Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa | |||
Processo: |
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Relator: | TERESA SOARES | ||
Descritores: | NULIDADE DE DESPACHO ENTREGA DO SUPORTE DAS GRAVAÇÕES ANTES DA CONCLUSÃO DO JULGAMENTO | ||
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Nº do Documento: | RL | ||
Data do Acordão: | 02/08/2024 | ||
Votação: | UNANIMIDADE | ||
Texto Integral: | S | ||
Texto Parcial: | N | ||
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Meio Processual: | APELAÇÃO | ||
Decisão: | PROCEDENTE | ||
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Sumário: | I - Numa diligência processual com mais de uma sessão as gravações devem ser entregues, após cada sessão. A lei fala em acto –art.º 155.º,3 CPC. Cada sessão constitui um acto por si. II - A gravação abrange uma função mais vasta que a reapreciação da matéria de facto. Permite-se, por força da gravação, escrutinar toda a actividade processual que se tenha desenrolado oralmente em diligências presididas pelo juiz. | ||
Decisão Texto Parcial: | ![]() | ||
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Decisão Texto Integral: | Acordam na 6.ª sessão do Tribunal da Relação de Lisboa: Nos presente autos foi apresentado a 19/10/2022 o seguinte requerimento: “MM, Ré/Reconvinte nos autos à margem referenciados e ali melhor identificada vem requerer a V. Exa cópia da gravação da sessão de 19-10-2022, nos termos do artigo 155.º, n.º 3 do CPC Sobre o qual recaiu o seguinte despacho: “Requerimento datado de 19.10.2022 (Ref.ª 43616475): Considerando que o julgamento ainda não terminou, tendo apenas sido interrompido, aliado ao facto da gravação da prova ter por finalidade a instrução de recurso com vista à reapreciação dos fundamentos de facto, determina-se que a cópia das requeridas gravações sejam entregues à R., no momento em que for encerrada a audiência de julgamento, nos termos do disposto no art.º 155º, nº3 do CPC. Notifique” Notificado deste despacho veio a R recorrer alegando com as seguintes conclusões: A - Conforme decorre do artigo 155º n.ºs 3 e 4 do Código de Processo Civil a gravação deve ser disponibilizada às partes no prazo de dois dias após a realização do respectivo ato e as partes devem invocar no prazo de 10 dias a falta ou deficiência da gravação, a contar da disponibilização. B – Após cada sessão se Julgamento em que haja prova gravada, terminada e encerrada esta, deve ser disponibilizada a gravação às partes, esta é a solução que, além de ir ao encontro do sentido literal do normativo, mais vai no sentido de eventuais irregularidades da gravação que possam comprometer a desejável celeridade no andamento dos autos serem remediadas o mais cedo possível. C – Acresce que tal solução permite ainda aos Mandatários melhor prepararem as suas alegações finais e neste sentido salientarem com maior certeza ao Tribunal os pontos da matéria de facto que julguem relevantes. D - Impugnação da matéria de Direito, o Tribunal a quo não aplicou, ou interpretou erroneamente pelo menos os artigos seguintes: - 155.º, n.ºs 3 e 4 do CPC. Nestes termos e nos demais de Direito e sempre com o Douto Suprimento de V. Ex.ªs, deve ser dado provimento ao presente recurso e revogado o Douto Despacho, sendo substituído por outro que entenda que a entrega da gravação deve ser feita após cada sessão/ato e não apenas no final do Julgamento, seguindo o processo a sua ulterior tramitação até final, com as legais consequências. Se o presente recurso não subir de imediato deve subir com o primeiro que vier a subir da D. Decisão final, caso exista. O CD com as gravações terá sido facultado à R. após o julgamento, conforme determinado no despacho. Foi interposto recurso pela R. o qual já foi julgado, por acórdão transitado, que confirmou a decisão que resolveu o contrato de arrendamento, em que é R. a aqui recorrente. O presente recurso, por motivo que se desconhece, não veio a subir com o recurso da decisão final, como era imperativo legal. Nada obsta ao conhecimento do recurso. É nosso entendimento que numa diligência processual com mais de uma sessão as gravações devem ser entregues, após cada sessão. A lei fala em acto –art.º 155.º,3 CPC. Cada sessão constitui um acto por si. Para o bom funcionamento dos trabalhos, nomeadamente para se detectar deficiências de gravação, analisar requerimentos, despachos ou depoimentos, deve entender-se que cada sessão constitui “um acto” e por isso deveria a gravação ter sido entregue finda a sessão, conforme requerido. Não assiste razão ao tribunal recorrido quando limita a função das gravações à reapreciação da matéria de facto. Que assim não é decorre do art.º 155.º cuja epígrafe é “Gravação da audiência final e documentação dos demais actos presididos pelo Juiz” esclarecendo-se no n.º 1 que são recolhidas na acta “depoimento, informação, esclarecimento, requerimento e respectiva resposta, despacho, decisão, alegações orais”. Abrange assim a gravação uma função mais vasta que a reapreciação da matéria de facto. Permite-se, por força da gravação, escrutinar toda a actividade processual que se tenha desenrolado oralmente em diligências presididas pelo juiz. Vejamos o caso dos autos. A acção já está decidida por decisão transitada em julgado. O CD terá sido entregue. A recorrente limita-se a pedir que o despacho seja revogado e substituído por outro que entenda que a entrega deve ser feita após cada sessão “seguindo o processo a sua ulterior tramitação”. O recorrente está obrigado a alegar e concluir - art.º 639.ºCPC. As alegações funcionam como uma petição inicial e as conclusões como o pedido. Ora, o que a recorrente pretende é ver esclarecida a posição jurídica assumida nos autos pelo julgador, pretende que este tribunal se debruce sobre a questão. O que pede é que este tribunal revogue o despacho e o substitua por outro que entenda que a entrega dessa ser feita cada sessão, não retirando daí quaisquer concretas conclusões ao nível do andamento do processo. Pretende a anulação do julgamento em 1.ª e 2.ª instância? Não o sabemos porque a recorrente o não diz. Ainda assim vejamos que conclusão se poderá tirar? Entende-se que não foi observada uma formalidade legal. Contudo a omissão de uma formalidade só produz nulidade quando a lei o declare ou quando a irregularidade cometida possa influir no exame ou decisão da causa. Assim o dispõe o art.º 195.º do CPC. Ora, não invoca a recorrente em que medida é que essa formalidade omitida influiu, concretamente, na decisão da causa. Limita-se a dizer que teria melhor preparado as alegações finais. Isto não é um facto, mas antes uma mera alegação subjectiva, dificilmente comprovável. Não pode tal alegação ser entendida como fundamento suficiente para se julgar o processo ferido de nulidade. E convidado a esclarecer se tinha interesse no recurso vem alegar que: “Continua a ser relevante e útil para a Recorrente, saber se o prazo legal foi respeitado pelo Tribunal e qual é esse prazo, porque isso tem relevância na segurança e na certeza jurídica.” Assim revoga-se o despacho sem, contudo, daí retirar qualquer consequência jurídica, uma vez que a irregularidade cometida não constitui nulidade. Pelo exposto acorda-se em julgar procedente o recurso, revogando-se a decisão recorrida. Sem custas. Lisboa, 8 de fevereiro de 2024 Teresa Soares Octávia Viegas João Manuel P. Cordeiro Brasão |