Acórdão do Tribunal da Relação de Guimarães | |||
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| Relator: | JOSÉ CARLOS PEREIRA DUARTE | ||
| Descritores: | REAPRECIAÇÃO DA MATÉRIA DE FACTO PRINCÍPIO DA ECONOMIA E CELERIDADE PROCESSUAIS FACTOS IRRELEVANTES LEGITIMIDADE SUBSTANTIVA AMPLIAÇÃO DOS TEMAS DA PROVA | ||
| Nº do Documento: | RG | ||
| Data do Acordão: | 09/25/2025 | ||
| Votação: | UNANIMIDADE | ||
| Texto Integral: | S | ||
| Meio Processual: | APELAÇÃO | ||
| Decisão: | APELAÇÃO PROCEDENTE | ||
| Indicações Eventuais: | 1ª SECÇÃO CÍVEL | ||
| Sumário: | I - Uma vez que está vedado ao tribunal ad quem a prática de actos inúteis, não há lugar à reapreciação da decisão de facto se os factos objecto da impugnação, atentas as circunstâncias do caso e as várias soluções plausíveis de direito, mesmo que demonstrados são insusceptíveis de alterar a decisão de mérito no quadro das soluções plausíveis da questão de direito. II - A legitimidade substantiva traduz-se na constatação de que a parte tem na relação material controvertida, tal como ela é na realidade, uma posição que lhe permite o exercício de determinados direitos. III - Uma das fontes da legitimidade substantiva é a celebração de um contrato, o qual resulta da conjugação de duas declarações de vontade: uma proposta tendente à produção de determinados efeitos jurídicos, por um lado; uma resposta concordante com a proposta, ou seja, a aceitação dessa proposta, por outro. IV – O pagamento do preço é um efeito da celebração do contrato e não um elemento da respectiva celebração, podendo ser cumprido por terceiro. V – Numa situação em que o tribunal a quo julgou a acção improcedente por ter considerada a autora parte ilegítima substantivamente, não tendo por efeito disso conhecido dos pedidos formulados, não é possível ao tribunal ad quem conhecer de tais pedidos se não estiverem reunidos todos os elementos de facto para tal, sendo necessária a ampliação dos temas da prova. | ||
| Decisão Texto Integral: | ACORDAM OS JUÍZES DA 1ª SECÇÃO CÍVEL DO TRIBUNAL DA RELAÇÃO DE GUIMARÃES 1. Relatório EMP01... Unipessoal, Ldª intentou acção declarativa contra EMP02..., Ldª pedindo que seja: a) declarado que o material fornecido pela Ré à Autora era desconforme e apresentava defeitos; b) declarado que o material destinado à nova pavimentação c) a Ré condenada a pagar à Autora o montante de 3.500,00€, a título de indemnização pelos danos causados com a substituição dos materiais. Alegou, para tanto e em síntese: que se dedica, entre outras, à actividade de construção de edifícios; que a Ré dedica-se à venda a retalho de materiais de construção. Alegou, ainda, que: a A., no âmbito da sua actividade, celebrou com EMP03... Ldª um contrato de empreitada, do tipo “chave na mão”, que tinha por objecto a construção de uma moradia unifamiliar; a A. ficou responsável pela aquisição da totalidade dos materiais necessários à execução dos trabalhos, entre os quais os pavimentos, previamente escolhidos pela dona da obra; para isso, no início de 2021, a A. dirigiu-se às instalações da Ré e aí procedeu à encomenda dos materiais que identifica; a A. combinou com a Ré que o material adquirido fosse facturado directamente à dona da obra, o que foi comunicado à mesma, que procedeu ao pagamento nos termos das instruções que a A. lhe transmitiu e descontou no preço final; o material em referência destinava-se à pavimentação de uma sala de estar e cozinha; o material referido foi levantado pela A. nas instalações da Ré, em Agosto ou setembro de 2021. Mais alegou que a A. aplicou o material no mesmo período temporal - Agosto ou setembro de 2021 – respeitando todas as indicações do manual de instalação que acompanhava o pavimento, assegurando as folgas perimetrais, juntas de dilatação e demais recomendações; o flutuante aplicado no pavimento começou a levantar e a deformar-se; de imediato a A. denunciou à Ré os defeitos no pavimento; a Ré aceitou o defeito do material fornecido à A.; a Ré denunciou os defeitos ao fabricante que enviou um técnico que concluiu que era necessário o seu levantamento e substituição, por não ser possível o seu aproveitamento; a Ré já não dispunha de material idêntico para substituir o material com defeito, pelo que a única solução era substituir a totalidade do pavimento; a Ré forneceu-lhe novo material, a título de substituição, que faturou à dona da obra e a quem reclama o seu pagamento, no valor de € 5.318,55; a colocação do novo material causou um prejuízo de € 3.500,00 a titulo de mão de obra necessária para a realização daquela. A Ré, citada, contestou, invocando a ilegitimidade substantiva da A., dizendo para tanto que a Ré forneceu o material à EMP03..., Ldª, contra quem intentou um procedimento de injunção por falta de pagamento do preço daquele; a Ré foi contactada pela dona da obra para fornecimento do pavimento flutuante; não foi estabelecida qualquer relação comercial relativa ao material em discussão com a A. Invocou também a excepção de litispendência. E invocou, ainda, que, perante a reclamação do dono da obra relativa ao material fornecido, a Ré “demandou” o fabricante, o qual mandou pessoa idónea à obra, que elaborou um relatório e concluiu que as deformações verificadas não resultam de qualquer inconformidade do pavimento, não sendo passíveis de reclamação; o pavimento foi aplicado à margem das instruções, pelo que nenhuma responsabilidade pode ser assacada da Ré; verificado que a responsabilidade é única e exclusiva do aplicador do material, o dono da obra decidiu encomendar material para substituir o mesmo, tendo a Ré fornecido o material. A A. respondeu às excepções. Foi designada para a realização de tentativa de conciliação, a qual teve lugar, sem sucesso. Foi proferida decisão, que relegou para final o conhecimento da ilegitimidade substantiva da A. e julgou improcedente a excepção de litispendência. Foi proferido despacho saneador que julgou tabelarmente verificados os pressupostos processuais, despacho a identificar o objecto do litígio e a enunciar os temas da prova e despacho quanto às provas. Os temas da prova enunciados foram os seguintes: Temas de Prova: . material de pavimentação em causa nos autos – termos do fornecimento, intervenientes na aquisição e entrega do material em causa; . defeitos do material de pavimentação fornecido, necessidade de substituição; . danos referentes à substituição. Foi designada data para audiência final, a qual se realizou, tendo sido proferida sentença cujo decisório tem o seguinte teor: “Face ao exposto, e ao abrigo das disposições legais citadas, decide-se julgar totalmente improcedente a presente ação e, consequentemente absolver a Ré dos pedidos. Mais se decide condenar em custas a Autora.” A A. interpôs recurso, pedindo a revogação da sentença e a sua substituição por acórdão em conformidade com as alegações formuladas, tendo terminado com as seguintes conclusões: [1] 1. O Tribunal “a quo” deu como não provados factos para os quais, no entendimento do Recorrente, há suporte probatório e como tal, deverão ser considerados como provados. 2. Para formar a sua convicção o tribunal alicerçou-se na análise da prova documental junta aos autos e da prova testemunhal produzida na audiência de julgamento. 3. Com efeito no ponto h) da matéria dada como não provada: A Autora aplicou o material respeitando todas as indicações do manual de instalação que acompanhava o pavimento, assegurando as folgas perimetrais, juntas de dilatação e demais recomendações. 4. Salvo devido e merecido respeito, entende a Recorrente que foi produzida prova para suportar o facto dado como não provado no ponto h). 5. Entende a Recorrente que o facto dado como não provado na alínea h), deveria constar da matéria dada como provada, nomeadamente, pelas declarações de AA e BB, que prestaram serviços para a Recorrente, no que concerne à colocação do pavimento vinílico. 6. A testemunha AA revelou ao Tribunal, assentar pavimento há mais e trinta anos. 7. Tendo dito também, que presta serviços à Recorrente e, que nesta altura, além da moradia onde se discute o presente litígio, foi o responsável pela pavimentação das restantes moradias, construídas subjacente àquela. 8. Afirmou a testemunha de forma clara, precisa e segura confirmou ao Tribunal a quo, que todas as indicações do fabricante foram respeitadas na colocação do pavimento. 9. Referiu que o pavimento tendo em conta a especificação do que se podia ler na embalagem, não poderia, como sucedeu ter-se “movimentado”, tanto mais, que sendo vinílico, não deveria ser sensível à água como é, por exemplo, o MDF ou a madeira. 10. Pormenorizou ainda, que além do respeito pelas folgas recomendadas, foram ainda efetuados os testes para aferir da humidade, os quais apresentam valores ainda mais abaixo, do que se consideram aptos para iniciar a pavimentação. 11. De resto, esta testemunha de forma objetiva disse ao Tribunal, que o pavimento “não cresceu” nos rodapés, que mantiveram as juntas – o que se verificou ao remover o pavimento - mas sim entre os encaixes entre as réguas, evidenciando-se com a “claridade”. 12. Referiu ainda esta testemunha, que o pavimento fornecido pela Recorrida, teve de ser substituído não uma, mas duas vezes. 13. Neste sentido, foi também o depoimento da testemunha BB, que confirmou igualmente ao Tribunal, que todas as recomendações da marca foram cumpridas, como aliás “são sempre”. 14. Que se asseguraram as folgas, o que se verificou aliás quando se levantou o rodapé (“havia um centímetro e meio, dois de folga”). 15. De resto, situou os problemas na “segunda moradia”, após ter afirmado ter acompanhado as obras todas, isto é, todas as moradias. 16. Foi apenas e só nesta moradia, e por referência a este material, que houve problemas com a pavimentação. 17. Em todas as moradias, foi colocado o mesmo tipo de material, aplicado pelos mesmos trabalhadores, e cumprindo os mesmos requisitos. 18. Pelas regras da experiência, tendo e consideração que no processo de pavimentação, o único elemento que difere é exatamente o material a colocar, dado que todas as outras circunstâncias não se alteram, é de concluir que o defeito apenas poderá estar no pavimento vinílico que foi colocado. 19. Circunstância este que o Tribunal a quo deveria ter valorado e tido em consideração, aquando da apreciação destes factos, e que erroneamente no entendimento da Recorrente, não o fez. 20. A Recorrente logrou fazer prova da existência dos defeitos que alega. 21. A Recorrente fez prova clara, nomeadamente, através do depoimento das testemunhas AA e BB, que todos os procedimentos necessários à colocação do pavimento foram respeitados, e como tal, por exclusão de hipóteses, a desconformidade resulta apenas e só de defeitos intrínseco do próprio material, que revelou não comportar as caraterísticas, anunciadas pelo próprio fabricante. 22. Assim, por tudo o quanto exposto, atendendo à prova produzida nos presentes autos, deve ser alterada a matéria de facto dada como não provada, alterando-se o facto h) para a matéria de facto dada como provada. 23. Também para o ponto a) da matéria de facto dada como não provada, entende a Recorrente existir suporte probatório suficiente, para que passe a vigorar como facto dado como provado, desde logo porque a não o ser, está em clara contradição, com o ponto 3 da matéria dada como provada. 24. O Tribunal a quo, deu como provado a existência entre a Recorrente e a empresa EMP03..., LDA., da celebração de um contrato de empreitada do tipo “chave na mão”. 25. É comumente reconhecido, pela generalidade das pessoas, que este tipo de contrato, carateriza-se substancialmente, pelo facto de o empreiteiro assumir a responsabilidade em termos totais pela construção. 26. O que passa desde logo, com a aquisição de todos os materiais e, de por si ou por terceiros, realizar a construção e todo o tipo de especialidades (carpintaria, eletricidade, pichelaria), que sejam necessárias. 27. Cabe ao próprio empreiteiro, neste tipo de contrato, determinar o tipo de materiais a aplicar, negociar preços, fixar prazos de conclusão e condições de pagamento, o que faz diretamente com os eventuais terceiros e sem intervenção do dono da obra. 28. No final, o resultado da execução deste tipo de contrato “chave na mão” é a entrega ao dono da obra, de uma casa totalmente terminada, apta para habitação imediata. 29. Razão pela qual, é completamente contra-senso, que o Tribunal venha por um lado dar como provado a celebração de um contrato de compra e venda do tipo “chave na mão”, e por outro venha negar, uma parte essencial que caracteriza este tipo de negócio: a adquirição de todo o material pela Recorrente. 30. Pelo exposto, entende a Recorrente que deveria o Tribunal a quo, dar como provado o facto constante da alínea a), porquanto o mesmo mais não é do que uma condição, à afirmação do facto dado como provado no ponto n.º 3 da matéria de facto dada como provada na sentença a quo. 31. Como resulta dos factos provados a Recorrente celebrou um contrato de empreitada, do tipo “entrega/chave na mão”, com a empresa EMP03..., LDA., para a construção da de uma casa unifamiliar a ser implantada no prédio inscrito na matriz predial urbana da freguesia ... sob o artigo ...02... e ...16º e descrito na Conservatória do Registo Predial ... sob o número ...13 e ...29, e que se encontra atualmente inscrita sob o número ...49º da freguesia ... – cfr. facto dado como provado 1. a 4. 32. Dos vários trabalhos contratados entre a Recorrente e a empresa EMP03..., estava previsto, entre outros, a colocação dos pavimentos. – cfr. facto dado como provado 5. 33. Para o efeito, no início de agosto de 2021, a Recorrente dirigiu-se às instalações da Recorrida e encomendou os materiais necessários para a execução dos trabalhos de pavimentação acordados com a empresa EMP03..., nomeadamente, FLUT. AKUA RIGID 2677 ARTIC 1220x181x 5,5 124 Caixas X 2,43m2. – cfr. facto dado como provado 6. a 8. 34. O material acima mencionado foi encomendado e levantado pela Recorrente, nas instalações da Recorrida, em agosto ou setembro de 2021. – cfr. facto dado como provado 10. 35. A Recorrente combinou com a Recorrida, que o material adquirido, fosse faturado diretamente ao dono da obra - a empresa EMP03..., LDA. cfr. facto dado como provado 9. 36. E após o levantamento do flutuante aplicado e da sua deformação, foi a Recorrente que se dirigiu ao estabelecimento comercial da Recorrida e lhe denunciou os defeitos do pavimento que havia adquirido semanas antes, tendo a Recorrida enviado um técnico responsável da marca ..., para verificar o pavimento. cfr. facto dado como provado 11 a 13. 37. Ainda assim, tendo em consideração os factos dados como provados nas alíneas 1. a 13. da sentença proferida em 1ª instância, o Tribunal a quo, decidiu pela ilegitimidade da Recorrente, decisão com a qual não pode a Recorrente conformar-se. 38. É indiscutível que a Recorrente encomendou e levantou e a Recorrida entregou o pavimento FLUT. AKUA RIGID 2677 ARTIC 1220x181x5,5 124 Caixas X 2,43m2, que consta da fatura, pelo que, desde logo lhe era devido o preço correspondente. 39. Contudo, não pode a Recorrente concordar com o Tribunal a quo, quanto ao “com quem foi celebrado o negócio em causa” e, por conseguinte, a quem cabe a legitimidade ativa, nos presentes autos. 40. Pelo Tribunal a quo, foi referido na sentença de qual se recorre que “como é evidente, tendo sido a faturação realizada em nome desta empresa, foi esta quem assumiu a obrigação de pagamento, e, consequentemente, apenas se deu como provado que a Autora encomendou, e não: adquiriu.” 41. Ora, ao referir que a Recorrente, apenas adquiriu e não comprou, o Tribunal a quo, retrata-a como uma representante no negócio. 42. Caraterizando a compra e venda dos presentes autos, como uma realização do negócio em nome do representado. 43. Sucede, que para tal é necessário que a contraparte saiba ou possa saber com quem negoceia, pois, a regra geral é a de que se negoceia em nome próprio. 44. Em segundo lugar, tem de existir uma declaração, mais ou menos expressiva, de uma vontade própria do representante e não apenas, de uma vontade de representado. 45. Além de que, todos os atos de representação devem ser executados dentro dos poderes que foram conferidos ao representante, isto é, deve haver legitimação representativa, pressuposto essencial de eficácia. 46. A fatura junta aos autos foi emitida em nome da empresa EMP03..., Lda., mas, por si só, ainda que conjugada com a circunstância de esta empresa ser também cliente da Recorrida, não permite concluir que esta é parte no contrato. 47. Acresce, que não existe qualquer outro elemento de onde se possa retirar que tenha sido a referida empresa EMP03..., Lda. a emitir a declaração de vontade nesse sentido, isto é, que tenha sido ela a fazer uma proposta de compra e que o bem tenha sido entregue em consequência da aceitação dessa proposta. 48. Pelo contrário, como aliás consta dos factos dados como provados a Recorrente “celebrou um contrato de empreitada, do tipo “entrega/chave na mão”, com a empresa EMP03..., LDA.” 49. Foram todos estes atos subjacentes ao contrato do tipo “chave na mão”, que a Recorrente levou a cabo, para a construção da casa unifamiliar a ser implantada no prédio inscrito na matriz predial urbana da freguesia ... sob o artigo ...02... e ...16º e descrito na Conservatória do Registo Predial ... sob o número ...13 e ...29, e que se encontra atualmente inscrita sob o número ...49º da freguesia .... 50. Nos presentes autos, nunca se poderá considerar que a Recorrente “atuou como um mero intermediário na negociação”, que apenas “encomendou”. 51. A Recorrente não fez a sua proposta por interposta pessoa, não atuou por nome de terceiros, nomeadamente, da empresa EMP03..., LDA. 52. A simples emissão da fatura em nome daquela, é manifestamente insuficiente, para se concluir que o negócio tivesse sido realizado por aquela, ainda que por “intermédio”, da aqui Recorrente. 53. Por outro lado, como já verificámos não se demonstra, nem tão pouco foi alegada, a existência de poderes de representação. 54. Não se provou que a empresa EMP03..., LDA. comprou qualquer pavimento à Recorrida. 55. A Recorrente encomendou e levantou o material encomendado, que se destinava aos trabalhos acordados no âmbito do acordo referido no facto 3, isto é, do contrato de empreitada do tipo “chave na mão”. 56. A emissão de fatura em nome da empresa EMP03..., LDA., com a indicação do n.º de identificação fiscal da mesma não constitui qualquer vinculação desta ao pagamento do preço do produto faturado, nem significa qualquer acordo ou aceitação da obrigação de pagamento do preço a que respeita a fatura emitida. 57. A faturação é uma operação unilateral efetuada pelo vendedor dos bens faturados e não traduz qualquer consenso ou acordo por parte da pessoa em nome de quem os bens são faturados 58. O pavimento FLUT. AKUA RIGID 2677 ARTIC 1220x181x 5,5 124 Caixas X 2,43m2, foi encomendado pela Recorrente, por si e no âmbito no contrato de empreitada “chave na mão”, que havia sido celebrado entre a Recorrente e a empresa EMP03..., Lda. 59. Assim, por tudo o quanto exposto, não deveria o Tribunal a quo, como fez, considerar a Recorrente parte ilegítima nos presentes autos. A Ré contra-alegou pugnando pela manutenção da decisão recorrida, tendo terminado as suas alegações com as seguintes conclusões: 1. Não resulta do depoimento das testemunhas AA e BB a existência dos defeitos. 2. Não há prova dos defeitos do pavimento. 3. Não foi requerida, nem efetuada perícia para sustentar a tese da Autora. 4. A ré forneceu material, mas em momento algum esteve na sua alçada e responsabilidade sobre aplicação do material. 5. Destarte, a ré accionou, pelo cumprimento dos deveres de boa fé o fornecedor do material que foi à obra e verificou, aliás como se encontra documentado nos autos a má aplicação do flutuante/pavimento. 6. O ônus da prova cabia à Autora que não logrou o fazer. 7. Vejamos ainda que, tanto que após relatório da marca entregue a 24.02.2023 o empreiteiro e dono da obra não promoveram qualquer contestação ao evidente! 8. Fizeram foi aquilo que bem lhes apeteceu, encomendaram novo material e não pagaram, fazendo por si até hoje um acerto de contas, que não é merecedor da tutela do direito, impondo-se sim o pagamento a quem de direito, a aqui ré. 9. Certo é que, o dono da obra constituiu-se na obrigação de pagamento do preço correspondente à aquisição do material. 10. A acção é demandada pela sociedade - empreiteiro que não tem relação com aqui Ré. 11. Existe ilegitimidade por parte da Autora. 12. Apesar de a Autora ser dotada de legitimidade ativa, pressuposto processual já considerado, pacificamente, verificado, em termos tabelares, existe falta de legitimidade substantiva, dada a manifesta falta do direito que pretende fazer valer e a manifesta inviabilidade das pretensões, por resultar dos autos se não ter gerado o dano na sua esfera jurídica, mas na de terceiro, nada podendo obter para si relativamente a reparação/indemnização relativa a imóvel alheio. 13. Determinando a absolvição da Ré. 14. Sendo claro que a presente acção não é mais do que uma “tentativa enviesada, de um eventual acerto de contas”! 15. Ademais, o recurso baseia-se tão só na versão da Autora que tem interesse na causa, não resultando de resto prova de facto para julgar a acção procedente, sem prejuízo da ilegitimidade da Autora. 2. Questões a apreciar O objecto do recurso é balizado pelo teor do requerimento de interposição (artº 635º nº 2 do CPC), pelas conclusões (art.ºs 608º n.º 2, 609º, 635º n.º 4, 637º n.º 2 e 639º n.ºs 1 e 2 do CPC), pelas questões suscitadas pelo recorrido nas contra-alegações em oposição àquelas, ou por ampliação (art.º 636º CPC) e sem embargo de eventual recurso subordinado (art.º 633º CPC) e ainda pelas questões de conhecimento oficioso, cuja apreciação ainda não se mostre precludida. O Tribunal ad quem não pode conhecer de questões novas (isto é, questões que não tenham sido objecto de apreciação na decisão recorrida), uma vez que “os recursos constituem mecanismos destinados a reapreciar decisões proferidas, e não a analisar questões novas, salvo quando… estas sejam do conhecimento oficioso e, além disso, o processo contenha elementos imprescindíveis” (cfr. António Abrantes Geraldes, in Recursos em Processo Civil, 7ª edição, Almedina, p. 139). Pela sua própria natureza, os recursos destinam-se à reapreciação de decisões judiciais prévias e à consequente alteração e/ou revogação, pelo que não é lícito invocar nos recursos questões que não tenham sido objecto de apreciação da decisão recorrida. Por outro lado, muito embora nos recursos também vigore o principio do dispositivo, a apreciação das questões suscitadas não está sujeita à ordem com que as mesmas são colocadas pelas partes, mas à precedência lógico-jurídica por devem ser apreciadas, o que resulta quer do disposto na 1ª parte do n.º 2 do art. 608º, nº 2 do CPC, aplicável ex vi art. 663º, n.º 2 também do CPC, ao dispor que o “juiz deve resolver todas as questões que as partes tenham submetido à sua apreciação, excetuadas aquelas cuja decisão esteja prejudicada pela solução dada a outras”, quer do principio da utilidade processual, plasmado no art.º 130º do CPC. As questões que cabe apreciar, de acordo com a sua precedência lógica, são três: - a matéria constante das alíneas a) e h) dos factos não provados deve ser considerada provada? - o tribunal a quo errou ao julgar a A. parte ilegítima do ponto de vista substantivo e, em consequência, ao absolver a Ré do pedido? - caso a questão anterior mereça resposta positiva e não tendo o tribunal a quo conhecido concretamente dos pedidos formulados pela A. em função da solução que deu ao litígio, este tribunal dispõe de todos os elementos necessários, nomeadamente de facto, para conhecer de tais pedidos? 3. Fundamentação de facto 3.1. O tribunal considerou: A. Factos provados: 1. A Autora dedica-se, como escopo lucrativo, à construção de edifícios residências e não residenciais; compra e venda de bens imobiliários. Outras atividades especializadas de construção, demolição, preparação de locais de construção, perfurações, construção de fundações, preparação de armações de ferro para construção no local da obra; instalações elétricas e canalizações, acabamentos de edifícios; aluguer de equipamento de construção e demolição sem operador, inclui o aluguer de andaimes e plataformas. 2. A Ré dedica-se, como escopo lucrativo, à venda a retalho de materiais de construção. 3. A Autora, no âmbito da sua atividade profissional, celebrou um contrato de empreitada, do tipo “entrega/chave na mão”, com a empresa EMP03..., LDA., sociedade por quotas de responsabilidade limitada, NIPC ...70, com sede na Avenida ..., ..., freguesia ..., concelho ..., 4. Que tinha como objeto a construção de uma casa unifamiliar a ser implantada no prédio inscrito na matriz predial urbana da freguesia ... sob o artigo ...02... e ...16º e descrito na Conservatória do Registo Predial ... sob o número ...13 e ...29, e que se encontra atualmente inscrita sob o número ...49º da freguesia .... 5. De entre os trabalhos contratados pela Autora, estava previsto, entre outros trabalhos, os pavimentos previamente escolhidos pelo dono da obra. 6. No início de agosto de 2021, a Autora dirigiu-se às instalações da Ré a fim de proceder à encomenda dos materiais necessários para a execução dos trabalhos de pavimentação. 7. A Autora procedeu à encomenda à Ré de FLUT. AKUA RIGID 2677 ARTIC 1220x181x 5,5 124 Caixas X 2,43m2. 8. O material encomendado pela Autora à Ré destinava-se aos trabalhos acordados no âmbito do acordo referido no facto 3. 9. A Autora combinou com a Ré que o material adquirido, fosse faturado diretamente ao dono da obra - a empresa EMP03..., LDA.. 10. O material em causa e descrito no facto 7, foi encomendado pela Autora e por si levantado, nas instalações da Ré, em agosto ou setembro de 2021. 11. O flutuante aplicado no pavimento começou a levantar, a deformar-se. 12. A Autora dirigiu-se ao estabelecimento comercial da Ré denunciando-lhe os defeitos do pavimento que lhe havia adquirido semanas antes. 13. A Ré denunciou a deformação do pavimento ao fabricante que enviou um técnico responsável da marca ..., para verificar o pavimento. 14. A Autora concluiu que era necessário o seu levantamento e substituição. 15. A Autora retirou todo o pavimento e voltou a repô-lo substituindo o material. 16. A Ré faturou diretamente ao dono da obra a quem reclama o seu pagamento, no valor total de 5.318,55€, o pavimento que substituiu. B. factos não provados: a. A Autora ficou responsável pela aquisição da totalidade dos materiais necessários à execução dos trabalhos. b. A forma de faturação acordada pela Autora e pela Ré foi transmitida ao dono da obra, que procedeu ao pagamento nos termos das instruções que a Autora lhe transmitiu e descontou no preço final da empreitada. c. Mais se fixou no contrato de empreitada celebrado que todo o material adquirido seria pago pela Autora – o empreiteiro. d. O material de pavimentação adquirido pela Autora à Ré foi com base nas boas referências do mesmo prestadas pelos funcionários da aqui Ré. e. Que se destinava à pavimentação de uma sala de estar e cozinha especificando a configuração e medidas dos compartimentos. f. E aplicado nesse mesmo período temporal (por referência ao facto 10). g. A Ré reconheceu o defeito do material fornecido à Autora. h. A Autora aplicou o material respeitando todas as indicações do manual de instalação que acompanhava o pavimento, assegurando as folgas perimetrais, juntas de dilatação e demais recomendações. i. A Ré já não dispunha de material idêntico para substituir o material com defeito pelo que a única solução era substituir a totalidade do pavimento. j. O tipo de pavimento utilizado pela Autora sofreu uma alteração na linha de fabrico, o que implicou a diferença no tipo de encaixe das peças. l. A colocação do pavimento com o novo material fornecido pela Ré à A. causou um prejuízo de €3.500 (três mil e quinhentos euros) a título de mão-de-obra necessária para a colocação do pavimento. m. Além de inúmeros incómodos e transtornos, teve de se justificar perante a dona da obra, com quem tinha celebrado um contrato de empreitada, e atrasou a entrega da obra. 3.2. Da inutilidade da reapreciação da decisão de facto quanto à matéria constante das alíneas a) e h) dos factos provados 3.2.1. Enquadramento jurídico Dispõe o art.º 130º do CPC que não é lícito realizar no processo actos inúteis. Tal normativo tem aplicação à reapreciação da matéria de facto: se a modificação dos pontos de facto impugnados não tiver a virtualidade de, segundo as diversas soluções plausíveis das várias questões de direito, conduzir, per se ou conjugados com outros factos, à alteração do julgado, não faz sentido proceder à sua reapreciação. Neste sentido o Ac. do STJ de 28/09/2023, processo 2509/16.5T8PRT.P1.S1, consultável in www.dgsi.pt/jstj, sumariou o seguinte: “Por força dos princípios da utilidade, economia e celeridade processual, o Tribunal ad quem não deve reapreciar a matéria de facto se entender que os concretos factos objecto da impugnação, atentas as circunstâncias do caso e as várias soluções plausíveis de direito, não têm relevância jurídica, sob pena de se levar a cabo uma actividade processual puramente gratuita ou diletante.” E anteriormente o Ac. do STJ de 17/05/2017, processo 4111/13.4TBBRG.G1.S1, consultável in www.dgsi.pt/jstj, afirmou: “Definido o processo jurisdicional, do ponto de vista estrutural, como uma sequência de actos jurídicos logicamente encadeados entre si, ordenados em fases sucessivas com vista à obtenção da providência judiciária requerida pelo autor (Castro Mendes, Manual de Processo Civil, 1963, pág. 7, e A. Varela, Miguel Bezerra e Sampaio e Nora, Manual de Processo Civil, 2ª ed.,1985, pág.11), cabe ao juiz, no âmbito da sua função de direcção e controlo do processo, obviar a que nele sejam produzidos ou produzir actos inúteis. O princípio da limitação de actos, consagrado no artigo 130º do Código de Processo Civil para os actos processuais em geral, proíbe a sua prática no processo – pelo juiz, pela secretaria e pelas partes – desde que não se revelem úteis para este alcançar o seu termo. Trata-se de uma das manifestações do princípio da economia processual, também aflorado, entre outros, no artigo 611º, que consagra a atendibilidade dos factos jurídicos supervenientes, e no artigo 608º n.º 2, quando prescreve que, embora deva resolver todas as questões que as partes tenham submetido à sua apreciação, o juiz não apreciará aquelas cuja decisão esteja prejudicada pela solução dada a outras. Nada impede que também no âmbito do conhecimento da impugnação da decisão fáctica seja observado tal princípio, se a análise da situação concreta em apreciação evidenciar, ponderadas as várias soluções plausíveis da questão de direito, que desse conhecimento não advirá qualquer elemento factual, cuja relevância se projecte na decisão de mérito a proferir. Com efeito, aos tribunais cabe dar resposta às questões que tenham, directa ou indirectamente, repercussão na decisão que aprecia a providência judiciária requerida pela(s) parte(s) e não a outras que, no contexto, se apresentem como irrelevantes e, nessa medida, inúteis. Para se aferir da utilidade da apreciação da impugnação da decisão fáctica importa considerar se os pontos de facto questionados se não apresentam de todo irrelevantes, se a eventual demonstração dos mesmos é susceptível de gerar um juízo diferente sobre a questão de direito, se é passível de influenciar e, porventura, alterar a decisão de mérito no quadro das soluções plausíveis da questão de direito.” 3.2.2. Em concreto As alíneas a) e h) dos factos não provados tem o seguinte teor: a. A Autora ficou responsável pela aquisição da totalidade dos materiais necessários à execução dos trabalhos. h. A Autora aplicou o material respeitando todas as indicações do manual de instalação que acompanhava o pavimento, assegurando as folgas perimetrais, juntas de dilatação e demais recomendações. Como decorre dos pedidos e da causa de pedir, o objecto do litígio é saber se: - a A. celebrou um contrato de compra e venda de material referido no ponto 7 dos factos provados - FLUT. AKUA RIGID 2677 ARTIC 1220x181x 5,5 124 Caixas X 2,43m2 – e que os autos revelam tratar-se de um pavimento flutuante; - esse material padecia de defeito, já que após a sua aplicação começou a levantar e a deformar-se (objecto do primeiro pedido); - se em função disso, tendo a Ré fornecido novo material de substituição, o respectivo custo é imputável à mesma (objecto do segundo pedido). Neste quadro, o facto referido em a) e que se reporta à relação da A. com o terceiro com quem celebrou um contrato de empreitada (cfr. ponto 3 dos factos provados) é irrelevante, no sentido em que, mesmo que fique provado, em nada releva para decidir da procedência ou improcedência dos pedidos referidos. Quanto ao facto referido em h), importa começar por afirmar que cabe ao autor da acção/comprador alegar e provar os factos constitutivos do seu direito: a celebração do contrato de compra e venda de determinada coisa e que a mesma apresenta defeito; e ao réu cabe alegar e provar os factos impeditivos, modificativos ou extintivos desse direito. A A. alegou a celebração de um contrato de compra e venda de um pavimento flutuante e que o mesmo apresentou defeito – tendo aplicado, o pavimento começou a levantar, a deformar-se. Neste quadro, não cabia à A. provar que “aplicou o material….assegurando as folgas perimetrais, juntas de dilatação… (a parte em que se diz “respeitando todas as indicações do manual de instalação que acompanhava o pavimento” e a parte final em que se diz “e demais recomendações”, são conclusivas) por não ser um facto constitutivo do seu direito. Cabia, sim, à Ré provar a factualidade impeditiva que alegou no art.º 30º da contestação: a “deformação do pavimento, com réguas concavas e encaixes sobre elevados, denunciando terem sido submetidas a pressão periférica por inexistente ou insuficiente folga para dilatação e/ ou por choque térmico por eventual humidade na betonilha. – Ausência de folgas perimetrais. – pés niveladores dos módulos de cozinha sobre o pavimento. – pavimento aplicado sobre betonilha sem regularização.” Neste quadro a matéria referida na alínea h) também não é relevante para a decisão da causa. Em face do exposto, não se procede à apreciação da impugnação das alíneas a) e h) dos factos não provados por não terem utilidade para a boa decisão da causa. 4. Fundamentação de direito 4.1. O tribunal a quo errou ao julgar a A. parte ilegítima do ponto de vista substantivo e, em consequência, ao absolver a Ré do pedido? Castro Mendes in Teoria Geral do Direito Civil, vol. I, pág. 88 definia legitimidade como «susceptibilidade ou insusceptibilidade de certa pessoa exercer um direito ou cumprir uma obrigação, resultante, não das qualidades ou situação jurídica da pessoa, mas das relações entre ela e o direito ou obrigação em causa». Carvalho Fernandes in Teoria Geral do direito Civil, I, 6ª edição, pág. 144-145 segue de perto a referida definição: “Assim, por legitimidade deve entender-se a susceptibilidade de certa pessoa exercer um direito ou cumprir uma vinculação resultante de uma relação existente entre essa pessoa e o direito ou a vinculação em causa.” Perante um exercício jurídico, concretamente perante a invocação de determinados direitos para sustentar a dedução de determinadas pretensões num processo judicial, a final e na apreciação do mérito da relação material controvertida como ela resulta dos factos provados, poderá haver necessidade, nomeadamente por isso ser controvertido, de aferir se o sujeito que se apresenta a agir está efectivamente e perante o direito material em posição de exercer tais direitos (independentemente de saber, em momento posterior, se à luz do direito aplicável as concretas pretensões deduzidas devem ou não ser julgadas procedentes, podendo acontecer não o poderem ser por estarem prescritas ou terem caducado ou deverem ser paralisadas por o autor agir em abuso de direito). Neste sentido, a legitimidade substantiva traduz-se na constatação de que a parte tem na relação material controvertida, tal como ela é na realidade, uma posição que lhe permite o exercício de determinados direitos. Deste modo, a legitimidade substantiva é uma condição de procedência do pedido. E a sua falta determina a absolvição do pedido. Uma das fontes da legitimidade substantiva é a celebração de um contrato, pois dele emergem determinados direitos e deveres para as partes, bem como do seu incumprimento – mora, incumprimento definitivo ou cumprimento defeituoso. Assim, se alguém pretende exercer o direito de anulação de um contrato por erro, o mesmo só terá legitimidade substantiva para o fazer Na situação dos autos, a Ré colocou em crise a legitimidade da A. para exercer os direitos emergentes de um contrato de compra e venda de coisa alegadamente defeituosa. Cumpre então aferir se entre a A. e a Ré foi celebrado um contrato. Na definição de Antunes Varela, in Das Obrigações em Geral, I, 5ª edição, pág. 215: “diz-se contrato o acordo vinculativo, assente sobre duas ou mais declarações de vontade (oferta ou proposta, de um lado; aceitação, do outro), contrapostas mas perfeitamente harmonizáveis entre si, que visam estabelecer uma regulamentação unitária de interesses”. Em sentido crítico, Carlos Ferreira de Almeida, in Contratos, I, 6ª edição, pág. 35 defende que contrato é “o acordo formado por duas ou mais declarações que produzem para as partes efeitos jurídicos conformes ao significado do acordo obtido”. A celebração de um contrato resulta da conjugação de duas declarações de vontade, com um “conteúdo proposicional“ (a expressão é de Carlos Ferreira de Almeida, in ob. cit. pág. 95), formalmente adequadas: uma proposta completa e precisa tendente à produção de determinados efeitos jurídicos, por um lado; uma resposta concordante com a proposta, ou seja, a aceitação dessa proposta, por outro. Relativamente à completude importa considerar que quanto a determinados elementos, como o preço, a lei contém critérios para a sua integração, como sucede no contrato de compra e venda. Assim, dispõe o art.º 883º, n.º 1 do CC que se o preço não estiver fixado por entidade pública, e as partes o não determinarem nem convencionarem o modo de ele ser determinado, vale como preço contratual o que o vendedor normalmente praticar à data da conclusão do contrato ou, na falta dele, o do mercado ou bolsa no momento do contrato e no lugar em que o comprador deva cumprir; na insuficiência destas regras, o preço é determinado pelo tribunal, segundo juízos de equidade. Por outro lado, e quanto à aceitação, a mesma é, em regra, uma declaração recipienda, que deve ser dirigida ao proponente. Mas o art.º 234.º dispõe que quando a proposta, a própria natureza ou circunstâncias do negócio, ou os usos tornem dispensável a declaração de aceitação, tem-se o contrato por concluído logo que a conduta da outra parte mostre a intenção de aceitar a proposta. Este normativo considera que um comportamento concludente pode ter o sentido de declaração tácita e não recipienda de aceitação, dispensando a comunicação expressa da mesma (cfr. Carlos Ferreira de Almeida, in ob. cit. pág. 128). 4.2. Em concreto A A. alega que celebrou com a Ré um contrato de compra e venda de um pavimento flutuante com defeitos e pede o reconhecimento desse facto e a declaração de que o novo material foi entregue pela Ré à A. a título de substituição do pavimento com defeitos e uma indemnização por danos alegadamente causados com a substituição do pavimento. Neste quadro a A. será parte legítima do ponto de vista substantivo para exercer os direitos emergentes do cumprimento defeituoso – art.º 913º do CC - se tiver celebrado com a Ré o contrato de compra e venda de que a entrega daquele pavimento é efeito. O art.º 874º do CC define compra e venda como sendo o contrato pelo qual se transmite a propriedade de uma coisa, ou outro direito, mediante um preço. De referir que o contrato de compra e venda de bens móveis não está sujeito a forma especial, antes resultando do mútuo consenso entre as partes. Está provado – ponto 6 – que no início de agosto de 2021, a Autora dirigiu-se às instalações da Ré a fim de proceder à encomenda dos materiais necessários para a execução dos trabalhos de pavimentação, tendo concretamente ficado provado – ponto 7 – que encomendou à Ré “FLUT. AKUA RIGID 2677 ARTIC 1220x181x 5,5 124 Caixas X 2,43m2” Temos assim que a A. apresentou à Ré uma proposta de compra e venda daquele material. A proposta não inclui o preço. Porém, não é normal que assim aconteça, antes sendo normal no tráfico que, como dispõe o art.º 883º do CC, vale como preço contratual o que o vendedor normalmente praticar à data da conclusão do contrato A factualidade provada também não inclui uma declaração expressa de aceitação por parte da aqui Ré. Porém, ficou provado – ponto 10 – que o material descrito no ponto 7 foi levantado pela A. nas instalações da Ré, em agosto ou setembro de 2021, o que significa que a Ré o entregou, o que traduz um comportamento manifestamente concludente de aceitação da proposta. Resultou ainda provado – ponto 9 – que a Autora combinou com a Ré, que o material adquirido, fosse facturado diretamente ao dono da obra - a empresa EMP03..., LDA.. O que resulta deste facto é apenas e tão só que a factura relativa ao preço seria emitida em nome do dono da obra. Como se refere no Ac. desta RG de 05/03/2020, proc. 2606/19.5T8BRG.G1, consultável in www.dgsi.pt/jtrg “ 1- As faturas são meros documentos particulares de valor contabilístico, emitidos unilateralmente pelo emitente...” e “2- As faturas nem sequer fazem prova da verificação efetiva da transação comercial que justificará a respetiva emissão pelo emitente…” Destarte o que consta do ponto 9 em nada releva para a questão de saber se a A. e Ré celebraram um contrato de compra e venda. Do ponto 9 não resulta quem pagou o preço do referido material. Como dispõe o art.º 879º do CC, a obrigação de pagar o preço é um dos efeitos da celebração do contrato, ou seja, é uma consequência da celebração do contrato, não entrando no processo de formação do mesmo. A obrigação de pagamento do preço é do comprador. E, em regra, a mesma é cumprida pelo comprador. Mas, como resulta do disposto no art.º 767º, n.º 1 do CC, pode ser cumprida por terceiro. Assim, ainda que o preço tivesse sido pago pelo dono da obra, isso em nada colidiria com a legitimidade substantiva da A. para a presente acção pois o pagamento do preço já está para lá da celebração do contrato. Analisando a decisão recorrida verifica-se que num primeiro momento a mesma (pág. 11) reconheceu - e bem - que “a Ré forneceu pavimento à Autora, tendo por contrapartida um preço” e “[t]endo por base tal factualidade [considerou] que se encontra verificado (…) o normativo contido no artigo 874º do Código Civil”. Porém, e mais adiante – pág. 14 – considerou: No caso aqui em apreço, resultou provado que, a Autora encomendou pavimento vinílico, num primeiro momento que se encontrava com defeito e foi fornecido novo material a título de substituição, que a Ré faturou ao dono da obra, e cujo pagamento exigiu a este último. Ora, da factualidade provada emerge, de todo o modo, que a Ré procedeu em conformidade com o disposto no art.º 914.º do Código Civil, e, neste prisma, nunca teria cabimento uma indemnização pelo valor do pavimento. Todavia, o núcleo da presente ação reside numa conclusão intransponível: o comprador é o dono de obra com quem a Autora celebrou um contrato de empreitada. Resultou provado que, o combinado entre Autora e Ré o pavimento encomendado por aquela seria faturado à empresa EMP03..., Lda. (dono da obra onde foi colocado o pavimento), e, exatamente no seguimento de tal acordo, a Ré forneceu novo material, a título de substituição, que faturou diretamente ao dono da obra a quem reclama o seu pagamento, no valor total de 5.318,55€ Sucede, porém, que quem veio instaurar a presente ação, efetivamente foi quem encomendou o material em questão, mas a obrigação de pagamento, impende sobre terceiro: o dono da obra, que não é parte nos autos.” Aparentemente a decisão recorrida considera dois momentos: o momento inicial do fornecimento do pavimento flutuante e o momento subsequente do fornecimento do pavimento de substituição. O que releva para os autos, e concretamente para a legitimidade da A., é apenas e tão só o primeiro momento, isto é, saber se a mesma é parte no contrato de compra e venda do material alegadamente com defeito. E em face de tudo o exposto, impõe-se concluir que entre a A. e a Ré foi celebrado um contrato de compra e venda tendo por objecto o material denominado FLUT. AKUA RIGID 2677 ARTIC 1220x181x 5,5 124 Caixas X 2,43m2” - que os autos revelam tratar-se de pavimento flutuante -, pelo que, enquanto parte compradora no contrato, a mesma tem na relação material controvertida, tal como é na realidade, uma posição que a torna sujeito do direito a um cumprimento perfeito, a um cumprimento sem defeitos; e, assim, tem uma posição que a legitima a exercer os direitos emergentes de um cumprimento defeituoso (se os tens ou não é questão que não faz da legitimação, mas da concludência dos concretos pedidos formulados). Quanto ao segundo momento, está provado e não foi impugnado que: 14. A Autora concluiu que era necessário o seu levantamento e substituição. 15. A Autora retirou todo o pavimento e voltou a repô-lo substituindo o material. 16. A Ré facturou diretamente ao dono da obra a quem reclama o seu pagamento, no valor total de 5.318,55€, o pavimento que substituiu. Embora não cabalmente expresso, resulta desta factualidade que a Ré entregou à A. novo material de pavimento para substituição do inicialmente fornecido e alegadamente com defeito. E resulta ainda provado que a Ré pediu o pagamento do novo material entregue ao dono da obra. Porém, esta factualidade não afasta a legitimidade substantiva da A. para os pedidos que formula. A legitimidade da A. só podia radicar no facto de ser parte no contrato de compra e venda do material alegadamente defeituoso e é isso que sucede. Note-se que, pelas razões que já deixámos expostas, o facto de o preço ter sido facturado ao dono da obra não o torna parte em tal contrato. Note-se ainda que a A. não pede para ser indemnizada no valor de 5 318,55€ (valor das facturas relativas ao material de substituição, facturas essas emitidas em nome do dono da obra que não as pagou, tendo a aqui Ré intentado contra o mesmo processo de injunção) mas apenas e tão só que seja declarado que tal valor é imputável à Ré por, alegadamente, corresponder ao cumprimento do dever do vendedor de substituir o material inicialmente entregue com defeito. Em face de tudo o exposto a decisão recorrida deve ser revogada e substituída por outra que julgue a A. parte legítima do ponto de vista substantivo para os pedidos que formula. 4.3. Este tribunal dispõe de todos os elementos necessários, nomeadamente de facto, para conhecer dos pedidos? A decisão recorrida não entrou na apreciação dos pedidos concretamente formulados, por ter considerado a A. parte ilegítima do ponto de vista substantivo, decisão que se concluiu dever ser revogada. Dispõe o art.º 665º n.º 2 do CPC: 2 - Se o tribunal recorrido tiver deixado de conhecer certas questões, designadamente por as considerar prejudicadas pela solução dada ao litígio, a Relação, se entender que a apelação procede e nada obsta à apreciação daquelas, delas conhece no mesmo acórdão em que revogar a decisão recorrida, sempre que disponha dos elementos necessários. Cumpre averiguar se este tribunal dispõe dos elementos de facto necessários para conhecer do pedido, para o que se terá de ter em consideração o direito aplicável. Dispõe o art.º 913º do CC 1. Se a coisa vendida sofrer de vício que a desvalorize ou impeça a realização do fim a que é destinada, ou não tiver as qualidades asseguradas pelo vendedor ou necessárias para a realização daquele fim, observar-se-á, com as devidas adaptações, o prescrito na secção precedente, em tudo quanto não seja modificado pelas disposições dos artigos seguintes. 2. Quando do contrato não resulte o fim a que a coisa vendida se destina, atender-se-á à função normal das coisas da mesma categoria. O n.º 1 alude a quatro modalidades de defeitos: - a coisa vendida sofrer de vício: i) que a desvalorize ii) que impeça a realização do fim a que é destinada - a coisa vendida não tiver as qualidades: i) asseguradas pelo vendedor (qualidades asseguradas que entraram no conteúdo do contrato) ii) necessárias para a realização do fim a que é destinada. De acordo com a lei, as referidas modalidades reconduzem-se a duas categorias base: a) vícios da coisa; b) falta de qualidade da coisa. O vício traduz-se num desvio, à qualidade normal de coisas idênticas à vendida, numa desconformidade, numa imperfeição, numa diferença negativa entre o que a coisa devia ser, material e intrinsecamente considerada em si mesma, e o que ela é na realidade, cuja causa deve encontrar-se na concepção, no processo de execução ou no processo de conservação e de guarda da coisa entregue ao comprador (quanto a esta última afirmação, vd. Nuno Manuel Pinto de Oliveira in Contrato de Compra e Venda – Venda de Coisas Defeituosas, Gestlegal, pág. 349), de tal modo que tal vício tem uma de duas consequências: i) desvaloriza coisa; ii) impede a realização do fim a que é destinada. Mas a coisa pode não sofrer de um vício material intrínseco, de uma diferença negativa entre o dever ser e o ser; pode apenas faltar-lhe uma qualidade – aptidão, atributo, característica, propriedade - assegurada pelo vendedor ou necessária para a realização do fim a que a coisa é destinada. Relativamente ao fim a que a coisa é destinada ele pode estar especificamente contemplado no acordo e, portanto, resultar do contrato, sendo por ele se afere se a coisa sofre de vício que impeça a realização desse fim ou se a coisa não tem as qualidades necessárias à realização desse fim. Quando do contrato não resulte o fim a que a coisa vendida se destina, atender-se-á à função normal das coisas da mesma categoria, isto é, à aptidão normal das coisas idênticas à vendida, à utilidade que o adquirente espera de coisas idênticas à vendida ou, como afirma Nuno Oliveira, ob cit. pág. 370: “O art.º 913º, n.º 2, do Código Civil, ao falar do fim normal ou na função normal das coisas está a falar de uma função económico-social normal das coisas da mesma categoria ou do mesmo tipo – e a função económico-social das coisas da mesma categoria ou do mesmo tipo exige que a coisa seja adequada ao uso habitual, tenha o desempenho ou a performance habituais e que tenha as qualidades “necessárias ou essenciais segundo o tráfico […] para o desempenho desse destino normal.” Importa assinalar a importância que a lei atribuiu ao fim a que a coisa é destinada, considerando defeituosa a coisa imprópria para o uso concreto a que é destinada contratualmente – função negocial concreta programada pelas partes – ou para a função normal das coisas da mesma categoria ou tipo, se do contrato não resultar o fim a que se destina (art.º 913º n.º 2 do CC) (cfr. Calvão da Silva, Compra e venda de coisas defeituosas pág. 41). Como decorre da lei, a noção de vício tem sempre por referencial a coisa vendida em si mesmo considerada, é algo intrínseco ao estado material da coisa em si mesma considerada. Neste sentido o Ac. do STJ de 14 de maio de 2016, processo 1341/12.0TBVFR.P1. S1, consultável in www.dgsi.pt/jstj em cujo sumário consta: I - Da conjugação do princípio do exacto e pontual cumprimento dos contratos com o regime legal da venda de coisa defeituosa previsto no art. 913.º e ss. do CC resulta que, na execução do contrato, o vendedor não está apenas obrigado a entregar ao comprador a coisa vendida, estando também obrigado a entregar-lhe o bem objecto do contrato isento de vícios e de defeitos intrínsecos inerentes ao seu estado material, ou seja, em conformidade com o contratualmente estabelecido e com aquilo que for legitimamente esperado pelo comprador, sob pena de a coisa se ter por defeituosa (arts. 406.º, n.º 1, 879.º, al. b), e 913.º, do CC). Está em causa nos autos saber se: - a A. celebrou um contrato de compra e venda de material referido no ponto 7 dos factos provados - FLUT. AKUA RIGID 2677 ARTIC 1220x181x 5,5 124 Caixas X 2,43m2 – e que os autos revelam tratar-se de um pavimento flutuante; - esse material padecia de defeito, já que após a sua aplicação começou a levantar e a deformar-se (objecto do primeiro pedido); - se em função disso, tendo a Ré fornecido novo material de substituição, o respectivo custo é imputável à mesma (objecto do segundo pedido). Como já se deixou dito, cabe ao autor da acção/comprador alegar e provar os factos constitutivos do seu direito – a celebração do contrato de compra e venda de determinada coisa e que a mesma apresenta defeito – e ao réu alegar e provar os factos impeditivos, modificativos ou extintivos desse direito. A A. alegou e provou a celebração de um contrato de compra e venda de um pavimento flutuante. Alegou e provou que o pavimento fornecido apresentou defeito, já que, tendo-o aplicado, o mesmo começou a levantar, a deformar-se. Tendo em consideração a função económico-social normal das coisas da mesma categoria ou do mesmo tipo, há-de considerar-se como integrando o desempenho, a performance normal de um pavimento, a sua regularidade relativamente ao piso. Se o pavimento começa a levantar e a deformar-se há-de considerar-se, em princípio, na falta de outra factualidade, que o mesmo apresenta um desvio, uma imperfeição material que impede a realização do fim a que é destinado. Porém, a Ré alegou (art.º 30º da contestação): que a “deformação do pavimento, com réguas concavas e encaixes sobre elevados, denunciando terem sido submetidas a pressão periférica por inexistente ou insuficiente folga para dilatação e/ ou por choque térmico por eventual humidade na betonilha. – Ausência de folgas perimetrais. – pés niveladores dos módulos de cozinha sobre o pavimento. – pavimento aplicado sobre betonilha sem regularização.”. Ou seja: a Ré alegou que o pavimento começou a levantar, a deformar-se devido a inexistente ou insuficiente folga para dilatação e/ou por choque térmico por eventual humidade na betonilha, o que, dito de outra forma, significa que aqueles factos ficaram a dever-se à incorrecta aplicação do pavimento, quer do ponto de vista da execução do trabalho (deviam ter sido deixadas folgas para dilatação, o que não sucedeu), quer do ponto de vista da verificação das condições prévias e necessárias à execução do trabalho (a betonilha não devia ter humidade ou devia ter um determinado grau de humidade). De referir que a A. alegou que cumpriu as indicações do manual de instalação que acompanhava o pavimento, pelo que, no quadro fáctico em referência, a existência, ou não, de tal manual constitui um facto instrumental relevante. Assim, e de acordo com as várias soluções plausíveis da questão de direito, admite-se que a factualidade alegada pela Ré seja susceptível de impedir o direito da A., no sentido em que, caso se prove exactamente o que aquela alega e não se estabelecendo uma situação de concausalidade - defeito do material e aplicação incorrecta -, não se afigura possível considerar que o facto de o pavimento ter começado a levantar, a deformar-se, resultará necessariamente de um desvio, de uma imperfeição do respectivo material (que impede a realização do fim a que é destinado), afigurando-se antes que tal facto possa ser imputável à actuação da A., que não terá procedido a uma correcta aplicação do pavimento. Sucede que a factualidade alegada pela Ré não foi contemplada nos temas da prova, os quais são apenas: . material de pavimentação em causa nos autos – termos do fornecimento, intervenientes na aquisição e entrega do material em causa; . defeitos do material de pavimentação fornecido, necessidade de substituição; . danos referentes à substituição. Em face do exposto, o tribunal só se pode pronunciar em definitivo quanto aos pedidos formulados após produção de prova e decisão quanto à matéria alegada pela Ré no art.º 30º da contestação, a qual, muito embora tenha sido alegada sob o título de “impugnação”, na realidade constitui matéria de excepção, por consubstanciar factualidade susceptível de impedir o direito da A. Destarte, não estão reunidos todos os elementos de facto para este tribunal conhecer dos pedidos formulados, impondo-se determinar a baixa dos autos à 1ª instância a fim de ampliar os temas da prova quanto à matéria alegada pela Ré no art.º 30º da contestação, realizar novo julgamento tendo única e exclusivamente por objecto tal matéria e proferir nova sentença que conheça dos pedidos formulados. 4.4. Custas Dispõe o art.º 527º n.º 1 do CPC que a decisão que julgue a ação ou algum dos seus incidentes ou recursos condena em custas a parte que a elas houver dado causa ou, não havendo vencimento da ação, quem do processo tirou proveito. E o n.º 2 dispõe que “dá causa às custas do processo a parte vencida, na proporção em que o for.” A recorrida ficou vencida quanto ao objecto da apelação, pelo que é responsável pelas custas. 5. Decisão Termos em que: - julga-se a apelação procedente e em consequência revoga-se a decisão recorrida, a qual se substitui por outra que julga a A. parte legítima do ponto de vista substantivo para a dedução dos pedidos formulados na petição; - determina-se a baixa dos autos à 1ª instância a fim de ampliar os temas da prova quanto à matéria alegada pela Ré no art.º 30º da contestação, realizar novo julgamento tendo única e exclusivamente por objecto tal matéria e proferir nova sentença que conheça dos pedidos formulados. Custas pela recorrida Notifique-se * Guimarães, 25/09/2025 (O presente acórdão é assinado electronicamente) Relator: José Carlos Pereira Duarte Adjuntos: Alexandra Maria Viana Parente Lopes Maria João Marques Pinto de Matos [1] Dispõe o n.º 1 do art.º 639º do CPC que (sublinhado nosso) “O recorrente deve apresentar a sua alegação, na qual conclui, de forma sintética, pela indicação dos fundamentos por que pede a alteração ou anulação da decisão. Este normativo impõe dois ónus: o de alegação e o de conclusão. No caso releva este último e traduz-se na necessidade de finalizar as alegações recursivas com a formulação sintética de conclusões, em que é suposto que o apelante resuma ou condense os fundamentos pelos quais pretende que o tribunal ad quem modifique ou revogue a decisão proferida pelo tribunal a quo. (Ac. RP de 09/11/2020, proc. 18625/18.6T8PRT.P1, consultável in www.dgsi.pt/jtrp). Já referia Alberto dos Reis, in Código de Processo Civil Anotado, V volume, 1984, pág. 359, que “As conclusões são as proposições sintéticas que emanam naturalmente do que se expôs e considerou ao longo da alegação”. No mesmo sentido Aveiro Pereira, in “O ónus de concluir nas alegações de recurso em processo civil “, pág. 31, acessível in www.trl.mj.pt/PDF/Joao%20Aveiro.pdf, onde refere que as conclusões são as “ ilações ou deduções lógicas terminais de um raciocínio argumentativo, propositivo e persuasivo, em que o alegante procura demonstrar a consistência das razões que invoca contra a decisão recorrida.” Não é possível deixar de referir a prolixidade das 59 conclusões, nomeadamente por elas constar matéria que apenas deve constar da motivação, como é a relativa à apreciação da prova. Mas opta-se por não proferir despacho de aperfeiçoamento (art.º 639º n.º 3 do CPC) e, assim, convidar a recorrente a sintetizá-las única e exclusivamente para não dilatar a apreciação do recurso. |