| Acórdão do Tribunal da Relação de Coimbra | |||
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| Nº Convencional: | JTRC | ||
| Relator: | CARLOS MOREIRA | ||
| Descritores: | OMISSÃO DE PRONÚNCIA TÍTULO EXECUTIVO OBRIGAÇÃO PLURAL OBRIGAÇÃO CONJUNTA PAGAMENTO | ||
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| Data do Acordão: | 09/16/2025 | ||
| Votação: | UNANIMIDADE | ||
| Tribunal Recurso: | TRIBUNAL JUDICIAL DA COMARCA DE CASTELO BRANCO – IDANHA-A-NOVA – JUÍZO DE COMPETÊNCIA GENÉRICA | ||
| Texto Integral: | S | ||
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| Meio Processual: | APELAÇÃO | ||
| Decisão: | CONFIRMADA | ||
| Legislação Nacional: | ARTIGOS 516.º, 519.º, 524.º DO CÓDIGO CIVIL ARTIGO 615.º, N.º 1, AL. D) E 846.º DO CÓDIGO DE PROCESSO CIVIL | ||
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| Sumário: | I - Só existe nulidade por excesso ou omissão de pronúncia se a decisão extravasa ou omite pronúncia relativamente ao objeto decidendo introduzido pelas partes e não já quando há invocação ou omissão de argumento ou razão por elas não aduzido ou aduzido. II - No processo executivo, cujo título executivo encerre uma obrigação plural de cariz não solidário, mas apenas conjunto, o pagamento voluntário, feito só por um dos co- obrigados, para solver toda a dívida ou que exceda o valor da sua quota de responsabilidade, é possível – artº 846º nº1 do CPC; e, se essa for a vontade manifestada, aproveita – vg. para o efeito de cessação dos juros moratórios e da sanção compulsória do artº 829º-A do CC - aos demais executados; sem que, porém, o pagante - versus o que sucede nas obrigações solidárias: artº 524º do CC – fique com qualquer direito de reembolso sobre estes pelo que pagou em excesso. (Sumário elaborado pelo Relator) | ||
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| Decisão Texto Integral: | Relator: Carlos Moreira Adjuntos: João Moreira do Carmo Fernando Monteiro * ACORDAM OS JUÍZES NO TRIBUNAL DA RELAÇÃO DE COIMBRA 
 
 1. No processo em epígrafe foi proferido o seguinte despacho: 
 Reclamação das notas de honorários e despesas do Agente de Execução, datada de 22/11/2024, com a ref.ª Citius 3796718. 
 «Por via do requerimento em referência, vieram os executados, AA, BB e CC, pugnar, a final, pela revisão das notas discriminativas apresentadas e datadas de 14/11/2024. Invocam, para o efeito, não ter o Sr. Agente de Execução dado cabal cumprimento ao decidido no ponto iii) do despacho proferido em 02/11/2024, …na medida em que o valor voluntariamente depositado pelos executados - 202,094,84 € -, em 31/01/2024, não se mostra imputado aos valores devidos e da responsabilidade de cada um, isto porque o Sr. Agente de Execução eliminou a informação referente às quantias voluntariamente entregues pelos executados, surgindo os campos correspondentes a zeros (cf. rubricas n.ºs 4, 5 e 6 das notas discriminativas apresentadas). Notificados, os exequentes pugnam pela manutenção das notas discriminativas tal como apresentadas, na medida em que não pode o pagamento voluntário ser imputado à divida de CC, não podendo, consequentemente, suspender-se a contabilização de juros. Por fim, veio o Sr. Agente de Execução pronunciar-se nos seguintes termos: «A conta ora apresentada foi elaborada nos termos da douta decisão proferida, com os limites temporais ali definidos. Sendo certo que, como resulta da conta, os executados somente pagaram parte da quantia exequenda e não a sua totalidade. Desta forma a parte não paga deveria continuar a vencer juros até efetivo e integral pagamento. Mas, como superiormente determinado somente foram calculados juros e juros moratórios até 31.01.2024. Consideramos pois não assistir razão aos executados, que, pelo contrário, estão beneficiados com a presente conta. Quanto à parte solidária a decisão que se executa é constituída por duas partes, uma solidária e uma da responsabilidade individual, e, como tal, foi elaborada. Quanto ao facto de as contas individuais estarem a zero na parte dos pagamentos voluntários tal facto prendesse exclusivamente com o facto de não tendo sido feitos pagamento por todos os executados, mas somente por dois, e tendo de ser imputado a cada um o valor total (mas não pago) não se pode referir pagamento voluntário do executado, nem a aplicação o admite. Assim, optou-se por colocar a zero tal item, mas que não influencia a conta final, na qual foi retirado a cada executado o valor já entregue». Cumpre apreciar e decidir. Antes de mais, e pese embora não seja o objeto da reclamação ora em apreço, impõe-se uma nota prévia no que tange aos juros de mora. Os juros de mora são devidos até que a quantia exequenda se mostre integralmente paga, devendo ser contabilizados sob o capital em dívida. É esse, como não podia deixar de ser, o sentido do despacho que antecede. Naquela sede, é determinado que sejam contabilizados juros de mora até ao dia 31/01/2024, sob a totalidade da dívida, isto porque, a partir dessa data, a quantia exequenda se mostra parcialmente paga pelos executados. Assim, a partir do dia 31/01/2024, devem ser contabilizados juros de mora apenas sob o capital efetivamente em dívida - após consideração do valor voluntariamente entregue pelos executados, a saber, 202,094,84 €, uma vez que o valor pago é insuficiente para liquidar integralmente a quantia exequenda. Ora, quando no despacho que antecede se refere que: «Dispõe o artigo 846.º, n.º 1, do Código de Processo Civil, do seguinte modo: «Em qualquer estado do processo pode o executado ou qualquer outra pessoa fazer cessar a execução, pagando as custas e a dívida». Dos autos resulta que os executados, BB e AA, por requerimento datado de 31/01/2024, …comprovaram a entrega voluntária da quantia global de 202,094,84 € (duzentos e dois mil noventa e quatro euros e oitenta e quatro cêntimos). Ora, cessa, como não podia deixar de ser, na data do depósito pelo executado, a mora para efeitos de liquidação de juros», é sob a quantia global que não podem vencer juros de mora por inexistência de fundamento legal, devendo, naturalmente, continuar a vencer-se juros sob o capital que permanece em dívida, assistindo, nesta parte, razão ao Sr. Agente de Execução. Prosseguindo. Compulsadas as Notas discriminativas de honorários e despesas apresentadas pelo Sr. Agente de Execução, constata-se que as rubricas assinaladas pelos executados se encontram, de facto, a zeros, sem que se alcance, da resposta apresentada pelo Sr. Agente de Execução, a razão pela qual aqueles campos se mostram por preencher, nem em que medida foi o valor voluntariamente entregue pelos executados considerado nas notas ora apresentadas. Pelas razões que se consignaram em despacho que antecede, datado de 02/11/2024, …e desde logo o depósito voluntário, pelos três executados, em 31/01/2024, da quantia de 202,094,84 € -, deverá esse valor ser imputado aos valores devidos e da responsabilidade de cada um dos executados, devendo essa realidade estar espelhada em cada uma das Notas discriminativas, julgando-se, por isso, procedente a reclamação apresentada pelos executados. Ante o exposto, julgo procedente a reclamação apresentada, e, consequentemente, determino que sejam as Notas Discriminativas de Honorários e Despesas apresentadas pelo Sr. Agente de Execução corrigidas em conformidade, devendo o Sr. Agente de Execução imputar o valor voluntariamente depositado pelos executados - 202,094,84 € -, aos valores devidos e da responsabilidade de cada um dos executados, devendo essa imputação resultar clara das notas discriminativas. Na eventualidade de tal retificação não se mostrar possível em virtude de vicissitude do sistema informático, tal como invocado pelo Sr. Agente de Execução, deverá o mesmo explicar em que medida se encontra o valor voluntariamente entregue pelos executados considerado nas respetivas notas discriminativas ora apresentadas.» 2. Inconformados, DD e outro(s), Exequentes, interpuseram recurso do mesmo. Rematando as suas alegações com as seguintes conclusões: 1/ Resulta da sentença dada à execução (proc. 48/14.8T8IDN ref.ª CITIUS 27363633) que os executados foram condenados a realizar o pagamento de prestações pecuniárias determinadas e individualizadas, a que acresce juros legais e moratórios. 2/ Nas obrigações conjuntas os vínculos obrigacionais dos vários credores e dos vários devedores mostram-se em tudo distintos e independentes uns dos outros, estando cada um deles imune às consequências dos actos ou factos jurídicos praticados pelos restantes credores ou devedores, ou praticados por terceiros, em face destes. 3/ Neste sentido se pronunciou o Acórdão do Tribunal da Relação do Porto de 02- 05-1997, relator: Emídio Costa, acessível em www.dgsi.pt: “ III - Por via de regra, nas obrigações conjuntas, a parte de cada um dos devedores ou credores é igual à dos restantes, mas nem sempre assim sucede porque essa igualdade não é essencial à conjunção. Traço característico da conjunção é que cada vínculo, uma vez constituído, possui vida autónoma, em que os factos relativos a cada um dos credores ou dos co-obrigados não exercem efeito sobre as restantes obrigações.” 4/ A natureza jurídica da obrigação conjunta é reconhecida pelos próprios executados no requerimento que apresentaram em 11-04-2024, (ref.ª CITIUS 3563170) quando escrevem: “as obrigações de cada um dos executados não são solidárias quanto à sua natureza, é certo”. 5/ Em 31-01-2024 os executados, AA e BB, deram conhecimento ao Tribunal através de requerimento com a ref.ª CITIUS 2489616 de que haviam transferido as importâncias de €167.039,59 e €35.056,25, respectivamente, para a conta do agente de execução, juntando as cópias dos talões de multibanco. 6/ A quantia de €202,094,84 foi calculada de forma avulsa pelos próprios executados, sem qualquer confirmação pelo agente de execução ou correspondência com alguma conta que este tivesse enviado a estes. 7/ Pretendendo os dois executados que o pagamento que efectuaram fosse considerado como tendo sido feito em nome e por conta dos três executados. 8/ Pretensão que o Tribunal a quo apreciou declaradamente no despacho recorrido ao eleger como essencial a resposta a dar à questão da natureza jurídica da obrigação exequenda. 9/ O Tribunal a quo, ao determinar que “(…) o depósito voluntário, pelos três executados, em 31/01/2024, da quantia de 202,094,84€ -, deverá esse valor ser imputado aos valores devidos e da responsabilidade de cada um dos executados, devendo essa realidade estar espelhada em cada uma das Notas discriminativas (…)” apreciou ex novo matéria de facto sobre a qual já incidiu juízo de mérito anterior, atribuindo à obrigação uma natureza solidária. 10/ Ou seja, o modo de pagamento feito pelos exequentes não se mostra titulado, nem pela sentença do processo de prestação de contas (proc. 48/14.8T8IDN ref.ª CITIUS 27363633), nem pelo acórdão do Supremo Tribunal de Justiça, (proc. 48/14.8T8IDN-A), pois estes arestos não condenam os aí executados no pagamento em regime de solidariedade. 11/ Pelo que o despacho recorrido, ao contrariar outra decisão judicial, que lhe é anterior, transitada em julgado, é ilegal porque ofende o caso julgado (arts. 619.º e 620.º do Cód. Processo Civil). 12/ Devendo o despacho recorrido ser declarado nulo nos termos do artigo 615º n.º 1, alínea d) do Cód. Processo Civil. 13/ Devendo ser reconhecido que o executado, EE, por não ter efectuado qualquer pagamento da quantia exequenda, permanece devedor do capital, bem como dos juros legais e compulsórios os quais deverão ser contabilizados desde 27/04/2016 até efectivo e integral pagamento, tudo conforme os termos constantes da sentença de prestação de contas e do Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça. 14/ A decisão do Tribunal recorrido, ao alterar a natureza da obrigação dos executados de conjunta para solidária, deu origem à apresentação, pelos executados, de sucessivas reclamações da nota de honorários e despesas, devido à impossibilidade, já declarada pelo agente de execução, de consignar um pagamento cujo valor desconhece na conta de um executado que nada pagou. 15/ De facto, os executados optaram por nunca informar o Tribunal sobre qual o montante, do valor global de €202.094,84, que consideram ter pago por conta do terceiro executado, EE. 16/ A decisão recorrida ao considerar um pagamento parcial como tendo sido efectuado por todos os executados, impede a correcta actualização da quantia exequenda por parte do agente de execução, e liquidação das responsabilidades dos três executados, em virtude de o sistema não permitir. 17/ Consequentemente é de censurar a decisão do Tribunal a quo, o qual, confrontado com as consequências da incongruência da decisão tomada com violação de caso julgado empurra para o agente de execução a apresentação de uma solução para uma decisão errada e nula: “na eventualidade de tal rectificação não se mostrar possível em virtude do sistema informático, tal como invocado pelo Sr. agente de execução, deverá o mesmo explicar em que medida se encontra o valor voluntariamente entregue pelos executados considerado nas respectivas notas discriminativas ora apresentadas”. 18/ Bem sabendo de antemão o Tribunal recorrido que o agente de execução não pode considerar os ditos valores nas notas discriminativas devido aos motivos já por este expostos em 21-01-25: “tal facto prende-se exclusivamente com o facto de não tendo sido feitos pagamento por todos os executados, mas somente por dois, e tendo de ser imputado a cada um o valor total (mas não pago) não se pode referir pagamento voluntário do executado, nem a aplicação o admite.” 19/ Assiste-se a um ziguezaguear entre o Tribunal que persiste na aplicação de uma decisão errada e o agente de execução que se vê impossibilitado de apresentar uma nota discriminativa de honorários e despesas nos termos do prolatado no despacho. 20/ Situação, que tem sido aproveitada pelos executados, os quais, embora reconhecendo que a obrigação é conjunta e, não, solidária, preferiram, com o beneplácito do Tribunal recorrido, prevalecer-se duma decisão nula, para com isso obstaculizarem o andamento normal do processo e liquidarem as suas responsabilidades, apresentando ao invés, sucessivas reclamações da nota de honorários e despesas, “invocando (…) não ter o sr. Agente de execução dado cabal cumprimento ao decidido no ponto iii) do despacho proferido em 02/11/2024, (…) na medida em que o valor voluntariamente depositado pelos executados – 202,094,54€ - em 31/01/2024, não se mostra imputado aos valores devidos e da responsabilidade de cada um (…)” 21/ Os exequentes não concordam com o trecho decisório infra quando se refere à contabilização apenas de juros de mora sobre o capital efectivamente em dívida: “Assim, a partir do dia 31/01/2024, devem ser contabilizados juros de mora apenas sob o capital efetivamente em dívida - após consideração do valor voluntariamente entregue pelos executados, a saber, 202,094,84 €, uma vez que o valor pago é insuficiente para liquidar integralmente a quantia exequenda.” 22/ Salvo melhor entendimento, sobre o capital em dívida deverão ser contabilizados, não apenas os juros legais, mas também, os juros compulsórios, no cumprimento do decidido no Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça. 23/ Executando-se obrigação pecuniária, a liquidação dos juros compulsórios pelo agente de execução deve ser feita a final, nos termos do art.º 716.º, n.º 3, do Cód. Processo Civil, não dependendo de requerimento do exequente, nem de qualquer outro pressuposto ou condição para além do trânsito em julgado da sentença que condene o devedor no cumprimento de obrigação pecuniária. 24/ Os juros compulsórios correspondentes à sanção legal prevista no art.º 829.º-A, n.º 4, do Código Civil não gozam da regra de precipuidade (cf. art.º 541.º do Cód. de Processo Civil), pelo que só podem ser pagos pelo executado, competindo ao agente de execução, após liquidação de tais juros, notificar o executado dessa liquidação, para que este proceda ao pagamento no prazo que lhe for fixado (art.º 716.º, n.º 3, do CPC). 25/ Pelo que o Tribunal a quo ao decidir contabilizar apenas juros de mora sobre o capital em dívida, pronunciou-se sobre questão de que não podia conhecer, porque já estava decidida com trânsito, no caso, o prolatado no Acórdão do supremo Tribunal de Justiça, ferindo o despacho recorrido de nulidade nos termos do artigo 615º n.º 1, alínea d) do Cód. Processo Civil. NESTES TERMOS E NOS MELHORES DE DIREITO, QUE V.ª EXAS. SABIAMENTE SABERÃO SUPRIR, DEVE SER DADO PROVIMENTO AO PRESENTE RECURSO, DECLARANDO-SE NULO O DOUTO DESPACHO RECORRIDO POR OFENSA DE CASO JULGADO, SUBSTITUINDO-SE POR OUTRO QUE DECLARE QUE SENDO A OBRIGAÇÃO CONJUNTA, OS PAGAMENTOS EFECTUADOS PELOS EXECUTADOS AA E BB, SEJAM LEVADOS APENAS ÀS SUAS RESPECTIVAS CONTAS, E BEM ASSIM, QUE O EXECUTADO, EE, POR NÃO TER EFECTUADO QUALQUER PAGAMENTO DA QUANTIA EXEQUENDA, PERMANECE DEVEDOR DO CAPITAL, BEM COMO DOS JUROS LEGAIS E COMPULSÓRIOS EM QUE FOI CONDENADO, OS QUAIS DEVERÃO SER CONTABILIZADOS DESDE 27-04-2026 ATÉ EFECTIVO E INTEGRAL PAGAMENTO, TUDO CONFORME OS TERMOS CONSTANTES DA SENTENÇA DE PRESTAÇÃO DE CONTAS E DO ACÓRDÃO DO SUPREMO TRIBUNAL DE JUSTIÇA. 
 3. 1ª - Nulidade do despacho, nos termos do artº 615º nº1 al. d) do CPC. 2ª -Obrigação conjunta sem possibilidade de imputação do pagamento aos três executados. 
 4. Apreciando. 4.1. Primeira questão. 4.1.1. O artº 615º do CPC estatui quanto às nulidades da sentença. Como é consabido, as nulidades do citado preceito são meros vícios formais, «handicaps» intrínsecos à própria sentença, em si mesma considerada, que afetam a sua validade/idoneidade/virtualidade na sua idiossincrasia, e enquanto, essencial e primeiro, instrumento jurídico comunicante do processo, o qual se pretende logicamente escorreito e conforme ao objeto do processo tal como delineado pelas partes. E nada tendo a ver e/ou se confundindo com a maior ou menor curialidade ou o erro de direito e o juridicamente interpretado e decidido quanto a tal objeto. Pois que, neste caso, não nos encontramos apenas no mero âmbito formal da emissão/prolação/publicitação da sentença/acórdão, linear e formalmente adequado ao objeto dos autos, mas antes estamos no domínio do jurídico perspetivado ao quid substantivo/material, campo este que apenas admite censura se ao mesmo puder ser assacada ilegalidade. Prescreve o nº1 al. d) de tal preceito que a sentença é nula quando: «O juiz deixe de pronunciar-se sobre questões que devesse apreciar ou conheça de questões de que não podia tomar conhecimento». Este segmento normativo conexiona-se com o estatuído nos arts. 154º e 608º do mesmo diploma, ou seja, com o dever do juiz administrar a justiça proferindo despachos ou sentenças sobre as matérias pendentes – artº 152º - e com a necessidade de o juiz dever conhecer das questões processuais que possam determinar a absolvição da instância, segundo a ordem imposta pela sua precedência lógica. E, bem assim, de resolver todas as questões – e apenas estas questões, que não outras, salvo se de conhecimento oficioso - que as partes tenham submetido à sua apreciação, excetuadas aquelas cuja decisão esteja prejudicada pela solução dada a outras –artº608º. Porém, como é consabido e constituem doutrina e jurisprudência pacíficas, não se devem confundir «questões» a decidir, com considerações, argumentos, motivos, razões ou juízos de valor produzidos pelas partes. A estes não tem o tribunal que dar resposta especificada ou individualizada, mas apenas às pretensões formuladas e aos elementos inerentes ao pedido e à causa de pedir –cfr. Rodrigues Bastos, in Notas ao CPC, 2005, p.228; Antunes Varela in RLJ, 122º,112 e, entre outros, Acs. do STJ de 24.02.99, BMJ, 484º,371 e de 19.02.04, dgsi.pt. 4.1.2. No caso vertente. Clamam os recorrentes que o despacho é nulo, nos termos do artº 615º nº1 al. d) do CPC, por alterar a natureza da obrigação dos executados de conjunta para solidária e por decidir contabilizar apenas juros de mora e não também juros compulsórios. Mas não é assim. Desde logo, e em termos formais teóricos, a nulidade por excesso de pronúncia, atento o supra exposto, inexiste. Na verdade, no despacho conheceu-se apenas do thema decidendum introduzido pela partes, a saber: se o pagamento efetuado pelos dois executados aproveita, ou não, ao terceiro executado. O fundamento ora invocado pelos recorrentes quanto à alteração da natureza da obrigação, apresenta-se, na economia do supra aduzido, apenas como um argumento invocado pelos executados. Mas, como se viu, a desconsideração de um argumento alegado, ou a consideração de algum que o não tenha sido, não fulmina- desde que se contenha dentro da causa de pedir e do objeto decidendo - a decisão de nula, por omissão ou excesso de pronúncia. Depois, mesmo que assim não fosse ou não se entenda, e em termos mais concretos, em função do aduzido na fundamentação do despacho, a alegação recursiva não colhe. Efetivamente, no despacho não se transmutou uma obrigação conjunta em obrigação solidária. Nele apenas se admitiu que o pagamento dos cerca de 202 mil euros deve ser imputado às responsabilidades dos três executados, na sequência do nesse sentido informado e pretendido pelos dois executados depositantes. Desta decisão não se pode retirar, como entendem os recorrentes, que no despacho recorrido e no despacho de novembro de 2024 se decidiu alterar a natureza da obrigação. Pois que uma coisa é esta natureza, relativamente à qual no despacho nada se decidiu, e outra é o pagamento, ademais espontâneo e voluntário, efetuado, e o modo e amplitude da sua imputação. Sendo que, reitera-se, a decisão neste particular quanto ao pagamento em nada bule com aquela natureza. Até porque, como infra melhor se explicitará, nas obrigações plurais, o pagamento, espontâneo e voluntário, pode, independentemente de a obrigação ser solidária ou conjunta, ser livremente efetuado; e, ademais, efetuado não apenas por algum dos devedores, como também por qualquer terceiro. Aliás, os recorrentes confundem e misturam as figuras da ilegalidade e da nulidade, pois que, - conclusões 11 e 12 – tanto afirmam que a decisão é ilegal por ofensa do caso julgado, como alegam que é nula. Mas, como se viu, tais figuras, no seu jaez e efeitos, são diversas e não se confundem ou misturam. In casu, e como se viu, até poderá existir ilegalidade, o que se apreciará infra, mas inexiste nulidade. 
 No atinente à nulidade por se contabilizar apenas juros de mora sobre o capital em dívida, e nada se dizendo sobre juros compulsórios, a sem razão dos arguentes é ainda mais patente. Como se expende no despacho de sustentação, a decisão ora colocada sub sursis não indeferiu os juros compulsórios. Nem sequer deferiu os juros moratórios. A alusão a estes constitui apenas um esclarecimento ou reiteração do já decidido no despacho pretérito de novembro de 2024, que apenas os concedeu até 31.01.2024, data do depósito. Entendido o jaez desta pronúncia nestes termos, obviamente que inexiste qualquer nulidade por excesso de pronúncia quanto aos juros moratórios. E, bem assim, inexiste qualquer nulidade, quer por excesso, quer por omissão de pronúncia, quanto aos juros compulsórios do artº 829-A do CCivil, pois que a pronúncia quanto a estes também já tinha sido emitida em tal despacho. A questão central, e nova, que foi decidida, foi unicamente a imputação dos valores depositados aos três executados. Aliás, não tão nova assim, pois que no despacho de novembro de 2024 já tinha sido decidido no sentido de a imputação dever ser feita nas quotas dos três executados. 
 4.2. Segunda questão. 4.2.1. Liminarmente. Como vem de se referir, e bem vistas as coisas, esta temática já foi decidida no despacho de novembro de 2024, no último parágrafo da decisão atinente aos designados juros civis. E decidida no sentido de, na sequência da vontade manifestada pelos executados nesse sentido, o valor depositado dever ser imputado «nas respetivas (ou seja de todos os executados) responsabilidades». E ali mais se ordenando ao Sr. Agente de Execução a reformulação das notas discriminativas de honorários e despesas, em conformidade com esta decisão. Não se alcançando que sobre este despacho tenha incidido recurso, formou-se caso julgado quanto ao tema, pelo que o presente recurso quedaria inadmissível. 4.2.2. Mas mesmo que assim não fosse ou não se entenda, sempre se dirá o seguinte. Já se viu que a natureza da obrigação não foi alterada. Resta saber se, sendo a obrigação conjunta, o pagamento de um dos co-obrigados/executados apenas pode beneficiar e ser imputado na quota parte respetiva, sem abranger a dos não pagantes, ou pode também ser imputada na quota destes. A resposta, como outrossim do supra expendido já dimana, vai no sentido de se considerar bem fundado e fundamentado o decidido. Certo é que, como defendem os recorrentes e constitui jurisprudência pacífica: « Nas obrigações conjuntas ou parcelares, cada um dos devedores apenas se encontra obrigado á sua parte na prestação total, já que estas obrigações caraterizam-se pela autonomia e independência do vínculo respeitante a cada um dos obrigados de tal modo que os factos relativos a cada um daqueles não produzem qualquer efeito quanto às obrigações dos restantes.» - Ac. TRP de 10.12.2019, p. 4853/16.2T8OAZ-A.P1 in dgsi.pt, como os infra cits. Mas esta regra e efeitos da conjunção apenas valem no lado ativo. Ou seja, nas obrigações plurais conjuntas, versus o que acontece nas obrigações solidárias, o credor não pode exigir a cada um dos co-obrigados mais do que a sua quota parte. Já no lado passivo, e quando o próprio devedor se dispõe espontaneamente a solver a dívida, nada impede, ao menos por via de regra, que apenas um dos co obrigados pague para além da sua parte, e, inclusive, satisfaça in totum o montante devido por todos. É o que resulta da lei, rectius do artº 846.º nº1 do CPC, quando, sob a epígrafe Cessação da execução pelo pagamento voluntário, estatui: «1 - Em qualquer estado do processo pode o executado ou qualquer outra pessoa fazer cessar a execução, pagando as custas e a dívida.» Ora se um qualquer terceiro interessado pode pagar, por igualdade, ou até, maioria de razão – argumento a fortiori - um co obrigado/executado no processo o pode fazer. Assim: «A extinção da acção executiva poderá ocorrer em qualquer estado do processo por acto voluntário do executado ou de terceiro, de índole extrajudicial, sem a participação do agente de execução (art.º 846º do CPC) - Ac. TRC de 07.10.2020, p. 69/09.2TBTND-B.C1. O que também vale para as obrigações plurais. Na verdade: «O pagamento da quantia exequenda por parte do co-executado extinguiu o crédito da exequente, determinando, consequentemente, o fim da execução » - Ac. STJ de 22.02.2017, p. 18/13.3TBVLP-E.G1.S1. O único ou essencial efeito relevante do total pagamento de um co obrigado se em sede de obrigação solidária, se em sede de obrigação conjunta, coloca-se apenas nas relações internas entre os devedores, rectius nos direitos que entre eles lhes assistem. Assim, nas obrigações solidárias, o codevedor pagante, porque não faz mais do que o credor lhe poderia exigir – artº 519º do CCivil - fica com o direito de regresso contra os demais – artº 524º . Já nas obrigações conjuntas, porque o co devedor vai além, de um modo voluntário, do que lhe poderia ser exigido pelo credor, ele não pode arrogar-se o direito de reaver dos demais devedores o excesso que pagou. Assim sendo, neste caso: «Inexiste por isso titulo executivo se, nas relações internas entre devedores, um deles paga ao credor para além da quota parte da obrigação que lhe corresponde, uma vez que o direito de regresso é apenas reconhecido ao devedor solidário que pagou mais do que correspondia à sua real quota, nos termos gerais dos artº 524º e 516º do Código Civil.» - Ac. TRP de 10.12.2019, p. 4853/16.2T8OAZ-A.P1 sup. cit. Certo é que este entendimento inequivocamente se aplica nos casos de pagamento total da dívida. Mas não vislumbramos motivos para que, mesmo no caso de pagamento parcial para além da quota parte de responsabilidade do co obrigado pagante, ele não se aplique. Maxime se este manifestar vontade nesse sentido, como aqui aconteceu. O defendido pelos recorrentes de imputar o depósito feito apenas nas quotas dos depositantes, mesmo que o valor exceda as mesmas, sem que - inclusive contra a sua vontade expressamente manifestada -, pudesse ser aproveitado para o pagamento da quota do não depositante, revelar-se-ia contrário ao fim precípuo da execução que é a satisfação da quantia exequenda no mais curto lapso de tempo possível. Tanto assim que, como se viu, a lei permite o pagamento pode ser realizado por qualquer pessoa, obrigado/executado ou terceiro. E, ademais, demonstrada a inviabilidade do argumento de a obrigação ser conjunta - ao menos se tal tese e postura forem tomadas sem invocação de razão, pessoal e substantiva, admissível -, pois que tal não apenas frusta o fito legal de extinção da execução o mais brevemente possível, como pode contender com interesse atendível dos pagantes, o qual, na espécie, desde logo se traduz na cessação do pagamento dos juros e da sanção compulsória. Usando um ditado popular, é caso para dizer que «o dinheiro não tem côr». Ou seja, o dinheiro é um recurso neutro e a sua posse e uso não estão ligados a características, causas ou razões individuais; pelo que não importa de onde vem ou quem o está usando, desde que os meios para obtê-lo tenham sido legítimos. Destarte, e concedendo-se ao desiderato legal – artº 846º do CPC - , ao menos por via de regra, de que o presente caso não constitui exceção, há que aproveitar todo o montante depositado para pagamento do máximo do valor da dívida, se for essa, como in casu foi, a vontade dos depositantes e demais obrigados, e daí retirando todas as consequências legalmente admissíveis. 
 Improcede o recurso. 
 5. Deliberação. Termos em que se acorda julgar o recurso improcedente e, consequentemente, confirmar o despacho recorrido. 
 Custas pelos recorrentes. 
 Coimbra, 2025.09.16. 
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