Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa | |||
Processo: |
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Relator: | LUÍS FILIPE PIRES DE SOUSA | ||
Descritores: | DECLARAÇÃO RESOLUTÓRIA IRREVOGABILIDADE ACORDO DE REPRISTINAÇÃO DO CONTRATO FORMA | ||
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Nº do Documento: | RL | ||
Data do Acordão: | 05/13/2025 | ||
Votação: | UNANIMIDADE | ||
Texto Integral: | S | ||
Texto Parcial: | N | ||
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Meio Processual: | APELAÇÃO | ||
Decisão: | IMPROCEDENTE | ||
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Sumário: | Da responsabilidade do relator: I. A declaração resolutória é irrevogável, sem prejuízo das partes acordarem a sua revogação, repristinando o contrato resolvido. II. Estando o contrato de arrendamento sujeito à forma escrita, os factos integrantes do comportamento concludente de repristinação do contrato de arrendamento teriam, eles próprios, de assumir a forma escrita, atento o disposto no Artigo 217º, nº2, do Código Civil. Dito de outra forma, as declarações tácitas de repristinação do contrato de arrendamento teriam de assumir traços ou vestígios documentais escritos. III. Não ocorreu efetiva repristinação do contrato de arrendamento, após a sua resolução, porquanto as partes não emitiram declarações tácitas com observância da necessária forma escrita. As declarações tácitas, para serem eficazes e consequentes, teriam de assumir forma escrita, o que não ocorreu no caso. | ||
Decisão Texto Parcial: | ![]() | ||
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Decisão Texto Integral: | Acordam os Juízes na 7ª Secção do Tribunal da Relação de Lisboa: RELATÓRIO AB, CD e EF intentaram procedimento especial de despejo contra Imobiliária, Lda. Para tanto, alegaram, em síntese, que: a) No dia 16.8.2013, os então, proprietária e usufrutuário celebraram com a Requerida um contrato, tendo como objeto a ocupação, para fins não habitacionais, do prédio urbano sito em Casal (...) Lote 1 (atual Rua (...), n.º 8) freguesia de (...), em (...). b) No decurso da vigência do contrato, adquiriram o pleno direito de propriedade. c) De acordo com a Cláusula 2.ª, o contrato foi celebrado pelo prazo de dez anos, tendo o seu início em 1.1.2014 e término em 31.12.2023, d) Sendo renovável por períodos sucessivos de três anos, se não fosse denunciado por parte da Arrendatária, ou dos Senhorios, com uma antecedência mínima de 240 dias. e) Os Requerentes opuseram-se à renovação, por via de carta registada, com aviso de receção, a 26.10.2022, carta recebida pela Requerida a 27.10.2022, tendo reiterado a sua posição em Junho e Novembro de 2023. f) Nas cartas remetidas, esta foi interpelada para o pagamento das rendas referentes ao período de Janeiro de 2021 a Março de 2022, que estavam em dívida, no valor de € 5.773,25. g) Todavia, a Requerida não procedeu à restituição do imóvel, nem pagou as rendas. O requerimento de despejo foi entregue tendo como fundamento a cessação do contrato por oposição à renovação pelo senhorio. Citada, a Requerida veio defender uma cessação do contrato em 30/3/2022, por via de uma declaração prévia de resolução realizada pelo senhorio, com base na falta de rendas. Defende, em simultâneo, que, tendo continuado a utilizar o imóvel locado, “e a pagar pontualmente a renda devida”, “E não tendo sido celebrado pelas partes um novo contrato escrito”, deve considerar-se que foi celebrado um novo contrato de arrendamento entre as partes, em 31/03/2022. Alega, ainda, que “nunca recusou a celebração de um contrato escrito” e que “os Requerentes nunca se opuseram à utilização do locado pela Requerida, pelo menos até 31/12/2023”. Notificada da oposição, os Requerentes apresentaram a sua resposta, no âmbito da qual admitiram a expedição de uma carta de resolução na data indicada, mas afirmaram que, em face da resposta recebida, entenderam que o contrato se manteria válido, tendo optado pela comunicação da sua oposição à respetiva renovação, mais sublinhando jamais terem aceitado a celebração de qualquer novo contrato. Elaborado o saneador-sentença, este Tribunal da Relação de Lisboa decidiu pela anulação da sentença proferida, ordenando a ampliação da matéria de facto com referência aos acontecimentos que se verificaram a partir da declaração resolutiva de 30.3.2022. Após julgamento, foi proferida sentença com o seguinte dispositivo: «Nestes termos e por todo o exposto, julga-se a presente ação parcialmente procedente, por provada, e, em consequência, decide-se: a) Declarar verificada a cessação do contrato de arrendamento, condenando a Requerida a restituir o prédio locado, completamente livre de pessoas e bens, aos Requerentes; b) Condenar a Requerida no pagamento, aos Requerentes, do parcial das rendas vencidas entre os meses de Janeiro de 2021 e Março de 2022, no valor de € 5.773,25 (cinco mil, setecentos e setenta e três euros e vinte e cinco cêntimos), acrescidos de juros de mora, vencidos desde a data da citação, e vincendos, até integral pagamento, à taxa legal supletiva.» * Não se conformando com a decisão, dela apelou a Ré formulando, no final das suas alegações, as seguintes CONCLUSÕES: 1. Considerando credível o depoimento do Gerente da Recorrente, compaginando estas declarações com os factos constantes dos articulados e dos documentos com estes juntos, com o depoimento de parte do A. CD e o depoimento da testemunha AR, a Meritíssima Juiz a quo deveria ter considerado como provado que a R. nada deve aos AA. 2. Estes meios probatórios, constantes do processo e da gravação dos mencionados depoimentos, à luz das regras da experiência, deveriam ter levado o Tribunal recorrido a considerar como provado que a Requerida procedeu ao pagamento do valor de € 5.773,25, a título de rendas, peticionado pelos Requerentes. 3. Decisão que deve ser proferida, passando o facto 2 dos factos não provados a considerar-se provado. 4. Em 30.3.2022, os Requerentes procederam à resolução do contrato com base na alegação da falta de pagamento de rendas por parte da Requerida por via de uma notificação judicial avulsa. 5. Enquanto exercício de um direito potestativo, a resolução traduz-se numa declaração de vontade unilateral e receptícia, mediante a qual um dos contraentes comunica à contraparte a extinção do vínculo contratual, declaração que se torna eficaz logo que chega ao poder ou é conhecida pelo seu destinatário. 6. Com a sua comunicação à outra parte, a resolução assume plena eficácia e é irrevogável. 7. Os AA. nunca comunicaram à R. que tinham desistido da resolução. 8. Não é assim possível extrair do comportamento das partes, ao contrário do que se diz na Sentença recorrida, uma vontade de ambas as partes na manutenção do anterior contrato. 9. A resolução, ou rescisão como se escreveu no contrato, está assim sujeita à forma legal – comunicação escrita – que, no caso concreto se traduz em carta registada com prova de receção. 10. Uma eventual declaração tácita de revogação da resolução do contrato só seria válida e eficaz se pudesse ser deduzida, sem margem para dúvidas, de um qualquer documento escrito, comunicado da mesma forma, à outra parte, como impõe o estipulado no n.º 2 do art.º 217.º do Código Civil. 11. Não tendo ocorrido a revogação da resolução, ou “desistência” como pretendem os AA., a repristinação ou reintegração do contrato só poderiam ocorrer por acordo expresso e escrito das partes, atentas as exigências de forma previstas para a celebração e resolução do contrato de arrendamento 12. Deve, pois, ser declarado que a resolução produziu os seus efeitos em 31/13/2022, data em que se extinguiu o contrato de arrendamento celebrado pelas partes em 16/08/2013. 13. Um contrato extinto não pode renovar-se. Por maioria de razão, é inútil a oposição à renovação de um contrato que não existe. 14. Sem contrato após 30.03.2022, a inquilina continuou a utilizar o imóvel, a pagar a renda, sem a oposição dos senhorios. 15. Os senhorios continuaram a disponibilizar o imóvel à inquilina, recebendo como contrapartida uma renda. 16. A lei tem um conjunto de regras que visam proteger o inquilino nas situações de inexistência de contrato escrito, assumindo ser esta a parte do contrato que estará por via de regra, mais fragilizada na respetiva relação. 17. A interpretação dada a esta norma pela douta Sentença recorrida contraria a ratio legis do preceito, ao exigir ao inquilino outra prova que não a utilização do local e o pagamento da renda por mais de seis meses. 18. Foram dados como provados os requisitos previstos no n.º 2 do art.º 1069.º do Código Civil. 19. Existe um contrato de arrendamento em vigor entre os AA e a R., o qual só pode ter-se formado de acordo com este preceito legal, uma vez que o anterior foi resolvido pelos AA e essa resolução não foi declarada ilícita por qualquer Tribunal. 20. Não estando em vigor, desde 30/03/2022, o contrato de arrendamento celebrado entre as partes. 21. Continuando a Requerida a utilizar o locado, como arrendatária, e a pagar pontualmente a renda devida. 22. E não tendo sido celebrado entre as partes novo contrato escrito, forçoso é concluir que o arrendamento ao Requerido da imóvel propriedade dos Requerentes é regulado pelo regime supletivo previsto no Código Civil. 23. O contrato de arrendamento em vigor entre as partes deve considerar-se como celebrado em 31/03/2022. 24. A Requerida nunca recusou a celebração de novo contrato escrito. 25. Os Requerentes nunca se opuseram à utilização do locado pela Requerida, pelo menos até 31/12/2023. 26. Decorreram mais de seis meses desde a data do início do novo contrato, e até esta data, a Requerente pagou todas as rendas vencidas. 27. Este contrato tem como objeto um imóvel que não é destinado à habitação. 28. A duração, denúncia ou oposição à renovação do contrato regem-se pelo disposto no art.º 1110.º do Código Civil. 29. Na falta de estipulação de prazo, o mesmo considera-se celebrado por prazo certo, pelo período de cinco anos. 30. Tendo iniciado a sua vigência em 31/03/2022, o seu término será no dia 30/03/2027. Nestes termos e nos melhores de Direito aplicáveis que V. Ex.ªs doutamente suprirão, deve o presente recurso ser considerado procedente, revogando-se a decisão recorrida e absolvendo-se a R. do pedido, assim se fazendo, como sempre, JUSTIÇA.» Contra-alegaram os apelados, propugnando pela improcedência da apelação. Em especial, sustentaram a intempestividade do recurso (questão resolvida com a subsequente reclamação nos termos do Artigo 643º do Código de Processo Civil), bem como que a apelante não cumpriu os requisitos do Artigo 640º, não indicando para cada ponto de facto que considera incorretamente julgado, quais os meios de prova que impunham decisão diversa e qual a decisão que sobre o mesmo deve ser proferida. QUESTÕES A DECIDIR Nos termos dos Artigos 635º, nº4, e 639º, nº1, do Código de Processo Civil, as conclusões delimitam a esfera de atuação do tribunal ad quem, exercendo um função semelhante à do pedido na petição inicial.[1] Esta limitação objetiva da atuação do Tribunal da Relação não ocorre em sede da qualificação jurídica dos factos ou relativamente a questões de conhecimento oficioso, desde que o processo contenha os elementos suficientes a tal conhecimento (cf. Artigo 5º, nº 3, do Código de Processo Civil). Também não pode este Tribunal conhecer de questões novas que não tenham sido anteriormente apreciadas porquanto, por natureza, os recursos destinam-se apenas a reapreciar decisões proferidas, ressalvando-se as questões de conhecimento oficioso, v.g., abuso de direito.[2] Nestes termos, as questões a decidir são as seguintes: i. Impugnação da decisão da matéria de facto (conclusões 1 a 3); ii. Existência da resolução do contrato (conclusões 4 a 13); iii. Celebração de novo contrato de arrendamento (conclusões 14 a 30). Corridos que se mostram os vistos, cumpre decidir. A jurisprudência citada neste acórdão sem menção da origem encontra-se publicada em www.dgsi.pt. FUNDAMENTAÇÃO DE FACTO A sentença sob recurso considerou como provada a seguinte factualidade: 1. No dia 16.08.2013, GH e JK celebraram, na qualidade de Senhorios, com Good Line Imobiliária, Lda., na qualidade de Arrendatária, um contrato de arrendamento urbano para fins não habitacionais, que teve por objeto o prédio urbano sito em Casal (...) Lote 1 (atual Rua (...), n.º 8) freguesia de (...), em (...). 2. No decurso da vigência do contrato, GH transmitiu o seu direito de propriedade sobre 1/2 do imóvel a AB, a 07.06.2017, conforme Ap. 3465 de 2017/06/07 no registo predial. 3. Posteriormente, a 11.04.2022, ocorreu a extinção do usufruto a favor de JK que incidia sobre a outra 1/2 do imóvel. 4. Os Requerentes passaram a ser proprietários do imóvel locado (EF titular de quota de 1/6, AB titular de quota de 4/6, e CD titular de quota de 1/6). 5. De acordo com a Cláusula 2.ª, o contrato é de duração limitada, sendo celebrado pelo prazo de dez anos, tendo o seu início em 01.01.2014 e término em 31.12.2023, 6. Sendo renovável por períodos sucessivos de três anos, se não for denunciado por parte da Arrendatária, ou dos Senhorios, com uma antecedência mínima de 240 dias. 7. Em 30.03.2022, os Requerentes procederam à resolução do contrato com base na alegação da falta de pagamento de rendas por parte da Requerida, por via de uma notificação judicial avulsa. 8. Nesta comunicação, os Requerentes afirmaram que a Requerida não pagou parciais das rendas de Janeiro a Dezembro de 2021 e parciais das rendas de Janeiro a Março de 2022, num valor total de € 5.773,25. 9. Após a referida notificação, a Requerida contactou os Requerentes, opondo-se à resolução e à restituição do imóvel. 10. Para o efeito, alegou que era falso que houvesse rendas em dívida, porque teria efetuado o pagamento dos montantes alegadamente em falta, através da entrega de dinheiro a um dos senhorios, JK, e adiantou que, em caso de recurso à via judicial, opor-se-ia e apresentaria recibos emitidos pelo senhorio falecido, que lhe teriam sido entregues. 11. Depois de 30.03.2022, a Requerida continuou a ocupar o imóvel. 12. Tem pago um valor equivalente ao da renda mensal estipulada no contrato de 16.08.2013. 13. Confrontados com a posição adotada pela Requerida, a sua recusa em sair do locado e perante a impossibilidade de confirmação da veracidade de tais alegações, uma vez que o então senhorio tinha falecido a 20.03.2022, os Requerentes concluíram que o contrato se manteria em vigor. 14. Não pretendendo a renovação do contrato, os Requerentes opuseram-se à sua renovação, através do envio de carta registada com aviso de receção a 26.10.2022, recebida pela Requerida a 27.10.2022, tendo reiterado a sua posição em 28.06.2023 e 13.11.223. 15. Nas cartas remetidas à Requerida, esta foi também interpelada para o pagamento de rendas vencidas e por si parcialmente não pagas, referentes ao período de Janeiro de 2021 a Março de 2022, no valor de € 5.773,25. 16. Todas as comunicações remetidas pelos Requerentes à Requerida e por esta recebidos faziam referência expressa ao contrato de arrendamento celebrado em 2013. 17. No dia 09.01.2024, os Requerentes remeteram uma nova comunicação à Requerida, com expressa referência de que o contrato havia terminado a 31.12.2023. 18. Até à presente data, a Requerida não procedeu à restituição do imóvel. 19. As partes não celebraram um novo contrato escrito. 20. A Requerida nunca recusou a celebração de novo contrato escrito. 21. Os Requerentes nunca se opuseram à utilização do locado pela Requerida até 31/12/2023. * O tribunal a quo considerou não provados os seguintes factos: 1. A Requerida não deduziu oposição à resolução do contrato de arrendamento levada a cabo em 30.03.3022. 2. A Requerida procedeu ao pagamento do valor de € 5.773,25, a título de rendas, peticionado pelos Requerentes. FUNDAMENTAÇÃO DE DIREITO Impugnação da decisão da matéria de facto A apelante pretende que se proceda à reversão do facto não provado 2 (“2. A requerida procedeu ao pagamento do valor de € 5.773,25, a título de renda, peticionado pelos requerentes”) para provado (conclusões 1 a 3). No corpo das alegações, a apelante afirma que “é inexato e carece de fundamentação o facto 13 considerado como provado”. Todavia, a apelante não finaliza a alegação (nem no corpo das alegações nem nas conclusões) com um pedido sobre a reversão de tal facto de provado para não provado ou a sua mera alteração de redação. Nos termos do Artigo 640º, nº 1, do Código de Processo Civil, «Quando seja impugnada a decisão sobre a matéria de facto, deve o recorrente obrigatoriamente especificar, sob pena de rejeição: a) Os concretos pontos de facto que considera incorretamente julgados; b) Os concretos meios probatórios, constantes do processo ou de registo ou gravação nele realizada, que impunham decisão sobre os pontos da matéria de facto impugnados diversa da recorrida; c) A decisão que, no seu entender, deve ser proferida sobre as questões de facto impugnadas.” No que toca à especificação dos meios probatórios, incumbe ainda ao recorrente «Quando os meios probatórios invocados tenham sido gravados, incumbe ao recorrente, sob pena de imediata rejeição do recurso na respetiva parte, indicar com exatidão as passagens da gravação em que se funda o seu recurso, sem prejuízo de poder proceder à transcrição dos excertos que considere relevantes” (Artigo 640º, nº 2, al. a), do Código de Processo Civil). Nos termos do AUJ nº 12/2023 (DR, I Série, 14.11.2023, com Declaração de retificação nº 25/2023), foi clarificado que: «Nos termos da alínea c) do n.º 1 do artigo 640.º do Código de Processo Civil, o Recorrente que impugna a decisão sobre a matéria de facto não está vinculado a indicar nas conclusões a decisão alternativa pretendida, desde que a mesma resulte, de forma inequívoca, das alegações.» Se a falta de indicação exata das passagens da gravação não dificulta, de forma substancial e relevante, o exercício do contraditório nem o exame pelo Tribunal da Relação, a rejeição do recurso com tal fundamento constituirá solução excessivamente formal e sem justificação razoável. [3] O recorrente não satisfaz o ónus impugnatório quando omite a especificação dos pontos de facto que reputa incorretamente julgados bem como a decisão a proferir sobre cada um deles, limitando-se a discorrer sobre o teor dos depoimentos prestados com afloramentos de resultados probatórios que entendem ter sido logrados na produção da prova.[4] O ónus imposto ao recorrente na al. b) do nº 1 do Artigo 640º do Código de Processo Civil não se satisfaz com a simples afirmação de que a decisão devia ser diversa, antes exige que se afirme e especifique qual a resposta que havia de ser dada em concreto a cada um dos diversos pontos da matéria de facto controvertida e impugnados, pois só desta forma se coloca ao tribunal de recurso uma concreta e objetiva questão para apreciar.[5] Omitindo o recorrente o cumprimento do ónus processual fixado na al. c), do nº 1, do art.º 640º, impõe-se a imediata rejeição da impugnação da matéria de facto, não sendo legalmente admissível a prolação de despacho de convite ao aperfeiçoamento das conclusões.[6] O STJ vem entendendo que, na verificação do cumprimento dos ónus de impugnação previstos no citado artigo 640º, os aspetos de ordem formal devem ser modelados em função dos princípios da proporcionalidade e da razoabilidade.[7] Ora, a apelante não cumpriu o ónus do Artigo 640º, nº1, a c), no que tange ao desacordo que manifesta quanto ao facto provado sob 13, na medida em que não concretizou qual a alteração pretendida e a mesma não resulta, de forma inequívoca, das alegações. Já no que tange ao facto não provado sob 2, a apelante deu minimamente cumprimento aos ónus processuais na medida em que indicou os meios de prova que, no seu entender, justificam a alteração, indicou os minutos dos respetivos depoimentos e precisou a decisão pretendida. O tribunal a quo justificou a resposta de não provado ao facto 2 nestes termos: «Relativamente ao pagamento dos parciais das rendas cujo pagamento é, também nesta acção, reclamado pelos Requerentes, a Requerida limitou-se a afirmar que «O pagamento das rendas devidas entre 31/03/2023 e a presente data deve considerar-se provado pelo teor do requerimento de despejo, conjugado com o teor do documento 1 junto: o valor em dívida a título de rendas é o mesmo, os restantes valores peticionados alegadamente venceram-se após 31/12/2023, o que não se aceita»[artigo 19.º da oposição]. Ocorre que a circunstância de o valor peticionado ser idêntico não demonstra qualquer pagamento, sendo antes um indício de que o seu pagamento não foi demonstrado, até à data – e não tendo sido apresentado pela Requerida qualquer meio de prova referente a esses pagamentos, a liquidação dá-se como não provado (artigo 342.º, nº2, do Cód. Civil).» Dos meios de prova indicados pela apelante, não emerge prova suficiente no sentido pretendido, muito pelo contrário. Assim, no âmbito da prestação do seu depoimento de parte, o legal representante da Ré, MQ, revelou-se extretamente nervoso e titubeante, procurando sempre o contacto visual com o seu mandatário para validar as suas respostas. A Mma. Juíza, e bem, advertiu-o várias vezes quanto à inadmissibilidade de tal conduta, sendo que, ao fim de 24 minutos, o mesmo afirmava ainda “Eu já estou confuso”, “Estou um bocado nervoso”. No que tange especificamente ao pagamento das rendas em causa, o mesmo verbalizou que as pagou ao falecido RS e que tinha recibos emitidos por este. Todavia, a Ré não os juntou aos autos, prova acabada da inveracidade e topete da verbalização do seu legal representante. CD, no âmbito do seu depoimento de parte, afirmou que, após a remessa da resolução do contrato por falta de pagamento de rendas, a então mandatária da ré afirmou que as rendas estavam pagas e que a ré tinha recibos disso. Face à dúvida assim instalada, os autores decidira “cancelar a resolução” e continuar com o contrato até final de 2023, vindo a opor-se à renovação do mesmo. A dúvida justificava-se porque o tio do depoimento, RS, havia entretanto falecido, não podendo confirmar-se essa versão com o mesmo. Posteriormente, não tendo a Ré junto os recibos em causa, confirmou-se que os pagamentos não tinham ocorrido. Finalmente, a testemunha AR é solicitadora, prestando serviços à primeira autora no âmbito deste contrato de arrendamento. Depôs por menos de dez minutos, tendo a mandatária dos autores desistido da respetiva inquirição. Nada disse sobre o pagamento das rendas em causa, tendo afirmando apenas que a parte da renda da autora em causa não era regulamente paga até ao dia 8 de cada mês. Flui de todo o exposto que, sendo desnecessárias outras considerações, inexiste prova que justifique a reversão do facto não provado sob 2 para facto provado. ii. Existência da resolução do contrato A apelante sustenta que o contrato foi resolvido em 30.3.2022, sendo a resolução irrevogável e não tendo os autores/apelados comunicado à Ré que tinham desistido da resolução. Mais argumenta que: não é possível extrair do comportamento das partes uma vontade na manutenção do anterior contrato; uma eventual declaração tácita de revolução da resolução do contrato só seria válida se pudesse ser deduzida de um qualquer documento escrito, comunicado da mesma forma à outra parte; a repristinação do contrato só poderia ocorrer por acordo expresso e escrito das partes. Apreciando. Os factos relevantes para a apreciação da questão da resolução do contrato e eventual repristinação do mesmo são os seguintes: 7. Em 30.3.2022, os Requerentes procederam à resolução do contrato com base na alegação da falta de pagamento de rendas por parte da Requerida, por via de uma notificação judicial avulsa. 8. Nesta comunicação, os Requerentes afirmaram que a Requerida não pagou parciais das rendas de Janeiro a Dezembro de 2021 e parciais das rendas de Janeiro a Março de 2022, num valor total de € 5.773,25. 9. Após a referida notificação, a Requerida contactou os Requerentes, opondo-se à resolução e à restituição do imóvel. 10. Para o efeito, alegou que era falso que houvesse rendas em dívida, porque teria efetuado o pagamento dos montantes alegadamente em falta, através da entrega de dinheiro a um dos senhorios, JK, e adiantou que, em caso de recurso à via judicial, opor-se-ia e apresentaria recibos emitidos pelo senhorio falecido, que lhe teriam sido entregues. 11. Depois de 30.03.2022, a Requerida continuou a ocupar o imóvel. 12. Tem pago um valor equivalente ao da renda mensal estipulada no contrato de 16.08.2013. 13. Confrontados com a posição adotada pela Requerida, a sua recusa em sair do locado e perante a impossibilidade de confirmação da veracidade de tais alegações, uma vez que o então senhorio tinha falecido a 20.03.2022, os Requerentes concluíram que o contrato se manteria em vigor. 14. Não pretendendo a renovação do contrato, os Requerentes opuseram-se à sua renovação, através do envio de carta registada com aviso de receção a 26.10.2022, recebida pela Requerida a 27.10.2022, tendo reiterado a sua posição em 28.06.2023 e 13.11.223. Em 30.3.2022, os autores formalizaram uma resolução do contrato de arrendamento através de notificação judicial avulsa, invocando como fundamento a falta de pagamento de rendas pela ré/apelante. A resolução do contrato é um meio de extinção do vínculo contratual por declaração unilateral e encontra-se condicionada por um motivo previsto na lei ou depende de convenção das partes (Artigo 432º, nº 1 do Código Civil) A resolução legal tem por motivo o incumprimento de prestações contratuais ou a perda do equilíbrio contratual (cf. Artigos 801º e 437º do Código Civil). No que tange à reversibilidade da declaração resolutória, Pedro Romano Martinez, Da Cessação do Contrato, Almedina, 3º Ed., p. 176, pronuncia-se nestes termos: «A resolução determina a imediata cessação do vínculo, produzindo o efeito extintivo logo que a declaração chega ao poder do destinatário ou é dele conhecida (art.º 224º, nº 1, do CC). Depois de recebida (ou de ser conhecida) a declaração negocial de resolução do vínculo não poderá ser revogada, admitindo-se, porém, que aquele que resolveu o contrato proponha ao destinatário da declaração (contraparte) a repristinação do negócio judicio, sendo, então, necessário o consentimento deste. Em suma, a resolução funda-se num direito potestativo, mas a sua revogação pressupõe o acordo.» Na jurisprudência, tem sido admitida a repristinação de contrato já resolvido, mencionando-se exemplificativamente os seguintes arestos. Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 16.10.2024, Belo Morgado, 4843/21: «Uma vez que, como se compreende, não é concetualmente configurável a possibilidade de unilateralmente fazer renascer um vínculo já extinto, digamos que, até ao decurso do prazo de 7 dias concedido na lei laboral para o arrependimento do trabalhador, a resolução do contrato fica com a sua eficácia paralisada/suspensa. Mas, decorrido este prazo, a resolução assume plena eficácia, cessando para todos os efeitos a relação contratual, deixando por isso de ser possível proceder à sua revogação, unilateral ou convencionalmente. 13. Todavia, num plano dogmaticamente distinto, nada obsta, naturalmente, a que as partes acordem em qualquer momento na repristinação do contrato, ao abrigo do princípio da liberdade contratual, segundo o qual, dentro dos limites da lei, as partes têm a faculdade de fixar livremente o conteúdo dos contratos, celebrar contratos diferentes dos previstos na lei ou incluir nestes as cláusulas que lhes aprouver (Art.º 405.º, nº 1, do C. Civil).« Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 10.10.2023, Lopes do Rego, 4094/07: «(…) a perpetuação, de forma continuada, ao longo de vários meses, da mesma disciplina contratual, originariamente acordada, sem qualquer objeção das partes – que persistem exatamente na execução material das mesmas situações jurídicas – pode e deve efetivamente, segundo um critério prático, ser tomada como comportamento concludente no sentido de ter ocorrido renovação ou repristinação da relação contratual originariamente existente. (…) Ou seja: a autonomia da vontade, tal como levou as partes a estipularem certa forma convencional para determinado ato, pode justificar que ulteriormente, em consequência do modo como atuam na vida jurídica, se possa concluir que prescindiram da forma convencionada, admitindo a renovação tácita do contrato em causa. Ora, como atrás se realçou, entende-se que a reiteração continuada no cumprimento da disciplina contratual, ao longo de vários meses, sem qualquer objeção quanto à estabilidade da relação contratual existente, pode e deve – desde logo, à luz do princípio da boa fé – ser razoavelmente interpretada como envolvendo uma renovação ou repristinação tácita do contrato, prescindindo os interessados da forma convencional que inicialmente haviam estipulado. E, neste concreto e peculiar circunstancialismo, não há que fazer apelo à norma constante do nº 2 do art.º 217º do CC, de modo a exigir – como sustenta a recorrente - que a emissão de declaração tácita só seria possível quando tivessem sido observadas as exigências de forma escrita quanto aos factos de que a declaração se deduz: é que, no caso dos autos, a ilisão da presunção estabelecida no nº1 do art.º 223º do CC implicou, como consequência adequada, a conclusão de que as partes, por força do seu comportamento material e em concretização do princípio da autonomia da vontade – prescindiram da exigência formal originariamente estipulada.» Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa de 19.3.2024, José Capacete, 8162/21, www.colectaneadejurisprudencia.com : I - O efeito extintivo da resolução do contrato ocorre, em regra, na data em que a declaração de vontade é eficaz, determinando a imediata cessação do vínculo (logo que a declaração chega ao poder do destinatário ou é dele conhecida). II - Por isso, depois de recebida, ou de ser conhecida, a declaração de resolução já não pode ser revogada, admitindo-se, porém, que aquele que resolveu o contrato proponha à contraparte a respetiva repristinação, sendo, então, necessário o consentimento desta. III - A circunstância de as partes terem adotado a forma convencional escrita para os contratos de aluguer declarados resolvidos, não impede a repristinação tácita consensual dos mesmos, pois a sua inicial redução a escrito não decorreu de imposição legal, mas da autonomia da vontade das partes, no âmbito da tutela dos respetivos interesses. IV - O alcance da estipulação negocial de redução a escrito daqueles contratos teve apenas como finalidade o estabelecimento de uma presunção ilidível de que as partes só pretendiam vincular-se pela forma convencionada, podendo, por isso, o abandono da forma convencional resultar, tacitamente, do seu posterior comportamento concludente. V - Tendo as partes, por vontade própria, abandonado tacitamente a exigência da forma escrita adotada para os contratos anteriormente celebrados, a repristinação dos mesmos, sem sujeição a tal forma, não a torna inválida ou ineficaz. No caso em apreço, os Requerentes procederam à resolução do contrato de arrendamento com base na alegação da falta de pagamento de rendas por parte da requerida (factos 7 e 8). Todavia, face à reação da requerida, negando a existência de rendas em dívida e alegando o seu pagamento a um senhorio entretanto falecido, os requerentes não prosseguiram uma atuação assente e consentânea com a resolução do contrato (cf. factos 9 a 13), não exigindo a imediata entrega do locado, nem instaurando procedimento judicial emergente da resolução e relação de liquidação emergente da resolução. Pelo contrário, após 30.3.2022, quer os senhorios/requerentes quer a requerida/inquilina continuaram a executar o contrato no plano material como se nada tivesse ocorrido no sentido da extinção do contrato: os senhorios não exigiram, judicial ou extrajudicialmente, a saída da inquilina do locado e a inquilina continuou a pagar um valor equivalente ao da renda mensal estipulada inicialmente. Numa primeira leitura, estes comportamentos das partes são concludentes no sentido de que as partes manifestaram, de forma tácita, a sua vontade confluente de continuar a execução do contrato de arrendamento celebrado em 16.8.2013. Dir-se-ia que o comportamento adotado pelas partes foi positivo e inequívoco no sentido da repristinação do contrato de arrendamento, após a formalização da declaração resolutiva. «Para as declarações tácitas, a lei impõe que os factos concludentes – factos de onde se deduz a manifestação de vontade – revelam, com toda a probabilidade, a manifestação de uma declaração negocial» (Comentário ao Código Civil, Parte Geral, Universidade Católica Editora, 2014, p. 491). A declaração tácita constitui um comportamento declarativo que «pode estar contido ou ser integrado por comunicações escritas, verbais ou por quaisquer actos significativos de uma manifestação de vontade, incorporem ou não uma outra declaração expressa» (Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 24.5.2007, Alves Velho, 07A988). «Na determinação da concludência do comportamento em ordem a apurar o respectivo sentido, nomeadamente enquanto declaração negocial que dele deva deduzir-se com toda a probabilidade, é entendimento geralmente aceite que a inequivocidade dos factos concludentes não exige que a dedução seja forçosa ou necessária, bastando que, conforme os usos do ambiente social, ela possa ter lugar com toda a probabilidade, devendo ser aferida por um “critério prático”, baseada numa “conduta suficientemente significativa” e que não deixe “nenhum fundamento razoável para duvidar” do significado que dos factos se depreende» (mesmo aresto). Assim, nesta primeira leitura, tendo as partes atuado, materialmente e de forma confluente, no sentido da execução/manutenção do contrato de arrendamento, seria singela e incontrovertida a conclusão de que acordaram numa informal repristinação do contrato de arrendamento. Todavia, dispõe o Artigo 217º, nº 2, do Código Civil, que «O carácter formal da declaração não impede que ela seja emitida tacitamente, desde que a forma tenha sido observada quanto aos factos de que a declaração se deduz.» «O nº2 é um corolário do princípio da liberdade declarativa: a natureza formal de uma declaração não impede que ela seja tacitamente emitida, desde que os factos concludentes de onde ela se deduz revistam a forma legalmente prescrita» (Comentário ao Código Civil, Parte Geral, Universidade Católica Editora, 2014, p. 491). Ora, o contrato de arrendamento em causa estava, desde a sua origem (16.8.2013), sujeito à forma escrita, conforme deflui do Artigo 1069º, nº1, do Código Civil, na redação da Lei nº 31/2012, de 12.2. Essa forma foi respeitada na sua celebração, conforme contrato junto aos autos. Nos termos da cláusula 12ª do contrato, o mesmo contrato apenas poderá ser alterado – designadamente pelo aditamento, suspensão ou modificação das cláusulas – por escrito e subscrito pelos outorgantes. Estando o contrato de arrendamento sujeito à forma escrita, os factos integrantes do comportamento concludente de repristinação do contrato de arrendamento teriam, eles próprios, de assumir a forma escrita, atento o disposto no Artigo 217º, nº 2, do Código Civil. Dito de outra forma, as declarações tácitas de repristinação do contrato de arrendamento têm de assumir traços ou vestígios documentais escritos. Ora, esses elementos escritos inexistem no caso, estando provado que o primeiro documento escrito emitido pelos autores foi a subsequente oposição à renovação remetida em 26.10.2022 e, por outro lado, não está demonstrada a entrega pela Ré aos autores de documento escrito após a formalização da resolução. Em suma, não ocorreu efetiva repristinação do contrato de arrendamento, após a sua resolução, porquanto as partes não emitiram declarações tácitas com observância da necessária forma escrita. As declarações tácitas, para serem eficazes e consequentes, teriam de assumir forma escrita, o que não ocorreu no caso. «Basta, mas torna-se necessário, que os factos concludentes estejam revestidos de forma legal» (Carlos Mota Pinto, Teoria Geral do Direito Civil, 4ª ed., p. 423). Assim sendo, o contrato de arrendamento cessou por resolução operada em 30.3.2022, através de notificação judicial avulsa, com fundamento na falta de pagamento das rendas de janeiro a dezembro de 2021 e parciais das rendas de janeiro março de 2022, num total de € 5.773,25 (factos 7 e 8). Note-se que à ré incumbia a prova do pagamento das rendas, como facto extintivo do direito dos autores/senhorios (Artigo 342º, nº2, do Código Civil), o que a Ré não logrou fazer (cf. facto não provado sob 2). Celebração de novo contrato de arrendamento A apelante sustenta que foi celebrado entre as partes novo contrato de arrendamento porquanto: a inquilina continuou a utilizar o imóvel, a pagar a renda sem oposição dos senhorios; os senhorios continuaram a disponibilizar o imóvel, recebendo as rendas; deve considerar-se celebrado um novo contrato de arrendamento, nos termos do Artigo 1069º, nº2, do Código Civil. Improcede a apelação neste segmento. Nos termos do Artigo 1069º, nº 2, do Código Civil, «Na falta de redução a escrito do contrato de arrendamento que não seja imputável ao arrendatário, este pode provar a existência de título por qualquer forma admitida em direito, demonstrando a utilização do locado pelo arrendatário sem oposição do senhorio e o pagamento mensal da respetiva renda por um período de seis meses.» Por força da resolução fundada operada em 30.3.2022, a ré estava obrigada a entregar o locado a partir de 30.4.2022, nos termos do Artigo 1087º do Código Civil. Ora, entre 30.4.2022 e 26.10.2022 (data em que foi expedida a carta registada pelos senhorios em que estes declararam opor-se à renovação do contrato, carta recebida em 27.10.2022 – facto 14) não se completaram sequer seis meses (cf. Artigo 279º, al. c), do Código Civil). A remessa dessa carta de oposição à renovação é completamente infirmatória de qualquer intuito consentâneo com a celebração de novo contrato de arrendamento por parte dos autores. Em segundo lugar, a norma do Artigo 1069º, nº 2, do Código Civil, está pensada para os casos em que, ab initio, as partes não reduziram o contrato de arrendamento a escrito, apesar de o executarem durante mais de seis meses. Não é esse o caso porquanto o contrato foi originariamente reduzido a escrito e depois foi regularmente resolvido (cf. supra). Em terceiro lugar, após a resolução do contrato e até à efetiva restituição do imóvel, o pagamento de um valor equivalente ao da renda constitui obrigação legal de indemnização diretamente decorrente do Artigo 1045º, nº 1, do Código Civil, não dando azo à sua subsunção na previsão do Artigo 1069º, nº 2, do Código Civil. Termos em que, sendo desnecessárias outras considerações, improcede esta linha argumentativa da apelante. Custas A fundamentação autónoma da condenação em custas só se tornará necessária se existir controvérsia no processo a esse propósito (cf. art.º 154º, nº1, do Código de Processo Civil; Acórdãos do Tribunal Constitucional nºs. 303/2010, de 14.7.2010, Vítor Gomes, e 708/2013, de 15.10.2013, Maria João Antunes). DECISÃO Pelo exposto, acorda-se em julgar improcedente a apelação, confirmando-se a sentença recorrida. Custas pela apelante na vertente de custas de parte (Artigos 527º, nºs 1 e 2, 607º, nº 6 e 663º, nº 2, do Código de Processo Civil). Lisboa, 13.5.2025 Luís Filipe Pires de Sousa José Capacete Edgar Taborda Lopes _______________________________________________________ [1] Abrantes Geraldes, Recursos em Processo Civil, 7ª ed., 2022, p. 186. [2] Abrantes Geraldes, Op. Cit., pp. 139-140. Neste sentido, cf. os Acórdãos do Supremo Tribunal de Justiça de 9.4.2015, Silva Miguel, 353/13, de 10.12.2015, Melo Lima, 677/12, de 7.7.2016, Gonçalves Rocha, 156/12, de 17.11.2016, Ana Luísa Geraldes, 861/13, de 22.2.2017, Ribeiro Cardoso, 1519/15, de 25.10.2018, Hélder Almeida, 3788/14, de 18.3.2021, Oliveira Abreu, 214/18, de 15.12.2022, Graça Trigo, 125/20, de 11.5.2023, Oliveira Abreu, 26881/15, de 25.5.2023, Sousa Pinto, 1864/21, de 11.7.2023, Jorge Leal, 331/21, de 11.6.2024, Leonel Serôdio, 7778/21, de 29.10.2024, Pinto Oliveira, 5295/22, de 13.2.2025, Luís Mendonça, 2620/23. O tribunal de recurso não pode conhecer de questões novas sob pena de violação do contraditório e do direito de defesa da parte contrária (Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 17.12.2014, Fonseca Ramos, 971/12). [3] Cf. Acórdãos do Supremo Tribunal de Justiça de 22.9.2015, Pinto de Almeida, 29/12, de 29.10.2015, Lopes do Rego, 233/09. [4] Cf. Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 22.10.2015, Tomé Gomes, 212/06. [5] Cf.: Acórdão da Relação do Porto de 16.5.2005, Cunha Barbosa, 0550879; Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 6.7.2022, Ramalho Pinto, 28533/15. [6] Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 25.3.2021, Bernardo Domingos, 1595/15. [7] Cf. Acórdãos do Supremo Tribunal de Justiça de 21.3.2018, Ferreira Pinto, 5074/15, de 12.7.2018, Ferreira Pinto, 167/11, de 11.9.2019, Ribeiro Cardoso, 42/18, de 3.10.2019, Rosa Tching, 77/06, de 5.2.2020, Pinto de Oliveira, ECLI:PT:STJ:2020:3920.14.1TCLRS.S1, de 4.6.2020, Rijo Ferreira, 1519/18, de 9.2.2021, Maria João Tomé, 26069/18, de 11.2.2021, Graça Trigo, 4279/17, de 6.5.2021, Pinto Oliveira, 618/18, de 18.1.2022, Maria Vaz Tomé, 701/19, de 13.10.2022, Graça Trigo, 1700/20, de 12.10.2023, Graça Trigo, 1/20, de 25.1.2024, Fernando Baptista, 1007/17. |