Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa | |||
Processo: |
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Relator: | MARIA JOSÉ COSTA PINTO | ||
Descritores: | CONTRATO DE TRABALHO A TERMO CATEGORIA PROFISSIONAL TRIPULANTE DE CABINE | ||
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Nº do Documento: | RL | ||
Data do Acordão: | 05/14/2025 | ||
Votação: | UNANIMIDADE | ||
Texto Integral: | S | ||
Texto Parcial: | N | ||
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Meio Processual: | APELAÇÃO | ||
Decisão: | PARCIALMENTE PROCEDENTE | ||
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Sumário: | I. Devem considerar-se nulas por violação de norma legal imperativa cláusulas de uma convenção colectiva que estabelecem categorias inferiores na admissão para os contratados a termo, em conformidade com o Acórdão do Pleno da Secção Social do Supremo Tribunal de Justiça de 11 de Dezembro de 2024. II. Uma vez adoptada pelo Supremo Tribunal de Justiça jurisprudência com função uniformizadora, deve ela ser seguida pelos tribunais judiciais enquanto se mantiverem as circunstâncias em que se baseou. III. O dano não patrimonial, enquanto pressuposto da responsabilidade civil, não reside em factos, situações ou estados mais ou menos abstractos aptos para desencadear consequências de ordem moral ou espiritual sofridas pelo lesado, mas na efectiva verificação dessas consequências. | ||
Decisão Texto Parcial: | ![]() | ||
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Decisão Texto Integral: | Acordam na Secção Social do Tribunal da Relação de Lisboa: П 1. Relatório 1.1. AA intentou a presente acção declarativa com processo comum, emergente de contrato de trabalho contra TAP – Transportes Aéreos Portugueses. Formulou o pedido que se transcreve: «1. Deverá a presente ação julgar-se procedente, por provada, e, julgando-se nulo o termo aposto no contrato de trabalho celebrado entre a R. e o A., ser declarada a ilicitude do seu despedimento; Consequentemente, a. Deverá a R. ser condenada a reintegrar o A. no seu posto de trabalho, b. com a categoria de CAB I e antiguidade nessa categoria reportada a 18 de fevereiro de 2018; OU com a categoria superior que lhe couber em função da antiguidade na empresa (CAB II a partir de 18 de fevereiro de 2021, CAB III a partir de 18 de fevereiro de 2024, etc.). c. Deverá também a R. ser condenada a pagar ao A. as retribuições que este deixou de auferir desde a data do seu despedimento até ao trânsito em julgado da decisão que declare o despedimento ilícito; 2. Deverá ainda a R. ser condenada a pagar ao A.: a. as diferenças salariais verificadas em virtude da sua errada integração inicial na categoria de CAB Início; b. uma indemnização pelos danos não patrimoniais infligidos pela Ré ao Autor, à razão de uma quantia não inferior a 1.000,00 € por cada mês de afastamento do Autor da sua atividade, que provisoriamente se liquidam em 12.000,00 €, sem prejuízo dos danos excedentes vincendos.» No decurso da audiência de partes, foi decidida a suspensão da instância, por se ter entendido existir prejudicialidade entre os autos de Impugnação Judicial da Regularidade e Licitude do Despedimento que corriam termos sob o número 26501/18.6T8LSB, no Juizo do Trabalho de Lisboa. Uma vez junta a sentença proferida nesses autos, foi retomada a diligência, no termo da qual a R. foi notificada para contestar a acção. Na contestação apresentada, a R. escusou-se a pronunciar sobre parte dos pedidos apresentados pelo Autor – em face do já definitivamente decidido nos autos 26501/18.6T8LSB quanto à nulidade do termo aposto ao contrato de trabalho celebrado com o Autor – e defendeu a total improcedência do mais peticionado pelo Autor, no que respeita à sua categoria, por entender que a interpretação que aquele faz não se revela correcta e não encontra fundamento no Acordo de Empresa. Afirmou ainda ser infundado o pedido de danos não patrimoniais, não existindo um qualquer comportamento ilícito da sua parte, susceptível de justificar tal condenação, nem danos que mereçam a tutela do direito. Findos os articulados, foi proferido despacho saneador, em que se conheceu da excepção dilatória insuprível e de conhecimento oficioso de caso jugado, atento o âmbito de conhecimento destes autos e o que fora já conhecido e decidido, por sentença transitada em julgado nos autos número 26501/18.6T8LSB, que haviam corrido termos no Juízo de Trabalho de Lisboa (Juiz 3), considerando que as questões suscitadas pelo Autor nos seus pontos 1, alíneas a. e c. do petitório se mostravam definitivamente decididas, razão pela qual se absolveu a Ré da instância quanto ao ali pretendido. Mais se decidiu que os autos prosseguiriam apenas para apreciação do peticionado no ponto 1., alínea b. (apreciação da categoria do Autor) e no ponto 2., alíneas a. e b., do petitório (existência de diferenças salariais a pagar, em função da categoria do Autor, e danos não patrimoniais). Foi também proferido despacho a fixar o objecto do litígio e a elencar os temas da prova, fixando-se à acção o valor de € 30.000,01. Uma vez realizada a audiência de discussão e julgamento, foi proferida sentença que julgou a presente acção improcedente e, em consequência, absolveu a R. de todos os pedidos contra si deduzidos. 1.2. O A., inconformado interpôs recurso desta decisão, tendo formulado, a terminar as respectivas alegações, as seguintes conclusões: “a. O Recorrente deu entrada de ação declarativa de condenação peticionando que a sua reintegração fosse com a categoria de CAB I reportada a 18 de fevereiro de 2018 ou com a categoria superior que lhe coubesse em função da antiguidade da empresa, o pagamento das diferenças salariais verificadas em virtude da sua errada integração inicial na categoria de CAB Início bem como uma indemnização pelos danos não patrimoniais infligidos pela Ré ao Autor, à razão de uma quantia não inferior a € 1.000,00 por cada mês de afastamento do Autor da sua atividade. b. Após realização da audiência de discussão e julgamento, o Tribunal proferiu sentença absolvendo a Recorrida dos pedidos apresentados. c. Não se conformando com tal decisão, o Recorrente apresentou o presente recurso de alegação, visando assim a revogação da sentença primitiva proferida, substituindo-a por outra que condene a Recorrida nos pedidos aduzidos. d. Salvo melhor opinião, é inequívoco que o Recorrente deveria ser reintegrado na categoria de CAB I, recebendo as respetivas diferenças salariais. e. Encontra-se estabelecido na Cláusula 12ª do contrato celebrado pelos Recorrentes com a Recorrida: “No omisso, o presente contrato rege-se em tudo quanto for compatível pelo AE TAP/SNPVAC e subsidiariamente pelas disposições constantes do Código de Trabalho e demais legislação complementar”. f. Estabelecem a cláusulas 4ª e 5ª do Regulamento da Carreira Profissional de Tripulante de Cabina anexo ao Acordo de Empresa celebrado entre a TAP/SNPVAC, publicado no BTE nº 8/2006, de 28.2 referem que apenas os tripulantes de cabine contratados a termo são classificados nas categorias CAB início e CAB 0, sendo os tripulantes com contrato por tempo indeterminados integrados na categoria CAB I. g. Por conseguinte, tendo em conta as tabelas salariais insertas no mesmo instrumento de regulação coletiva, deveria o Recorrente ter auferido desde a admissão a retribuição base mensal correspondente ao valor vigente para CAB I, até ao despedimento, pelo que também lhe é devida as respectivas diferenças salariais, quer ao nível da remuneração base, quer ao nível das demais prestações calculadas por referência a essa retribuição, tais como subsídios de férias, natal e per diems. h. A Recorrida não logrou provar nenhum motivo que obstasse à evolução salarial do Recorrente; i. A sentença ora em análise encontra-se em manifesta contradição com acórdãos já transitados em julgado, como é exemplo disso os Acórdãos proferidos no âmbito dos processos 21095/20.5T8LSB.L1-4, 10317/20.2T8LSB.L1 e 6563/22.2T8LSB.L2 j. Assim, considerando, que da leitura combinada das mencionadas cláusulas retira-se essa conclusão, ou seja, que aos contratados a termo será atribuída a categoria CAB início e após o decurso do período a que alude o nº 2 da cláusula 5ª a CAB 0, ao passo que os contratados por tempo indeterminado ingressarão, de imediato, a categoria CAB 1 sem que tenham de guardar o decurso do período aí mencionada, a sentença ora recorrida não aplica de forma correta o direito, motivo pelo qual merece, com o devido respeito censura. k. Motivo pelo qual deverá a mesma ser revogada e substituída por outra que reconheça que o Recorrente deverá ser enquadrado na categoria de CAB I desde o primeiro dia, recebendo, assim, as respetivas diferenças salariais que se vierem a apurar bem como uma indemnização pelos danos morais causados que, são indiscutíveis, no cenário de um despedimento ilícito no âmbito de uma pandemia.” 1.3. A R. apresentou contra-alegações em que defende a improcedência do recurso. Rematou a sua peça com as seguintes conclusões: “1. O presente recurso vem interposto da sentença proferida no dia 23 de julho de 2024, que julgou a ação improcedente, absolvendo a Recorrida de todos os pedidos contra si deduzidos, incidindo apenas e tão-só sobre a matéria de direito. 2. Em primeiro lugar, entende o Recorrente que, por ter sido decidido que o termo aposto ao contrato de trabalho celebrado entre as partes em litígio era nulo, então, por força dessa nulidade e da consequente conversão desse mesmo contrato em contrato por tempo indeterminado desde a data da sua celebração, decorreria o direito de ser integrado na categoria de CAB I desde o momento em que foi admitido na Recorrida e, em consequência, reclama o pagamento das respetivas diferenças salariais. 3. Porém, o entendimento do Recorrente não pode proceder, por carecer de fundamento de direito. 4. Antes de mais, cumpre referir que a invalidade do termo aposto no contrato de trabalho não pode extrair-se outro efeito que não o da mera estabilização do vínculo laboral. 5. A evolução salarial nas várias posições que integram a categoria de CAB não depende nem está associada ao tipo de vínculo contratual de cada trabalhador e também não é automática. 6. Com efeito, o AE aplicável define e comporta uma tabela e evolução salarial como regime base ou principal de integração inicial e de evolução da carreira profissional de CAB, depois complementado com as demais cláusulas do AE, entre elas as constantes do RCPTC anexo ao referido AE. 7. De acordo com esse regime, os tripulantes de cabine (independentemente do tipo de vínculo contratual que tenham celebrado com a Ré) são admitidos no quadro de narrow body (ou seja, prestam a sua atividade profissional em equipamentos narrow body, que são aeronaves de fuselagem estreita) – n.º 1 da cláusula 4.ª do RCPTC. 8. A possibilidade que é concedida a estes profissionais de passarem para o quadro wide body (ou seja, de passarem a prestar a sua atividade profissional em equipamentos wide body, que são aeronaves de fuselagem larga) depende do resultado do processo de progressão técnica [cfr. alínea d), da cláusula 2.ª e cláusula 14.ª do RCPTC], processo esse que, entre outros requisitos, avalia a experiência profissional dos tripulantes de cabine em função do número de anos de trabalho ao serviço da Ré, entre outros. 9. Sendo certo que, só prestam trabalho no quadro Wide body os tripulantes de cabine que titulem, pelo menos, o nível I da categoria de CAB, precisamente porque o elemento experiência (medido em termos de tempo de exercício da profissão) é absolutamente essencial e crítico para o desenvolvimento desta concreta atividade profissional. 10. E esse mesmo elemento, ou seja, a experiência e o tempo de exercício da profissão, assume, igualmente, crucial e crítica importância na evolução nos diversos níveis salariais que integram a categoria de CAB, também porque, como se viu, o facto de um tripulante de cabine ocupar um determinado nível tem impacto e relevância para as funções exercidas e para o tipo de equipamento onde pode exercer essas mesmas funções. 11. Por isso mesmo, aliás, os n.ºs 1 e 2 da cláusula 5.ª do RCPTC estabelecem diversos requisitos para a evolução salarial nos escalões previstos, maxime a permanência durante um determinado período de tempo em cada posição, sem qualquer dependência do tipo de vínculo contratual. 12. O requisito essencial de período de permanência em cada escalão remuneratório, não pode, até pela sua razão de ser – a aquisição de experiência – ser omitido, em virtude da estabilização do vínculo. 13. Tal interpretação traduzir-se-ia num atentado expresso e direto contra o elemento literal da cláusula em causa e em abdicar de uma leitura integral e congruente de todo o RCPTC, recorrendo a um elemento de enquadramento jurídico para ignorar um elemento de tipo naturalístico. 14. Neste mesmo sentido, veja-se os acórdãos proferidos por este douto Tribunal, de 20 de novembro de 2019 (proc. n.º 2210/13.1TTLSB-A.L1), de 28 de junho 2023 (proc. n.º 28988/21.0T8LSB.L1) – às quais se faz menção na sentença recorrida, por o Tribunal a quo acompanhar esse mesmo entendimento, sufragado também pela Recorrida – e, ainda, de 11 de julho de 2024 (processo n.º 30533/21.9T8LSB.L1-4). 15. Com efeito, dúvidas não restam de que a declaração de nulidade do termo aposto a contrato a termo não pode ter como consequência a integração do Recorrido ab initio no nível salarial de CAB I, por tudo quanto se expõe. 16. Por outro lado, sustenta ainda o Recorrente que deverá a sentença ser revogada, substituindo-a por outra que condene a Recorrida também no pagamento de uma indemnização pelos danos morais sofridos pelo Recorrente com a sua alegada dolosa atuação. 17. Sucede, porém, que não assiste qualquer razão ao Recorrente, aderindo-se integralmente à decisão recorrida também quanto a esta matéria. 18. Assim, desde logo, o reconhecimento do direito a indemnização por danos morais pressupõe a alegação e prova de todos os pressupostos que enformam a responsabilidade civil, o que não se verificou nos presentes autos. 19. Mesmo que assim não se tivesse entendido, não sofreu o Recorrido danos, muito menos objetivamente graves e, nos termos legais, só estes são merecedores de reparação. 20. Nestes termos, a decisão recorrida, que julgou improcedente a ação, absolvendo a Recorrida dos pedidos deduzidos pelo Recorrente, não merece qualquer censura, pelo que a mesma deve ser mantida nos seus precisos termos.” 1.4. O recurso foi admitido com subida imediata, nos próprios autos (fls. 409). * 1.5. Recebidos os autos nesta Relação, a Exma. Procuradora-Geral Adjunta opinou pelo não provimento do recurso em douto Parecer a que nenhuma das partes respondeu. * Colhidos os “vistos”, foram notificados recorrente e recorrida nos termos do artigo 3.º, n.º 3, do Código de Processo Civil, para se pronunciarem, querendo, sobre a questão da validade da Cláusula 5.ª do Regulamento da Carreira Profissional de Tripulante de Cabina, anexo ao Acordo de Empresa celebrado entre a TAP e o SNPVAC, publicado na 1.ª Série do BTE n.º 8, de 28 de Fevereiro de 2006, conhecida no Acórdão do Pleno da Secção Social do Supremo Tribunal de Justiça de 11 de Dezembro de 2024 (pro. n.º 8882/20.3T8LSB.L1.S1), perpectivando a hipótese de vir a ser acolhida por este Tribunal da Relação a doutrina uniformizadora constante de tal aresto. Cumprido o contraditório, apenas a recorrida se pronunciou, invocando o Acórdão do Tribunal Constitucional n.º 361/2018 para sustentar que o indicado aresto de 11 de Dezembro de 2024 não poderá ter influência na decisão destes autos e enfatizando que o período de permanência em cada escalão remuneratório que estabelece a cláusula 5.ª, n.ºs 1 e 2 do RCPTC anexo ao AE aplicável constitui requisito essencial para a evolução salarial nos escalões que não pode ser omitido, conforme jurisprudência que cita, e que a declaração de nulidade do termo aposto ao contrato de trabalho não pode ter como consequência a integração do Recorrido ab initio no nível salarial de CAB I, um grave desequilíbrio e uma injusta indiferenciação entre profissionais, remetendo para o que expendeu nas suas alegações de recurso. Colhidos novos vistos e realizada a Conferência, cumpre decidir. * 2. Objecto do recurso Sendo o âmbito do recurso delimitado pelas conclusões do recorrente – artigos 635.º, n.º 4 e 639.º, n.ºs 1 e 2 do Código de Processo Civil, aplicáveis “ex vi” do art.º 87.º, n.º 1, do Código de Processo do Trabalho – as questões a enfrentar são, por ordem lógica da sua apreciação as seguintes: 1.ª – saber se a circunstância de o contrato de trabalho a termo celebrado inicialmente com o recorrente se ter convertido em contrato de trabalho por tempo indeterminado implica a sua integração automática na categoria profissional de CAB I, o que pressupõe a interpretação da cláusulas 10.ª, do citado AE e das cláusulas 4.ª e 5.ª, do Regulamento da Carreira Profissional do Tripulante de Cabine, anexo ao Acordo de Empresa TAP/SNPVAC, publicado no BTE, n.º 8, de 28 de Fevereiro de 2006, bem como aferir da sua validade; 2.ª – em caso de resposta afirmativa, com a integração do recorrente na categoria de CAB I desde o início do seu contrato de trabalho, aferir se o mesmo tem direito a diferenças remuneratórias daí decorrentes; 3.ª – da indemnização por danos não patrimoniais. Cabe precisar que não é objecto do presente recurso, a matéria da validade do motivo justificativo aposto ao contrato a termo celebrado entre as partes, por tal se encontrar decidido com trânsito em julgado. * 3. Fundamentação de facto * A sentença da 1.ª instância contém a seguinte decisão de facto (que não foi objecto de impugnação): «[...] II.1. – Factos Provados: Discutida e instruída a causa, com relevo para a sua decisão, resultaram provados os seguintes factos: A. O Autor e a Ré celebraram, em 18 de Fevereiro de 2018, acordo escrito, denominado Contrato de Trabalho a Termo Certo, mediante o qual a segunda declarava admitir o primeiro ao seu serviço e este se obrigava a prestar-lhe a sua actividade com a categoria com a categoria profissional de CAB – Comissário/Assistente; B. Por comunicação datada de 11 de Outubro de 2018, a Ré comunicou ao Autor a sua decisão de despedimento imediato, com invocação de justa causa; C. Na sequência do referido em B., o Autor intentou procedimento cautelar de suspensão de despedimento que correu termos sob o número 26501/18.6T8LSB-A, em que, por acórdão proferido a 15 de Maio de 2019, foi decretada a suspensão do despedimento do aqui Autor; D. O Autor instaurou, na sequência da comunicação referida em B. uns autos de Impugnação da Regularidade e Licitude do despedimento, que foram distribuídos ao J3 do Juízo de Trabalho de Lisboa, sob o número 26501/18.6T8LSB; E. Com data de 25 de Janeiro de 2019, a Ré enviou ao Autor comunicação escrita de onde constam, para além do mais, os seguintes dizeres: “(…) “cautelarmente, caso o pedido de declaração da ilicitude e regularidade do despedimento de V. Exa. venha a ser considerado judicialmente procedente, no que não se concede, fica V. Exa. por este meio expressamente notificado, nos termos do n.º 1 do art.º 344. Do Código do Trabalho, que o contrato individual de trabalho a termo certo, outorgado no dia 18 de Fevereiro de 2018, caduca com efeitos a 17 de Fevereiro de 2019, data a partir da qual se considerará, em qualquer caso, extinto o vínculo laboral.”; F. Por sentença datada de 03 de Junho de 2022, nos autos 26501/18.6T8LSB, foi a acção julgada procedente e, em consequência (i) foi declarado nulo o termo aposto no contrato de trabalho celebrado entre Autor e Ré, referido em A.; (ii) foi declarado ilícito o despedimento do Autor e condenada a Ré a reintegrar o Autor no seu posto de trabalho, sem prejuízo da sua categoria e antiguidade e a pagar-lhe as retribuições que deixou de auferir desde o trigésimo dia anterior à data da propositura da acção até ao trânsito em julgado da presente sentença, aí se incluindo a retribuição das férias, subsídio de férias e subsídio de Natal, deduzidas das importâncias previstas nas alíneas a) e c) do n.º 2 , do artigo 390º, do Código do Trabalho, acrescidas de juros legais a partir da data do referido trânsito em julgado e até integral pagamento; G. A sentença referida em F. transitou em julgado em 27 de Fevereiro de 2023; II.2 – Factos Não Provados: Com interesse para a decisão da causa não se provaram quaisquer outros facos, nomeadamente não se provou que: 1. Só os tripulantes contratados a termo pela Ré são integrados nas categorias de Comissário/Assistente de Bordo CAB início e CAB0; 2. Os tripulantes da Ré não contratados a termo são obrigatoriamente integrados na carreira de Comissário/Assistente de Bordo CAB 1 ou superior; 3. Ao longo do processo referido em D., a Ré fez o Autor sentir-se enganado, por se ter apercebido que o seu Contrato de Trabalho foi celebrado a termo certo sem justificação atendível, com o propósito de o manter em situação laboral precária e por a Ré se ter aproveitado desse termo certo para se obviar às obrigações de o reintegrar e de o fazer crer que não iria ter qualquer hipótese de reintegração em razão da caducidade do contrato; 4. O Autor sentiu-se perseguido e alienado pela Ré, o que o tem deixado frustrado por se sentir discriminado e impotente perante a ‘marcação cerrada’ efectuada pela TAP; 5. O Autor não conseguiu encontrar emprego na área de que tanto gosta, por ter sido despedido pela TAP; [...]». * 4. Fundamentação de direito * 4.1. A questão de direito essencial a apreciar consiste em saber se, face ao disposto no Regulamento de Carreira Profissional do Tripulante de Cabine (RCPTC) anexo ao Acordo de Empresa TAP/SNPVAC, publicado no Boletim do Trabalho e Emprego, n.º 8, de 28 de Fevereiro de 2006, a circunstância de o contrato de trabalho a termo celebrado inicialmente com o recorrente se ter convertido em contrato de trabalho por tempo indeterminado implica a sua integração automática na categoria profissional de CAB I desde o início, o que convoca, antes de mais se proceda à interpretação – e aferição da validade – da cláusula 10.ª, do citado AE e das cláusulas 4.ª e 5.ª, do RCPTC a ele Anexo. Segundo alega o recorrente, tendo sido decidido que o termo aposto ao contrato de trabalho celebrado entre as partes em litígio era nulo, com a consequente conversão desse mesmo contrato em contrato por tempo indeterminado desde a data da sua celebração, daí decorre o direito a ser integrado na categoria de CAB I desde o momento em que foi admitido ao serviço da recorrida, em consequência do que reclama o pagamento das respetivas diferenças salariais. Na perspectiva da recorrida, da invalidade do termo aposto no contrato de trabalho não pode extrair-se outro efeito que não o da mera estabilização do vínculo laboral e, além disso, a evolução salarial nas várias posições que integram a categoria de CAB não depende nem está associada ao tipo de vínculo contratual de cada trabalhador e também não é automática, dependendo de outros factores, como a experiência profissional dos tripulantes de cabina, o número de anos de trabalho ao seu serviço e o tempo de permanência em cada escalão contratual. A cláusula 10.ª do indicado Acordo de Empresa, publicado no Boletim do Trabalho e Emprego n.º 8, de 28 de Fevereiro de 2006, sob a epígrafe, “Categorias e carreiras profissionais”, dispõe que: “1 – As categorias profissionais dos tripulantes de cabina e o respetivo conteúdo funcional são os constantes do regulamento de carreira profissional do tripulante de cabina. 2 - As qualificações técnicas necessárias ao desempenho das funções previstas para cada uma das categorias profissionais são as estabelecidas nas disposições legais aplicáveis e no presente AE. 3 — A evolução na carreira profissional e a progressão técnica processa-se de acordo com o regulamento de carreira profissional do tripulante de cabine. 4 — As normas de utilização dos tripulantes são as constantes do regulamento de utilização e prestação de trabalho deste AE.” Por seu turno a Cláusula 4ª do Regulamento de Carreira Profissional do Tripulante de Cabina (RCPTC), a ele anexo, sob a epígrafe “Admissão e evolução na carreira profissional”, rege do seguinte modo: “1 — Os tripulantes de cabina são admitidos na categoria profissional de comissário/assistente de bordo (CAB), no quadro de narrow body. 2 — A evolução dos tripulantes de cabina na respetiva carreira profissional efetivar-se-á pelas seguintes categorias profissionais: Comissário/assistente de bordo; Chefe de cabina; Supervisor de cabina; respeitando o seguinte esquema de promoção e progressão: (…). 3 — Os tripulantes de cabina contratados a termo (CAB início e CAB 0), enquanto se mantiverem nesta situação, apenas serão afetos a equipamento NB. 4 — Os C/Cs aos quais seja facultado prestar serviços de voo exclusivamente em equipamentos NB e que pretendam evoluir na carreira profissional para S/C só poderão ter essa evolução, verificadas as condições e os requisitos gerais estabelecidos neste regulamento, após um período mínimo de 18 meses de prestação de serviços nos equipamentos NW.” Além disso, a cláusula 5ª deste RCPTC, referente à “Evolução salarial”, estabelece o seguinte: “1 — A evolução salarial processa-se de acordo com os seguintes escalões: CAB início a CAB 0 (contratados a termo); CAB — de I a V; C/C — de I a III; S/C — de I a III. 2 — A evolução salarial, nos escalões indicados, terá lugar de acordo com os seguintes períodos de permanência, sem prejuízo do disposto nos números seguintes: Categoria Anuidades CAB 0 . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 18 meses de CAB início. CAB I . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . Até 18 meses de CAB 0. CAB II . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . Três anuidades de CAB I. CAB III . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . Três anuidades de CAB II. CAB IV . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . Três anuidades de CAB III. CAB V . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . Três anuidades de CAB IV. C/C II . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . Quatro anuidades de C/C I. C/C III . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . Quatro anuidades de C/C II. S/C II . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . Quatro anuidades de S/C I. S/C III . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . Quatro anuidades de S/C II. 3 — Para os efeitos do número anterior, as anuidades são contadas nos termos da cláusula 17ª («Exercício efetivo de função») do acordo de empresa. 4 — A evolução salarial terá lugar, salvo verificação das seguintes situações: a) Existência de sanções disciplinares que não sejam repreensões no período de permanência no escalão possuído; b) Pendência de processos disciplinares; c) Ocorrência de motivo justificativo em contrário relacionado com exercício ou conduta profissional, desde que expresso e fundamentado por escrito. 5 — No caso previsto na alínea b) do n.º 4, a evolução salarial só não se efetivará enquanto não estiver concluído o processo disciplinar e se dele resultar a aplicação de sanção disciplinar que não seja repreensão; se do processo disciplinar resultar sanção de repreensão ou ausência de sanção, a evolução será efetivada com efeitos a partir da data em que devia ter tido lugar. 6 — No caso previsto na alínea c) do n.º 4, o motivo invocado será comunicado, em documento escrito, ao tripulante, que o poderá contestar e dele recorrer; a impugnação será apreciada por uma comissão constituída nos termos da cláusula 10ª («Comissão de avaliação»), e, se for considerada procedente, a evolução será efetivada com efeitos a partir da data em que devia ter tido lugar. 7 — Ocorrendo qualquer motivo impeditivo da evolução salarial, ao abrigo do nº 4, a mesma terá lugar no ano imediatamente seguinte, salvo se ocorrer, então, o mesmo ou outro motivo impeditivo; a inexistência de motivos impeditivos será referenciada a um número de anos, seguidos ou interpolados, correspondente à permanência mínima no escalão possuído. 8 — Os tripulantes contratados como CAB 0 até à data da assinatura deste acordo manter-se-ão como CAB 0, por um período máximo de três anos, para efeitos exclusivamente remuneratórios, sendo eliminado para todos os demais efeitos, nomeadamente de evolução na carreira e de antiguidade, contando todo o tempo de antiguidade e categoria na posição de CAB 0 para os efeitos de anuidades e integração nos níveis salariais.” Sobre a exacta questão colocada na presente apelação, cujo fulcro se radica na interpretação dos indicados preceitos convencionais, este Tribunal da Relação teve já oportunidade de se pronunciar várias vezes, ainda que nem sempre em sentido coincidente. E fê-lo designadamente nos Acórdãos de 15 de Novembro de 202211, de 11 de Julho de 202422 e de 23 de Outubro de 202433, que a ora relatora subscreveu como adjunta4, bem como no Acórdão da Relação de Lisboa de 06 de Novembro de 2024, relatado pela ora relatora5. Ainda que reconhecendo a dificuldade e melindre da tarefa interpretativa das indicadas cláusulas convencionais do Regulamento de Carreira do PNC anexo ao Acordo de Empresa celebrado entre a TAP e o SNPVAC, publicado na 1.ª Série do BTE n.º 8 de 28 de Fevereiro de 2006, a ora relatora consolidou a sua posição no sentido de que a circunstância de a contratação de um tripulante de cabine o ser por via de contrato por tempo indeterminado (seja ab initio seja em resultado da judicial convolação do contrato a termo em contrato sem termo) não determina o seu posicionamento em CAB I, com os fundamentos que ficaram exarados no último dos arestos citados (de 06 de Novembro de 2024), não questionando a validade da cláusula. Não obstante, foi entretanto proferido pelo Pleno da Secção Social do Supremo Tribunal de Justiça o Acórdão de 11 de Dezembro de 2024, em julgamento ampliado de revista6, que, lembrando que o Supremo Tribunal de Justiça já havia decidido no seu Acórdão de 16 de Junho de 2016, proferido no processo n.º 968/12.4TTLSB.L1.S1, que os tripulantes de cabina na situação em apreço deviam ser integrados na categoria CAB I, atento o preceituado nos n.ºs 1 e 3 da Cláusula 4.ª e n.ºs 1 e 2 da Cláusula 5.ª do RCPTC, veio a afirmar, no essencial, que: - resulta inequivocamente da letra das cláusulas 4.ª n.º 3 e 5.ª n.º 1, a associação entre as CAB início e CAB 0 e a contratação a termo e que “as categorias CAB início e CAB 0 foram concebidas para contratados a termo e determinam a sua evolução salarial”; - tais cláusulas, ao preverem uma categoria de admissão para contratados a termo com retribuições menos elevadas e uma evolução/progressão salarial mais longa, “violam diretamente o princípio da igualdade de tratamento entre trabalhadores contratados a termo e trabalhadores contratados por tempo indeterminado”, o qual corresponde a um “princípio fundamental do Direito da União Europeia que não deve ser interpretado restritivamente e que não pode ser violado nem sequer por convenção coletiva”, mostrando-se consagrado no artigo 4.º n.º 1 do Acordo-Quadro CES, UNICE e CEEP relativo ao contrato de trabalho a termo, anexo à Diretiva 1999/70/CE do Conselho de 28 de junho de 1999 [“No que diz respeito às condições de emprego, não poderão os trabalhadores contratados a termo receber tratamento menos favorável do que os trabalhadores permanentes numa situação comparável pelo simples motivo de os primeiros terem um contrato ou uma relação laboral a termo, salvo se razões objectivas justificarem um tratamento diferente”] e transposto para a lei portuguesa através do princípio da igualdade de tratamento consagrado sucessivamente no artigo 136.º do Código do Trabalho de 2003 e no artigo 146.º n.º 1 do Código do Trabalho de 2009, preceito a que há que atribuir “natureza imperativa” por força da interpretação conforme. Perante estes pressupostos, concluiu o Pleno do Supremo Tribunal de Justiça do seguinte modo: “Assim, há que concluir pela nulidade, por violação de norma legal imperativa, das cláusulas que previam categorias inferiores na admissão para os contratados a termo, com a consequência de que os Recorrentes, tal como já foi decidido em situação similar pelo mencionado Acórdão de 16-06-2016, se devem considerar para efeitos de evolução salarial, como tendo sido admitidos com a CAB 1”. E veio, em conformidade, a conceder a revista das ali autoras, condenando a Ré a integrá-las nos seus postos de trabalho como tendo sido admitidas desde o início da respetiva relação contratual com a categoria CAB 1, processando-se a partir daí a evolução na categoria em conformidade com o Acordo de Empresa, bem como a pagar-lhes as diferenças salariais devidas em virtude da sua errada integração nas categorias de CAB Início e CAB 0, ao invés da categoria de CAB 1, a contar desde o início dos seus respetivos contratos de trabalho. A doutrina deste aresto tem sido seguida, sem excepções, pelo Supremo Tribunal de Justiça, como se constata, por exemplo do Acórdão de 29 de Janeiro de 202577, que, invocando a decisão do Pleno, sintetizou os fundamentos do seu veredicto do seguinte modo: «[…] A cláusula 5ª do sobredito Regulamento da Carreira Profissional de Tripulante de Cabina, no segmento em que se refere a CAB início a CAB 0 para contratados a termo, infringe o art.º 4.º, n.º 1, do Acordo-Quadro CES, UNICE e CEEP, relativo a contratos de trabalho a termo, que faz parte integrante da Diretiva 1999/70/CE. O princípio de que os contratados a termo não devem, só por esse facto, ser tratados de modo menos favorável que os contratados sem termo constitui, segundo a jurisprudência do TJUE, um princípio de direito social da União que não pode ser interpretado de modo restritivo (v.g. Acórdão do TJUE proferido no processo C-677/16, n.º 41), sendo que a mera previsão em convenção coletiva da diferença de tratamento não é razão objetiva para essa diferença (n.º 56). Aquela cláusula, no aludido segmento, é, pois, nula. Deste modo, impõe-se condenar a Ré a integrar os Autores nos seus postos de trabalho, como tendo sido admitidos desde o início da respetiva relação contratual com a categoria CAB 1, processando-se a partir daí a evolução na categoria em conformidade com o Acordo de Empresa, bem como a pagar-lhes todas as diferenças salariais devidas, quer a título de salário base, quer de ajudas de custo, em consequência da sua errada integração nas categorias de CAB Início e CAB 0, contadas desde o início dos respetivos contratos de trabalho, montantes a calcular pelas instâncias, se necessário em sede de incidente de liquidação. […]» O mesmo sucedeu com o Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 2 de Abril de 2025, proferido no processo n.º 1890/23.4T8CSC.L1.S1.88 Têm igualmente sido admitidos recursos de revista excepcional em processos em que é R. a presente e no âmbito da mesma contratação colectiva, com fundamento em haver contradição entre Acórdãos quanto à aplicação do Regulamento da Carreira Profissional de Tripulante de Cabine, anexo ao Acordo de Empresa TAP/SNPVAC, publicado no BTE, n.º 8, de 28.02.2006, mais concretamente, quanto à questão de saber se, tendo os contratos de trabalho sido considerados sem termo desde o seu início (por ter sido declarado nulo o respetivo termo), os Autores deveriam ter sido colocados desde essa data na categoria de CAB I9. Também nestes arestos subscritos pela formação prevista no artigo 672.º, n.º 3, do Código de Processo Civil se invoca já a decisão constante do Acórdão de 11 de Dezembro de 2024, Proc. n.º 8882/20.3T8LSB.L1.S1. O julgamento ampliado de revista visa a interpretação e aplicação uniforme do direito e tem lugar quando o Presidente do Supremo Tribunal de Justiça entende que tal se revela “necessário ou conveniente para assegurar a uniformidade da jurisprudência” (cfr. o artigo 686.º, nº 1, do CPC), o que justifica também a publicação do acórdão na 1.ª série do Diário da República (artigo 687.º, n.º 5, do CPC). Embora o aresto em causa não tenha sido ainda objecto de publicação oficial no Diário da República e não tenhamos notícia de que tenha transitado em julgado, certo é que a orientação do mesmo tem sido sufragada pelo Supremo Tribunal de Justiça em todas as decisões que naquele tribunal foram proferidas a este propósito, o que não pode deixar de ser ponderado. Cabe não esquecer que os Acórdãos Uniformizadores de Jurisprudência (AUJ) são decisões proferidas pelo Supremo Tribunal de Justiça que têm justamente por objectivo, em nome da segurança jurídica, evitar que decisões judiciais, que envolvam a mesma lei e a mesma questão de direito, obtenham dos tribunais respostas diferentes. Ou seja, valendo inter-partes, têm um objectivo orientador e persuasivo que extravasa o concreto processo em que foram proferidos10 e, uma vez adoptada aquela jurisprudência com a função uniformizadora (ou estabilizadora) que é atribuída ao AUJ , deve a mesma ser acatada pelos tribunais judiciais e seguida “enquanto se mantiverem as circunstâncias em que se baseou”11. Como se refere no Acórdão do Tribunal Constitucional n.º 361/2018, de 28 de Junho de 2018, citado pela recorrida, é expectável que o efeito persuasivo da prolação de um acórdão uniformizador opere uma estabilização da jurisprudência, desde logo, do próprio Supremo Tribunal de Justiça. Sendo certo que, como se refere no mesmo aresto, “tal estabilidade não equivale a imutabilidade”, é igualmente certo que, como também aí se enfatiza, citando Abrantes Geraldes, a haver alteração da posição jurisprudencial assumida “será, em regra, como resultado de um «circunstancialismo complexo» em que se enquadram circunstâncias como a ampla renovação do quadro de juízes que integram as secções cíveis do Supremo Tribunal de Justiça; o período de tempo decorrido desde a prolação da decisão, conjugado com relevantes modificações do regime jurídico conexo com a norma cuja interpretação uniformizadora se efetivou; o surgimento de argumentos jurídicos que não tenham sido analisados ou suficientemente rebatidos no acórdão uniformizador”. Ora no caso em análise nenhuma destas circunstâncias se vislumbra, não só atento o escasso tempo decorrido desde a prolação do acórdão uniformizador (cerca de 5 meses), como porque todos os juízes que actualmente integram a Secção Social do Supremo Tribunal de Justiça subscreveram já acórdãos em que se perfilha a perspectiva do Acórdão Uniformizador12, como porque o regime jurídico legal e convencional aplicável é exactamente o mesmo, como ainda não foram aduzidos pelas partes novos argumentos jurídicos relacionados com a validade das cláusulas 4.ª, n.º 3 e 5.ª , nº 1, Regulamento da Carreira Profissional de Tripulante de Cabina (RCPTC) anexo ao Acordo de Empresa celebrado entre a TAP/SNPVAC, publicado no BTE nº 8/2006, de 28 de Fevereiro, sendo antes reiterados os antecedentes relacionados com os requisitos da evolução salarial constantes da cláusula 5.ª do RCPTC (arts. 4.º e ss. da contestação) e com a injusta diferenciação entre profissionais (arts. 43.º a 45.º da contestação). Assim, em face da decisão constante do Acórdão de 11 de Dezembro de 2024 do Pleno da Secção Social do Supremo Tribunal de Justiça no sentido da invalidade das cláusulas convencionais em análise, tendo em consideração que se vislumbra no nosso mais alto tribunal uma uniformidade de posições a este propósito, sem qualquer voz dissonante, e tendo ainda em consideração o disposto no artigo 8.º, n.º 3, do Código Civil – segundo o qual “[n]as decisões que proferir, o julgador terá em consideração todos os casos que mereçam tratamento análogo, a fim de obter uma interpretação e aplicação uniformes do direito” –, entendemos acolher a doutrina no mesmo expressa. O que implica se responda afirmativamente à primeira questão colocada no recurso, decidindo que a circunstância de o contrato de trabalho a termo celebrado inicialmente com o recorrente se ter convertido em contrato de trabalho por tempo indeterminado implica a sua integração automática na categoria profissional de CAB I. E, em consequência, deve considerar-se, igualmente para efeitos de evolução salarial, como tendo sido admitido com a categoria profissional de CAB 1, o que implica se responda afirmativamente também à segunda questão acima enunciada quando se traçou o objecto do recurso. Haverá assim de condenar a recorrida a integrar o recorrente no seu postos de trabalho, como tendo sido admitido desde o início da respetiva relação contratual – 18 de Fevereiro de 2018 – com a categoria CAB 1, processando-se a partir daí a evolução na categoria em conformidade com o Acordo de Empresa, bem como a pagar-lhes as diferenças salariais devidas ao nível da remuneração base e das demais que sejam devidas e calculadas por referência a essa retribuição, em consequência da sua errada integração na categoria de CAB Início e CAB 0, contadas desde o início do respetivo contrato de trabalho, a apurar em sede de incidente de liquidação de sentença, por absoluta falta de elementos para o efeito. Neste aspecto, procede a apelação. * 4.2. Resta a questão dos danos não patrimoniais. O A. pediu na petição inicial uma indemnização pelos danos não patrimoniais infligidos pela Ré, à razão de uma quantia não inferior a 1.000,00 € por cada mês de afastamento do A. da sua atividade, que provisoriamente liquidou em 12.000,00 €, sem prejuízo dos danos excedentes vincendos. Percorrendo a matéria de facto provada nenhum facto se vislumbra revelador de que o recorrente sofreu danos de natureza não patrimonial em consequência de uma conduta da recorrida. Ao invés, apesar de o ter alegado, o A. não logrou provar que se tenha sentido perseguido e alienado pela Ré, que tal o tenha deixado frustrado por se sentir discriminado e impotente perante a ‘marcação cerrada’ efectuada pela TAP e que não tenha conseguido encontrar emprego na área de que tanto gosta, por ter sido despedido pela TAP – vide os pontos 4. e 5. dos factos “não provados”. É patente que o confronto de uma pessoa com um despedimento ilícito, maxime em contexto de pandemia, como diz o recorrente, é, em princípio, susceptível de causar danos na sua personalidade moral. Ponto é que se prove a verificação destes danos não patrimoniais na medida em que à luz da previsão legal do artigo 483.º do Código Civil, o dano constitui um dos pressupostos do direito à indemnização. Sem dano não há responsabilidade. É importante ter presente que o dano não patrimonial não reside em factos, situações ou estados mais ou menos abstractos aptos para desencadear consequências de ordem moral ou espiritual sofridas pelo lesado, mas na efectiva verificação dessas consequências13. Se por exemplo se alega um estado de ansiedade, não bastará a afirmação genérica da sua verificação, se não se alega e prova em que consistiu ou manifestou esse estado, em termos de tornar inteligível se o mesmo teve, e em que medida, repercussão na saúde física ou psíquica do lesado ou na sua tranquilidade e estabilidade psicológica. Ora nada de concreto se apurou nestes autos quanto a danos de natureza não patrimonial que o recorrente tenha sofrido em consequência da conduta da recorrida, pelo que, por falta deste pressuposto essencial do inerente direito indemnizatório, não poderá proceder o recurso quanto à pretensão de condenação da recorrida no pagamento de uma indemnização por danos não patrimoniais. Deve confirmar-se a sentença na parte em que absolveu a recorrida da peticionada indemnização por danos não patrimoniais. * 5.3. Tendo o recorrente obtido parcial vencimento no recurso, a responsabilidade pelas custas inerentes ao mesmo recaem sobre ambas as partes, na proporção do respectivo decaimento, sendo, todavia, suportadas provisoriamente, e até posterior liquidação, na proporção de 1/2 para o A. e 1/2 para a R. (cfr. artigo 527.º, do Código de Processo Civil). Mostrando-se pagas as taxas de justiça e não havendo encargos a contar neste recurso que, para efeitos de custas processuais, configura um processo autónomo (artigo 1.º, n.º 2 do Regulamento das Custas Processuais), a respectiva condenação é restrita às custas de parte que haja. * 6. Decisão Em face do exposto, concede-se parcial provimento ao recurso e condena-se a recorrida a integrar o recorrente no seu posto de trabalho, como tendo sido admitido desde o início da respetiva relação contratual em 18 de Fevereiro de 2018 com a categoria CAB 1, processando-se a partir daí a evolução na categoria em conformidade com o Acordo de Empresa, bem como a pagar-lhes as diferenças salariais devidas ao nível da remuneração base e das demais que sejam devidas e calculadas por referência a essa retribuição, em consequência da sua errada integração na categoria de CAB Início e CAB 0, contadas desde o início do respetivo contrato de trabalho, a apurar em sede de incidente de liquidação de sentença. No mais, confirma-se a sentença. Condenam-se A. e R. nas custas de parte que haja a contar, na proporção do respectivo decaimento, sendo todavia, até posterior liquidação, suportadas provisoriamente na proporção 1/2 para o A. e 1/2 para a R. Nos termos do artigo 663.º, n.º 7, do CPC, anexa-se o sumário do presente acórdão. Lisboa, 14 de Maio de 2025 Maria José Costa Pinto Alves Duarte Eugénia Guerra ______________________________________________________ 1. Processo n.º 8882/20.3T8LSB.L1.L1, inédito, tanto quanto nos é dado saber. 2. Processo n.º 2504/23.8T8CSC.L1.L1, também inédito, tanto quanto nos é dado saber, mas sumariado in https://trl.mj.pt/4a-seccao-trabalho/. 3. Processo n.º 2093/23.3T8CSC.L1, igualmente inédito, tanto quanto nos é dado saber e sumariado no mesmo sítio. A ora relatora lavrou ainda voto de vencida no Acórdão da Relação de Lisboa de 2024.07.11, Processo n.º 7670/23.0T8LSB.L1, este no sentido propugnado pelos recorrentes. 4. No primeiro deles revendo posição anterior. Vide ainda o Acórdão da Relação de Lisboa de 2024-07-11, Processo nº 30533/21.9T8LSB.L1, in www.dgsi.pt. 5. Proferido no processo n.º 1890/23.4T8CSC.L1, inédito, tanto quanto nos é dado saber e no qual o Exmo. Sr. Desembargador aqui primeiro adjunto votou vencido. 6. Prolatado no processo n.º 8882/20.3T8LSB.L1.S1 e ainda não publicado, tanto quanto nos é dado saber. 7. Proferido no processo n.º 5544/22.0T8LSB.L1.S1, in www.dgsi.pt. 8. O qual revogou o Acórdão da Relação de Lisboa de 6 de Novembro de 2024, cima citado – vide a nota 7. 9. Vide os Acs. do STJ de 12 Fev. 2025, processo n.º 2093/23.3T8CSC.L1.S2, e de 15 de Janeiro de 2025, Processo n.º 2504/23.8T8CSC.L1., mesmo sítio. 10. Vide os Acórdãos do Supremo Tribunal de Justiça de 12 de Maio de 2016, Processo n.º 982/10.4TBPTL.G1-A.S1, e de 29 de Março de 2022, Processo n.º 2309/16.2T8PTM.E1-A.S1, in www.dgsi.pt. 11. Vide Abrantes Geraldes, in Recursos no Novo Código de Processo Civil, Almedina, 3.ª Edição, 2016, p. 425 e o Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 19 de Outubro de 2017, Processo n.º 1077/14.7TVLSB.L1.S1, no mesmo sítio. 12. Vide os Acórdãos do Supremo Tribunal de Justiça de 02 de Abril de 2025, processo n.º 5544/22.0T8LSB.L1.S1, de 02 de Abril de 2025, processo n.º 1890/23.4T8CSC.L1.S1, de 12 de Fevereiro de, processo n.º 2093/23.3T8CSC.L1.S2, de 29 de Janeiro de 2025, processo n.º 5544/22.0T8LSB.L1.S1 e de 15 de Janeiro de 2025, processo n.º 2504/23.8T8CSC.L1.S2, todos in www.dgsi.pt. 13. Vide o Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 2007.05.24, Revista n.º 07A1187 -1.ª Secção, in www.dgsi.pt. |