Acórdão do Tribunal da Relação de Coimbra | |||
Processo: |
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Nº Convencional: | JTRC | ||
Relator: | CARLOS MOREIRA | ||
Descritores: | DECLARAÇÃO DE PARTE VALORAÇÃO PROBATÓRIA INTERMEDIAÇÃO FINANCEIRA VIOLAÇÃO DO DEVER DE INFORMAÇÃO DANOS INDEMNIZAÇÃO PRESCRIÇÃO | ||
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Data do Acordão: | 07/08/2025 | ||
Votação: | UNANIMIDADE | ||
Tribunal Recurso: | TRIBUNAL JUDICIAL DA COMARCA DE LEIRIA – LEIRIA – JUÍZO CENTRAL CÍVEL – JUIZ 1 | ||
Texto Integral: | S | ||
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Meio Processual: | APELAÇÃO | ||
Decisão: | CONFIRMADA | ||
Legislação Nacional: | ARTIGOS 309.º E 483.º DO CÓDIGO CIVIL ARTIGO 466.º DO CÓDIGO DE PROCESSO CIVIL ARTIGOS 7.º, 289.º, 290, 293.º, 304.º, 312.º, 314.º, 324.º DO CÓDIGO DOS VALORES MOBILIÁRIOS - DL Nº 486/99, DE 13 DE NOVEMBRO | ||
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Sumário: | I - A censura sobre a convicção probatória do julgador, apenas pode ser concedida – máxime perante prova pessoal e considerando os benefícios da imediação e da oralidade – se tal convicção se revelar manifestamente desconforme à prova invocada, e, assim, os meios probatórios aduzidos pelo recorrente e a exegese deles operada não apenas sugiram, mas antes imponham tal censura – artº 640ºdo CPC.
II – As declarações de parte não podem ser liminarmente desvalorizadas, antes podendo ter virtualidade para, ao menos no contexto de outra prova, contribuir para a formação da convicção. III - O artº 324º do CVM consagra dois prazos de prescrição: i) Vinte anos se o agente agir com dolo ou culpa grave; ii) Dois anos a partir da data mais recente em que o cliente tenha conhecimento da conclusão do negócio e/ou dos respetivos termos. III - Provando-se que os autores foram informados por funcionária do banco que o produto em que foi convidada a investir – obrigações subordinadas – era idêntico a um depósito a prazo, vg. com capital garantido, o que levou a autora a investir, e porque tal funcionária sabia, ou era-lhe exigível que soubesse, que havia risco de perda de capital, tal informação é a contrária da que deveria ter sido prestada, sendo típica da atuação de um agente excecionalmente descuidado, pelo que há culpa grave na sua atuação, sendo o prazo de prescrição de 20 anos – artº 309º do CCivil. IV - Provando-se, nuclearmente, o referido em III e, ainda, que não foi mostrado e lido aos autores qualquer documento ou explicado o conteúdo do produto, bem como se os autores tivessem tomado conhecimento de que o produto apresentava algum risco não teriam autorizado tal aplicação, o que era do conhecimento dos funcionários da agência do banco, é de concluir que a instituição não cumpriu o seu dever de informação quanto ao jaez do produto vendido, assim atuando ilícitamente; e, verificados os demais pressupostos da responsabilidade contratual, é obrigado a indemnizar pelos prejuízos havidos. (Sumário elaborado pelo Relator) | ||
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Decisão Texto Integral: | Relator: Carlos Moreira Adjuntos: Fernando Monteiro Vítor Amaral * ACORDAM OS JUIZES NO TRIBUNAL DA RELAÇÃO DE COIMBRA
1. AA e BB, instauraram contra Banco 1... SA, a presente ação declarativa, de condenação, sob a forma de processo comum.
Pediram: a) A condenação do réu a pagar aos autores o capital e juros vencidos e garantidos que, nesta data, perfaz a quantia de €197.250,00, bem como os juros vincendos desde a citação até efectivo e integral pagamento; Ou assim não se entendendo: b) Seja declarado nulo qualquer eventual contrato de adesão que o réu invoque para ter aplicado os €150.000,00€ que os autores entregaram ao réu e que este aplicou em obrigações subordinadas SLN 2006; c) Seja declarado ineficaz em relação aos autores a aplicação que o réu tenha feito desses montantes; d) A condenação do réu a restituir aos autores os €150.000,00 que ainda não receberam do montante que entregaram ao réu, bem como o valor dos juros vencidos à taxa contratada, acrescido de juros legais vincendos, desde a data da citação do réu, até efectivo e integral cumprimento; e sempre: e) A condenação do réu a pagar aos autores a quantia de € 7.500,00 a título de danos não patrimoniais. Para tanto, alegaram em síntese. Em 10 de Abril de 2006, foram aconselhados pela sua gestora de conta, no então BPN – Banco Português de Negócios, agência de ..., a aplicar dinheiro oriundo das suas poupanças, numa única conta de depósito a prazo, com juros mais aliciantes, tendo a mesma garantido que se tratava de uma aplicação com capital garantido pelo BPN, com rentabilidade assegurada e que a poderiam movimentar a qualquer momento. Confiavam plenamente naquela gestora, tanto mais que têm baixo nível de escolaridade, não têm quaisquer conhecimentos de finanças, o que era conhecido do banco. Com base nas informações que lhes foram dadas, efectuaram uma primeira subscrição em 10.04.2006, no valor de € 100.000,00 e uma segunda, em 15.07.2008 no valor de € 50.000,00. Se tivessem sido esclarecidos sobre as reais características dos produtos nunca teriam consentido ou autorizado tal aquisição. Quando o réu deixou de pagar os juros, deslocaram-se à agência de ... e só nesse momento tiveram conhecimento que haviam adquirido um produto em nada comparável a um depósito a prazo, não podendo proceder ao levantamento do capital, nem dos respectivos juros. Instado pelos autores, o réu atribuiu a responsabilidade do pagamento à SLN, entidade que. nem sabiam existir e que os deixou verdadeiramente alarmados quando confrontados com a existência de uma outra entidade, com quem, de resto, nunca negociaram ou tiveram qualquer contacto. A situação descrita colocou os autores num permanente estado de preocupação e ansiedade, com receio de não reaverem o seu dinheiro que constituía as poupanças de uma vida.
O réu contestou. Por exceção invocou a prescrição. Por impugnação, alegou: Que os autores sempre manifestaram apetência por investimentos em aplicações financeiras, ainda que de baixo risco, tendo por isso conhecimento e experiência suficientes para o investimento que vieram a efetuar, com conhecimento da respetiva natureza, riscos e maior rentabilidade relativamente a um vulgar depósito a prazo. Que as obrigações são tendencialmente um produto conservador, com um risco normalmente reduzido, indexado à solidez financeira da sociedade emitente, a que acrescia in casu, o facto de esta sociedade ser a “mãe” do banco, sendo este um garante de solvabilidade daquela, por ser o principal activo do seu património. Deste modo, o risco de um depósito a prazo seria semelhante a uma tal subscrição por o risco da SLN ser indexado ao risco do próprio banco, tanto mais que, à data, o Fundo de Garantia de Depósitos tinha o valor máximo de € 25.000,00 por conta bancária. O incumprimento que ocorreu foi devido a circunstâncias completamente imprevisíveis e anormais, como uma nacionalização e a forma como essa nacionalização foi determinada, separando o banco do restante grupo de empresas. A gestora de conta explicou aos autores que a aplicação em causa constituía um produto de valores mobiliários em representação de dívida da sociedade emitente, tendo igualmente explicado que se tratava da sociedade-mãe do banco, pelo que se tratava de um produto seguro, explicando as suas condições e com uma remuneração mais vantajosa que um depósito a prazo, o seu prazo, condições de reembolso e obtenção de liquidez ao longo dos 10 anos apenas ser possível pela via do endosso. Conclui, por isso, que os autores foram total e exaustivamente esclarecidos sobre as condições do produto, acompanhada da respetiva nota técnica, pelo que foram cumpridos todos os deveres de informação.
2. Prosseguiu o processo os seus termos, tendo, a final, sido proferida sentença na qual foi decidido: «…julgo a acção parcialmente procedente e em consequência condeno o réu a pagar aos autores a quantia de € 150.000,00 (cento e cinquenta mil euros), acrescida de juros de mora, desde a data da citação, à taxa legal de 4%, até efectivo e integral pagamento. * Custas pelos autores e pelo réu, na proporção de 1/3 para os primeiros e 2/3 para o segundo (artº 527º nºs 1 e 2 do CPC).»
3. Inconformada recorreu a ré. Rematando as suas alegações com as seguintes conclusões: 1.º Por muito respeito que mereça o vertido na decisão a quo, com a mesma não se pode de modo algum concordar, pois que, considerando o Tribunal Recorrido a presente ação parcialmente procedente, não julgou corretamente. 2.º Com tal decisão, a Mma. Juiz a quo violou e fez errada aplicação e interpretação do disposto nos arts. 7º, 290º nº 1 alínea a), 304º-A e 312º a 314º-D e 323º a 323º-D do CdVM; 4º, 12º, 17º e 19º do D.L. 69/2004 de 25/02 e da Directiva 2004/39/CE; 220º, 232º e 236º, 483º e ss., 595º e 615º do C.C; 615.º, n.º 1, al. e) do CPC. 3.º O Banco R., tal qual estava obrigado, prestou aos Autores informações completas, verdadeiras, atuais, claras, objetivas e lícitas (nos termos e para os efeitos do art.7º do Código de Valores Mobiliários), quanto às obrigações por estes subscritas, dando cumprimento não só à lei, mas também a uma política de transparência e de confiança pela qual sempre se pautou. 4.º O Apelante entende, assim, que os factos dados como provados nos números 2, 5 e 7 não deveriam constar do corpo da Sentença nos termos ali propostos, em face da prova produzida em sede de audiência de discussão e julgamento. Nestes termos, é o Banco Apelante de pugnar pela alteração de tais factos, de acordo com a redação adiante proposta. 5.º Comecemos por referir, porque nos parece de elevada importância e de ter em consideração (ainda que evidenciada pelo douto Tribunal a fls., não lhe retirou qualquer consequência) que o produto – Obrigações SLN 2006 – foi vendido por funcionário bancário diferente daquele que foi ouvido em audiência de discussão e julgamento, ou seja, e em concreto, sopesadas as declarações de parte, não se pode conceber como se podem retirar factos provados relativos às informações efetivamente prestada, dado que o único funcionário bancário foi inquirido, referiu desconhecer quais as informações que foram, efetivamente, transmitidas à Autora aquando da subscrição das obrigações! 6.º Quanto às declarações de parte, refere Lebre de Freitas que “A apreciação que o juiz faça das declarações de parte importará sobretudo como elemento de clarificação do resultado das provas produzidas e, quando outros não haja, como prova subsidiária, máxime se ambas as partes tiverem sido efetivamente ouvidas.”. Ou seja, para este autor as declarações de parte têm uma função eminentemente integrativa e subsidiária. Já Paulo Pimenta afirma que “Face ao sistema probatório instituído, o mais provável é que a prova por declarações de parte tenha uma natureza essencialmente supletiva(…)”. 7.º A razão de ser do surgimento desta figura processual (designadamente alicerçada nas assimetrias probatórias no exercício do direito à prova) estriba, em primeira linha, esta tese, bem como o facto de as declarações poderem ser requeridas até ao início das alegações orais, o que inculca que se visa colmatar falhas ao nível da produção da prova designadamente testemunhal. 8.º Nesta linha de raciocínio, enfatiza-se a maior fragilidade deste meio de prova na demonstração dos factos, imputando-se às declarações de parte um valor autónomo e suficiente quanto a factualidade essencial que, como nos presentes autos, apenas teve lugar entre as partes, sem a presença de terceiros intervenientes. 9.º Não se pode ter como material e probatoriamente irrelevante o facto de estarmos a analisar as afirmações dos Autores, claramente interessados no objeto em litígio e que teve. Também não nos podemos esquecer o caráter necessário e essencialmente supletivo destas declarações que, na maior parte dos casos, servirá para combater uma fraca ou inexistente prestação probatória. 10.º Diríamos mais, o princípio de prova é o menor grau de prova admissível e se se atribuir esse valor às declarações de parte, então o que não teria nenhum valor probatório em si mesmo (nem sequer como mera justificação) passa a poder ter algum valor probatório, ainda que o menor na escala dos valores probatórios. 11.º Mais em concreto: se se atribuir às declarações de parte relevância como princípio de prova, isso significa que estas declarações, apesar de não serem suficientes para formar a convicção do juiz nem sobre a verdade, nem sobre a plausibilidade ou verosimilhança do facto, ainda assim podem ser utilizadas para corroborar outros resultados probatórios. 12.º A propósito do depoimento da testemunha CC não podemos deixar de salientar que tal depoimento deve ser atendido e valorado com alguma moderação. De facto, a referida testemunha é aqui parte interessada no desfecho da causa. Evidentemente que, sendo filha dos Autores, terá todo o interesse em que o Banco seja condenado e, portanto, sempre estaria inquinada na sua expressão do que é a realidade… 13.º A testemunha DD relatou a forma como ela vendia os produtos em crise a outros clientes, o que resultava genericamente no seguinte: produto de capital garantido; com juros semestrais, liquidados na conta do cliente; e que apesar de produto ter o prazo de 10 anos, era possível, desde que avisassem a agência com 2 ou 3 dias de antecedência, ceder o produto a outro cliente 14.º Do mesmo depoimento não resulta em lado nenhum, sequer, a menção ou equiparação das Obrigações SLN 2006 a um depósito a prazo. 15.º Por outro lado, a testemunha DD referiu que, em regra não sentia necessidade de dizer que o produto subscrito era emitido pela SLN, até porque, na maioria das vezes, os clientes não questionavam e atendendo que a SLN era a dona do Banco, se o cliente confiava no Banco ainda mais confiava na SLN. Contudo, cada vez que os clientes a questionavam, e referiu não saber se os Autores o fizeram, dizia que a SLN era a dona do Banco e de uma série de empresas. 16.º Destarte, parece-nos meridianamente provado que os factos dados como provados nos números 2 e 5 deveriam ter a seguinte redação: 2 – Em 10.04.2006, mediante aconselhamento da sua gestora de conta, a autora subscreveu duas obrigações SLN, no valor de € 50.000,00 cada uma, tendo-lhe sido explicado por aquela que as mesmas tinham capital garantido e com rentabilidade assegurada. 5 – Os autores subscreveram as aplicações mencionadas em 2 e 3, convictos de que se tratava de um produto seguro, e que poderiam levantar quando entendessem, mediante aviso com antecedência prévia de 3 dias. 17.º Do aludido depoimento da testemunha DD resultou ainda que, os clientes, naquela altura não liam os documentos e, dada a relação de confiança que existia com os funcionários do Banco apenas se limitavam a assinar. 18.º Desta forma, parece claro ao Recorrente que o facto provado n.º 7 deveria de ter a seguinte redação: 7 – Os autores têm a 4ª classe, são pessoas com perfil conservador e sem apetência para o risco. DO DIREITO, 19.º O negócio de cobertura é o concreto contrato de intermediação financeira celebrado entre o intermediário e o cliente e que tem por objeto imediato conceder ao intermediário os poderes necessários para celebrar o negócio de execução. 20.º O negócio de execução, por seu turno, é o contrato celebrado entre o intermediário e o terceiro, no interesse e por conta do cliente (ou também o negócio celebrado diretamente entre o terceiro e o cliente, com a intermediação do intermediário financeiro), e tem a maioria das vezes por objeto a aquisição, alienação ou qualquer outro negócio sobre valores mobiliários. 21.º Daqui resulta que os deveres de informação a prestar pelo intermediário financeiro, previstos no art. 312º nº 1 do CdVM, são os deveres de informação relativos ao próprio contrato de intermediação financeira, v.g., ao negócio de cobertura! 22.º Daí que não se possa retirar qualquer consequência jurídica da afirmação do incumprimento dos deveres previstos no art. 312º do CdVM, tendo antes de se buscar na densificação desses preceitos o conteúdo do dever de informação aí genericamente afirmado. 23.º O RISCO que a sentença associa maioritariamente a um fenómeno de incumprimento da obrigação assumida (neste caso incumprimento do reembolso da obrigação) ou até à insolvência do emitente, NÃO É NEM PODE SER CONSIDERADO UM RISCO ESPECIAL! 24.º Parece-nos por isso manifesto que a expressão operações a realizar aponta para uma atividade – decorrente da intermediação financeira – e não para o objeto dessa atividade – o instrumento financeiro. 25.º Parece-nos assim por demais evidente que a disposição do art. 312º nº 1 alínea e) relativa aos “riscos especiais nas operações a realizar” em nada se relaciona com a matéria em crise nos presentes autos pois o que é invocado na P.I. é a prestação de uma informação falsa quanto ao instrumento financeiro em si e esta disposição, como vimos, diz respeito à prestação de informação acerca do negócio de intermediação ou de cobertura. 26.º São ESTES e APENAS ESTES os riscos do tipo do instrumento financeiro sobre os quais o Intermediário Financeiro tem que prestar informação! 27.º A informação acerca do risco da perda do investimento tem de ser dada em função dos riscos próprios do tipo de instrumento financeiro, o que deve ser feito SE E SÓ se tais riscos de facto existirem! 28.º É que a este respeito, impõem-se clarificar, que em lado algum da lei resulta estar o intermediário financeiro obrigado a analisar ou avaliar a robustez financeira do emitente na atividade de intermediação financeira de receção e transmissão de ordens. 29.º E também em lado nenhum da lei resulta a obrigação de prevenir o investidor acerca das hipóteses de incumprimento das obrigações assumidas pelo emitente do instrumento financeiro ou até da probabilidade de insolvência do mesmo! 30.º O incumprimento é uma caraterística latente a qualquer obrigação, que pode, ou não, vir a manifestar-se e que tem ver com as qualidades ou circunstâncias do emitente (ou obrigado) do instrumento financeiro e não com o tipo do instrumento financeiro, conforme referido no art. 312º-E nº 1 do CdVM, que é expressão que aponta claramente para uma objetivização do risco em função do próprio instrumento de investimento e não para uma subjectivização em função do emitente! 31.º Assim, resulta para nós claro que, mesmo à luz da lei actualmente em vigor, neste caso concreto, não houve dever de informação quanto ao risco do instrumento financeiro que o Banco Réu tivesse deixado por cumprir! 32.º Na data da subscrição das referidas obrigações, a redação do CdVM era aquela resultante das sucessivas alterações do D.L. 486/99 de 13/11 até ao D.L. 52/2006 de 15/03. Na redação vigente à data da subscrição das Obrigações resulta ainda mais evidente a sistematização supra referida dos deveres de informação, em função do negócio de cobertura e do negócio de execução (ou, se quisermos, em função do dever de informação anterior à celebração do contrato de intermediação ou, depois, na vigência do mesmo). 33.º À data da contratação das aplicações não existia sequer qualquer dever de informação quanto aos riscos associados ao instrumento financeiro, ou quanto ao risco de perda da totalidade do investimento, conforme hoje decorre do art. 312º-E nº 2 alínea a)! 34.º Ao contrário do que hoje sucede, não havia na anterior redação do CdVM qualquer norma que taxativamente obrigasse o intermediário financeiro a prestar informações acerca dos riscos do tipo de instrumento financeiro em que se pretendia investir. Essa foi a grande inovação da D.M.I.F. e do diploma que a transpôs! 35.º O uso da expressão “capital garantido” apenas se pode ter como referência à mecânica de funcionamento do investimento, que é feito por um determinado prazo, findo o qual o capital é reembolsado na totalidade, acrescido da rentabilidade. 36.º Não é porque um investimento se possa vir a revelar ruinoso, que o mesmo pode ser classificado como investimento de risco... Tal juízo tem de ser feito retroagindo ao momento da subscrição e tendo por base a prognose que então era possível fazer com os dados conhecidos. E o certo é que as Obrigações eram então, como é ainda, um produto conservador, com um risco normalmente reduzido, indexado à solidez financeira da sociedade emitente. 37.º Nesse momento não havia qualquer indicação de que a emissão pudesse vir a não ser paga ou qualquer ideia sobre o risco de insolvência do emitente. Mas sempre se diga também que o Banco Réu não estava como não está obrigado a advertir o investidor sobre a essa hipótese de insolvência do emitente. Tal como não estava como não está obrigado a advertir o depositante sobre o risco da sua insolvência quando recebe um DP! 38.º O dever de informação neste contrato será um dever secundário, genérico ou acessório da prestação principal, por estar umbilicalmente ligado àquela (não resistindo autonomamente sem ela) e podendo até condicioná-la. 39.º A VIOLAÇÃO DO DEVER DE INFORMAÇÃO NÃO IMPLICA QUALQUER PRESUNÇÃO DE ILICITUDE, tinham de ser os AA. a alegar e provar que concretas informações é que o Banco Réu deveria ter dado, que não deu! Não o tendo feito, tem a presente ação necessariamente que claudicar! 40.º A condenação do Banco Réu no pagamento da integralidade do valor desembolsado pelos AA. é manifestamente excessiva e não cumpre com o critério teoria da diferença prevista no art. 566º nº 2 do CC, uma vez que dá azo a que os AA. venham depois a receber da emitente do título e que acrescerá ao valor da indemnização já porventura pago pelo Réu e equivalente ao montante por ele desembolsado na subscrição do valor mobiliário. 41.º Não podemos deixar de apontar que do elenco de factos provados não resulta um único facto que permita estabelecer uma qualquer ligação entre a qualidade (ou falta dela) da informação fornecida aos AA. e o acto de subscrição. De facto, sempre seria essencial aferir se, em face de informação sobre o mesmo produto, prestada de forma legalmente exigível e tal qual o Tribunal entendeu que deveria ser prestada, os AA. deixariam de subscrever o instrumento financeiro em causa. 42.º Analisado o fim principal pretendido pelo contrato aqui em apreço – contrato de execução da actividade de intermediação financeira, de recepção e transmissão de ordens por conta de outrem -, parece-nos evidente que o mesmo se circunscreve à recepção e retransmissão de ordens de clientes – no caso os AA. É este o único conteúdo típico e essencial do contrato e que é, portanto, susceptível de o caracterizar. 43.º No âmbito da responsabilidade contratual, presumindo-se a culpa, caberá a quem alega o direito demonstrar a ilicitude, o nexo causal e o dano, que em caso algum se presumem! 44.º Não sabemos nem alcançamos o que é que a Autora não sabia que, se porventura soubesse, teria determinado a sua recusa em efectuar o investimento! Efectivamente ficamos sem saber quais as supostas características verdadeiras do produto que os AA. teriam ficado sem saber e que por si só mudariam a sua decisão de investimento. 45.º Assim, ou os Autores alegavam e provavam que se tivesse sido cumprido o dever de informação, não teria realizado o investimento, ou então, tem que arcar com as normais consequências de um investimento que se tornou ruinoso, pois não há forma de corrigir a titularidade do risco, pela responsabilidade — the risk lies where it falls! 46.º A causalidade entre a eventual violação do dever de informação não se pode presumir legalmente, e presumindo-se judicialmente sempre se deverá reflectir na afirmação de um facto como provado e não apenas na justificação de um raciocínio jurídico puramente abstracto, como se de um palpite se tratasse. 47.º A prova da causalidade deveria ter provado que não houver aquela violação e nunca subscreveria o produto financeiro, tendo esta subscrição causado um dano, e que a produção desse dano resulta como consequência adequada da ilicitude. 48.º Em suma, manifestamente, não consta da matéria de facto dada como provada que os Autores, se lhe tivesse sido fornecida toda a informação sobre o produto, não teriam realizado o investimento. 49.º Não se poderá assim ter por verificado, no seguimento da jurisprudência agora uniformizada, o requisito do nexo de causalidade e, como tal, não poderá o banco Recorrente ser responsabilizado pelo dano que se produziu em virtude do incumprimento da SLN. 50.º Nenhum dos funcionários envolvidos do Banco Réu sequer concebeu a possibilidade de estar a faltar ao dever de informação acerca da aplicação financeira e que, com essa falta, poderia estar a determinar o investimento do cliente num produto que este não quereria se estivesse devidamente informado. 51.º Terá havido, portanto (e quando muito) uma indução dos AA. em erro, sem que por parte dos funcionários do Banco Réu houvesse intenção ou consciência de o fazer – trata-se, portanto, de uma indução negligente em erro. 52.º Ora, parece-nos evidente e manifesto que os AA. conheceram os termos em que o negócio foi concluído, designadamente a inexistência de garantia de capital e juros e a subordinação da obrigação aquando da receção dos extratos bancários no seu domicílio, ou pelo menos em novembro de 2008, data da nacionalização do Recorrente! 53.º Data em que é facto público e notório que ocorreu uma corrida aos depósitos e levantamento dos mesmos. Não obstante, a ação apenas foi proposta em novembro de 2023! E, portanto, já se encontrava prescrita qualquer putativa responsabilidade do Banco Réu!
Inexistiram contra alegações. 4. Sendo que, por via de regra: artºs 635º nº4 e 639º do CPC - de que o presente caso não constitui exceção - o teor das conclusões define o objeto do recurso, as questões essenciais decidendas são as seguintes: 1ª – Alteração da decisão sobre a matéria de facto. 2ª – Prescrição do direito dos autores. 3ª- Improcedência da ação. 5. Apreciando. 5.1. Primeira questão. Pretende o recorrente a alteração da redação dos pontos 2, 5 e 7. Têm eles o seguinte teor: 2- Em 10.04.2006, mediante aconselhamento da sua gestora de conta, a autora subscreveu duas obrigações SLN 2006, no valor de € 50.000,00 cada uma, tendo-lhe sido explicado por aquela que as mesmas tinham capital garantido e com rentabilidade assegurada, sem ter sido mencionado especificamente qual a entidade responsável pelo pagamento da remuneração e pelo reembolso do capital, designadamente se era a SLN, se era o BPN, e sem ter sido mencionado que se tratavam de obrigações subordinadas. 5- Os autores subscreveram as aplicações mencionadas em 2 e 3, convictos de que se tratava de um produto seguro, semelhante a um depósito a prazo e que o poderiam levantar quando entendessem, mediante aviso com antecedência prévia de 3 dias. 7- Os autores têm a 4ª classe, são pessoas com perfil conservador e sem apetência para o risco, razão pela qual a autora, se tivesse tomado conhecimento de que os produtos que lhe foram propostos e que adquiriu apresentava algum risco, designadamente porque que se tratava de obrigações subordinadas, não teria autorizado tal aplicação, o que era do conhecimento dos funcionários da agência referida em 1. Redação proposta pela recorrente: 2 – Em 10.04.2006, mediante aconselhamento da sua gestora de conta, a autora subscreveu duas obrigações SLN, no valor de € 50.000,00 cada uma, tendo-lhe sido explicado por aquela que as mesmas tinham capital garantido e com rentabilidade assegurada. 5 – Os autores subscreveram as aplicações mencionadas em 2 e 3, convictos de que se tratava de um produto seguro, e que poderiam levantar quando entendessem, mediante aviso com antecedência prévia de 3 dias. 7 – Os autores têm a 4ª classe, são pessoas com perfil conservador e sem apetência para o risco. 5.1.4. A julgadora fundamentou as respostas nos seguintes termos: «…os factos relacionados com as circunstâncias em que os autores adquiriram obrigações SLN 2006 e a informação que para o efeito lhes foi dada, factos 1, 2, 3, 4, 6, 8, 10 e 11, fundamenta-se no depoimento da testemunha DD, que pelo facto de trabalhar na agência bancária em causa lidava com os autores… …não foi a testemunha em questão que apresentou a aplicação financeira em causa aos autores, mais concretamente à autora, mas sim a gestora de conta dos mesmos. No entanto, explicou a mesma testemunha de forma detalhada, convincente e lógica o modus operandi habitual dos funcionários do BPN na apresentação do produto em causa, mormente informações concretamente fornecidas e as omitidas. Com efeito e como de forma lapidar nos foi dito …à data da subscrição pelos autores do produto financeiro em causa, não havia percepção, até mesmo pelos funcionários bancários, do risco envolvido neste tipo de produto e até das especificidades do mesmo, motivo pelo qual não eram dadas informações específicas sobre a concreta entidade emitente, sobre as responsabilidades da mesma na garantia do capital e dos juros, e sobre o que sucederia em caso de insolvência da mesma, atento o facto de se tratarem de obrigações subordinadas. Conjugando tal depoimento com as declarações de parte dos autores referentes a tais factos, foi possível alicerçar a nossa convicção quanto à sua verificação, … …como também descrito por aquela testemunha, o produto em causa era visto como um produto seguro, ideia que transmitiam aos clientes, e que, em sede de declarações de parte foi confirmado pelos autores, os quais só se aperceberam das características da aplicação financeira em questão quando os juros deixaram de ser pagos, o que justifica também a factualidade provada descrita em 5 e 10. Nos mesmos meios de prova se fundamenta a nossa convicção quanto ao perfil de investidor que demos por provado no facto 7 …pois não obstante no extracto bancário se observarem aplicações financeiras diferentes de depósitos a prazo, resultou daquele depoimento tratarem-se de clientes cautelosos que não procuravam o risco, sobretudo porque para a sua actividade económica poderiam necessitar de liquidez imediata. A testemunha CC, filha dos autores, reforçou o depoimento da testemunha DD quanto ao perfil dos autores, acrescentando ainda a escolaridade dos mesmos e as preocupações sentidas pelo facto de não disporem do dinheiro investido e sem saberem se alguma vez o irão reaver, o que fundamenta o facto 13.» Já o recorrente pugna pela sua pretensão nos termos plasmados nas conclusões 5ª a 15ª, nas quais, nuclearmente, desvaloriza ou interpreta de modo diverso o valor probatório das declarações de parte e dos depoimentos das testemunhas inquiridas. 5.1.5. Foi apreciada a prova. Perscrutemos. O facto de a testemunha DD não ter vendido o produto aos autores não é determinante, de per se, no sentido da sua irrelevância ou desvalorização como pretendido pela recorrente. É que tal testemunha também vendia o produto, conhecia os autores e verbalizou que, a regra, quando ela ou os seus colegas procediam a tal venda, era os clientes serem informados nos termos que referiu. A assim ser, e à míngua de prova em sentido contrário, ou seja, que no caso vertente tal normal e usual atuar não se verificou – a cargo da ré, como facto impeditivo da valoração de tal depoimento: artº 342º nº2 do CCivil – tem de concluir-se que também no caso vertente tal normal procedimento informativo se verificou. Quanto à desvalorização probatória das declarações de parte dos autores. Prescreve o artº Artigo 466.º do CPC: Declarações de parte 1 - As partes podem requerer, até ao início das alegações orais em 1.ª instância, a prestação de declarações sobre factos em que tenham intervindo pessoalmente ou de que tenham conhecimento direto. 2 - Às declarações das partes aplica-se o disposto no artigo 417.º e ainda, com as necessárias adaptações, o estabelecido na secção anterior. 3 - O tribunal aprecia livremente as declarações das partes, salvo se as mesmas constituírem confissão. Vemos assim que se, à partida, as declarações de parte não visarem a confissão, podem nesta desaguar se a parte admitir factos que lhe sejam desfavoráveis. – nºs 2 e 3. Mas se esta confissão não advier, as declarações são probatoriamente livremente apreciadas. Quanto ao valor probatório destas declarações, urge ter presente que elas, só porque dimanam da parte que é interessada num desfecho favorável da ação, não podem ser, apriorística e liminarmente, desvalorizadas. Por um lado, porque tal lançaria sobre a parte um labéu de infidedignidade/inveracidade/desonestidade que não é humanamente admissível Por banda outra, porque retiraria todo o efeito útil ao aludido preceito, o qual, ao admitir as declarações, algum valor probatório, em tese, lhe atribuiu, no sentido de poder contribuir para a justa composição do pleito. Pois que em muitos casos, quer pela natureza dos factos probandos, quer pelo circunstancialismo em que se terão praticado, apenas, ou essencialmente, a parte interveniente nos mesmos e/ou no seu circunstancialismos envolvente, tem conhecimento ou conhecimento privilegiado. Assim: «I – A prova por declarações de parte deve merecer, em abstrato, a mesma credibilidade das demais provas legalmente admissíveis, sendo apreciada livremente pelo tribunal. II – Porém, em concreto, normalmente é insuficiente para valer como prova convincente, se desacompanhada de prova corroborante que a sustente.» - Ac. TRC de 26.04.2022, p. 63725/20.8YIPRT.C1. (itálico nosso) No caso vertente. A testemunha DD verbalizou, de um modo muito sereno, impressivo e convicto, que informavam que o produto era de capital garantido, com juros semestrais, liquidados na conta do cliente; e que apesar de produto ter o prazo de 10 anos, o reembolso era possível desde que avisassem a agência com 2 ou 3 dias de antecedência. Mais verbalizou que se os clientes – rectius os autores – soubessem que o capital não era garantido, «seguramente» que não subscreveriam o produto. Expendeu finalmente que ninguém perguntava quem garantia o capital – se o banco se a SLN - nem elas próprias sentiam necessidade de informar nesse sentido. Por seu turno os autores afirmaram que sempre estiveram convencidos que a garantia do capital que lhes era asseverada correspondia a uma garantia dum depósito a prazo. Verifica-se assim que existe uma complementaridade lógica e natural entre a informação prestada pela funcionária do banco e a convicção dos autores no sentido de que o produto tinha a segurança de um depósito a prazo. Pois que, principalmente para um investidor mediano de parcos conhecimentos em aplicações económico financeiras - como, à míngua de prova em contrário devem ser considerados os autores, até porque se provou que eles têm apenas a 4ª classe e são pessoas com perfil conservador e sem apetência para o risco – o produto mais comum e conhecido sem risco - ao menos até ao montante assegurado pelo Estado - é o depósito a prazo. Numa outra perspetiva, inclusive aceite pelo recorrente, pode dizer-se que as presentes declarações dos autores não foram valoradas apenas por si mesmas, isoladamente, mas antes e apenas como um complemento, subsidiário e supletivo, do depoimento da aludida testemunha, e, como se viu, tendo ainda em consideração as regras da lógica e da experiência comum. Por conseguinte, vistos os elementos probatórios produzidos e as posições das partes, tudo sagazmente ponderado, bem como as regras da experiência comum e a normalidade das coisas, a prova da factualidade impugnada é mais do que admissível, até porque ainda ínsita dentro da margem de álea em direito probatório concedida ao julgador. Nesta conformidade, se atingindo a final conclusão de que os elementos probatórios esgrimidos pelo recorrente e a exegese que dos mesmos opera, não são suficientes para impor, como exige a lei – artº 640º do CPC – a censura da convicção da julgadora. 5.1.4. Decorrentemente, e na improcedência desta questão, os factos a considerar são os apurados na 1ª instância, a saber: 1- Os autores foram clientes da agência do banco BPN de ..., aí tendo aberto a conta de depósitos à ordem com o nº ...01, sendo presentemente clientes do banco réu, na mesma agência. 2- Em 10.04.2006, mediante aconselhamento da sua gestora de conta, a autora subscreveu duas obrigações SLN 2006, no valor de € 50.000,00 cada uma, tendo-lhe sido explicado por aquela que as mesmas tinham capital garantido e com rentabilidade assegurada, sem ter sido mencionado especificamente qual a entidade responsável pelo pagamento da remuneração e pelo reembolso do capital, designadamente se era a SLN, se era o BPN, e sem ter sido mencionado que se tratavam de obrigações subordinadas. 3- No dia 15.07.2008, a autora, através da cedência dos titulares das respectivas obrigações, adquiriu uma obrigação SLN 2006, o que fez em face das explicações que lhe tinham sido dadas na ocasião mencionada em 2. 4- Na ocasião referida em 2, a autora foi informada, pelo menos, da taxa de juros e que os mesmos seriam pagos semestralmente. 5- Os autores subscreveram as aplicações mencionadas em 2 e 3, convictos de que se tratava de um produto seguro, semelhante a um depósito a prazo e que o poderiam levantar quando entendessem, mediante aviso com antecedência prévia de 3 dias. 6- Os autores, quer antes quer depois da subscrição das obrigações referidas em 2 e 3, haviam subscrito fundos de investimento imobiliário. 7- Os autores têm a 4ª classe, são pessoas com perfil conservador e sem apetência para o risco, razão pela qual a autora, se tivesse tomado conhecimento de que os produtos que lhe foram propostos e que adquiriu apresentava algum risco, designadamente porque que se tratava de obrigações subordinadas, não teria autorizado tal aplicação, o que era do conhecimento dos funcionários da agência referida em 1. 8- Na ocasião referida em 2 e 3 não foi lido à autora qualquer documento ou explicado o conteúdo do mesmo, designadamente o prospecto referente ao produto em causa. 9- Após as datas referidas em 2 e 3, os autores foram recebendo um extracto periódico onde lhes aparecia as obrigações em causa como integrando a sua carteira de títulos. 10- Os autores dirigiram-se à agência do banco BPN de ..., quando os juros deixaram de ser creditados na sua conta e só nessa ocasião tiveram consciência que não podiam proceder ao levantamento do capital e dos respectivos juros. 11- Não foi entregue aos autores cópia de qualquer contrato que contivesse cláusulas sobre obrigações subordinadas SLN, nem que contivesse prazos de resolução unilateral pelos autores. 12- Na data do prazo de maturidade, o capital investido não foi pago aos autores. 13- Em consequência do facto referido em 12, os autores estão impedidos de utilizar o seu dinheiro da forma que entendessem, o que os coloca num estado de preocupação, com receio de não reaverem ou de não saberem quando vão reaver o seu dinheiro. 14- As obrigações SLN 2006 foram emitidas pela SLN, SGPS, SA, sociedade que à data detinha 100% do capital social do banco BPN, o que deteve de forma permanente até à nacionalização das acções participativas do capital social deste banco, ocorrida em Novembro de 2008. 15- Às datas referidas em 2 e 3 não eram previsíveis as circunstâncias em que ocorreria a nacionalização referida em 14. 16- À data referida em 2, o Fundo de Garantia de Depósitos tinha o valor máximo de € 25.000,00 por conta bancária.
5.2. Segunda questão. 5.2.1. A julgadora decidiu nos seguintes termos: «Dispõe o artº 324º nº 2 do CVM que salvo dolo ou culpa grave, a responsabilidade do intermediário financeiro por negócio em que haja intervindo nessa qualidade prescreve decorridos dois anos a partir da data em que o cliente tenha conhecimento da conclusão do negócio e dos respectivos termos. Perante esta norma legal haveria que qualificar a culpa do banco BPN, na violação daqueles deveres de informação, por forma a concluirmos pela existência ou não de dolo ou culpa grave. Porém, uma questão prévia se levanta, qual seja a data em que o autor teve conhecimento do negócio e dos respectivos termos. Como abundantemente já se referiu, em Abril de 2006, a autora subscreveu uma obrigação SLN 2006 porque a mesma lhe foi apresentada como um produto, com boa remuneração e com capital garantido, omitindo-se a circunstância de se tratar de uma obrigação subordinada, bem como os riscos que tal implicava. O que ignoramos, foi em que data é que a autora teve conhecimento das reais características de tais obrigações, para podermos concluir pela data em que teve conhecimento dos termos do negócio. Na verdade, ainda que se encontre demonstrado que a autora se deslocou à agência bancária após ter recebido a carta para citação a que se alude em 10, ignoramos em concreto o que lhe foi transmitido. Na ausência desta prova há que fazer funcionar o disposto no artº 343º nº 2 do Código Civil o qual dispõe que nas acções que devam ser propostas dentro de certo prazo a contar da data em que o autor teve conhecimento de determinado facto, cabe ao réu a prova de o prazo ter já decorrido, salvo se outra for a solução especialmente consignada na lei. Por outro lado sempre se dirá que o prazo prescricional ainda não decorreu uma vez que, atenta a matéria de facto dada como provada, é de concluir que o banco réu actuou com culpa grave, para o efeito de não aplicabilidade do prazo de prescrição de dois anos, uma vez que o banco ocultou informação relevante, visando obter a anuência do cliente a um determinado produto que a autora nunca subscreveria se tivesse conhecimento de todas as características do mesmo (cf. facto 12). Desta forma, a conduta do Banco violou de forma grave o dever de informação, ficando pois excluída da aplicação do prazo curto de prescrição previsto no art. 324º, nº 2 do Código dos Valores Mobiliários, e sujeita ao prazo ordinário de 20 anos, previsto no art.º 309.º do Código Civil (desta forma, em igual sentido, citado Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 17-03-2016, e ainda, Acórdão do Tribunal da Relação de Guimarães de 27-04- 2017, Proc. 2928/16.7T8GMR.G1, in www.dgsi.pt). Assim, pelos motivos expostos se julga improcedente a excepção da prescrição» Já o réu considera, por um lado, que os autores tiveram conhecimento da natureza da aplicação com a receção dos extratos bancários no seu domicílio, ou, no máximo, em novembro de 2008 com a nacionalização do banco recorrente. E, por outro lado, que não atuou com dolo ou culpa grave, mas, quando muito, atuou negligentemente, induzindo os autores em erro. 5.2.2. Atentemos. O artº 324º nº 2 do CVM prevê dois prazos de prescrição. Se o agente agir com dolo ou culpa grave, vale o prazo geral de 20 anos. Se não agir, o prazo é de dois anos. Quanto ao primeiro não há matéria factual bastante para atribuir ao réu uma conduta dolosa, ie. deliberadamente fraudulenta e enganatória, em sentido forte. Mas ela já é suficiente para se concluir que atuou com culpa grave. Na verdade, a culpa: (i) será levíssima quando o agente tiver omitido os deveres de cuidado que só uma pessoa excepcionalmente diligente teria observado; (ii) será leve quando o parâmetro atendível for o comportamento de uma pessoa normalmente diligente; (iii) será grave quando a omissão corresponde àquela em que só uma pessoa excepcionalmente descuidada e incauta teria também incorrido.» - Cfr. ACSTJ de 25-03-2009, p. n.º 3087/08 -4.ª Secção. No caso emerge esta culpa grave pois que dos factos provados dimana que a funcionária do banco prestou aos autores, conscientemente, ou, ao menos, com excecional descuido, informações nuclearmente consubstanciadas na equiparação, máxime quanto à segurança do capital investido, das obrigações subordinadas a um depósito a prazo, o que se revelava errado e enganatório, aqui em sentido fraco. Versus o entendido pelo recorrente, o que releva não é, ou não é essencialmente, a convicção pessoal e subjetiva do agente, neste caso se a funcionária do banco estava convencida da segurança do investimento. Mas antes releva o que, objetivamente lhe era exigível que transmitisse à autora, em função das circunstâncias, vg. do cariz não seguro do investimento quanto ao capital e da atitude conservadora da autora na aplicação das suas poupanças. Ora os funcionários do banco sabiam - ou, o que é o qb., era-lhes exigível que soubessem -, da natureza potencialmente aleatória e arriscada da aplicação com possibilidade teórica da perda do capital investido. E sendo irrelevante se, na conjuntura, ninguém acreditasse na possibilidade desta perda; o que releva, dada a natureza da aplicação, é a dita possibilidade teórica. Pelo que deveriam ter informado a autora em conformidade. O que não apenas não fizeram, como fizeram o contrário: asseverando a garantia do capital, tal como num deposito a prazo, o que não era tecnicamente verdadeiro. Assim, e desde logo relevava o prazo de 20 anos. 5.2.3. Mas mesmo que assim não fosse ou não se entenda, cumpriria ainda atentar no mais previsto em tal segmento normativo. Aqui urge ter presente que ele fixa o dies a quo do prazo de prescrição não apenas na data da conclusão do negócio, mas, também, na data em que este foi concluído e o subscritor teve conhecimento dos seus termos, i.e do seu conteúdo. Se tal conclusão e conhecimento coincidirem na mesma data, é a partir dela que se começa a contar o aludido prazo. Se não coincidirem, será a partir da data mais recente - a da conclusão ou do conhecimento, pois que inexiste uma inelutável precedência lógica para a primeira ocorrência de qualquer destes quids – que tal prazo começa a contar. Ademais, como exceção perentória que extingue o direito invocado, a prescrição tem de ser provada por quem a invoca por um modo e com uma aquidade e clareza que que não deixem dúvidas. Se dúvidas houver, e ultrapassem a margem de álea em direito probatório concedida ao julgador, elas resolvem-se contra a parte a quem aproveita a prescrição, não podendo tal exceção ser dada como provada - artº 414º do CPC Ora a receção dos extratos bancários e a nacionalização do banco, por si só, não demonstram que os autores ficaram a conhecer o jaez do produto que subscreveu. Aquelas receções foram atos normais, correntes a tabelares que, naturalmente, não alertaram mais os autores para a o cariz das obrigações subordinadas do que já (não) tinha alertado o boletim de subscrição das mesmas. Já a nacionalização é um ato politico administrativo apenas incidente sobre o banco, e sequer dirigido diretamente aos subscritores do produto, do que emerge a mesma inidoneidade ou, ao menos, insuficiência, para a consecução daquele concreto alerta e dever informativo sobre o produto subscrito. Assim sendo, provou-se a data da celebração dos contratos – abril de 2006 e julho de 2008. Mas não se provou a data do conhecimento do seu teor por banda dos autores. Do que tudo decorre que a prescrição não pode ser acolhida.
5.3. Terceira questão. 5.3.1. A julgadora decidiu nos seguintes, sinóticos e essenciais, termos: «Dispõe o artº 314º do CVM que: 1- Os intermediários financeiros são obrigados a indemnizar os danos causados a qualquer pessoa em consequência da violação de deveres respeitantes ao exercício da sua actividade, que lhes sejam impostos por lei ou por regulamento emanado de autoridade pública. 2- A culpa do intermediário financeiro presume-se quando o dano seja causado no âmbito de relações contratuais ou pré-contratuais e, em qualquer caso, quando seja originado pela violação de deveres de informação. …as informações foram omitidas no âmbito de uma relação bancária contratual pré-existente, uma vez que a autora era detentora de uma conta de depósitos à ordem no mesmo banco, a significar que a conduta do banco réu no que se refere à prestação de informações erróneas ou falsas terá que ser analisada em sede de responsabilidade contratual. …importa referir que tal como sucede na responsabilidade extracontratual, o dever de indemnizar pressupõe: a) A ilicitude do facto danoso, entendida esta como a desconformidade entre o comportamento devido pelo seu autor e o comportamento observado; b) A culpa sob a forma de dolo ou negligência, culpa esta que se presume face ao disposto no artº 314º nº 2; c) O dano; d) O nexo de causalidade entre o facto e os danos sofridos pelo lesado. Quanto à ilicitude do facto traduz-se ela na violação dos deveres de informação, pela omissão de informação relevante, violação esta que levou os autores a investir num produto que julgava ter determinadas características, designadamente que o mesmo não comportava qualquer risco, circunstância que não se verificava em caso de insolvência da entidade emitente e da subordinação inerente a tal produto, aspectos para os quais os autores não foram alertados, ainda que outras informações lhe tenham sido prestadas, como a cadência do pagamento dos juros. Acresce que, temos também demonstrado (cf. facto 7) que se a autora tivesse conhecimento do aludido risco jamais teria autorizado tal aplicação, com o que se demonstrado o nexo causal entre a violação de tais deveres e o dano sofrido pela autora, qual seja a perda co capital investido. Por último, e face à existência deste nexo causal, nos termos do disposto no artº 314º nº 2, a culpa do banco BPN presume-se, sendo certo que não foi ilidida esta presunção. Deste modo, estão verificados os pressupostos da obrigação de indemnizar os autores, indemnização essa correspondente ao valor do capital investido, € 150.000,00, uma vez que se trata do montante que os autores despenderam com a subscrição de três obrigações SLN 2006 e que não teriam subscrito não fora a violação dos deveres de informação por parte do banco BPN. Já quanto aos juros, carece de sentido atribuir os juros desde a data do prazo de maturidade. Com efeito, é consabido que, no âmbito da responsabilidade contratual, o devedor considera-se constituído em mora quando, por causa que lhe seja imputável, a prestação, ainda possível, não foi efectuada no tempo devido (artº 804º nº 2). Tratando-se de uma obrigação pecuniária a indemnização corresponde aos juros a contar do dia da constituição em mora (artº 806º nº 1). In casu a prestação que impende sobre o réu tem natureza pecuniária e é ainda possível mas para que o devedor se considere constituído em mora é necessário que haja sido judicial ou extrajudicialmente interpelado para cumprir, salvo quando ocorra alguma das situações tipificadas no nº 2 do artº 805, nas suas diversas alíneas. Não foi alegado em que data concreta foi requerido o resgate do capital, pelo que apenas são devidos juros de mora desde a data da citação.» 5.3.2. Esta subsunção e exegese afiguram-se curiais e adequadas, quer em tese, quer para os contornos fáctico circunstanciais nos autos apurados. Em seu abono diz-se mais o seguinte (aliás, reiterando-se o expendido no processo nº 2239/23.... que teve como ilustre advogado do recorrente e como relator os que também o são nos presentes autos, e sendo que os factos determinantes apurados bem como o teor das alegações, se apresentam, na sua essencialidade relevante, os mesmos). Como referido na sentença há que perspetivar, a seguinte legislação. O Regime Geral das Instituições de Crédito e Sociedades Financeiras -R.G.I.C.S.F. - aprovado pelo DL 298/92, de 31/12, na redação vigente à data dos factos introduzida pelo DL n.º 252/2003, de 17/10 - estabelece a regulação pública da atividade das instituições de crédito e instituições financeiras. Nele releva o artº 73º o qual estatui: "«s instituições de crédito devem assegurar, em todas as atividades que exerçam, elevados níveis de competência técnica, garantindo que a sua organização empresarial funcione com os meios humanos e materiais adequados a assegurar condições apropriadas de qualidade e eficiência«. Sequencialmente, os artigos 74.º e 75.º, entre outros deveres de conduta, determinam que os administradores e os empregados das instituições de crédito devem proceder «com diligência, neutralidade, lealdade e discrição e respeito consciencioso dos interesses que lhes estão confiados… Já o CVM, aprovado pelo DL nº 486/99 de 13.11, estabelece no art. 289º nº1,al. a), que são atividades de intermediação financeira os serviços e atividades de investimento em instrumentos financeiros. Por sua vez, intermediários financeiros são, nos termos do art. 293º nº1 al. a), as instituições de crédito (e as empresas de investimento), que estejam autorizadas a exercer atividades de intermediação financeira em Portugal. São serviços e atividades de investimento em instrumentos financeiros, segundo o art 290º nº1, als. a) e b), a receção e a transmissão de ordens por conta de outrem, bem como a execução de ordens por conta de outrem. Importa destacar as seguintes normas com relevo para o caso concreto em apreciação: Artigo 7.º (Qualidade da Informação) 1 - Deve ser completa, verdadeira, actual, clara, objectiva e lícita a informação respeitante a valores mobiliários, a ofertas públicas, a mercados de valores mobiliários, a actividades de intermediação e a emitentes que seja susceptível de influenciar as decisões dos investidores ou que seja prestada às entidades de supervisão e às entidades gestoras de mercados, de sistemas de liquidação e de sistemas centralizados de valores mobiliários… Artigo 304.º (Princípios) 1 - Os intermediários financeiros devem orientar a sua actividade no sentido da protecção dos legítimos interesses dos seus clientes e da eficiência do mercado. 2 - Nas relações com todos os intervenientes no mercado, os intermediários financeiros devem observar os ditames da boa fé, de acordo com elevados padrões de diligência, lealdade e transparência. 3 – Na medida do que for necessário para o cumprimento dos seus deveres, o intermediário financeiro deve informar-se sobre a situação financeira dos clientes, a sua experiência em matéria de investimentos e os objectivos que prosseguem através dos serviços a prestar. Artigo 312.º (Deveres de Informação) 1 - O intermediário financeiro deve prestar, relativamente aos serviços que ofereça, que lhe sejam solicitados ou que efectivamente preste, todas as informações necessárias para uma tomada de decisão esclarecida e fundamentada, incluindo nomeadamente as respeitantes a: a) Riscos especiais envolvidos pelas operações a realizar; b) Qualquer interesse que o intermediário financeiro ou as pessoas que em nome dele agem tenham no serviço prestado ou a prestar; c) Existência ou inexistência de qualquer fundo de garantia ou de protecção equivalente que abranja os serviços a prestar; d) Custo do serviço a prestar. Artigo 314.º na redação vigente à data da prática dos factos: 1 - Os intermediários financeiros são obrigados a indemnizar os danos causados a qualquer pessoa em consequência da violação de deveres respeitantes ao exercício da sua actividade, que lhes sejam impostos por lei ou por regulamento emanado de autoridade pública. 2 - A culpa do intermediário financeiro presume-se quando o dano seja causado no âmbito de relações contratuais ou pré-contratuais e, em qualquer caso, quando seja originado pela violação de deveres de informação. Sendo de notar que este preceito, na sua atual redação, reforça ainda mais o cuidado que o intermediário deve ter com o cliente, pois que prescreve: Artigo 314.º Princípio geral 1 - O intermediário financeiro solicita ao cliente informação relativa aos seus conhecimentos e experiência em matéria de investimento no que respeita ao tipo de instrumento financeiro ou ao serviço considerado, que lhe permita avaliar se o cliente compreende os riscos envolvidos, nos termos previstos na legislação da União Europeia. 2 - Se, com base na informação recebida ao abrigo do número anterior, o intermediário financeiro julgar que a operação considerada não é adequada àquele cliente deve adverti-lo, por escrito, para esse facto, devendo o cliente confirmar, por escrito, que recebeu a advertência em causa. E do disposto no art. 39.º, n.º 1, do Regulamento da CMVM n.º 12/2000, Antes de iniciar a prestação de um serviço, o intermediário financeiro: a) fornece ao investidor informação adequada sobre a natureza, os riscos e as implicações da operação ou do serviço em causa, cujo conhecimento seja necessário para a tomada de decisão de investimento ou de desinvestimento, tendo em conta a natureza do serviço prestado e o conhecimento e a experiência do investidor em causa; b) entrega ao investidor documento sobre os riscos gerais do investimento em valores mobiliários ou noutros instrumentos financeiros; c) fornece ao investidor informação específica e detalhada sobre o risco envolvido, quando os produtos ou serviços envolvam risco de liquidez, risco de crédito ou risco de mercado; d) informa o investidor sobre a existência e modo de funcionamento do serviço do intermediário financeiro destinado a receber a analisar as reclamações dos investidores e da possibilidade de reclamação junto da entidade de supervisão. A questão de saber se os intermediários financeiros cumprem, ou não, o seu dever de informação para com o cliente, requisito que é conditio sine qua non para concluir sobre a (i)licitude da sua conduta, por seu turno pressuposto inexorável, em cumulação com os demais – culpa, dano e nexo de causalidade -, para a sua responsabilização, tem constituído uma vexata quaestio, ou seja, uma problemática intrincada e de difíceis, e díspares, soluções. Como dimana dos preceitos supra citados é consensual que o dever e informação, neste conspeto do tráfico jurídico comercial e financeiro, é indeclinável, e assume - por virtude dos maiores ou menores riscos que, normalmente, estão associados aos investimentos - um jaez imbuído de maior exigência para o intermediário. Até porque, por via de regra, existe uma posição assimétrica dos intervenientes, com maior poder e conhecimentos por banda do intermediário por reporte ao cliente/investidor. Este dever justifica-se, em nosso entendimento, essencialmente por três ordens de razões: - a cada vez maior complexidade dos produtos financeiros; - a sua cada vez maior volatilidade e insegurança derivada de um controlo dos mercados financeiros por grandes operadores, os quais podem assumir e praticar procedimentos especulativos; - o suposto e exigível apetrechamento técnico – vg., a nível humano, através de funcionários/colaboradores qualificados - dos intermediários financeiros para proporcionarem as minuciosas informações necessárias ao cumprimento de tal dever, de sorte a que o investidor, máxime o individual, normalmente leigo na matéria, assuma as suas opções de investimento conscienciosa e esclarecidamente. E, assim, sendo a atuação do intermediário financeiro, neste particular, associada não ao normal ou mediano, mas ao diligentíssimo bónus pater família. – cfr. vg. Acs. da RP de 13.06.2018, p. 3703/16.4T8VFR.P1 e de 15.11.2018, p. 5780/17.1T8PRT.P1, Ac. da RC de 25.09.2018, p. 3446/16.9T8LRA.C1, e Ac. do STJ, de 10.04. 2018 p. 753/16.4TBLSB.L1.S1., todos in dgsi.pt, como os infra citados. Não obstante, certo é que das inúmeros arestos que já se debruçaram sobre esta matéria dimanam algumas diferenças ou nuances relativamente à extensão e a profundidade da informação a prestar pelo intermediário ao cliente. Descortinando-se uma tendência claramente definida, com a qual concordamos, qual seja, a de considerar que a maior ou menor exigência na prestação, qualitativa e quantitativa, da informação, dimana das circunstancias do caso concreto, como, p. ex.,do perfil do cliente e dos seus maiores ou menores conhecimentos na matéria. Assim e, entre outros, cfr. Ac. da RC de 15.05.2018, p. 2339/16.4T8LRA.C2.; Ac. RP de 11.04.2018, p. 1647/16.9T8PVZ.P1; Ac. da RL de 07.02.2019, p. 1592/17.0T8LRA.L1. e Ac. do STJ de 18.09.2018, p. 20403/16.8T8SLB.L1.S. Corroborando-se este entendimento importa operar uma precisão interpretativa. Uma coisa é, perante um cliente mais conhecedor do produto, admitir-se que as informações sejam menos incisivas e pormenorizadas do que seriam para outro menos atento e capaz. Outra coisa, inadmissível, é prestarem-se, adrede e convictamente, abundantes informações que não correspondem, em aspetos essenciais, como seja a certeza da garantia do reembolso do capital, às caraterísticas do produto. Quanto a nós sempre pugnamos que, provando-se, nuclearmente: i- que o banco informou que as obrigações subordinadas eram um produto igual, semelhante ou equivalente a um depósito a prazo; ii- que complementou esta informação genérica com a concreta informação de que o capital estava sempre garantido; iii- que o cliente, sem conhecimentos especiais na matéria, aderiu ao produto com este convencimento; está claramente provada a violação ilícita do dever de informação – cfr. neste sentido o Ac. da RC de 2018.10.09., p. nº2406/16.4T8LRA.C1; Ac. do STJ de 07.02.2019, p. 31/17.1T8PVZ.P1.S1; Ac. do STJ de 23.03.2021, p. 1209/19.9T8STR.E1.S1; Ac. do STJ de 10.01.2023, p. 4127/18.4T8VIS.C1.S1, todos in in dgsi Tendo-se sumariado nestes dois últimos Arestos: «I - A informação prestada pelo intermediário financeiro é deficiente e inexacta quando não elucida aspectos essenciais do produto de modo a permitir ao cliente entender as respectivas especificidades. II - Constitui aspecto essencial para um investidor de perfil conservador e não qualificado a informação de que o produto (obrigações SLN) tinha a mesma garantia de um depósito a prazo, sem que lhe tenha sido explicitado, pelo menos, que não lhe assistia a garantia prevista para os depósitos bancários a prazo, isto é, o reembolso de € 25 000,00 garantidos legalmente, que consubstancia característica específicas do produto ab initio (por não estar dependente de quaisquer variantes, designadamente, da evolução da conjuntura económico-financeira). III - A violação do dever de informação que impende sobre intermediário financeiro leva a presumir a sua conduta como culposa, nos termos do disposto no art. 314.º, n.º 2, do CVM. IV - Actua com culpa grave o intermediário financeiro que utiliza informação enganosa quanto às características do produto sabendo que o cliente não subscreveria a aplicação se tivesse tido conhecimento da realidade das mesmas.» «A violação dos deveres de esclarecimento e de informação decorrentes dos arts. 7.º, n.º 1, 312.º n.º 1, alínea a), e 314.º do Código dos Valores Mobiliários, na redação anterior à introduzida pelo Decreto-Lei n.º 357-A/2007, de 31 de Outubro, deve dar-se por verificada desde que a subscrição de obrigações subordinadas tenha sido sugerida pelo intermediário financeiro a clientes que não tinham conhecimentos ou experiência para avaliar o risco daquele produto financeiro e que não tinham a intenção de aplicar o seu dinheiro em produtos de risco, com a informação / explicação de que o reembolso do capital era garantido, ou uma informação equivalente e sem uma explicação adequada do que eram obrigações subordinadas.»
Efetivamente, as obrigações subordinadas podem, quanto ao facto de se tratar de um produto com prazo certo e render juros periódicos, serem comparadas a um depósito a prazo. Mas já quanto à sua natureza intrínseca e consequente risco, já não o podem ser porque não são semelhantes, ou seja: análogos, equivalentes, idênticos, congéneres, conformes. O depósito a prazo é a aplicação financeira mais segura e, tendencialmente, de capital garantido: apenas o total colapso da instituição bancária ou a sua insolvência o põe em risco. Acresce que a atividade bancária está fortemente regulada/regulamentada, pelo que, em tese e por regra – ainda que, infelizes exceções recentes tenham postergado este normal acontecer - tal colapso não é perspetivável. Ademais – e, certamente para proteção das pequenas poupanças individuais e familiares que custaram a ganhar – o próprio Estado assegura o seu reembolso até um certo montante não despiciendo: presentemente cem mil euros. Já as obrigações são um produto estritamente financeiro e a sorte da sua segurança e solvabilidade está já e apenas dependente da atividade de uma sociedade comercial, essencialmente no âmbito e âmago das leis do mercado, com todas as vicissitudes e riscos que daí podem advir, vg. em função de atuações temerárias e/ou especulativas ou, até, ilícitas, não apenas da sociedade emitente, mas de outras, ou também de outras, que a podem negativamente afetar. Não se pode, pois, asseverar que a (in)segurança e a (in)solvabilidade de um depósito a prazo é comparável, e, muito menos, semelhante, a um produto obrigacionista, ademais de cariz subordinado, ou seja, apenas pagável, em caso de insolvência da sociedade emitente, a SLN, após outros encargos ou obrigações preferenciais ou comuns – cfr. art. 360º, nº 1, e), do Cód. Soc. Com. Como se viu, sobre a funcionária do banco réu incidia o dever de informar, cabal e circunstanciadamente, sobre o jaez e o risco do produto subscrito. In casu, e, perante os factos provados, não cumpriu tal dever. Antes pelo contrário, convenceu os autores que a aplicação era segura, semelhante a um depósito a prazo, o que, como se viu, era inexato. Mesmo que se admita que algo referiu aos autores que os levasse a pensar que as obrigações e o deposito a prazo não eram a mesma realidade financeira e que aquelas assumiam alguns riscos, tal informação não foi suficiente, como exige a lei, pois que se provou: 7- Os autores têm a 4ª classe, são pessoas com perfil conservador e sem apetência para o risco, razão pela qual…se tivessem tomado conhecimento de que os produtos que lhe foram propostos e que adquiri(ram) apresentava algum risco, designadamente porque que se tratava de obrigações subordinadas, não teria(m) autorizado tal aplicação, o que era do conhecimento dos funcionários da agência referida em 1. 5.3.3. Ademais, e Sdr. os nucleares argumentos invocados pelo recorrente na conclusão 19ª e segs. não procedem. No caso aplica-se o artº 312º, na redação vigente em 2006 e não o artº 312º-E, aliás presentemente já revogado – conclusão 25ª. Depois, este preceito não apenas exige informação cabal, esclarecida e fundamentada, relativamente à atividade de intermediação genericamente considerada, como relativamente aos instrumentos financeiros - «operações», nos termos legais – que estiverem em negociação e em vias de serem realizados. Depois, mesmo que as informações devam ser dadas em função dos riscos próprios do instrumento financeiro sem se analisar ou avaliar a robustez financeira do emitente, tais informações deveriam ser prestadas, máxime quanto à não garantia do capital, pois que esta aplicação não o garante. Ora não apenas não se apurou a prestação de tal informação, como se provou o seu contrário, ou seja, que os autores foram convencidos que as obrigações subordinadas eram aplicação segura idêntica a deposito a prazo, com garantia de capital, o que não é verdade A afirmação de que «À data da contratação das obrigações não existia sequer qualquer dever de informação quanto aos riscos associados ao instrumento financeiro, ou quanto ao risco de perda da totalidade do investimento, conforme hoje decorre do art. 312º-E nº 2 alínea a)» - conclusão 33ª, é inverídica e peregrina. Existia, como se viu: era, nomeadamente, a supra citada. Dizer que: 35º. O uso da expressão “capital garantido” apenas se pode ter como referência à mecânica de funcionamento do investimento , que é feito por um determinado prazo, findo o qual o capital é reembolsado na totalidade, acrescido da rentabilidade.» é jogar com as palavras e querer «tapar o sol com a peneira», no brocardo popular. Capital garantido é o investidor, no momento do investimento, ter a certeza de que, no final do período da aplicação, vai efetivamente reembolsá-lo, aconteça o que acontecer, salvo circunstancias excecionalíssimas. Será o caso, presentemente, do depósito a prazo até cem mil euros que tem a garantia de pagamento do Estado, mesmo que o Banco entre em insolvência. Neste caso só não haverá garantia de reembolso se o Estado se desmoronar ou entrar em incumprimento de tal modo grave, e definitivo, que não possa cumprir esta garantia. O que, convenhamos, será caso muito raro. Muito menos raro e até comum é caso da insolvência de uma qualquer empresa, mesmo com dimensão e nome no mercado. Veja-se o caso Lehman Brothers entre outros. Nestes casos, como o presente, a informação fidedigna e bastante para que o cliente se decida, consciente e esclarecidamente, impõe-se, como se viu. O alegado na conclusão 36ª «Não é porque um investimento se possa vir a revelar ruinoso, que o mesmo pode ser classificado como investimento de risco... Tal juízo tem de ser feito retroagindo ao momento da subscrição…» também não é inteiramente correto. Assumindo o investimento, em si mesmo, no momento da subscrição, risco, teórico e potencial – como acontece nas obrigações subordinadas - a informação aludida sobre tal jaez e possibilidade, mesmo que remota, de perda, total ou parcial, do capital, tem de ser fornecida independentemente da maior ou menor estabilidade económico financeira do momento. Finalmente o expendido na conclusão «39º. A VIOLAÇÃO DO DEVER DE INFORMAÇÃO NÃO IMPLICA QUALQUER PRESUNÇÃO DE ILICITUDE! E, portanto, tinha de ser a A. a alegar e provar que concretas informações é que o Banco Réu deveria ter dado, que não deu! Não o tendo feito, tem a presente ação necessariamente que claudicar! (sublinhado nosso)., assume-se como totalmente inaceitável porque contrária às aludidas disposições legais. Na verdade, impondo elas ao intermediário financeiro o dever de informar o investidor, invocada por este a falta do seu cumprimento de tal dever, sobre aquele, e não sobre os autores, impende o ónus de provar tê-lo cumprido – artº 342º nº2 do CCivil. Finalmente, a referência nas conclusões: 48º. …não consta da matéria de facto dada como provada que a A., se lhe tivesse sido fornecida toda a informação sobre o produto, não teria realizado o investimento. Até porque tal facto não foi sequer alegado! 49º. Não se poderá assim ter por verificado, no seguimento da jurisprudência agora uniformizada, o requisito do nexo de causalidade e, como tal, não poderá o banco Recorrente ser responsabilizado pelo dano que se produziu em virtude do incumprimento da SLN, só por erro, ou temeridade pôde ser plasmado. Os autores alegaram tal nexo de causalidade - artº9º da pi- e ele foi provado – facto 7. O que não foi alegado na contestação, não foi provado e não foi decidido foi o invocado na conclusão 40ª atinente ao não reembolso da totalidade do valor da subscrição, por a autora ter já recebido valores por tal aplicação. E sendo que, como é consabido, os tribunais de recurso apenas reponderam o já decidido e não decidem em primeira mão e ex novo questões não alegadas e decididas na 1ª instância, esta pretensão está patentemente votada ao insucesso. Pelo exposto, e perante os factos ora provados, afigura-se-nos meridianamente claro que o dever de informação do intermediário financeiro foi violado pelo banco. Pois que, face a eles, se encontram presentes os requisitos supra referidos em i a iii. Constatada a atuação ilícita do banco por virtude da violação do dever de informação a culpa do mesmo presume-se, nos termos do artº 314º nº2 do CVM. E o nexo de causalidade está, outrossim, presente. Tal dimana do ponto provado em 7 «7- Os autores têm a 4ª classe, são pessoas com perfil conservador e sem apetência para o risco, razão pela qual…se tivessem tomado conhecimento de que os produtos que lhe foram propostos e que adquiri(ram) apresentava algum risco, designadamente porque que se tratava de obrigações subordinadas, não teria(m) autorizado tal aplicação, o que era do conhecimento dos funcionários da agência referida em 1.». Está assim cumprido o requisito exigido pelo AUJ de nº 8/2022, de 6 de Dezembro, que uniformizou a jurisprudência nos seguintes termos: “1. No âmbito da responsabilidade civil pré-contratual ou contratual do intermediário financeiro, nos termos dos arts. 7º, nº 1, 312º, nº 1, al. a), e 314º do Código dos Valores Mobiliários, na redação anterior à introduzida pelo DL nº 357-A/07, de 31-10, e 342º, nº 1, do CC, incumbe ao investidor, mesmo quando seja não qualificado, o ónus de provar a violação pelo intermediário financeiro dos deveres de informação que a este são legalmente impostos e o nexo de causalidade entre a violação do dever de informação e o dano. 2. Se o Banco intermediário financeiro – que sugeriu a subscrição de obrigações subordinadas pelo prazo de maturidade de 10 anos a um cliente que não tinha conhecimentos para avaliar o risco daquele produto financeiro nem pretendia aplicar o seu dinheiro em produtos de risco – informou apenas o cliente, relativamente ao risco do produto que “o reembolso do capital era garantido (porquanto não era produto de risco”) sem outras explicações, nomeadamente, o que eram obrigações subordinadas, não cumpre o dever de informação aludido no art. 7º, nº1, do CVM. 3. O nexo de causalidade deve ser determinado com base na inexatidão, imputável ao intermediário financeiro, da informação necessária para a decisão de investir. 4. Para estabelecer o nexo de causalidade entre a violação dos deveres de informação, por parte do intermediário financeiro, e o dano decorrente da decisão de investir, incumbe ao investidor provar que a prestação da informação devida o levaria a não tomar a decisão de investir. Sendo de notar que já existe jurisprudência que dispensa a prova do nexo de causalidade na formulação negativa do AUJ. E considerando que ele existe, se, mesmo nãos e apurando naquela formulação negativa, se opere, numa formulação positiva a «demonstração de que a decisão de investir ulteriormente danosa, tida como consciente e responsável, foi tomada decisiva e essencialmente, com base, como sua condição e neste contexto atendendo a um critério de previsibilidade-verosimilhança e probabilidade, em informação que, sendo necessária e crítica, não foi prestada ou foi prestada de forma incompleta, falsa, inexacta ou obscura).» Assim: «É de decretar a responsabilidade peticionada ao banco-intermediário financeiro se se logrou demonstrar …um quadro suficiente de circunstâncias subjectivas e objectivas do processo factual que permita concluir, atendendo a um critério de previsibilidade-verosimilhança e probabilidade causal (art. 563.º do CC) na imputação do dano, que foi o incumprimento da informação devida…» - Ac. STJ de 17.12.2024, p. 25984/16.3T8LSB.L1.S2. Aliás, nesta senda e concomitantemente urge não esquecer que a nossa lei - artº 563º do CC - consagra a teoria da causalidade adequada na formulação negativa de Enneccerus-Lehman nos termos da qual: « o facto que actuou como condição do dano só deixará de ser considerado como causa adequada se, dada a sua natureza geral, se mostrar de todo indiferente para a verificação do mesmo, tendo-o provocado só por virtude das circunstâncias excepcionais, anormais, extraordinárias ou anómalas que intercederam no caso concreto» -- como ainda a causalidade indirecta, bastando que o facto condicionante desencadeie outro que directamente suscite o dano» -Cfr. entre outros, os Acs. do STJ de 06.11.2002, 29.06.04, 20.10.2005, 07.04.2005 e 13-03-2008 in dgsi.pt, ps. 02B1750, 03B4474, 05B2286, 05B294 e 08A369 e A. Varela, in Das Obrigações em Geral, 2ª ed ps. 746/756. Ora há que convir que mesmo que não se tivesse provado o facto 7 e se admitisse que a informação falsa/inexata/ insuficiente não foi a única causa da determinação da vontade dos autores no sentido de subscrever as obrigações subordinadas, ao menos alcança-se inequívoco, numa sagaz exegese de todos os outros factos apurados – cfr. factos dos pontos 2, 5 e 8 - que foi a causa/fator, essencial e determinante, que os levou a tal subscrição. Pelo que, mesmo assim, ela se revelaria causa adequada da subscrição dos autores do produto financeiro em dilucidação.
Improcede o recurso.
7. Deliberação. Termos em que se acorda julgar o recurso improcedente e, consequentemente, confirmar a sentença.
Custas pelo recorrente.
Coimbra, 2025.07.08.
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