Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa
Processo:
1151/19.3PBCSC.L1-3
Relator: CARLOS ALEXANDRE
Descritores: INSUFICIÊNCIA DA MATÉRIA DE FACTO
RELATÓRIO SOCIAL
MEDIDA CONCRETA DA PENA
SUSPENSÃO DA EXECUÇÃO DA PENA
JUIZO DE PROGNOSE
PENA DE PRISÃO
Nº do Documento: RL
Data do Acordão: 05/07/2025
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Texto Parcial: N
Meio Processual: RECURSO PENAL
Decisão: NÃO PROVIDO
Sumário: Sumário (elaborado pela CIJ):
I – A solicitação de elaboração de relatório social da arguida constitui uma faculdade de que o Tribunal dispõe se a considerar necessária, para recolha de informação apta à determinação da sanção a aplicar.
II – A arguida não compareceu a Tribunal, apesar de notificada, ao invés do seu marido, CC, co-arguido nestes autos, o seu paradeiro quase sempre foi desconhecido.
III - Perante a prova produzida em sede de julgamento, o Tribunal a quo não sentiu necessidade de solicitar a elaboração de relatório social, até por desconhecimento do seu paradeiro, nem o Ilustre defensor da arguida requereu a produção de qualquer elemento de prova, referente à situação económica e pessoal da arguida.
IV - Valorando o ilícito global, na ponderação conjunta dos factos e personalidade do arguido, como determina o art. 77.º, n.º 1, do CP, tendo em conta a natureza e gravidade dos ilícitos, as fortes exigências de prevenção geral na defesa e restabelecimento das normas violadas, sendo forte a intensidade do dolo e da culpa, bem como as exigências de socialização, em que os factos praticados face à vida pregressa do arguido revelam tendência criminosa, não se revela desadequada a pena única de 5 anos e 10 meses de prisão aplicada pela 1.ª instância.
V - A arguida demonstra propensão para a assunção de comportamentos ilícitos, quer ao nível de crimes contra o património, quer ao nível de crimes contra a integridade física, no caso do crime de ameaça.
VI - Tendo presente as circunstâncias em que os factos ocorreram, os antecedentes criminais da arguida, a reiteração das condutas, entende este Tribunal de Recurso que não é possível formular um juízo de prognose favorável no sentido de considerar que a simples censura do facto e a ameaça da pena, serão suficientes para afastar a arguida da criminalidade.
VII - A arguida não altera o seu comportamento, vivendo de expedientes que, astuciosamente, engenha, por forma a induzir terceiros em erro e, locupletar-se com valores monetários, que consiga obter através daqueles enganos.
VIII - Não há qualquer dimensão de inconstitucionalidade na interpretação de que a pena privativa da liberdade aplicada por um dos crimes de burla, deva ou tenha de ser cumprida em permanência na habitação, atribuindo-se a essa permanência o carater de pena substitutiva da prisão.
Decisão Texto Parcial:
Decisão Texto Integral: Acordam os Juízes que constituem a Conferência nesta 3ª Secção Criminal do Tribunal da Relação de Lisboa:

A arguida AA, veio recorrer da sentença proferida pelo Juízo Local Criminal de Cascais – Juiz 3, que a condenou como autora material de três crimes de burla simples, p. e p. pelo artigo 217º, nº 1, do CP, sendo condenada pela prática dos dois primeiros crimes, na pena de 130 dias de multa, à taxa diária de € 5, por cada um, e pelo terceiro crime na pena de nove meses de prisão e, em cúmulo jurídico das penas de multa, na pena única de 220 dias, à taxa diária de cinco euros, o que perfaz quanto à pena de multa, o valor global de €1.100,00.
A arguida apresentou motivação, formulando as seguintes conclusões:
1. Não pode a recorrente conformar-se com o subscrito da douta sentença.
2. Foi a arguida, ora recorrente, foi condenada pela prática de:
- três crimes de burla p. p. pelo artigo 217.°, n° 1, do Código Penal, indo condenado pela prática de dois primeiros crimes, na pena de 130 (cento e trinta) dias de multa, à taxa diária de 5,00 €, por cada um, e pelo terceiro crime na pena de 9 (nove) meses de prisão.
- Operando o cúmulo das penas de multa referidos em b), vai a arguida condenada na pena única de 220 (duzentos e vinte) dias de multa, à taxa diária de cinco euros, o que perfaz a multa global de 1.100,00 € (mil e cem euros).
3. Sob pena de comprometer o embasamento das diligências adotadas e seus resultados, cumpre afirmar que, não se questionando a verosimilhança das ilações retiradas de uma apreciação crítica das provas, tem-se como inadequada, face aos factos apurados, a medida da pena concretamente aplicada.
4. No caso sub júdice, com o devido respeito o Tribunal a quo não conseguiu determinar quaisquer elementos acerca da situação das condições de vida da arguida, nomeadamente no que concerne à sua integração familiar, profissional e social.
5. O Tribunal a quo e perante a ausência da arguida na audiência de julgamento podia e devia recorrer á faculdade que lhe é concedida pelo art° 370 do Código Processo Penal, para poder aferir das condições de vida desta, permitindo assim estar na posse de elementos que reputamos de essenciais para a boa decisão da causa.
6. O Tribunal a quo não dando cumprimento ao disposto no art° 370° do Código Processo Penal, não fez juntar o relatório relativo à pessoa da ora recorrente, arguida nos autos, razão por que ficou por apurar a factualidade relativa à sua história de vida, condições pessoais, famliares, sociais e económicas.
7. Não resulta da economia de todo o ordenamento penal adjetivo que a junção aos autos de relatório social relativo à arguida seja obrigatória.
8. O conhecimento da situação pessoal e de vida da ora recorrente, para além da sua pertinência para a escolha e medida de pena, é fundamental para aplicação de eventual pena de substituição.
9. Assim considera a recorrente que o Tribunal a quo está investido do poder-dever de investigar, oficiosamente, porquanto lhe incumbe o poder-dever da busca da verdade material e da boa decisão da causa.
10. Ora, no caso sub judice, o Tribunal a quo não apurou quaisquer elementos respeitantes às condições de vida da recorrente apesar de o poder e dever fazer, numa clara ausência de elementos de prova concretos e objetivos, o que seria sempre impeditivo da determinação da medida da pena, nomeadamente quanto à pena de prisão em que esta foi condenada.
11. Acresce ainda que a culpa ínsita aos crimes praticados ser reduzida, resultante do valor diminuto do enriquecimento ilegítimo por parte da recorrente.
12. Se de facto as necessidades de prevenção geral e especial são elevadas, como bem refere a douta sentença, consideramos, contudo, que a pena de prisão em que foi condenada a recorrente foi excessiva, devendo, por tal, ser determinada uma pena inferior.
13. Consideramos, conteúdo, que o Tribunal a quo não devia ter afastado a possibilidade de o cumprimento da pena de prisão ser cumprido em regime de permanência na habitação, previsto pelo artº 44, nº 1 do Código Penal, o que podia ter sido aplicado.
14. Parece-nos, com a devido respeito, que existem condições para que a recorrente pudesse ter beneficiado da possibilidade de cumprir a pena de prisão em que foi condenada no regime de permanência na habitação, sujeito a fiscalização por meios técnicos de controlo à distância.
15. O cumprimento da pena de prisão em regime de permanência na habitação, permitiria à recorrente refletir sobre as sérias e graves consequências que para si advirão se repetir o seu comportamento delituoso, impedindo, igualmente, a potenciação do efeito criminógeno particularmente ativo nas penas de privação da liberdade de curta duração.
16. Pelo que entende a recorrente, que a sentença recorrida deverá ser revogada quanto à pena de prisão determinada, condenando-a numa pena inferior à mesma,
17. bem como, no segmento decisório respeitante ao cumprimento da pena de prisão em que venha a ser condenada, ser esta cumprida em regime de permanência na habitação (por este regime ser, neste caso, o adequado e preferível dentro do leque das penas de substituição detentivas disponíveis, sendo essa pena “ainda comunitariamente suportável à luz da necessidade de tutela de bens jurídicos e da estabilização das expetativas comunitárias na validade da norma violada”),
18. A recorrente entende que deve ser apreciada a inconstitucionalidade da interpretação normativa do artigo 44º do Código Penal, por não ter sido acolhida, na decisão recorrida, a aplicação do regime de permanência na habitação enquanto pena “substitutiva”, à pena de prisão,
19. considerando e com o devido respeito, que tal interpretação ora colocada em crise viola as garantias de defesa, consagradas no artigo 32º da Constituição da República Portuguesa, bem como, do dever de fundamentar, estatuído no artigo 205.º, nº 1 da Constituição da República Portuguesa.
20. A recorrente considera e com o devido respeito que o Tribunal recorrido deveria ter aplicado os princípios constitucionais suprarreferidos aquando da interpretação normativa do artigo 44º do Código Penal, por se entender que toda a pena de prisão deve ter sempre como desiderato a reintegração social do condenado,
21. e consequentemente dever ser aplicada uma pena de substituição, nomeadamente a prevista no artº 44 do Código Penal dependendo de um juízo de adequação às finalidades da punição, o que no caso sub judice não
22. assim se respeitando as normas dos artºs. 42º, 44º, 70º, 71º, nº 1, 50º, nº 1, 53º, nº 3 e 217º, nº 1, todos do Código Penal e artº 370º do Código Processo Penal e artºs. 32 e 205, nº 1 da Constituição da República Portuguesa.
O Ministério Público não apresentou a resposta ao recurso.
O Ministério Público junto deste Tribunal da Relação de Lisboa, emitiu parecer em 18/02/2025, nos seguintes termos:
O recurso ora em apreço não suscita objeções quanto á sua admissibilidade, tempestividade, legitimidade, espécie, forma, momento de subida e efeito fixado, sendo de julgar em conferência, atento o disposto no art. 419.º, nº3, alínea c) do Código de Processo Penal.
O recurso interposto pela Arguida AA incide sobre a sentença proferida a 1 de julho de 2024, que a condenou pela prática, em autoria material, de três crimes de burla, previstos e punidos pelo art. 217.º, nº1, do Código Penal, na pena única de 220 dias de multa, à taxa diária de € 5,00 (cinco euros), o que perfaz a multa global de € 1.100,00 (mil e cem euros).
A Recorrente entende que «os elementos recolhidos no decurso das diligências adotadas, a análise e ponderação da matéria probatória carreada e a interpretação dos elementos disponíveis nos autos não habilitam a prolação da douta sentença proferida pelo Tribunal a quo», e que «o Tribunal a quo, perante a ausência da arguida na audiência de julgamento podia e devia recorrer à faculdade que lhe é concedida pelo art. 370.º, do Código de Processo Penal, para poder aferir das condições de vida desta, permitindo assim estar na posse de elementos que reputamos de essenciais para a boa decisão da causa».
Não temos conhecimento que o Ministério Público na 1.ª Instância tenha respondido às motivações de recurso.
Conforme se infere das conclusões apresentadas, a Recorrente defende, no essencial, que o Tribunal a quo devia ter solicitado relatório social, com vista ao apuramento das condições de vida da Arguida e a uma melhor decisão da causa.
Nesse sentido, a Recorrente sugere que estamos perante o vício da insuficiência para a decisão da matéria de facto dada como provada, decorrente da violação dos princípios da investigação e da verdade material, face à deteção do incumprimento, por parte do Tribunal, do dever de apuramento dos factos necessários à decisão sobre a pena.
Todavia, não lhe assiste razão.
Nos termos do art. 370.º, nº1, do Código de Processo Penal, a solicitação de elaboração de relatório social do arguido constitui uma faculdade de que o tribunal dispõe quando considerar necessária a informação recolhida em tal relatório para a determinação da sanção a aplicar.
O Tribunal a quo não solicitou a realização de relatório social por entender, por certo, que neste caso não era necessário.
Com efeito, de acordo com os dados disponíveis, a Arguida, apesar de regularmente notificada, não compareceu a julgamento, sendo que, no decurso de todo o processo, o seu paradeiro quase sempre foi desconhecido, circunstância esta que naturalmente inviabilizava a realização do aludido relatório.
Acresce que, uma vez produzida a prova em sede de julgamento, o seu Ilustre Defensor não requereu a produção de qualquer elemento de prova referente à situação económica e pessoal da Arguida, nomeadamente a realização de relatório social.
Assim sendo, entendemos que a matéria de facto considerada pelo Tribunal a quo se mostra suficiente para a decisão sobre a determinação da pena, sendo que fez uma acertada ponderação das circunstâncias que rodearam a prática dos factos e valorou corretamente o grau de culpa manifestado, a ilicitude dos factos e as exigências de prevenção especial e geral, sendo que a pena única aplicada se mostra adequada, proporcional e corresponde a uma correta interpretação dos critérios estabelecidos nos arts. arts. 40.º, 70.º e 71.º, do Código Penal.
Nesta conformidade, emitimos parecer no sentido da improcedência do recurso, com a consequente confirmação da sentença impugnada.
Os autos foram a vistos e à conferência.
Do âmbito do recurso e da decisão recorrida:
O âmbito do recurso é delimitado em função do teor das conclusões extraídas pelo Recorrente da motivação apresentada, só sendo lícito ao Tribunal ad quem, apreciar as questões desse modo sintetizadas, sem prejuízo das que importe conhecer oficiosamente, como são os vícios da sentença previstos no artigo 410º n.º 2 do CPP, mesmo que o recurso se encontre limitado à matéria de direito – cfr. Ac. do Plenário das Secções Criminais do STJ de 19/10/1995, DR I-A Série, de 28/12/1995 e artigos 403º nº 1 e 412º nºs 1 e 2, ambos do CPP.
Em face da motivação, são as seguintes as questões a considerar:
- Ocorre insuficiência para a decisão da matéria de facto provada?
- Ocorre violação do disposto nos artigos 50º e 51º do CP?
- Ocorre interpretação normativa do artigo 44º do CP, por violação do artigo 32º da CRP?
A decisão condenatória sob recurso fixou os factos, nos seguintes termos (transcrição parcial):
1. MATÉRIA DE FACTO PROVADA
De relevante para a discussão da causa, resultou provada a seguinte matéria de facto:
1. À data dos factos infra descritos os arguidos eram casados entre si desde ... de ... de 2010 e tinham três filhos em comum, ainda menores.
2. Em data não concretamente apurada, mas antes do dia ... de ... de 2019, a arguida formulou o propósito de obter para si benefício económico através da colocação na internet de anúncios fraudulentos para venda de vários produtos, designadamente de peças de vestuário
3. Para o efeito, em data não concretamente apurada, mas antes do dia ... de ... de 2019, a arguida colocou um anúncio na rede social “Facebook”, anunciando a venda de várias peças de vestuário para criança, a preços variados.
4. Nessa sequência, no dia ... de ... de 2019, a ofendida BB contactou com a arguida, através de mensagens escritas para o telemóvel ..., tendo a arguida acordado com a ofendida a venda de 5 (cinco) polos de criança, pelo valor de € 27 (vinte e sete euros).
5. O telemóvel ... utilizado pela arguida pertence ao arguido CC.
6. Mais acordou a arguida com a ofendida que o pagamento seria feito através de MBWay.
7. Assim, no dia ... de ... de 2019, a ofendida efectuou o pagamento do preço acordado, através de transferência bancária via MBWay, para a conta com ... da ..., titulada pela arguida AA.
8. Pelo que o valor de € 27 ficou disponível para a arguida em ... de ... de 2019.
9. Porém, não obstante ter efectuado o pagamento do preço acordado, a arguida não enviou as referidas peças de vestuário, conforme se havia comprometido.
10. E, de igual forma, também a arguida não devolveu à ofendida o valor de € 27, não obstante as várias tentativas de contacto por parte da ofendida.
11. Ao agir da forma descrita, conseguiu a arguida convencer a ofendida de que possuía efectivamente peças de vestuário infantil para venda e, desse modo, determinou a ofendida a proceder ao pagamento de € 27 (vinte e sete euros), criando-lhe a expectativa de que, em troca, receberia os produtos encomendados, o que não veio a suceder.
12. Deste modo, a arguida logrou obter para si vantagem patrimonial, a que sabia não ter direito, no valor de € 27, causando o correlativo prejuízo no património da ofendida.
(Do processo n.º 666/19.8PFCSC)
13. Em data não concretamente apurada, a arguida criou na rede social Facebook (www.facebook.com), um perfil com o nome de utilizador “DD” e através daquela rede social, na página “...”, publicitou artigos para venda.
14. No dia ... de ... de 2019, ... acedeu através da Internet ao perfil criado pela arguida na referida página e ficou interessada na aquisição de quatro máquinas de costura e outro aparelho não concretamente apurado, cuja venda a arguida ali anunciou.
15. ... contactou a arguida por mensagem remetida através da página do Facebook e, após troca de várias mensagens, a arguida concordou vender e a ofendida comprar os referidos artigos pelo preço global de € 315 (trezentos e quinze euros)
16. Mais ficou acordado que a arguida entregaria os artigos na morada indicada por ..., ... na ...
17. E que a ofendida transferiria o preço acordado para o NIB ..., indicado pela arguida.
18. No dia ... de ... de 2019, pelas 20h00, em local não concretamente apurado, por não suspeitar das reais intenções da arguida, ... transferiu o montante de 315,00€ (trezentos e quinze euros), para o NIB ..., correspondente a conta bancária de que a arguida é titular na ....
19. Em consequência, a conta bancária titulada pela arguida foi creditada no referido valor, que a mesma fez seu.
20. No dia ... de ... de 2019, atendendo à demora na entrega dos equipamentos, a ofendida contactou a arguida que, inicialmente, foi apresentando desculpas para a não entrega e, de seguida, deixou de responder aos contactos de ....
21. A arguida não procedeu ao envio das máquinas de costura, o que, aliás, nunca teve intenção de fazer.
22. A arguida actuou de forma ardilosa, querendo e conseguindo induzir em erro a ofendida, fazendo-a acreditar que dispunha dos artigos acima descritos para venda e que os estava a vender mediante a contrapartida acordada, determinando-a, dessa forma, a entregar-lhe a quantia acima identificada, o que aquela apenas fez por acreditar, perante a actuação da arguida, que esta lhe entregaria os artigos descritos no anúncio.
23. A arguida nunca teve intenção de vender e entregar à ofendida os referidos equipamentos, mas, apenas, obter para si própria vantagem patrimonial que não lhe era devida e causar à ofendida o prejuízo correspondente, o que quis e conseguiu.
24. Actuou a arguida de forma livre, deliberada e consciente, bem sabendo que a sua conduta era e é proibida e punida por lei.
(Do Processo 234/22.7GACSC)
25. Em data não concretamente apurada, mas localizada antes de ... de ... de 2022, a arguida colocou um anúncio no Facebook, secção de ..., anunciando a venda de uma cama de casal, duas mesas de cabeceira, um espelho e uma cómoda.
26. Nessa sequência, em ... de ... de 2022, a ofendida EE contactou com a arguida, através de mensagens na referida rede social, tendo a arguida acordado com a ofendida a venda dos referido mobiliário pelo preço de € 240 (duzentos e quarenta euros).
27. Mais ficou acordado que o preço seria pago pela ofendida através de transferência bancária para a conta da arguida, do ..., com ...
28. Assim, no dia ... de ... de 2022, a ofendida procedeu à transferência do preço de € 240 (duzentos e quarenta euros) para a conta identificada em 3.
29. Pelo que o valor de € 240 (duzentos e quarenta euros) ficou disponível para a arguida em ... de ... de 2022.
30. Porém, não obstante a ofendida ter efectuado o pagamento do preço acordado, a arguida não enviou as peças de mobiliário, conforme se havia comprometido.
31. E, de igual forma, também a arguida não devolveu à ofendida o valor de € 240 (duzentos
e quarenta euros), não obstante as várias tentativas de contacto por parte da ofendida.
32. Ao agir da forma descrita, conseguiu a arguida convencer a ofendida de que possuía efectivamente uma cama de casal, duas mesas de cabeceira, um espelho e uma cómoda para venda e, desse modo, determinou a ofendida a proceder ao pagamento de € 240 (duzentos e quarenta euros), criando-lhe a expectativa de que, em troca, receberia os artigos encomendados, o que não veio a suceder.
33. Deste modo, a arguida logrou obter para si vantagem patrimonial, a que sabia não ter direito, no valor de € 240 (duzentos e quarenta euros), causando o correlativo prejuízo no património da ofendida.
34. A arguida agiu livre, voluntária e conscientemente, bem sabendo que a sua conduta era proibida e punida pela lei penal.
35. Por sentença transitada em julgado em 14.11.2017 e proferida no âmbito do processo 482/16.9PLLRS, foi a arguida condenada na pena de 100 dias de multa, pela prática, em ........2016, de um crime de burla.
36. Por sentença transitada em julgado em 28.05.2020 e proferida no âmbito do processo 74/16.2GALSD, foi a arguida condenada na pena de 100 dias de multa, pela prática, em ........2016, de um crime de burla.
37. Por sentença transitada em julgado em 12.01.2021 e proferida no âmbito do processo 2392/19.9GBABF, foi a arguida condenada na pena de 200 dias de multa, pela prática, em ........2019, de um crime de burla.
38. Por sentença transitada em julgado em 31.03.2022 e proferida no âmbito do processo 450/20.6PCSNT, foi a arguida condenada na pena única de 1 ano e 6 meses de prisão suspensa na sua execução, pela prática, em ........2020, de dois crimes de burla.
39. Por sentença transitada em julgado em 21.06.2019 e proferida no âmbito do processo 193/16.5GFLLE, foi a arguida condenada na pena única de 220 dias de multa, pela prática, em 2016, de dois crimes de burla.
40. Por sentença transitada em julgado em 26.01.2021 e proferida no âmbito do processo 1367/19.2S5SLB, foi a arguida condenada na pena de 30 dias de multa, pela prática, em ........2019, de um crime de burla.
41. Por sentença transitada em julgado em 20.09.2021 e proferida no âmbito do processo 1275/19.7PFLRS, foi a arguida condenada na pena de 1 ano de prisão suspensa na sua execução, pela prática, em ........2019, de um crime de burla.
42. Por sentença transitada em julgado em 15.03.2022 e proferida no âmbito do processo 1326/19.5PBVCT, foi a arguida condenada na pena única de 220 dias de multa, pela prática, em .../...20, de dois crimes de burla.
43. Por sentença transitada em julgado em 02.11.2022 e proferida no âmbito do processo 93/21.7GAVCD, foi a arguida condenada na pena de 40 dias de multa, pela prática, em ........2021, de um crime de ameaça agravada.
44. Por sentença transitada em julgado em 23.03.2023 e proferida no âmbito do processo 804/19.0PAMGR, foi a arguida condenada na pena de 1 ano de prisão suspensa na sua execução, pela prática, em ........2019, de um crime de burla.
45. Por sentença transitada em julgado 10.02.2023 e proferida no âmbito do processo 116/20.7GEVCT, foi a arguida condenada na pena de 1 ano de prisão suspensa na sua execução, pela prática, em .../2020, de um crime de burla.
46. Por sentença transitada em julgado 12.02.2024 e proferida no âmbito do processo 96/20.9GDSTB, foi a arguida condenada na pena de 1 ano e 3 meses de prisão suspensa na sua execução por dois anos, pela prática, em .../2020, de um crime de burla.
47. Por sentença transitada em julgado 22.02.2024 e proferida no âmbito do processo 222/21.0PCMTS, foi a arguida condenada na pena de 2 anos e 7 meses de prisão suspensa na sua execução, pela prática, em ........2021, de um crime de burla qualificada.
48. Por acórdão transitado em julgado 14.03.2024 e proferida no âmbito do processo 4797/20.3JAPRT, foi a arguida condenada na pena única de 2 anos de prisão suspensa na sua execução por 3 anos, pela prática, em ........2020, de dois crimes de burla qualificada.
49. A arguida tem registado em seu nome o veículo automóvel de matrícula ..-..-OZ, marca ..., modelo ...
2. MATÉRIA DE FACTO NÃO PROVADA
De relevante para a discussão da causa não se logrou provar a seguinte matéria de facto:
(Do processo 1151/19.3PBCSC)
1. Em data não concretamente apurada, mas localizada antes de ... de 2019, o arguido formulou com a arguida o propósito conjunto de obter para si benefício económico, através da colocação na internet de anúncios fraudulentos para venda de vários produtos, designadamente produtos de vestuário.
2. Para o efeito, e no cumprimento desse desígnio, em data não concretamente apurada, mas antes do dia ... de ... de 2019, o arguido colocou um anúncio na rede social “Facebook”, anunciando a venda de várias peças de vestuário para criança, a preços variados.
3. Que o arguido acordou com a ofendida a venda das peças de roupa supra referidas pelo valor de € 27, e acordou com esta que o pagamento seria feito através de MBway, para a conta da arguida.
4. Que o valor da venda ficou disponível para o arguido no dia ........2019, mas o arguido não enviou as peças tal como se havia comprometido nem devolveu o valor da venda.
5. Que o arguido e segundo um plano conjunto e previamente delineado, conseguiu convencer a ofendida de que possuía efectivamente peças de vestuário infantil para venda e, desse modo, determinou a ofendida a proceder ao pagamento de € 27 (vinte e sete euros), criando-lhe a expectativa de que, em troca, receberia os produtos encomendados, o que não veio a suceder.
6. Deste modo, o arguido logrou obter para si vantagem patrimonial, a que sabia não ter direito, no valor de € 27, causando o correlativo prejuízo no património da ofendida.
3. MOTIVAÇÃO DA DECISÃO DE FACTO
A convicção do Tribunal relativamente aos factos provados de índole criminal
fundou-se na análise crítica e conjugada da prova e as regras de experiência comum.
Assim, quanto aos negócios e pagamentos efetuados, teve-se em atenção o depoimento das testemunhas BB, FF e ..., que apesar de ofendidas depuseram de forma clara, tranquila e imparcial, afirmando que viram anúncios no facebook (...) de produtos que pretendiam adquirir (fls. 26 do processo 666/19.8 e fls. 15 do processo 234/22.7,), que entraram em contacto com a vendedora, que foi esta quem indicou o preço dos bens, a forma de pagamento tendo indicado o n.º da conta para onde as transferências deviam ser efectuadas ou o contacto para pagamento via Mbway, pagamento que exigiu ser efetuado antes do envio dos bens, conjugado com os documentos juntos aos autos, mensagens trocadas entre a vendedora e a compradora junta a fls. 6 a 28, (27 a 41 do processo 666/19.8 e 16 a 18 do processo 234/22.7), documentação bancária de fls. 49, e 67 a 72, (comprovativo da transferência de fls. 10 e documentção bancária de fls. 18 a 22 do processo 666719.8 e fls. 23 e seg. documentação bancária e comprovativo de pagamento do processo 234/22.7) de onde resulta que os pagamentos/transferências efetuadas pelas ofendidas foram creditados nas contas bancárias tituladas apenas pela arguida.
No que concerne à autoria dos factos, teve-se em atenção o depoimento das ofendidas, os documentos bancários e as regras de experiência comum. Resultando inequivocamente da documentação bancária (extratos bancários) juntos que as transferências/pagamentos foram efectuadas, a pedido da vendedora, para as contas bancárias por si indicadas e das quais a arguida é a única titular, afigura-se, de acordo com as regras da normalidade, ser ela a pessoa que contatou com as ofendidas, já que ela é a única pessoa que beneficiava com tal atuação.
Assente que foi a arguida a autora dos factos, tendo criado a convicção nas ofendidas de que se tratava de negócios legítimos quando, face à conduta que adoptou, veja-se o teor das mensagens trocadas com as mesmas, e que após ter confirmado o pagamento deixou de atender os telefonemas das ofendidas e bloqueou a ofendida BB na rede social Facebook, só podemos concluir que a mesma nunca teve intenção de vender qualquer objecto, que agiu com intenção de obter um enriquecimento ilegítimo e que astuciosamente levou os ofendidos a entregarem-lhe os valores peticionados, pelo que se deu como assente que a arguida agiu com intenção de enganar as ofendidas levando-os a praticar atos que lhe causavam prejuízo patrimonial, obtendo, desse modo, o arguido um benefício a que sabia não ter direito.
Mais, teve-se em atenção os assentos de nascimento e casamento juntos a fls. 116 a 120, a informação da ... de fls. 63, onde consta que o telemóvel utilizado pela arguida está registado em nome do seu marido, o aqui co-arguido.
Teve-se, ainda, o certificado de registo criminal junto aos autos, bem como os prints da conservatória do registo automóvel junto em audiência.
Quanto à matéria não provada teve-se em atenção o princípio do in dubio pro reo.
É certo que resultou assente que o telemóvel utilizado pela arguida estava em nome do arguido. No entanto a conta para onde foi feita a transferência só pertencia à arguida. Sendo certo que os arguidos eram, à data dos factos, casados entre si, ficámos na dúvida se o arguido teve alguma participação nos factos, sendo habitual ou podendo acontecer entre casais o telemóvel ser adquirido por um para o outro utilizar ou até ser adquirido por ambos e ter ficado registado em nome do arguido.
Também o facto de em Maio de 2021 quando o arguido prestou TIR ter indicado esse telemóvel como sendo o seu, só por si, não permite concluir que, à data dos factos era o arguido que utilizava o referido telemóvel ou que o utilizava em conjunto com a sua mulher.
Pelo que, subsistindo a dúvida nessa matéria, sempre tais dúvidas terão que beneficiar o arguido por obediência ao princípio in dubio pro reo como emanação constitucional do princípio da presunção da inocência.
É possível, ou até mesmo provável que seja o arguido o autor dos factos. Mas, como afirma Cavaleiro Ferreira “provável e provado são expressões antitéticas sob o ponto de vista jurídico” e a dúvida terá sempre de funcionar em sentido favorável ao arguido. O que se fez.
Vejamos então:
A arguida não põe em causa a factualidade dada por provada na sentença recorrida, consubstanciadora do cometimento, em autoria material, dos referidos ilícitos.
A arguida não coloca em causa que os factos merecem censura penal, apenas coloca em causa, a inobservância, a seu ver, das regras dos artigos 70º e 71º do CP.
Logo, a arguida não discute que do acórdão constam a exposição de motivos de facto e de direito que fundamentaram a decisão de aplicação das penas, nem questiona a indicação e o exame crítico das provas que serviram para formar a convicção do Tribunal a quo.
Neste particular a arguida vem a um tempo suscitar a insuficiência da matéria de facto apurada para a decisão e invocar uma inconstitucionalidade.
A arguida pugna pela existência de vício da insuficiência para a decisão da matéria de facto dada como provada, adveniente da violação do princípio da descoberta da verdade material, em virtude de o Tribunal a quo não ter desenvolvido diligências legalmente exigidas – elaboração do relatório social-, para o apuramento dos factos necessários à decisão sobre a pena.
Este Tribunal de Recurso entende que a solicitação de elaboração de relatório social da arguida constitui uma faculdade de que o Tribunal dispõe se a considerar necessária, para recolha de informação apta à determinação da sanção a aplicar.
Do excurso dos autos verifica-se não só que a arguida não compareceu a Tribunal, apesar de notificada, ao invés do seu marido, CC, co-arguido nestes autos, o seu paradeiro quase sempre foi desconhecido.
O artigo 370º, nº 1 do CPP, estatui que “O tribunal pode a qualquer altura do julgamento, logo que, em função da prova produzida em audiência, o considerar necessário à correta determinação da sanção que eventualmente possa vir a ser aplicada, solicitar a elaboração de relatório social ou de informação dos serviços de reinserção social…”
Consequentemente, não é obrigatória a realização de relatório social.
Perante a prova produzida em sede de julgamento, o Tribunal a quo não sentiu necessidade de solicitar a elaboração de relatório social, até por desconhecimento do seu paradeiro, nem o Ilustre defensor da arguida requereu a produção de qualquer elemento de prova, referente à situação económica e pessoal da arguida.
Destarte, improcede esta dimensão do recurso que se traduz na evocação de insuficiência da matéria de facto para a decisão.
No tocante à fundamentação que subjaz às medidas das penas parcelarmente aplicadas, ao cúmulo jurídico operado e à necessária aplicabilidade do cumprimento de pena efectiva em permanência na habitação, o Tribunal de Recurso segue o entendimento propugnado, designadamente, nos seguintes arestos:
Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça, proferido em 3/12/20, pela 5ª Secção, no âmbito do Processo 565/19.3PBTMR.E1.S1, em que foi relatora Margarida Blasco, consultável em www.dgsi.pt:
“I - Nos termos do art. 40.º, do CP, que dispõe sobre as finalidades das penas, a aplicação de penas e de medidas de ... visa a protecção de bens jurídicos e a reintegração do agente na sociedade e em caso algum a pena pode ultrapassar a medida da culpa, devendo a sua determinação ser feita em função da culpa do agente e das exigências de prevenção, de acordo com o disposto no art. 71.º, do mesmo diploma.
Como se tem reiteradamente afirmado, encontra este regime os seus fundamentos no art. 18.º, n.º 2, da CRP, segundo o qual a lei só pode restringir os direitos, liberdades e garantias nos casos expressamente previstos na Constituição, devendo as restrições limitar-se ao necessário para salvaguardar outros direitos ou interesses constitucionalmente protegidos. A restrição do direito à liberdade, por aplicação de uma pena (art. 27.º, n.º 2, da CRP), submete-se, assim, tal como a sua previsão legal, ao princípio da proporcionalidade ou da proibição do excesso, que se desdobra nos subprincípios da necessidade ou indispensabilidade – segundo o qual a pena privativa da liberdade se há-de revelar necessária aos fins visados, que não podem ser realizados por outros meios menos onerosos, – adequação – que implica que a pena deva ser o meio idóneo e adequado para a obtenção desses fins – e da proporcionalidade em sentido estrito – de acordo com o qual a pena deve ser encontrada na justa medida, impedindo-se, deste modo, que possa ser desproporcionada ou excessiva.
A projecção destes princípios no modelo de determinação da pena justifica-se pelas necessidades de protecção dos bens jurídicos tutelados pelas normas incriminadoras violadas (finalidade de prevenção geral) e de ressocialização (finalidade de prevenção especial), em conformidade com um critério de proporcionalidade entre a gravidade da pena e a gravidade do facto praticado, avaliada, em concreto, por factores ou circunstâncias relacionadas com este e com a personalidade do agente, relevantes para avaliar da medida da pena da culpa e da medida da pena preventiva que, não fazendo parte do tipo de crime (proibição da dupla valoração), deponham a favor do agente ou contra ele (arts. 40.º, e n.º 1, do 71.º, do CP).
A medida da gravidade da culpa há que, de acordo com o art. 71.º, n.º 2, do CP considerar os factores reveladores da censurabilidade manifestada no facto, nomeadamente os factores capazes de fornecer a medida da gravidade do tipo de ilícito objectivo e subjectivo – indicados na al. a), primeira parte (grau de ilicitude do facto, modo de execução e gravidade das suas consequências), e na al. b) (intensidade do dolo ou da negligência) –, e os factores a que se referem a al. c) (sentimentos manifestados no cometimento do crime e fins ou motivos que o determinaram) e a al. a), parte final (grau de violação dos deveres impostos ao agente), bem como os factores atinentes ao agente, que têm que ver com a sua personalidade – factores indicados na al. d) (condições pessoais e situação económica do agente), na al. e) (conduta anterior e posterior ao facto) e na al. f) (falta de preparação para manter uma conduta lícita, manifestada no facto). Na consideração das exigências de prevenção, destacam-se as circunstâncias relevantes por via da prevenção geral, traduzida na necessidade de protecção do bem jurídico ofendido mediante a aplicação de uma pena proporcional à gravidade dos factos, reafirmando a manutenção da confiança da comunidade na norma violada, e de prevenção especial, que permitam fundamentar um juízo de prognose sobre o cometimento de novos crimes no futuro e assim avaliar das necessidades de socialização. Incluem-se aqui o comportamento anterior e posterior ao crime [al. e)], com destaque para os antecedentes criminais) e a falta de preparação para manter uma conduta lícita, manifestada no facto [al. f)]. O comportamento do agente, a que se referem as circunstâncias das als. e) e f), adquire particular relevo para determinação da medida da pena em vista das exigências de prevenção especial
II - O objecto do presente recurso – tal como definido pelo teor das conclusões que o recorrente extrai da respectiva motivação e que delimitam o objecto do recurso - cinge-se, unicamente, à apreciação da medida da pena aplicada que o recorrente considera excessiva, desproporcional e desajustada às finalidades da punição, tendo o Tribunal “a quo” violado o disposto nos arts. 40.º e 71.º, ambos do CP, pugnando pela sua redução…”
Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça, proferido 25/05/16, pela 3ª Secção, no âmbito do Processo 101/14.8GBALD.C1.S1, em que foi relator Pires da Graça, consultável em www.dgsi.pt:
“I - O art. 71.º, do CP estabelece o critério da determinação da medida concreta da pena, dispondo que a determinação da medida da pena, dentro dos limites definidos na lei é feita em função da culpa do agente e das exigências de prevenção.
II - A decisão recorrida descreve os factos necessários à decisão da acusa, incluindo, factos sobre a personalidade do arguido e a sua vida pregressa, sendo que a decisão recorrida pronunciou-se sobre os factores alegados pelo recorrente. Ou seja, o recorrente não indica qualquer outra circunstância a que o tribunal devesse ter atendido. Mais, as penas parcelares aplicadas (4 anos de prisão pela prática de 1 crime de roubo qualificado, 3 meses de prisão pela prática de 1 crime de violação de domicílio, 2 anos e 6 meses de prisão pela prática de 1 crime de roubo e 1 ano e 6 meses de prisão pela prática de 1 crime de roubo na forma tentada) não se revelam desadequadas, nem desproporcionais, atentas as fortes exigências de prevenção geral e especial e a intensidade da culpa.
III - É o conjunto dos factos que fornece a gravidade do ilícito global perpetrado, sendo decisiva para a sua avaliação a conexão e o tipo de conexão que entre os factos concorrentes se verifique. A determinação da pena do cúmulo exige, pois, um exame crítico de ponderação conjunta sobre a interligação entre os factos e a personalidade do condenado, de molde a poder valorar-se o ilícito global perpetrado.
IV - Valorando o ilícito global, na ponderação conjunta dos factos e personalidade do arguido, como determina o art. 77.º, n.º 1, do CP, tendo em conta a natureza e gravidade dos ilícitos, as fortes exigências de prevenção geral na defesa e restabelecimento das normas violadas, sendo forte a intensidade do dolo e da culpa, bem como as exigências de socialização, em que os factos praticados face à vida pregressa do arguido revelam tendência criminosa, não se revela desadequada a pena única de 5 anos e 10 meses de prisão aplicada pela 1.ª instância.”
Por outro lado, a respeito dos critérios de valoração das penas parcelares e da pena unitária, em casos como o presente, de concurso real de crimes, atemo-nos ao entendimento sufragado no aresto acabado de citar e aplicando ao caso concreto, temos presente o seguinte:
- Os factos em apreciação são graves;
- A arguida revela ter uma personalidade impulsiva e reativa, dedicando-se a estes expedientes enganosos, para obter enriquecimento à custa de terceiros;
- A arguida já regista anteriores contactos com o sistema de justiça, traduzidos em quinze condenações transitadas em julgado, conformes pontos 35 a 48 dos factos provados:
“35. Por sentença transitada em julgado em 14.11.2017 e proferida no âmbito do processo 482/16.9PLLRS, foi a arguida condenada na pena de 100 dias de multa, pela prática, em ........2016, de um crime de burla.
36. Por sentença transitada em julgado em 28.05.2020 e proferida no âmbito do processo 74/16.2GALSD, foi a arguida condenada na pena de 100 dias de multa, pela prática, em ........2016, de um crime de burla.
37. Por sentença transitada em julgado em 12.01.2021 e proferida no âmbito do processo 2392/19.9GBABF, foi a arguida condenada na pena de 200 dias de multa, pela prática, em ........2019, de um crime de burla.
38. Por sentença transitada em julgado em 31.03.2022 e proferida no âmbito do processo 450/20.6PCSNT, foi a arguida condenada na pena única de 1 ano e 6 meses de prisão suspensa na sua execução, pela prática, em ........2020, de dois crimes de burla.
39. Por sentença transitada em julgado em 21.06.2019 e proferida no âmbito do processo 193/16.5GFLLE, foi a arguida condenada na pena única de 220 dias de multa, pela prática, em 2016, de dois crimes de burla.
40. Por sentença transitada em julgado em 26.01.2021 e proferida no âmbito do processo 1367/19.2S5SLB, foi a arguida condenada na pena de 30 dias de multa, pela prática, em ........2019, de um crime de burla.
41. Por sentença transitada em julgado em 20.09.2021 e proferida no âmbito do processo 1275/19.7PFLRS, foi a arguida condenada na pena de 1 ano de prisão suspensa na sua execução, pela prática, em ........2019, de um crime de burla.
42. Por sentença transitada em julgado em 15.03.2022 e proferida no âmbito do processo 1326/19.5PBVCT, foi a arguida condenada na pena única de 220 dias de multa, pela prática, em .../...20, de dois crimes de burla.
43. Por sentença transitada em julgado em 02.11.2022 e proferida no âmbito do processo 93/21.7GAVCD, foi a arguida condenada na pena de 40 dias de multa, pela prática, em ........2021, de um crime de ameaça agravada.
44. Por sentença transitada em julgado em 23.03.2023 e proferida no âmbito do processo 804/19.0PAMGR, foi a arguida condenada na pena de 1 ano de prisão suspensa na sua execução, pela prática, em ........2019, de um crime de burla.
45. Por sentença transitada em julgado 10.02.2023 e proferida no âmbito do processo 116/20.7GEVCT, foi a arguida condenada na pena de 1 ano de prisão suspensa na sua execução, pela prática, em 05/2020, de um crime de burla.
46. Por sentença transitada em julgado 12.02.2024 e proferida no âmbito do processo 96/20.9GDSTB, foi a arguida condenada na pena de 1 ano e 3 meses de prisão suspensa na sua execução por dois anos, pela prática, em 01/2020, de um crime de burla.
47. Por sentença transitada em julgado 22.02.2024 e proferida no âmbito do processo 222/21.0PCMTS, foi a arguida condenada na pena de 2 anos e 7 meses de prisão suspensa na sua execução, pela prática, em ........2021, de um crime de burla qualificada.
48. Por acórdão transitado em julgado 14.03.2024 e proferida no âmbito do processo 4797/20.3JAPRT, foi a arguida condenada na pena única de 2 anos de prisão suspensa na sua execução por 3 anos, pela prática, em ........2020, de dois crimes de burla qualificada.”
A arguida demonstra propensão para a assunção de comportamentos ilícitos, quer ao nível de crimes contra o património, quer ao nível de crimes contra a integridade física, no caso do crime de ameaça.
Como se constacta supra a arguida foi condenada, por várias vezes, em penas de prisão cuja execução lhe foi declarada suspensa.
Sopesando aquele critério que define como limite máximo a soma das penas parcelares de prisão, temos que o limite máximo é de nove meses de prisão e € 1.100 euros de pena de multa, sendo o limite mínimo de nove meses de prisão, pelo que, considerados em conjunto os factos e a personalidade da arguida, reputam-se ajustadas as penas aplicadas.
A arguida veio, ainda, pugnar pela inconstitucionalidade da interpretação normativa do artigo 44º do CP, por não ter sido acolhida, na decisão recorrida, a aplicação do regime de permanência na habitação enquanto pena “substitutiva” à pena de prisão, afirmando que tal interpretação viola as garantias de defesa consagradas no artigo 32º e 205º da CRP.
Sobre esta matéria da natureza das sanções a aplicar e dosimetria, este Tribunal de Recurso já tem afirmado um entendimento, consequente e perene.
Escrevia CESARE BECARIA – Dos delitos e das Penas, tradução de JOSÉ DE FARIA COSTA, Serviço de Educação, Fundação Calouste Gulbenkian, p. 38, sobre a necessidade da pena que “Toda a pena que não deriva da absoluta necessidade – diz o grande Montesquieu – é tirânica.” (II); - embora as penas produzam um bem, elas nem sempre são justas, porque, para isso, devem ser necessárias, e uma injustiça útil não pode ser tolerada pelo legislador que quer fechar todas as portas à vigilante tirania...” (XXV)
Mas, como ensinava EDUARDO CORREIA, Para Uma Nova Justiça Penal, Ciclo de Conferências no Conselho Distrital do Porto da Ordem dos Advogados, Livraria Almedina, Coimbra, p. 16, “Ao contrário do que pretendia Beccaria, uma violação ou perigo de violação de bens jurídicos não pode desprender-se das duas formas de imputação subjectiva, da responsabilidade, culpa ou censura, que lhe correspondem.
E neste domínio tem-se verificado uma evolução que seguramente não nos cabe aqui, nem é possível, desenvolver.
Essa solução está, de resto, ligada ao quadro que se vem tendo do homem, às necessidades da sociedade que o integra, aos fins das penas a que se adira e à solidariedade que se deve a todos, ainda que criminosos.”
Na lição de Figueiredo Dias (Direito Penal –Questões fundamentais – A doutrina geral do crime- Universidade de Coimbra – Faculdade de Direito, 1996, p. 121):
“1) Toda a pena serve finalidades exclusivas de prevenção, geral e especial. 2) A pena concreta é limitada, no seu máximo inultrapassável, pela medida da culpa. 3) dentro deste limite máximo ela é determinada no interior de uma moldura de prevenção geral de integração, cujo limite superior é oferecido pelo ponto óptimo de tutela dos bens jurídicos e cujo limite inferior é constituído pelas exigências mínimas de defesa do ordenamento jurídico. 4) Dentro desta moldura de prevenção geral de integração a medida da pena é encontrada em função de exigências de prevenção especial, em regra positiva ou de socialização, excepcionalmente negativa ou de intimidação ou ... individuais.”
Em termos jurídico-constitucionais, é a ideia de prevenção geral positiva ou de integração que dá corpo ao princípio da necessidade de pena.
As penas como instrumentos de prevenção geral são “instrumentos político-criminais destinados a actuar (psiquicamente) sobre a globalidade dos membros da comunidade, afastando-os da prática de crimes através das ameaças penais estatuídas pela lei, da realidade da aplicação judicial das penas e da efectividade da sua execução”, surgindo então a prevenção geral positiva ou de integração “como forma de que o Estado se serve para manter e reforçar a confiança da comunidade na validade e na força da vigência das suas normas de tutela de bens jurídicos e, assim, no ordenamento jurídico-penal; como instrumento por excelência destinado a revelar perante a comunidade a inquebrantabilidade da ordem jurídica, pese todas as suas violações que tenham tido lugar (idem, ibidem, p. 84)
A finalidade das penas integra o programa político-criminal legitimado pelo artigo 18º, nº 2 da CRP e que o legislador penal acolheu no artigo 40º do CP, estabelecendo o seu nº 1 que a aplicação das penas visa a protecção de bens jurídicos e a reintegração do agente na sociedade.
E determinando o nº 2 que, em caso algum, a pena pode ultrapassar a medida da culpa.
O ponto de partida das finalidades das penas com referência à tutela necessária dos bens jurídicos reclamada pelo caso concreto e com significado prospectivo, encontra-se nas exigências da prevenção geral positiva ou de integração, em que a finalidade primária da pena é o restabelecimento da paz jurídica comunitária posta em causa pelo comportamento criminal.
A moldura de prevenção, comporta ainda abaixo do ponto óptimo ideal outros em que a pressuposta tutela dos bens jurídicos “é ainda efectiva e consistente e onde portanto a pena pode ainda situar-se sem que perca a sua função primordial de tutela de bens jurídicos. Até se alcançar um limiar mínimo – chamado de defesa do ordenamento jurídico – abaixo do qual já não é comunitariamente suportável a fixação da pena sem se pôr irremediavelmente em causa a sua função tutelar de bens jurídicos.” (idem, ibidem, p. 117)
O ponto de chegada está nas exigências de prevenção especial, nomeadamente da prevenção especial positiva ou de socialização, ou, porventura a prevenção negativa relevando de advertência individual ou de ... ou inocuização, sendo que a função negativa da prevenção especial, se assume por excelência no âmbito das medidas de ....
Ensina o mesmo Ilustre Professor, As Consequências Jurídicas do Crime, §55, que “Só finalidades relativas de prevenção geral e especial, e não finalidades absolutas de retribuição e expiação, podem justificar a intervenção do sistema penal e conferir fundamento e sentido às suas reacções específicas. A prevenção geral assume, com isto, o primeiro lugar como finalidade da pena. Prevenção geral, porém, não como prevenção geral negativa, de intimidação do delinquente e de outros potenciais criminosos, mas como prevenção positiva ou de integração, isto é, de reforço da consciência jurídica comunitária e do seu sentimento de ... face à violação da norma ocorrida: em suma, como estabilização contrafáctica das expectativas comunitárias na validade e vigência da norma ‘infringida’”
Todavia em caso algum pode haver pena sem culpa ou acima da culpa (ultrapassar a medida da culpa), pois que o princípio da culpa, como salienta o mesmo Insigne Professor – ob. cit. § 56 -, “não vai buscar o seu fundamento axiológico a uma qualquer concepção retributiva da pena, antes sim ao princípio da inviolabilidade da dignidade pessoal. A culpa é condição necessária, mas não suficiente, da aplicação da pena; e é precisamente esta circunstância que permite uma correcta incidência da ideia de prevenção especial positiva ou de socialização.”
Ou, em síntese: A verdadeira função da culpa no sistema punitivo reside efectivamente numa incondicional proibição de excesso; a culpa não é fundamento de pena, mas constitui o seu limite inultrapassável: o limite inultrapassável de todas e quaisquer considerações ou exigências preventivas – sejam de prevenção geral positiva de integração ou antes negativa de intimidação, sejam de prevenção especial positiva de socialização ou antes negativa de ... ou de neutralização. A função da culpa, deste modo inscrita na vertente liberal do Estado de Direito, é por outras palavras, a de estabelecer o máximo de pena ainda compatível com as exigências de preservação da dignidade da pessoa e de garantia do livre desenvolvimento da sua personalidade nos quadros próprios de um Estado de Direito democrático. E a de, por esta via, constituir uma barreira intransponível ao intervencionismo punitivo estatal e um veto incondicional aos apetites abusivos que ele possa suscitar.”- v. FIGUEIREDO DIAS, Temas Básicos da Doutrina Penal, Coimbra Editora, 2001, p. 109 e ss.
O artigo 71º do CP estabelece o critério da determinação da medida concreta da pena, dispondo que a determinação da medida da pena, dentro dos limites definidos na lei é feita em função da culpa do agente e das exigências de prevenção.
Por sua vez, o nº 2 do mesmo artigo do CP, estabelece, que:
Na determinação concreta da pena o tribunal atende a todas as circunstâncias que não fazendo parte do tipo de crime, depuserem a favor do agente ou, contra ele, considerando nomeadamente:
a) O grau de ilicitude do facto, o modo de execução deste e a gravidade das suas consequências, bem como o grau de violação dos deveres impostos ao agente;
b) A intensidade do dolo ou da negligência:
c) Os sentimentos manifestados no cometimento do crime e os fins ou motivos que o determinaram;
d) As condições pessoais do agente e a sua situação
e) A conduta anterior ao facto e a posterior a este, especialmente quando esta seja destinada a reparar as consequências do crime;
f) A falta de preparação para manter uma conduta lícita, manifestada no facto, quando essa falta deva ser censurada através da aplicação da pena.
As circunstâncias e critérios do artigo 71º do CP devem contribuir tanto para co-determinar a medida adequada à finalidade de prevenção geral (a natureza e o grau de ilicitude do facto impõe maior ou menor conteúdo de prevenção geral, conforme tenham provocado maior ou menor sentimento comunitário de afectação dos valores), como para definir o nível e a premência das exigências de prevenção especial (as circunstâncias pessoais do agente, a idade, a confissão, o arrependimento), ao mesmo tempo que também transmitem indicações externas e objectivas para apreciar e avaliar a culpa do agente.
As imposições de prevenção geral devem, pois, ser determinantes na fixação da medida das penas, em função de reafirmação da validade das normas e dos valores que protegem, para fortalecer as bases da coesão comunitária e para aquietação dos sentimentos afectados na perturbação difusa dos pressupostos em que assenta a normalidade da vivência do quotidiano.
Porém tais valores determinantes têm de ser coordenados, em concordância prática, com outras exigências, quer de prevenção especial de reincidência, quer para confrontar alguma responsabilidade comunitária no reencaminhamento para o direito do agente do facto, reintroduzindo o sentimento de pertença na vivência social e no respeito pela essencialidade dos valores afectados.
Todos estão hoje de acordo em que é susceptível de revista a correcção do procedimento ou das operações de determinação, o desconhecimento pelo tribunal ou a errónea aplicação dos princípios gerais de determinação, a falta de indicação de factores relevantes para aquela, ou, pelo contrário, a indicação de factores que devam considerar-se irrelevantes ou inadmissíveis. Não falta, todavia, quem sustente que a valoração judicial das questões de justiça ou de oportunidade estariam subtraídas ao controlo do tribunal de revista, enquanto outros distinguem: a questão do limite ou da moldura da culpa estaria plenamente sujeita a revista, assim como a forma de actuação dos fins das penas no quadro da prevenção, mas já não a determinação, dentro daqueles parâmetros, do quantum exacto de pena, para controlo do qual o recurso de revista seria inadequado. Só não será assim, e aquela medida será controlável mesmo em revista, se, v.g., tiverem sido violadas regras da experiência ou se a quantificação se revelar de todo desproporcionada. (Figueiredo Dias, Direito Penal Português -As consequências Jurídicas do Crime, Aequitas, Editorial Notícias, 1993, § 278, p. 211, e Ac. de 15-11-2006 deste Supremo, Proc. n.º 2555/06- 3ª)
Perscrutando as penas parcelares, verifica-se que, como fundamenta a sentença recorrida, tais penas se mostram claramente adequadas e proporcionais aos critérios estabelecidos e que fizemos alusão.
Tendo presente as circunstâncias em que os factos ocorreram, os antecedentes criminais da arguida, a reiteração das condutas, entende este Tribunal de Recurso que não é possível formular um juízo de prognose favorável no sentido de considerar que a simples censura do facto e a ameaça da pena, serão suficientes para afastar a arguida da criminalidade.
Na verdade, os Tribunais já condenaram a arguida em várias penas de prisão cuja execução declaram suspensa, por “acreditarem” que a arguida tomaria outro caminho, mas tais suspensões não se relevaram eficazes e aptas a dissuadi-la da prática de condutas desconformes ao direito e censuráveis penalmente.
Este Tribunal de Recurso, acolhe o entendimento propugnado por este Tribunal, proferido a 9/02/2023, no âmbito do Processo 80/21.5PCLRS.L1-9, em que foi Relatora a Desembargadora Renata Whytton da Terra:
“1.–As finalidades que estão na base da suspensão da execução da pena de prisão consistem, no essencial, na reintegração plena do agente na sociedade através de um comportamento responsável e sem praticar crimes. Subjacente à suspensão da execução da pena de prisão está sempre um juízo de prognose favorável, traduzido numa expectativa fundada, mas assente num compromisso responsável com o condenado, de que a mera censura do facto e a ameaça da prisão sejam bastantes para que não sejam cometidos novos crimes.
2.–O juízo de prognose favorável reporta-se ao momento em que a decisão é tomada e pressupõe a valoração conjunta de todos os elementos que tornam possível uma conclusão sobre a conduta futura do arguido.
3.–A aplicação de uma pena de substituição não é uma faculdade discricionária do tribunal, mas, pelo contrário, constitui um verdadeiro poder/dever, sendo concedida ou denegada no exercício de um poder vinculado.
4.–Na jurisprudência, tanto no Tribunal Constitucional como no Supremo Tribunal de Justiça, foi defendida a necessidade de fundamentação, face à versão anterior, justificando-se de pleno a mesma posição face à nova lei, em que apenas foi alterado o pressuposto formal passando do limite de 3 para 5 anos de prisão.
5.–A caracterização da suspensão da execução da pena de prisão como um poder vinculado conduz à necessidade de fundamentação da decisão que a aplica, ou a desconsidera, incorrendo em nulidade a decisão que não contemple tal injunção, de conhecimento oficioso, nos termos do art.º 379.º, n.ºs 1, al. c) e 2, do Código de Processo Penal.
6.–A conjunção de necessidades de prevenção geral face ao bem jurídico lesado e cuja validade da norma que o protege tem de ser reafirmada, com outras de prevenção especial que as qualidades da personalidade do arguido infirmam, não permitem preencher o juízo de prognose favorável quanto à sua capacidade para não voltar a delinquir.” – consultável em www.dgsi.pt
A arguida não altera o seu comportamento, vivendo de expedientes que, astuciosamente, engenha, por forma a induzir terceiros em erro e, locupletar-se com valores monetários, que consiga obter através daqueles enganos.
Não há qualquer dimensão de inconstitucionalidade na interpretação de que a pena privativa da liberdade aplicada por um dos crimes de burla, deva ou tenha de ser cumprida em permanência na habitação, atribuindo-se a essa permanência o carater de pena substitutiva da prisão.
Perante tudo isto, o recurso deve improceder nas aludidas dimensões.

Dispositivo:
Por todo o exposto, acordam os Juízes que compõem a 3ª Secção do Tribunal da Relação de Lisboa, julgar totalmente não provido o recurso e, consequentemente, mantendo-se a sentença recorrida.
Custas pela recorrente, fixando-se a taxa de justiça em 3 UC.
Acórdão elaborado pelo Primeiro signatário em processador de texto que reviu integralmente, sendo assinado pelo próprio e pelas Desembargadoras Adjuntas.

Lisboa, 7de Maio de 2025
Carlos Alexandre
Ana Guerreiro da Silva
Cristina Isabel Henriques