Acórdão do Tribunal da Relação de Coimbra
Processo:
87/19.2JACBR-C.C1
Nº Convencional: JTRC
Relator: CARLOS MOREIRA
Descritores: AÇÃO EXECUTIVA
SEPARAÇÃO DE BENS COMUNS
PRINCÍPIO DO CONTRADITÓRIO
NULIDADE
NULIDADE DE SENTENÇA
JUÍZO DE EXECUÇÃO
TRIBUNAL DE FAMÍLIA
INCOMPETÊNCIA ABSOLUTA
Data do Acordão: 09/30/2025
Votação: UNANIMIDADE
Tribunal Recurso: TRIBUNAL JUDICIAL DA COMARCA DE VISEU – VISEU – JUÍZO CENTRAL CRIMINAL – JUIZ 2
Texto Integral: S
Meio Processual: APELAÇÃO
Decisão: REVOGADA
Legislação Nacional: ARTIGOS 97.º, 99.º, 195.º, 206.º, N.º 2 , 740.º, N.º 2 E 1135.º DO CÓDIGO DE PROCESSO CIVIL
ARTIGOS 122.º E 129.º, N.º 1, DA LEI N.º 62/2013, DE 26 DE AGOSTO - LEI DA ORGANIZAÇÃO DO SISTEMA JUDICIÁRIO
Sumário: I - O princípio do contraditório visa facultar às partes os fundamentos, factuais, jurídicos e probatórios, da outra parte, e do tribunal, de modo a poder contestá-los, e a evitarem-se decisões surpresa; a sua violação constitui nulidade processual nos termos e com as consequências do artº 195º do CPC.

II - A especial previsão, adrede e inequivocamente plasmada no artº 740º nº2 do CPC, sobreleva sobre as regra geral de atribuição de competência aos juízos de família do artº 122º nº 2 da LOSJ - Lei n.º 62/2013, de 26.08 – pelo que o incidente de separação de bem, impetrado pelo cônjuge do executado, deve ser apensado ao processo de que depende e aqui decidido – artº 206º nº2 do CPC – e não distribuído pelos aludidos juízos.


(Sumário elaborado pelo Relator)
Decisão Texto Integral: Relator: Carlos Moreira
Adjuntos: Fernando Monteiro
Alberto Ruço

*

1.

No processo em epígrafe foi proferido o seguinte despacho:

«AA veio, na qualidade de ex-cônjuge do executado BB, requerer por apenso à ação executiva n.º 87/19.2JACBR.1, separação dos bens, ao abrigo do disposto nos artigos 740º n.º 1 e 1135º ambos do Código de Processo Civil.

Nos termos do artigo 740.º, do Código de Processo Civil, quando em execução movida contra um só dos cônjuges forem penhorados bens comuns do casal, deverá proceder-se à citação do cônjuge do executado para, no prazo de vinte dias, requerer a separação de bens ou juntar certidão comprovativa da pendência de acção em que a separação já tenha sido requerida.

Contudo, não obstante o teor de tal preceito, importa considerar as normas relativas à atribuição da competência material entre tribunais.

Nos termos do artigo 129.º, n.º 1, da Lei n.º 62/2013, de 26.08., «Compete aos juízos de execução exercer, no âmbito dos processos de execução de natureza cível, as competências previstas no Código de Processo Civil», porém, dispõe o n.º 2, do mesmo preceito que, “Estão excluídos do número anterior os processos atribuídos ao tribunal (…) de família e menores (…).”.

Por sua vez, nos termos do n.º 2, do artigo 122.º, da mesma Lei, dispõe que “Os juízos de família e menores exercem ainda as competências que a lei confere aos tribunais nos processos de inventário instaurados em consequência de separação de pessoas e bens, divórcio, declaração de inexistência ou anulação de casamento civil, bem como nos casos especiais de separação de bens a que se aplica o regime desses processos.”.

O presente caso visa, precisamente, a instauração de um processo de separação de bens em casos especiais, com aplicação do regime do processo de inventário, tal como prevê o preceituado no artigo 1135.º do Código de Processo Civil.

Do exposto resulta, salvo melhor opinião, ser este Juízo materialmente incompetente para a tramitação do presente processo, cuja competência é atribuída aos Juízos de Família e Menores.

Como é sabido, da previsão dos artigos 577.º, al. a), e 96.º, ambos do Código de Processo Civil, aplicável “ex vi” do artigo 551.º, n.º 1, do mesmo diploma legal, extrai-se que a incompetência material configura uma incompetência absoluta, de conhecimento oficioso, conforme previsto no artigo 97.º, do citado diploma legal, e que tem por consequência a absolvição da instância ou o indeferimento em despacho liminar, quando o processo o comportar, como decorre da previsão do art.º 99.º, n.º 1, ambos do Código de Processo Civil.

Por conseguinte, verificada a excepção dilatória da incompetência absoluta do tribunal, não poderá o presente processo seguir os seus termos neste Tribunal, impondo-se, desde já, a declaração de incompetência.

Face ao exposto, julgo este Juízo materialmente incompetente para o presente processo e, consequentemente, ao abrigo do disposto no n.º 1, do art.º 99.º, do Cód. Proc. Civil, indefiro liminarmente a pretensão da requerente.

Custas pela requerente, que se fixam em 1 UC (artigo 7.º, do RCP e tabela II, ao mesmo anexa).»

2.

Inconformada recorre a requerente.

Rematando as suas alegações com as seguintes conclusões:

I. O presente recurso é tempestivo, uma vez que a notificação do despacho recorrido ocorreu via CITIUS no dia 11.03.2025, presumindo-se efetuada em 14.03.2025, terminando o prazo de interposição em 29.03.2025, data em que os tribunais se encontram encerrados, o seu termo transferiu para o primeiro dia útil seguinte, que é dia 31.03.2025, data em que o mesmo é enviado a juízo.

II. O Tribunal a quo notificou a Requerente para se pronunciar sobre a eventual exceção dilatória de erro na forma do processo, mas, com surpresa, vem a decidir, de ânimo leve, que «afinal» estamos perante a exceção dilatória de incompetência absoluta.

III. A Requerente não foi notificada, nem se pronunciou sobre a eventual exceção dilatória de incompetência absoluta, não podendo sequer razoavelmente contar que esse seria o caminho seguido pelo douto Tribunal a quo após o despacho proferido em 20.02.2025,

IV. Pelo que, o despacho recorrido padece de nulidade por violação do princípio do contraditório e da proibição da decisão-surpresa, nos termos do artigo 3.º, n.º 3 e artigo 615.º, n.º 1, alínea d), ambos do CPC, ao decidir sobre a exceção dilatória de incompetência absoluta sem permitir à Recorrente o exercício do contraditório a que por lei tem direito.

V. Tal princípio impõe que as partes sejam previamente ouvidas antes da decisão judicial sobre questões jurídicas ou factuais, ainda que de conhecimento oficioso, de forma a conceder-lhes ampla e efetiva possibilidade de as discutir, contestar, valorar ou ajuizar, o que não é afastado por estarmos perante um indeferimento liminar, conforme jurisprudência consolidada onde se destaca o Acórdão do Tribunal da Relação do Porto (Acórdão n.º 14227/19.8T8PRT.P1) e do Tribunal da Relação de Coimbra (Acórdão n.º 3550/17.6T8CBR.C1).

VI. Em consequência, o despacho recorrido é nulo e deve ser revogado e substituído por outro nos termos requerido infra.  

VII. Sem conceder e subsidiariamente, o despacho recorrido violou o disposto nos artigos 740.º, n.º 2, 1083.º, n.º 1, alínea b), e 206.º, n.º 2, todos do CPC, ao considerar incompetente o presente juízo, enquanto juízo de execução, ao abrigo do disposto no artigo 129.º, n.º 2 da LOSJ, para tramitação da separação de bens, quando destes preceitos legais resulta que o processo de separação de bens corre por apenso à execução, sendo este o tribunal competente.

VIII. É, aliás, densa a doutrina e jurisprudência que refere que a separação de bens, no caso de penhora de bens comuns na ação executiva, prevista no artigo 1135.º do CPC, correr por apenso ao processo de execução, ao abrigo do disposto no artigo 740.º, n.º 2 do CPC, o que decorre também do disposto no artigo 1083.º, n.º 1, al. b) do CPC que estabelece que o inventário deve ser requerido no tribunal judicial sempre que o inventário constitua dependência de outro processo, sendo que, neste caso, em concreto, o tribunal competente será o de execução, por ser o processo de que depende o inventário.

IX. O legislador, na elaboração dos trabalhos preparatórios da referida norma, deixou claro o critério de determinação da competência dos tribunais, pertencendo a estes em exclusivo quando «segundo as leis de processo, o processo de inventário devesse constituir dependência de outro processo judicial», entendendo-se que existe esta dependência quando «a partilha de bens seja necessária para a tramitação desse processo ou quando seja consequência do decidido naquele processo.» que é o que manifestamente sucede no presente caso, artigo 740.º do CPC, na medida em que a separação da meação surge e é consequência direta da penhora do bem comum, estando a resolução desta questão em estreita conexão com o processo executivo, condicionando, inclusive o seu o prosseguimento.

X. Na decisão a proferir, o Tribunal a quo deve atender não apenas ao determinado expressamente nas leis do processo, como também considerar todos os casos que mereçam tratamento análogo, a fim de obter uma interpretação e aplicação uniforme do direito, nos termos do disposto no artigo 8.º, n.º 3 do Código Civil (CC), não podendo descurar a jurisprudência e doutrina unânime que existe sobre esta matéria, pelo que deve o despacho impugnado ser revogado e substituído por outro que declare ser este Juízo materialmente competente para a tramitação dos presentes autos e determine o prosseguimento dos ulteriores termos, o que se requer.

XI. Sem conceder e subsidiariamente, caso assim não se entenda, o que apenas por dever de patrocínio se equaciona, dir-se-á que a Mm. ª Juiz fez uma errada interpretação e aplicação do disposto no artigo 122.º, n.º 2 da LOSJ ao considerar os Juízos de Família competentes para a tramitação dos presentes autos, ignorando o disposto no artigo 740.º, n.º 2 e o critério legal de competência por conexão claramente estabelecido no artigo 1083.º, n.º 1, alínea b), do CPC, e bem assim as normas processuais que conformam o processo, designadamente artigo 206.º, n.º 2, artigo 287.º, artigo 132.º do CPC e Portaria n.º 280/2013, de 26 de agosto, violando tais disposições legais e o disposto no artigo 8.º e 9.º do CC.

XII. O regime previsto no artigo 740.º do CPC, já vem desde versões anteriores do CPC, mantendo o legislador incólume a exigência de «requerer ou juntar certidão», prevendo sempre, e concretamente no seu n.º 2, que o requerimento será «apensado» à ação executiva, cuja interpretação não deixa de revelar que o requerimento corre por apenso, já que se com a introdução do n.º 2 do artigo 122.º da LOSJ, o legislador pretendesse que fosse o Juízo de Família e Menores o tribunal materialmente competente para conhecer do requerimento do regime da separação de bens em casos especiais, teria alterado em conformidade o disposto no artigo 740.º do CPC, deixando de fazer sentido a distinção «requerer ou juntar certidão», pois apenas seria possível à Requerente juntar certidão,

XIII. Já que na forma como se encontra hoje conformado o processo civil, a apensação só é possível quando verificados os pressupostos legais previstos no artigo 267.º do CPC, os quais, desde logo, revelam que o termo «Apensado» utilizado pelo legislador não tem em vista esse regime, mas sim o regime previsto no artigo 206.º, n.º 2 do CPC, que consagra a competência por conexão, de igual forma, questões de ordem legal e prática impõem este entendimento, pois, tendo o processo natureza eletrónica, e devendo as peças processuais serem apresentadas através de formulários, nos termos do disposto no artigo 132.º do CPC e artigo 1.º, n.º 5, 6.º e 7.º da Portaria 280/2013, de 26 de Agosto, não se encontram consagrados mecanismos legais que permitam a propositura de uma ação  num determinado tribunal e a sua apensação noutro tribunal, pelo que a análise concatenada de tais preceitos, permitem concluir, como aliás faz a doutrina, que o processo de separação corre por apenso ao processo executivo, sendo este o tribunal competente para a tramitação dos autos.

XIV. Se dúvidas houvesse, este entendimento vem a ser confirmado pelo legislador com a introdução do regime de inventário pela Lei n.º 117/2019, de 13 de setembro, no qual claramente expressa que o critério definidor da competência dos tribunais para a tramitação dos processo de inventário é a dependência a outro processo judicial, pelo que, não tendo o artigo 122.º, n.º 2 da LOSJ sofrido qualquer alteração a propósito deste novo regime e critério, deverá ser interpretado em conformidade e com as devidas adaptações, atendendo à competência por conexão, cuja prevalência é dada pelo legislador.

XV. No mais, dir-se-á que, esta dependência existe e é clara no regime aplicável ao presente caso, o qual apresenta especificidades, dada a sua conexão com o processo executivo, e impõe uma constante dialética e dinâmica entre a Requerente, Executado, Exequente e Agente de Execução, o que justifica a opção do legislador, sendo, ainda, mais evidente no presente caso onde apenas se pretende a partilha do bem comum que foi penhorado, pois nada mais há a partilhar, por conseguinte a sua dependência ao processo executivo é manifesta, não existindo qualquer relação ou dependência a processos que se encontrem no Juízo de Família e Menores, somando-se ainda, para afastar o entendimento do Tribunal a quo, os constrangimentos e a complexidade que tal solução consubstanciaria, representando um retrocesso à celeridade e boa administração da justiça.

XVI. Havendo no CPC norma que define que o processo deve correr por apenso ao processo executivo (cfr. artigo 740.º, n.º 2 e artigo 1083.º, n.º 1, al. b)) por eleição do critério da dependência entre os processos, deve entender-se que, porque a intenção do legislador foi eleger apenas esse critério para determinação da competência, que essas normas se sobrepõem às disposições orgânicas que regulam a competência (em relação da matéria ou do território), devendo atender-se, também, neste exercício, aos ensinamentos do Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça, no processo n.º 3193/22.2T8VFX.L1.S1, o qual ensina que, em respeito ao processo equitativo e a previsibilidade, não pode considerarse competente um tribunal diferente daquele que resulta e é determinado pela lei processual, por conseguinte deve o despacho impugnado ser revogado e substituído por outro que declare ser este Juízo materialmente competente para a tramitação dos presentes autos e determine o prosseguimento dos ulteriores termos, o que se requer.

XVII. Sem conceder, e subsidiariamente, caso assim não se entenda, o que apenas por dever de patrocínio se equaciona, sempre se dirá, tendo em conta o já referido no ponto anterior, que o despacho impugnado ao decidir que o juízo materialmente competente é o juízo de família e menores, viola os princípios constitucionais da tutela jurisdicional e efetiva e do processo equitativo, previstos no artigo 20.º, n.º 1 e n.º 4 da CRP, na medida em que, tal interpretação não encontra respaldo na lei, designadamente artigos 740.º, n.º 2, artigo 1083.º, n.º 1, al. b) e artigo 206.º, n.º 2 todos do CPC, nem tampouco encontra resposta na forma como se encontra hoje conformado o processo civil, nos temos do artigo 132.º e Portaria 280/2013, de 26 de Agosto, além de que contraria a jurisprudência e doutrina unânime que existe sobre esta matéria, pelo que não pode ser acolhida uma interpretação que esbarra com os fundamentos primordiais do direito constitucional a um processo justo e equitativo, o qual pressupõe e exige a determinabilidade da lei e a previsibilidade do direito, ou seja, a univocidade de interpretação das normas processuais que permita aos sujeitos processuais não serem surpreendidos com interpretações e aplicações processuais não previstas e que consubstanciem a supressão dos seus direitos por questões formais.

XVIII. Esta decisão é mais grave e violentadora dos direitos da Requerente/Recorrente, pois, tendo tal questão sido decidida, de ânimo leve no despacho liminar, como se de uma questão manifestamente evidente se tratasse, que como se viu não é o caso, concluindo pelo indeferimento liminar da ação, ao abrigo do disposto no artigo 99.º, n.º 1 do CPC, tal implica que seja totalmente vedado à Requerente/Recorrente que, nos termos legais deduziu a sua pretensão em tempo, o direito de obter a separação das meações, por força do disposto no artigo 560.º ex vi artigo 590.º do CPC.  

XIX. Deste modo, e em face do exposto, não se pode aceitar a interpretação do Tribunal a quo que conduz à a supressão e inviabilização do exercício de um direito substantivo por via de um formalismo excessivo ou de uma exigência processual não razoável e imprevisível, o que não só viola a lei, como afronta a exigência constitucional de um processo equitativo e funcionalmente adequado à realização do direito, sendo que, tal como tem afirmado reiteradamente o Tribunal Constitucional, a interpretação e aplicação das normas legais devem ser conformes à Constituição, sendo vedado ao intérprete adotar soluções que impliquem uma compressão desproporcional ou injustificada de direitos fundamentais, sob pena de inconstitucionalidade.

XX. Do exposto, não havendo um mínimo de correspondência na letra da lei, não pode ser acolhida a interpretação da Mm. ª Juiz que representa uma afronta e grave violação do princípio do processo justo e equitativo na sua dimensão de segurança e previsibilidade dos comportamentos processuais, previsto no artigo 20.º da CRP, pelo que o despacho ora impugnado deve ser revogado e substituído por outra decisão que declare o presente Juízo materialmente competente para os presentes autos e determine o seu prosseguimento com os ulteriores termos.

XXI. Sem prescindir de tudo o já exposto, caso assim não se entenda, o que apenas por dever de patrocínio se equaciona, tendo em conta que a Mm.ª Juiz indeferiu liminarmente o requerimento, ao abrigo do disposto no artigo 99.º, n.º 1 do CPC, e tendo em conta o previsto no artigo 560.º ex vi artigo 590.º, n.º 1 do CPC, por força do princípio pro actione, que decorre do direito a uma tutela judicial efetiva, consagrado no artigo 20º da CRP, o qual impõe que seja dada prioridade à apreciação do fundo da causa, obstando a que simples obstáculos formais sejam transformados em pretextos para recusar uma resposta efetiva à pretensão formulada, assentando na ideia de favor actionis, outrossim, para atenuação da natureza rígida e absoluta das regras processuais, não pode, da interpretação das normas processuais, resultar que seja vedado à Requerente, por questões processuais e formais, o direito de obter a separação da sua meação do bem comum penhorado nos presentes autos.

XXII. Por conseguinte, caso se entenda que existe incompetência material do presente Juízo para a tramitação dos presentes autos, sempre deve ser determinada a remessa dos presentes autos para o tribunal considerado materialmente competente, aproveitando-se os atos já praticados, ao abrigo do disposto no artigo 20.º da CRP, uma vez que daí não advém qualquer prejuízo para o executado, nem tampouco para a justiça, e entendimento diverso, isto é, que obste a que seja possível o aproveitamento dos atos e a remessa ao douto tribunal competente, implicará um grave prejuízo para a Requerente e para justiça material, com a consequente extinção do seu direito, por questões meramente processuais e formais, violando os pilares fundamentais do nosso Estado Democrático e do sistema de justiça, com expressão no artigo 20.º da CRP.

XXIII. Sem conceder, e subsidiariamente, caso assim não se entenda, o que por dever de patrocínio se equaciona, sempre se dirá que a decisão recorrida violou o disposto no artigo 590.º, n.º 1, do CPC, ao aplicar indevidamente o indeferimento liminar, mecanismo reservado exclusivamente para situações claras, manifestas e indiscutíveis, como referem os Acórdãos do Tribunal da Relação de Coimbra (proc. n.º 441/23.5T8LRA.C1) e Tribunal da Relação de Lisboa (proc. n.º 82020/19.9YIPRT.L1-7), o que não sucede no presente caso, já que, conforme resulta dos presentes autos, não estamos perante uma questão evidente ou manifesta, aliás disso é exemplo o facto do tribunal a quo ter primeiramente invocado estar em causa a exceção dilatória de erro na forma do processo.

XXIV. Por conseguinte, não estando em causa uma exceção dilatória evidente ou manifesta, e tendo a Mm.ª Juiz dúvidas a esse respeito, não podia, nem devia enveredar pelo indeferimento liminar, mas antes citar o Executado e Exequente para os presentes autos, pelo que deve o despacho liminar ser revogado e substituído por outro que determine a citação do executado e exequente para os presentes autos, seguindo-se os ulteriores termos, sendo também, sem conceder no suprarreferido, a solução que melhor se compagina com as normas constitucionais e princípios processuais, supra já mencionados, caso se entenda não ser a remessa legalmente admissível, evitando que seja vedado à Requerente o direito de pedir a separação do bem comum por questões formais e através de uma interpretação que não é pacifica, nem tem correspondência com a letra da lei.

Nestes termos e nos demais de direito que V. Exa. doutamente suprirá, deve o recurso ser julgado totalmente procedente por provado e, em consequência, ser revogado o despacho de que se recorre por ser nulo e o mesmo substituído por outro que determine que este juízo é materialmente competente para a tramitação dos presentes autos e prosseguindo os ulteriores termos com a citação do Executado e Exequente para os presentes autos.

Sem conceder, caso assim não se entenda, o que apenas por dever de patrocínio se equaciona, deve o despacho impugnado ser revogado e substituído por outra decisão que determine a remessa dos presentes autos para o tribunal entendido como materialmente competente com o aproveitamento dos atos já praticados, ao abrigo do disposto no artigo 20.º da CRP, seguindo-se os ulteriores termos.

Sem conceder, caso assim não se entenda, o que apenas por dever de patrocínio se equaciona, deve o despacho impugnado ser revogado e substituído por outro que determine a citação do executado e exequente para os presentes autos, seguindo-se os ulteriores termos.

Contra alegou a Digna Magistrada do MºPº pugnando pela manutenção do decidido com os seguintes argumentos finais:

Um dos casos em que o processo de inventário é da exclusiva competência dos tribunais judiciais por o inventário ser dependência de outro processo judicial – artº 1083º nº1 al. b) do CPC -  é, manifestamente, aquele que trata da separação de meações na ação executiva, nos termos e para os efeitos do art. 740.º, n.º 2, do C.P.C.

No caso, estando o inventário dependente da execução, a competência é deferida ao Juízo de Execução, no qual aquela se encontra pendente – competência determinada por conexão nos termos do n.º 2 do artigo 206.º do CPC.

O Tribunal Criminal, por força do princípio da adesão previsto no 71.º e ss. do CPP, vê a sua competência, em razão da matéria, “estendida/conexa” ao conhecimento do pedido de indemnização civil fundado na prática do crime.

E, por sua vez, vê essa competência, em razão da matéria, extensível à execução da sentença que arbitrou a indemnização (líquida e certa), face ao disposto nos artigos 131.º e 129.º, n.º 2, da LOSJ, preceito este segundo o qual, «estão excluídos do número anterior1 (...) as execuções de sentenças proferidas em processos de natureza criminal que, nos termos da lei processual penal, não devam correr perante um juízo cível».

A ação executiva respetiva corre por APENSO ao processo crime;

Também resulta claro que as secções de competência especializada criminal do Juízo Central são competentes para julgar e decidir todas as questões e pedidos que tenham que correr autuadas por apenso ao processo de execução (cfr. artigo 788.º, n.º 8, do CPC).

Pelo que, deve ser julgado procedente o recurso e determinar que o Tribunal a quo, mediante despacho, exponha a sua posição e, consequentemente, convide as partes para, querendo, pronunciarem-se sobre tal questão, após o que deverá ser prolatada nova decisão sobre tal matéria e/ou deve o despacho impugnado ser revogado e substituído por outro que declare ser este Juízo materialmente competente para a tramitação dos presentes autos e determine o prosseguimento dos ulteriores termos, o que se requer.

3.

Sendo que, por via de regra: artºs  635º nº4 e 639º do CPC - de que o presente caso não constitui exceção - o teor das conclusões define o objeto do recurso, as questões essenciais decidendas  são as seguintes:

1ª - Nulidade do despacho recorrido por preterição do contraditório.

2ª -  Ilegalidade do mesmo.

4.

Apreciando.

4.1.

Primeira questão.

O princípio do contraditório é um dos princípios basilares que enformam o processo civil, e, na estrita perspetiva das partes, quiçá o mais relevante.

Na verdade: «o processo civil reveste a forma de um debate ou discussão entre as partes (audiatur et altera pars)…esta estruturação dialéctica ou polémica do processo tira partido do contraste de interesses dos pleiteantes, ou até só do contraste das suas opiniões…para o esclarecimento da verdade» - Manuel de Andrade, Noções Elementares, 1979, p.379.

 A  sua consagração legal  mais evidente está plasmada no artº 3º nº3 do CPC:

«O juiz deve observar e fazer cumprir, ao longo de todo o processo, o princípio do contraditório, não lhe sendo lícito, salvo caso de manifesta desnecessidade, decidir questões de direito ou de facto, mesmo que de conhecimento oficioso, sem que as partes tenham tido a possibilidade de sobre elas se pronunciarem».

Efetivamente:

«O princípio do contraditório, previsto no art. 3º, nº 3, do NCPC, consiste numa garantia de participação efectiva que é concedida à parte contrária para se pronunciar sobre o desenvolvimento de todo o litígio, permitindo-se o exercício do seu direito de defesa com a exposição das suas razões e a discussão acerca da matéria que considera relevante para se alcançar a justa composição do litígio e a efectivação em juízo dos seus direitos.» - Ac. do STJ de 22.02.2017, p. 2325/15.1T8OAZ.P1.S1 in dgsi.pt.

Ou, noutra perspetiva ou «nuance»:

 «o princípio do contraditório refere-se ao direito de influenciar a decisão no que tange aos factos, provas e questões de direito que se encontrem em ligação com o objeto dialético controvertido entre as partes…visando-se assim afastar a denominada decisão-surpresa, ou seja a decisão que se funda numa perspetiva não suscitada ou antevista pelas partes… - Ac. do STJ de 20.09.2016,  p. nº1742/09.0TBBNV-H.E1.S.

Assim sendo, este princípio   tem uma abrangência muito grande, emergindo não apenas para as decisões sobre matéria de direito ou de facto, como, mutatis mutandis, para a  prova com base na qual tais decisões são proferidas.

Aqui dispõe o artº 415º do CPC, o qual, sob a epígrafe “princípio da audiência contraditória”, estatui no seu nº1:

«Salvo disposição em contrário, não são admitidas nem produzidas provas sem audiência contraditória da parte a quem hajam de ser opostas»

No que tange à matéria de direito, urge ter presente que:

«quer…a ação…quer a defesa, assentam numa determinada qualificação jurídica dos factos carreados para o processo, que as partes tiveram por pertinente e adequada…

Deste modo, qualquer alteração do módulo jurídico perfilhado, designadamente quando assuma um grau particularmente relevante, é suscetível de comprometer a posição das partes e os direitos que…pretendem fazer valer e daí a proibição imposta pelo nº3 (do artº 3º)…

É verdade que os patronos das partes devem conhecer o direito…e devem prever todas as qualificações jurídicas de que os factos alegados são suscetíveis…e que o normativo em apreço não retira ao tribunal a plena liberdade de dizer o direito…(mas) o que se trata é apenas de evitar, proibindo-as, decisões surpresa» - Abílio Neto in  Breves Notas ao CPC, 2005, p.10.

Nesta sentido se pronunciando a jurisprudência:

Assim:

«I) A correcta compreensão do princípio do contraditório não se basta com a garantia de que as partes tenham a possibilidade de intervir no processo, tendo conhecimento e possibilidade de pronúncia quanto aos pedidos que deduzem ou contra si são deduzidos; implica ainda que as partes possam pronunciar-se quanto a questões determinantes para a decisão a proferir e que, constituindo novidade no processo, não tenham sido objecto de pronúncia no decurso do normal contraditório previsto na tramitação processual. - Ac. RL de  10.09.2020, p. 12841/19.0T8LSB.L2-6.

In casu.

O Tribunal recorrido notificou a requerente para se pronunciar sobre a eventual exceção dilatória de erro na forma do processo,  mas,  depois decidiu sobre a exceção dilatória de incompetência absoluta (material).

Aquele vício acarreta as consequências do artº 193º do CPC , ou seja, importa unicamente a anulação dos atos que não possam ser aproveitados, devendo praticar-se os que forem estritamente necessários para que o processo se aproxime, quanto possível, da forma estabelecida pela lei.

Já a incompetência absoluta têm consequências mais graves, podendo levar ao indeferimento liminar da pretensão, como foi o caso – artº 99º nº1 do CPC.

Estamos pois perante duas figuras/realidades jurídicas autónomas e com efeitos patentemente diferenciados.

 Assim sendo a notificação inicial para a decisão sobre o erro na forma do processo não observou as exigências legais para assegurar o cumprimento do contraditório, pois que a decisão não versou sobre tal temática mas sobre outra claramente diversa.

Destarte, conclui-se que  foi omitido o ato adequado de notificação para assegurar o cumprimento do contraditório o que constitui nulidade processual prevista no artigo 195.º do CPC, com possível influência no desfecho do despacho decidido, o que acarreta a nulidade  desta decisão recorrida.

Não obstante dispõe o artº 665º nº1 do CPC:

Regra da substituição ao tribunal recorrido

1 - Ainda que declare nula a decisão que põe termo ao processo, o tribunal de recurso deve conhecer do objeto da apelação.

É o que infra se fará.

4.2.

Segunda questão.

A competência  em razão da matéria de um tribunal, enquanto medida da jurisdição que lhe é atribuída e que o legitima a conhecer de um determinado litígio, constitui um pressuposto processual que visa garantir que a decisão final é proferida pelo tribunal mais idóneo para  ela o seja com a maior adequação, justiça e no mais curto lapso de tempo possível.

Assim sendo, a competência em razão da matéria deve ser aferida  em função do objeto do processo e da respetiva causa de pedir, atendendo-se ao modo como a relação jurídica é configurada pelo autor.

Esta competência pode ser determinada em termos mais genéricos e abrangentes constantes na LOSJ  - Lei n.º 62/2013, de 26 de Agosto  - ou em termos mais específicos consagrados em normas avulsas.

No caso em apreço releva desde logo o disposto no n.º 2, do artigo 122.º, desta Lei 62/2013:

 «Os juízos de família e menores exercem ainda as competências que a lei confere aos tribunais nos processos de inventário instaurados em consequência de separação de pessoas e bens, divórcio, declaração de inexistência ou anulação de casamento civil, bem como nos casos especiais de separação de bens a que se aplica o regime desses processos.»

Estamos perante um caso especial de separação de bens permitida aquando penhora de bens comuns do casal – artº 740º do CPC.

Sendo, pois, aplicável o artº 1135º do CPC:

Artigo 1135.º

Separação de bens em casos especiais

1 - Se for requerida a separação de bens nos casos de penhora de bens comuns do casal …aplica-se o disposto no regime do processo de inventário em consequência de separação, divórcio, declaração de nulidade ou anulação do casamento, com as especificidades previstas nos números seguintes.

2 - O exequente, nos casos de penhora de bens comuns do casal, ou qualquer credor, no caso de insolvência, podem promover o inventário e o seu andamento.

3 - Só podem ser aprovadas dívidas que estejam devidamente documentadas.

4 - O cônjuge do executado ou do insolvente pode escolher os bens com que deve ser formada a sua meação.

5 - Se usar a faculdade prevista no número anterior, são os credores notificados da escolha, podendo reclamar fundamentadamente contra ela.

6 - Se o juiz julgar atendível a reclamação prevista no número anterior, ordena a avaliação dos bens que lhe pareçam mal avaliados.

7 - Se a avaliação modificar o valor dos bens escolhidos pelo cônjuge do executado ou do insolvente, este cônjuge pode declarar que desiste da escolha, caso em que as meações são adjudicadas por meio de sorteio.

8 - As meações são igualmente adjudicadas por meio de sorteio se o cônjuge do executado ou do insolvente não tiver usado da faculdade de escolha dos bens que compõem a meação.

Do que decorre que, liminarmente, o caso subsumir-se-ia na previsão do artº 122º nº2, in fine, da LOSJ.

Mas tal impressão liminar não pode singrar.

É que existe norma específica ou especial que derroga a previsão genérica do artº 122º nº 2 citado, qual seja o artº 740º do CPC  que estatui:

Artigo 740.º

Penhora de bens comuns em execução movida contra um dos cônjuges

1 - Quando, em execução movida contra um só dos cônjuges, forem penhorados bens comuns do casal, por não se conhecerem bens suficientes próprios do executado, é o cônjuge do executado citado para, no prazo de 20 dias, requerer a separação de bens ou juntar certidão comprovativa da pendência de ação em que a separação já tenha sido requerida, sob pena de a execução prosseguir sobre os bens comuns.

2 - Apensado o requerimento de separação ou junta a certidão, a execução fica suspensa até à partilha; se, por esta, os bens penhorados não couberem ao executado, podem ser penhorados outros que lhe tenham cabido, permanecendo a anterior penhora até à nova apreensão.

Como se vê, este preceito, prevê, adrede e inequivocamente, que o requerimento de separação deve ser apensado ao processo de execução de que é dependência.

Aliás em conformidade e respeito pela regra geral do artº 206º nº2 do CPC o qual prescreve:

«2 - As causas que por lei ou por despacho devam considerar-se dependentes de outras são apensadas àquelas de que dependam.»

Temos pois que a letra  este preceito não deixa margem para exegeses díspares e tergiversantes.

Sendo estas vedadas pelo simples facto de não terem na letra da lei um mínimo de correspondência verbal, em conformidade com o disposto no artº 9º nº2 do CCivil.

Se o artº 740º adrede plasma que o requerimento deve ser apensado ao processo executivo  é porque quer que o pedido de separação tramite por apenso ao mesmo.

Isto sob pena de, desde logo em termos lógico-formais, de ilogicidade, e, na ótica material/funcional, de inutilidade da apensação.

Se  o legislador do artº 740º não quisesse que a separação não tramitasse por apenso bastaria que no nº1  referisse que a separação poderia ser requerida nos termos gerais, vg. do 1133º;  e, neste caso sim, seria o tribunal de família o competente.

Tal não se verificando, a competência cabe, por conexão, ao juízo da execução.

Efetivamente:

«pretendendo o cônjuge do executado requerer a separação de bens, “esta faz-se processo de inventário nos termos dos arts. 1082-d e 1135, o qual corre apenso à execução e tem, entre outras, as particularidades de poder ser impulsionado, não só pelo cônjuge do executado, como parte principal, mas também pelo exequente… »josé Lebre de Freitas, Armando Ribeiro Mendes e Isabel Alexandre – Código de Processo Civil Anotado, Vol. 3º, Almedina, pág. 522, 527 e 528 ;  Ac. TRL de 07.03.2024, p. nº 22487/06.8YYLSB.L1-2 e Cláudia Carvalho Morgado O IMPACTO DAS DÍVIDAS NA VIDA CONJUGAL ALGUMAS QUESTÕES PROCESSUAIS NO QUADRO DA RESPONSABILIDADE PRÉ-EXECUTIVA E EXECUTIVA POR DÍVIDAS DOS CÔNJUGE in https://estudogeral.uc.pt/retrieve/266133/Cl%C3%A1udia%20Morgado.pdf

Já se viu que a competência por conexão derroga as regras gerais de atribuição de competência.

E a ratio desta derrogação é intuível.

Dimana da íntima ligação, vg, material e funcional,  existente entre a ação pendente e o processado ou incidente nela suscitado, ligação que aconselha, por razões de economia e celeridade, que seja o mesmo julgador a apreciar e decidir nos dois processos.

É o que sucede no caso sub judice.

Certo é que este tipo de inventário para a separação de bens visa essencialmente proteger o interesse do cônjuge do executado, permitindo-lhe proceder à separação dos bens do casal e salvaguardar a sua meação nos bens do casal.

Mas nele o próprio exequente e os credores podem ter interesses a defender, pelo que a lei lhes permite  no mesmo intervirem.

Assim, se o cônjuge do executado exercer o direito a escolher os bens que hão de formar a sua meação (artigo 1135.º, n.º 4 do CPC), o exequente será notificado dessa escolha, a fim de poder reclamar fundamentadamente contra ela (artigo 1135.º, n.º 5).

Se o juiz julgar atendível a reclamação do exequente, ordena a avaliação dos bens que lhe pareçam mal avaliados (artigo 1135.º, n.º 6).

Caso essa avaliação modificar o valor dos bens escolhidos pelo cônjuge do executado, este pode declarar que desiste da escolha, caso em que as meações são adjudicadas por meio de sorteio (nº 7).

Também, se o cônjuge do executado não exercer a faculdade de escolha dos bens que compõem a sua meação, então as meações serão adjudicadas por meio de sorteio ( n.º 8).

Mostra-se, pois, acertada a posição do recorrente quando expende que:

«esta dependência existe e é clara no regime aplicável ao presente caso, o qual apresenta especificidades, dada a sua conexão com o processo executivo, e impõe uma constante dialética e dinâmica entre a Requerente, Executado, Exequente e Agente de Execução, o que justifica a opção do legislador…»

(itálico nosso)

Acresce que, por via de regra, de que - como também nota a recorrente -,  o presente caso não constitui exceção, a partilha efetuada na sequência do divórcio e demais casos tipificados – artº 1133º -  é mais ampla  e, quiçá, mais complexa, do que a partilha a efetuar em processo pendente para separação de meações nos termos do artº 1135º.

Pelo que a  vantagem adveniente, aliás eventual e apenas  em teoria,  de uma decisão proferida por tribunal especializado – tribunal de família –, qual seja uma decisão tecnicamente mais apurada  do que, porventura, decorre uma  decisão mais justa, não compensa, ou pode não compensar, as vantagens decorrentes da prolação de decisão pelo juiz de execução atinentes à economia de meios e à celeridade.

 E, inclusive, previsivelmente não beliscam a justiça material; antes pelo contrário, a podem potenciar, pois que, normalmente, nesta matéria não se levantam questões jurídicas complexas e o juiz do processo executivo tem uma visão mais abrangente e apurada de todas as circunstâncias, objetivas e até subjetivas que perpassaram no processo «mãe» podendo assim, operar uma  concatenação com a tramitação do processo apensado em termos e com resultados  profícuos para uma  decisão final mais célere e justa.

Procede o recurso.

5.

Deliberação.

Termos em que se acorda julgar o recurso procedente, revogar a decisão, declarar a competência material do tribunal  a quo, e ordenar a tramitação do incidente por apenso à execução.

Custas recursivas pelo vencido a final no incidente ou na proporção do decaimento.

Coimbra, 2025.09.30.