Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça
Processo:
1315/24.8T8PRT-B.P1.S1
Nº Convencional: 6.ª SECÇÃO
Relator: LUIS ESPIRITO SANTO
Descritores: EMBARGOS DE EXECUTADO
TERCEIRO ADQUIRENTE
DIVISÃO DE HIPOTECA
REGRA PROPORCIONAL
DISTRATE
HIPOTECA
INDIVISIBILIDADE
PROPRIEDADE HORIZONTAL
FRAÇÃO AUTÓNOMA
DIVISIBILIDADE
INTERPRETAÇÃO DA DECLARAÇÃO NEGOCIAL
RENÚNCIA
DECLARAÇÃO TÁCITA
FACTO CONCLUDENTE
NORMA SUPLETIVA
Data do Acordão: 10/07/2025
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Privacidade: 1
Meio Processual: REVISTA
Decisão: REVISTA PROCEDENTE REPRESTINANDO DA DECISÃO DA 1ª INSTÂNCIA
Sumário :
I – Encontrando-se definitivamente decidida a questão da divisibilidade da hipoteca, bem como que o cálculo da permilagem deve ser feito por referência ao conjunto das fracções não distratadas (sete) e não ao das fracções inicialmente objecto da constituição da hipoteca (doze), não há fundamento para tomada em consideração no acórdão recorrido do (eventual) superveniente distrate de outras fracções que não as indicadas no requerimento executivo.

II – Desde logo, na medida em que se trata de matéria que não foi sequer alegada nem discutida no processo pelas partes, mormente pelo embargado executado, tendo sua impugnação incidido exclusivamente sobre o método cálculo da permilagem em apreço (sobre sete fracções – não distratadas – ou sobre doze – inicialmente objecto da garantia real).

III - Por outro lado, a tomada em consideração desses eventuais e novos distrates não encontra o menor reflexo nos factos que foram dados como provados, coisa alguma tendo sido referido nesse âmbito que permitisse conhecer este novo elemento de facto trazido a juízo com base em referências e conhecimentos do julgador que se desconhece como foram encontrados, não havendo tal questão jurídica essencial sido sequer sujeita ao contraditório, conforme obrigaria o disposto no artigo 3º, nº 3, do Código de Processo Civil.

IV – Nestas concretas circunstâncias, a lei não permite que se tenham em conta, para cálculo da permilagem da fracção do titular que agora é executado, novos e sucessivos (e relativamente incertos) distrates invocados pelo primeira vez e oficiosamente no acórdão do Tribunal da Relação, desprovidos de base documental e que, sem nenhuma possibilidade de contraditório, iriam injustificadamente desproteger o credor hipotecário e gerar mesmo inopinadamente a própria incerteza e iliquidez do título executivo colocando assim em crise a subsistência da própria instância executiva.

Decisão Texto Integral:

Acordam no Supremo Tribunal de Justiça (6ª Secção).

I - RELATÓRIO.

Apresentou o executado AA os presentes embargos de executado por oposição à execução ordinária para pagamento de quantia certa baseada em escritura de mútuo garantido por hipoteca sobre imóvel que Caixa Geral de Depósitos, SA, entretanto substituída, por habilitação de cessionário, por ETAPA PREPONDERANTE SA.

Alegou essencialmente:

Existe ilegitimidade activa pois a exequente já cedeu o seu crédito.

A embargante já recebeu pelo produto da venda de outras fracções, parte do seu crédito e que aceitou o distrate das hipotecas que incidiam sobre essas fracções, pelo que renunciou à indivisibilidade da hipoteca.

A sua responsabilidade está limitada ao valor proporcional e que este é ilíquido.

Os juros estão parcialmente prescritos.

Conclui pela extinção da execução.

Liminarmente recebidos os embargos, contestou a exequente embargada, pugnando pela total improcedência dos embargos.

Essencialmente alegou:

O embargante sabia que a fracção por si adquirida estava onerada com uma hipoteca.

Esta garantia mantém-se válida e nunca foi cancelada.

Por isso, apesar de o embargante não ser o seu devedor, o bem onerado pela hipoteca pode aqui ser penhorado.

O penhoriante nunca renunciou à indivisibilidade da hipoteca.

A hipoteca nem sequer incide sobre a totalidade do prédio, pelo que a posição do embargante não tem aplicabilidade no caso dos autos.

Foi proferido saneador-sentença que julgou os presentes embargos parcialmente procedentes, e consequentemente, decidiu determinar o prosseguimento da execução pelo valor de € 81.650,16 (oitenta e um mil, seiscentos e cinquenta euros e dezasseis cêntimos), acrescidos de juros sobre este montante.

O embargante interpôs recurso de apelação.

Foi, nesta sequência, proferido pelo Tribunal da Relação do Porto acórdão, datado de 24 de Março de 2025, que (com um voto de vencido) julgou procedente o recurso de apelação e, consequentemente, revogou a sentença quanto à fixação do valor do capital garantido, ordenando o prosseguimento da execução, para cobrança do valor achado de acordo com o raciocínio por si exposto quanto ao capital (sendo que a esse capital - inferior a € 81.650,16 (oitenta e um mil, seiscentos e cinquenta euros e dezasseis cêntimos), - acrescem os juros de três anos sobre este montante, como decidido em 1ª instância), limitada tal cobrança à fração “F” (hipotecada e penhorada nos autos).

Veio o exequente embargado interpor recurso de revista, apresentando as seguintes conclusões:

A) O Tribunal da Relação do Porto decidiu, por maioria dos Juízes subscritores, na procedência do Recurso interposto pelo executado/embargante, revogando a decisão do tribunal da 1ª instância “quanto à fixação do valor do capital garantido e ordenar o prosseguimento da execução, para cobrança do valor achado de acordo com o raciocínio acabado de expor quanto ao capital (sendo que a esse capital – inferior a € 81.650,16 – acrescem os juros de três anos sobre este montante, como decidido em 1ª instância), limitada tal cobrança à fracção “F” (hipotecada e penhorada nos autos)”.

B) Cumpre precisar que o Recurso que ora se interpõe visa tão somente alterar-se o “raciocínio acabado de expor quanto ao capital” decidido pelo tribunal a quo.

C) Concordando em absoluto a exequente com o teor da sentença proferida pelo tribunal de 1ª instância, que determinou “o prosseguimento da execução pelo valor de € 81.650,16, acrescido dos juros de três anos sobre este montante.”, razão pela qual deverá ser repristinada.

D) O Tribunal da Relação do Porto revogou a sentença da 1ª instância quanto à fixação do valor do capital garantido, ordenando que este fosse determinado de acordo com um raciocínio incerto e não isento de dificuldades de materialização.

E) O raciocínio encontrado pelo tribunal a quo foi conforme infra se refere:

“Ora, pelas razões explanadas, não podemos deixar de aqui afirmar esta posição com relação, também, à fração hipotecada aqui penhorada - a “F” - tendo de ser apurado o atual valor total em dívida – posto que já abatidos, pelo menos,os créditos relativos às frações “C” e“R”, e, também, “T” – e apurar-se, depois, o referente à permilagem relativa da fração aqui em causa (“F”) de entre a permilagem correspondente às frações ainda hipotecadas (devendo obter-se certidão do registo predialatualizadaeindicaraexequente quaisasfraçõescujahipotecafoiexpurgada),raciocinando- se, depois, aritmeticamente, como acabado de expor.

Nesteconspecto,e resumidamente,sendo aquestãoadecidir ado limitedagarantia (porter operado a divisibilidade da hipoteca) e entendendo-se como critério de cálculo a seguir para determinar o concreto quantum o da proporcionalidade da permilagem da fração de entre as frações da hipoteca global quepermanecemregistadas para garantiadocrédito esendo a decisão recorrida “a) julgar os presentes embargos de executado parcialmente procedentes, e em consequência determino o prosseguimento da execução pelo valor de €81.650,16, acrescido dos juros de três anos sobre este montante, sabendo, como pacificamente, resulta da decisão recorrida e dos elementos dos autos e v. o supra exposto – existirem fracções que já responderam pela dívida, passando a ser menos as que permanecem agarantir adívida (não são,atualmente,as 7referidas nadecisãorecorrida a responder, mas menos do que essas, resultando, também ser o valor pelo qual a execução tem de prosseguir inferior a €81.650,16), tem de ser apurado, nos autos, o capital atual em dívida, para, depois, prosseguir a execução para pagamento desse inferior capital garantido, acrescido dos juros de três sobre o montante a que se chegar, como se mostra decidido.”.

F) Não pode a ora recorrente concordar com o raciocínio indicado no Acórdão de que se recorre, acompanhando na íntegra o Voto de Vencido do Juiz Desembargador Nuno Marcelo Araújo.

G) Conforme exposto por este Juiz Desembargador no seu Voto de Vencido (doravante, “Voto de Vencido”): “o objecto do recurso (…) reside simplesmente, no caso dos autos, em saber se, para a determinação da quantia exequenda, o critério da permilagem da fracção do embargante (fracção F) deve ser calculado sobre as 7 fracções que, de acordo com a decisão recorrida e as alegações, estão hipotecadas, ou sobre as 12 fracções inicialmente oneradas e financiadas pelo exequente, como pretende o recorrente.”.

H) Ora, o raciocínio calculado no Acórdão do Tribunal da Relação do Porto extravasou o objecto do recurso.

I) Foi isso mesmo que o Voto de Vencido continuou a elucidar: “(…) decisão agora proferida terá acabado por divergir para uma questão nova, que não foi colocada nas conclusões do recurso, nem sequer debatidano processo até ao momento, e à qual respondeu afirmativamente: saber se, já depois de instaurada execução, por cada distrate que ocorrer, deve recalcular-se a permilagem relevante das fracções ainda oneradas.”.

J) Por hipótese, o critério/raciocínio determinado pelo tribunal a quo até pode originar que o valor de capital de€ 81.650,16– aser reduzido,mesmo sem que tenhasidoprecisadooufixado qualquer valor – possa ser superior.

K) Isso mesmo também nos referiu o Voto de Vencido: “(…) o critério da “proporcionalidade da permilagem da fração de entre as frações da hipoteca global que permanecem registadas” pode determinar, em tese, um valor para a quantia exequenda superior a € 81.650,16, embora este seja o máximo admissível para o efeito, transitado nesse limite, pois o recurso visou a sua redução e o exequente dessa limitação não recorreu.”.

L) A sentença proferida pelo tribunal de 1ª instância sustentou a sua decisão com base num recente Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 15 de Maio de 2004, acórdão esse proferido sobre a mesma questão aqui em discussão: processo idêntico, relativo ao mesmo negócio e mesma hipoteca (só o executado é diferente).

M) Essa sentença de 1ª instância aplicou o critério da permilagem da fracção “F” em discussão nos autosaovalordaexecução(€1.056.503,55), o que nos autos correspondeuà quantia de €81.650,16.

N) Ou seja, o que relevou para a decisão de 1ª instância – decisão que não merece qualquer censura – foi a participação de cada fracção ainda onerada por hipoteca por referência à actual dívida exequenda.

O) Conforme explanado nessa sentença de 1ª instância: “temos que a execução dos autos foi instaurada para cobrança da quantia de €1056.503,55, sendo tal crédito garantido, atualmente, por hipotecas constituídas sobre 7 frações (frações C, F, Q, R, S, T e U)).

Assim, o valor ainda em dívida (quantia exequenda) encontra-se garantido por hipoteca registada sobre fracções que representam 427/1000 (frações C, F, Q, R, S, T e U), o que significa que o valor pelo qual a presente execução deve prosseguir é de €81.650,16 (correspondente à permilagem de 33 correspondente à fracção pertencente ao Embargante por referência àquela quantia exequenda).”.

P) Conforme supra mencionado, sobre esta mesma questão – num processo idêntico, relativo ao mesmo negócio, mesma hipoteca, que correu termos com o nº 1502/22.3T8PRT-A no Juiz 6 do Juízo de Execução do Porto – já se pronunciou o Supremo Tribunal de Justiça muito recentemente, em 15.05.2024, através de Acórdão disponível em www.dgsi.pt.

Q) O Sumário desse Acórdão do Supremo Tribunal de 15.05.2024 foi o seguinte:

“1. Em caso de hipoteca indivisível constituída sobre uma pluralidade de coisas, nada impede o credor hipotecário de executar uma ou várias hipotecas à sua escolha pela totalidade do crédito garantido.

2. No caso de divisibilidade da hipoteca, o único critério que se revela claro e objetivo é, à semelhança do já vem sendo defendido por este STJ, o critério da permilagem.

3.Oquerelevaéaparticipaçãode cada fracção onerada por referência à dívida exequenda existente”.

R) Perante factualidade emtudo idêntica com a destes autos, o STJ ensinou neste recente Acórdão de 15.05.2024 que:

“o credor hipotecário aceitou constituir a hipoteca sobre 12 frações autónomas, cujas permilagens já se encontravam definidas e eram do conhecimento do credor. Sabia, então, o credor hipotecário, à data da constituição da hipoteca, quais as permilagens das frações hipotecadas, não tendo, certamente, tais elementos sido alheios à decisão tomada quanto à escolha dos bens a hipotecar.”

S) E continuou o mesmo Acórdão do STJ de 15.05.2024:

“Todos estes aspetos a que se fez referência impõem a conclusão de que o único critério que se revela claro e objetivo é, à semelhança do já vem sendo defendido por este STJ, o critério da permilagem.

Aqui chegados, importa apenas clarificar que o critério da permilagem deve ser aplicado ao valor do crédito existente na presente data, sendo evidente que o montante em dívida no momento atual é distintodocréditoinicial,sejaporforçadasamortizaçõesparciaislevadasacabo,sejapelovencimento de juros.

Como é evidente, o critério da permilagem não pode ser, ao contrário do que pretende a recorrente, aplicado ao montante inicial do crédito, porquanto tal corresponderia, no limite, à desproteção do crédito hipotecário, o que não foi, de todo em todo, pretendido pelo legislador.”

T) A este propósito, e contextualizando, cumpre relembrar a factualidade dada por provada sob o nº 3 e nº 12 na sentença de 1ª instância:

“Facto nº 3: “Dentre tais imóveis, permanecem hipotecadas, à data da propositura da execução, as fracções autónomas designadas pelas letras “C”, “F”, "Q", “R”, “S”, “T” e “U”, supra melhor identificadas. (…)

Facto nº 12: “A execução de que estes autos dependem foi instaurada em 12/01/2024”

U) E continua o Acórdão do STJ de 15.05.2024 a ensinar-nos para determinação do critério a adoptar:

“(…) para a determinação do critérioa observarparaefeitos deaferição dovalorpeloqual cada fração responde “haverá desde logo de ter em conta que pela ‘natureza das coisas’ o cálculo do montante da dívida garantido por cada fracção autónoma sempre padecerá de alguma aleatoriedade. Com efeito, no tipo de contrato em causa, o montante da dívida é sempre um montante variável na medida em que depende quer do montante do crédito efectivamente utilizado, quer dos pagamentos parcelares efectuados, quer do tempo decorrido e do consequente montante de juros, quer dos percalços no cumprimento do contrato e das suas repercussões nos acessórios do crédito também garantidos.” –

Acórdão de 11/03/2021, já citado.

O que releva é, pois, a participação de cada fração onerada por referência à dívida exequenda atualmente existente.

Ora, aplicando este entendimento ao caso concreto, temos que a execução dos autos foi instaurada para cobrança da quantia de €1.056.503,55, sendo tal crédito garantido, atualmente, por hipotecas constituídas sobre 7 frações (frações C, F, Q, R, S, T e U)).

Assim,valor aindaem dívida (quantia exequenda) encontra-se garantido por hipoteca registada sobre frações que representam 427/1000 (frações C, F, Q, R, S, T e U), o que significa que o valor pelo qual a presente execução deve prosseguir é de €175 590,89 (correspondente à permilagem de 71 correspondente à fração pertencente à Embargante por referência àquela quantia exequenda).

(…) Como explica Rui Estrela de Oliveira, “os propósitos do legislador, com a norma em causa, centram-se, pois, na garantia do crédito, tendo pretendido evitar-se que as eventuaisvicissitudes a ocorrer na coisa dada em garantia pudessem prejudicar a satisfação do crédito, nomeadamente, que parte daquele créditodeixasse de ser garantido ou que a garantia, ao invés do seu momento inicial, se viesse a revelar curta ou insuficiente para os propósitos iniciais.” - A Renúncia Tácita do Credor à Indivisibilidade da Hipoteca”, in Estudos de Direito do Consumidor, n.º 17, 2021, disponível em https://cdc.fd.uc.pt/revista/, p.606.

Assim, se é certo que o devedor não deve ser responsabilizado pela totalidade da dívida em cenário de divisibilidade da hipoteca, é também evidente que não é possível defender a degradação da função de garantia do crédito inerente à hipoteca, que não pode ficar em causa”.

V) Não se vê razão para se divergir do entendimento acolhido neste Acórdão do STJ de 15.05.2024.

W) Issomesmo foi lembrado e aplaudido no Voto de Vencido: “Ora, não se vislumbra motivo bastante para divergir do aresto do STJ (e, assim, da decisão recorrida) recentemente proferido sobre o mesmo negócio e que, segundo se crê, a coerência das decisões judiciais justificaria ter sido observado.”

X) Mais referindo o Voto de Vencido – posição que se corrobora na íntegra – que: “Para além disso, não vislumbro motivo idóneo para essa divergência em atenção às conclusões do recurso, as quais, a meu ver, improcedem manifestamente a respeito do critério relevante para a fixação do capital exequendo.

Com efeito, a tese do recorrente – no essencial, fixar o montante da obrigação exequenda tendo por objeto o valor correspondente à proporção da permilagem da fração “F” no total de 12 frações inicialmente financiadas (o que daria um resultado de 624/1000, em lugar dos 427/1000 adoptados na sentença) – é clara e fundadamente rebatida no dito Acórdão do STJ de 15/05/2024, segundo o qual, “o critério da permilagem não pode ser, ao contrário do que pretende a recorrente, aplicado ao montante inicial do crédito, porquanto tal corresponderia, no limite, à desproteção do crédito hipotecário, o que não foi, de todo em todo, pretendido pelo legislador”.”.

Y) O raciocínio achado pelo Tribunal da Relação do Porto gera incerteza e dificuldades na determinação do valor a ser apurado, o que não deveria ocorrer na presente fase processual.

Z) Conforme nosensina o Voto de Vencido: “Econstituindo princípiolegalconsolidado que aexecução principia pelas diligências, a requerer pelo exequente, destinadas a tornar a obrigação certa, exigível e líquida, se o não for em face do título executivo (art.713.º do CPC), é de crer que a opção maioritária adoptada terá por efeito devolver o processo executivo à sua fase inicial e afastar,injustificadamente, qualquer relevância do requerimento executivo.

(…)

E não há dúvida que nas várias decisões proferidas pelo Supremo Tribunal de Justiça a este respeito, tal como, de resto, na sentença recorrida, foi sempre fixado um valor certo para esse efeito.”.

AA) Pelo que bem esteve o tribunal de 1ª instância na sentença proferida, contrariamente ao raciocínio ora determinado pelo Acórdão do Tribunal da Relação do Porto.

Contra-alegou a embargante executado, apresentando as seguintes conclusões:

A. O presente recurso foi interposto pela Recorrente ETAPA PREPONDERANTE, SA por, alegadamente, não se conformar com o, aliás, douto Acórdão do Tribunal da Relação do Porto que decidiu conceder provimento ao recurso de apelação motivado pelo ora aqui Recorrido, e, em consequência, determinou o prosseguimento da execução «para cobrança do valor achado de acordo com o raciocínio acabado de expor quanto ao capital (sendo que a esse capital – inferior a €81.650,16 – acrescem os juros de três anos sobre este montante, como decidido em 1.ª instância), limitada tal cobrança à fração “F” (hipotecada e penhorada nos autos).

B. Acontece que, ressalvado o devido respeito, não nos parece que assista razão alguma à aqui Recorrente, pelo menos, no que concerne aos fundamentos expostos nas suas Alegações de Recurso de Revista.

SENÃO VEJAMOS,

C. Insurge-se a Recorrente quanto à decisão proferida pelo Venerando Tribunal da Relação do Porto, na medida em que considerou que este revogou mal a sentença da 1ª instância, quanto à fixação do valor do capital garantido, ao ter ordenado que aquele fosse determinado de acordo com um raciocínio incerto e não isento de dificuldades de materialização.

D. No entanto, salvo o devido respeito, carece o presente recurso, de qualquer sentido útil, pois que, salvo o devido respeito, tão artificial se configura, afinal, o sustentado!

E. É que, importa desde logo referir, sendo assente a divisibilidade da hipoteca aqui em causa – nem sequer, nesta instância recursiva se coloca tal questão – e tendo o Credor Hipotecário distratado a hipoteca relativamente a cinco frações autónomas, deve entender-se que cada uma das restantes, que nestes autos é a fração “F”, que assim não garantem a totalidade da dívida que a hipoteca garantia, mas apenas a dívida na proporção da permilagem da fração respetiva.

F. Ou seja, entendeu – bem, dizemos nós – o Venerando Tribunal da Relação do Porto que a aceitação da divisibilidade como sucedeu, in casu, resulta do facto de ter havido distrates anteriores, aceites pela aqui Exequente/Recorrente;

G. Ora, sendo o distrate um documento requerido/emitido no momento da transmissão de um imóvel, o qual, comprova a extinção ou rescisão de um contrato com hipoteca, é consabido que, no caso daquela hipoteca abranger mais do que uma fração, os distrates podem ser parciais, correspondendo, claro está, a reembolsos também eles parciais.

H. Ou seja, quando uma dívida de crédito hipotecário é extinta, não necessariamente no seu todo, é possível a emissão de distrates parciais, a título de cancelamento de hipoteca, correspondentes a reembolsos parciais, o que necessariamente implica a redução da hipoteca.

I. Isto para dizer que, a emissão de um distrate parcial corresponde sempre a pagamento proporcional da dívida, logo, o valor atribuído a cada uma das frações corresponderá ao valor admitido, pela aqui Exequente/Recorrente, a título de pagamento parcial e proporcional do débito em causa.

Aqui chegados,

J. Importava, por conseguinte, saber qual o critério para determinar o montante da dívida pela qual responde o aqui Recorrido, ou melhor dizendo, a fração F, hipotecada a favor da aqui Recorrente.

K. Considerou o Dign.º Tribunal “a quo”, na sua motivação, que «Sobre esta questão, num processo idêntico, relativo ao mesmo negócio, mesma hipoteca, que correu termos com o nº 1502/22.3T8PRT-A pelo Juiz 6 deste Juízo de Execução, de que é titular a signatária, já se pronunciou o Supremo Tribunal de Justiça, em 15/05/2024, num acórdão com o seguinte sumário:

1. Em caso de hipoteca indivisível constituída sobre uma pluralidade de coisas, nada impede o credor hipotecário de executar uma ou várias hipotecas à sua escolha pela totalidade do crédito garantido.

2. No caso de divisibilidade da hipoteca, o único critério que se revela claro e objetivo é, à semelhança do já vem sendo defendido por este STJ, o critério da permilagem.

3. O que releva é a participação de cada fração onerada por referência à dívida exequenda atualmente existente.»

L. Ou seja, o Tribunal “a quo” considerou parcialmente procedentes os embargos aduzidos, e determinou o montante pelo qual a fracção da propriedade do aqui Embargante responderá, como seja, a quantia de €: 81.650,16, correspondente à permilagem de 33 sobre aquela quantia exequenda garantida por hipoteca registada sobre 7 (sete) frações, ainda hipotecadas, que representam 427/1000 (€: 1.056.503,55 x 33 /427).

M. O ora aqui Recorrido não aceitando aquele raciocínio, antes defendeu que tal cálculo haveria de ser aferido em função do valor correspondente à proporção da permilagem da fração “F” no total de 12 frações (624/1000) inicialmente hipotecadas, cuja aquisição foi financiada pela CGD, conforme, aliás, assim foi decidido no Acórdão do Tribunal da Relação do Porto, de 10/10/2023, devidamente transitado em julgado, e proferido nos autos de processo 1501/22.5T8PRT-A, do Juiz 3, do Juízo de Execução do Porto (situação igual à dos autos, mudando apenas o Executado), cujo sumário supra se transcreveu e aqui se dá por integralmente reproduzido.

N. Ora, versando sobre aquela problemática – qual o critério para determinar o montante garantido pela hipoteca na concreta fração em causa nos autos -veio, nestes autos de processo, o Venerando Tribunal da Relação do Porto a considerar que, terá de se encontrar o critério adequado a estabelecer a divisão da garantia pelas frações que se mantêm oneradas, em função do crédito atual.

O. Concluindo, que «no caso de divisibilidade da hipoteca de frações autónomas de um prédio, o critério que se revela claro eobjetivo paraa divisãodagarantia pelas frações ainda oneradas é o critério da permilagem adequado e capaz de traduzir a proporcional participação de cada uma das frações oneradas, compreendendo o título constitutivo da propriedade horizontal a individualização das frações com o seu valor relativo, expresso em permilagem do valor total do prédio, a vincular os adquirentes das frações (cfr. arts 1418º e nº1, do art. 1419º, do Código Civil). Assim, para o cálculo do valor pelo qual responde a fracção autónoma hipotecadae penhorada ao executado/embargante, o que releva é a participação de cada fração das que se encontram, ainda, oneradas (sendo de considerar no cálculo a permilagem relativa da fração aqui em causa de entre a permilagem correspondente às frações ainda hipotecadas) por referência à dívida exequenda atualmente existente.»

P. Sendo que, aplicando aquele critério ao caso concreto, considerou o Venerando Tribunal da Relação do Porto que:

«na ótica do ac. do STJ mencionado por último, teremos de considerar qual o valor que está atualmente em dívida – após destrate de outras hipotecas (e após decisões judiciais proferidas antes da presente) – e quais as hipotecas que já foram expurgadas (também após a instauração da presente execução e nomeadamente em função das sentenças entretanto proferidas e transitadas em julgado - as mencionadas supra, duas, da 2.ª secção deste tribunal) e, após, efetuar o cálculo proposto pelo STJ.

O valor em dívida atualmente – que não será certamente o constante do requerimento executivo (porque, entretanto, pelo menos, duas frações – a “C” e a “R” – já responderam pelo crédito da ora exequente) será considerado tendo em conta a proporcionalidade da permilagem da fração “T” (70) entre as frações que permanecem registadas para garantia deste crédito (sabendo nós que as frações “C” e “R”, mencionadas no acórdão referido, e tidas em conta na proporção aí mencionada – ... – se não acham já hipotecadas).

Vemos que o valor encontrado no ac. do STJ, de 15.5.2024, pelo qual responderia a fração “R” foi de € 175,590,89, equivalente a 166,2/1000, ou seja, o valor ali em dívida (€ 1.056.503,55) estaria para 1000, tal como 116, 2, estaria para x. No nosso caso, deverá apurar-se qual o valor total em dívida – posto que já abatidos, pelo menos, os créditos relativos às frações “C” e “R” – e apurar-se, depois, qual a permilagem relativa da fração aqui em causa (“T”) de entre a permilagem correspondente às frações ainda hipotecadas (devendo obter-se certidão do registo predial atualizada e indicar a exequente quais as frações cuja hipoteca foi expurgada), raciocinando-se, depois, aritmeticamente, como acabado de expor”

(…)

Ora, pelas razões explanadas, não podemos deixar de aqui afirmar esta posição com relação, também, à fração hipotecada aqui penhorada - a “F” - tendo de ser apurado o atual valor total em dívida – posto que já abatidos, pelo menos, os créditos relativos às frações “C” e “R”, e, também, “T” – e apurar-se, depois, o referente à permilagem relativa da fração aqui em causa (“F”) de entre a permilagem correspondente às frações ainda hipotecadas (devendo obter-se certidão do registo predial atualizada e indicar a exequente quais as frações cuja hipoteca foi expurgada), raciocinando-se, depois, aritmeticamente, como acabado de expor.

Neste conspecto, e resumidamente, sendo a questão a decidir a do limite da garantia (por ter operado a divisibilidade da hipoteca) e entendendo-se como critério de cálculo a seguir para determinar o concreto quantum o da proporcionalidade da permilagem da fração de entre as frações da hipoteca global que permanecem registadas para garantia do crédito».

Deste modo,

Q. É claro e evidente que o Venerando Tribunal da Relação do Porto tomou uma decisão - entre calcular sobre 7 (Proc. 1502) frações ou sobre 12 (Proc. 1501) frações – optou pelo decidido no processo 1502, conforme expressamente salientado na motivação supra transcrita, apenas com a tónica de que, resulta da decisão recorrida e dos elementos dos autos, existirem frações que já responderam pela dívida, passando a ser menos as que permanecem a garantir a dívida (não são, atualmente, as 7 referidas na decisão recorrida a responder, mas menos do que essas, resultando, também ser o valor pelo qual a execução tem de prosseguir inferior a €81.650,16),

R. Donde, em bom rigor, esta decisão espelha, precisamente, o mesmo critério que presidiu a decisão tomada no Acórdão STJ, proferido nos autos de processo n.º 1502/22.3T8PRT-A – Juiz 6 – Execução do Porto.

S. Pelo que, claro está, falece a argumentação expendida pela Recorrente no sentido de que o Venerando Tribunal da Relação do Porto “extravasou o objeto do recurso”, acabando por decidir “questão nova”.

T. A questão é única e exatamente a mesma – a do limite da garantia (por ter operado a divisibilidade da hipoteca) - entendendo-se como critério de cálculo a seguir para determinar o concreto quantum o da proporcionalidade da permilagem da fração de entre as frações da hipoteca global que permanecem registadas para garantia do crédito, seja, tendo por referência, o valor atualmente em dívida.

U. Não há qualquer “questão” nova – tanto mais que, o Tribunal ora recorrido tomou, como seu, precisamente, o critério que presidiu à tomada de decisão nos autos de processo n.º 1502/22.3T8PRT-A – Juiz 6 – Execução do Porto.

V. Tal critério é claro, certo, determinativo e limitador, não havendo, por conseguinte, ao contrário do que aventa a aqui Recorrente, qualquer dificuldade na sua materialização, sendo o seu apuramento meramente aritmético – apenas não tendo sido já indicado no douto Acórdão aqui recorrido, o montante correspondente (o que foi feito, no proc. 1502/22) porquanto, não consta dos autos, informação suficiente sobre o capital ainda em dívida, e quais as frações que ainda permanecem registadas, antes, se sabendo, por força dos dois processos referidos (1501/22 e 1502/22), que já há mais frações distratadas, e como tal, há-de ser menor o capital atualmente em dívida.

W. O que, salvo a devida vénia, se impõe, por conseguinte, apurar em sede de incidente de liquidação, tal como aliás, decidido nos autos (idênticos a estes, e aos demais já referidos, apenas mudando a fração hipotecada e o respetivo Executado), de processo n.º 1613/24.0T8PRT-B.P1, da 5.ª Secção do Tribunal da Relação do Porto, proferido em 27/01/2025, e já transitado em julgado (deste não recorreu a aqui Recorrente!), assim sumariado:

«I - Nos termos do art. 696.º do CC, não são, em princípio, de admitir as expurgações parciais de hipotecas, a não ser que o credor, por comum acordo, renuncie à indivisibilidade parcial, aceitando o distrate parcial da hipoteca, permanecendo a hipoteca sobre todas as parcelas não distratadas.

II - A convenção contrária à indivisibilidade da hipoteca pode ser posterior à sua constituição e tácita; ocorre a convenção de divisibilidade da hipoteca quando o credor aceita o distrate da hipoteca sobre determinada fração predial autónoma contra o pagamento da parte proporcional do respetivo crédito.

III - No caso de divisibilidade da hipoteca, o critério que se revela claro e objetivo é, comovem sendodefendido por este STJ, ocritérioda permilagem. O que releva é a participação de cada fração onerada por referência à dívida exequenda atualmente existente.».

X. Sendo que, tal como no Acórdão ora recorrido nestes autos de processo, também naqueles autos – importando, pois, defender a coerência do sistema judicial – entendeu o Venerando Tribunal da Relação do Porto, mesma 5.ª Secção, que «tendo-se concluído pela divisibilidade da hipoteca» em primeiro plano, há que, em segundo, «determinar o valor pelo qual responde o bem penhorado. E, na ótica do ac. do STJ mencionado por último, teremos de considerar qual o valor que está atualmente em dívida – após destrate de outras hipotecas (e após decisões judiciais proferidas antes da presente) – e quais as hipotecas que já foram expurgadas (também após a instauração da presente execução e nomeadamente em função das sentenças entretanto proferidas e transitadas em julgado - as mencionadas supra, duas, da 2.ª secção deste tribunal) e, após efetuar o cálculo proposto pelo STJ. O valor em dívida atualmente – que não será certamente o constante do requerimento executivo (porque, entretanto, pelo menos, duas frações – a “C” e a “R” – já responderam pelo crédito da ora exequente) será considerado tendo em conta a proporcionalidade da permilagem da fração “T” (70) entre as frações que permanecem registadas para garantia deste crédito (sabendo nós que as frações “C” e “R”, mencionadas no acórdão referido, e tidas em conta na proporção aí mencionada – 427/1000 – se não acham já hipotecadas). Vemos que o valor encontrado no ac. do STJ, de 15.5.2024, pelo qual responderia a fração “R” foi de € 175, 590, 89, equivalente a 166, 2/1000, ou seja, o valor ali em dívida (€1.056.503, 55) estaria para 1000, tal como 116, 2, estaria para x. No nosso caso, deverá apurar-se qual o valor total em dívida – posto que já abatidos, pelo menos, os créditos relativos às frações “C” e “R” – e apurar-se, depois, qual a permilagem relativa da fração aqui em causa (“T”) de entre a permilagem correspondente às frações ainda hipotecadas (devendo obter-se certidão do registo predial atualizada e indicar a exequente quais as frações cuja hipoteca foi expurgada), raciocinando-se, depois, aritmeticamente, comoacabadode expor.»

Y. Assim, por tudo o exposto, tal como decidido nestes autos de processo, naqueles foi decidido que, considerando-se a divisibilidade da hipoteca, o critério para determinar o montante que a mesma garante, há-se ser determinado de acordo com o critério da permilagem, da fração hipotecada nos autos, por confronto com o valor atual em dívida (retirados os valores já distratados).

Z. Só assim, aliás, se poderá encontrar uma solução/critério justo e equitativo, sendo certo que, a justiça e a equidade devem ser consideradas no processo de divisão, de forma a garantir a proteção dos direitos dos credores e de terceiros.

AA. Ainda que esse critério, tenha de assegurar que a garantia hipotecária é suficiente para cobrir a parte da dívida correspondente a cada fração, não se pode olvidar a proteção dos titulares do direito de propriedade da fração em causa.

BB. Sendo, pois, gritante o descomedimento da aqui Recorrente em pretender “impor” um critério que lhe permitiria embolsar um quantitativo superior àquele que lhe está em dívida, fazendo-se as “contas” ignorando os distrates que (antes e depois de se ter iniciado a instância executiva) entretanto foram emitidos, com a correspondente redução do montante em dívida.

CC. De modo que, ainda que tenha o Venerando Tribunal da Relação do Porto acolhido nestes autos de processo a decisão tomada nos autos de processo n.º 1502/22.3T8PRT-A, com a especificidade da atualização do montante em dívida face aos distrates entretanto emitidos –, afastando, assim, a decisão defendida nos autos de processo n.º 1501/22.5T8PRT-A – o que, na verdade, o aqui Recorrido não defende, tal qual, fez constar da sua motivação de apelação – estamos certos de que esta decisão não incorre em violação de qualquer norma substantiva,

DD. Tão pouco, aliás, a Recorrente alega/invoca qualquer norma violada, em total inobservância do disposto no art.º 639.º, n.º 2, al. a) e b) do CPC, com o consequente incumprimento do ónus recursivo que se lhe impunha.

EE.Em todo caso, como vimos supra, a decisão aqui tomada, e ora recorrida, em nada gera incerteza e/ou dificuldades na determinação do valor a ser apurado – é tão simples, como isto, juntar aos autos as certidões de registo predial de cada uma das frações hipotecadas (as 12) para se saber quais as que já foram desoneradas da respetiva hipoteca.

FF.Razão pela qual, em suma, pelo exposto, e salvo o devido respeito, o certo é que, a douta motivação de recurso ora apresentada pela Recorrente não colhe qualquer sustentação, devendo, por isso, manter-se a douta decisão ora recorrida.

II – FACTOS PROVADOS.

Encontra-se provados nos autos que:

1. No dia 31 de Julho de 2008 a exequente Caixa Geral de Depósitos, S.A. celebrou com a sociedade Constromega - Investimentos Imobiliários, Lda., uma escritura pública denominada de compra e venda e empréstimo com hipoteca e mandato, mediante a qual na parte relevante declararam as partes que a exequente concedia à dita sociedade um empréstimo a que atribuíram o n.º ..............90, do montante de € 1.100.000,00 (um milhão e cem mil euros), destinado a aquisição de doze frações para revenda

2. Mais declararam que, para garantia do capital mutuado pelo empréstimo supra descrito, respetivos juros e despesas, a sociedade mutuária constituiu hipoteca voluntária, em benefício da Exequente, sobre os seguintes imóveis: a. fração autónoma designada pela letra “B” descrita na Conservatória do Registo Predial do Porto sob o n.º .............-B e inscrita na matriz predial urbana sob o art. .......-B; b. fração autónoma designada pela letra “C” descrita na Conservatória do Registo Predial do Porto sob o n.º .............-C e inscrita na matriz predial urbana sob o art. .......-C; c. fração autónoma designada pela letra “F” descrita na Conservatória do Registo Predial do Porto sob o n.º .............-F e inscrita na matriz predial urbana sob o art. .......-F; d. fração autónoma designada pela letra “G” descrita na Conservatória do Registo Predial do Porto sob o n.º ..............G e inscrita na matriz predial urbana sob o art. .......-G; e. fração autónoma designada pela letra “L” descrita na Conservatória do Registo Predial do Porto sob o n.º ..............L e inscrita na matriz predial urbana sob o art. .......-L; f. fração autónoma designada pela letra “O” descrita na Conservatória do Registo Predial do Porto sob o n.º ..............O e inscrita na matriz predial urbana sob o art. .......-O; g. fração autónoma designada pela letra “P” descrita na Conservatória do Registo Predial do Porto sob o n.º .............-P e inscrita na matriz predial urbana sob o art. .......-P; h. fração autónoma designada pela letra “Q” descrita na Conservatória do Registo Predial do Porto sob o n.º .............-Q e inscrita na matriz predial urbana sob o art. .......-Q; i. fração autónoma designada pela letra “R” descrita na Conservatória do Registo Predial do Porto sob o n.º .............-R e inscrita na matriz predial urbana sob o art. .......-R; j. fração autónoma designada pela letra “S” descrita na Conservatória do Registo Predial do Porto sob o n.º .............-S e inscrita na matriz predial urbana sob o art. .......-S; k. fração autónoma designada pela letra “T” descrita na Conservatória do Registo Predial do Porto sob o n.º .............-T e inscrita na matriz predial urbana sob o art. .......-T; l. fração autónoma designada pela letra “U” descrita na Conservatória do Registo Predial do Porto sob o n.º .............-U e inscrita na matriz predial urbana sob o art. .......-U.

3. De entre tais imóveis, permanecem hipotecadas, à data da propositura da execução, as frações autónomas designadas pelas letras “C”, “F”, "Q", “R”, “S”, “T” e “U”, supra melhor identificadas.

4. A referida hipoteca foi registada a favor da CGD, ora Exequente, pela inscrição lavrada com base na Ap. 73 de 2008/08/06.

5. O prédio em causa é composto pelas frações e correspondentes permilagens: A. PERMILAGEM: 33; B. PERMILAGEM: 37; C. PERMILAGEM: 24; D. PERMILAGEM: 24; E. PERMILAGEM: 98; F. PERMILAGEM: 33; G. PERMILAGEM: 30; H. PERMILAGEM: 28; I. PERMILAGEM: 25; J. PERMILAGEM: 28; K. PERMILAGEM: 25; L. PERMILAGEM: 26; M. PERMILAGEM: 65; N. PERMILAGEM: 50; O. PERMILAGEM: 50; P. PERMILAGEM: 54; Q. PERMILAGEM: 85; R. PERMILAGEM: 71; S. PERMILAGEM: 71; T. PERMILAGEM: 70 e U. PERMILAGEM: 73;

6. A última prestação paga pela sociedade mutuária data de Setembro de 2011.

7. A aquisição da referida fração autónoma designada pela letra “F” mostra-se registada, por decisão judicial à MASSA INSOLVENTE DE "CONSTROMEGA-INVESTIMENTOS IMOBILIÁRIOS, LIMITADA, a favor do embargante, mediante a AP. 4976 de 2023/10/13, nos seguintes termos: «Decretada a execução específica do contrato promessa celebrado por escritura de 30/11/2012 e, em consequência, declarada transferida para a esfera jurídica do sujeito ativo a propriedade da presente fração autónoma.»

8. Por sentença proferida, nos autos de apenso T, do processo n.º 952/12.8TBEPS – Juiz 1 – Juízo de Comércio de Vila Nova de Famalicão, já transitada em julgado, veio a julgar-se parcialmente procedente a ação, instaurada pelo ora aqui Executado, consignando-se na sua parte decisória o seguinte: «a) – decreto a execução específica do contrato promessa celebrado por escritura de 30.11.2012 e, em consequência, declaro transferido para a esfera jurídica do A. AA a propriedade da fração autónoma, designada pela letra “F”, destinada a habitação, correspondente ao 1.° andar, do tipo T1, com um lugar de estacionamento na segunda cave e designados pela letra “F”, do Edifício ..., sito na Rua 1, freguesia de Paranhos, concelho do Porto, inscrito na matriz predial urbana sob o n.° ...39 e descrito na Primeira Conservatória do Registo Predial do Porto sob o n.° ............. . F, com aquisição provisória inscrita a favor da ora Insolvente pela Ap. 20 de 26.5.2008, convertida em definitiva pelo averbamento - Ap. 72 de 6.8.2008 da 1.ª Conservatória do Registo Predial do Porto; b) – a venda assim decretada é feita livre da apreensão para a insolvência cujo levantamento ordeno, mas mantém-se em pleno vigor a hipoteca registada a favor da Caixa Geral de Depósitos pela Ap. 73 de 6.8.2008, da Primeira Conservatória do Registo Predial do Porto; c) – Condeno a Insolvência de “Constromega – Investimentos Imobiliários, Lda.”, a entregar ao Autor o valor correspondente ao débito A sociedade mutuária "Constromega - Investimentos Imobiliários, Lda." foi declarada insolvente no âmbito do processo que, com o n.º 952/12.8TBEPS, corre atualmente termos no Tribunal Judicial da Comarca de Braga, Juízo de Comércio de Vila Nova de Famalicão, Juiz 1.».

9. A CGD aceitou distratar a hipoteca constituída a seu favor sobre cinco das doze frações autónomas abrangidas por aquela garantia, frações B, G, L, O, e P, contra o pagamento das quantias correspondentes aos valores da sua avaliação.

10. No dia 29 de Abril de 2024, Etapa Preponderante SA. apresentou um requerimento pedindo a sua habilitação como cessionária da exequente Caixa Geral de Depósitos, SA, em virtude de contrato celebrado em 6 de março de 2024.

11. Por sentença proferida no apenso A, no dia 19 de Junho de 2024, a sociedade Etapa Preponderante SA. foi habilitada como cessionária do crédito exequendo.

12. A execução de que estes autos dependem foi instaurada em 12 de Janeiro de 2024.

III – QUESTÕES JURÍDICAS ESSENCIAIS DE QUE CUMPRE CONHECER.

I – Divisibilidade da hipoteca. Embargos de executado. Determinação do valor pelo qual deverá prosseguir a execução. Aplicação do critério da permilagem por referência ao valor da dívida exequenda indicada no requerimento executivo.

Passemos à sua análise:

Diga-se, antes de mais, que embora nas suas contra-alegações o embargante executado alegue que “Tão pouco, aliás, a recorrente alega/invoca qualquer norma violada, em total inobservância do disposto no artigo 639º, nº 2, al. a) e b) do CPC, com o consequente incumprimento do ónus recursivo que se lhe impunha” (conclusão DD), afigura-se-nos que as conclusões apresentadas pela recorrente contêm no essencial, e de forma clara e inequívoca, a fundamentação jurídica que suporta suficientemente o seu argumentário, não exigindo o artigo 639º, nº 2, alíneas a) e b), do Código de Processo Civil qualquer outra especial especificação cuja falta motive, por si, o não conhecimento do recurso de revista.

O conhecimento da presente revista pressupõe, antes de mais, a definição clara e rigorosa do seu objecto.

Vejamos:

Instaurou o embargante os presentes embargos de executado com base nos seguintes fundamentos essenciais (na parte que ora releva):

- No requerimento executivo indicou a exequente como pedido exequendo a dívida de € 721.620,71 de capital, a que acrescem € 334.766,66 a título de juros respeitantes ao período que mediou entre 23 de Junho de 2018 e 23 de Junho de 2021 e € 106,18 de comissões.

- O embargante é demandado apenas enquanto proprietário da fracção autónoma designada pela letra “F”, não tendo sido interveniente no contrato de mútuo do qual resultou a dívida exequenda.

- A sua responsabilidade limita-se ao valor da hipoteca constituída em favor da embargada, tendo em conta a única fracção autónoma de que é proprietário (e não à totalidade da dívida exequenda ou à totalidade das fracções do prédio objecto dessa mesma garantia real).

- O exequente permitiu a divisibilidade da hipoteca em causa ao aceitar a venda, com emissão do respectivo título de distrate, de cinco das doze fracções hipotecadas.

- Assim sendo, a hipoteca permanece apenas como garantia do montante correspondente à permilagem das fracções não distratadas (sete, nas quais se inclui naturalmente a de que é titular o ora embargante).

Conclui pedindo que se julgue extinta a execução por se verificar a incerteza, inexigibilidade e iliquidez da obrigação exequenda.

Contestou a embargada, invocando essencialmente que a hipoteca nem sequer incide sobre a totalidade do prédio e que nunca renunciou à indivisibilidade da hipoteca.

Foi proferido despacho saneador-sentença em 1ª instância, datado de 11 de Outubro de 2024, onde se decidiu:

1º - A hipoteca foi constituída e registada não sobre a totalidade do prédio mas apenas sobre doze das vinte e uma fracções que o compõem, sendo certo que o terceiro adquirente do imóvel hipotecado, não sendo devedor da embargada, apenas pode ser executado por referência ao seu imóvel e pelo valor da garantia.

2º - Tendo a execução sido instaurada para cobrança do valor total de € 1.056.503,55 e encontrando-se apenas garantida por hipoteca constituída sobre sete das doze fracções, estas representam 427/1000 do total, correspondente à permilagem de 33 (tendo em conta o único imóvel que pertence ao embargante e por referência àquela mesma quantia exequenda).

3º - Assim sendo, a aplicação do critério da permilagem ao caso concreto (e face ao valor da execução) determina o valor de € 81.650,16, pelo qual deverá prosseguir a presente execução, acrescido dos juros de três anos sobre esse mesmo montante.

4º - Do que resultou, nestes precisos termos, a procedência parcial dos embargos de executado.

Veio o embargante/executado interpor recurso de apelação onde essencialmente referiu:

Tendo a hipoteca em causa incidido sobre doze fracções, a permilagem que se impõe é de 624/1000 (correspondente àquelas doze fracções hipotecadas) e não de 427/1000 (correspondente às sete fracções não distratadas), o que perfaz a quantia de € 55.872,78.

No acórdão recorrido, datado de 24 de Março de 2025, decidiu-se sobre esta temática:

1º - Na situação sub judice a hipoteca é divisível.

2º - O valor pelo qual responde o titular da fracção que permanece hipotecada deve ser apurado de entre as fracções ainda hipotecadas, ou seja, há que tomar em consideração como critério de cálculo o da proporcionalidade da permilagem da fracção entre as fracções da hipoteca global que permanecem registadas para garantia do crédito.

Todavia, nesse mesmo acórdão (tirado por maioria) entendeu-se “resultar pacificamente da decisão recorrida e dos elementos dos autos” existirem fracções que já responderam pela dívida, passando a ser menos (em número inferior a sete) as que permanecem a garantir a dívida.

Pelo que se concluiu que há que apurar o capital actual em dívida para depois prosseguir a execução para pagamento desse inferior capital garantido, acrescido dos juros de três anos sobre o montante a que se chegar.

Foi nesses exactos termos julgado parcialmente procedente o recurso de apelação.

Apenas a exequente/embargada apresentou recurso de revista junto deste Supremo Tribunal de Justiça, limitando-se o embargado/executado a apresentar contra-alegações, onde sustentou a confirmação do acórdão recorrido.

Vejamos, nesta sequência:

Encontra-se definitivamente assente e decidida a questão da divisibilidade da hipoteca.

(Sobre a temática da divisibilidade da hipoteca por renúncia ainda que tácita do credor vide o acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 11 de Março de 2021 (relator Rijo Ferreira), proferido no processo nº 2889/15.0T8OVR.A. P1.S1), e o acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 15 de Maio de 2024 (relator Pedro Lima Gonçalves), proferido no processo nº 1502/22.3T8PRT.A.P1.S1, publicados in www.dgsi.pt; Isabel Menéres Campos in “O Direito Português da Hipoteca”, publicado in Boletim Da Faculdade de Direito da Universidade de Coimbra, Volume LXXXV, Coimbra 2009, a páginas 733 a 734 e in “Indivisibilidade da Hipoteca”, publicado in “Cadernos de Direito Privado”, nº 9, Janeiro a Março de 2005, a páginas 12 a 22, em anotação ao acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 12 de Fevereiro de 2004, proferido no processo nº 2831/03; Rui Estrela de Oliveira in “A Renúncia Tácita do Credor à indivisibilidade da Hipoteca”, publicado in “Estudos de Direito do Consumidor”, “Faculdade de Direito da Universidade de Coimbra”, nº 17/2021, páginas 563 a 646).

Face à conformação do embargado/executado que não recorreu nessa parte, ainda que subordinadamente, para o Supremo Tribunal de Justiça, cumpre considerar também assente e definitivamente resolvido que o cálculo da permilagem é feito por referência ao conjunto das fracções não distratadas (sete) e não ao das fracções inicialmente objecto da constituição da hipoteca (doze).

Outrossim não discutiu o embargante/executado que o cálculo da permilagem se deveria fazer tendo por referência o valor da dívida indicado no requerimento executivo (concretamente no montante de € 1.056.503,55), nunca aventando, neste tocante, hipótese diversa.

Neste contexto, não encontramos fundamento para tomada em consideração (com vista à aplicação da regra da permilagem) no acórdão recorrido do (eventual) superveniente distrate de outras fracções do mencionado grupo de sete (tornando-o menor).

Desde logo, na medida em que se trata de matéria que não foi alegada nem discutida em parte alguma do processo pelas partes, mormente pelo embargado executado.

Neste tocante, a sua impugnação incidiu exclusivamente sobre o método cálculo da permilagem em apreço (sobre sete fracções – não distratadas – ou sobre doze – inicialmente objecto da garantia real).

Tal questão encontra-se neste momento, como se disse, definitivamente ultrapassada, tendo-se constituído quanto a ela caso julgado.

Cumpre salientar igualmente que a tomada em conta desses eventuais e novos distrates não encontra o menor reflexo nos factos que foram dados como provados.

Rigorosamente coisa alguma é referida nesse âmbito que permitisse conhecer este novo elemento de facto, trazido a juízo a pretexto e com base em referências e conhecimentos (algo nebulosos, diga-se) que se desconhece como foram encontrados.

Por ler-se no acórdão recorrido:

“O valor em dívida actualmente – que não será certamente o constante do requerimento executivo (porque, entretanto, pelo menos, duas frações – a “C” e a “R” – já responderam pelo crédito da ora exequente) será considerado tendo em conta a proporcionalidade da permilagem da fração “T” (70) entre as frações que permanecem registadas para garantia deste crédito (sabendo nós que as frações “C” e “R”, mencionadas no acórdão referido, e tidas em conta na proporção aí mencionada – ... – se não acham já hipotecadas)”.

Ora, esta factualidade trazida para o processo oficiosamente pelo julgador não integra – como se salientou supra – a causa de pedir que fundamenta os presentes embargos de executado, extrapolando-a necessariamente e ofendendo este tipo de actuação processual, por isso mesmo, o basilar princípio do dispositivo.

Conforme resulta do artigo 5º, nº 1 e 608º, nº 2, do Código de Processo Civil, o juiz não pode ocupar-se senão das questões suscitadas pelas partes, não se verificando in casu a ressalva de natureza excepcional constante do segmento final deste último normativo.

(vide neste tocante José Lebre de Freitas e Isabel Alexandre in “Código de Processo Civil Anotado”, Volume 1º, 4ª edição, Almedina Janeiro 2021 a página 37 e Volume II, 4ª edição, Almedina Fevereiro de 2019 a páginas 211 a 212; referem a este propósito Abrantes Geraldes, Paulo Pimenta e Luís Pires de Sousa in “Código de Processo Civil Anotado., Volume1º. Processo Geral de Declaração. Artigos 1º a 702º””, 2ª edição, Almedina Fevereiro de 2020, a página 505: “No que tange aos factos que o juiz conheça em virtude do exercício das suas funções, constitui condição de utilização no concreto processo a demonstração, por via documental, o que na prática significa que o juiz deve ordenar oficiosamente a junção da certidão atinente” o que na situação sub judice não foi manifestamente observado).

De resto, nem sequer a este propósito foi devidamente cumprido o princípio do contraditório genericamente previsto no artigo 3º, nº 3, do Código de Processo Civil (nenhuma das partes foi oportunamente confrontada com a inesperada possibilidade de o tribunal entender, com base no seu dito conhecimento funcional, que o número de fracções não distratadas era afinal menor daquele que consta no requerimento inicial e em todas as subsequentes peças processuais).

Conforme magistralmente refere o Professor José Alberto dos Reis in “Código de Processo Civil Anotado”, Volume V, Coimbra Editora, 3ª edição, a página 51:

“(…) o princípio do dispositivo é, substancialmente, a projecção, no campo processual, daquela autonomia privada que, dentro dos limites marcados pela lei, encontra a sua afirmação mais enérgica na figura tradicional do direito subjectivo; até onde a lei substancial reconhecer tal autonomia, mesmo para a coordenar melhor com os fins colectivos, o princípio dispositivo deverá ser coerentemente mantido no processo civil, como expressão irrefragável do poder atribuído aos particulares, de dispor da sua esfera jurídica própria”.

Conservaram-se, por isso, no Código Civil, como afirmações de princípio, os aforismos da sabedoria antiga: ne procedat judex ex officio, ne eat judex ultra petita partium, judex secundum allegata et prabata decidere debet.

Suprimir estes princípios equivaleria a reformar, mais do que o processo, o próprio direito privado; dar ao juiz o poder de iniciar ex officio um pleito que os interessados querem evitar, ou de conhecer de factos que as partes não alegaram, significaria cercear, no campo do direito processual, aquela autonomia individual que, no campo do direito substancial, a lei vigente reconhece e garante”.

(Sobre este ponto – isto é, não existir cabimento nos poderes de cognição das instâncias para o aditamento de factos essenciais não alegados e ainda que os mesmos pudessem resultar da instrução da causa -, vide o acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 18 de Abril de 2023 (relatora Graça Amaral), proferido no processo nº 1205/19.6T8VCD.P1.S1, publicado in www.dgsi.pt; acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 16 de Janeiro de 2025 (relator Emídio Santos), proferido no processo nº 4338/17.0T8LSB-A.L1.S1, publicado in www.dgsi.pt; acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 17 de Setembro de 2024 (relator Nelson Borges Carneiro), proferido no processo nº 1613/21.2T8PNF.P1.S1, publicado in www.dgsi.pt; o acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 28 de Maio de 2025 (relator Fernando Baptista), proferido no processo nº 985/19.3T8AVR.P1.S1, não publicado).

Acresce ainda que relativamente à introdução em juízo de factos supervenientes (parecendo porventura tratar-se desse tipo de factualidade a que o acórdão do Tribunal da Relação, de muitíssimo forma vaga e imprecisa, se refere) a sua atendibilidade depende sempre e em qualquer circunstância da sua alegação em momento anterior ao encerramento da discussão da causa, conforme expressamente resulta do disposto nos artigos 588º e 589º do Código de Processo Civil, o que manifestamente não ocorreu.

(Sobre este ponto, vide José Lebre de Freitas e Isabel Alexandre in “Código de Processo Civil Anotado”, Volume II, 4ª edição, Almedina Fevereiro de 2019, a páginas 612 a 617).

Nestas concretas circunstâncias a lei não permite, portanto, que se tenham em conta, para cálculo da permilagem da fracção do titular que agora é executado, novos e sucessivos (e relativamente incertos) distrates invocados pelo primeira vez e oficiosamente no acórdão do Tribunal da Relação, desprovidos de base documental e que, sem nenhuma possibilidade de contraditório, iriam injustificadamente desproteger o credor hipotecário e gerar mesmo inopinadamente a própria incerteza e iliquidez do título executivo colocando assim em crise a subsistência da própria instância executiva (deixam de subsistir neste contexto elementos documentais idóneos para configurar a exacta e exigível expressão pecuniária da quantia exequenda).

Conforme se afirma no acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 15 de Maio de 2024 (relator Pedro Lima Gonçalves), proferido no processo nº 1502/22.3T8PRT.A-P1.S1, publicado in www.dgsi.pt, no qual, diferentemente do que sucedeu no acórdão recorrido, e em relação a situação de facto análoga à presente, se reportou o crédito exequendo à quantia indicada pela exequente no requerimento inicial e às sete fracções objecto da hipoteca à data da instauração da acção executiva:

“(…) se é certo que o devedor não deve ser responsabilizado pela totalidade da dívida em cenário de divisibilidade da hipoteca, é também evidente que não é possível defender a degradação da função da garantia inerente à hipoteca, que não pode ficar em causa”.

Pelo que se concede provimento à revista, revogando-se o acórdão recorrido e repristinando a decisão de 1ª instância.

IV – DECISÃO

Pelo exposto, acordam os juízes do Supremo Tribunal de Justiça (6ª Secção - Cível) conceder provimento à revista da embargada/exequente, revogando o acórdão recorrido e repristinando a sentença de 1ª instância.

Custas pelo recorrido.

Lisboa, 7 de Outubro de 2025.

Luís Espírito Santo (Relator)

Cristina Coelho

Luís Correia de Mendonça

V – Sumário elaborado pelo relator nos termos do artigo 663º, nº 7, do Código de Processo Civil.