Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa | |||
| Processo: |
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| Relator: | LUÍS FILIPE BRITES LAMEIRAS | ||
| Descritores: | ARRENDAMENTO HABITACIONAL TRANSMISSÃO DO ARRENDAMENTO CONVIVÊNCIA COM O INQUILINO ÓNUS DA PROVA | ||
| Nº do Documento: | RL | ||
| Data do Acordão: | 12/02/2025 | ||
| Votação: | UNANIMIDADE | ||
| Texto Integral: | S | ||
| Texto Parcial: | N | ||
| Meio Processual: | APELAÇÃO | ||
| Decisão: | IMPROCEDENTE | ||
| Sumário: | Sumário: I – O conceito de convivência com o inquilino há mais de cinco anos a contar da morte deste e a que se refere o artigo 57º, nº 1, alínea f), do NRAU, na redacção da Lei nº 13/2019, de 12 de Fevereiro, como condição impeditiva da caducidade do arrendamento habitacional, deve ser enquadrada por factos que demonstrem uma comunhão de vida, de partilha de espaço e de centro fixado do quotidiano, com traços de cumplicidade e de perenidade. II – É ao putativo transmissário do arrendamento, participante dessa convivência, que carrega o ónus de provar esses factos (artigo 342º, nº 2, do Código Civil); trazendo ao tribunal ferramentas probatórias, sólidas e consistentes, que permitam convencê-lo, para lá de toda a dúvida razoável, de que essa convivência, e ao longo desse tempo, foi efectivamente real, e existiu (artigos 607º, nº 4, segunda parte, e nº 5, início, e 663º, nº 2, final, do Código de Processo Civil). III – E se os sinais ou indícios que reunir, enquadrados pelo panorama e pelos sintomas dos vários elementos disponíveis, não permitirem superar aquela dúvida, deixando o patamar do convencimento aquém do desejável, é a esse virtual transmissário que a decisão fáctica há-de desaproveitar (artigo 346º, final, do Código Civil, e 414º do Código de Processo Civil). | ||
| Decisão Texto Parcial: | |||
| Decisão Texto Integral: | Acordam no Tribunal da Relação de Lisboa: I – Relatório (I). A instância da acção. 1. (1.º) M---, (2.º) A--- e (3.º) (marido) R--- suscitaram contra M--- acção declarativa a pedir a declaração (a) da sua propriedade sobre o prédio da Av---, na P---, (b) e da caducidade do arrendamento que sobre esse incidiu, por óbito da arrendatária, e a condenação da ré, filha daquela, (c) a restituir-lhes o prédio e (d) a pagar-lhes a quantia de 400,00 € por mês, desde o óbito até entrega efectiva (computando já 8.400,00 €), e juros (28.4.2023). É a seguinte, em súmula, a sua argumentação. Adquiriram, por sucessão (as autoras), e são (todos) possuidores do prédio. Por volta de 1955, o prédio foi arrendado, para habitação, a A---, mãe da ré, que faleceu no dia ---.---.2021; sem óbito comunicado; e sem que no locado habite qualquer outra pessoa. A caducidade do arrendamento acarreta o direito dos senhorios à restituição do imóvel. Acresce que desde o falecimento da inquilina os senhorios poderiam ter rentabilizado o bem, em 400,00 € por mês; sendo essa a sua quebra patrimonial decorrente da falta da entrega. 2. A ré foi citada, por contacto pessoal de agente de execução (20.9.2023), na « R---, comarca de Coimbra » (19.10.2023). Apresentou contestação (27.10.2023); e defendeu a improcedência da causa. Em síntese, disse que tem a sua residência permanente é no locado. Foi aí que passou a residir, conjuntamente com sua mãe, e de forma ininterrupta desde 2014; aí passou a ter o centro da sua vida pessoal e familiar, tomar refeições e descansar, passar o tempo e receber visitas; sendo a sua morada. As suas deslocações são esporádicas. À data do óbito de sua mãe tinha 71 anos. No ano de 2022 sobreviveu exclusivamente com o rendimento anual global de 16.075,63 €. Com o falecimento a primitiva arrendatária, transmitiu-se-lhe o arrendamento. 3. A instância seguiu; e houve audiência final, com prova pessoal (29.1.2025). 4. Foi proferida a sentença final (10.2.2025). 4.1. (1.º). Nesta decisão, a matéria de facto provada foi assim organizada. 1. M--- e A--- são donas do prédio urbano sito na Av---, Parede, UF de C--- e P---; inscrito na matriz pelo artigo n.º --- da aludida União de Freguesias (cf. certidão matricial junta como documento n.º 1 com a petição inicial – PI –, cujo teor aqui se considera integralmente reproduzido). 2. A--- é casada, sob o regime de comunhão de bens adquiridos, com R--- (cf. Escritura Pública de Habilitação de Herdeiros outorgada a 08-6-2004, junta como documento n.º 3 com a petição inicial – PI –, cujo teor aqui se considera integralmente reproduzido). 3. M--- e A---foram as universais herdeiras dos seus pais, ou seja de M--- (falecido a 29-3-2004, no estado de viúvo) e de A--- (cf. documento n.º 3 da PI). 4. Em data não concretamente apurada, mas por volta do ano de 1955, os pais das autoras celebraram com A--- contrato de arrendamento, cujo objecto foi o prédio acima identificado. 5. Como renda mensal foi acordado, e ao longo dos anos paga, a quantia de € 1,05. 6. No ano de 2011, os autores realizaram obras de conservação no referido prédio (cf. cópia de duas cartas enviadas pela 1.ª autora a A---, datadas de 7- 6-2011 e de 27-5-2011, juntas como documentos n.ºs 4 e 5 com a petição inicial – PI -, cujo teor aqui se considera integralmente reproduzido). 7. A--- manteve no aludido prédio a sua residência própria e permanente. 8. M--- é filha de A---. 9. A--- faleceu a 02-7-2021, na freguesia de --- (---), concelho de Setúbal; com a idade de 99 anos (cf. certidão do Assento de Óbito n.º --- do ano de 2021, junta como documento n.º 6 junto com a PI, cujo teor aqui se considera integralmente reproduzido). 10. M--- não comunicou aos autores o falecimento da sua mãe – A--- –. 11. O prédio acima identificado não foi habitado por qualquer outra pessoa, que não A---; não foi habitado pela ré M---. 12. Dá-se aqui por integralmente reproduzido o teor da carta datada de 27-10-2022 remetida pela 1.ª autora M--- à ré M---, a qual configura o documento n.º 7 junto com a PI. Da aludida missiva destaca-se o seguinte excerto: “(…) Tendo, entretanto, tido conhecimento que a senhora D.ª A--- faleceu em 02 de julho de 2021, sem que tal facto me tenha sido comunicado, venho por este meio, face à cessação do contrato de arrendamento, solicitar a entrega da moradia livre de pessoas e bens, no prazo de oito dias, (…)”. 13. A aludida carta foi devolvida à remetente pelos CTT, com a indicação postal “Objeto não reclamado” (documento n.º 7). 14. A 09-01-2023 os ora autores requereram a notificação judicial avulsa da ora ré, com vista a que a mesma restituísse o prédio em causa, no prazo de quinze dias (documento n.º 8 junta com a PI, cujo teor aqui se considera integralmente reproduzido). 15. A aludida notificação judicial avulsa correu termos no Juízo de Competência Genérica de Penacova, sob o n.º ---; sendo que a mesma foi deferida pelo respectivo Sr. Juiz de Direito (documento n.º 8). 16. M--- nasceu a …-…-1950, tem presentemente 74 anos de idade (cópia do cartão de cidadão da ré, junto como documento n.º 1 junta com a contestação, cujo teor aqui se considera integralmente reproduzido). 17. A ré M--- é titular de contrato de fornecimento de serviços de televisão e de internet com a sociedade ZON/NOS, tendo ocorrido, no âmbito do mesmo: intervenções técnicas a 14-3-2014; emissão de facturas a 03-4-2016 e a 04-9-2023, a adesão a serviços a 18-6-2016 (cf. o documento n.º 2 indicado na contestação e junto aos autos através de um primeiro requerimento autuado a 27-10-2023, cujo teor aqui se considera integralmente reproduzido). Da aludida documentação consta o endereço respeitante ao prédio urbano sito na Av---, P---, UF de ---. 18. A ré M--- foi titular de contrato de fornecimento de serviços de televisão e de internet com a sociedade MEO, tendo ocorrido, no âmbito do mesmo, a adesão a determinado tarifário a 03-10-2017 (cf. o documento n.º 2 indicado na contestação e junto aos autos através de um segundo requerimento autuado a 27-10-2023, cujo teor aqui se considera integralmente reproduzido). A aludida documentação tem como referência o endereço respeitante ao prédio urbano sito na Av---, P--- UF de ---. 19. Dá-se aqui por integralmente reproduzido o teor da certidão fiscal emitida a 22-12-2023 (documento junto através do requerimento autuado a 25-01-2024, cujo teor aqui se considera integralmente reproduzido). Destaca-se o seguinte teor da aludida certidão: no ano fiscal de 2022 o valor do Rendimento Anual Bruto Corrigido (RABC) do agregado familiar da ré foi de € 16.075,63. 20. O certificado único da matrícula respeitante ao veículo --- foi enviado para a ré, através de carta, a qual teve como referência o endereço respeitante ao prédio urbano sito na Av---, P---, UF de --- (documento n.º 3 da contestação, cujo teor aqui se considera integralmente reproduzido). 21. O aviso de recibo/extracto emitido a 15-7-2023 pela Companhia de Seguros Allianz Portugal, Sa. respeitante à apólice n.º --- teve como referência de envio o prédio urbano sito na Av---, P---, UF de --- (documento n.º 6 junto com a contestação, cujo teor aqui se considera integralmente reproduzido). A aludida apólice respeita a seguro do ramo casa, cujo local de risco é a Rua ---, em Paradela. 22. O Banco BPI, Sa. enviou à ré carta datada de 20-01-2023, tendo por referência o endereço respeitante ao prédio urbano sito na Av---, P---, UF de --- (documento n.º 4 da contestação, cujo teor aqui se considera integralmente reproduzido). 23. Dá-se aqui por reproduzido o teor da “Ficha de Identificação” emitida pelo Centro de Saúde de P---, o qual configura o documento n.º 5 junto com a contestação. A aludida ficha refere que a ré se encontra inscrita desde 21-02-2001, na qualidade de utente inscrito residente, cuja morada respeita ao prédio urbano sito na Av---, P---, UF de ---. 24. Dá-se aqui por reproduzido o teor dos dois documentos com a epígrafe “Conforama”, datados de Fevereiro de 2016, cujo endereço de referência respeita ao prédio urbano sito na Av---, P---, UF de --- (documento n.º 7 junto com a contestação, cujo teor aqui se considera integralmente reproduzido). 25. Dá-se aqui por reproduzido o teor da carta dirigida pelo SAMS – Serviço de Assistência Médico-Social à ré, datada de 01-9-2023, cujo endereço de referência respeita ao prédio urbano sito na Av---, P---, UF de --- (página 2.ª do documento n.º 5 junto com a contestação, cujo teor aqui se considera integralmente reproduzido). 26. Dá-se aqui por reproduzido o teor da carta dirigida pela seguradora MetLife à ré, datada de 29-8-2023, cujo endereço de referência respeita ao prédio urbano sito na Av---, P---, UF --- (página 3.ª do documento n.º 5 junto com a contestação, cujo teor aqui se considera integralmente reproduzido). 27. Dá-se aqui por reproduzido o teor de declaração com o timbre do SAMS – Serviço de Assistência Médico-Social, datada de 02-5-2017, sendo que a ré consta em tal missiva como beneficiária; cujo endereço de referência respeita ao prédio urbano sito na Av---, P---, UF de --- (página 2.ª do documento n.º 5 junto com a contestação, cujo teor aqui se considera integralmente reproduzido). (2.º). A sentença organizou assim a matéria de facto não provada. a. Que a residência permanente da ré M--- seja, pelo menos desde 2014, o prédio sito na Av---, P---. b. Que, desde o ano de 2014, a ré M--- viva de forma ininterrupta no prédio sito na Av---, P---. c. Que o prédio sito na Av---, P---, seja o centro da vida pessoal e familiar da ré M---, nomeadamente, que aí tome as suas refeições, pernoite, descanse, realize a sua higiene, receba amigos e familiares. d. . Que, sem prejuízo da documentação e das considerações acima expressas nos pontos 17 a 27 dos factos provados, a ré M--- no aludido prédio, de forma regular, assista a programas televisivos, utilize a internet, estabeleça conversas telefónicas com amigos, familiares e terceiros. e. Que os documentos com a epígrafe “Conforama”, datados de Fevereiro de 2016, acima identificados no ponto 24 dos factos provados, formalizem a compra de mobiliário que se destine a integrar o recheio do prédio sito na Av---, P---. f. Que a ré apenas esporadicamente se desloque à casa sita na Rua da .., n.º …, em P…, a qual é acima referida na parte final do ponto 21 dos factos provados. g. Que a ré tenha realizado e custeado obras no prédio sito na Av---, P---. h. Que o prédio sito na Av---, P---, no mercado de arrendamento actual e no que respeita à respectiva área geográfica em causa, assuma o valor de renda mínimo mensal de € 400,00 (Quatrocentos euros). 4.2. Em matéria jurídica a sentença disse assim (além do mais). « (…) como a inquilina, mãe da ré, faleceu a 02-7-2021, por conseguinte na vigência do NRAU, a transmissão do contrato de arrendamento em litígio, por morte da inquilina, rege-se pelas disposições transitórias conjugadas dos artigos 26º, nº 2, 27º, 28º e 57º, nºs 1 a 4, do NRAU. (…) o aludido contrato de arrendamento caducou a 02 de Julho de 2021, ou seja com o falecimento da arrendatária A--- (artigo 1051º, alínea d), do Código Civil). Não resultou provada factualidade que consubstancie excepção legal à conclusão acima alcançada, nomeadamente o caso em apreço não é, a qualquer título, subsumível no artigo 57º do NRAU. » 4.3. No dispositivo final, a decisão julgou a acção procedente e: (a.). « declaro(u) que as autoras (…), são as únicas proprietárias e legítimas possuidoras do prédio urbano sito em Av---, (…). » (b.). « reconhe(ceu) a caducidade do contrato de arrendamento que teve por objecto o prédio acima identificado, por falecimento, a 02 de Julho de 2021, da respectiva inquilina A---. » (c.). « condeno(u) a ré M--- a proceder à restituição imediata do referido prédio, livre de pessoas e bens. »; e (d.). « condeno(u) a ré (…) no pagamento aos autores, a título de indemnização, na quantia que se vier a apurar, através de incidente de liquidação (…); correspondente ao período compreendido entre os seis meses subsequentes ao dia 02 de Julho de 2021 – (…) – e até que seja concretizada a efectiva entrega do prédio (…). » (II). A instância da apelação. 1. A ré, inconformada, interpôs recurso da sentença. Organizou assim as conclusões da sua alegação. a) Entende a ré, ter existido um erro na apreciação da prova produzida, com a consequente incorrecta aplicação das normas aplicáveis no caso em concreto, culminado com a procedência da acção, fundada na decisão da existência da caducidade do contrato e arrendamento que teve por objecto o prédio acima identificado, por falecimento, a 02 de Julho de 2021, da respectiva inquilina A---. b) E assim segundo o decidido, (…), erroneamente, considerou resultar por não provada factualidade que consubstancie excepção legal à conclusão acima alcançada, nomeadamente o caso em apreço não é, a qualquer título, subsumível no artigo 57.º do NRAU. c) Quando na verdade a inquilina, pela prova produzida, tendo a mãe da ré, falecido em 02-7-2021, vivendo com a ré pelo menos desde 2014, por deveria o tribunal a quo decidido pela transmissão do contrato de arrendamento, para ré por morte da sua mãe, primitiva arrendatária. d) Pois resultando provado que a ré nasceu em …-…-1950, logo tem presentemente 74 anos. e) Tendo o decesso da primitiva arrendatária mãe da ré, ocorrido em 02-07-2021, nessa data a ré tinha idade superior 65 anos, concretamente tinha 71 anos. f) Bem como conforme facto provado 19., o RABC da ré era inferior a 5 RMNA, concretamente o seu RBAC era de € 16.075,63. g) Os autores não lograram demonstrar que a ré não vivia no locado, sito em Av---, inscrito na matriz predial pelo artigo 1422. h) Pelo contrário a ré pela documentação junta aos autos, com a contestação, sob doc. 3 a 7., demostrou que desde 2001 fez constar em documentação importante, como sejam documentos de seguros, registo automóvel, via verde, serviços de assistência médica, serviço nacional de saúde (inscrita desde Fevereiro de 2001 no centro de saúde da Parede). i) O que resulta das regras da lógica e experiência comum, a ré ao contratar serviços de fornecimento de televisão, telecomunicações móveis e fixas para morada sita na Av---, bem como ao adquirir mobília no ano de 2016, para entrega na mesma morada, só o fez por ali efectivamente residir. j) A prova documental conjugada com o testemunho da sua filha, nos seguintes termos: [03:02:] – Advogado: Eu vou perguntar em relação à senhora sua mãe, Dona M--- qual morada que a mesma habita se é na Rua --- Paradela ou se é na Av--- Por que é que acabaram, algum motivo? (...) [03:16]: Testemunha: É na Av---, é onde deixo as minhas filhas. [03:02]: – Advogado: É lá onde deixa as suas filhas, é lá que a sua mãe dorme? [03:33]: Testemunha: Sim. [03:34]: – Advogado: É lá onde a sua mãe faz a sua alimentação? [03:35]: Testemunha: Sim. [05:38]: – Advogado: Não foi após o falecimento da sua avó que a sua mãe passou aí a habitar? [05:40]: Testemunha: Não, não, a minha mãe já lá estava, as minhas filhas aliás, não conhecem outra casa da minha mãe que não essa, e a casa da En--- tiveram lá para aí 3 vezes, na vida, e uma tem onze anos e a outra tem sete, a casa da avó --- é aquela casa, referência das minhas filhas e é a minha referência, é a referência do meu irmão. k) A testemunha arrolada pelos Autores, M---, sobrinho e filho destes testemunhou que a casa estava habitada no ano de 2014 e inclusivamente no ano de 2023 quando lá passou, a mesma estava cuidada, habitada, inclusivamente com as janelas abertas. [33:10]: – Advogado: Estive nesta casa em 2014? [33:12]: Testemunha: Sim, sim, estive nesta casa em 2014 e já passei nesta rua diversas vezes, vejo a casa minimamente habitada, nota-se. [33:35]: Testemunha: Dr., há dois anos em 2023, quando eu la passei pensava que estava lá a Dona A---, não sabia que estava la a Dona L--- na casa, não sabia do falecimento da Dona A---. [34:34]: Testemunha: Imaginemos este cenário, o falecimento da Dona A---, se a Dona L--- não quisesse saber fechasse a porta e fechasse a casa notava-se nada levantou suspeita do falecimento da Dona A--- porque a casa aparentava na mesma, eu acho que até tinha as janelas abertas, aparenta estar habitada na minha ideia. l) Assim pelo conjunto da prova produzida, é manifesto a incorrecta apreciação da prova operada pelo tribunal a quo, devendo a decisão recorrida ser substituída por ao contrário do decidido dever ser aplicada as disposições conjugadas dos artigos 26.º, n.º 2, 27.º, 28.º e 57.º, n.ºs 1, al. f) a 4, do NRAU. m) Mais se diga que o facto da ré não ter comunicado aos autores a morte da sua mãe e primitiva arrendatária não obsta à transmissão da posição do arrendatário, in casu para a ré. n) E por tal, conforme o estabelecido no art.º 1107.º do Código Civil, a omissão da comunicação do falecimento do primitivo arrendatário não tem como consequência – ao contrário do decido pelo tribunal recorrido - a caducidade do contrato de arrendamento. o) Assim pela prova produzida deve ser considerando que o contrato de arrendamento celebrado em 1955 se transmitiu com o decesso no ano de 2021 da primitiva arrendatária A--- mãe da ré, para esta última. Em síntese. Deve a decisão recorrida ser revogada e substituída por outra que: 1.º; determine a inexistência da caducidade do arrendamento, pelo falecimento em ---.---.2021 da inquilina A---, mãe da ré; 2.º; declare a transmissão da posição de arrendatária para a ré. Ou, caso assim se não entenda, seja ordenada a renovação da produção de prova e novos meios de prova. 2. Os autores responderam. E organizaram assim as conclusões da contra-alegação. 1- A mera invocação de residência habitual ou apresentação de documentos com morada não é suficiente, sendo imprescindível a prova inequívoca de que o locado era a residência permanente do transmissário. 2- O ónus da prova recai sobre quem alega a transmissão por morte. 3- O legislador entendeu, não proteger as pessoas financeiramente carenciadas em sede de transmissão por morte (tal como o fez com os menores e os deficientes) e entendeu bem: não faz sentido que os senhorios – que pagam impostos tal como os outros cidadãos – sejam sobrecarregados com funções de assistência social que, naturalmente, competem ao Estado, o que aliás aconteceu durante toda a época do vinculismo e, em parte, ainda continua a acontecer. 4- À recorrente não assiste o direito à transmissão do arrendamento e por o saber não comunicou o óbito aos senhorios. 5- Nem à mesma assistiam quaisquer legitimas expectativas pois desde 2006 a recorrente bem sabia que não seria beneficiária da transmissão do arrendamento por morte de sua mãe. 6- Deste modo, não se encontrando a ré em nenhuma das situações previstas nas alíneas do nº. 1 do artº. 57º do NRAU, mormente na sua alínea e), não se lhe transmite o arrendamento para habitação e não ocorrendo transmissão do contrato de arrendamento por morte da arrendatária, a morte desta constitui causa legal de caducidade automática desse contrato e da consequente obrigação de restituição do locado aos senhorios. 7- Nos termos do artigo 1051.º, alínea d), do Código Civil, o contrato de arrendamento caduca com a morte do arrendatário, salvo disposição legal em contrário. 8- A excepção prevista na lei – designadamente nos artigos 1106.º e 1107.º do Código Civil e no artigo 57.º do NRAU – exige a comprovação da coabitação efectiva com o arrendatário falecido e da residência habitual no locado. 9- O tribunal a quo deu como não provado que a ré residisse efectivamente no locado e essa falta de prova radica desde logo no facto de a prova documental junta aos autos não permitir concluir pela residência efectiva e permanente da recorrente no locado, tratando-se de elementos formais sem valor probatório suficiente. 9- O depoimento da testemunha C--- foi correctamente valorado como não credível, por ser interessada e por não coincidir com outros elementos objectivos dos autos, sendo importante apreciar que o facto de a sua mãe, aqui recorrente, ir a almoços e jantares de família na casa da falecida arrendatária em vida desta só demonstra que lá não vivia - era uma visita. 10- A Lei nº 6/2006 de 27/2 veio estabelecer o NRAU, tendo no seu art.º 59º regulado a sua aplicação no tempo, dispondo no seu n.º 1: “O NRAU aplica-se aos contratos celebrados após a sua entrada em vigor, bem como às relações contratuais constituídas que subsistam nessa data, sem prejuízo do previsto nas normas transitórias.” 11- Estas normas transitórias são as contempladas nos artºs 26º a 58º da referida Lei. Os artºs 26º, n.º 1, 27º e 28º, nº. 1 impõem a aplicação do novo regime a todos os contratos celebrados não só na vigência do RAU, aprovado pelo DL 321-B/90 de 15/10, como também aos contratos de arrendamento para habitação celebrados em momento anterior ao da sua vigência, com as especificidades previstas no mencionado art.º 26º. 12- A morte da arrendatária constitui causa legal de caducidade automática desse contrato e da consequente obrigação de restituição do locado aos senhorios por não se verificar qualquer requisito para a sua transmissão. 13- Pelo que deve manter-se inalterada a douta decisão proferida por ter efectuado correcta aplicação da matéria de facto provada e da lei aplicável in casu. Em síntese. Deve manter-se a decisão recorrida, confirmando a caducidade do arrendamento e a restituição do locado aos recorridos. 3. A delimitação do objecto do recurso. 3.1. As conclusões da alegação circunscrevem os temas do recurso (artigo 635º, nº 4, do Código de Processo Civil). 3.2. Para o caso da impugnação da decisão relativa à matéria de facto, os ónus acrescidos do recorrente impõem-lhe ainda que sinalize (1.º) os pontos de facto concretos mal julgados, (2.º) as provas que impõem diferente apreciação e (3.º) as decisões alternativas (artigo 640º, nº 1, do Cód. Proc. Civ.; na interpretação feita pelo acórdão uniformizador nº 12/2023, de 17.10 [DR, 1.ª série, de 14.11.2023]). 3.3. A hipótese concreta centra-se precisamente no recurso em matéria de facto. 3.4. Na verdade, o enquadramento jurídico do caso não parece merecer controvérsia entre as partes. Está em causa um contrato de arrendamento, de início pretérito ao do Regime do Arrendamento Urbano (RAU) (Decreto-Lei nº 321-B/90, de 15.10). E com vida à data da entrada em vigor do Novo Regime do Arrendamento Urbano (NRAU) (Lei nº 6/2006, de 27.2). O artigo 12º, nº 2, início, do Código Civil, estabelece que, quando a lei disponha acerca dos efeitos de certos factos jurídicos, se deve entender, na dúvida, que visa apenas os factos novos; significando assim que a lei que se lhe aplica é a que vigorar ao tempo da ocorrência do facto jurídico concreto em causa. A inquilina da hipótese faleceu no dia 2 de Julho de 2021. Ao contrato habitacional aqui convocado, porque celebrado antes da vigência do RAU, aplicam-se os artigos 27º, 28º, nº 1, e 26º, nº 2, do NRAU, na versão da Lei nº 13/2019, de 12.2. E, por conseguinte, em matéria de transmissão por morte, ainda o disposto no artigo 57º, nº 1, alínea f), do mesmo diploma e na mesma versão, de onde resulta que, por morte do primitivo arrendatário, o arrendamento habitacional transmite-se ao filho que lhe sobreviva, desde que (1.) com ele convivesse há mais de cinco anos, (2.) tenha idade igual ou superior a 65 anos e (3.) o RABC do agregado seja inferior a 5 RMNA. A idade da ré (2.), para o caso, é incontroversa (facto provado 16.); como o é o seu rendimento (3.) (facto provado 19.; em particular, se confrontado com os diplomas os valores das retribuições mínimas garantias, para 2021 [DL 109-A/2020, de 31.12] ou para 2022 [DL 109-B/2021, de 7.12]). Subsiste o pressuposto da convivência há mais de cinco anos (1.). Sendo este, e aqui, o primordial pólo de polémica. 3.5. Acontece que o desenho da recorrente não é neste particular imaculado. No corpo da alegação vai referindo (apenas) que o entendimento devia ter sido de que « a residência permanente da ré (…) é, pelo menos desde 2014, o prédio sito na Av---, P--- » (artigo 23º); e que « a decisão proferida deveria manifestamente ter sido literalmente oposta » (à que foi) (artigo 26º); bem como que « o facto a. da matéria dada por não provada, não poderia como foi ter sido considerado por não provado » (artigo 28º). Nas conclusões diz (apenas) viver com a mãe « pelo menos desde 2014 » (alínea c)); que « os autores não lograram demonstrar que a ré não vivia no locado » (alínea g)); e que ali « efectivamente [estava a] residir » (alínea i)). Está no limiar da satisfação dos ónus das alíneas a) (concretos pontos de facto) e c) (concretas decisões alternativas), do artigo 640º, nº 1, do código. É que da matéria de facto provada decorre (além do mais): - que « o prédio (…) não foi habitado por qualquer outra pessoa, que não A---; não foi habitado pela ré M--- » (facto 11.). E da não provada decorre (além do mais): - que « a residência permanente da ré (…) seja, pelo menos desde 2014, o prédio (…) » (facto a.); - que « desde o ano de 2014, a ré (…) viva de forma ininterrupta no prédio (…) » (facto b.); - que « o prédio (…) seja o centro da vida pessoal e familiar da ré (…), nomeadamente, que aí tome as suas refeições, pernoite, descanse, realize a sua higiene, receba amigos e familiares » (facto c.); - que « (…) a ré (…) no aludido prédio, de forma regular, assista a programas televisivos, utilize a internet, estabeleça conversas telefónicas com amigos, familiares e terceiros » (facto d.); - ou ainda, que « a ré apenas esporadicamente se desloque à casa sita (…) em Paradela » (facto f.). Em qualquer dos casos. A circunscrição mínima encetada pela apelante, à luz de uma interpretação que busque (mais) os desígnios materiais da vida (e empreendida de alguma forma já pela antes citada uniformização de jurisprudência nº 12/2023), permite intuir que o recurso em matéria de facto tem o objectivo de tornar não provado o facto provado nº 11, e de tornar provados, pelo menos, os factos não provados das alíneas a., b., c., d. e f. – estes todos (o provado e os não provados na sentença) que se moldam como realmente importantes para o julgamento do mérito; os cinco primeiros (11. [prov.]; a., b., c. e d. [não prov.]) aliás essenciais mesmo para preencher o que resta (ainda indemonstrado) da previsão normativa, conducente à transmissão da locação. E que ao fim e ao resto é o que a apelante, central e verdadeiramente, quer (!). II – Fundamentos 1. O ónus da prova da apelante. O vínculo probatório incidente sobre a apelante, com o objectivo de mostrar o infundado da acção, concentra-se no substrato da norma que exige, à data do decesso da inquilina, sua mãe, a convivência com ela e há mais de cinco anos. São os factos jurídicos (esse substrato) que importa dar por reconhecidos. Interessa que ao tribunal se transmita, através dos instrumentos de prova, de uma forma consistente e concludente, capaz de lhe fazer superar a dúvida razoável – aquela acomodada às exigências práticas da vida – e de fazer posicionar a sua convicção em patamares de suficiente convencimento, a realidade de que residia com a sua mãe, no locado, há mais de cinco anos, contados do dia em que esta faleceu. O conceito de convivência há mais de cinco anos, em causa, que o artigo 57º, nº 1, alínea f), aqui relevante, contém, transporta-nos para uma ideia de comunhão de vida, de residência habitual com o arrendatário; e, esta, para uma concepção de eixo (de núcleo) fixado da vida, de centralidade do quotidiano. Importa, por outras palavras, que o arrendatário e o filho partilhem do lar, como local de permanência em comum; aquele lugar onde, um e outro, compartilham e repartem os seus espaços de (eterno) retorno, em cada dia do curso da vida, mostrando ser esse o lugar fixo (e cúmplice) do seu lar, dos dois; e com traços de perenidade. A sentença deu como provado que « o prédio (…) não foi habitado por qualquer outra pessoa, que não A---; não foi habitado pela ré M--- » (cit. facto 11.). A apelante, de seu lado, refere que « os autores não lograram demonstrar que a ré não vivia no locado » (conclusão alínea g)). Nem um, nem outro, desses índices, sinaliza a centralidade essencial. É a apelante – repete-se – que tem de mostrar a convivência há mais de cinco anos; na certeza de que, não o fazendo, o julgamento lhe há-de desaproveitar em matéria de facto (artigo 414º do Cód. Proc. Civ; artigo 346º, final, do Cód. Civ.). E, por decorrência disto, com cedência do efeito jurídico por ela pretendido. 2. A decisão proferida sobre a matéria de facto. A apelante conseguiu convencer de que convivia com sua mãe, inquilina e no locado, há mais de cinco anos, quando esta faleceu (em Julho de 2021)? O tribunal a quo julgou, essencialmente, que não. E para tanto consignou – além do mais –, e a respeito da prova prestada pela apelante, não « permit[ir] concluir, de forma suficientemente segura, que a casa em apreço possa ter constituído e constitua a residência efectiva e permanente da ora ré ». Expressando ademais por acréscimo que « a título meramente complementar, há que ter em consideração que a ré foi citada para a presente acção na sua casa sita na aldeia de Paradela, (…) ». Segundo o artigo 662º, nº 1, do Cód. Proc. Civ., o tribunal da Relação apenas deve alterar a decisão proferida sobre a matéria de facto, se os factos tidos como assentes, a prova produzida ou um documento superveniente impuserem decisão diversa. O critério do julgamento ao que interessa é, como para a 1.ª instância, o da livre apreciação probatória (artigos 663º, nº 2, final, e 607º, nº 5, início); ainda que agora a incidir sobre a plataforma das provas, já de certa forma fixada, e que dessa instância a quo provém. Em qualquer dos casos, as provas disponíveis têm que ser criticamente analisadas e obtidas ilações dos factos instrumentais; bem como compatibilizada toda a matéria de facto adquirida e extraídas dos factos apurados as presunções impostas pelas regras de experiência (artigo 607º, nº 4). Em particular, a prova por testemunhas está subordinada à apreciação livre (artigo 396º do Cód. Civ.). Nessa, constituindo factores de creditação, p. ex., a maior ou menor proximidade com os sujeitos e o assunto em discussão, a consistência do conhecimento adquirido acerca dos factos do depoimento, ou o nível de harmonização evidenciado no confronto com outros instrumentos probatórios (artigos 513º, nº 1, ou 516º, nº 1, ou ainda 521º, todos do Cód. Proc. Civ.). Quais as provas concretas que a apelante reuniu para convencer com nitidez que era convivente com a mãe (desde antes de Julho de 2016)? Está provado que a apelante não comunicou o falecimento (facto 10.). A circunstância não é significativa (decisiva); ainda que, não obstando por si à sucessão no arrendamento (artigo 1107º, nº 2, do Cód. Civ.), possa ser sintoma de uma vontade para manter um status quo precedente. A apelante não foi judicialmente notificada, como pediram os apelados, no sítio da Paradela, por se ter frustrado, aí, o contacto, em 12.1.2023 (factos 14. e 15.; estando certificada a não notificação naquela data). Mas, como a sentença frisa, foi aí citada, por contacto pessoal, para a acção, no dia 20.9.2023. Está provado um agregado de factos – cerca de dez –, emergência de prova por documentos, que reflecte, em nome da apelante e na morada do locado, algum tipo de facturações e indiferenciadas comunicações (factos 17., 18. e 20. a 27.); capaz de sinalizar traço indiciário, estritamente instrumental; mas que, em face das dúvidas que são presentes, não pode deixar de carecer de um complemento algo mais sólido, capaz de o corroborar (na mostra de que era essa a sua residência permanente). Acontece que precisamente em trecho documental, a apelante apresentou alguns emitidos pela autoridade tributária; desde logo, um reflectido em facto provado (facto 19.) e outro a mostrar liquidação de imposto sobre o rendimento singular, do ano fiscal de 2022 (27.10.2023; com a contestação); aquele referindo o imóvel da « R da --- Paradela », mas sobretudo este, o segundo, de onde foi cirurgicamente removido o segmento que podia mostrar a morada fiscal real da própria apelante. A isso associado, evocou-se em audiência final (29.1.2025) e contexto de prova pessoal aí conduzida, haver morada fiscal da apelante, na Paradela; mas o certo é que a circunstância não (nunca) foi esclarecida, nem certificada (…). A apelante não mostrou, por aí, consolidada a sua residência habitual no locado. Por outro lado; exactamente em tema de prova pessoal constituenda. A única que a apelante propôs foi a sua própria filha, C---, ouvida como testemunha, na audiência, a verbalizar essencialmente o locado como casa, com a avó, aonde a mãe correntemente desenvolvia as actividades quotidianas. Não obstante; narrando ainda este pormenor; o de que a mãe « antes residia numa casa mesmo ao lado », que aí tinha contrato de « arrendamento ». Um detalhe que a testemunha, proposta pelos apelados – também sobrinho da 1.ª e filho dos 2.ª e 3.º –, M---, corroborou; de que a apelante « vivia noutra casa contígua ». Ora, esta circunstância é susceptível de fazer suspeitar que na verdade houvesse alguma partilha de quotidiano, entre mãe (locatária no arrendado) e filha (a apelante na casa contígua); mas não a convivência – a comunhão – que se supõe para preencher a previsão normativa do artigo 57º, nº 1, alínea f), que aqui nos importa. Acresce mais isto – não se esclareceu (e houve condições para o fazer) o que aconteceu afinal ao « arrendamento » da tal casa contígua; manteve-se (!?), cessou (!?) ou que vicissitudes conheceu; por tal modo, que se permitisse classificar a partir de certo trecho temporal a apelante como convivente (com residência permanente) já no locado, na companhia da inquilina e por mais de cinco anos. A testemunha M---, proposta dos apelados, ainda precisou o pormenor, que aliás a apelante destaca no recurso (conclusão k)), de que « há cerca de dois anos (em 2023) » passou junto do arrendado e viu sinais de estar habitada, pensando até que era ainda uso da primitiva arrendatária. Não é decisivo, para a tese da apelante; pode ser apenas a concretização do efeito que afinal se quer fazer persistir, o de que, já após o decesso da inquilina, a apelante visa manter a utilização da casa; e, neste sentido, sendo natural que lhe dê algum uso; mas sem virtualidade – repetimo-lo – para evidenciar a consistência fáctica acomodada a preencher o conceito de anterior convivência com a inquilina há mais de cinco anos. Em síntese; a creditação de qualquer das testemunhas aqui ouvidas não pôde ser alheia à proximidade familiar evidenciada; e ao condicionamento que a situação traz naturalmente associado. Perante isso; impunha-se – à apelante; a quem carregada com o ónus da prova – que reunisse (outros) instrumentos complementares, convincentes e compactos, capazes de alicerçar, com solidez, a factualidade impeditiva do direito dos apelados. Era a matéria-prima para o desenho da livre convicção, antes indicada. E que, não existindo, deixou ficar aquém do mínimo razoável o convencimento. Quer dizer; a prova produzida, associada aos factos assentes, não é hábil a impor decisão diversa, no seu essencial, da que foi proferida sobre a matéria de facto na 1.ª instância; que, por conseguinte, a Relação não está habilitada a alterar (artigo 662º, nº 1, do código, antes cit.). Uma derradeira precisão. A apelante remata o seu recurso a pedir, subsidiariamente, que « seja ordenada a renovação da produção de prova e novos meios de prova ». Trata-se de sinalizar o regime contemplado nas alíneas a) e b), do artigo 662º, nº 2, do Cód. Proc. Civil, de accionamento de faculdades inquisitórias já no tribunal ad quem, quando a credibilidade ou o sentido da prova pessoal produzida gere «dúvidas sérias» (permitindo renová-la) ou quando a prova realizada suscite «dúvida fundada» (permitindo inová-la). Mas não é nitidamente o caso. Nem as testemunhas ouvidas merecem aquela suspeição; nem a generalidade dos instrumentos probatórios, designadamente os propostos pela apelante, mostram alguma susceptibilidade de equívoco ou perplexidade. A situação em causa foi outra; foi a de que, em boa verdade, as ferramentas para convencer, reunidas pela apelante, no momento próprio, ficaram aquém de um mínimo exigível para alicerçar a convicção judiciária. E como tal a decisão não podia deixar de lhe desaproveitar. Além de que, ainda neste particular, nunca seria de se poder acolher a pretensão de rejuvenescimento da prova, em apelação, sem o desenho mínimo de espessura ou densidade; ou seja, sem percepção de qual (?) a prova a renovar ou de quais (?) novos meios de prova a produzir (!?). 3. Síntese conclusiva. 3.1. A apelante centra a sua impugnação nos segmentos (b.) e (c.) do dispositivo final da sentença proferida na 1.ª instância. O 1.º; que reconheceu a caducidade do arrendamento da casa da Av---, na P---, por morte da inquilina, no dia 2 de Julho de 2021. O 2.º; e consequente, que condenou a apelante à sua restituição aos apelados. 3.2. O ónus de prova dos factos impeditivos do direito dos apelados (artigo 57º, nº 1, alínea f), do NRAU) carregava sobre a apelante (artigo 342º, nº 2, do Cód. Civ.); o que não conseguiu, com suficiência bastante, cumprir. O facto, autonomizado na sentença, como provado, de que na casa arrendada só a inquilina habitou, e de que a apelante aí não habitou (facto 11.), contraria as regras da distribuição daquele ónus; e como tal mostra-se ali desnecessário e inconsequente. Nesse sentido, nada obstando à sua supressão daquele elenco. No demais, não se evidenciando razões para alterar a decisão proferida sobre a matéria de facto. 3.3. A apelante não conseguiu preencher os requisitos da transmissão da locação. Não conseguiu fazer impedir a caducidade do arrendamento (artigo 1051º, alínea d), do Cód. Civ.). Permitiu, assim, consolidar a posição jurídica dos apelados. 3.4. A acção procede nos segmentos impugnados como a 1.ª instância sentenciou. E improcede o recurso de apelação. III – Decisão Em face do exposto, acordam os juízes deste tribunal da Relação em: 1.º; suprimir o facto provado nº 11, na sentença recorrida, por desnecessário e inconsequente à decisão de mérito; 2.º; manter a restante decisão proferida sobre a matéria de facto; 3.º; no demais, e a respeito dos segmentos concretamente visados no recurso, das alíneas (b.) e (c.) do dispositivo final da sentença, julgar a apelação improcedente e confirmar o que nesses segmentos ficou decidido. As custas devidas pela apelação são encargo da apelante, que no essencial decaiu. Lisboa, 2 de Dezembro de 2025 Luís Filipe Brites Lameiras Diogo Ravara Micaela Sousa |