Acórdão do Tribunal da Relação do Porto
Processo:
1116/25.6T8VLG.P1
Nº Convencional: JTRP000
Relator: JOÃO DIOGO RODRIGUES
Descritores: REQUERIMENTO DE INJUNÇÃO
OBRIGAÇÕES QUE PODEM SER OBJETO DE REQUERIMENTO DE INJUNÇÃO
EXECUÇÃO COM BASE EM REQUERIMENTO DE INJUNÇÃO
Nº do Documento: RP202511261116/25.6T8VLG.P1
Data do Acordão: 11/26/2025
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Privacidade: 1
Meio Processual: APELAÇÃO
Decisão: CONFIRMADA
Indicações Eventuais: 2.ª SECÇÃO
Área Temática: .
Sumário: I - O direito ao contraditório não se destina a facultar à parte a possibilidade de contornar a inconsistência jurídica da sua pretensão.
II - Se, em face do título executivo (requerimento de injunção com aposição de fórmula executória), não é possível decifrar quais as quantias emergentes de obrigações pecuniárias diretamente resultantes da execução do contrato e quais as oriundas de outra fonte, designadamente, responsabilidade civil, ainda que contratual, é inviável apenas o indeferimento parcial da execução.
Reclamações:
Decisão Texto Integral: Processo n.º 1116/25.6T8VLG.P1


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Sumário:

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Relator: Des., João Diogo Rodrigues
Adjuntos: Des., Maria da Luz Teles Meneses de Seabra;
Des., Pinto dos Santos.

Acordam no Tribunal da Relação do Porto,

I- Relatório

1- A..., S.A. instaurou, no dia 22/03/2025, a presente execução contra AA, pedindo que este último seja compelido a pagar-lhe a quantia de 1.988,18€, que “corresponde ao valor que permanece ainda em divida da injunção, incluindo o capital, juros vencidos calculados à taxa comercial à data de apresentação da injunção, e ao valor da taxa de justiça”. “Ao valor líquido – prossegue -acresce, por simples cálculo aritmético, o valor dos juros moratórios vencidos, calculados à taxa comercial, desde a data de apresentação da injunção até à presente data, assim como acrescem os juros moratórios vincendos, calculados à taxa comercial e os fundados na alínea d) do artigo 13 do DL nº 269/98, de 1 de Setembro, à taxa de 5% ao ano desde a data em que foi conferida força executiva ao requerimento de injunção, até integral pagamento”.

Baseia este pedindo no requerimento de injunção que apresenta e no qual foi aposta a fórmula executória, do qual consta o seguinte:

“1-A Rte tem por objeto social a prestação de serviços de comunicações eletrónicas (fixas e/ou moveis) de conceção, construção, gestão e exploração de redes de infraestruturas e soluções de comunicações eletrónicas, assim como outras atividades complementares, subsidiarias ou acessórias das acima referidas. 2- No exercício da sua atividade, celebrou com o Rdo um contrato de prestação de serviçs de telecomunicações e outro de venda de equipamento a prestações, sem reserva de propriedade, aos quais foram atribuídos n.s de contrato/conta cliente. 3- No âmbito do contrato de prestação de serviços e nas condições nele estabelecidas, a Rte obrigou-se a prestar os serviços contratados, de acordo com os tarifários escolhidos pelo Rdo e este, por seu turno, obrigou-se pelo período de tempo acordado e identificado no contrato, a efetuar o pagamento tempestivo do respetivo preço. 4-Ficou, ainda, estabelecido que, em caso de cessação antecipada do contrato sem justa causa, a Rte tem o direito de receber uma indemnização correspondente ao valor dos benefícios/vantagens concedidos na data da celebração do contrato e associados, designadamente ao custo da instalação, da ativação do serviço, da subsidiação de equipamentos e ofertas promocionais ou condições comerciais;

5- Esta indemnização é calculada considerando: (período contratual acordado - n. meses em que os serviços estiveram ativos) x (benefícios e vantagens conferidos) / (período de fidelização);

6- Ainda, no exercício da sua atividade, a pedido e solicitação do Requerido, foi celebrado um contrato de compra e venda de equipamento a prestações, sem reserva de propriedade, através do qual aquele adquiriu o equipamento, que lhe foi entregue; na fatura, então emitida, esta identificado o equipamento bem como definidas as condições de pagamento acordadas, ou seja, o numero de prestações mensais, respetivo valor e datas de vencimento. Fatura que foi emitida e entregue ao requerido e é do seu conhecimento. Ficou, ainda, estabelecido que na falta de pagamento atempado de qualquer uma das prestações mensais, perdia o Rdo o benefício do prazo relativamente as prestações mensais seguintes, conferindo-se a Rte o direito de exigir, de imediato, o pagamento integral de todas as prestações mensais em falta. Sendo que, a falta de pagamento de uma das prestações sempre implicaria imediato vencimento do total das prestações, por forca do disposto no artigo 781. do Código Civil; 7 - Nos termos fixados nas condições contratuais estabelecidas entre as partes o valor das prestações, correspondentes a aquisição do equipamento, foi processado e mensalmente discriminado na fatura relativa a conta da prestação do serviço de telecomunicações eletrónicas contratada com a Requerente; 8 - Faturas que foram enviadas para o endereço por este indicado para o efeito - não tendo sido registada evidencia de correspondência devolvida e/ou reclamada.

9- Todas as faturas emitidas refletem mensalidades, planos de preços, alugueres de equipamentos, comunicações efetuadas, preço do equipamento com prestações pré-acordadas. 10 - Sucede que o requerido não pagou os valores devidos pela prestação dos serviços nem as prestações mensais que se foram vencendo relativas a aquisição do equipamento, montantes titulados e melhor identificados nas faturas (infra discriminadas), nas datas dos respetivos vencimentos, não obstante ter sido interpelado varias vezes para o efeito; assim quebrando os vínculos contratuais, facto que determinou a conversão da mora em incumprimento definitivo (art..s 798., 801., 805. e 808. C.C.) e, em consequência, originou a emissão e respetivo envio de fatura com os valores acordados contratualmente como devidos a Autora pela cessação antecipada do contrato de prestação de serviços, por motivo imputável ao Rdo (nos termos referidos nos pontos 4. e 5. do presente procedimento. 11 - Tendo, ainda, o incumprimento do plano prestacional referente a venda do equipamento a prestações, determinado o vencimento integral das prestações vincendas.

12- E o Rdo também responsável pelo prejuízo que o incumprimento causa a Rte pois, atempadamente interpelada, não procedeu a respetiva liquidação;

13- Assim sendo, nos termos dos art.. 804., 805., n..s 1 e 2 alínea a) e 806., todos do C.C., a Rte tem direito a indemnização correspondente aos juros de mora vencidos calculados desde as datas de vencimento das referidas faturas e sobre os respetivos montantes, ate integral e efetivo pagamento, a taxa legal aplicável (§ 3.. do artigo 102. do Cod. Com., DL 62/2013, de 10 de Maio);

14- Por ultimo, o tribunal competente para dirimir o presente litigio, indicado pela ora Rte e escolhido em conformidade com o disposto no art.. 71., n. 1, in fine do CPC

Proc.: ...96 Conta N.: ...00 NIC: ...01...ata Contrato: 06/09/2023 N. Factura; Data Limite de Pagamento; Capital

abr-24; ...09; 04/09/2024; 25.27;

abr-24; ...09; 03/10/2024; 25.27;

abr-24; ...09; 21/10/2024; 25.27;

abr-24; ...09; 12/11/2024; 25.27;

abr-24; ...09; 12/11/2024; 25.27;

abr-24; ...09; 12/11/2024; 25.27;

abr-24; ...09; 12/11/2024; 25.27;

abr-24; ...09; 12/11/2024; 25.27;

abr-24; ...09; 12/11/2024; 25.27;

abr-24; ...09; 12/11/2024; 25.27;

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abr-24; ...09; 12/11/2024; 25.27;

abr-24; ...09; 12/11/2024; 25.27;

abr-24; ...09; 12/11/2024; 25.27;

abr-24; ...09; 12/11/2024; 25.27;

abr-24; ...09; 12/11/2024; 25.27;

abr-24; ...09; 12/11/2024; 25.28;

abr-24; ...09; 12/11/2024; 25.28;

abr-24; ...09; 12/11/2024; 25.28;

abr-24; ...09; 12/11/2024; 25.28;

abr-24; ...09; 12/11/2024; 25.28;

abr-24; ...09; 12/11/2024; 25.28;

abr-24; ...09; 12/11/2024; 25.28;

abr-24; ...09; 12/11/2024; 25.28;

abr-24; ...09; 12/11/2024; 25.28;

abr-24; ...09; 12/11/2024; 25.28;

abr-24; ...09; 12/11/2024; 25.28;

abr-24; ...09; 12/11/2024; 25.28;

abr-24; ...09; 12/11/2024; 25.28;

abr-24; ...09; 12/11/2024; 25.28;

abr-24; ...09; 12/11/2024; 25.28;

abr-24; ...09; 12/11/2024; 25.39;

mai-24; ...64; 03/07/2024; 16.52;

mai-24; ...64; 02/08/2024; 16.52;

mai-24; ...64; 19/08/2024; 545.43;

jun-24; ...89; 03/07/2024; 61.84;

jul-24; ...78; 02/08/2024; 65.18;

ago-24; ...85; 04/09/2024; 87.69;

set-24; ...86; 03/10/2024; 0.56

Proc.: ...37 Conta N.: ...00 NIC: ...01...ata Contrato: 06/09/2023 out-24; ...; 23/10/2024; 258.74”.

2- Perante este requerimento recaiu, no dia 30/04/2025, despacho no qual se considerou, em resumo, que “[d]o requerimento de injunção dado à execução resulta que este foi intentado, não para o cumprimento de obrigação pecuniárias emergente de contrato, a contrapartida pelos serviços prestados e pelos equipamentos vendidos, mas sim para a efetivação das consequências da sua extinção, ou seja, para fazer valer direitos indemnizatórios concernentes à responsabilidade contratual inerente ao incumprimento do referido contrato”.

E, por isso mesmo, porque nos termos do artigo 1.º do Decreto-Lei n.º 269/98, de 01/11, o procedimento de injunção se destina a “exigir o cumprimento de obrigações pecuniária emergentes de contratos”, “ou seja, obrigações consistentes na entrega de dinheiro em sentido estrito e não obrigações de valor em que o valor pecuniário traduz apenas a liquidação do valor da obrigação”, o que não é o caso, “o procedimento de injunção requerido pela exequente é um expediente processual impróprio para obter a satisfação dos pedidos”, o que se reconduz a uma exceção dilatória inominada “que tem como consequência a absolvição da instância ainda que o procedimento de injunção pudesse ser aplicado a determinadas parcelas do pedido”.

Por conseguinte, “[o] procedimento de injunção devia ter sido recusado pela secretaria com fundamento na pretensão nele deduzida não se ajustar à finalidade do procedimento, em conformidade com o que dispõe o artº 11º n.º 1 al. h) do Regime Anexo ao Dec. Lei 269/98 de 01/09, na redação introduzida pelo Dec. Lei 107/2005 de 01/07 ou, não o tendo sido, sempre devia o secretário judicial ter recusado a aposição da formula executória, conforme prevê o artº 14º n.º 3 do citado diploma.

E não obstante a questão não tenha sido suscitada no procedimento de injunção pelo requerido, nada obsta a que na ação executiva ela possa ser apreciada uma vez que estamos perante um título executivo ilegal, porquanto obtido à revelia dos pressupostos legalmente exigidos para o recurso ao procedimento de injunção

Estamos, assim, perante uma exceção dilatória inominada, insuprível, de conhecimento oficioso, que tem como consequência a absolvição da instância – cfr. artº. 576º. nº. 2 do e 578º. CPC”.

Como tal, ao abrigo do disposto no artigo 726.º n.º 2 al. b) e 734.º n.º 1 do CPC, decidiu-se rejeitar a presente execução.

3- Inconformada com esta decisão, dela interpôs recurso a Exequente, finalizando a sua motivação com as seguintes conclusões:

“1. A Sentença recorrida deve ser revogada pois nela se fez, salvo o devido respeito, errada aplicação do Direito.

2. Considerou o Tribunal a quo existir exceção dilatória inominada do uso indevido do procedimento de injunção e consequente falta de título executivo, rejeitando deste modo a presente execução.

3. Por, a ora Recorrente ter apresentado ação executiva com base em requerimento de injunção, ao qual foi aposta força executiva, que incluiu valor em dívida relativo a cláusula penal pela rescisão antecipada do contrato.

4. Sem que, para tal, tenha notificado a exequente para, ao abrigo do artigo 3.º do CPC, se pronunciar quanto à eventual rejeição da execução por força da ineficácia do documento junto como título executivo.

5. Na sequência da qual, a ora Recorrente poderia ter procedido à desistência parcial da instância na parte relativa à indemnização por incumprimento contratual, requerendo o prosseguimento quanto ao remanescente de € 1.729,44.

6. Ora, o entendimento de que a cláusula penal ou indemnização não pode integrar o procedimento injuntivo não pode conduzir, salvo o devido respeito, à recusa do título no seu todo, mas apenas em relação à parte que integra tais valores.

7. Devendo assim ser afirmada a exequibilidade parcial do título dado à execução e determinada a continuação da execução para cobrança das obrigações pecuniárias diretamente emergentes do contrato celebrado entre as partes.

8. O propósito da instituição do procedimento especial de injunção foi o de agilizar a vida económica (agilizar cobranças) e, simultaneamente, o de libertar os tribunais das ações declarativas subjacentes.

9. Ora, no caso sub judice, não se vislumbra razão para o não aproveitamento do processo.

10. Pelo que, o recurso aos referidos princípios da economia processual, da proporcionalidade e do aproveitamento dos atos processuais, exige que se reconheça a validade do título executivo, no que respeita ao pedido de pagamento da quantia exequenda de € 1.729,44, pois que, relativamente à mesma, não se verifica qualquer uso indevido do procedimento de injunção onde se formou o título executivo.

11. Assim, a decisão recorrida, ao rejeitar, liminarmente, a execução, violou o disposto nos arts. 726, nº 3 e 734º, ambos do CPC, devendo, consequentemente, ser revogada e substituída por decisão que admita o requerimento executivo e mande prosseguir os autos”.

4- Citado o Executado para os termos da execução e do recurso, não deduziu qualquer oposição.

5- Recebido o recurso e preparada a deliberação, importa tomá-la.


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II- Mérito do recurso

1- Não podendo o Tribunal de recurso conhecer de questões não suscitadas pelo recorrente, salvo se as mesmas forem de conhecimento oficioso [artigos 608º, nº 2, “in fine”, 635º, nº 4, e 639º, nº 1, todos do Código de Processo Civil (CPC)], cinge-se o objeto deste recurso a saber se:

a) Foi violado o princípio do contraditório, por a Apelante não ter sido ouvida antes de ter sido proferida a decisão recorrida;

b) A rejeição da execução devia ter sido parcial e não total.


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2- Tendo em consideração os factos constantes do antecedente relatório – que são os únicos relevantes para a resolução das referidas questões -, vejamos, então, como solucioná-las:

O primeiro dado a considerar é que a Apelante não questiona a conclusão a que se chegou na decisão recorrida, no sentido de que o procedimento de injunção se destina, tão só, a exigir o cumprimento de obrigações pecuniárias diretamente emergentes de contratos e não o cumprimento de obrigações com outra fonte, designadamente, responsabilidade civil, ainda que contratual (cfr. artigo 1.º do Decreto Lei n.º 269/98, de 1 de setembro). Por isso mesmo, o procedimento de injunção em que seja pedido o cumprimento de obrigações deste último tipo e em que seja aposta a fórmula executória, está ferido de vício que afeta a sua exequibilidade. Esta é, de resto, jurisprudência dominante que se deve ter por assente (ainda que haja divergências sobre o concreto vício que pode ser configurado como falta ou insuficiência de título ou como erro, insanável, na forma do procedimento, enquanto exceção dilatória inominada[1]].

Seja como for, repetimos, a Apelante não questiona propriamente o facto de na presente ação executiva não poder reclamar qualquer indemnização por incumprimento contratual. Aquilo que questiona é o facto de não ter sido previamente ouvida sobre a inviabilidade do pedido formulado a esse título, pois que, se assim tivesse sucedido, teria desistido dessa parte da instância e, por outro lado, a circunstância da sua pretensão executiva ter sido rejeitada na totalidade e não parcialmente.

Ora, como veremos, em nenhum destes aspetos assiste razão à Apelante.

Quanto ao primeiro, admitindo a Apelante que teria desistindo da instância relativamente à sua pretensão indemnizatória se tivesse sido ouvida previamente à rejeição dessa pretensão, tal significa que reconhece (e já reconhecia à época) a inconsistência jurídica dessa pretensão. Logo, estando dela ciente, nenhuma surpresa constitui para si a decisão recorrida. Só o constitui na medida em que não lhe permitiu contornar a dita inconsistência

O direito ao contraditório prévio, porém, não tem essa finalidade.

Como resulta do disposto no artigo 3.º, n.º 3, do CPC, esse contraditório tem em vista permitir que as partes, embora detentoras de interesses materiais conflituantes, sejam chamadas a uma atitude cooperante na realização da justiça. Por isso se diz que, mais do que a defesa contra a atuação alheia, o direito ao contraditório encerra hoje também a possibilidade das partes concorrerem, ativamente, com todos os elementos aos seu dispor, para a resolução do litígio de forma materialmente adequada; ou dito por outras palavras, de forma justa[2].

É neste pressuposto que se impõe ao juiz o dever de “observar e fazer cumprir, ao longo de todo o processo, o princípio do contraditório, não lhe sendo lícito, salvo caso de manifesta desnecessidade, decidir questões de direito ou de facto, mesmo que de conhecimento oficioso, sem que as partes tenham tido a possibilidade de sobre elas se pronunciarem” – artigo 3.º, n.º 3, do CPC.

Mas, no caso, não se verifica esse pressuposto. A Apelante não pretendia contribuir para a melhor resolução da questão que levou ao indeferimento da sua pretensão executiva. O que pretendia, assumidamente, era, repetimos, contornar a inconsistência jurídica da sua pretensão indemnizatória. Por isso, para esses efeitos, não lhe assegura a lei o direito ao contraditório. Daí que não se tenha por violado esse direito.

Resta a questão do pretendido indeferimento parcial da pretensão executiva.

Neste âmbito, como é sabido, a jurisprudência não é uniforme. Uns entendem que esse indeferimento é admissível, outros têm o entendimento contrário[3].

De qualquer modo, mesmo para os que entendem ser admissível o indeferimento parcial, a jurisprudência dominante tem sustentado que “se em face do título (requerimento de injunção com aposição de fórmula executória), sendo embora evidente que está reclamada e incluída quantia atinente a indemnização, não se consegue, com igual e suficiente evidência, saber o respetivo valor e distingui-la das demais quantias, é inviável a rejeição parcial da execução”[4]. Ou seja, dito por outras palavras, pode “ao abrigo do art.º 734º do CPC, ser rejeitada a execução apenas relativamente à parte do pedido exequendo que excede os limites válidos do título executivo, ou seja, relativamente aos valores que não poderiam ser objeto de procedimento de injunção, desde que estes estejam devidamente delimitados no requerimento de injunção”[5].

E percebe-se que assim seja. Estando já na fase executiva não há fundamento legal que permita aperfeiçoar o requerimento que deu origem à fase anterior. E completá-lo na fase subsequente, ou seja, na execução, equivaleria a preencher o conteúdo do título, sem que se saiba se, nessas circunstâncias, ele seria emitido.

Concluímos, assim que se, em face do título executivo (requerimento de injunção com aposição de fórmula executória) não é possível decifrar quais as quantias emergentes de obrigações pecuniárias diretamente resultantes da execução do contrato e quais as oriundas de outra fonte, designadamente, responsabilidade civil, ainda que contratual, é inviável o indeferimento parcial da execução.

Ora, no caso presente, é isso justamente que se passa.

A Apelante liquidou, no requerimento de injunção, o capital em dívida pelo Apelado em 1.886,66€, mas não discriminou os títulos parcelares que o compõem. Nem juntou faturas de onde se possa retirar essa informação. Apenas referenciou algumas faturas e os respetivos valores parcelares no final daquele requerimento, mas sem que se saiba exatamente a que prestações concretas correspondem. E, nesta fase executiva também não o fez.

Por conseguinte, é impossível concretizar os títulos e valores parcelares que correspondem a prestações emergentes dos contratos celebrados entre ambos e as que são resultantes da violação das obrigações desses convénios.

É verdade que, neste recurso, o Apelante veio pedir que “se reconheça a validade do título executivo, no que respeita ao pedido de pagamento da quantia exequenda de € 1.729,44, pois que, relativamente à mesma, não se verifica qualquer uso indevido do procedimento de injunção onde se formou o título executivo”.

Todavia, nem este é, como vimos, o momento oportuno para tal alegação, nem a Apelante indica os elementos probatórios de onde resulta tal liquidação.

Daí que, em suma, o requerido deferimento parcial do requerimento executivo seja de rejeitar. O que implica, necessariamente, a improcedência deste recurso e a confirmação da decisão recorrida.


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III- Dispositivo

Pelas razões expostas, acorda-se em julgar improcedente o presente recurso e, por consequência, confirma-se a decisão recorrida.


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- Em função deste resultado, as custas em ambas as instâncias serão pagas pela Apelante - artigo 527.º, n.ºs 1 e 2, do CPC.



Porto, 26/11/2025

João Diogo Rodrigues

Maria da Luz Seabra

Pinto dos Santos.




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[1] Cfr. a este propósito, a resenha efetuada pelo ora 2.º Adjunto no Ac. RP, de 11/12/2024, Processo n.º 1261/24.5T8VLG-A.P1, consultável em www.dgsi.pt.
[2] José Lebre de Freitas, Introdução ao Processo Civil, Conceito e Princípios Gerais, 2ª Edição Reimpressão, Coimbra Editora, págs 108 e 109.
[3] Cfr., para uma resenha de ambas as posições, o Ac. RLx, de 22/05/2025, Processo n.º 5821/24.6T8SNT.L1-6, consultável em www.dgsi.pt.
[4] Ponto 2 do sumário do Ac. RLx, de 21/11/2024, Processo n.º 5760/24.0T8SNT.L1-8, consultável em www.dgsi.pt.
Em sentido idêntico, Ac. RLx de 07/11/2024, Processo n.º 5740/24.6T8SNT.L1-2, consultável no mesmo endereço eletrónico.
[5] Ac. RLx, de 16/01/2025, Processo n.º 5863/24.1T8SNT.L1-8, consultável em www.dgsi.pt.