Acórdão do Tribunal da Relação de Coimbra
Processo:
1202/24.0T8LRA.C1
Nº Convencional: JTRC
Relator: MÁRIO RODRIGUES DA SILVA
Descritores: CONTRATO COLETIVO DE TRABALHO
CONTABILISTA
RENOVAÇÃO
CADUCIDADE
Data do Acordão: 09/26/2025
Votação: UNANIMIDADE
Tribunal Recurso: JUÍZO DO TRABALHO DE LEIRIA DO TRIBUNAL JUDICIAL DA COMARCA DE LEIRIA
Texto Integral: N
Meio Processual: APELAÇÃO
Decisão: CONFIRMADA
Legislação Nacional: ARTIGOS 499.º, 501.º, N.ºS 5 E 8, 502.º, N.º 1, AL.ª B), II), 503.º E 515.º-A DO CÓDIGO DO TRABALHO
Sumário: I – A indicação exata das passagens das gravações não passa necessariamente pela sua localização temporal, sendo a exigência legal compatível com a transcrição das partes relevantes dos depoimentos, o que é diferente da invocação de extratos da síntese que o Tribunal “a quo” fez dos depoimentos das testemunhas.

II – Com a Lei nº 93/2019, de 4/09, o legislador previu expressamente, tendo presente, desde logo, a liberdade sindical (e de associação, no caso dos empregadores, negativa) uma outra forma de caducidade, mais precisamente a decorrente da extinção ou perda de qualidade de associação sindical ou de associação de empregadores celebrantes de convenção coletiva (art.º 502º, nº 1, al. b), ii) do CT).

III – O TC não declarou a inconstitucionalidade da norma contida na subalínea ii), da al. b), do nº 1, do artigo 502º, na redação introduzida pela Lei nº 93/2019.

Com a Lei nº 93/2019, de 4 de setembro, o legislador veio solucionar em termos expressos os efeitos da cessação de vigência de convenção ou decisão arbitral aplicada por portaria de extensão, com o artigo 515º-A, que determina por remissão para o nº 8 do artigo 501º, que após a cessação, mantém-se, os efeitos já produzidos pela convenção ou decisão arbitral nos contratos de trabalho relativamente: a) à retribuição do trabalhador; b) categoria profissional e respetiva definição; c) duração do tempo de trabalho; d) regimes de proteção social cujos benefícios sejam substitutivos dos assegurados pelo regime geral de segurança social ou com protocolo de substituição do Serviço Nacional de Saúde; e) parentalidade; e f) segurança e saúde no trabalho.


(Sumário elaborado pelo Relator)
Decisão Texto Integral: ***

Acordam no Tribunal da Relação de Coimbra


***

RELATÓRIO

A..., Lda., intentou a presente ação declarativa com processo comum contra AA, pedindo a condenação da ré a pagar-lhe a quantia de €55.865,80, sendo €48.968,56, a título de danos patrimoniais e €7000,00 a título de danos não patrimoniais, acrescida de juros até ao seu integral pagamento.

Alegou, em síntese que exerceu a ré exerceu, por sua conta, a atividade de contabilista, tendo a relação laboral iniciado em 01/09/2011 e cessado no dia 01/03/2023. Por força do CCT entre a APECA e a SITESC que rege os trabalhadores e as empresas que prestam serviços de contabilidade, publicado no BTE n.º 1, de 08/01/2023 e que foi objeto de Portaria de Extensão (que não identifica), a ré estava obrigada, nos termos da cláusula 14ª, a não assumir qualquer vínculo contratual relativamente a clientes da sua empregadora/autora até ao termo do exercício seguinte ao da cessação do contrato. Todavia, a ré abusou da sua posição de proximidade com os clientes da autora, os quais cessaram os contratos de prestação de serviços que tinham com a mesma, tendo a ré passado a prestar-lhes os mesmos serviços, em prejuízo da autora, tendo, por isso, direito a ser indemnizada no valor das avenças mensais que deixou de receber. Calculou em €2.095,36 + IVA o valor mensal das avenças que deixou de receber e que considerado o período desde junho de 2023 até dezembro de 2024, a ré deve à autora a quantia de €39.811,84 + IVA, no total de €48.968,56. Além destes prejuízos de natureza patrimonial a autora sofreu perturbações a nível interno porquanto todos os trabalhadores tiveram conhecimento desta situação e houve necessidade de os tranquilizar bem como reorganizar o trabalho em função da perda de clientes, o que prejudicou a produtividade da autora; além disso, viu o seu bom nome afetado no mercado. Reclamou, assim, a título de danos não patrimoniais a quantia de €7.000,00.

A ré apresentou contestação, invocando a exceção de ineptidão da petição inicial, alegando que a autora não estava dispensada de invocar os factos essenciais que integram a causa de pedir, designadamente não explicou o motivo de ser aplicável à relação entre as partes e o CCT alegado na petição inicial, pois não dizendo se a autora é associada de uma das associações outorgantes ou se a ré é sindicalizada e em que sindicato, não identificando a Portaria de Extensão aplicável nem a data da sua publicação. No BTE n.º 1 de 08/01/2023 foi publicado o CCT entre a APECA e a FEPCES, sendo que nenhum dos outorgantes era o SITESC. Como consta do BTE n.º 21, de 08/06/2017 foi “cancelado o registo dos estatutos do Sindicato dos Trabalhadores de Escritório, Serviços, Comércio, Alimentação, Hotelaria e Turismo – SITESC, efetuado no Diário da República, n.º 194, supl., III Série, de 23 de agosto de 1975, com efeitos a partir da data de publicação deste aviso no Boletim do Trabalho e Emprego”, pelo que o Sindicato em causa extinguiu-se. Como a autora não refere se é associada da APECA e a ré não é sindicalizada o referido CCT nunca poderia ter aplicação por força do princípio da filiação. Por outro lado, a CCT entre a APECA e a FEPCES, a ser aquela que a autora pretendeu invocar, seria aplicável mas apenas por força de uma PE que a autora não indica. Acresce que a PE do CCT entre a APECA e a FEPCES, foi publicada em DR através da Portaria n.º 152/2023, de 06/06 (que entrou em vigor no dia 11 de junho de 2023, sendo que a relação laboral extinguiu-se em data anterior) e no BTE n.º 22, de 15/06/2023. No caso de se entender, o que não concede, que (apesar de a autora não o referir) seria aplicável o CCT entre a APECA e o SinCESAHT e outras, publicado no BTE n.º 45 de 08/12/2015, por força da PE que indica, sempre aquele IRCT, à data da cessação do contrato de trabalho, caducou por força do disposto no art.º 501.º do CT porquanto vigorou pelo período de um ano, findo o qual não foi substituído (senão em 2023) ou renegociado. Resulta do exposto que às relações de trabalho entre a autora e a ré não é de aplicar nenhum dos IRCT que se mencionaram, além de que nunca a autora aplicou algum IRCT nas suas relações de trabalho com os seus trabalhadores, nunca tendo prestado informação sobre o CCT aplicável e a PE como se encontrava obrigada, nos termos previstos no art.º 106.º do CT. A entender-se ser aplicável o CCT invocado pela autora a cláusula 14ª, n.º 3, é nula por força do disposto no art.º 136.º do Código do Trabalho e por prejudicar a liberdade de trabalho do trabalhador após a cessação do contrato, pelo que não produz qualquer efeito, não podendo defender-se a existência de qualquer indemnização a atribuir à autora. Nunca aliciou ou desviou qualquer cliente da autora, sendo que os clientes mencionados pela autora é que decidiram cessar o contrato com esta e procuraram a ré, inexistindo assim qualquer conduta concorrencial ou desleal da ré.

Deduziu reconvenção pedindo que seja declarada nula a cláusula 14ª, n.º 3, do CCT entre a APECA e a FEPCES, publicado no BTE n.º 1, de 08/01/2023.

Na sequência da contestação veio a autora, na resposta, referir que afinal o contrato coletivo que pretendia indicar na petição inicial é o CCT entre a APECA e o SinCESAHT e outros, entre eles o SITESC, publicado no BTE n.º 4,5 de 08/12/2015, que foi objeto de Portaria de Extensão e do qual constava a cláusula 16.º-A que impunha deveres específicos aos técnicos oficiais de contas sendo que com a extinção das duas entidades outorgantes representantes dos trabalhadores, restava como outorgante a FEPCES e, neste sentido, a APECA e a FEPCES outorgaram novo contrato coletivo mas mantendo o conteúdo do contrato coletivo anterior, publicado no BTE n.º 1 de 08/01/2023, que foi objeto de PE, sendo que apesar de ter entrado em vigor em 11/06/2023, ou seja, após a cessação do contrato de trabalho em apreço, o CCT entre a APECA e a FEPCES entrou em vigor em 13/01/2023 enquanto a relação laboral subsistia. Para além disso, enquanto a PE não entrou em vigor aplicava-se o CCT entre a APECA e o SinCESAHT.

Respondeu à matéria da reconvenção e pugnou, a final, pela improcedência da matéria de exceção, devendo ser deferida a correção do CCT aplicável, sem prejuízo de posterior notificação para aperfeiçoamento da petição inicial, devendo ainda a reconvenção ser julgada improcedente por não provada.

A ré, a convite do Tribunal, veio alegar que a autora indicou, na resposta, um novo instrumento de regulamentação coletiva dizendo que afinal é este o aplicável, todavia, é inadmissível qualquer alteração à causa de pedir.

*

Foi proferido despacho saneador no qual foi julgada improcedente a exceção dilatória de ineptidão da petição inicial e, por inexistir acordo da Ré na alteração da causa de pedir, não havendo também da parte desta confissão, e mesmo que tivesse havido, não tendo sido feita a alteração no prazo a que alude o n.º 1 do art.º 265.º, não se admitiu a alteração da causa de pedir, considerando-se não escrita a Resposta em tudo o que não se relacione com a resposta à reconvenção.

Mais se relegou para final a apreciação do mérito dos autos, afirmando-se a validade e a regularidade da instância, dispensando-se a enunciação dos temas da prova.

Realizou-se a audiência de julgamento.

Foi proferida sentença com o seguinte dispositivo:

“Pelos fundamentos expostos, e atentas as normas legais citadas, decide-se julgar totalmente improcedente, por não provada, a presente ação intentada pela Autora A..., Lda., absolvendo-se a Ré AA, do pedido formulado pela Autora.

                                                                           *

                                                                           *

Custas a suportar pela Autora (art.º 527º, nºs 1 e 2 do Código de Processo Civil, aplicável subsidiariamente por força do disposto no art.º 1º, n.º 2, al. a) do Código de Processo do Trabalho).

                                                                           *

Valor da ação: o já fixado.

                                                                           *

Registe e notifique.”

Inconformada com o decidido, a autora interpôs recurso, terminando as suas alegações com as seguintes conclusões:

(…).

A ré apresentou contra-alegações com as seguintes conclusões:

(…).

O Exmº Procurador-Geral Adjunto junto deste Tribunal emitiu parecer no sentido de que deve ser negado provimento ao recurso, confirmando-se a sentença nos seus precisos termos.

Não houve resposta a este parecer.

Colhidos os vistos, cumpre decidir.

                                                                           ***

OBJETO DO RECURSO

Como é sabido, o objeto do recurso é delimitado nos termos dos artigos 635.º, n.º 4 e 639.º, n.ºs 1 e 2, do Código de Processo Civil, aplicável “ex vi” do art.º 87.º, n.º 1, do Código de Processo do Trabalho, ressalvadas as questões do conhecimento oficioso que ainda não tenham sido conhecidas com trânsito em julgado.

Em função destas premissas, as questões suscitadas são as seguintes:
1. Incumprimento dos requisitos constantes do art.º 640º do CPC (questão prévia- suscitada pela recorrida).
2. Impugnação da decisão quanto à matéria de facto.
3. Caducidade do CTT entre a APECA e a SinCESAHT (Sindicato do Comercio, Escritórios, Serviços, Alimentação, Hotelaria e Turismo e outras publicado no BTE n.º 45 de 08/12/2015, de 27/04.
4. Nulidade da “Cláusula 16.ª- do CTT entre a APECA e a SinCESAHT (Sindicato do Comercio, Escritórios, Serviços, Alimentação, Hotelaria e Turismo e outras publicado no BTE n.º 45 de 08/12/2015, de 27/04.

                                                                           ***

FUNDAMENTOS DE FACTO

A 1ª instância fixou a matéria de facto da seguinte forma:

“1 - Factos Provados

Discutida a causa, resultaram provados os seguintes factos com relevância para a decisão da mesma:

1) Entre a Autora e a Ré foi celebrado, em 01/09/2001, um contrato de trabalho, mediante o qual a Ré se obrigou a desempenhar, por conta, sob a direção e fiscalização da Autora, as funções de contabilista.

2) No dia 01/03/2023 a Ré entregou à Autora uma comunicação na qual informava a Autora da “decisão de rescisão do contrato de trabalho celebrado com a vossa empresa, passando a partir de hoje a cumprir o período de aviso prévio de 60 dias, conforme disposto no nº 1 do artigo 400 do código do trabalho”.

3) Por força da denúncia, o contrato de trabalho cessou em 01/05/2023.

4) No dia 04/05/2023 a sociedade “B..., Lda.” remeteu à Autora uma carta a informar da intenção de “rescindir o contrato de serviço de Contabilidade e Recursos Humanos que mantemos com a vossa empresa, com efeitos a partir de 31 de maio de 2023.”

5) Por cartas registadas datadas de 10/05/2023, as sociedades “C..., S.A.”, “D..., Lda.”, “E..., Lda.” e “F..., Lda.” remeteram, individualmente, à Ré, uma comunicação com o seguinte conteúdo: “Serve a presente de instrumento de rescisão/resolução do contrato de prestação de serviços de contabilidade que vimos mantendo com a vossa empresa, com efeitos a partir de 31 de maio de 2023.

Oportunamente serão contactados pelo gabinete de contabilidade/contabilista certificado que passará a acompanhar a nossa empresa a nível de “contabilidade”.

Ficamos gratos pela disponibilidade demonstrada ao longo dos anos”.

6) No dia 11/05/2023 a Ré remeteu à Autora uma comunicação com o seguinte teor:

“Na expetativa de que receberá os meus respeitosos cumprimentos, venho informá-lo de que fui contatada para assumir a responsabilidade pela organização e regularidade técnica, contabilística e fiscal dos seus clientes:

G... Lda., NIF: ...90

F... Lda., NIF: ...57

E... Lda., NIF: ...72

H... Lda. NIF: ...50

Neste sentido e dando cumprimento ao disposto no n.2 do art.74ª do Estatuto da Ordem dos Contabilistas Certificados, venho solicitar que me informe se os supra referidos lhes devem algo, em termos monetários, enquanto Contabilista Certificado ou se existe algum motivo que obste a que possa assumir a responsabilidade desta contabilidade, a partir do mês de junho de 2023.

Caso não exista qualquer entrave, solicito o favor de me remeter das quatro empresas, por email (...):

- As senhas de acesso ao portal da AT, segurança social, relatório único e outras necessárias;

- Ficheiro saft da contabilidade de 2022 e ficheiro saft da contabilidade até março de 2023;

- Balancete Analítico à data de 31/03/2023;

- Ficha do funcionário da E... Lda.;

- Fichas dos ativos e listagem inventário do imobilizado (em excel e pdf);

- E outros documentos necessários ao desenvolvimento do nosso trabalho.”

8) No dia 16/05/2023 a Ré remeteu à Autora uma comunicação com o seguinte teor: “Na expetativa de que receberá os meus respeitosos cumprimentos, venho informá-lo de que fui contatada para assumir a responsabilidade pela organização e regularidade técnica, contabilística e fiscal dos seus clientes:

I... SA NIF: ...40 e J... Lda. NIF: ...21

Neste sentido e dando cumprimento ao disposto no n.2 do art.74ª do Estatuto da Ordem dos Contabilistas Certificados, venho solicitar que me informe se os supra referidos lhes devem algo, em termos monetários, enquanto Contabilista Certificado ou se existe algum motivo que obste a que possa assumir a responsabilidade desta contabilidade, a partir do mês de junho de 2023.

Caso não exista qualquer entrave, solicito o favor de me remeter das quatro empresas, por email (...):

-As senhas de acesso ao portal da AT, segurança social, relatório único e outras necessárias;

-Ficheiro saft da contabilidade de 2022 e ficheiro saft da contabilidade até março de 2023;

-Balancete Analítico à data de 31/03/2023;

-Ficha do funcionário da E... Lda.;

-Fichas dos ativos e listagem inventário do imobilizado (em excel e pdf);

-E outros documentos necessários ao desenvolvimento do nosso trabalho.”

9) A Autora, no dia 16/05/2023 remeteu à Ré uma carta registada com o seguinte conteúdo:

“É com enorme surpresa e estupefação que acusamos a receção das suas diversas missivas referentes às empresas B..., Lda., G..., Lda., F..., Lda., E... Lda., H... Lda., I..., SA e J..., Lda., relativamente às quais informa que irá passar a assumir a contabilidade.

Como V. Exa. bem sabe, e por isso nos remeteu as comunicações, estas empresas eram clientes da A..., inclusive durante o tempo em que foi nossa trabalhadora, sendo apenas por esse motivo que teve contacto com as empresas de que pretende agora assumir a contabilidade.

Todos os clientes que refere passar a assumir, mantiveram-se clientes da A... até à data em que foram contactados por si.

A A..., aquando da sua saída da empresa, acreditou genuinamente que esta seria para prosseguir um projeto seu e, apesar de lamentar a perda da BB enquanto colaboradora, não colocou quaisquer entraves e fez votos de sucesso no seu percurso profissional.

No entanto, estava longe de imaginar que esse percurso passaria por aliciar e angariar para si os clientes da A..., ou seja, prejudicar o seu anterior empregador.

Ademais, tal comportamento, além de altamente censurável pelo bom senso e pelas boas práticas profissionais, também não é permitido pela lei, nomeadamente na cláusula 14ª do Contrato Coletivo de Trabalho que rege os trabalhadores e as empresas que prestem serviços de contabilidade e que passamos a transcrever:

“Cláusula 14.ª:

Deveres específicos dos contabilistas certificados

1 – Os contabilistas certificados deverão pautar o exercício da sua atividade pelo respeito pela lei, pelas normas contabilísticas em vigor, assim como pelas diretivas do seu empregador que não colidam com aquelas normas e princípios, que deverão sempre respeitar, salvo se arguirem, por escrito, a sua ilegalidade.

2 – As relações entre os contabilistas certificados e as empresas clientes do empregador deverão limitar-se apenas ao estritamente necessário para a execução dos serviços contabilístico-fiscais, de que estão incumbidos e pelos quais são responsáveis.

3 – O contabilista certificado, quando cesse o seu contrato individual de trabalho, não pode assumir qualquer vínculo contratual relativamente a clientes do seu empregador, até ao termo do exercício seguinte ao da cessação do contrato de trabalho.” (sublinhado nosso)

(Boletim do Trabalho e Emprego, n.º 1, Vol 90, de 8 Janeiro de 2023)

Atentas as práticas adotadas por V. Exa., admitidas expressamente nas missivas que nos remeteu, somos forçados a relembrar a existência desta norma, na expetativa que, voluntariamente, se abstenha de praticar atos de angariação de clientes da A..., sem prejuízo daqueles clientes que informou já ter angariado e que cuja contabilidade está impedida de assumir.

Face ao exposto, informamos que não iremos remeter-lhe as informações solicitadas.

(…)”

10) A Ré, por carta registada com aviso de receção, datada de 29/05/2023, respondeu à missiva da Autora referida em 9), mencionando o seguinte:

“(…) não contactei, nem por qualquer forma manifestei junto das empresas que enumeram na V/ carta, ou quaisquer outras que sejam clientes dessa empresa, interesse ou vontade de me substituir a Vª Exs. Na prestação de serviços de contabilidade às mesmas, nada tendo feito, após a minha saída dessa empresa, nada com intenção de causar qualquer prejuízo à mesma, ou de alcançar um qualquer benefício ilegítimo para a minha pessoa.

No que concerne às empresas que menciona, B... LDA., G... LDA., F... LDA., E... LDA., H... LDA., I... SA E J... LDA, passo-vos a transmitir que os seus legais representantes me procuraram, no sentido de passarem a contar com os meus serviços da indicada natureza.

À data informei-as que, nem eu nem qualquer contabilista certificado, poderia prestar esses erviços enquanto as suas empresas tivessem vínculo com outro contabilista certificado/gabinete de contabilidade, pelo que ficava muito grata, mas tinha de rejeitar as propostas.

Após prestar esta informação, fui contactada pelas empresas em causa, informando que os contratos estavam resolvidos com a vossa empresa e, da sua intenção de contratarem os meus serviços.

(…)

Ao que sei, foi o facto das empresas em causa tomarem conhecimento da minha saída da A... Lda. e da conhecida situação de alteração da estrutura da vossa sociedade e, bem assim da eventual reforma do Sr. CC (…) que terá sido o motivo que levou as mesmas a rescindirem a prestação de serviços com essa empresa e a questionarem-me se eu estaria disposta a acompanhar as contabilidades das mesmas, revelando até alguma preocupação caso tal não acontecesse, porque conhecedoras do ante indicado contexto que, segundo elas, faz com que, de forma alguma pretendam “manter-se” na vossa empresa.

(…)

Faço notar que os legais representantes das empresas em causa me transmitiram também, que um dos motivos principais era, também, a preocupação com o contexto que deixei exposto nomeadamente, ficarem privados do meu apoio e, eventualmente, no futuro, o do colega CC, tendo-me transmitido que, de forma alguma pretendiam continuar com a vossa prestação e serviços.

(…)”.

11) A Autora cobrou uma avença referente ao mês de maio de 2023, à sociedade B..., que englobava ainda a sociedade K..., Unipessoal, Lda., no valor de € 451,63 + IVA.

12) A Autora cobrou uma avença referente ao mês de maio de 2023, à sociedade G..., Lda., que englobava ainda a sociedade H..., Lda., no valor de € 870,61 + IVA.

13) A Autora cobrou uma avença referente ao mês de fevereiro de 2023, à sociedade F..., Lda., no valor de € 172,15 + IVA.

14) A Autora cobrou uma avença e uma licença mensal programa faturação referente ao mês de maio de 2023, à sociedade E..., Lda., no valor de € 64,39 + IVA.

15) A Autora cobrou uma avença referente ao mês de maio de 2023, à sociedade I..., S.A., que englobava ainda a sociedade J..., Lda., no valor de €536,58 + IVA.

16) No último dia de prestação de atividade (em 28 de abril de 2023) e com o conhecimento da Autora, a Ré remeteu, no final do dia, através do seu email profissional ..., um email aos clientes a anunciar a sua saída da Autora.

17) Tendo respondido a quem a questionou sobre quem passaria a ser o interlocutor após a sua saída.

18) Os clientes a quem a Ré passou a prestar serviços tratam-se de três famílias, sendo estes sócios de várias empresas, a saber:

a) D..., E..., F... e H..., Lda. (esta última sem movimento);

b) I... e J... (esta última sem movimento);

c) B... e K... (esta última sem movimento).

19) Depois de saberem que a Ré já não desempenharia mais atividade na Autora, tais clientes decidiram pôr termo ao contrato de prestação de serviços que mantinham com a Autora.

20) Após isso, contactaram a Ré e questionaram-na sobre a possibilidade desta assumir a sua contabilidade.

21) No valor de uma avença mensal estão englobados os serviços especializados, materiais de escritório, energia, serviços diversos, gastos com o contabilista, impostos e quotas da Ordem dos Contabilistas.

                                                                           *

2– Factos Não Provados

Não se provaram quaisquer outros factos com interesse para a decisão final deste processo, para além ou em contradição com os factos dados como provados, nomeadamente que:

a) A Ré instruiu e apoiou os clientes da Autora sobre a forma como deveriam proceder para se desvincularem dos serviços da Autora e poderem contratar a Ré.

b) Se não fosse a atitude da Ré a instruir tais clientes da forma como deveriam agir para se desvincularem da Autora, os mesmos não teriam abandonado os serviços desta.

c) A Autora teve de dispensar tempo a contactar os clientes (não só os que pretenderam sair para contratar a Ré, mas também aqueles que souberam destas saídas) para procurar mantê-los vinculados ao seu gabinete de contabilidade e procurar esclarecer que o gabinete continuava a prestar serviços com a mesma qualidade que sempre prestou.

d) A Autora teve de tranquilizar os seus trabalhadores e reorganizar o trabalho em função da perda destes clientes, o que prejudicou a sua produtividade e o bem estar da equipa de funcionários.

e) A Autora viu o seu bom nome afetado no mercado em virtude da saída de um elevado e prestigiado número de clientes.

f) Foi várias vezes questionada por outros clientes sobre toda esta situação.

g) A Autora sofreu com as preocupações inerentes à sua continuidade e à possibilidade de conseguir manter todos os postos de trabalho com a saída dos clientes.

h) Nas suas relações com os trabalhadores a Autora aplicou e aplica as cláusulas de IRCT, nomeadamente do CCT entre a APECA e a SITESC, publicado no BTE n.º 1, de 08/01/2023.

i) A Ré teve intenção, uma vez cessada a relação laboral com a Autora, de contactar os clientes desta para passar a prestar-lhes serviços de contabilidade.

j) A Ré teve intervenção na redação das cartas endereçadas pelos clientes à Autora, mencionadas em 4) e 5).

                                                                           *

                                                                           *

3 – Fundamentação da matéria de facto

(…).

                                                                           ***

FUNDAMENTOS DE DIREITO
1. Incumprimento dos requisitos constantes do art.º 640º do CPC.

Alega a apelada que a apelante não cumpre as exigências legais previstas no art.º 640º do CPC, aplicável ex vi do art.º 1º nº 2 do C.P.T.; pois não concretiza relativamente a cada um dos pontos da matéria de facto impugnados individualmente (provados e não provados) os meios probatórios concretos que impunham uma decisão distinta relativamente a cada um deles, pelo que deve ser julgado improcedente o recurso apresentado, com as legais consequências” (conclusões 3 e 4).

 Vejamos.

                   No que se reporta a esta questão, a recorrente formulou, no recurso de apelação, as seguintes conclusões:

                  D) Ora, antes de mais, cumpre-nos salientar que, no que concerne aos à análise crítica de toda a prova produzida, falhou o douto tribunal a quo em não valorar corretamente o documento n.º 11 junto com a petição inicial – Carta remetida pela Ré à Autora a 29/05/2023, em conjunto com os depoimentos das testemunhas DD, EE, FF e GG. Tendo sido valorada corretamente, o conteúdo desta carta impunha que se tivesse dado como provado o facto não provado da alínea a) A Ré instruiu e apoiou os clientes da Autora sobre a forma como deveriam proceder para se desvincularem dos serviços da Autora e poderem contratar a Ré. Nessa carta, a Ré afirmou “à data informei-as que, nem eu nem qualquer contabilista certificado, poderia prestar esses serviços enquanto as suas empresas tivessem vínculo com outro contabilista certificado/gabinete de contabilidade (…) Após prestar esta informação, fui contactada pelas empresas em causa, informando que os contratos estavam resolvidos com a vossa empresa e, da sua intenção de contratarem os meus serviços (…)”, acrescido da menção que tal acontece quando a Ré ainda era trabalhadora da Autora, tudo fundamentado pelos depoimentos das testemunhas supra indicadas e que constam como fundamentação da matéria de facto provada na sentença recorrida, pois todos referem que o contacto com a Ré se deu após o envio do email no dia 28/02/2023, tendo o contrato cessado no dia 01/03/2023 (“Factos provados 16) No último dia de prestação de atividade (em 28 de abril de 2023) e com o conhecimento da Autora, a Ré remeteu, no final do dia, através do seu email profissional ..., um email aos clientes a anunciar a sua saída da Autora.”).

                  E) Deve considerar-se como facto provado que: A Ré instruiu e apoiou os clientes da Autora sobre a forma como deveriam proceder para se desvincularem dos serviços da Autora e poderem contratar a Ré, quando ainda era trabalhadora da Autora.

                  F) Considerou ainda a sentença recorrida que não se provou que “d) A Autora teve de tranquilizar os seus trabalhadores e reorganizar o trabalho em função da perda destes clientes, o que prejudicou a sua produtividade e o bem estar da equipa de funcionários.” Nem que “g) A Autora sofreu com as preocupações inerentes à sua continuidade e à possibilidade de conseguir manter todos os postos de trabalho com a saída dos clientes.”.

                  G) Entende a Recorrente que, atenta a própria fundamentação da sentença no que toca à  matéria de facto provada, que os facos referidos deveriam ter sido considerados provados, uma vez que se valorou o depoimento da testemunha HH, do qual o tribunal a quo retirou que “se tenha apercebido que alguns clientes prescindiram dos serviços da Autora e que o futuro dos trabalhadores podia estar em risco pelo facto dos clientes supra mencionados terem optado pelos serviços da Ré, nada concretizou, nomeadamente quanto à quebra de faturação,”.

                   H) E ainda, o depoimento da testemunha II, também tido em conta na fundamentação da matéria de facto, que refere o seguinte: “Referiu que a Ré tinha alguns clientes que acompanhava e que a saída dos clientes acima mencionados (desconhecendo a quantas «famílias» pertenciam tais empresas) causou um grande rombo na empresa (sem especificar nem concretizar em que é que se objetivou esse rombo) e que os funcionários expressaram preocupação”.

                   I) Ora, a douta sentença recorrida fundamenta-se e valorou o depoimento de duas testemunhas, uma trabalhadora e uma sócia, que descrevem com coerência que a saída dos clientes causou preocupação à gerência e aos trabalhadores e dificuldades financeiras. Mostrando-se assim contraditória quanto à fundamentação e à matéria de facto dada como não provada.

                  J) Assim, deveria a douta sentença, no entendimento da Recorrente, ter considerado como provado que: “d) A Autora teve de tranquilizar os seus trabalhadores em função da perda destes clientes, o que prejudicou a sua produtividade e o bem estar da equipa de funcionários” e “g) A Autora sofreu com as preocupações inerentes à sua continuidade e à possibilidade de conseguir manter todos os postos de trabalho com a saída dos clientes.” Ou, no mínimo, caso assim não se entenda, ter dado como provado que “A Autora teve de tranquilizar os seus trabalhadores em função da perde destes clientes e sofreu com as preocupações inerentes à sua continuidade e à possibilidade de conseguir manter todos os postos de trabalho com a saída dos clientes.”

                   Dispõe o art.º 640º do CPC, sob a epígrafe “Ónus a cargo do recorrente que impugne a decisão relativa à matéria de facto”:

                  “1. Quando seja impugnada a decisão sobre a matéria de facto, deve o recorrente obrigatoriamente especificar, sob pena de rejeição:

                  a) Os concretos pontos de facto que considera incorretamente julgados;

                   b) Os concretos meios probatórios, constantes do processo ou de registo ou gravação nele realizada, que impunham decisão sobre os pontos da matéria de facto impugnados diversa da recorrida;

                   c) A decisão que, no seu entender, deve ser proferida sobre as questões de facto impugnadas.

                  2. No caso previsto na alínea b) do número anterior, observa-se o seguinte:

                  a) Quando os meios probatórios invocados como fundamento do erro na apreciação das provas tenham sido gravados, incumbe ao recorrente, sob pena de imediata rejeição do recurso na respetiva parte, indicar com exatidão as passagens da gravação em que se funda o seu recurso, sem prejuízo de poder proceder à transcrição dos excertos que considere relevantes;

                   b) Independentemente dos poderes de investigação oficiosa do tribunal, incumbe ao recorrido designar os meios de prova que infirmem as conclusões do recorrente e, se os depoimentos tiverem sido gravados, indicar com exatidão as passagens da gravação em que se funda e proceder, querendo, à transcrição dos excertos que considere importantes:

                   3. (…) “

                  Conforme ensina António dos Santos Abrantes Geraldes[1] “A rejeição total ou parcial do recurso respeitante à impugnação da decisão da matéria de facto deve verificar-se quando falta a indicação exata, na motivação, das passagens da gravação em que o recorrente se funda.

                   (…)

                  Além disso, se, em lugar de uma sincopada e por vezes estéril localização temporal dos segmentos dos depoimentos gravados, o recorrente optar por transcrever esses trechos, ilustrando de forma mais completa e inteligível os motivos das pretendidas modificações da decisão da matéria de facto, deve considerar-se razoavelmente cumprido o ónus de alegação neste campo. A indicação exata das passagens das gravações não passa necessariamente pela sua localização temporal, sendo a exigência legal compatível com a transcrição das partes relevantes dos depoimentos.

                  Ora, no caso em apreço, e no que respeita aos factos não provados d) e g), a recorrente limita-se a invocar extratos da síntese que o Tribunal a quo fez dos depoimentos das testemunhas HH “se tenha apercebido que alguns clientes prescindiram dos serviços da Autora e que o futuro dos trabalhadores podia estar em risco pelo facto dos clientes supra mencionados terem optado pelos serviços da Ré, nada concretizou, nomeadamente quanto à quebra de faturação” e II “Referiu que a Ré tinha alguns clientes que acompanhava e que a saída dos clientes acima mencionados (desconhecendo a quantas «famílias» pertenciam tais empresas) causou um grande rombo na empresa (sem especificar nem concretizar em que é que se objetivou esse rombo) e que os funcionários expressaram preocupação”, o que é diferente da transcrição das partes relevantes dos depoimentos.

                  Conforme refere o mesmo autor acima citado[2], “quando, porventura, houver sérios motivos para a rejeição do recurso sobre a matéria de facto (maxime quando o recorrente se insurja genericamente contra a decisão, sem indicação dos pontos de facto; quando não indique, de forma clara, nem os pontos de facto impugnados, nem os meios de prova em que criticamente se baseia; ou quando nem sequer tome posição clara sobre a resposta alternativa pretendida), tal efeito apenas se repercutirá nos segmentos afetados, não colidindo com a admissibilidade do recurso quanto aos demais aspetos. Isto é, eventuais falhas de elementos essenciais no campo da motivação e/ou das conclusões apenas podem atingir as questões de facto a que respeitam, sem prejudicar a parte relacionada, quer com restante a matéria de facto quer com a matéria de direito”.

                   Assim sendo, rejeita-se o recurso quanto à matéria de facto que consta das als. d) e g) dos factos não provados.

                                                                                              **

                   2.   Impugnação da decisão quanto à matéria de facto.

                   (…).

                                                                                              **

                  3. Caducidade do CTT entre a APECA e a SinCESAHT (Sindicato do Comercio, Escritórios, Serviços, Alimentação, Hotelaria e Turismo e outras publicado no BTE n.º 45 de 08/12/2015, de 27/04.

                  Na sentença recorrida considerou-se que “importa considerar que de acordo com a cláusula 2ª, “O presente CCT vigora pelo período de um ano e entre em vigor nos termos da lei, ou seja, cinco dias após a sua publicação no Boletim do Trabalho (n.º 1). Findo esse ano, o CCT não foi substituído nem renegociado, tendo caducado ao abrigo do disposto no art.º 501.º do Código do Trabalho”, pelo que conclui que o mesmo não é aplicável às relações entre a autora e a ré”.- fim de transcrição.

                  Sustenta a recorrente que o CCT não regula a sua renovação, pelo que se renovava sucessivamente por períodos de um ano (art.º 499.º CTrabalho). Acresce que, decorrendo negociações e mediação pela DGERT, é porque o CCT foi denunciado por alguma das partes, sendo que após essa denúncia se manteria em vigor, pelo menos por 18 meses (art.º 501.º n.º 5 CTrabalho). Beneficiou também da suspensão dos prazos de sobrevigência por força da Lei 11/2021. O CCT não se encontrava caducado e era aplicável na Empregadora desde 08/05/2016 (data da portaria de extensão publicada no Boletim do Trabalho e Emprego, n.º 17, 8/5/2016) e aplicava-se quando o contrato de trabalho da ré estava em vigor e até à sua cessação. Nem se diga que a extinção de entidades outorgantes, como foi o caso da extinção do SITESC em publicada no Boletim do Trabalho e Emprego, n.º 21 de 08/06/2017 e do SINCESAHT em publicada no Boletim do Trabalho e Emprego, n.º 35 de 22/09/2021, produziu a caducidade do CCT nos termos do art.º 502.º b) ii) do CTrabalho, pois à data da entrada em vigor do CCT APECA-SINCESAHT, a redação do art.º 502.º do CTrabalho não previa a extinção de entidades outorgantes como fundamento para a cessação do CCT (conclusões R) e S)).

                   Analisemos.

                  Com interesse para a apreciação desta questão, importa chamar à colação os seguintes factos provados:

                  -Entre a autora e a ré foi celebrado, em 01/09/2001, um contrato de trabalho, mediante o qual a ré se obrigou a desempenhar, por conta, sob a direção e fiscalização da autora, as funções de contabilista (facto 1);

                  -No dia 01/03/2023 a ré entregou à autora uma comunicação na qual informava a autora da “decisão de rescisão do contrato de trabalho celebrado com a vossa empresa, passando a partir de hoje a cumprir o período de aviso prévio de 60 dias, conforme disposto no nº 1 do artigo 400 do código do trabalho” (facto 2);

                   3) Por força da denúncia, o contrato de trabalho cessou em 01/05/2023 (facto 3).

                  Importa ter ainda em atenção que a extinção do SINCESAHT foi publicada no Boletim do Trabalho e Emprego, n.º 35 de 22/09/2021.

                  Consta da cláusula 2ª, nº 1, do CCT entre a APECA e a SinCESAHT (Sindicato do Comercio, Escritórios, Serviços, Alimentação, Hotelaria e Turismo e outras publicado no BTE n.º 45 de 08/12/2015: “1- O presente CCT vigora pelo período de um ano e entra em vigor nos termos da lei, ou seja, cinco dias após a sua publicação no Boletim do Trabalho e Emprego”.

                  A Portaria de extensão n.º 107/2016, de 27/04 entrou em vigor no quinto dia após a sua publicação no Diário da República (artigo 2º, nº 1).

                   A matéria da cessação da vigência da convenção coletiva de trabalho está referida formalmente apenas no art.º 502º, mas na verdade, ela é também tratada no art.º 501º nºs 6, 7, 8 e 9, e no art.º 503º. Este regime foi, entretanto, alterado pela Lei nº 55/2014, de 25/08, pela Lei nº 93/2019, de 4/09, e pela Lei nº 13/2023, de 3/04.

                  Com a Lei nº 93/2019, de 4/09, o legislador previu expressamente, tendo presente, desde logo, a liberdade sindical (e de associação, no caso dos empregadores, negativa) uma outra forma de caducidade, mais precisamente a decorrente da extinção ou perda de qualidade de associação sindical ou de associação de empregadores celebrantes de convenção coletiva, nos termos do art.º 502º, nº 1, al. b), ii).

                  O TC não declarou a inconstitucionalidade da norma contida na subalínea ii), da al. b), do nº 1, do presente artigo, na redação introduzida pela Lei nº 93/2019. (Ac. nº 318/2021, de 18.05.21 in www.tribunalconstitucional.pt).

                   Quanto à caducidade da convenção coletiva, tem por efeito, como não podia deixar de ser, a cessação deste instrumento de regulamentação coletiva de trabalho.

                   Com a Lei nº 93/2019, de 4/09, o legislador veio solucionar em termos expressos os efeitos da cessação de vigência de convenção ou decisão arbitral aplicada por portaria de extensão, com o artigo 515º-A, que determina por remissão para o nº 8 do artigo 501º, que após a cessação, mantém-se, os efeitos já produzidos pela convenção ou decisão arbitral nos contratos de trabalho relativamente:

a) à retribuição do trabalhador;

b) categoria profissional e respetiva definição;

c) duração do tempo de trabalho;

d) regimes de proteção social cujos benefícios sejam substitutivos dos assegurados pelo regime geral de segurança social ou com protocolo de substituição do Serviço Nacional de Saúde;

e) parentalidade; e

f) segurança e saúde no trabalho

                  Quando foi publicado no BTE n.º 35 de 22/09/2021, a extinção do SINCESAHT, o CCT entre a APECA e a SinCESAHT (Sindicato do Comercio, Escritórios, Serviços, Alimentação, Hotelaria e Turismo e outras publicado no BTE n.º 45 de 08/12/2015 (com a Portaria de extensão nº 107/2016, de 27/04) cessou por caducidade, com exceção dos efeitos acima referidos.

                   Não é assim aplicável à relação laboral entre a autora e a ré a cláusula 16.ª- A, do citado CTT.

                                                                                              **

                   4. Nulidade da “Cláusula 16.ª- do CTT entre a APECA e a SinCESAHT (Sindicato do Comercio, Escritórios, Serviços, Alimentação, Hotelaria e Turismo e outras publicado no BTE n.º 45 de 08/12/2015, de 27/04.

                   O conhecimento desta questão fica prejudicado, em face da solução dada à questão anterior- artigo 608º, nº 2 “parte final” ex vi do artigo 663º, nº 2 “parte final”, do CPC.

                                                                                              *

                  Em suma: improcede a apelação, com a consequente manutenção da sentença confirmada.  

                                                                           ***

DECISÃO

Com fundamento no atrás exposto, acorda-se em julgar improcedente a apelação, com a consequente confirmação da sentença recorrida.

Custas pela apelante, atendendo ao seu vencimento- artigos 527º, nºs 1 e 2, 607º, nº 6 e 663º, nº 2, todos do CPC ex vi do artigo 87º, nº 1, do CPT.

  Coimbra, 26 de setembro de 2025

Mário Rodrigues da Silva- relator

Paula Maria Roberto- adjunta

Felizardo Paiva- adjunto

                                                                           ***

Sumário (artigo 663º, nº 7, do CPC):

(…).

 

Texto redigido com aplicação da grafia do (novo) Acordo Ortográfico da Língua Portuguesa, respeitando-se, no entanto, em caso de transcrição, a grafia do texto original


[1] Recursos em Processo Civil, 8ª edição, 2024, pp. 232 e 233.
([2]) obra citada, p. 242.