| Acórdão do Tribunal da Relação de Coimbra | |||
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| Nº Convencional: | JTRC | ||
| Relator: | VÍTOR AMARAL | ||
| Descritores: | PROCESSO DE PROTEÇÃO DE CRIANÇAS E JOVENS EM PERIGO ACOLHIMENTO RESIDENCIAL INTERESSE DO MENOR | ||
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| Data do Acordão: | 09/30/2025 | ||
| Votação: | UNANIMIDADE | ||
| Tribunal Recurso: | TRIBUNAL JUDICIAL DA COMARCA DE COIMBRA – COIMBRA – JUÍZO DE FAMÍLIA E MENORES – JUIZ 1 | ||
| Texto Integral: | S | ||
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| Meio Processual: | APELAÇÃO | ||
| Decisão: | CONFIRMADA | ||
| Legislação Nacional: | ARTIGOS 4.º, 36.º, N.ºS 5 E 6 DA LEI Nº 147/99, DE 1 DE SETEMBRO – LEI DE PROTEÇÃO DE CRIANÇAS E JOVENS EM PERIGO | ||
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| Sumário: | 1. - Estando em causa a promoção dos direitos e a proteção das crianças e dos jovens em perigo, no âmbito da LPCJP (Lei nº 147/99, de 01-09, na sua versão atual), o interesse a atender e a salvaguardar é o superior interesse do menor – parte/sujeito mais débil na relação familiar complexa e conflitual –, e nunca os interesses egoísticos de outrem, mesmo que os seus progenitores. 2. - Mostra-se necessária e adequada (proporcional) a aplicação da medida de acolhimento residencial a uma jovem, agora com dezasseis anos de idade, que, por se encontrar em situação de perigo para a sua educação, higiene e segurança junto da mãe, teve de ser-lhe retirada e colocada em acolhimento residencial, onde se encontra bem integrada e deseja permanecer, não sendo caso, subsistindo o risco, de confiança da jovem, contra a vontade desta, à sua mãe. 3. - Num tal caso, destinando-se a prevenir/obstar à situação de perigo atual, a medida de acolhimento residencial, embora reiterado, mostra-se conforme ao superior interesse da menor, cuja família não responde, por ora, às suas necessidades básicas/essenciais. (Sumário elaborado pelo Relator) | ||
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| Decisão Texto Integral: | * Acordam na 2.ª Secção do Tribunal da Relação de Coimbra: *** I – Relatório Em processo de promoção e proteção relativamente à jovem AA, nascida a ../../2009, filha de BB e de CC, com os sinais dos autos, foi aplicada a medida de promoção e proteção de acolhimento residencial, pelo prazo de seis meses, por decisão datada de 02/03/2022 ([1]). Tendo tal medida sido objeto de prorrogação, em 19/11/2024 foi junto relatório social pelo técnico gestor do SATT, que propôs, em sede de revisão da medida, a manutenção da jovem em acolhimento residencial, no caso, na Residência ..., proposta com a qual os progenitores não concordaram (como resulta do teor da ata da conferência realizada em 16/12/2024, pugnaram pela alteração da medida para uma medida de apoio junto da mãe). Por decisão de 19/12/2024, foi aplicada, a título cautelar, “a manutenção do acolhimento residencial da jovem AA enquanto se aguarda a realização de debate judicial”. Determinado o cumprimento do disposto no art.º 114.º, n.º 1, da LPCJP, o Ministério Público (doravante, M.º P.º) apresentou alegações e concluiu dever ser mantida a medida de acolhimento residencial, para o que indicou meios de prova. Realizado o debate judicial, com produção de provas, incluindo audição da jovem e dos seus progenitores, foi proferido acórdão (datado de 24/03/2025) com o seguinte dispositivo: «Pelo exposto, acordam os juízes que compõem este Tribunal Colectivo Misto, ao abrigo do disposto nos artigos 35.º, n.º 1, al. f), 49º e 62.º, nºs 1 e 3, al. c), da Lei de Proteção de Crianças e Jovens em Perigo, em manter a medida de promoção e proteção de acolhimento residencial da jovem AA, pelo período de seis meses, permanecendo a jovem sob a guarda e cuidados da instituição que presentemente a acolhe. A execução da medida continuará a ser acompanhada pela Segurança Social, sendo que caso não ocorram anomalias deverá juntar novo relatório atualizado dentro de cinco meses.». A Requerida mãe, em 22/05/2025, inconformada, veio interpor recurso desta decisão judicial, apresentando alegação e as seguintes Conclusões ([2]): «I – ENQUADRAMENTO E FUNDAMENTAÇÃO DA MEDIDA 1. Por acórdão proferido em 24 de março de 2025, foi determinada a manutenção da medida de acolhimento residencial da menor AA, com base nos artigos 35.º, n.º 1, al. f), 49.º e 62.º, n.ºs 1 e 3, al. c), da LPCJP. 2. Segundo a decisão, subsistiriam fundamentos que justificam a continuação da institucionalização da menor, com referência a factos iniciados em 2020! 3. Contudo, passados mais de cinco anos, a Recorrente entende que a subsistência da medida se revela manifestamente desproporcional, injustificada e violadora dos princípios estruturantes do regime de promoção e proteção. 4. A medida foi aplicada em contexto de emergência e de forma provisória (que já não subsiste), mas a sua manutenção sem reavaliação concreta da situação atual colide frontalmente com os princípios da atualidade, da proporcionalidade e da subsidiariedade, consagrados no artigo 4.º da LPCJP. 5. Ademais, a decisão desconsidera completamente a evolução positiva da mãe, Recorrente, quer no plano pessoal, emocional, habitacional, quer no plano do exercício da parentalidade. 6. A Recorrente tem atualmente estabilidade económica, habitação adequada e demonstrou repetidamente a sua disponibilidade para cuidar da filha e reintegrá-la no seu meio familiar, desde logo por dispor de competências e responsabilidade parental. 7. Em sede de debate judicial, foram produzidas provas que confirmam inequivocamente a existência de vínculo afetivo entre mãe e filha, de respeito e cuidado mútuo, a manutenção de contacto regular e a ausência de risco atual no seio materno. 8. Apesar disso, o Tribunal recorrido optou por reiterar os fundamentos de decisões anteriores, de modo automático, ignorando o contexto presente e os novos elementos probatórios trazidos aos autos. II – DA NULIDADE DA DECISÃO (Art. 615.º, n.º 1, als. b), c) e d), CPC) 9. O acórdão recorrido padece de vícios formais que impõem a sua anulação, desde logo por falta de especificação dos fundamentos de facto e de direito (alínea b)). 10. Os factos dados como provados são apresentados de forma desorganizada e incongruente, com quebras cronológicas constantes, alternando entre 2020, 2022 e 2025, sem qualquer articulação lógica, sequência narrativa ou coerência interna, tornado o mesmo impercetível e de difícil compreensão. 11. Até ao ponto n.º 18, é possível entrever alguma lógica na enumeração dos factos, já que o Tribunal parece iniciar a exposição a partir de eventos ocorridos em 2020, seguindo uma linha temporal razoável — ainda que a Recorrente, naturalmente, não concorde com o teor dos mesmos. 12. No entanto, essa estrutura rapidamente se desfaz: a partir do ponto 18 e, mais notoriamente, no ponto 19, há um salto abrupto e direto para a atualidade (2025), sem qualquer transição, justificação, ou marcação cronológica que permita ao destinatário compreender em que momento e contexto se situam os acontecimentos. 13. Este avanço repentino revela-se altamente problemático, pois logo após afirmar que a menor DD frequenta o 10.º ano (presente), o acórdão declara, sem delimitação temporal, que “DD recebia visitas semanais da mãe, supervisionadas por técnicas do CAR”, o que suscita inevitáveis interrogações: 14. Quando? 15. Como? 16. Onde? 17. Porquê? 18. Em que contexto e circunstâncias? 19. Referente a que período temporal? 20. Essa ausência de resposta transforma a decisão em algo incompreensível e ininteligível, violando o dever de fundamentação e conduzindo à nulidade prevista na alínea c) do art. 615.º do CPC, por obscuridade e ambiguidade da decisão. 21. Esta desorganização afeta diretamente ainda numerosos outros pontos da factualidade provada: com efeito, a incoerência temporal estende-se aos pontos 21 a 24 e 27 a 30; os pontos 31 a 39 voltam a reportar-se ao ano de 2025, mas inexplicavelmente o ponto 41 recua para 2022! 22. Os pontos 42 a 49 mantêm essa indefinição; o ponto 50 remonta a julho de 2020; os pontos 51 a 54 não são temporalmente marcados, e o ponto 55 regressa novamente a 2020; os pontos 57 a 60 estão igualmente sem marco cronológico, enquanto os pontos 63 a 67 voltam a referir-se ao presente — veja-se a referência expressa: “A DD tem 15 anos de idade (…)”. 23. Seguem-se os pontos 68 a 70, que voltam a não ser localizados no tempo; o ponto 71, por seu lado, refere-se ao Natal de 2022, para que, nos pontos 72 a 76, se retome uma narrativa sem delimitação temporal clara. 24. Em resumo, relativamente a 41 pontos da factualidade provada, é absolutamente impossível extrair elementos fundamentais que permitam saber quando, como, onde e por que razão os factos ocorreram, o que prejudica gravemente a compreensão e sindicância do juízo decisório. 25. Tal ausência de estrutura fática impede que se faça a necessária ligação entre os factos e a decisão — comprometendo o silogismo judiciário — e impede também que a Recorrente identifique com precisão quais os pontos que pretende impugnar, o que prejudica o exercício do seu direito de recurso. 26. O vício é, assim, duplo: por um lado, falta de especificação (al. b)); por outro, obscuridade e ambiguidade (al. c)), que, conjugados, impedem a formação de um juízo completo, coeso e fundamentado. 27. Também se verifica omissão de pronúncia sobre questões essenciais, nomeadamente o contexto atual da menor, o desenvolvimento da relação com a mãe e os efeitos do afastamento prolongado. 28. O Tribunal não analisou os convívios recentes entre mãe e filha, nem ponderou a viabilidade de uma transição segura para o regresso ao seio familiar. 29. Esta omissão viola o dever de conhecimento de todas as questões relevantes para a boa decisão da causa e consubstancia a nulidade prevista na alínea d). 30. Como sublinha o Prof. Alberto dos Reis, “o que a lei considera nulidade é a falta absoluta de motivação; a insuficiência ou mediocridade da motivação é espécie diferente” (CPC Anotado, Vol. V). 31. No caso dos autos, estamos perante nulidades formais que afetam a própria estrutura e validade da sentença, impondo a sua anulação. III – DO ERRO DE JULGAMENTO (Erro de facto e erro de direito) 32. Ainda que assim não se entenda, sempre se dirá que a decisão incorre igualmente em erro de julgamento, quer na apreciação da prova, quer na sua valoração jurídica. 33. O Tribunal não valorou corretamente a prova produzida em sede de audiência, nem considerou a evolução positiva da Recorrente nos últimos anos. 34. Os elementos tidos como determinantes foram relatórios sociais desatualizados, elaborados entre 2020 e 2022, ignorando os factos atuais, colhidos em sede de debate judicial em 2025. 35. Os depoimentos prestados evidenciaram que a mãe possui atualmente condições emocionais, económicas e parentais para reassumir os cuidados da filha. 36. A menor demonstrou, nos convívios, afeto e disponibilidade para a reaproximação, apesar de sinais evidentes de condicionamento institucional. 37. O Tribunal deu excessivo relevo a respostas breves e mecânicas da menor, desconsiderando que se trata de uma adolescente institucionalizada há cinco anos, sujeita a influência da equipa técnica. 38. A jurisprudência do STJ, nomeadamente no acórdão de 17/10/2017 (Proc. 1204/12.9TVLSB.L1.S1), tem afirmado que decisões injustas e desconformes com o caso concreto devem ser revogadas. 39. Também no acórdão de 02/06/2016, o STJ destacou que nulidades e erros de julgamento comprometem a validade e eficácia de decisões judiciais. 40. O princípio da atualidade, previsto no artigo 4.º, al. e), da LPCJP, exige que a intervenção seja justificada no momento da decisão – e não com base em factos ultrapassados. 41. A medida aplicada à menor foi pensada como provisória e excecional, mas tem sido reiteradamente renovada, sem verificação de risco atual. 42. O artigo 36.º, n.º 6, da CRP dispõe que os filhos não podem ser separados dos pais salvo por decisão judicial e quando estes não cumpram os seus deveres. 43. A decisão ora recorrida não demonstra que a Recorrente falhe nos seus deveres parentais atualmente, nem fundamenta adequadamente a subsistência do perigo. 44. O princípio da proporcionalidade impõe que se prefiram medidas menos gravosas, designadamente soluções de integração em meio familiar. 45. A LPCJP, no seu artigo 34.º, estabelece que o objetivo da medida é afastar o perigo e criar condições para o desenvolvimento da jovem, não prolongar institucionalizações indefinidamente, que não é o desejável para um crescimento saudável. 46. O Tribunal falhou em avaliar se tais condições já foram alcançadas, como indicia fortemente a prova constante dos autos. 47. A menor está atualmente no 10.º ano, com 15 anos de idade, e deverá, em breve, transitar para uma fase mais exigente da sua vida pessoal e académica. 48. O regresso ao seio familiar permitir-lhe-ia esse percurso com apoio, afeto e estabilidade. 49. O contexto emocional da menor não pode ser analisado de forma isolada ou abstrata, mas com base numa análise concreta da qualidade da relação com a mãe. 50. A institucionalização contínua, sem perspetiva de transição, compromete o desenvolvimento saudável da menor. 51. O Direito da Criança/Jovem deve estar orientado pelo seu interesse superior, que neste caso passa por retomar a convivência e habitação com a progenitora, que demonstra estar em condições de a acompanhar. 52. A decisão ora recorrida não apenas falha na forma, mas também no conteúdo: não interpreta nem aplica corretamente a lei da promoção e proteção. 53. O erro de direito é manifesto na subsunção de factos antigos a um quadro legal que exige perigo atual. 54. O erro de facto é evidente na não valoração da prova testemunhal, documental e pessoal colhida em juízo, da situação presente. 55. O juízo do Tribunal a quo está fundado em presunções, relatórios obsoletos e perceções desajustadas da realidade presente. 56. A prova foi colhida em audiência pública, com respeito pelas regras da imediação e oralidade, e devia ter sido apreciada à luz do momento atual. 57. A decisão recorrida revela cristalização de juízos passados, sem esforço de atualização nem ponderação crítica, operando de forma mecânica. 58. Esta postura judicial compromete o dever de justiça material, a que o julgador está vinculado. 59. A Recorrente não pode continuar privada do exercício da maternidade com base em fundamentos caducos. 60. Por todo o exposto, deve ser dado provimento ao recurso, com declaração de nulidade da decisão recorrida, ou, subsidiariamente, com a sua revogação e substituição por outra que atenda ao superior interesse da menor. 61. Deve ser determinada a cessação da medida de acolhimento residencial e a reintegração da menor no seio familiar, promovendo-se, se necessário, uma transição com acompanhamento técnico adequado. 62. Em face do acima exposto, cremos que sem sombra de dúvidas que a decisão recorrida não reúne as condições mínimas para se manter como válida e eficaz no nosso Ordenamento Jurídico. 63. Primeiramente, enferma de vícios que importam a sua nulidade. 64. Ainda que assim não fosse padece de erro de julgamento, quer de facto quer de Direito. 65. Ou seja, andou mal o douto Tribunal a quo, em diversos planos, quer ao nível dos requisitos formais da decisão (e subsequentes vícios e nulidades arguidas), quer ao nível da apreciação da factualidade, enfermando o acórdão ora recorrido, primeiramente com nulidade e, em seguida, com erro de julgamento, devendo este Venerando Tribunal da Relação de Coimbra, impor-lhe as demais consequências legais. Nestes termos e nos melhores de Direito, consentidos que vós, Venerandos Juízes Desembargadores do Tribunal da Relação de Coimbra, muito doutamente suprireis, se requer que seja o presente recurso de apelação julgado totalmente procedente, nos exatos termos supra expostos, e por via dele: • Serem reconhecidas as nulidades invocadas, ao abrigo do art.º 615.º n.º 1 al. b), c) e d) do CPC, com as demais consequências legais; Subsidiariamente, • Ser revogada a Sentença recorrida por manifesto erro de julgamento, quer de facto quer de direito, com as demais consequências legais; ASSIM DECIDINDO, SE FARÁ A HABITUAL E COSTUMADA JUSTIÇA!». O M.º P.º respondeu ao recurso, concluindo pela sua total improcedência. Não se mostra junta contra-alegação de recurso do Requerido pai. O recurso foi admitido como de apelação, a subir imediatamente, nos próprios autos e com efeito meramente devolutivo, tendo sido ordenada a remessa dos autos a este Tribunal ad quem, onde foi mantido o regime fixado. Nada obstando, na legal tramitação, ao conhecimento do mérito do recurso, cumpre apreciar e decidir. *** II – Âmbito recursivo Perante o teor das conclusões formuladas pela Recorrente – as quais definem o objeto e delimitam o âmbito do recurso ([3]), nos termos do disposto nos art.ºs 608.º, n.º 2, 609.º, 620.º, 635.º, n.ºs 2 a 4, 639.º, n.º 1, todos do Código de Processo Civil em vigor (doravante, NCPCiv.) –, importa saber, na ponderação do superior interesse da jovem AA: a) Se ocorrem as invocadas causas de nulidade do acórdão; b) Se, a ser admissível a impugnação da decisão de facto, esta deve proceder, com alteração dessa decisão, por via de erro de julgamento quanto à matéria de facto; c) Se deve alterar-se a decisão de direito, com revogação do acórdão recorrido, cessação da medida aplicada e regresso da menor ao seio familiar, com apoio junto da sua mãe. *** III – Fundamentação A) Das causas de nulidade da decisão recorrida Começa a Apelante por esgrimir, em matéria de nulidade do acórdão recorrido, com reporte à materialidade dada como provada, que se verificam as causas de nulidade a que aludem as al.ªs b) – falta de fundamentação – e c) – oposição entre fundamentos e decisão ou ocorrência de alguma ambiguidade ou obscuridade que torne a decisão ininteligível – do n.º 1 do art.º 615.º do NCPCiv.. A 1.ª instância, pronunciando-se, entendeu inexistirem as invocadas nulidades. Vejamos. O art.º 615.º, n.º 1, do NCPCiv. comina, quanto às suas al.ªs b) e c), com a nulidade da sentença as situações em que, respetivamente, (i) faltem os fundamentos da decisão ou (ii) estes, existindo, estejam em oposição com a decisão ou ocorra alguma ambiguidade ou obscuridade que torne a decisão ininteligível. Trata-se de normação inovadora apenas quanto ao fundamento de nulidade da sentença traduzido na existência de ambiguidade ou obscuridade que torne a decisão ininteligível, pois que no anterior art.º 668.º, n.º 1, al.ª c), do CPCiv. revogado apenas se aludia ao vício de oposição entre os fundamentos e a decisão e na al.ª b) desse dispositivo do Cód. revogado apenas se previa, como agora, a não especificação dos fundamentos, de facto e de direito, justificativos da decisão. Em qualquer caso, serão vícios internos da decisão, no plano dos respetivos fundamentos e decorrente dispositivo, constituindo anomalia a extrair da leitura da sentença ou acórdão – vistos em si próprios –, ante a forma como se mostram elaborados, e não da sua conjugação com outras posições decisórias exaradas no processo, designadamente anteriores despachos. Como é consabido, por ser orientação dos Tribunais Superiores, a nulidade da decisão (sentença/acórdão ou despacho), tal como prevista no dispositivo citado – a problemática a considerar é sempre, com efeito, a dos fundamentos da decisão, seja pela sua falta, contradição ou ininteligibilidade –, segundo o qual “a sentença é nula quando os fundamentos estejam em manifesta oposição com a decisão, sanciona o vício de contradição formal entre os fundamentos de facto ou de direito e o segmento decisório da sentença. Como se sabe, a sentença deve conter os fundamentos, devendo o Juiz discriminar os factos que considera provados e indicar, interpretar e aplicar as normas jurídicas correspondentes (art. 659º, nº2, do CPC). Ora, constituindo a sentença um silogismo lógico-jurídico, de tal forma que a decisão seja a conclusão lógica dos factos apurados, aquela nulidade – como tem sido unanimemente afirmado na doutrina e na jurisprudência – só se verifica quando das premissas de facto e de direito se extrair uma consequência oposta à que logicamente se deveria ter extraído” ([4]). Por outro lado, e desde logo, são bem consabidas as exigências de fundamentação das decisões dos tribunais (cfr. art.º 154.º, n.º 1, do NCPCiv., tal como o antecedente art.º 158.º, n.º 1, do CPCiv./2007), a que se reporta o art.º 615.º, n.º 1, al.ª b), do NCPCiv. (tal como o anterior art.º 668.º, n.º 1, al.ª b), do CPCiv./2007), e cuja violação, uma vez verificada, é causa de nulidade da sentença ([5]), cabendo naturalmente à Recorrente clarificar onde pudesse ter faltado a decisão à fundamentação devida/exigível, em termos de omissão absoluta de fundamentos. Ora, a esta luz, deve começar por dizer-se que este Tribunal não logra descortinar uma total falta de fundamentação da sentença, ou outra causa de nulidade da mesma, neste âmbito enunciado, sendo que não se trata de matéria de conhecimento oficioso ([6]). Com efeito, na decisão recorrida constam os factos provados (de 1 a 76), tal como a respetiva justificação da convicção probatória, não podendo, por isso, dizer-se que falte em absoluto a indicação dos fundamentos de facto do acórdão. Razão pela qual logo improcede, sem necessidade de outras considerações, a primeira arguição de nulidade, a referente à falta de fundamentação. Prosseguindo. Nos moldes em que invocadas em sede de conclusões de recurso, as ditas contradição e ininteligibilidade – esta por ambiguidade ou obscuridade –respeitarão também à exposição da matéria de facto provada, mormente por deficiente datação de factos, arbitrária e imprecisa “deambulação” temporal e falta de definição sobre o “quando”, “como”, “onde” e “porquê”, bem como “em que contexto e circunstâncias” quanto a diversa factualidade essencial. Ora, como visto, a contradição relevante para efeitos de nulidade teria de se verificar entre factos e decisão, ou seja, entre segmentos fácticos concretos e dispositivo do acórdão – e não conflito/oposição de factos perante outros factos, o que nos poderia, se ocorresse, transportar já para o erro de julgamento de facto (cfr. art.º 662.º do NCPCiv.) –, o que, manifestamente, não se verifica no caso. Donde que também não proceda a invocação do vício de contradição/oposição. E nem sequer se verifica ininteligibilidade, por via de ambiguidade ou obscuridade na descrição fáctica: os factos são percetíveis, de per si, ou no encadeamento reciproco, assumindo o conjunto fáctico provado suficiente definição, encadeamento e sequência, bem como contextualização – e atualização –, como resulta da sua reprodução infra. Assim, a matéria de facto provada mostra-se inteligível, decaindo a Recorrente também nesta parte. Resta o invocado vício de omissão de pronúncia. Este teria de se reportar a uma falta ao conhecimento de questões de que deveria ter-se conhecido, tratando-se, pois, da invocação da causa de nulidade da sentença a que alude o art.º 615.º, n.º 1, al.ª d), do NCPCiv., que comina com a nulidade da decisão judicial o vício que se traduz em o juiz deixar de pronunciar-se sobre questões que devesse apreciar (ou, ao invés, conhecer de questões de que não pudesse tomar conhecimento). Sendo aquela primeira vertente a aqui em causa, é sabido que na 2.ª parte do n.º 2 do art.º 608.º do mesmo NCPCiv. prescreve-se que não pode o juiz ocupar-se senão das questões suscitadas pelas partes, salvo se a lei lhe permitir ou impuser o conhecimento oficioso de outras, questões essas que, naturalmente, deverá apreciar, a não ser que devam ter-se por prejudicadas. Vem sendo entendimento pacífico da doutrina e da jurisprudência o de que somente as questões em sentido técnico, ou seja, os assuntos que integram o thema decidendum, ou que dele se afastam, constituem verdadeiras questões de que o tribunal tem o dever de conhecer para decisão da causa ou o dever de não conhecer, sob pena de incorrer na nulidade prevista nesse preceito legal. De acordo com Amâncio Ferreira, “trata-se de nulidade mais invocada nos tribunais, originada na confusão que se estabelece com frequência entre questões a apreciar e razões ou argumentos aduzidos no decurso da demanda” ([7]). E, segundo Alberto dos Reis, “são na verdade coisas diferentes: deixar de conhecer de questão de que devia conhecer-se e deixar de apreciar qualquer consideração, argumento ou razão produzida pela parte. Quando as partes põem ao tribunal determinada questão, socorrem-se a cada passo, de várias razões ou fundamentos para fazer valer o seu ponto de vista; o que importa é que o tribunal decida a questão posta; não lhe incumbe apreciar todos os fundamentos ou razões em que elas se apoiam para sustentar a sua pretensão” ([8]). Ora, no caso dos autos a Apelante pretende que o vício cometido – omissão de pronúncia – consistiu em se não ter conhecido e definido quanto a determinado âmbito fáctico, havendo, a seu ver, na decisão fundamentos fácticos e probatórios vagos, parcos, genéricos e desprovidos de alcance e efeito probatório. Ora, cabe dizer, liminarmente, que tal não configura qualquer questão em sentido técnico, qualquer assunto integrante do thema decidendum, não o sendo os factos, as provas ou os argumentos das partes. Donde que também não ocorra omissão de pronúncia. Improcede, pois, na totalidade a arguição de nulidades do acórdão. 
 B) Da (in)admissibilidade e (im)procedência da impugnação da decisão de facto A Recorrente, em sede de impugnação da decisão de facto – se efetivamente pretendia entrar nesse âmbito –, teria de deixar observados, em termos suficientes, os ónus a seu cargo, a que alude, desde logo, a norma do art.º 640.º, n.º 1, do NCPCiv. – especificação, sob pena de rejeição, (i) dos concretos pontos de facto, referidos no acórdão em crise (como provados ou como não provados), que considerasse erradamente julgados; (ii) dos concretos meios probatórios que impunham decisão diversa sobre os pontos impugnados; (iii) da diversa decisão que deveria ser proferida sobre cada uma das questões de facto impugnadas. Ora, a Apelante não indicou – nem nas suas conclusões nem, sequer, na sua antecedente motivação/alegação – quais os concretos pontos da parte fáctica do acórdão (os de 1 a 76) que, tendo sido julgados provados, deveriam ter sido julgados como não provados ou simplesmente ser objeto de alterações; nem quais os factos que deveriam ser agora julgados como provados e foram julgados como não provados; nem que outros factos, por relevantes, devessem ser aditados à parte fáctica da decisão recorrida. Falta, pois, o objeto fáctico da eventual impugnação da decisão de facto. Mas também falta – logo por isso – a indicação dos concretos meios probatórios que impusessem decisão diversa sobre cada um dos pontos que houvessem sido adequadamente impugnados. Embora no corpo da motivação haja referência a excertos da gravação da prova pessoal – o que permitia à Recorrente beneficiar do prazo acrescido de 10 dias a que alude o art.º 638.º, n.º 7, do NCPCiv. ([9]) –, tal indicação queda-se inconsequente por falta, ab initio, de especificação dos factos objeto da impugnação. E também não foi, do mesmo modo, indicada – como se impunha – a diversa decisão a proferir sobre qualquer concreta factualidade do acórdão, o divergente juízo que deveria ser proferido/adotado a respeito. A Recorrente quedou-se por vagas alusões a imputadas imprecisões na descrição dos factos do acórdão, designadamente por invocada falta de datas, contextos e circunstâncias, mas sem dizer quais os concretos factos que impugnasse, quais as concretas provas que, quanto a factos concretos/específicos, impusessem decisão diversa e qual fosse essa decisão fáctica diversa (quais as concretas respostas diversas a estabelecer/fixar). Por isso, resta a rejeição da impugnação da decisão de facto, de acordo com a norma imperativa daquele art.º 640.º, n.º 1, do NCPCiv., dela, por isso, aqui não se conhecendo. 
 C) Da matéria de facto apurada A materialidade fáctica julgada provada é a seguinte: «1. AA está registada como filha de BB e de CC e como tendo nascido a ../../2009. 2. Em 1 de outubro de 2020 foi aplicada à AA a medida provisória de acolhimento residencial, ficando a jovem acolhida na Fundação ..., Residência ..., em ..., até hoje. 3. Antes do acolhimento, a jovem AA residia com a mãe. 4. Em 25 de setembro de 2020 a casa onde a jovem AA residia com a mãe estava caótica e imunda, não se percebendo sequer onde dormiam mãe e filha. 5. Por referência a 25 de setembro de 2020, a mãe da AA não pagava renda há cerca de três anos. 6. Em 31 de julho de 2020 a mãe da AA apresentou-se na Segurança Social com falta de higiene e emanando odores e assumiu uma postura de hostilidade. 7. E AA apresentou-se com um vestido de manga comprida bastante usado e com collants opacas. 8. Em maio de 2020 a mãe publicou no Facebook uma fotografia da filha a pegar ao colo um gato ensanguentado e sem olhos e referiu não ver qualquer problema nesta situação e ter enterrado o gato num vaso que mantinha no terraço. 9. Antes do acolhimento, AA frequentava o Colégio ..., em .... 10.Em 31 de julho de 2020, a mãe referiu que a frequência do Colégio importava o pagamento de uma mensalidade de € 400. 11.Em 31 de julho de 2020, a mãe referiu estar a frequentar um curso de formação, auferindo cerca de € 350,00 mensais. 12.Como rendimentos referiu também receber o abono da menor, no valor mensal de € 37,46. 13.A mãe foi ouvida em Tribunal, a 17 de setembro de 2020, através de videochamada, não permitiu que lhe fossem formuladas questões, falando sem parar, tendo sido ordenado que se desligasse a videochamada, evidenciando a mãe uma postura de altivez, agressividade e desadequação, suspeitando-se de desequilíbrio mental. 14.O modelo de vinculação da mãe da AA é de natureza insegura-evitante e poderá condicionar as suas relações íntimas e de parentalidade. 15.No momento do acolhimento, em 1 de outubro de 2020, a AA estava muito calma e tranquila e muito suja e com o cabelo com lêndeas e piolhos. 16.AA continua a manter um comportamento adequado, respeitando todas as orientações e atividades que lhe são transmitidas, estando a execução de medida a decorrer de modo positivo e favorável ao seu desenvolvimento integral, bem como à sua consolidação da sua estabilidade emocional e psicológica. 17.É acompanhada no Centro de Saúde .... 18.É também acompanhada em consultas de psicologia na .... 19.AA está a frequentar o 10º ano Agrupamento de Escolas ..., tem tido um comportamento adequado, é assídua e pontual, e tem muito bom aproveitamento. 20.AA recebia visitas semanais da Mãe, supervisionadas por técnicas da CAR. 21.Durante as visitas, é frequente a mãe hostilizar os Técnicos. 22.A AA recebia visitas das tias maternas, da avó materna, do avô materno e da bisavó materna (mãe do avô materno). 23.Estas visitas eram, em regra, calmas. 24.O avô materno realizou uma visita alcoolizado. 25.A AA nunca recebeu visitas do pai ou da família paterna na CAR. 26.Desde o acolhimento, o pai fez um contacto telefónico. 27. A mãe da jovem AA vendeu roupa e calçado online. 28. Fez trabalhos como artista/cantora, tendo sido “Miss ...”. 29. A mãe da AA recebeu dinheiro de amigos para pagar consumos domésticos. 30. A mãe mudou de residência para .... 31. Atualmente reside na Urbanização ... / ... ... com o seu atual companheiro/namorado EE. 32. Mudou para a nova morada no dia 28 de janeiro de 2025. 33.A habitação é propriedade do seu companheiro/namorado que informou estar a pagar empréstimo bancário de cerca de mil e cem euros mensais (1.100,00€). 34.Trata-se de uma moradia unifamiliar tipologia 4, de dois pisos, com pátio exterior e garagem, situada junto ao ..., com boas condições habitacionais e que, no dia da visita domiciliária, se encontrava devidamente higienizada e organizada. 35.No pátio relvado da casa existe um canil que acolhe dois cães do proprietário e uma casota que acolhe o cão de D. CC. 36.No piso superior situam-se os quartos de dormir, incluindo o quarto destinado à AA e onde a jovem AA já pernoitou. 37.Trabalha desde junho de 2024 na Churrasqueira “...” de que é proprietário o Senhor EE, seu companheiro. Referiu ter como remuneração mensal entre 800,00 a 1000,00 euros. O senhor EE ‘explora’ a churrasqueira há cerca de dez anos, quando veio da ... (onde tinha negócio semelhante “...”). 38.O SISS (Sistema de Informação da Segurança Social) menciona remuneração base mensal: 870,00€. 39.Consta ainda da comunicação do SIATT junta aos autos em 28-02-2025 que: « (…) No dia 04 de fevereiro de 2025 foi realizado serviço externo com o objectivo de realizar visita domiciliária ao apartamento onde D. CC habitou até à sua saída em 28 de janeiro. Os senhorios informaram que: 1. A arrendatária tinha deixado o apartamento num estado miserável de sujidade e alguma degradação dos materiais e espaços, sendo notória a falta de limpeza e higiene da casa: restos de gordura, acumulação de pó, denotando desmazelo no cuidado. Mais afirmaram que tinham sido deixados dejectos no wc. De tal forma que até aquele dia já tinha andado uma mulher duas tardes lá em casa a limpar: «em quatro anos, nunca fez uma limpeza…» (sic), mostrando a sua indignação quanto à falta de higiene. 2. Referiram ainda que a saída de D. CC da casa foi conflitual e apenas o conseguiram ao fim de dois anos e que teve que ser através de advogado. E que tinham sido alvo de ameaças por parte da arrendatária: “olhe que não sabe do que sou capaz” (sic). 3. Mais contaram que, no final do mês (presumivelmente dezembro 2024) D. CC foi a casa deles chorar, pedir para a deixarem ficar. Pela roupa que trazia vestida pareceu-lhes que estava grávida, o que lhe perguntaram, ao que respondeu que ainda não sabia… 4. Acrescentaram que tinham queixas dos vizinhos sobre maus cheiros, ladrar de cão e miar de gato: «aqui no prédio ninguém gostava dela…» (sic) 5. Sobre o gato, referiram que a dado momento D. CC se queixou que ele tinha desaparecido, desconfiava que lho teriam furtado, mais, teria sido uma vizinha (Juíza no Julgado de Paz) que o teria na sua posse. E que ela teria feito queixa na GNR… Nota: relacionado com este tema, os senhorios referiram que o senhor que fez a mudança dos móveis de casa lhes disse que tinham encontrado uma caixa com um gato morto lá dentro… 6. Concluiaram dizendo: «Não posso nem ouvir falar no nome dela…» (sic)». 40. Por despacho de 5 de janeiro de 2022, foram suspensos os convívios da AA com a mãe na CAR, sendo autorizados convívios supervisionado nas instalações da Segurança Social. 41. A AA não quis estar presencialmente com a mãe entre o dia 5 de janeiro de 2022 e a realização do debate judicial ocorrido em 8 e 9 de fevereiro de 2022. 42. A AA sente vergonha da mãe e tristeza pela forma agressiva como trata as Técnicas da CAR. 43. Bem como por ter acampado à frente da CAR. 44. E por ter rondado a escola que a AA frequenta. 45. AA pretende continuar acolhida na CAR onde se encontra, que considera como sendo a sua “casa”. 46. A mãe da AA está incompatibilizada com a avó materna, bem como com a tia materna da AA, de nome FF. 47. A avó materna reside num T3, com o companheiro, recebe RSI e trabalha em limpezas. 48. A avó materna padece de doença psiquiátrica. 49. O avô materno está em tratamento por dependência de estupefacientes há quinze anos e está incompatibilizado com a avó materna. 50. A mãe, em julho de 2020, publicou fotografias da filha em roupa de banho e de dormir, na rede social Facebook, expondo-a a comentários de utilizadores identificados como de sexo masculino, como “gostosa linda”, “melhor foto tas toda sexy”, “já aguentas?”, “já tes comichão”, “mostra me tudo amoras”, “posso comer as duas”, “já aguentavas”, “fudia as duas devagarinho e com vaselina”, “gostosas”, “vivo sozinho fica entre nós três o teu contact”, “andas cheia de tesão devagarinho entra”, “abre mostra me cona”, “foda as duas fica entre nós”, “já engolia a jija”, “gostei dessa tás linda”. 51. No âmbito do processo de acompanhamento de maior nº 738/21...., que correu termos no Juiz 3 do Juízo Local Cível de Coimbra, CC foi nomeada acompanhante de GG. 52. A mãe sempre recusou e continua a recusar qualquer intervenção da Segurança Social ou do Tribunal. 53. A mãe passou, pelo menos, uma noite num hotel da ..., acompanhada da AA e de HH, tendo dormido os três na mesma cama, sendo esta uma das duas vezes em a AA esteve com HH. 54. A II, nascida a ../../2009, foi sinalizada à CPCJ por diversas vezes, designadamente em 2011 e 2016, por negligência parental nos cuidados básicos de higiene habitacional por parte de progenitora, tendo esta beneficiado, entre abril de 2011 e novembro de 2013, de sucessivas medidas de apoio junto dos pais, que nunca se revelaram eficazes por falta absoluta de colaboração da progenitora que se mostrou sempre reticente a qualquer intervenção, por não reconhecer a necessidade da mesma. 55. Em julho de 2020, após nova sinalização por parte de uma vizinha, foi reavaliada a situação por parte da EMAT, confirmando-se, não obstante a postura de resistência da progenitora, que a casa se encontrava completamente degradada, sem higienização, com cheiro nauseabundo e roupa espalhada por todo o lado, não dando para perceber onde mãe e filha dormem. Era quase impossível entrar nos quartos, sem pisar as peças de roupa, peluches entre outras coisas que se encontravam no chão. 56. Na sequência de tal visita, e face, designadamente, à absoluta falta de salubridade da habitação, foi aplicada, a 01/10/2020, medida provisória de acolhimento residencial, tendo sido, a 02/03/2022, proferida sentença na sequência da realização de debate judicial. 57. Realizada perícia psicológica à progenitora e ouvida a perita em sede de debate judicial para prestar esclarecimentos sobre a mesma, esta concluiu pela existência de um modelo de vinculação insegura-evitante e esclareceu que a progenitora não consegue ter um relacionamento afetivo com outras pessoas, apresentando-se esta característica com um risco para o exercício da parentalidade. Reconheceu ainda em sede de debate a subscritora da perícia que a progenitora poderia sofrer de mania da perseguição e de incapacidade para aceitar ajuda e que é natural que precise da filha como compensação para si própria, podendo tais comportamentos configurar risco ao nível do exercício da parentalidade. 58. Ao longo de todo o tempo de acolhimento, a progenitora da menor tem mantido uma postura de agressividade com todos os técnicos, mantendo igualmente uma vida de grande instabilidade. 59. Manteve alguns aos comportamentos desadequados com os técnicos da CA e com a filha, como impor a sua presença em frente à escola que esta frequenta, fazendo exercício físico, deixando a AA envergonhada e sujeita aos comentários dos colegas. Estas atitudes têm gerado alguns conflitos entre ambas e têm levado a AA a não pretender estar com a mãe, situações que levaram várias vezes a visitas supervisionadas e à intervenção do CEIFAC orientada para a promoção do convívio salutar da AA com a mãe. 60. Não obstante os esforços nesse sentido e apesar dos diversos problemas de articulação entre a progenitora, os técnicos da Casa e do SATT, a jovem tem mantido alguns períodos de convívio com a mãe, mantendo embora, no momento atual, alguma resistência a ali pernoitar. 61. A AA é atleta de atletismo, filiada na Federação Portuguesa de Atletismo, com o nr de registo ...24, pelo clube “...”, através da sua seção de atletismo “...”, competindo no escalão Sub 18 (Juvenis), uma vez que nasceu no ano de 2009. 62. A AA já é campeã distrital de ... (tendo já sido convocada para representar a seleção distrital de ..., em competições de âmbito nacional), de provas de resistência em pista, de corridas de velocidade e barreiras, de provas de salto em altura e triplo salto, tanto no ano passado, quando ainda era atleta do escalão sub 16 (iniciados), como na presente época, como sub 18 (juvenis). 63. A AA tem 15 anos de idade, e exibe suficiente discernimento e capacidade de compreensão para procurar construir (e construir-se) em torno daquilo que foram as suas vivências anteriores ao acolhimento e as experiências de vida que, após o acolhimento, lhe são proporcionadas. 64. A equipa técnica da CAR continua a desenvolver as tarefas e assumir as responsabilidades que lhe estão atribuídas, mantendo-se a perspectiva de que a AA tem mantido um ‘percurso de acolhimento positivo e favorável ao seu bom desenvolvimento e bem-estar, educação e formação, saúde e segurança. 65. A jovem AA mantém um comportamento adaptativo ao contexto de acolhimento, havendo uma evolução positiva e favorável ao seu melhor desenvolvimento, por existência de um quadro quotidiano regrado, estável, consistente, organizado, previsível e confiável, sendo simultaneamente espaço de interacções e afectos positivos, tendo como modelo, agora, as figuras de referência na Casa. 66. A AA beneficia de um ambiente regulado e regulador, coerente, contentor e afectivo, onde regras e limites definidos proporcionam e permitem, simultaneamente, a liberdade de poder pensar e pensar-se. 67. A AA não apresenta dificuldades a nível de saúde. 68. Mantêm-se as saídas da CAR para junto de familiares: as tias maternas FF e JJ e a avó materna, de acordo com o determinado pelo Tribunal. 69. Que são apreciadas pela jovem de modo positivo. 70. Mas são fonte de perturbação e inquietude para a mãe. 71. Após o Natal de 2022, os convívios da AA com a mãe ficaram dependentes da vontade da jovem e, de algum modo, da possibilidade de mãe exibir atitudes e comportamentos que pudessem ser mais colaborativos e menos complicativos de modo a poder resgatar a relação maternal e filial em causa. 72. A AA pretende manter-se na Casa de Acolhimento, sendo que após o período de tempo em que decorreram momentos de maior proximidade à mãe e com a mãe, a jovem expressou descontentamento e desinvestimento – nomeadamente para a experiência de férias junto da mãe. 73. Dando assim sinal do que ela própria foi sentindo ao longo do tempo: de que a possibilidade de confiar é reduzida e de que a mudança que parecia existir se esfuma perante a manutenção de um tipo de relação e comunicação por parte da mãe que a desagrada. 74. Ao longo do tempo de execução da medida e desde a sua integração na Residência ..., a AA tem mantido comportamento e atitudes ajustadas ao contexto, cumprindo as regras e preservando sentimento de ligação à Casa. 75. É considerado que a AA mantém uma disposição de incerteza e confiança reduzida relativamente à mãe, devido a acontecimentos passados e recentes na sua história de vida. 76. A mãe mantém, ainda que nesta fase se tenha atenuado, uma atitude de beligerância acusatória relativamente a procedimentos internos e modos de funcionamento quase constante com a equipa técnica da CAR, em particular com a Directora Técnica, Dra. KK.» ([10]). 
 D) Aspeto jurídico do recurso Ante o que a Recorrente (progenitora da jovem AA) reiteradamente invoca nestes autos, mormente na peça recursiva, logo se constata que a mesma pretende que a filha – esta agora já com 16 anos de idade – seja devolvida à casa materna, para viver junto da sua mãe, cessando a medida que lhe vem estando aplicada e que o acórdão recorrido fez subsistir, a de acolhimento residencial, enquanto medida de promoção e proteção. Considera a mãe – não obstante episódios passados – estar agora, afastado todo o perigo, em condições de receber e cuidar adequadamente da filha. Assim não entende o M.º P.º, que defende a confirmação do acórdão recorrido, podendo ler-se na fundamentação da decisão em crise: «(…) atenta a factualidade dada como provada, por um lado, não será de aplicar a medida de apoio junto dos pais, concretizada junto da mãe, pois face aos comportamentos da mãe, o eventual regresso voltaria a colocar a AA novamente numa situação de perigo, e por outro, não se nos afigura que o interesse da AA passe pelo apoio junto de qualquer familiar, quer para a casa da avó materna, quer para a casa das tias maternas, sendo que além do mais a jovem nunca expressou qualquer desejo nesse sentido, sendo sua única e exclusiva vontade permanecer no CAR. Tanto mais que, como decorre até dos factos provados, mantêm-se as saídas da CAR para junto de familiares as tias maternas FF e JJ e a avó materna, de acordo com o determinado pelo Tribunal, e que são apreciadas pela jovem de modo positivo. Aqui chegados, face à conjugação da factualidade dada como provada, não é, pois, possível equacionar uma substituição ou cessação da medida aplicada. Ou seja, justifica-se plenamente a manutenção da medida de acolhimento residencial da jovem AA, aliás, em coerência com o seu projeto de vida. Assim, não obstante a oposição da progenitora, o Tribunal entende que se mantêm os pressupostos que determinaram a aplicação da medida de promoção e proteção de acolhimento residencial nos presentes autos.». Refere, em reforço, o M.º P.º: «(…) apesar de o tribunal ter sempre procurado, na concretização do interesse superior desta jovem, a manutenção de uma relação desta com a mãe, mantém-se a resistência a convívios prolongados, conforme resulta do depoimento (completo) da AA no debate judicial. Parece-nos evidente que a mesma continua a considerar que os comportamentos da mãe em relação a si e às pessoas de quem gosta, desde logo as técnicas e colegas da CA, lhe continuam a causar mal-estar e sofrimento. Não faltaram ao longo de todos estes anos tentativas de intervenção técnica junto da progenitora da AA, e anteriormente de ambos os pais, para tentar por termo ao padrão de negligência parental sucessivamente sinalizado, com sucessivas medidas de apoio junto dos pais, medidas que nunca se revelaram eficazes por falta absoluta de colaboração da progenitora que se mostrou sempre reticente a qualquer intervenção, por não reconhecer a sua necessidade. Todos os factos constantes da decisão recorrida se encontram, infelizmente, comprovados nos autos, sendo que muitos deles, designadamente os respeitantes às circunstâncias que levaram ao acolhimento da AA (que esta considerou, na carta a que fizemos referência, pecar por tardio), foram já dados como provados no acórdão de 02/03/2022, já transitado em julgado e no qual se concluiu pela necessidade de aplicação da mesma medida de promoção e proteção. Relativamente às mudanças operadas na vida da recorrente e que parece resultar das alegações de recurso, embora tal não tenha sido pedido, deverem justificar uma imediata mudança da AA para ir viver com a mãe, há que dizer que são muito recentes e que, em face do padrão de instabilidade relacional, ocupacional e habitacional retratado nos autos, há dúvidas fundadas relativamente à sua consolidação. O que, sem embargo, se deseja, assim como se deseja que a recorrente perceba, finalmente, que necessita de ajuda para recuperar a confiança da filha e possibilitar o alargamento dos convívios com esta e uma eventual integração no seu agregado. A este propósito há, no entanto, que chamar a atenção para o ponto 39 da matéria de facto provada, relativamente a circunstâncias bastante recentes da vida da recorrente e das quais resulta que esta mantém os comportamentos que levaram ao acolhimento da filha.». Tal facto 39 reporta-se a uma comunicação do SIATT junta aos autos em 28-02-2025 aludindo a que: “No dia 04 de fevereiro de 2025 foi realizado serviço externo com o objectivo de realizar visita domiciliária ao apartamento onde D. CC habitou até à sua saída em 28 de janeiro”. Tendo os senhorios informado, segundo tal comunicação, que: «1. A arrendatária tinha deixado o apartamento num estado miserável de sujidade e alguma degradação dos materiais e espaços, sendo notória a falta de limpeza e higiene da casa (…). Mais afirmaram que tinham sido deixados dejectos no wc. De tal forma que até aquele dia já tinha andado uma mulher duas tardes lá em casa a limpar (…). 2. (…) a saída de D. CC da casa foi conflitual e apenas o conseguiram ao fim de dois anos e que teve que ser através de advogado. E que tinham sido alvo de ameaças por parte da arrendatária: “olhe que não sabe do que sou capaz”. 3. (…) no final do mês (presumivelmente dezembro 2024) D. CC foi a casa deles chorar, pedir para a deixarem ficar. Pela roupa que trazia vestida pareceu-lhes que estava grávida, o que lhe perguntaram, ao que respondeu que ainda não sabia… 4. (…) tinham queixas dos vizinhos sobre maus cheiros, ladrar de cão e miar de gato (…). 5. Sobre o gato, referiram que a dado momento D. CC se queixou que ele tinha desaparecido, desconfiava que lho teriam furtado, mais, teria sido uma vizinha (Juíza no Julgado de Paz) que o teria na sua posse. E que ela teria feito queixa na GNR…». Ora, contrariamente à posição tomada pela Recorrente, este circunstancialismo, assim vertido, é recente, deixando transparecer um padrão de conduta que, emergindo do passado, ainda encontra ecos no presente (ou passado muito próximo). De não esquecer, nem negligenciar, as caraterísticas de personalidade da mãe da jovem, bem percetíveis no ponto 57 dos factos provados (complementado, quanto a comportamentos significativos, pelos pontos 58 e 59). Padrão esse claramente nocivo para a menor, agora uma jovem de 16 anos, com uma vontade já vincada, embora ainda com uma personalidade em formação/desenvolvimento. Assim, a jovem, não ignorando nem esquecendo o que – de menos positivo – já passou na vida (cfr., designadamente, factos 50 a 56), sabe bem o que quer (para o presente e para o futuro) e verbaliza-o sem equívocos. Como resulta do aludido facto 57, realizada perícia psicológica à progenitora e ouvida a perita em sede de debate judicial, a conclusão pericial foi no sentido da “existência de um modelo de vinculação insegura-evitante”, com a progenitora a não conseguir ter “um relacionamento afetivo com outras pessoas, apresentando-se esta característica com um risco para o exercício da parentalidade”. A jovem mantém uma “disposição de incerteza e confiança reduzida relativamente à mãe, devido a acontecimentos passados e recentes na sua história de vida” (facto 75). “Não pretende pernoitar em casa da mãe, porque é complicado estar com a mãe …” (cfr. ata de debate judicial de 03/03/2025, a fls. 474 do processo físico). Bem se compreende que pretenda “manter-se na Casa de Acolhimento” (facto 72), onde está integrada, com um percurso de sucesso nos estudos, em ambiente seguro e que propicia o seu desenvolvimento adequado, sem descurar, todavia, na medida em que benéficos, os contactos com elementos da sua família, incluindo a mãe. Todavia, ante a história de vida da menor, tal como se pode retirar dos factos provados, e a sua vontade manifestada, reflexo de uma capacidade constatada de ponderação e autodeterminação, deve tal vontade, fundamentada e séria, ser também respeitada, por ser ainda subsistente o perigo anteriormente identificado (e que motivou a intervenção do Estado/aparelho de justiça), tudo sem prejuízo – reitera-se – dos contactos existentes com a mãe e outros elementos da sua família alargada. Como é consabido, dispõe o art.º 4.º da LPCJP ([11]) que a intervenção externa deve ser orientada por diversos princípios, de que se salientam os seguintes: «a) Interesse superior da criança e do jovem – a intervenção deve atender prioritariamente aos interesses e direitos da criança e do jovem, nomeadamente à continuidade de relações de afeto de qualidade e significativas, sem prejuízo da consideração que for devida a outros interesses legítimos no âmbito da pluralidade dos interesses presentes no caso concreto; (…) c) Intervenção precoce – a intervenção deve ser efetuada logo que a situação de perigo seja conhecida; d) Intervenção mínima – a intervenção deve ser exercida exclusivamente pelas entidades e instituições cuja ação seja indispensável à efetiva promoção dos direitos e à proteção da criança e do jovem em perigo; e) Proporcionalidade e atualidade – a intervenção deve ser a necessária e a adequada à situação de perigo em que a criança ou o jovem se encontram no momento em que a decisão é tomada e só pode interferir na sua vida e na da sua família na medida do que for estritamente necessário a essa finalidade; f) Responsabilidade parental – a intervenção deve ser efetuada de modo que os pais assumam os seus deveres para com a criança e o jovem; (…) h) Prevalência da família – na promoção dos direitos e na proteção da criança e do jovem deve ser dada prevalência às medidas que os integrem em família, quer na sua família biológica, quer promovendo a sua adoção ou outra forma de integração familiar estável; (…) k) Subsidiariedade – a intervenção deve ser efetuada sucessivamente pelas entidades com competência em matéria da infância e juventude, pelas comissões de proteção de crianças e jovens e, em última instância, pelos tribunais» ([12]). Assim sendo – visto o escopo que presidiu à solução encontrada para o caso –, e por se tratar de uma jovem já com 16 anos de idade, com o necessário grau de maturidade na formação da sua vontade, sedimentando a sua decisão relativamente ao seu presente e ao seu futuro próximo, não merece censura, salvo o devido respeito, o sentido da decisão em crise, por corresponder ao superior interesse da aludida jovem (a menos de dois anos de atingir a maioridade), que se vem integrando favoravelmente no ambiente em que se encontra, em termos de potenciar o seu desenvolvimento integral como pessoa. Não ocorre, pois, violação do princípio da proporcionalidade ou outro relevante para o caso, não podendo dizer-se, perante os factos apurados, que esteja afastada uma situação de perigo atual em caso de entrega/confiança à mãe, não se logrando estabelecer, nesta altura, um prognóstico favorável em termos de estabilidade e segurança junto da progenitora. Não se esqueça que vem provado – com atualidade – que a Recorrente/mãe, em postura não cooperante e reativa, sempre recusou e continua a recusar qualquer intervenção da Segurança Social ou do Tribunal (facto 52). Por isso, também não se demonstra violação que algum princípio ou norma de cariz constitucional, como os invocados art.ºs 36.º, n.ºs 5 e 6, e 205.º, n.º 1, da Constituição, que a Recorrente menciona mas cuja violação não fundamenta/esclarece. Aliás, a referência tem de ser sempre, neste campo, não um interesse egoístico de qualquer dos progenitores, mas – exclusivamente – o interesse do menor, a parte mais débil na relação familiar complexa e conflitual, que precisa de cada um dos seus pais, enquanto figuras essenciais de referência e apoio, se lho puderem dar/aportar ([13]), ou, na falta deste, de um ambiente adequado de segurança, estabilidade, afetividade e motivação, em modo de necessária substituição. Importa é garantir que a pessoa menor possa beneficiar de uma esfera segura e gratificante, que lhe permita desenvolver as suas potencialidades e, desde logo, não estar sujeita ao perigo aludido, que se poderia transformar em dano. Ora, é esse dano que o superior interesse da criança e do jovem impõe que se procure evitar ([14]), no caso através de medida adequada, se necessário através do afastamento temporário da família, a qual, lamentavelmente, não mostra condição, por agora, para cumprir adequadamente os seus deveres para com a dita menor. E é essa promoção – pelo lado positivo – de condições para um adequado desenvolvimento integral que ao Estado cumpre garantir, no seio da família, se possível, ou em esfera alternativa temporária segura, se necessário. Essa necessidade mostra-se presente in casu e a medida adotada comporta adequação e atualidade perante os contornos da situação e as necessidades da jovem. Por isso, foram observados os ditos princípios essenciais, mormente da proporcionalidade, atualidade e prevalência do superior interesse do menor. Tudo para concluir, assim, pela improcedência do recurso, não se notando qualquer violação de lei. *** IV – Sumário ([15]): (…) ***V – Decisão Pelo exposto, acordam os juízes deste Tribunal da Relação, na improcedência da apelação, em manter a decisão recorrida. Custas da apelação pela Recorrente (vencida no recurso), sem prejuízo do benefício do apoio judiciário. Escrito e revisto pelo relator – texto redigido com aplicação da grafia do (novo) Acordo Ortográfico da Língua Portuguesa (ressalvadas citações de textos redigidos segundo a grafia anterior). Coimbra, 30/09/2025 Vítor Amaral (Relator) Luís Cravo (1.º Adjunto) Carlos Moreira (2.º Adjunto) 
 ([5]) É pacífico o entendimento de que a fundamentação insuficiente ou deficiente da sentença não constitui causa de nulidade da decisão, embora justifique a sua impugnação mediante recurso, mas apenas a falta absoluta da respetiva fundamentação. Com efeito, a causa de nulidade referida na al. b) do n.º 1 do dito art.º 615.º do NCPCiv. ocorre quando o tribunal julga procedente ou improcedente um pedido, mas não especifica quais os fundamentos de facto ou de direito que foram relevantes para essa decisão, violando o dever de motivação ou fundamentação das decisões judiciais (cfr. art.º 208.º, n.º 1, CRPort., e art.º 154.º, n.º 1, do CPCiv. aplicável). Como refere, a este propósito, Teixeira de Sousa – cfr. “Estudos  sobre o Processo Civil”, pág. 221 –, “o dever de fundamentação restringe-se às decisões proferidas sobre um pedido controvertido ou sobre uma dúvida suscitada no processo (...) e apenas a ausência de qualquer fundamentação conduz à nulidade da decisão (...); a fundamentação insuficiente ou deficiente não constitui causa de nulidade da decisão, embora justifique a sua impugnação mediante recurso, se este for admissível”. Também Lebre de Freitas – cfr. Código de Processo Civil, pág. 297 – esclarece que “há nulidade quando falte em absoluto indicação dos fundamentos de facto da decisão ou a indicação dos fundamentos de direito da decisão, não a constituindo a mera deficiência de fundamentação”. Por sua vez, Alberto dos Reis já ensinava – cfr. Código de Processo Civil Anotado, vol. V, pág. 140 – que deve distinguir-se “a falta absoluta de motivação da motivação deficiente, medíocre ou errada. O que a lei considera nulidade é a falta absoluta de motivação; a insuficiência ou mediocridade da motivação é espécie diferente, afeta o valor doutrinal da sentença, sujeita-a ao risco de ser revogada ou alterada em recurso, mas não produz nulidade. Por falta absoluta de motivação deve entender-se a ausência total de fundamentos de direito e de facto”. ([7]) Cfr. Manual dos Recursos em Processo Civil, 9.ª ed., p. 57. |