Acórdão do Tribunal da Relação do Porto | |||
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| Nº Convencional: | JTRP000 | ||
| Relator: | TERESA PINTO DA SILVA | ||
| Descritores: | RECLAMAÇÃO DE CRÉDITOS SUSTAÇÃO DA EXECUÇÃO | ||
| Nº do Documento: | RP202510138352/24.0T8PRT-A.P1 | ||
| Data do Acordão: | 10/13/2025 | ||
| Votação: | UNANIMIDADE | ||
| Texto Integral: | S | ||
| Privacidade: | 1 | ||
| Meio Processual: | APELAÇÃO | ||
| Decisão: | CONFIRMADA | ||
| Indicações Eventuais: | 5ª SECÇÃO | ||
| Área Temática: | . | ||
| Sumário: | I - A norma do artigo 794.º, n.º 2, do CPC estabelece um prazo perentório de 15 dias, contado da notificação da sustação, para o exequente reclamar o seu crédito no processo em que a penhora é mais antiga. II - Tendo a Recorrente sido regularmente notificada da sustação da execução por si intentada por ofício datado de 10 de dezembro de 2024, que continha todos os elementos essenciais e era plenamente apto a fazer correr aquele prazo legal de 15 dias, a reclamação de créditos apresentada em 4 de fevereiro de 2025 é manifestamente extemporânea. III - A circunstância de ter sido expedida uma segunda notificação em 11 de fevereiro de 2025 não tem o condão de repristinar ou renovar o prazo já decorrido, sob pena de grave violação dos princípios da segurança jurídica e da proteção da confiança. | ||
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| Decisão Texto Integral: | Processo nº 8352/24.0T8PRT-A.P1 Origem: Tribunal Judicial da Comarca do Porto Juízo de Execução do Porto – Juiz 7 Relatora: Teresa Pinto da Silva 1ª Adjunta: Teresa Fonseca 2ª Adjunta: Eugénia Cunha * Acordam as Juízas subscritores deste acórdão, da 5ª Secção, Cível, do Tribunal da Relação do PortoI – RELATÓRIO Por apenso aos autos de execução ordinária para pagamento de quantia certa que Condomínio do Edf. ..., ... intentou contra AA e BB, veio “A..., Lda”, em 4 de fevereiro de 2025, apresentar reclamação de créditos, alegando correr termos no Juíz 2 do Juízo de Execução de Ansião do Tribunal Judicial da Comarca de Leiria execução sob o n.º ..., contra o Executado/reclamado, em que a Reclamante figura como exequente, correspondendo a quantia exequenda/crédito ao montante global de €1.251.160,78, no âmbito da qual foi penhorado o bem imóvel descrito na Conservatória Registo Predial sob o nº ... - D, freguesia e concelho de Vila Nova de Famalicão, inscrito na matriz no artigo urbano ..., que também se encontra penhorado na execução de que estes autos constituem apenso, com registo anterior, pelo que foi sustada aquela execução n.º ... quanto ao identificado bem, nos termos do artigo 794º, do Código de Processo Civil. Em 14 de fevereiro de 2025, no âmbito dos presentes autos foi aberta conclusão, acompanha da seguinte informação: “Com informação a V.ª Ex.ª que me suscitam dúvidas quanto à data da decisão de sustação proferida no processo: ... - Tribunal Judicial da Comarca de Leiria - ... - Juízo de Execução - Juiz 2 (10-12-2024) e a notificação agora junta”, Tendo o Tribunal a quo proferido nessa data o seguinte despacho: «Na sequência do exposto na conclusão que antecede, solicite-se ao respetivo processo o envio de cópia da decisão de sustação da execução (quanto ao imóvel descrito na Conservatória do Registo Predial sobre o número ...-D - Vila Nova de Famalicão) e da sua notificação ao aí exequente, certificando a data desta.» Cumprido que foi esse despacho, veio o Juiz 2 do Juízo de Execução de Ansião informar, por ofício datado de 17 de fevereiro de 2025, que “a Execução Ordinária (Ag.Execução), ... se encontra sustada quanto ao imóvel descrito na Conservatória do Registo Predial sobre o numero ...-D - Vila Nova de Famalicão pelo Agente de Execução CC, com data de 10-12-2024, conforme ato do AE que se anexa. Dos autos consta que a agente de execução notificou a exequente na mesma data, 10-12-2024, conforme notificação que se anexa.”. Por despacho de 18 de fevereiro de 2025, o Tribunal a quo ordenou a notificação à reclamante A..., Lda., daqueles elementos juntos em 17.02.2025 (informação/elementos do processo nº ...), a fim de, «em 10 dias, se pronunciar, querendo, quando à perspetiva de ter sido notificado da sustação da execução por ofício de 10.12.2024 (e não em 11.02.2025, como se deduziria do requerimento de 12.02.2025).», o que aquela veio a fazer por requerimento de 26 de fevereiro de 2025, no qual se opôs à consideração de ter sido notificada no âmbito daquela execução em 10 de dezembro de 2024, alegando que foi notificada em 11 de fevereiro de 2025. Em 6 de março de 2025, o Tribunal a quo proferiu o seguinte despacho: « O processo n.º ..., do juízo de execução de Ansião-J2, evidencia que, em 10.12.2024, o agente de execução notificou o exequente da decisão de sustação da execução, em virtude de penhora à ordem da presente execução, e que, em 11.02.2025, o agente de execução notificou novamente o exequente dessa mesma decisão de sustação da execução, conforme ofícios juntos aos autos. Tendo presente os factos acima referidos, solicite-se ao processo n.º ..., do juízo de execução de Ansião-J2, que esclareça a razão da segunda notificação, obtendo, se possível, a explicação do agente de execução para o facto de ter notificado o exequente uma segunda vez da decisão de sustação e sobre qual a razão de a mesma ter sucedido exatamente no dia 11.02.2025.», tendo esta despacho sido notificado às partes apenas em 27 de março de 2025. Em 26 de março de 2025, o Juiz 2 do Juízo de Execução de Ansião informou da resposta do Sr,. Agente de Execução do processo n.º ..., ali prestada em 24 de março de 2025, no qual refere que notificou uma segunda vez o mandatário da exequente da decisão de sustação proferida naqueles autos em virtude de ter verificado que a notificação anteriormente efetuada ao mandatário apenas o notificava da decisão da sustação, e entendeu que a referida notificação padecia de uma irregularidade, pois não mencionava que a mesma era efetuada nos termos do artº 794º e 788 nº 3 e 5 do Código de Processo Civil, podendo o Exequente reclamar créditos. Mais esclareceu que efetuou a mesma no dia 11.02.2025, em virtude de nesse dia estar a tramitar o processo, proceder a citação de credor público e ter verificado a irregularidade na notificação. Em 27 de março de 2025, o Tribunal a quo proferiu despacho do qual consta o seguinte dispositivo: «Nestes termos, ao abrigo dos princípios e dos preceitos legais expostos, por extemporânea, indefiro liminarmente a reclamação de créditos da reclamante A.... Custas pela credora reclamante. Fixo à reclamação o valor apresentado pela reclamante.» Inconformada com esta decisão veio a Credora Reclamante A..., Lda, em 31 de março de 2025, dela interpor o presente recurso, terminando as suas alegações com as seguintes conclusões: i. A Recorrente não foi notificada da decisão de 6/3/2025, o que consubstancia nulidade processual, que ora se invoca na primeira intervenção processual após da mesma se ter apercebido. ii. Deverá ser conhecida tal nulidade e ser ordenada a notificação omitida da Recorrente (art.º 3º CPC). iii. A decisão recorrida indeferiu liminarmente a reclamação de créditos da Recorrente, por extemporânea. iv. A Reclamante entende que não foi regularmente notificada no âmbito dos autos de execução em 10-12-2024 da sustação da execução para efeito de reclamação de créditos nestes autos; v. Pois que foi regularmente notificada nesses autos para o efeito em 11/2/2025 – cfr arts. 719º, 720º e 157º, n.º 6 CPC; vi. no caso dos autos, a Sr.ª Solicitadora de Execução efectuou duas notificações à Reclamante, uma datada de 10/12/2024 e outra datada de 11/2/2025. vii. Por assim ser, quando reclamou créditos nestes autos – em 4/2/2025 – a Reclamante estava em tempo. viii. De notar que a notificação para reclamação de créditos de 11/2/2025 apenas se considera notificada ao Reclamante em 12/2/2025. ix. Por outro lado, não se pode conceder que se convoque a jurisprudência do Ac TRP de 11/3/2025, relator Alberto Taveira, pois que aí se estava perante uma citação, ao passo que nestes autos estamos perante um mero prazo ordenar para reclamação de créditos, sendo o reclamante um credor – e não um réu –, não estando a eximir-se à acção da justiça, e não perturbando a sua pretensão o andamento dos autos, tanto mais que existe já um apenso de reclamação de créditos, outros créditos foram reclamados, e há todo o interesse na apreciação e decisão conjunta na graduação dos créditos que detêm títulos executivos sobre o bem penhorado nos autos e sua satisfação pelo produto da venda. x. Evidentemente não litigou a Reclamante de má fé. xi. A decisão recorrida viola o disposto no artigo 157.º, no n.º 6 CPC, bem como o disposto nos arts 2º e 20º CRP, devendo ser substituída por outra que admita a reclamação de créditos da Reclamante, assim se fazendo a costumada JUSTIÇA! * Não foi apresentada resposta às alegações de recurso.* Foi proferido despacho, no qual se considerou o recurso tempestivo e legal e se admitiu o mesmo como sendo de apelação, com subida imediata, nos autos e com efeito suspensivo.* Recebido o processo nesta Relação, emitiu-se despacho que teve o recurso como próprio, tempestivamente interposto e admitido com efeito e modo de subida adequados.Colhidos os vistos legais, cumpre decidir. * Delimitação do objeto do recursoO objeto do recurso é delimitado pelas conclusões vertidas pela Recorrente nas suas alegações (arts. 635º, nºs 4 e 5 e 639º, nºs 1 e 2, do Código de Processo Civil), não podendo este Tribunal conhecer de matérias nelas não incluídas, a não ser que as mesmas sejam de conhecimento oficioso (art. 608.º, n.º 2, in fine, aplicável ex vi do art. 663.º, n.º 2, in fine, ambos do Código de Processo Civil). Não pode igualmente este Tribunal conhecer de questões novas (que não tenham sido objeto de apreciação na decisão recorrida), uma vez que os recursos são meios de impugnação de decisões judiciais prévias, destinando-se à apreciação de questões já levantadas e decididas no processo e não à prolação de decisões sobre questões que não foram nem submetidas ao contraditório nem decididas pelo tribunal recorrido. Mercê do exposto, da análise das conclusões vertidas pela Recorrente nas suas alegações decorre que o objeto do presente recurso está circunscrito às seguintes questões: 1ª – Se se verifica nulidade processual por alegada omissão de notificação da decisão de 6 de março de 2025. 2ª – Da tempestividade / intempestividade da reclamação de crédito apresentada pelo recorrente em 4 de fevereiro de 2025. * II – FUNDAMENTAÇÃOFundamentação de facto Os fundamentos de facto necessários à dilucidação das questões a decidir constam desde logo do relatório desta decisão, resultando a sua prova dos próprios autos de que a reclamação foi extraída, a que se teve acesso mediante a funcionalidade “Processos relacionados”, do sistema Citius, bem como dos próprios autos de reclamação, dotados, nesta vertente estritamente adjetiva, de força probatória plena, não se procedendo à reprodução dos mesmos, por tal se revelar desnecessário. Para além disso, importa ainda ter presente os seguintes factos que a decisão recorrida considerou provados: a) Nos autos da ação executiva, foi penhorada a fração autónoma designada pela letra “D” do prédio descrito na Conservatória do Registo Predial de Vila Nova de Famalicão, sob o n.º ...-D. b) Esta penhora encontra-se inscrita no respetivo registo predial sob a ap. de 7004, de 18.10.2024. c) A reclamante A... apresentou, como título executivo, a escritura pública de confissão de dívida e fiança junta com o respetivo requerimento, com o teor que se dá por reproduzido. d) A reclamante A... obteve, em execução por si interposta, com base naquele título executivo, sob o n.º ..., do juízo de execução de Ansião – J2 – conforme requerimento executivo junto como documento 8 da reclamação, com o teor que se dá por reproduzido – penhora sobre o mesmo imóvel, estando tal penhora registada sob a ap. ..., de 08.11.2024. e) Na sequência dessa penhora, a reclamante A... foi notificada nessa outra execução, por ofício de 10.12.2024, da sustação da execução, por pender penhora prioritária à ordem da presente execução, nos termos do seguinte ofício junto como documento 3 da reclamação: “Nos presentes autos foi penhorado bem imóvel descrito na Conservatória Registo Predial sob o nº ... - D, freguesia e concelho de Vila Nova de Famalicão, inscrito na matriz no artigo urbano ..., cfr. auto de penhora de 10/12/2024. Aquele foi penhorado anteriormente nos autos de execução Processo nº: 8352/24.0T8PRT do Tribunal Comarco do Porto- Porto- Juizo de Execução - Juiz 7. Assim, atenta a existência de penhora anteriormente registada sobre o imóvel, susta-se a execução, quanto àquele bem, nos termos do artigo 794º do CPC. Da presente decisão é informado o processo à ordem do qual se realizou a penhora anterior, acima identificado. Da presente decisão cabe impugnação para o Mmº Juíz, pelo que e para efeito, notifica-se a exequente, para, querendo, impugnar, no prazo de 10 dias.” f) A reclamante foi notificada na presente reclamação de créditos, por ofício de 06.02.2025, para juntar a notificação de sustação da sua execução, para efeitos da contagem do prazo da reclamação, g) vindo a reclamante a juntar, em 12.02.2025, um ofício de notificação da sustação da execução datado de 11.02.2025, correspondente ao infra referido. h) Por ofício do agente de execução dessa execução em que a A... é exequente, com data de 11.02.2025, foi a A... notificada do seguinte ofício: “Fica v.ª Exa. notificado na qualidade de mandatário da exequente, que a presente execução encontra-se sustada quanto ao imóvel descrito na Conservatória do Registo Predial sobre o numero ...-D - Vila Nova de Famalicão, nos termos do artigo 794º do CPC. Assim, poderá V.Exª reclamar créditos no processo com penhora anterior, nos termos do artº 788 nº 3 e 5 do CPC.”. * B) Fundamentação de direito1ª – Se se verifica nulidade processual por alegada omissão de notificação da decisão de 6 de março de 2025 A Recorrente invoca, em sede de recurso, a nulidade processual decorrente de não ter sido notificada do despacho de 6 de março de 2025, pugnando para que seja ordenada a notificação omitida. Compulsados os autos, cumpre desde logo referir que, diferentemente do alegado pela Recorrente, esta foi notificada do despacho de 6 de março de 2025 em 27 de março de 2025, conforme resulta da notificação do Citius com a referência 470419198. O que sucedeu foi que através dessa notificação a Recorrente foi notificada tando daquele despacho de 6 de março de 2025, como da decisão de 27 de março de 2025, da qual interpôs o presente recurso. Por isso, o que a Recorrente poderia questionar era o momento em que ocorreu aquela notificação, designadamente se deveria ter sido notificada daquele despacho de 6 de março de 2025 antes de ter sido proferida a decisão ora impugnada, o que não fez. Por outro lado, cumpre referir que caso tal questão tivesse sido suscitada pela Recorrente e se viesse a concluir que o despacho de 6 de março de 2025 deveria ter sido notificado às partes antes da prolação da decisão de 27 de março de 2025, não estaríamos perante um caso de nulidade principal (as nulidades principais estão previstas, taxativamente, nos art. 186º a 194º e 196º a 198º do Código de Processo Civil), mas perante uma irregularidade (as irregularidades estão incluídas na previsão geral do art. 195º Código de Processo Civil) que só determinaria a nulidade do processado subsequente àquela omissão se influísse no exame e decisão da causa, o que não é o caso. Acresce que o regime de arguição das irregularidades está sujeito ao disposto no artigo 199º, do Código de Processo Civil, pelo que a omissão de notificação do despacho de 6 de março de 2025 anteriormente à prolação da decisão e 27 de março de 2025 teria de ser arguida perante o Tribunal a quo, mediante reclamação, e não mediante recurso, tendo aqui inteira pertinência o brocardo segundo o qual”(dos despachos recorre-se, contra as nulidades reclama-se”. Termos em que, pelos fundamentos exposto, improcede nesta parte a pretensão recursiva. * 2ª – Da tempestividade / intempestividade da reclamação de crédito apresentada pela Recorrente em 4 de fevereiro de 2025 Dispõe o artigo 794.º do Código de Processo Civil, sob a epígrafe "Pluralidade de execuções sobre os mesmos bens": “1 – Pendendo mais de uma execução sobre os mesmos bens, o agente de execução susta quanto a estes a execução em que a penhora tiver sido posterior, podendo o exequente reclamar o respetivo crédito no processo em que a penhora seja mais antiga. 2 - Se o exequente ainda não tiver sido citado no processo em que a penhora seja mais antiga, pode reclamar o seu crédito no prazo de 15 dias a contar da notificação de sustação; a reclamação suspende os efeitos da graduação de créditos já fixada e, se for atendida, provoca nova sentença de graduação, na qual se inclui o crédito do reclamante. 3 – Na execução sustada, pode o exequente desistir da penhora relativa aos bens apreendidos no outro processo e indicar outros em sua substituição. 4 – A sustação integral determina a extinção da execução, sem prejuízo do disposto no nº5 do artigo 850º.” A norma é clara: o exequente cuja execução é sustada por força de penhora anterior dispõe de um prazo perentório de 15 dias, contados da notificação da sustação, para reclamar o seu crédito no processo em que a penhora é mais antiga. Resulta dos autos, com toda a clareza e sem margem para dúvida razoável, o seguinte factualismo: a) A Recorrente foi notificada, por ofício datado de 10 de dezembro de 2024, da sustação da execução n.º ..., em que é exequente, por força da existência de penhora anterior registada nos presentes autos; b) O referido ofício, junto pela própria Recorrente como documento n.º 3 na reclamação de créditos que apresentou em 4 de fevereiro de 2025, contém todos os elementos essenciais para aquela poder reclamar o seu crédito, designadamente a identificação do bem penhorado, a referência ao processo em que foi registada penhora anterior e, crucialmente, a indicação expressa de que se "susta a execução, quanto àquele bem, nos termos do artigo 794.º do CPC"; c) A Recorrente apresentou a sua reclamação de créditos em 4 de fevereiro de 2025, juntando precisamente o ofício de 10 de dezembro de 2024 como demonstrativo da sustação da execução n.º ... nos termos do artigo 794º do Código de Processo Civil. d) Posteriormente, em 11 de fevereiro de 2025, foi expedido um segundo ofício de notificação da sustação pela Srª Agente de Execução, com conteúdo substancialmente idêntico ao primeiro, apenas se tendo aditado “poderá V.Exª reclamar créditos no processo com penhora anterior, nos termos do artº 788 nº 3 e 5 do Código de Processo Civil”. Ora, é manifesto que a primeira notificação, datada de 10 de dezembro de 2024, era apta a despoletar o início do prazo de 15 dias previsto no artigo 794.º, n.º 2, do Código de Processo Civil. O ofício continha todos os elementos necessários à cabal compreensão da situação processual e das suas consequências jurídicas, sendo plenamente eficaz para o efeito pretendido. Mais: a própria Recorrente assim o entendeu, tanto que, em 4 de fevereiro de 2025, apresentou a sua reclamação de créditos com fundamento naquele ofício de 10 de dezembro de 2024, juntando-o aos autos como documento justificativo da sua legitimidade para reclamar. Em defesa da sua pretensão, invoca a Recorrente o disposto no artigo 157º, nº 6, do Código de Processo Civil, segundo o qual os erros e omissões da secretaria judicial não podem prejudicar as partes. Contudo, tal invocação não tem cabimento no caso sub judice, e isto por múltiplas razões. Em primeiro lugar, não se verifica qualquer erro ou omissão por parte da secretaria judicial ou do agente de execução. O ofício de 10 de dezembro de 2024 foi regularmente emitido, continha todos os elementos legalmente exigíveis e produziu os seus efeitos normais, designadamente o de fazer correr o prazo de 15 dias para a reclamação de créditos. Note-se que não é pelo facto de a Srª Agente de Execução vir posteriormente, de forma aliás inusitada, em 24 de março de 2025, quando instada a informar o motivo pelo qual notificou uma segunda vez o mandatário da exequente da sustação da execução do processo n.º ..., informar que o fez em virtude de ter verificado que a notificação anteriormente efetuada ao mandatário apenas o notificava da decisão da sustação, e ter entendido que a referida notificação padecia de uma irregularidade, pois não mencionava que a mesma era efetuada nos termos do artº 794º e 788 nº 3 e 5 do CPC, podendo o exequente reclamar créditos, que aquela notificação de 10 de dezembro de 2024 se deve ter por “irregular”. Aliás, a informação prestada pelo Juiz 2 do Juízo de Execução de Ansião, por ofício datado de 17 de fevereiro de 2025, (nos termos da qual /a Execução Ordinária (Ag.Execução), ... se encontra sustada quanto ao imóvel descrito na Conservatória do Registo Predial sobre o número ...-D - Vila Nova de Famalicão pelo Agente de Execução CC, com data de 10-12-2024, conforme ato do AE), que indicia que a Srº Agente de Execução tomou a iniciativa de enviar segunda notificação ao Ilustre Mandatária da Exequente, aqui reclamante, A... em 11 de fevereiro de 2025 e nem sequer deu imediato conhecimento desse ato naqueles autos. Em segundo lugar, a norma do artigo 157.º, n.º 6, do Código de Processo Civil, aplica-se a situações em que existe efetivamente um erro ou omissão da secretaria que seja suscetível de induzir a parte em erro ou de criar uma expectativa legítima quanto ao conteúdo ou alcance de determinado ato processual. No caso vertente, não existe qualquer erro ou omissão que tenha induzido a Recorrente em qualquer expectativa legítima. Pelo contrário: a Recorrente foi correta e tempestivamente notificada da sustação da execução, tendo inclusive compreendido perfeitamente o conteúdo e alcance dessa notificação, tanto que apresentou reclamação de créditos com fundamento nela. Mais, acabou por apresentar a reclamação de créditos antes da data da segunda notificação de sustação, cuja validade pretende ver reconhecida. Em terceiro lugar, a existência de uma segunda notificação não tem o condão de repristinar ou renovar um prazo que já se encontrava decorrido. Trata-se de situação completamente diversa daquela em que existe um erro inicial que é posteriormente corrigido. Aqui, não houve erro inicial algum; houve uma primeira notificação válida e eficaz, seguida, por razões que não são claras, de uma segunda notificação com idêntico conteúdo. Como bem refere a decisão recorrida, citando o Acórdão do Tribunal da Relação do Porto de 11 de março de 2025, processo n.º 4176/24.3T8OAZ-A.P1, disponível in www.dgsi.pt, "ocorrendo segunda citação da requerida para contestar e já havendo decorrido o prazo na íntegra após a primeira citação, precludiu o direito de contestar". Embora o acórdão citado se refira a citação e não a notificação para reclamação de créditos, o princípio subjacente é absolutamente transponível para o caso dos autos: uma vez decorrido integralmente um prazo perentório, não pode esse prazo ser renovado ou repristinado por uma segunda notificação do mesmo ato. A Recorrente pretende distinguir a sua situação da citação, alegando que se trata de "mero prazo ordenador" e que é "credor e não réu", argumentos que não colhem a adesão desta Tribunal. O prazo de 15 dias previsto no artigo 794.º, n.º 2, do CPC, tem natureza perentória e não ordenadora, como resulta inequivocamente da sua inserção sistemática e das razões de certeza jurídica e de proteção, tanto do devedor executado como dos credores exequentes. A Recorrente invoca ainda, em abono da sua tese, os princípios constitucionais da segurança jurídica e da proteção da confiança (artigo 2.º da Constituição da República Portuguesa), bem como o direito de acesso aos tribunais (artigo 20.º da Constituição da República Portuguesa). Porém, no caso sub judice, são precisamente estes princípios que militam contra a tese da Recorrente. Com efeito, a segurança jurídica exige previsibilidade e calculabilidade dos efeitos jurídicos dos atos processuais. Os prazos perentórios, designadamente o prazo de 15 dias previsto no artigo 794.º, n.º 2, do Código de Processo Civil, visam assegurar a celeridade e eficácia da tramitação processual, bem como a proteção dos direitos de terceiros (outros credores, executado). Admitir que uma segunda notificação, emitida dois meses após a primeira, pudesse ter o efeito de renovar o prazo de reclamação de créditos seria criar uma fonte de gravíssima insegurança jurídica, permitindo que situações processuais já consolidadas fossem reabertas a todo o tempo, mediante a simples expedição de uma segunda notificação. Por outro lado, não existe qualquer expectativa legítima da Recorrente que mereça tutela jurídica. A Recorrente foi regularmente notificada em 10 de dezembro de 2024, compreendeu perfeitamente o conteúdo dessa notificação (como o demonstra o facto de ter apresentado reclamação de créditos com fundamento nela, antes da segunda notificação), e simplesmente deixou decorrer o prazo legal sem o exercer atempadamente. Não pode, pois, invocar a seu favor uma segunda notificação cuja expedição, aliás, se mostra incompreensível, para tentar obviar às consequências da sua inércia processual - à data da apresentação da reclamação de créditos (4 de fevereiro de 2025) já havia decorrido mais do dobro do prazo legal de 15 dias desde a notificação de 10 de dezembro de 2024. O direito de reclamar créditos estava, pois, irremediavelmente precludido. Pelo exposto, não se vislumbra que a decisão recorrida viole o disposto no Artigo 157.º, n.º 6, do Código de Processo Civil, nem os preceitos constitucionais invocados, porquanto a primeira notificação (de 10.12.2024) cumpriu o seu escopo legal, e a Recorrente não podia nutrir qualquer expectativa legítima de que a duplicação do ofício, ocorrida após o decurso do prazo, pudesse convalidar a sua intempestividade. A extemporaneidade da reclamação de créditos apresentada pela Recorrente em 4 de fevereiro e 2025 é, pois, manifesta, decorrendo objetivamente do confronto entre a data da sua notificação nos termos do artigo 794º, nº1, do Código de Processo Civil (10/12/2024) e a data da apresentação da sua reclamação (04/02/2025). Improcede, pelo exposto, na totalidade, o recurso interposto, concluindo-se pela manutenção da decisão recorrida. * Nos termos dos n.ºs 1 e 2 do artigo 527º do Código de Processo Civil, a decisão que julgue o recurso condena em custas a parte que lhes tiver dado causa, presumindo-se que lhes deu causa a parte vencida, na respetiva proporção, pelo que, mercê do princípio da causalidade, as custas serão da responsabilidade da Recorrente.* Síntese conclusiva (da exclusiva responsabilidade da Relatora – artigo 663º, nº7, do Código de Processo Civil):……………………………… ……………………………… ……………………………… * III – DECISÃOPelo exposto, acordam as juízas subscritoras deste acórdão da 5ª Secção, Cível, do Tribunal da Relação do Porto em julgar a apelação improcedente, confirmando a decisão recorrida. Custas pela Recorrente. * Porto, 13 de outubro de 2025As Juízas Desembargadoras Teresa Pinto da SilvaTeresa Fonseca Eugénia Cunha |