quanto ao facto nº 60 É do seguinte teor o ponto 60 dos factos: Cessado o contrato, as Rés continuam a vender os seus produtos no Arquipélago da Madeira, tendo substituído a Autora, como distribuidora, por uma outra empresa, a R. Madeira, sociedade subsidiária da R. , S.A., que já detinha contrato de engarrafamento e comercialização de produtos C... para Portugal continental. Na linha da crítica ao ponto 4, as RR. pretendem que seja eliminada a referência à expressão “como distribuidora”, por se tratar de uma conclusão jurídica. E na verdade assim é, valendo aqui idênticos argumentos aos que deixamos consignados a propósito do ponto 4. Nesta conformidade o ponto 60 passará a ter a seguinte redação: Cessado o contrato, as Rés continuam a vender os seus produtos no Arquipélago da Madeira, tendo substituído a Autora por uma outra empresa, a R. Madeira, sociedade subsidiária da R. , S.A., que já detinha contrato de engarrafamento e comercialização de produtos C... para Portugal continental. Quanto aos factos nºs 67, 68 e 69 São do seguinte teor os referidos pontos de facto: 67- A média do produto das vendas das Rés pela Autora, nos cinco anos anteriores à cessação do contrato (isto é, de 1998 a 2003), ascende a € 8 723 765,00, para tanto se considerando os seguintes volumes de vendas de produtos das Rés (arredondados): 1998: € 5 478 635,00; 1999: € 6 511 215,00; 2000: € 6 944 143,00; 2001: € 8 172 369,00; 2002: € 8 731 553,00; 2003 (até 22 de outubro): € 7 780 910,00. 68- A que correspondem as seguintes margens da Autora: 1998: € 1 390 548,00; 1999: € 2 236 949,00; 2000: € 2 747 695,00; 2001: € 3 160 393,00; 2002: € 3 253 622,00; 2003 (até 22 de outubro): € 2 723 233,00. 69- A média de margem bruta da Autora para aquelas vendas é de € 2 870 730,00 (apurada relativamente aos produtos adquiridos na forma final a AI. e VC… pela diferença aritmética entre o valor de venda líquido de descontos, abatimentos e devoluções e o custo dos produtos vendidos, onde se inclui o preço de compra da mercadoria, bem como os custos para a colocar no seu estado atual, no local de armazenagem, nomeadamente custos com transportes, desalfandegamento, impostos de importação, seguros e outros). Entendem, as RR., que esta matéria corresponde a factos para cuja prova a lei exige documentos escritos, “como resulta da conjugação dos art.29º e seguintes do Código Comercial com o art.364º do Código Civil - artigo 485º, d) do Cód. de Proc. Civil”. Como tal, esta matéria não poderia ter sido considerada provada. Não assiste, todavia, qualquer razão às RR. porquanto, não há base legal para uma tal exigência, visto que a escrita mercantil constitui uma formalidade não constitutiva dos negócios de compra e venda para que remetem os indicados pontos da matéria de facto (média do produto das vendas entre 1998 e 2003; margens de recorrida nesse período e média da margem bruta da recorrida para as mesmas vendas). Na verdade, a escrituração comercial não constitui uma formalidade ad substantiam, mas uma formalidade ad probationem. Nessa medida, a ausência de comprovativo da escrita comercial não tem a virtualidade de beliscar o efeito cominatório semipleno com base no qual foi fixada a matéria de facto. Nesta conformidade, visto o art.º 574º, nº2 CPC, terão de ficar intocados os assinalados pontos da matéria de facto. Quanto ao facto nº 84 É do seguinte teor o ponto 84 dos factos: A Autora investiu, ao longo dos 26 anos que durou o contrato, quantias em publicidade e promoção dos produtos das Rés; As RR. questionam que o contrato de 1997, documentado nos autos, corresponda ao contrato celebrado em 1977. Todavia, as RR. não questionam que foi efetivamente celebrado um contrato entre as partes em 1977 e que tal contrato foi sendo sucessivamente renovado por períodos de cinco anos (ponto 5 dos factos). Ora, nesta conformidade, e face ao que acima ficou exposto, do nosso ponto de vista, assistia ao juiz a quo não apenas a prerrogativa, mas o dever de extrair a ilição que retirou. II.2. Apreciação Jurídica Relembra-se que as questões a discutir consistem em saber se: (i) - como deve qualificar-se o contrato celebrado entre as partes; (ii) - estão preenchidos os pressupostos da indemnização de clientela; (iii) - se há défice de fundamentação do quantum indemnizatório fixado pelo tribunal e se; (iv) - os juros devem ser contados a partir não da data da prolação da decisão, mas apenas após o trânsito em julgado da eventual decisão final condenatória que venha a ser proferida em sede de recurso; II.1. Quanto à qualificação do contrato As recorrentes entendem que o contrato dos autos não é um contrato de concessão comercial, mas um contrato de engarrafador, cujo figurino não abarca a aplicação analógica do contrato de agência. Com efeito, dizem, as recorrentes, que foram postas à disposição da recorrida matérias-primas específicas (xaropes das fórmulas secretas, i.e., as bases das bebidas que, na ótica das recorrentes a sentença equipara incorrectamente aos bens comercializados pela recorrida), processos de fabricação e marcas, tendo as partes subscrito três obrigações concretas: (i) crescimento do negócio ao máximo das probabilidades; (ii) confiança e estabilidade na estrutura acionista da AM. e (iii) qualidade na elaboração dos produtos. As bebidas objeto do contrato eram produtos “C... ”, abrangendo quer a C... clássica quer a S…, assim como outros refrigerantes, nomeadamente a C... L., F.., N.. M… e N…. A recorrida comprava às recorrentes os xaropes necessários à produção das bebidas e procedia à composição das bebidas, engarrafamento e venda. Daqui retiram, as recorrentes, que a recorrida não distribuía os produtos da recorrente da marca C... em nome e representação desta última, agindo como agente económico independente e em nome próprio, sendo remunerado pelo lucro e não por comissão; a atividade promocional era também efectuada pelas recorrentes. Logo, na visão das recorrentes não se justifica a aplicação analógica do regime legal do contrato de agência. Por seu turno, a recorrida entende tratar-se de um contrato de distribuição, porquanto as Ts. estavam obrigadas a disponibilizar à AM. o produto acabado pronto a ser revendido, embora, em certos casos lhes fornecessem os ingredientes necessários para a produção de outros produtos, ficando a AM. também responsável pelo engarrafamento; a AM. detinha-se exclusivamente no território correspondente ao Arquipélago do Madeira; a AM. estava também adstrita a deveres de marketing e de publicidade. A primeira nota que importa deixar clara é que as relações comerciais havidas entre as partes, por cerca de vinte seis anos não pode confundir-se com o contrato de franquia, porquanto esta figura contratual constitui um tipo de contrato, que alguns situam historicamente na alta Idade Média, e depois, a partir dos EUA, expandiu-se para a Europa a partir da década de 70. A lei Portuguesa não define o que seja contrato de franquia. Quer a doutrina quer a jurisprudência têm desenvolvido uma orientação no sentido de que há “flexibilidade do conteúdo, uma vez que vem responder a duas ordens de necessidades económicas: - por um lado, as necessidades daqueles que, dispondo já de um mercado para um determinado produto ou serviço, pretendem implantar-se noutro mercado geograficamente distinto do primeiro, sem necessitarem de fazer o investimento correspondente a tal implantação; - por outro lado, o interesse do comerciante independente que pretende manter a sua autonomia económica e a sua independência jurídica, efectuando o correspondente investimento, e, simultaneamente, beneficiar da experiência e organização empresarial de outrem, em cuja rede de distribuição se integra”[6]. No plano da caracterização económica, costumam ser apontados alguns traços como inerentes a este contrato. Numa economia concorrencial as empresa procuram meios de se adaptarem às novas condições dos mercados, surgindo a necessidade de animus cooperandi, emergindo o franchising como método de colaboração entre sociedades independentes, mediante o qual o franqueador concede ao franqueado o direito de explorar uma marca, uma fórmula comercial, um método ou esquema industrial, um conjunto de bens, produtos ou serviços desenvolvidos pelo primeiro, bem como os conhecimentos e a experiência no desenvolvimento e na exploração da atividade objeto da franquia[7]. Em matéria de contrapartidas pelo franqueado a doutrina tem-se referido aos direitos de entrada que consistem no pagamento de um preço para ingressar na rede de franquia, o qual funciona como caução, destinada a proteger o franqueador (quando transmite o seu saber-fazer a este) e à motivação dos candidatos. Além disso, o franqueador compensa o franqueado pagando-lhe direitos proporcionais ao volume de negócios, as royalties, sobre forma de prestações periódicas, mensais ou trimestrais[8]. Na jurisprudência, encontramos inúmeros acórdãos que aludem ao contrato de franquia como sendo um contrato que se distingue da concessão comercial pelo facto de o franqueado se obrigar a vender o produto, bem ou serviços do franqueador, mediante contrapartida, denominada royalty, aceitando certas obrigações, mormente, no que concerne à sua organização, à política comercial e à assistência a prestar a clientes, e, sujeitando-se a um certo controlo e fiscalização[9]. Importa aqui tornar ainda mais explícita a diferença entre franquia e concessão comercial: o franchising é muito mais amplo que a concessão comercial, embora haja áreas de sobreposição. Uma das diferenças está na utilização de bens imateriais na titularidade do franqueador. O concessionário, ao contrário, tem um nome e insígnia próprios. Outra diferença está na remuneração: o franqueador recebe um pagamento, enquanto o concedente participa nos lucros[10]. No caso dos autos, como o ilustra a matéria de facto: 8. Nos termos do contrato, a Autora obrigou-se a promover e vender os produtos das Rés, fazendo-o de modo estável e autónomo, através da sua estrutura empresarial, numa zona determinada – o Arquipélago da Madeira – mediante uma retribuição, constituída pelas margens de lucro conseguidas com a venda dos produtos das Rés; 9. A distribuição dos produtos C... no Arquipélago da Madeira era feita do seguinte modo: a) Produção e distribuição de produtos a partir de xaropes concentrados fornecidos por empresas do Grupo C... (AI e VC): C... , C... L. , S. , FL. , FLi. e FA. , sendo que o preço dos xaropes concentrados vendidos à Autora era fixado pelas empresas vendedoras do Grupo C... ; e b) Distribuição de produtos finais fornecidos pelas Rés ou outras empresas por elas indicadas: todos os enlatados e PET de C... , C... L. , C... Sem Cafeína, NM., N., .AM. , FSO. , FM. e Aq., cujo preço era fixado pelas Rés e pelas empresas do Grupo C... ; 10. A Autora colocava os produtos no comércio retalhista e nos estabelecimentos hoteleiros ou de restauração; 11. Desde o início da relação contratual com as Rés e até 2001, a Autora estruturou a sua atividade de distribuição dos produtos das Rés através de uma empresa, por si detida a 100 %, para colocação dos produtos C... no mercado: D. – Distribuidora de CR do Funchal, Lda., a qual adquiria os produtos à Autora e os colocava no mercado; 12. Este procedimento foi seguido ao longo dos anos com o conhecimento e sem oposição das Rés. Como se vê, os elementos acabados de transcrever denotam que não poderemos considerar o contrato dos autos como contrato de franquia, visto que, a recorrida, enquanto putativa franqueada, manteve as suas insígnias continuando a ser conhecida na RAM como AM. e não consta terem sido pagas quaisquer royalties, além de que não consta da matéria de facto que lhe tenha sido exigida qualquer quantia inicial para garantir a sua entrada na rede. Concretamente sobre a definição de contrato de concessão comercial, a doutrina e a jurisprudência têm-se alinhado no sentido de que o mesmo integra uma das espécies do contrato de distribuição comercial [indirecta], firmado entre o fornecedor e um distribuidor que poderá destinar os produtos àquele adquiridos, a venda por grosso (para revenda) ou a retalho (em que o destinatário é o consumidor final). Assim, o produtor[11] pode recorrer aos seus empregados para distribuição directa dos bens ao consumidor final ou pode valer-se de um intermediário ou de uma cadeia de intermediários[12]. Neste caso, tem-se distinguido entre contratos de distribuição indirecta integrada em rede de distribuição comercial e contratos de distribuição indirecta não integrada desse modo[13]. A distribuição indirecta integrada supõe que o distribuidor, embora mantendo a sua independência e autonomia jurídica e suportando o risco da comercialização, “está integrado na empresa ou no grupo do produtor, com o qual coordena e articula a sua actividade, o que implica ter de seguir directrizes de vária ordem, sujeitar-se a uma certa orientação, controlo e fiscalização, e aceitar promover os bens e serviços que distribui […]. Segundo a mesma doutrina, este enquadramento é válido para o agente, o concessionário e o franquiado mas também, designadamente, para o distribuidor autorizado e o distribuidor selectivo[14]. Todavia, o produtor[15] - que pode utilizar nesse serviço os seus empregados, distribuindo directamente ao consumidor -, pode recorrer a “esquemas intermédios, utilizando pessoas independentes que […] colaborarão consigo de modo estável na distribuição dos bens: em grau maior ou menor estão nesta situação, entre outros, o agente, o concessionário e o franquiado”[16]. Ora a diversidade de espécies negociais abrangidas pela designação de contratos de distribuição conduz a que não lhes seja aplicável um regime jurídico uniforme, tudo dependendo do conteúdo específico das obrigações assumidas pelas partes e que, no seu conjunto, integram a função económico-social do contrato[17]. Neste domínio, apenas o contrato de agência está tipificado na lei[18], não obstante estarmos em presença de contratos socialmente típicos[19]. A doutrina dominante tem encarado este contrato como contrato quadro que será densificado através dos contratos de execução sucessivos de compra e venda dos bens em causa nos termos acordados. Assim, é esse contrato quadro […] que faz surgir entre as partes uma relação obrigacional complexa[20] cujos elementos caracterizadores terão de ser pesquisados na matéria de facto e que neste caso são: a) - a obrigação de o concedente vender ao concessionário/distribuidor e de este comprar, para revenda a terceiros, determinados produtos em quantidades e condições pré-estabelecidas, durante um certo período de tempo ou por prazo indeterminado, o que se reconduz a uma relação jurídica de vocação duradoura; b) – a actuação do distribuidor em nome e por conta própria, com a consequente assunção dos riscos de comercialização (com a aquisição da propriedade da mercadoria); c) – a vinculação recíproca das partes a outro tipo de obrigações dirigidas à integração do distribuidor na rede comercial do fornecedor, nomeadamente através da fixação de objectivos e metas comuns e de formas de controlo e fiscalização sobre a execução do contrato[21]. É verdade que nesse contexto negocial, no âmbito do contrato-quadro, as partes podem estipular cláusulas de exclusividade. Porém, como vem referido no acórdão citado, “segundo a doutrina portuguesa mais seguida, as cláusulas de exclusividade não constituem sequer elementos típicos do contrato de concessão. Neste particular, há quem caracterize esta obrigação como uma mera obrigação de meios, porquanto a consumação da revenda depende também da vontade de terceiros. Não falta, porém, quem defenda que, pelo menos nalguns casos, se trata ainda de uma obrigação de resultado, mormente quando o distribuidor se vincule a alcançar uma quota ou um coeficiente de penetração no mercado. Na linha do mesmo entendimento jurisprudencial e doutrinário, podemos dizer, então, que o núcleo essencial do contrato de concessão comercial traduz-se, por um lado, na compra e venda dos produtos destinados a revenda pelo concessionário – entidade independente e autónoma - e, por outro, na obrigação deste promover a venda desses mesmos produtos junto de terceiros, sendo, à partida, responsável pelos riscos da comercialização. É nesse contexto negocial que se desenrola a vinculação típica do contrato-quadro[22] que põe em relação e dá corpo aos interesses do fornecedor em escoar os seus produtos e ao distribuidor que, independente e autónomo, é responsável pelos riscos da comercialização. Com essas obrigações típicas podem coexistir outras obrigações que visam, em diferentes graus de intensidade, a integração do distribuidor na rede comercial do fornecedor[23], como acontece, por um lado, com aquelas que se prendem com a definição dos objectivos e prossecução da política comercial do concedente (expressas através da fixação de: quotas de compra e revenda; directrizes sobre publicidade; condições de exposição dos produtos e assistência pós-venda) e, por outro, com as obrigações de informação e de apoio ao concessionário, a cargo do concedente, necessárias à organização e promoção das vendas[24]. Definidos os critérios que enquadram esta espécie contratual, importa verificar, em concreto, o caso sub judicio. Adianta-se desde já que os contratuais denotam que a A. assumiu obrigações em coerência com a qualificação jurídica do contrato como contrato concessão comercial. Com efeito, provou-se que, por um lado, entre empresas juridicamente independentes, foi firmado o compromisso de celebração de contratos de compra e venda de Bases de Bebidas produzidas pela R. Sociedade, destinadas a que a A. as desenvolvesse e estimulasse e satisfizesse, em permanência e integralmente, a procura de cada uma das Bebidas dentro do território. Nesse âmbito, por outro lado, cumpria à A., nomeadamente: (g) preparar, embalar, distribuir e vender as quantidades de cada uma das bebidas que satisfizessem integralmente, em todos os aspectos, cada pedido relativamente a cada uma das Bebidas dentro do Território; (h) desenvolver todos os esforços e empregar todos os meios testados, práticos e aprovados de desenvolver e explorar todo o potencial do negócio de preparação, embalagem, comercialização e distribuição de cada uma das Bebidas, em todo o Território, através da criação, promoção e expansão permanente da procura futura relativamente a cada uma das Bebidas e da satisfação integral e em todos os aspetos da procura existente; (i) investir todo o capital e assumir todas as despesas necessárias à organização, instalação, operação, manutenção e substituição dentro do Território das instalações e equipamentos de fabrico, armazenagem, comercialização, distribuição, entrega, transporte e outros necessários ao cumprimento (…do) Contrato; (j) proporcionar a gestão competente e bem preparada, e recrutar, formar, manter e dirigir todo o pessoal necessário, e suficiente em todos os aspetos, ao cumprimento de todas as obrigações dos Engarrafador ao abrigo (…do) Contrato; (k) não vender e/ou distribuir as Bebidas sem o consentimento prévio da Sociedade, fora do Território ou a qualquer pessoa que pretendesse revender as Bebidas fora do Território; esta proibição não era aplicável se o Território fosse um Estado-Membro ou dentro de um Estado-Membro da Área Económica Europeia e a venda resultasse de uma encomenda de um cliente em outro Estado-Membro ou para exportação para outro Estado-Membro; (l) não procurar ativamente clientes nem manter uma sucursal fora do Território; contudo o Engarrafador tinha o direito de satisfazer encomendas espontâneas de Bebidas de qualquer cliente situado dentro de outro Estado-Membro ou para a exportação para outro Estado-Membro da Área Económica Europeia (cláusula 6ª). No tocante às condições de venda, cumpria ao Engarrafador, nomeadamente, de acordo com as disposições do contrato, comprar as Bases de Bebidas necessárias à preparação e embalagem das Bebidas unicamente à Sociedade ou aos Fornecedores Autorizados (cláusula 24ª). De todo o exposto deflui que se encontram presentes os elementos (obrigações) que identificam e estruturam o assinalado contrato de concessão comercial, na modalidade de distribuição, como é expressamente admitido pelos próprios termos do contrato: preparar, embalar, distribuir e vender as quantidades de cada uma das bebidas, sendo assumido pelas partes que efetivamente a A. colocava produtos nos postos de venda. Identicamente, valoriza-se aqui o facto de a mesma ter desenvolvido actividades de promoção dos produtos (bebidas, xaropes e concentrados) da fornecedora e angariação clientes, assim escoando certas quotas de bens da fornecedora, mediante o pagamento de um preço. Seria, então, através do lucro obtido na revenda que a A. se compensaria. Do nosso ponto de vista, estão assim, como se viu, presentes os elementos do contrato de concessão comercial, na modalidade de distribuição. Não obsta a essa qualificação a circunstância de haver algum papel de transformação do produto vendido pela R. Sociedade à A.. Na verdade a R. Sociedade vendia à A. a base que iria dar origem, depois de desdobrada pela A., ao produto final que constitui o produto comercializado pela R. junto do consumidor final. Portanto, o papel da A. era efectivamente o de um distribuidor, colocando os produtos comercializados pelas RR. junto dos postos de venda (depois de ter desdobrado as bases vendidas pela R. Sociedade), a fim de serem levados ao consumidor final. Isto é, nos termos sobreditos, está presente o núcleo dos elementos essenciais que caraterizam o contrato de distribuição, não bastando para a sua descaraterização o facto de haver algum papel transformador da matéria prima por parte da A.. Aqui chegados, resta verificar se estão presentes os pressupostos do direito à indemnização de clientela. II.2.2. Pressupostos do direito à indemnização de clientela. A A. peticionou o pagamento da quantia de €2.870.730.00, a título de indemnização de clientela. Vejamos. O direito a indemnização de clientela está previsto pelo artigo 33.º do Dec.-Lei n-º n.º 178/86, de 3 de Julho, na redacção dada pelo Dec.-Lei nº 118/93, de 13 de Abril, em cujo nº 1 se prevêem requisitos positivos, a provar pelo agente, […e] devem verificar-se cumulativamente[25], a saber: 1. Sem prejuízo de qualquer outra indemnização a que haja lugar, nos termos das disposições anteriores, o agente tem direito, após a cessação do contrato, a uma indemnização de clientela, desde que sejam preenchidos, cumulativamente, os seguintes requisitos: a) – O agente tenha angariado novos clientes para a outra parte ou aumentado substancialmente o volume de negócios com a clientela já existente; b) – A outra parte venha a beneficiar consideravelmente, após a cessação do contrato, da actividade desenvolvida pelo agente; c) – O agente deixe de receber qualquer retribuição por contratos negociados ou concluídos, após a cessação do contrato, com os clientes referidos na alínea a). (…) 3. Não é devida indemnização de clientela se o contrato tiver cessado por razões imputáveis ao agente ou se este, por acordo com a outra parte, houver cedido a terceiro a sua posição contratual. Não é objecto de controvérsia que um dos factos constitutivos do direito à dita indemnização consiste na cessação do contrato. No caso presente não se provou que o contrato tenha cessado por razões imputáveis à A.. Os factos mostram, antes, que o contrato se extinguiu por caducidade. Importará explicitar um pouco mais esta questão já que as recorrentes pretendem que o contrato em questão cessou por causa imputável à recorrida. A este propósito importa tem em consideração que estamos em presença de um contrato celebrado em 1977, o qual foi sendo sucessivamente renovado, até que as recorrentes, antes do términus previsto para a última renovação do contrato, enviaram à A. a carta referenciada no nº 49 dos factos e da qual se destaca: “Em 19 de agosto de 2003, por carta dirigida pela 1.ª Ré à Autora, aquela comunicou a esta que o contrato cessaria, para tanto invocando o disposto na cláusula 26.ª (c), isto é, a caducidade (cfr. documento de fls. 135 a 137, cujo teor aqui se dá por reproduzido), na qual adianta, como motivos da sua decisão de não renovação do contrato, o facto de a Autora não ter solicitado consentimento prévio às Rés para a alteração da sua composição acionista, alude igualmente à obrigação da Autora em obter o certificado TCCQS no primeiro trimestre desse ano e, ainda, que o desempenho comercial da Autora havia sido insuficiente”. Sabido que nos termos da renovação do contrato documentada nos autos a cessação do contrato estava prevista para 22 de Outubro de 2002 (fls. 96) e sabido também que foi acordado “que o Engarrafador não terá qualquer direito de invocar uma renovação tácita deste Contrato”, temos de concluir que o contrato cessou por ter caducado. Uma vez que também foi dado como provado que: “Por carta datada de 11 de Outubro de 2002, as Rés comunicaram à Autora a prorrogação do contrato por mais um ano, até 22 de Outubro de 2003 (cfr. documento de fls. 123, cujo teor aqui se dá por reproduzido)” – (nº 29 dos factos), verificamos que o contrato terminou justamente no termo do prazo prefixado para a prorrogação adicional. Assim, muito embora a mesma missiva tenha convocado outros fundamentos que não a caducidade e que poderiam integrar a figura da resolução contratual, acontece que a contestação foi mandada desentranhar e como tal toda a matéria que sobre esta questão foi alegada mostra-se coberta pelo efeito cominatório semipleno a que acima já nos referimos. Lembra-se que a caducidade é uma modalidade de extinção de relações jurídicas pelo simples decurso do tempo, isto é, trata-se de uma causa objetiva de cessação. Portanto, perante a realidade dos factos e circunstâncias processuais deste caso, sempre teríamos considerar o contrato cessado por caducidade. Assente que o contrato cessou por caducidade, cumpre agora prosseguir com a questão de saber se, atenta a natureza da indemnização em causa, é ou não de aplicar analogicamente o regime do contrato de agência ao presente contrato e, a posteriori importará verificar se estão presentes os assinalados requisitos, de que acima demos nota, a provar pelo agente (aqui distribuidora). No que tange à natureza, há divergência doutrinária acerca da ratio desta “indemnização de clientela”, havendo quem a encare como uma compensação ao agente pela mais-valia por ele proporcionada ao principal na medida em que este continue, após o contrato, a aproveitar-se da clientela angariada [orientação inerente ao modelo alemão]; outros autores há que lhe associam uma função ressarcitória pela perda das remunerações do agente com a cessação do contrato [orientação associada ao modelo francês][26]. [23]. A legislação portuguesa orientou-se pelo modelo alemão. De facto, como ensina o Professor Pinto Monteiro, a indemnização de clientela constitui “uma compensação pela mais-valia que […o agente] proporciona ao principal, graças à actividade desenvolvida […por ele], na medida em que o principal continue a aproveitar-se dos frutos dessa actividade, após o termo do contrato …”. E afirma ainda o ilustre Mestre que “não se trata, em rigor, de uma verdadeira indemnização, até porque não depende da prova, pelo agente, de danos sofridos. O que conta são os benefícios proporcionados pelo agente à outra parte, benefícios esses que, na vigência do contrato, eram de proveito comum, e que, após o seu termo, irão aproveitar apenas, unilateralmente ao principal …Mesmo que o agente não sofra danos, haverá um enriquecimento do principal que legitima e justifica uma compensação … Trata-se, pois, de uma medida mais próxima do instituto do enriquecimento sem causa do que da responsabilidade civil[27]. Tem-se discutido se este instituto é aplicável ao contrato de concessão comercial, visto que, enquanto que o concessionário, actua em seu nome e por conta própria, adquire a propriedade da mercadoria (em princípio, pelo menos), compra para revenda e assume os riscos da comercialização (podendo usufruir ou não do direito de exclusivo, o agente age por conta e em nome do principal, sendo um colaborador autónomo da empresa, perante a qual se obriga a promover a celebração e contratos e, algumas vezes, a concluí-los ele próprio, mas por conta e em nome do principal[28]. O Acórdão da Relação de Lisboa que aqui seguimos de perto, dá-nos conta da posição seguida pela doutrina e jurisprudência nacionais [que] têm acolhido a extensão analógica daquele instituto ao concessionário, desde logo em decorrência da possibilidade da extensão, por via analógica, do regime de agência ao contrato de concessão, “sobretudo em matéria de cessação do contrato”, conforme se preconiza no último parágrafo do ponto 4 do preâmbulo do Dec.-Lei n.º 178/86. Assim, o Professor Menezes Leitão aponta duas orientações de algum modo divergentes: por um lado, os que parecem defender uma extensão genérica do instituto a todos os concessionários comerciais, por equiparação em abstracto ao agente (Menezes Cordeiro, José Alberto Vieira e Pinto Duarte)[29]; por outro, os que, sustentam uma aplicação casuística em função das similitudes específicas entre as circunstâncias concretas de determinado concessionário e a situação típica do agente (Pinto Monteiro[30] e Carlos Barata[31]). Por seu lado, o Professor Pinto Monteiro perfilha o entendimento de que haverá indemnização de clientela “desde que se verifique o pressuposto da obrigação de transmissão do círculo de clientes ao concedente e este adquira benefícios dessa transmissão”. Segundo o mesmo autor, não ocorrerá analogia nos casos excepcionais em que o concedente não adquire nesse caso nenhum benefício em resultado da cessação do contrato”. Por seu turno, o Professor Pinto Monteiro, admite a aplicação analógica do regime da agência ao contrato de concessão justifica-se porquanto este contrato “envolve, frequentemente […] uma actividade e um conjunto de tarefas similares às da agência, estando os contraentes unidos, de modo idêntico, por uma relação de estabilidade e de colaboração e comungando de um objectivo comum”; mas daí, este autor não conclui pela equiparação plena entre a situação do concessionário ao agente[32], dadas as diferenças que podem ocorrer entre um e outro. Por paralelismo com o que se passa com o agente no regime legal do contrato de agência, a Jurisprudência tem-se pronunciado de modo pacífico no sentido de que é ao distribuidor que compete a prova dos assinalados requisitos (art.ºs 342.º, n.º 1, do CCiv.)[33]. Como bem se assinala no Acórdão desta Relação acima citado, o indicado autor, em ordem a descobrir se há ou não analogia de situações, propõe, antes, que seja feita uma análise desdobrada em dois momentos[34]: a) - num primeiro momento, importa averiguar, se o distribuidor em questão “desempenhou funções, cumpriu tarefas e prestou serviços”, semelhantes aos de um agente” (designadamente de promoção dos produtos e de prospecção de mercado), “em termos de ele próprio dever considerar-se “factor relevante de atracção da clientela” [artigo 33.º/1/a) do Dec.-Lei n.º 178/86]. b) - num segundo momento, há que verificar “se a norma que se convoca é adequada ou se ajusta ao contrato de concessão”; verificar se o concedente previsivelmente irá beneficiar da clientela angariada, na vigência do contrato, entretanto cessado, pelo ex-concessionário [artigo 33.º/1/b) do Dec.-Lei n.º 178/86][35]. Diga-se ainda que no acórdão em referência suscitam-se ainda duas outras questões correspondentes a dificuldades interpretativas com repercussão na aplicação do direito. Uma tem a ver com a clarificação do requisito exigido pela alínea c) do normativo acima transcrito e que respeita à perda, por parte do agente, de remuneração por contratos negociados ou concluídos, após a cessação do contrato, com os clientes angariados. Afirma-se no mesmo aresto que tal requisito parece, literalmente, alheio à natureza do contrato de concessão, uma vez que o concessionário, actuando em seu nome e por conta própria, não aufere qualquer remuneração específica do concedente, usufruindo sim dos lucros resultantes das margens de comercialização conseguidas. Por isso, há quem entenda não ser de relevar aquele requisito para efeitos de analogia com o agente], enquanto outros optam pela equiparação da remuneração do agente à margem de lucro obtida pelo concessionário”. Neste âmbito, nada vem minimamente demonstrado no sentido de que a A. tenha recebido qualquer retribuição por contratos negociados ou concluídos, após a cessação do contrato com os clientes por ela angariados ex novo. Tratando-se de um facto negativo, cumpriria às RR. fazerem algum esforço probatório que pudesse apontar nesse sentido o que não vislumbramos nos autos. De qualquer modo, sempre teríamos aqui em evidência matéria a coberto dos efeitos do cominatório semipleno. Uma outra dificuldade e que exige ponderação, consiste em saber se a força atrativa da própria marca comercializada se sobrepõe ao papel do concessionário como factor de angariação da clientela, secundarizando-o, em termos de excluir a analogia com o agente. A opinião corrente é no sentido de que essa força atractiva da marca pode porventura concorrer com o esforço desenvolvido pelo concessionário, mas que não é, por si só excludente, podendo, quando muito, ser um factor a ponderar seja em sede de preenchimento do requisito previsto na al. a) do n.º 1 do artigo 33.º, seja mesmo na determinação do montante a arbitrar, segundo a equidade, nos termos do artigo 34.º do Dec.-Lei nº 178/86[36]. Feito este enquadramento legal e doutrinário, revertendo ao caso dos autos, é pertinente respigar do acervo dos factos provados que: Quanto ao primeiro momento do percurso metodológico acima enunciado, importa ter em conta que: - a A. obrigou-se a promover e a vender os produtos das RR., e fê-lo de modo estável e autónomo, mediante uma retribuição constituída pelas margens de lucro conseguidas com a venda dos produtos das RR. (nº8 dos factos); - a A. era responsável pela promoção dos produtos das RR. no Arquipélago da Madeira pela prospecção do mercado e angariação de clientela para aqueles produtos (nº14 dos factos). Verificamos, assim, à luz do que fica exposto, que estão preenchidos os elementos que integram o primeiro momento do percurso metodológico enunciado. Do mesmo passo, fica patente o beneficio que o concedente retirou com a angariação da clientela por parte da A., não obstante a severidade da crise económica e financeira que eclodiu alguns anos após a cessação do contrato e a qual sempre implicaria, pelo menos, algum refluxo nas vendas (como de resto foi reconhecido, nomeadamente pela testemunha D…). Importa ter presente a este respeito que não ficou demonstrada a tese das RR. no sentido de que cessado o contrato tiveram as mesma de começar do zero, em nada tendo beneficiado da atividade da A. desenvolvida na vigência do contrato. Pelo contrário o que se pode constatar da matéria de facto, nomeadamente dos pontos 8, 9, 10, 14, é que a A. efectivamente angariou clientela para as RR. ao longo dos anos. Inclusivamente “A rede de clientes que a A. criou para os produtos das RR. cobria praticamente todo o Arquipélago da Madeira” (nº52 dos factos). Note-se ainda que existe nos autos uma listagem de clientes angariados pela A. (nº53 dos factos), e no ano de 2003 angariou mais de 3000 clientes para os produtos das RR. (nº54 dos factos), sendo ainda expressivo que a quota dos produtos das RR., em especial a C... , de uma quota de 0% tenha passado a deter uma quota de mercado da ordem dos 40,3% no mercado dos refrigerantes com gás (nº58 dos factos). Importa ainda destacar que as RR. continuam a vender os seus produtos no Arquipélago da Madeira, tendo substituído a A. como distribuidora por uma outra empresa que já detinha idêntico contrato para Portugal Continental (nº60 dos factos) e que a actual rede de clientes das RR. é baseada na rede de clientes que a A. angariou até à cessação do contrato. Desde modo, temos por plenamente provado o requisito da al. a) do nº 1 do referenciado normativo. Por similitude de razões e na ponderação dos assinalados factos quanto à beneficiação da A. (distribuidora) com a actividade da R. Sociedade (produtora), dever-se-á concluir que esta, enquanto ex-concedente, previsivelmente beneficiou da clientela angariada pelo ex-concessionário, na vigência do contrato, entretanto cessado e, deste modo, não parece haver dúvida de relevo de que “a norma que se convoca é adequada […e] se ajusta ao contrato de concessão”. Por isso, temos por preenchido o segundo dos requisitos exigidos pelo citado inciso [al. b) do mesmo nº 1], como preenchido consideramos o requisito exigido pela alínea c) do mesmo nº1, pelas razões supra descritas. II.2.3. Quanto à alegada falta de fundamentação do quantum indemnizatório fixado pelo tribunal As RR. entendem que os factos provados são insuficientes para sustentar os critérios invocados pelo tribunal a quo para fixação do valor indemnizatório. Vejamos: A indemnização de clientela obedece ao cálculo segundo os critérios postos no art. 34º do contrato de agência, o qual remete para a fixação equitativa, sem poder exceder um valor equivalente a uma indemnização anual, calculada a partir da média anual das remunerações recebidas pelo agente durante os últimos cinco anos. Na sentença recorrida, aquando do cálculo da indemnização, a quo, no âmbito da explicitação dos critérios de cálculo, esclareceu-se que: “o conceito de remuneração a que alude o citado artigo 34º deve ser interpretado no contrato de concessão como lucro, mas como lucro líquido (ou seja), diferença entre compra e venda sem as chamadas despesas de estrutura) e não margem bruta”. Entende o meritíssimo juiz que a prova deste facto cabia à A. que a não logrou fazer. No entanto, como bem se assinala na decisão recorrida, o preceito apenas prevê um limite máximo para a indemnização em causa no domínio do cálculo com base na equidade. É que ao contrário do que inculca a reflexão das recorrentes, ainda que se tome em conta a ponderação do lucro líquido (em vez do lucro bruto) relativo aos últimos cinco anos de vigência do contrato, a verdade é que a lei apenas fixa um limite máximo para o valor calculado com base na equidade. Por conseguinte, não se afigura ser razão impeditiva para o cálculo da indemnização o facto de não se conhecer com rigor o lucro líquido da recorrida reportado aos últimos cinco anos de vigência do contrato. Importa notar que estamos num domínio de ponderação com recurso à equidade, no âmbito da qual não se pode falar de valores certos, mas de valores que, respeitando os limites legais e com base nos elementos factuais carreados para os autos, o juiz fixa um valor segundo o seu prudente arbítrio. Não se trata, pois, de um valor arbitrário mas sustentado, por um lado, pelos limites lei e pela ponderação dos dados de facto, por outro, o que permite determinar o valor tido por ajustado ao caso. E na situação vertente tal limite foi previsivelmente respeitado, como o denota a diferença entre o valor espelhado nos factos como sendo a imagem bruta e aquele que acabou por ser objeto da condenação. Não vá sem se dizer que esta questão como, aliás, resulta das alegações e contra-alegações, é uma questão controversa na doutrina e na jurisprudência Seja como for, na situação sub judice foram trazidos elementos que permitem, com um grau de aproximação verosímil, determinar o valor da indemnização de clientela. Com efeito, na decisão recorrida clarificam-se os factos com base nos quais foi efectuado o cálculo, como sejam: o tempo ao longo do qual perdurou a relação contratual entre as partes (26 anos consecutivos que – não obstante, a contraposição, algo contraditória, das RR. - este tribunal acabou por sufragar); a extensão do território exclusivo, isto é todo o Arquipélago da Madeira; os milhares de clientes angariados pela A.; a média das vendas dos produtos das RR. nos últimos cinco anos que se cifrou em €8.723.765.00; a média da margem bruta da A. para tais vendas e que nos últimos cinco anos se cifrou em €2.870.730; a notoriedade mundial e globalização da marca das RR. e sua situação patrimonial; a circunstância de a A. ser uma empresa conhecida na Madeira sendo certo que comercializava outras bebidas e dispunha também de uma produção própria. As recorrentes invocam terem sido ponderados os últimos seis anos (e não os últimos cinco) da vigência do contrato. Todavia, não obstante o teor dos factos 67 a 69, se atentarmos ao cálculo, o mesmo traduz-se no valor aproximado ao da soma dos valores reportados aos últimos cinco anos e dividindo por cinco. Quer dizer, que o meritíssimo juiz a quo se conteve dentro dos limites estabelecidos pelo artigo 34º do citado diploma[37]. No domínio do cálculo as RR. ressuscitam a necessidade de suporte documental com base na escrita mercantil. Todavia, esta questão ficou arrumada contra a pretensão das recorrentes aquando do conhecimento da matéria de facto. Suscitam ainda, a questão da força atrativa da própria marca. No entanto o contrato data de 1977. Em 1977, como é sabido, a C... não tinha no mercado nacional e internacional a implantação que tem hoje em dia e não podemos deixar de ter em conta que no mercado da Madeira a sua expansão foi feita pela própria recorrida. Portanto, neste caso, a força atrativa que esta marca usualmente poderá ter não funcionou, porquanto naquela altura e nos anos que se seguiram não tinha o poder de sedução do mercado que tem hoje em dia e na RAM a expansão foi obra da A.. Outro dos elementos trazidos pelas recorrentes para questionarem o cálculo da primeira instância, prendem-se com a circunstância de que a recorrida começou a comercializar uma bebida R. rada a que chamou Brisa-cola, criando assim uma concorrente direta da C... . Todavia, como resulta, este facto não consta do elenco da matéria provada, nem existe nos autos qualquer fundamento para que este tribunal pudesse alterar em conformidade a mesma matéria. Traz também à colação a relevância do papel da recorrida na cessação do contrato. Contudo, como ficou exposto nada se mostra provado sobre esta temática. O mesmo se diga da matéria respeitante à comercialização da P., S. e Compal. Com efeito, do ponto de vista contratual, nada impedia que a A., cessado o contrato, pudesse comercializar outras marcas, tanto mais que essa atividade era já prosseguida pela autora na RAM. Afigura-se-nos, pois, que é deixar intocado o valor da indemnização fixado pela primeira instância. II.2.4. Quanto ao dies a quo da contagem dos juros Na questão enunciada a título prévio, no âmbito desta mesma apreciação jurídica, como vimos, a recorrida não chegou a recorrer da decisão de primeira instância sobre este concreto ponto. Todavia, nas contra-alegações a recorrida amplia o objeto da apelação, no caso de o Tribunal da Relação decidir em sentido favorável à recorrente. E neste caso como veremos, ter-se-á de reconhecer que alguma razão assiste às recorrentes. Por conseguinte, a enunciada questão terá de ser ponderada na perspetiva, quer das recorrentes, quer da recorrida, embora não vejamos razão para não dar um tratamento unitário a este ponto. Estamos perante um valor ilíquido. Acontece que não estamos perante qualquer das exceções previstas na lei. Na verdade, nos termos do artigo 805º nº3 do CC, “Se o crédito for ilíquido, não há mora enquanto se não tornar líquido, salvo se a falte de liquidez for imputável ao devedor; tratando-se, porém, de responsabilidade por facto ilícito ou pelo risco, o devedor constitui sem mora desde a sitação, a menos que já haja então mora nos termos da primeira parte deste número”. Salvo melhor opinião, isto significa que, em regra, apenas após o trânsito em julgado da decisão que fixa o valor indemnizatório é que esse mesmo valor se torna efetivamente líquido (art.º 805º nº3 do Código Civil). No caso dos autos, havendo que operar o cálculo segundo a equidade – como foi o caso – não vemos que a falta de liquidez seja imputável às recorrentes. É certo que poderia ter ocorrido acordo sobre esta matéria, mas de modo nenhum radicado em qualquer exigência legal. Por outro lado, nada ficou demonstrado que indiciasse sequer o cometimento de qualquer facto gerador de responsabilidade por facto ilicito ou pelo risco. Nesta conformidade, não vemos razão que justifique o desvio à enunciada regra e, por isso, na improcedência neste particular da ampliação do objeto da apelação e na procedência do recurso nesta parte, os juros de mora devidos serão contados desde o trânsito e julgado da decisão condenatória. Ficam prejudicadas as demais questões suscitadas na ampliação do objecto da apelação (indemnização de clientela e valor da indemnização fixada pelo tribunal), em virtude de as RR. não terem obtido provimento quanto às mesmas. III. Decisão Pelo exposto e decidindo, de harmonia com as disposições legais citadas, na procedência parcial do recurso decide-se alterar a decisão quanto a juros, passando os mesmos a ser contados após o trânsito da decisão condenatória, mantendo-se em tudo mais. Custas por ambas as partes, na proporção do decaimento. LISBOA, 5/11/2019 Maria Amélia Ribeiro Adjuntos: Dina Monteiro Luís Espírito Santo _______________________________________________________ [1] Esta corresponde à versão alterada de acordo com o que adiante se refere quanto ao recurso sobre este ponto de facto. A versão original tem a seguinte redacção: Em 1977, A. e RR. celebraram um contrato de produção e distribuição exclusiva dos produtos das RR.. [2] Atual redacção, de acordo com a alteração adiante introduzida. A redacção original tinha o seguinte teor: Cessado o contrato, as Rés continuam a vender os seus produtos no Arquipélago da Madeira, tendo substituído a Autora, como distribuidora, por uma outra empresa, a R… Madeira, sociedade subsidiária da R…, S.A., que já detinha contrato de engarrafamento e comercialização de produtos C… para Portugal continental [3] Figueiredo Dias, Maria Gabriela de Oliveira (1995), A Assistência Técnica nos Contratos de Know How, Coimbra, Coimbra Editora, pp.25 e seguintes. [4] Idem, pp. 27 e 26 [5] A não ser numa ínfima parte como adiante se demonstrará e já introduzida no local próprio. [6] Simões, M. Barata (1991), Franchising – franquia, inovação e crescimento, Lisboa, Texto Editora p.57. [7] Ribeiro, Ana Paula (1992), O Contrato de Franquia (Franchising) no Direito Interno e Internacional, Lisboa, Texto Editora p.21. [8] Simões, M. Barata (1991), Franchising – franquia, inovação e crescimento, Lisboa, Texto Editora pp.53 e 54. [9] Ac. TRL 16.12.2008, e, no mesmo sentido, Ac. STJ 15.11.2007, in dgsi, referenciados, aliás, pela recorrida. [10] Ribeiro, Ana Paula (1992), O Contrato de Franquia (Franchising) no Direito Interno e Internacional, Lisboa, Texto Editora p.67. [11] O importador ou o próprio grossista (vd. Pinto Monteiro, António (2002), Contratos de Distribuição Comercial, Coimbra, Almedina, p. 60. [12] Idem, Ibidem. [13] Idem, Ibidem.p. 61. [14] Idem, Ibidem. [15] O importador ou o próprio grossista (idem, ibidem, nota 111, p. 62). [16] Neste sentido se pronunciou também o acórdão da Relação de Lisboa, de 4 de Outubro de 2011, relatado pelo Excelentíssimo Desembargador Tomé Gomes. [17] Acórdão supra citado. [18] Dec.-Lei n.º 178/86, de 3 de Julho, na redacção dada pelo Dec.-Lei n.º 118/93, de 13 de Abril (o qual transpôs a Directiva n.º 86/653/CEE do Conselho, de 18 de Dezembro de 1986). [19] Neste sentido se tem pronunciado a doutrina e a jurisprudência (vide acórdão da Relação de Lisboa, de 4 de Outubro de 2011, supra referenciado). [20] Pinto Monteiro, op. cit., p. 108. [21] Pinto Monteiro, op. cit., pp. 108 a 109 e acórdão desta Relação acima citado. [22] Acórdão citado. [23] Idem. [24] Ac. RL citado. [25] Op. cit. 152. [26] Acórdão da Relação de Lisboa supra citado. [27] Op. cit., pp. 150 e 151. [28] Op. cit., pp. 108 e 112. [29] Apud acórdão citado. [30] Op. cit., p. 151 [31] Carlos Lacerda Barata (1994), Alterações ao Novo Regime do Contrato de Agência, Lisboa, Lex, p. 87. [32] Op. cit., p. 163. [33] Neste sentido veja-se, a título de exemplo, o Ac. STJ de 29/09/15, relatado pelo Exmº Conselheiro Gregório Silva Jesus. [34] Op. cit., p. 163. [35] Op. cit., pp. 163 e 164. [36] Ac STJ de 29/09/15, relatado pelo Excelentíssimo Conselheiro Gregório Silva Jesus. [37] Vide Ac STJ de 06.12.2017, na Revista 594/10.8TBVFR.P2.S1, relatado pela Excelentíssima Conselheira Fernanda Isabel Pereira. |