Acórdão do Tribunal da Relação de Coimbra
Processo:
239/22.8T8MMV.C1
Nº Convencional: JTRC
Relator: MOREIRA DO CARMO
Descritores: ARRENDAMENTO RURAL
DIREITO DE PREFERÊNCIA
PRAZO PARA RECORRER
EXTEMPORANEIDADE DO RECURSO
RECLAMAÇÃO
DECISÃO SINGULAR
RECLAMAÇÃO PARA A CONFERÊNCIA
Data do Acordão: 06/05/2025
Votação: UNANIMIDADE
Tribunal Recurso: TRIBUNAL JUDICIAL DA COMARCA DE COIMBRA – MONTEMOR-O-VELHO – JUÍZO DE COMPETÊNCIA GENÉRICA
Texto Integral: S
Meio Processual: APELAÇÃO
Decisão: RECLAMAÇÃO IMPROCEDENTE
Legislação Nacional: ARTIGOS 31.º, N.º 2, E 35º, Nº 1, DO DL 294/09 DE 13 DE OUTUBRO – NOVO REGIME DO ARRENDAMENTO RURAL
ARTIGO 652.º, N.º 3, DO CÓDIGO DE PROCESSO CIVIL
Sumário: 1- Numa acção declarativa de preferência, no qual o A. pretende exercer a mesma, com fundamento em ser arrendatário rural, ao abrigo do art. 31º, nº 2, do DL 294/09 (de 13.10), tal processo judicial é urgente, nos termos do art. 35º, nº 1, do mesmo diploma, pelo que o prazo de recurso é de apenas 15 dias (art. 638º, nº 1, do NCPC);

2- Esse carácter resulta da lei imperativamente e não de qualquer atribuição pelo tribunal a quo onde a acção correu, que era do conhecimento dos srs. Advogados da parte, ou deviam conhecer, pelo que nenhuma surpresa para o A. e seus mandatários pode advir daí;

3- Não tendo os RR usufruído de qualquer benefício temporal, na tramitação processual, todo o processado não pode ser declarado nulo ou anulado por extemporâneo, por desrespeito ao disposto no art. 35º, nº 1, do DL 294/09;

4- Nem pode aplicar-se o Ac. do STJ de 17.5.2016, Proc.1185/13.1 T2AVR, com contornos diferentes, pois aí a 1ª instância aceitou a contestação e o articulado subsequente, fora do prazo legal contínuo para o efeito, tendo a decisão, favorável à ré, sido baseada na defesa extemporânea desta, indevidamente considerada pelo Tribunal, que não teve em atenção que a contagem do prazo não havia sido contínua, como se impunha, atenta a natureza urgente do processo, pelo que se aceitou a interposição do recurso em prazo compatível com um processo não urgente, e ao invés no nosso caso isso não aconteceu, pois a contestação respeitou o prazo legal e não teve qualquer benefício temporal adicional e inexistiu outro articulado subsequente;

5- Quando na reclamação da decisão singular, prevista no art. 652º, nº 3, do NCPC, a reclamante não apresenta nenhum argumento novo, limitando-se a requerer que sobre a matéria recaia um acórdão, pode a Conferência manter aquela decisão singular sem necessidade de apresentar novos fundamentos ou sequer de os reproduzir.


(Sumário elaborado pelo Relator)
Decisão Texto Integral: *

                                                      Acórdão

1. Estamos perante uma acção declarativa de preferência, no qual o A. pretende exercer a mesma, com fundamento em ser arrendatário rural, ao abrigo do art. 31º, nº 2, do DL 294/09 (de 13.10) – vide a p.i.

Nos termos do art. 35º, nº 1, do mesmo diploma, tal processo judicial, referido no art. 31º, têm carácter de urgência.

E nos processos urgentes o prazo de recurso é de apenas 15 dias (art. 638º, nº 1, do NCPC).

Atendendo à data de notificação da sentença (envio CITIUS em 10.10.2024) e data de interposição do recurso (26.11.2024) afigurou-se que o mesmo era extemporâneo.

Foi ordenada então a audição das partes.

2. O A./recorrente pronunciou-se dizendo, em suma, que: à presente acção não foi atribuído, pela 1ª Instância, caracter de urgência, em nenhum momento, nem na data de autuação dos autos, nem em qualquer outro momento, tendo a mesma tramitado normalmente; e os RR usufruíram do prazo de contestação de trinta dias e até das férias judiciais do Natal de 2024, para apresentar as suas alegações de recurso; ora, se o Tribunal da Relação, considerar agora o processo como urgente, a ser assim, todas as peças processuais deduzidas após a p.i., foram deduzidas fora de prazo porque o tribunal de 1ª Instância não tramitou o processo como urgente, devendo pois todo o processado ser declarado nulo ou anulado por extemporâneo, por desrespeito ao disposto no art. 35º, nº 1, do DL nº 294/09; argumentar-se com a extemporaneidade do recurso com base nessa disposição legal, constitui uma violação inadmissível dos princípios da cooperação, da boa fé processual, da tutela da confiança, da igualdade e da auto responsabilização quer das instituições quer das partes, como se diz no Ac. do STJ de 17.5.2016, Proc.1185/13.1 T2AVR.

Termos em que requereu que: 1º - o tribunal da Relação admita o recurso interposto pelo A.; ou assim não se entendendo, 2º - o tribunal da Relação declare a nulidade e ordene a anulação de todo o processado, a partir da p.i., por desrespeito total do estipulado nos artigos nos arts. 31º, nº 2, e 35º, nº 1, do DL 294/09.

Os recorridos emitiram pronúncia, concordando que o recurso é extemporâneo.

3. Foi proferido despacho pelo relator de não admissão do recurso e indeferida a pretensa nulidade/anulação.

4. Nesse despacho escreveu-se o seguinte:

“Não se acompanha a argumentação do recorrente. Relativamente às 4 objecções que levantou responde-se, sumariamente, como segue:

- à presente acção não foi atribuído, pela 1ª Instância, carácter de urgência, em nenhum momento, nem na data de autuação dos autos, nem em qualquer outro momento, nem tinha que o ser. Esse carácter resulta da lei imperativamente e não de qualquer atribuição pelo tribunal a quo onde a acção correu.

Aliás, o A. estava assistido por srs. Advogados que conheciam a lei, ou deviam conhecer, pelo que nenhuma surpresa para o A. e seus mandatários pode advir daí.

Se a acção decorreu mais lentamente isso decorreu ou pode ter decorrido da lentidão de funcionamento dos tribunais, nada mais.

- os RR usufruíram do prazo de contestação de trinta dias, o que nada de estranho tem, pois era esse o prazo legal para contestar e o seu decurso ocorreu continuadamente, sem qualquer intermitência, tendo a 1ª R. apresentado contestação dentro do prazo legal previsto, sem qualquer benefício temporal.

A haver algum benefício para os RR seria agora, e unicamente desde o início do processo, com a apresentação das suas contra-alegações de recurso, por se ter intrometido, pelo meio, as férias judiciais do Natal de 2024. O que naturalmente levaria esta Relação a não admitir as mesmas, situação de desnecessária pronúncia, pois o recurso do A. não é admissível.

- apesar de o processo ser urgente e compulsado o mesmo, verificamos que nenhuma peça processual deduzida após a p.i., foi deduzida fora de prazo ou com benefício temporal, pelo que todo o processado não pode ser declarado nulo ou anulado por extemporâneo, por desrespeito ao disposto no art. 35º, nº 1, do DL nº 294/09;

- o Ac. do STJ de 17.5.2016, Proc.1185/13.1 T2AVR, não pode aplicar-se ao nosso caso, por ter contornos diferentes. Aqui, a 1ª instância aceitou a contestação e o articulado subsequente, fora do prazo legal contínuo para o efeito, tendo a decisão, favorável à ré, sido baseada na defesa extemporânea desta, indevidamente considerada pelo Tribunal, que não teve em atenção que a contagem do prazo não havia sido contínua, como se impunha, atenta a natureza urgente do processo. Pelo que se aceitou a interposição do recurso em prazo compatível com um processo não urgente.

Ao invés no nosso caso isso não aconteceu, pois a contestação respeitou o prazo legal e não teve qualquer benefício temporal adicional e inexistiu outro articulado subsequente.

Termos em que, ao invés do que o A. requerente pretende não pode aceitar-se o recurso do mesmo, nem declarar a nulidade e ordene a anulação de todo o processado, a partir da p.i.”.

5. O A./Recorrente reclamou para a Conferência, requerendo que o recurso seja admitido.

No requerimento, repetiu o que já tinha escrito na sua pronúncia sobre a admissibilidade do recurso. E limitou-se a acrescentar que não podia concordar com a decisão de não admissibilidade do recurso, pelos motivos já enunciados.

Os recorridos responderam, dizendo que o recorrente manifesta pura teimosia, pois não invoca qualquer novo argumento ou disposição jurídica.

6. Na verdade, o reclamante/recorrente repete o que já tinha dito anteriormente, não invocando qualquer novo argumento ou disposição jurídica.

Nesta situação seguimos a jurisprudência pacífica do STJ de que (vide Acds. de 14.10.21, Proc.54843/19.6YIPRT.G1-A, e de 4.7.2024, Proc.2254/20.7T8STS.P1-A-A) quando, na reclamação da decisão singular prevista no artigo 652º, nº 3, do NCPC, a reclamante não apresenta nenhum argumento novo, limitando-se a requerer que sobre a matéria recaia um acórdão, pode a Conferência manter aquela decisão singular sem necessidade de apresentar novos fundamentos ou sequer de os reproduzir.

7. Sumariando (art. 663º, nº 7, do NCPC): (…).

8. Decisão

Pelo exposto, indefere-se a reclamação, assim se mantendo o despacho reclamado.

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Custas pelos recorrentes/reclamantes.

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5.6.2025

Moreira do Carmo

Carlos Moreira

 Fernando Monteiro