Acórdão do Tribunal da Relação de Guimarães | |||
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| Relator: | ANIZABEL SOUSA PEREIRA | ||
| Descritores: | OPOSIÇÃO À EXECUÇÃO VALOR PROCESSUAL | ||
| Nº do Documento: | RG | ||
| Data do Acordão: | 09/25/2025 | ||
| Votação: | UNANIMIDADE | ||
| Texto Integral: | S | ||
| Meio Processual: | APELAÇÃO | ||
| Decisão: | APELAÇÃO IMPROCEDENTE | ||
| Indicações Eventuais: | 3.ª SECÇÃO CÍVEL | ||
| Sumário: | O valor da oposição à execução pode ser igual ou inferior ao valor da ação executiva, mas não poderá ser superior ao desta, sendo sempre delimitado pelo valor da execução. | ||
| Decisão Texto Integral: | ACORDAM NO TRIBUNAL DA RELAÇÃO DE GUIMARÃES: * I- Relatório:Por apenso aos autos de execução sumária nº 2375/24.7T8GMR, intentados por AA veio o executado BB deduzir oposição àquela, mediante embargos de executado, visando a respetiva extinção.— Alega, em suma, para fundamentar a sua pretensão que detém crédito sobre o exequente que pretende compensar, sendo o crédito superior ao exequendo, pelo que se operará a extinção da execução.-- O exequente contestou, alegando, em síntese, que a compensação não é admissível.— Notificou-se o exequente para esclarecer o alegado na contestação e observou-se o contraditório quanto aos esclarecimentos prestados.-- * O tribunal fixou o valor da causa “no valor da execução – art. 304º, nº 1, do Cód. Proc. Civil” , saneou o processo em despacho tabelar e, decidindo agilizar o processo, dispensou a audiência prévia e proferiu decisão de mérito fundamentada, com o seguinte dispositivo:«Pelo exposto, decide-se julgar totalmente procedentes os embargos de executado e determinar, em consequência, a extinção da execução;--- Custas pelo exequente/embargado, fixando-se a taxa de justiça em 3 Ucs – art. 527º, nºs 1 e 2 do Cód. Proc. Civil, art. 7º, nº 4, do RCP e tabela II anexa ao último diploma citado.- Registe e notifique, incluindo ao(à) SE.-.» * Inconformado com esta decisão, veio o embargado/exequente dela interpor recurso, e a terminar as respetivas alegações, formulou as seguintes conclusões (que se transcrevem):“I – O valor do incidente de embargo é o valor do direito de crédito que erradamente foi reconhecido ao embargante, mesmo sob a afirmação de que tal direito de crédito consta de sentença transitada em julgado. II – O embargante não tem qualquer título executivo, porque a sentença que homologou a partilha, dada à execução, não reconhece qualquer direito de tornas ao embargante, nem condena o embargado a pagar quaisquer tornas. III – Tal sentença apenas homologa um Mapa de Partilha demonstrativo do cálculo da redução dos legados de todos os legatários. IV- Pelo que a sentença de homologação apenas adjudica e não condena, como dela consta. V – A pretensão de interpretação da sentença e Mapa de Partilha como que o cálculo da redução dos legados, e do legado do embargado, em € 70.506,53, fosse uma obrigação de tornas, já foi negada pelo Acórdão junto aos Autos, que fixou a natureza jurídica desse montante como de cálculo de redução do legado, de que resulta que o embargado é credor do legado de € 23.975,03. VI – Não pode existir compensação da quantia exequenda com contracrédito não exigível, porque não existente VII – A decisão da matéria de facto, com excepção das alíneas a-), b-), c-) e j-) a l-), que são reprodução de actos processuais, é errada ou despicienda, por estar contaminada de errada interpretação jurídica. VIII – A sentença recorrida violou, entre outros, os artigos 304º, nº 1, do CPC; e os artigos 847º, 851º, 848º, nº 1 e 854º do CC; e ainda a força de caso julgado de que tinha conhecimento. Termos em que deve ser julgado procedente o presente recurso, revogando-se a decisão recorrida e julgando improcedentes os embargos, COMO É DE JUSTIÇA.” * Foram apresentadas contra-alegações sustentando-se a manutenção da decisão recorrida.* Em 04-07-2025, foi proferido despacho a admitir apenas o recurso do Embargante relativamente ao segmento do despacho saneador sentença que fixou o valor da causa, como de “ apelação, com efeito meramente devolutivo e subida nos próprios autos – arts. 627º, nºs 1 e 2, 629º, nº 1, 631º, nº 1, 637º, nºs 1 e 2, 638º, nº 1, 639º, 644º, nº 1, al. a), 645º, nº 1, al. a) e 647º, nº 1, todos do Cód. Proc.Civil.”Neste TRG foi admitido aquele recurso com a subida e os efeitos ali consignados. * Colhidos os vistos legais, cumpre decidir.* II. Questões a decidir.Sendo o âmbito dos recursos delimitado pelas conclusões das alegações do recorrente, ressalvadas as questões do conhecimento oficioso que ainda não tenham sido conhecidas com trânsito em julgado, a questão essencial que se coloca à apreciação deste Tribunal consiste em saber: - Qual o valor da oposição à execução? * III. Fundamentação de facto.Os factos a atender com relevo jurídico-processual constam do relatório elaborado. Ainda deverá ter-se em conta o seguinte, colhido via eletrónica, : a) Foi dada à execução a sentença proferida no processo nº 4702/22.2T8GMR, do Juízo Central Cível de Guimarães - Juiz ..., cujo teor se dá por integralmente reproduzido, no segmento relativo à condenação do embargante em custas de parte e a respetiva nota, no valor de €: 1.632,00, acrescido de juros de mora, vencidos e vincendos.— b) No rosto do requerimento de oposição à execução, bem como no fim do requerimento e sob a epígrafe “Valor da Causa” consta“ 1 639,51 € (Mil Seiscentos e Trinta e Nove Euros e Cinquenta e Um Cêntimos) ( o da execução)”. * IV. Fundamentação de direito.Como vimos a única questão a decidir traduz-se em saber se está correto o valor da causa fixado pela Mma Juiz a quo, e é a única questão da apelação, uma vez que o despacho que admitiu o recurso interposto da decisão final, apenas admitiu o recurso quanto ao segmento do valor da causa e não sofreu qualquer reclamação. No caso dos autos, a Mma Juiz a quo fixou “ o valor da causa no valor da execução – art. 304º, nº 1, do Cód. Proc. Civil.”. O embargado/exequente defendeu que o valor da ação deve ser fixado na quantia total de € 70.684,81, “sendo este o valor do reconhecimento do crédito compensatório, pelo que é este o valor dos embargos, por ser este o crédito que é reconhecido ao embargante sobre o exequente, nos termos da segunda parte do nº 1, do artigo 304º do CPC” . Desde logo, é um valor diferente do que indicou na parte final do requerimento de contestação, e que no fim indicou “ valor o dos embargos”, sendo certo que o valor dos embargos foi indicado como sendo o da execução. Vejamos, então, de que lado está a razão. O valor atribuído à execução pelo exequente é de €: 1.632,00, acrescido de juros de mora, vencidos e vincendos. O executado deduziu oposição e no final do seu requerimento indicou como valor da causa: . 1.639,51 € [ o da execução ]. Agora pretende o exequente que deve ser fixado na quantia total de € 70.684,81, sendo este, na sua ótica, o valor do reconhecimento do crédito compensatório alegado pelo executado. Prima facie, importa realçar que o exequente/embargado não impugnou o valor que o embargante/executado indicou nos embargos, e até indicou, no fim da sua contestação, o valor como sendo “ o dos embargos de executado”, pelo que que tal conduta significa que aceitou esse valor dado pelo executado/embargante, nos termos do art.º 305º, nº 4, do Código de Processo Civil. Porém, tal não significa que o tribunal o deva aceitar. O art.º 306º, nº 1, do Código de Processo Civil determina que “compete ao juiz fixar o valor da causa (…)”. Mas, terá aqui aplicação o art.º 297º, nºs 1 e 2, do Código de Processo Civil, como parece defender o recorrente, ou o art.º 304º, do mesmo código, como decidiu o tribunal recorrido? Chegados aqui, importa analisarmos a natureza jurídica da figura da oposição à execução, tout court ou mediante embargos de executado, segundo a velha terminologia eliminada pela revisão de 2003 e repristinada pelo CPC de 2013, e pode concluir-se com toda a propriedade que, não obstante a flutuação de nomenclatura, a sua natureza jurídica não mudou em qualquer das reformas desde 2003. A oposição à execução continua a ser uma fase eventual da ação executiva que assume a natureza de contra-ação tendente a obstar aos efeitos da execução por via da afetação dos efeitos normais do título executivo e/ou da ação que nele se baseia – vide Lebre de Freitas, A Ação Executiva - À luz do Código de Processo Civil de 2013, 7.ª ed., Coimbra Editora, Coimbra, p. 214,215. “A oposição à execução segue o processo comum declarativo ( cfr. art. 732º,nº2), adaptado com normas próprias de procedimento, constantes dos art.s 728º, 732º e 733º. No mais, por se tratar de um incidente, observar-se-á o que vai disposto nos art.s 293º, 294 ex vi 292º (…) … A petição apresenta a estrutura e conteúdo de uma comum petição inicial, nos termos do art. 552º-v.g. a indicação do valor da causa ( …) … quanto ao valor da oposição à execução, por se tratar de um incidente da instância, aplicam-se os art.s 304º nº1 e 307º. Assim, o valor da oposição à execução é o da execução a que respeita, salvo se tiver realmente valor diverso deste ( art. 304º nº1); se, porém, o opoente não indicar o alor, entende-se que aceita o valor dado à execução ( art. 307º nº1)” ( - vide Rui Pinto- A Ação Executiva, ed.2019, p. 404 a 407). Em suma, a petição de embargos de executado equivale a uma petição inicial da ação declarativa, aplicando-se, com as devidas adaptações, o disposto no artigo 552.º do CPC, designadamente a alínea f) do n.º 1, relativa à indicação do valor da causa. Porém, não se pode descurar que, na sua dinâmica, esta fase eventual da ação executiva garante ao executado a defesa contra a pretensão do exequente. Seguindo de perto a jurisprudência dos acórdãos do TRP de 22.2.2007 e do TRL de 3.12.2015, proferidos nos processos n.ºs 0730569 e 4287/14.3YYLSB-A.L1-6, respetivamente, in www.dgsi.pt, há que ponderar que a oposição constitui também uma ação declarativa ligada instrumental e funcionalmente à ação executiva em que se enxerta. Por outro lado, as disposições do CPC relativas à verificação do valor da causa não contemplam um regime específico quanto ao valor da oposição à execução. Mas a oposição à execução tem um valor próprio, correspondente à sua utilidade económica – artigo 305.º, n.º 1, do CPC, a qual coincidirá, em princípio, com o valor da execução ou, se não a abranger na totalidade, ao valor da parte a que a oposição se refere. A respeito, já Salvador da Costa ( in Incidentes da Instância, 4ª ed, p. 27) impressivamente referia que “ o valor processual da oposição à execução é suscetível de corresponder ao da respetiva ação executiva ou ser inferior, conforme o respetivo âmbito seja igual ou menor”. Dito de outro modo: se a oposição à execução se destina a inutilizar a execução no seu todo, o seu valor há de corresponder ao valor da execução, pois a utilidade económica imediata do pedido executivo é igual à utilidade económica imediata a que visa a oposição e só tratando-se de uma oposição parcial é que haverá lugar a distinção de valores; contudo, atento o fim próprio da oposição, não é de admitir que tenha um valor superior ao da execução ( neste sentido, para além dos supra citados acórdãos, ainda o Ac STJ de 22-02-1979, in dgs; e AC da RP de 15-09-2022, proc. 728/22.4T8PRT-A.P1,in dgsi) . Ou seja, o valor da oposição à execução pode ser igual ou inferior ao valor da ação executiva, mas não poderá ser superior ao desta, sendo sempre delimitado pelo valor da execução. Em suma, deverá, pois, a oposição à execução ser perspetivada neste particular como incidente da instância à semelhança do que sucede com os embargos de terceiro, sendo-lhe aplicável o disposto nas disposições conjugadas dos artigos 304.º e 307.º do CPC, tendo-se como aceite, em princípio, o valor dado à execução. Na verdade, estando vedado ao embargante deduzir qualquer pedido indemnizatório na oposição à execução, não pode o mesmo ser atendido para efeito de determinação do valor da causa. Se assim fosse, facilmente a parte lograria obter um valor de ação e a admissibilidade do recurso de uma decisão nela proferida que, face ao seu real valor e à delimitação própria dos embargos de executado, não é legalmente admissível, como acontece aqui com a quantia exequenda, cujo montante está muito aquém do valor da alçada do tribunal de 1ª instância. Improcede, pois, a questão da apelação, sendo de confirmar o valor atribuído à oposição à execução pela instância recorrida, como sendo o valor da execução. V- Decisão Pelo exposto, acordam os juízes que constituem esta 3ª secção Cível do Tribunal da Relação de Guimarães: A) em julgar improcedente a apelação, confirmando a decisão recorrida. B) Custas da apelação pelo apelante. Notifique. Guimarães, 25 de setembro de 2025 Relatora: Anizabel Sousa Pereira Adjuntos: João Paulo Pereira e Luís Miguel Martins |