Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça
Processo:
14217/02.0TDLSB.S1
Nº Convencional: 5ª SECÇÃO
Relator: RODRIGUES DA COSTA
Descritores: BURLA
FUNCIONÁRIO
PENA ACESSÓRIA
PROIBIÇÃO DO EXERCÍCIO DE FUNÇÃO
Nº do Documento: SJ
Apenso:
Data do Acordão: 05/27/2010
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: N
Privacidade: 1
Meio Processual: RECURSO PENAL - CONFERÊNCIA
Decisão: PROVIDO
Doutrina: - Figueiredo Dias, Direito Penal Português – As Consequências Jurídicas Do Crime, págs. 168, 167 e 178 e ss.
- Maia Gonçalves, Código Penal Português, 18ª edição, pág. 256.
- Simas Santos e Leal Henriques, Código Penal Anotado, Editora Rei dos Livros.
Legislação Nacional: ESTATUTO DO MINISTÉRIO PÚBLICO, APROVADO PELA LEI N.º 47/86, DE 15/10, ALTERADA PELAS LEIS N.ºS 2/90, DE 20/01, 23/92, DE 20/08, 33-A/96, DE 26/08, 60/98, DE 27/08, 42/2005, DE 29/8, 67/2007, DE 31/12 E 52/2008, DE 28/08.
CÓDIGO DE PROCESSO PENAL (CPP): - ARTIGO 53.º.
CÓDIGO PENAL (CP): - ARTIGOS 66.º, N.º 1, E 68.º, N.º2.
Sumário :

I - Nos termos do art. 66.º, n.º 1, do CP, são dois os pressupostos exigidos para a aplicação da pena acessória de proibição do exercício de função, um de natureza formal e outro de natureza material. O primeiro diz respeito à condenação numa determinada pena: 3 anos de prisão. O segundo relaciona-se com a conexão do crime praticado com as funções exercidas, ou por o crime ter sido cometido com flagrante e grave abuso da função ou com manifesta e grave violação dos deveres que lhe são inerentes − al. a) −, ou por o crime praticado, apesar de cometido fora da função, revelar indignidade no exercício do cargo, ou implicar a perda da confiança necessária ao exercício da função − als. b) e c).
II - Está preenchido este pressuposto formal quando, num concurso de crimes, pelo menos um dos crimes foi punido com pena de prisão superior a 3 anos.
III - A arguida deve ser punida com a pena acessória de proibição do exercício das funções quando a sua actuação afectou de forma grave os fundamentos em que assenta o exercício da função que desempenhava de alta funcionária de uma instituição que tem como objectivos a promoção e defesa da legalidade democrática, o exercício da acção penal, o que implica o recebimento de denúncias, queixas e participações, a instauração do competente procedimento criminal em caso de ocorrência de crime, a investigação e a subordinação dos responsáveis a julgamento, mediante a dedução de acusação contra os infractores e a sua sustentação em juízo, como decorre do Estatuto do MP.
IV - Acresce que usou da função e do prestígio inerente, bem como da confiança que o cargo inspirava nas pessoas que ela contactava, para conseguir obter diversas vantagens ilícitas, não se coibindo de praticar os crimes de burla por que foi condenada, ainda que se considere que o uso do cargo não fez parte do processo fraudulento.

Decisão Texto Integral:


I. RELATÓRIO
1. No âmbito do Processo Comum Colectivo que, sob o n.º 14217/02.0TDLSB, correu termos pela 2.ª Vara Criminal de Lisboa, foi julgada, juntamente com outra, a arguida AA, identificada nos autos, e condenada por Acórdão de 29-03-2008 decidindo:
- pela prática de um crime de burla qualificada continuada, p. e p. pelos arts. 30º/2, 217º e 218º/2, a), do Código Penal (CP), na pena de 4 (quatro) ano e 6 (seis) meses de prisão – ofendido “B.P.S.M.” (Banco Pinto & Sotto Mayor);
- pela prática de um crime de burla qualificada continuada, p. e p. pelos arts. 30º/2, 217º e 218º/2, a), C.P., na pena de 4 (quatro) anos e 6 (seis) meses de prisão – ofendido “B.C.P.” (Banco Comercial Português);
- pela prática de um crime de burla qualificada p. e p. pelos arts. 217º e 218º/2, a), C.P., na pena de 5 (cinco) anos de prisão – ofendido “Banco Mello”;
- pela prática de um crime de burla qualificada continuada, p. e p. pelos arts. 217º e 218º/2, a), na pena de 5 (cinco) anos de prisão – “B.P.N.” (Banco Português de Negócios);
- pela prática de um crime de burla qualificada, p. e p. pelos arts. 217º e 218º/2, a), C.P., na pena de 5 (cinco) anos de prisão – ofendido “B.E.S.” (Banco Espírito Santo);
- pela prática de emissão de cheque sem provisão, p. e p. pelo art. 11º/1, a) e “in fine”, CPP – por convolação (ofendido BB) – na pena de 3 (três) anos de prisão;
- pela prática de um crime de burla qualificada, p. e p. pelos arts. 217º e 218º/2, a), C.P., na pena de 3 (três) anos e 6 (seis) meses de prisão – ofendido CC;
- pela prática de um crime de burla qualificada, p. e p. pelos arts. 217º e 218º/2, a), C.P., na pena de 4 (quatro) anos e 6 (seis) meses de prisão – ofendido DD;
- pela prática de um crime de burla qualificada, p. e p. pelos arts. 217º e 218º/2, a), C.P., na pena de 3 (três) anos de prisão – ofendido EE;
- pela prática de um crime de burla qualificada, p. e p. pelos arts. 217º e 218º/2, a), C.P., na pena de 3 (três) anos de prisão – ofendido FF;
- pela prática de um crime de burla qualificada tentada, p. e p. pelos arts. 22º, 217º e 218º/1, a), C.P., na pena de 2 (dois) anos e 6 (seis) meses de prisão – ofendido GG;
- pela prática de um crime de falsificação p. e p. pelo art. 256º/1, a), C.P., na pena de 1 (um) ano de prisão – contrato-promessa com DD;
- pela prática de um crime de falsificação, p. e p. pelo art. 256º/1, a), CP, na pena de 1 (um) ano e 6 (seis) meses de prisão – contrato de cessão de exploração das “Casas do P...” à “B...”;
- pela prática de 1 (um) crime de insolvência dolosa p. e p. pelo art. 227º/1, C.P. na pena de 1 (um) ano e 6 (seis) meses de prisão.
Em cúmulo jurídico, foi a arguida condenada na pena única de 10 (dez) anos de prisão.
Foi ainda proibida do exercício de qualquer cargo na Função Pública, pelo prazo de 5 (cinco) anos, após cumprimento de pena.

2. Inconformada com o assim decidido, a arguida AA interpôs recurso para o Tribunal da Relação de Lisboa.

3. Por acórdão de 21-05-2009, proferido pelos Juízes da 3.ª Secção do referido tribunal foi decidido:
- rectificar a decisão recorrida, passando a al. a) a fls. 162 da mesma (fls. 7202 dos autos) a ter a seguinte redacção:
É ainda AA condenada no pagamento de 270.000 (duzentos e setenta mil) dólares americanos a BB, com juros legais à taxa legal geral, desde 14 de Janeiro de 2000 até integral pagamento.
- alterar a mesma decisão quanto à matéria de facto provada nos pontos 19, 26, 31, 54, 78, 113, 114, 118, 142, 143, 164, 165, 170, 173, 174, 177, 451, 462, 463 e 464
- absolver a arguida da prática dos cinco crimes de burla qualificada em que foi condenada, relativamente aos Bancos: B.P.S.M., B.C.P., Banco Mello, B.P.N. e B.E.S., revogando, assim, nessa parte, a decisão recorrida.
- absolver a referida arguida da prática do crime de burla qualificada na forma tentada em que foi condenada, relativamente a GG, revogando, também nessa parte, a decisão recorrida.
- declarar extinta a responsabilidade criminal no que se refere ao crime de burla de que era vítima FF, dele absolvendo a arguida.
- confirmar a decisão recorrida na parte em que condenou a arguida pelas restantes crimes, ou seja:
3 anos de prisão, pela prática do crime de emissão de cheque sem provisão;
3 anos e 6 meses de prisão, pela prática do crime de burla qualificada em que foi vítima CC;
4 anos e 6 meses de prisão, pela prática do crime de burla qualificada em que foi vítima DD;
3 anos de prisão, pela prática do crime de burla qualificada em que foi vítima EE;
1 ano de prisão, pela prática do crime de falsificação relativamente ao contrato-promessa;
1 ano e 6 meses de prisão, pela prática do crime de falsificação relativamente ao contrato com a B...;
1 ano e 6 meses de prisão, pela prática do crime de insolvência dolosa.
- condenar a referida arguida na pena única de 6 (seis) anos de prisão.
- revogar a decisão recorrida na parte em que aplicou a pena acessória de proibição de exercício de qualquer cargo na função pública, pelo período de 5 anos.

4. Inconformado com esta decisão, o Ministério Público interpôs recurso para o STJ, concluindo a sua motivação da forma seguinte, na parte que interessa:

(…)
5. Da factualidade dada como provada na decisão de 1ª instancia, confirmada pelo acórdão do TRL, consta, designadamente, que no ano de 2009, desempenhando a arguida AA funções de Secretária da P6R, em dia de sessão do "Conselho Superior do M°P°" dirigiu-se a HH, membro do referido Conselho, referindo-lhe estar com problemas financeiros, mas passageiros, pedindo-lhe que a apresentasse ao Eng.° II.
Este, em face das funções desempenhadas pela arguida e por que a mesma lhe fora apresentada pelo seu amigo HH, membro do “CSM°P°", acreditou na sua solvabilidade e decidiu ajudá-la, entregando-lhe 270 000 USD, montante que a arguida AA jamais pagou.
A arguida invocou exercer funções na PGR junto de CC e DD, os quais confiando na seriedade e solvabilidade da arguida, entregaram-lhe 45.000.000§00 e 30.000.000§, respectivamente, montantes que a arguida jamais devolveu.
A arguida decidiu continuar a fazer valer os seus conhecimentos profissionais, decorrentes do seu exercício de funções na PGR, com a consequente facilidade em proporcionar contactos e agilizar decisões, mesmo em sede de processos pendentes nos tribunais.
Assim, apresentou-se perante EE como sendo funcionária da PGR, gerando em EE uma grande confiança nos negócios que eventualmente viesse a celebrar e em que a arguida AA fosse interveniente.
A arguida aludiu ao mesmo conhecer Magistrados do M°P° no IGAT e no Tribunal da Relação de Lisboa, pretextando inteirar-se do andamento de processos judiciais referentes a EE.
6. Como se aludiu, a arguida AA invocou perante os citados ofendidos a sua qualidade de funcionária técnica superior na PGR e de que conhecia Magistrados do M°P° junto do IGAT e do Tribunal da Relação de Lisboa, podendo obter informações sobre estado de processos, invocações essas que levaram tais ofendidos, perante a seriedade e prestígio da instituição onde a arguida exercia funções, a entregar-lhe avultadas quantias monetárias - 54.000.000§00, 45.000.000S00 e 30.000.000S00 e € 52.373,78-, confiando na seriedade e solvabilidade da mesma.
7. Fundamentou o acórdão do TRL a decisão de revogação da pena acessória prevista no art. 66° n°l do CP, pela qual tinha sido condenada em 1ª instância, nos seguintes moldes, a fls. 183/184 do acórdão:
" C.)
"Quanto à invocação da qualidade profissional, já se referiu que a mesma não foi relevante para a qualificação jurídica dos factos praticados pela arguida (....)
"Certamente que o comportamento da arguida tem relevância para efeitos disciplinares (...), mas, não sendo a arguida punida a este título, repete-se, não há fundamento legal para, por esta via, lhe ser aplicada qualquer pena.
"Por outro lado, nenhum dos crimes foi praticado no exercício da actividade para que foi nomeada.
"Como refere Maia Gonçalves, CP português, 18ª edição, anotação ao art. 66°, "Para que a proibição do exercício da função, profissão ou actividade seja decretada no processo penal ao abrigo das disposições deste artigo é necessária a verificação do pressuposto geral do corpo do n°l e ainda, o condicionalismo de alguma das alíneas deste número."
"Assim sendo, não deve ser mantida a pena acessória que foi aplicada á arguida."
8 .Porém, salvo o devido respeito, os pressupostos formais contidos no art. 66° n°l do CP encontram-se preenchidos: a arguida AA é funcionária pública, e foi concretamente punida com pena de prisão superior a 3 anos.
Conforme ensinamento do prof. Figueiredo Dias, em Direito Penal Português, Consequências do Crime, 2005, fls. 167, pondera o mesmo se , para integrar o pressuposto formal em análise, vale a pena conjunta (ou pena do concurso) ou cada uma das penas parcelares.
Admite o citado Professor que "dada a conexão da pena com o crime, através da exigência de um pressuposto material específico, deve em último termo exigir-se que ao menos um dos crimes em concurso tenha sido punido com pena de prisão superior a 2 anos" [na redacção vigente do art. 66° CP, de 3 anos]."
Ora a arguida AA foi condenada na pena única de 6 anos de prisão, tendo sido condenada na pena parcelar de 4 anos e 6 meses de prisão pelo crime de burla em que é ofendido CC, e na pena parcelar de 3 anos e 6 meses de prisão pelo crime de burla em que é ofendido DD.
Relativamente ao preenchimento dos pressupostos materiais alusivos ao art. 66° n°l do CP, citando de novo Figueiredo Dias, "o denominador comum dos pressupostos materiais da demissão" [previsto na redacção do CP de 1982] "não reside mais numa concepção sintomática" em que o crime e a sua gravidade constituem índice da inadequação do agente ao exercício da função.
Esse denominador comum reside na ideia base de que, concomitantemente com o crime, foram gravemente violados deveres relativos a um correcto exercício daquela função, ou foi posto severamente em causa o respeito e a confiança requeridos pelo exercício daquele cargo.
De forma aproximativa poderá talvez dizer-se que a violação justificativa da pena acessória tem de ser vista não apenas do lado do crime cometido - esse sancionado com a pena principal - mas também do reflexo que este produz sobre a função que o agente exerce, e isto ainda mesmo quando a lei apela à "indignidade do agente ou à "perda de confiança" para o exercício do cargo".
9 . Embora os crimes praticados pela arguida AA não tenham uma relação directa com a qualidade de funcionária pública da arguida, afigura-se inquestionável que a actividade delituosa da arguida ocorreu mediante invocação dessa qualidade funcional.
Tendo sido considerado provado que a invocação da qualidade de funcionária, técnica superior da Procuradoria Geral da República, foi relevante para a actividade delituosa prosseguida , não poderá deixar de se entender que os factos foram praticados no exercício da actividade para a qual arguida fora nomeada.
10. A actividade delituosa da arguida na prática dos referidos crimes é demonstrativa de conduta imprópria e absolutamente inadequada ao prestígio e elevação que o exercício do cargo de Secretária da Procuradoria Geral da República e de técnica superior lhe impunha.
Com a conduta descrita a arguida demonstrou não ter capacidade para o exercício de funções públicas por revelar inexistência de condições de dignidade, probidade e confiança que tais funções públicas exigem.
11. Pelo exposto, em face da factualidade apurada no atinente aos crimes pelos quais a arguida foi condenada, vindo a ser-lhe aplicada, com pena principal, de concurso, 6 anos de prisão, propugna-se pela condenação da arguida na pena acessória de proibição de exercício de cargo na Função Pública, nos termos do art. 66° n°l -b) do CP/revisto, nessa parte se revogando o decidido no acórdão do TRL”.

5. O assistente CC acompanhou o Ministério Público na sua pretensão de ver restabelecida a pena acessória de proibição de exercício de cargos públicos e a arguida, por seu turno, referiu ter sido condenada na pena de demissão da função pública, em processo disciplinar.
A Senhora Procuradora-Geral Adjunta neste Tribunal acompanhou igualmente a pretensão da sua colega no Tribunal da Relação de Lisboa.

6. Colhidos os vistos em simultâneo, teve lugar a conferência, a fim de se decidir da questão colocada no recurso do Ministério Público.

II. FUNDAMENTAÇÃO
7. Matéria de facto apurada
7.1. Factos dados como provados:
“1) AA iniciou funções na Procuradoria – Geral da República, em 17 de Outubro de 1980, em regime de comissão de serviço, na qualidade de Secretária do Sr. Procurador – Geral da República, funções essas que desempenhou até 14 de Setembro de 1982.
2) A partir de 15 de Setembro de 1982 a arguida passou a desenvolver as funções de Secretária da Procuradoria – Geral da República, igualmente em regime de comissão de serviço, sucessivamente renovada até ao dia 5 de Dezembro de 1999, data em que cessou essas mesmas funções.
3) No âmbito dessa sua actividade, competia-lhe super-intender nos serviços da Secretaria da Procuradoria Geral da República e, nomeadamente fiscalizar o funcionamento dos serviços e assegurar o secretariado do Conselho Superior do Ministério Público e do Conselho Consultivo, da referida Procuradoria e do Ministério Público.
4) Na prática tais funções correspondiam às de um Secretário Geral, com acesso e capacidade de decisão sobre o circuito de papéis relativos à Secretaria e poder hierárquico sobre os restantes funcionários, sendo um lugar de confiança e respondendo directamente perante o Sr. Procurador Geral da República.
5) Assessorava também o respectivo Gabinete.
6) A partir de 6 de Dezembro de 1999 a arguida passou a exercer funções como Assessora principal da carreira técnica superior, ainda na Procuradoria – Geral da República, categoria que mantém até hoje.
7) Com efeito, nessa altura o Senhor Procurador Geral da República, Dr. Cunha Rodrigues, teve conhecimento de que a arguida tinha algumas dívidas, que associava a um problema de partilha de heranças e desconhecendo também que a actuação da arguida pudesse ter contornos criminais.
8) O que aliás era ocultado pela arguida, junto do próprio marido.
9) E por isso a retirou de um cargo de direcção, para um outro de assessoria.
10) Por seu turno, JJ tem a categoria de Técnica Superior Principal do quadro de pessoal dos Serviços de Apoio Técnico e Administrativo da Procuradoria – Geral da República, desempenhando desde 1 de Janeiro de 2000, as funções de coordenadora da Unidade de Administração e Processos.
11) No exercício dessas funções, competia a JJ, além do mais, receber e encaminhar todo o expediente entrado na Procuradoria – Geral da República, competindo-lhe classificar e autuar o mesmo, inclusivé, sob a forma dos designados processos confidenciais e garantir a sua movimentação, fazendo-o sujeitar a despacho.
12) Fazia parte da carreira técnica administrativa, trabalhando também na parte administrativa das extradições e concursos públicos.
13) Ambas as arguidas mantinham entre si, pelos menos até ao ano de 2004, uma estreita relação de amizade, sendo além do mais, a arguida AA superior hierárquica da arguida JJ, na estrutura orgânica e funcional da Procuradoria – Geral da República.
14) A arguida AA descende de uma família conhecida da Golegã, com várias propriedades e ligada à criação de cavalos com ferro próprio e conhecido nas lides equestres – o ferro “V...M...”.
15) De porte altivo e senhorial, nela admirava a arguida JJ a educação, gostos e posses materiais.
16) Porém, esta não visitava a casa daquela, sendo que sempre tratava a arguida AA por “Sr.ª Dr.ª”.
17) Tudo fazia para a ajudar e à mesma agradar, sendo a relação de amizade mas “formal”, com alguma subalternidade da arguida JJ.
18) A arguida LL é, pelo menos desde o ano de 2000, Advogada da arguida AA .
19) Conforme adiante se especificará, a arguida AA havia assumido, entre 1995 e 1999, encargos financeiros com o pagamento de vários empréstimos que então contraiu, com a finalidade de, à excepção do referente à C.G.D., adquirir a Quinta das O... (parte do referente ao B.P.S.M.) e de realizar obras e adquirir mobiliário para a mesma(1).
20) Porém, pelo menos desde finais do ano de 1995, que a arguida AA deixou de fazer face aos compromissos financeiros por si assumidos perante terceiros.
21) Na verdade, nos anos de 1996, 1997, 1998, e 1999 a arguida auferiu anualmente, a título de remuneração líquida pelas funções por si exercidas junto da Procuradoria – Geral da República, os montantes de 6.367.200$00 (€31.759,46), 6.557.600$00 (€32.709,17), 6.738.200$00 (€33.610) e 7.791.520$00 (€38.764,18), respectivamente.
22) A que correspondiam, nomeadamente os ordenados mensais de 2 055.69€ (dois mil e cinquenta e cinco euros e sessenta e nove cêntimos)/mês enquanto era Secretária e 986.49€ (novecentos e oitenta e seis euros e quarenta e nove cêntimos) enquanto Assessora, a partir de 1 999, descendo pois de ordenado.
23) No entanto, tais montantes não eram suficientes para a arguida manter o estatuto financeiro que pretendia.
24) Assim é que, em 1 997 compra à herança em que era interessada, um imóvel com parte rústica e urbana, por 120 000 000$00 (cento e vinte milhões de escudos) – denominado “Quinta das O...” e onde veio a criar o empreendimento de turismo rural “Casas do P...”.
25) Sendo que já antes da compra perspectivava vendê-lo à “A.N.T.E.” (“Associação Nacional de Turismo Equestre”), para um projecto denominado “L...”, ligado à criação do cavalo lusitano, na Golegã.
26) (2)
27) Venda que porém se gorou, por a “A.N.T.E.” não ter conseguido angariar o dinheiro necessário à compra.
28) Registando-se porém que a arguida se lançou a efectuar tal compra, logo recorrendo na íntegra ao crédito bancário.
29) Sendo que, em avaliação encomendada pela arguida a particular, Sr. Eng.º MM, a referida “Quinta das O...” tinha sido avaliada, nos seguintes montantes:
- em 1 992 – 170 000 000$00 (cento e setenta milhões de escudos);
- em 1 997 – 275 000 000$00 (duzentos e setenta e cinco milhões de escudos);
- em 2 000 – 380 000 000$00 (trezentos e oitenta milhões de escudos).
30) O que corresponde sensivelmente ao seu valor, notando-se porém que pela sua especificidade e valor (“turismo rural ligado ao cavalo, na Golegã”) a sua alienação pode demorar, sendo pois de difícil retorno em termos de liquidez.
31) Devendo também referir-se que permaneciam indivisos os patrimónios dos Avós maternos e pai da arguida AA, sendo este último a dividir por 4 interessados, tendo pelos herdeiros sido calculado o quinhão hereditário da mesma, em 67 353 750$00 (sessenta e sete milhões, trezentos e cinquenta e três mil, setecentos e cinquenta escudos). (3)
32) A arguida quis, de forma quase obsessiva, transformar as “Casas do P...” num hotel de “charme” rural e ligado ao cavalo.
33) Não hesitando para isso em criar dívidas, que se iam acumulando de forma desproporcionada às suas possibilidades, como adiante se descreverá.
34) E recorrendo sempre a empréstimos, primeiro junto de bancos e, quando isso já não era possível, junto de particulares.
35) Referindo sempre:
- que esperava receber herança de família, que ainda hoje não está partilhada;
- que pertencia a uma família abastada;
- que era Secretária da “Procuradoria Geral da República”.
36) Mais, omitia os anteriores empréstimos bem como o montante global da dívida.
37) Aparecendo como solvente e desenvolta, mesmo após já ter sido declarada falida por sentença judicial.
38) Dizendo que passava por dificuldades pontuais e passageiras.
39) Junto dos bancos, dando sempre como garantia a “Quinta das O...”, não através do registo de hipoteca, mas por procuração com poderes especiais para constituir hipoteca.
40) Podendo assim dar de garantia de pagamento aos diversos bancos o mesmo bem, sem que os mesmos soubessem que o mesmo já garantia outros empréstimos.
41) O que propositadamente omitia.
42) Pedindo dinheiro, à medida que ia fazendo aquisições/obras nas “Casas do P...” ou tinha contas para pagar.
43) Tomando como possível que nunca as pagaria e com isso se conformando, como de seguida se descreverá e no que se refere aos Bancos.
45) Já em 12 de Julho de 1994, a arguida AA havia celebrado com a então designada “M... – Sociedade Financeira para Aquisições a Crédito, S.A.”, o contrato de financiamento de aquisições a crédito nº 1300, para financiamento de obras na habitação, no valor de 1.500.000$00 (€7.481,97), o qual deveria ser pago em 36 prestações mensais de 54.984$00 (€274,26) .
46) Tal crédito foi pela arguida destinado ao consumo.
47) No cumprimento desse contrato de financiamento, nos dias imediatamente seguintes à celebração do mesmo, a “M..., S.A.” depositou na conta da arguida nº ... da Caixa Geral de Depósitos, agência do Largo do Rato, o referido montante de 1.500.000$00 (€7.481,97).
48) Para garantia das obrigações emergentes desse contrato, a arguida entregou uma livrança por si assinada bem como um pacto de preenchimento.
48) Em 12 de Novembro de 1995, aquando do vencimento da 16ª prestação do contrato, a arguida deixou de efectuar qualquer pagamento por conta do contrato de financiamento celebrado com a “M..., S.A.”.
49) Em face do não pagamento da dívida, em 18 de Maio de 1998, a “M..., S.A.” intentou contra a arguida uma acção executiva para pagamento de quantia certa, que correu seus termos sob o Processo Ordinário nº 447/98, junto da 4ª Vara Cível de Lisboa, tendo como título executivo a livrança assinada pela arguida e preenchida pelo montante de 1.168.503$00 (€5.828,47).
50) Igualmente em data não concretamente determinada, mas necessariamente anterior a 26 de Junho de 1996 mas sempre no primeiro semestre deste ano, ou seja, quando já se encontrava em incumprimento perante a “M..., S.A.”, a arguida AA solicitou junto da Caixa Geral de Depósitos um crédito ao consumo no valor de 10.000.000$00 (€49.879,79).
51) Para garantia do pagamento de tal quantia a arguida indicou como fiadora, a sua mãe, NN.
52) Encontrando-se reunidas todas as condições entendidas por suficientes pela Caixa Geral de Depósitos para a concessão do crédito, no dia 26 de Junho de 1996, foi celebrado entre esta instituição de crédito e a arguida AA um contrato de mútuo nos termos do qual a primeira concedeu à segunda o montante de 10.000.000$00 (€49.879,79), a pagar em 36 prestações mensais.
53) Nessa data, o montante de 10.000.000$00 (€49.879,79) foi, assim, creditado na conta nº ... da Caixa Geral de Depósitos, titulada pela arguida.
54) Em 27 de Dezembro de 2000 a arguida ainda tinha em dívida para com a Caixa Geral de Depósitos o montante de 2.287.806$00. (4)
55) A partir de 1997 e dada a aquisição da “Quinta das O...”, a arguida passou a abordar sucessivas instituições financeiras, solicitando financiamentos dos montantes que a seguir se descrevem, que na sua maioria foram gastos na aquisição da “Quinta das O...”, na realização de obras na mesma e na compra de mobiliário, para a mesma.
56) Assim , em 27 de Maio de 1997, através de carta remetida ao Dr. OO da Companhia de Seguros Mundial Confiança a arguida solicitou a esta entidade, a concessão de um crédito num montante não inferior a 160.000.000$00 (€798.076,64), destinado à aquisição do prédio urbano sito na Rua do Tinoco, Golegã, descrito na Conservatória do Registo Predial da Golegã sob o nº 02208/970619 e inscrito na matriz sob o artigo nº 689 e o prédio urbano sito na Rua Rafael da Cunha, Golegã, descrito na Conservatória do Registo Predial da Golegã sob o nº ... e inscrito na matriz sob o artigo 1392, os quais constituem a denominada “Quinta das O...”.
57) Imóvel que, como se disse, estava integrado no acervo hereditário pendente de partilha com os seus irmãos e com a sua mãe.
58) Nesse pedido a arguida AA invocou que já havia procedido à assinatura do contrato-promessa de compra e venda do referido imóvel, com disponibilização de capitais próprios para a realização do sinal e princípio de pagamento, afirmando contudo que não era conveniente disponibilizar mais capitais próprios em virtude de alguns dos seus capitais estarem a ser investidos e outros comprometidos, para o pagamento de tornas por partilhas acertadas e a efectuar em breve.
59) A arguida instruiu esse pedido de empréstimo com um relatório de avaliação da “Quinta das O...”, datado de 27 de Maio de 1997, elaborado pelo Eng.º MM a seu pedido, que fixava o valor venal do imóvel em 275.000.000$00 (1.371.694,22).
60) Bem como instruiu esse pedido, em momento posterior, com uma certidão datada de 30 de Junho de 1997 relativa ao imóvel a adquirir.
61) Cumpridas as formalidades e assumindo o “Banco Pinto & Sotto Mayor” a posição da “Companhia de Seguros Mundial Confiança” no negócio, em 4 de Julho de 1997 é aprovada, por aquele Banco, a concessão do empréstimo, no valor de 170.000.000$00 (€847,956,43) à arguida AA.
62) No dia 20 de Agosto de 1997, o referido montante é assim depositado na conta à ordem nº ..., titulada pela arguida junto dessa instituição.
63) Em Julho de 1997 a arguida AA veio a adquirir, por compra, e pelo valor de 120.000.000$00, os prédios acima melhor descritos e que constituem a denominada “Quinta das O...”.
64) Na posse da referida propriedade, a arguida decidiu implementar o projectado empreendimento de turismo rural, denominado “Casas do P...”, que desejou arranjar e decorar com os melhores materiais, de forma a ali construir uma casa de turismo rural de “charme”.
65) Assim, em 26 de Novembro de 1997 a arguida solicitou ao “Banco Pinto & Sotto Mayor” um novo empréstimo, agora no montante de 50.000.000$00 (€249.398,95) para a realização de obras de beneficiação no mencionado imóvel.
66) Em 6 de Dezembro de 1997 foi então aprovado também esse empréstimo, sendo o referido montante depositado na sua conta à ordem nº ..., junto dessa instituição, no dia 12 de Dezembro de 1997.
67) De acordo com o contrato de mútuo celebrado entre a arguida AA e o Banco Pinto e Sotto Mayor o reembolso das quantias mutuadas e dos respectivos encargos deveria efectuar-se no prazo de 10 anos, em prestações trimestrais, de capitais e juros, no montante de 6.445.067$00 (€32.147,86) cada uma.
68) Para garantia dos empréstimos por si contraídos junto do Banco Pinto & Sotto Mayor a arguida AA conferiu a esta instituição de crédito, através de duas procurações irrevogáveis, datadas respectivamente de 12 de Agosto de 1997 e de 5 de Dezembro de 1997, poderes para constituir hipotecas sobre o imóvel que constituía a“Quinta das O...” – com parte rústica e urbana - até ao montante do capital em dívida, ou seja, 220.000.000$00 (€1.097.355,37) e juros de mora.
69) Em 28 de Outubro de 1998, quando já tinha pendente sobre si a acção executiva para pagamento de quantia certa intentada pela “M..., S.A.” e quando, nos cinco meses que precederam esta data, havia obtido do Banco Mello, do BCP e do BPN, conforme adiante se narrará, o valor global de 655 000 000$00 a arguida deixou de satisfazer as obrigações que havia assumido para com o “Banco Pinto & Sotto Mayor”, não pagando a prestação vencida nesse mês, nem as que se lhe seguiram.
70) Tendo caído em mora, a totalidade da dívida venceu-se em 25 de Outubro de 1999, no montante global de 239.065.576$00 (€1.192.454,06) que compreendia o capital, juros, sobretaxa de mora e imposto de selo.
71) Instada nessa data a pagar o montante em dívida, a arguida AA, visando ganhar tempo e retardar o conhecimento do seu real propósito, entregou ao “Banco Pinto & Sotto Mayor”, com data do dia 25 de Outubro de 1999, o cheque nº ..., sacado sobre a conta nº ... da agência do Calhariz da “Caixa Geral de Depósitos”, no valor de 240.000.000$00 (€1.197.114,95).
72) Apresentado porém o referido cheque a pagamento, veio o mesmo a ser devolvido por falta de provisão.
73) Confrontada com a devolução do cheque a arguida, acabou por entregar ao “Banco Pinto & Sotto Mayor”, em 13 de Dezembro de 1999, um cheque no valor de 35.000.000$00 (174.579,26), o qual foi pago através da mobilização de montantes obtidos através de outros financiamentos obtidos de forma fraudulenta.
74) Além desta amortização da dívida, o “Banco Pinto & Sotto Mayor” fez-se ainda pagar com a importância de 73.275$00 (€365,49) que fez transferir para o próprio Banco, em 14 de Julho de 2000, por débito da conta de depósitos à ordem da arguida.
75) A partir desta data a arguida não efectuou qualquer outro pagamento ao “Banco Pinto & Sotto Mayor”, sendo pois a sua dívida a este Banco, no montante de 203 992 301$00 de capital e respectivos juros de mora.
76) Em meados do ano 2000, quando o “Banco Pinto & Sotto Mayor” pretendeu fazer uso das procurações acima referidas para constituir hipotecas a seu favor nos imóveis que constituíam a “Quinta das O...”, já os imóveis se encontravam onerados com outras hipotecas voluntariamente constituídas a favor do “BPN”, do “Banco Mello” e do “BCP”, para garantia do pagamento de outras responsabilidades assumidas com estes bancos, no montante global de 655 000 000$00 e juros.
77) Assim, em 19 de Setembro de 2000, o “Banco Pinto & Sotto Mayor” requereu junto do Tribunal de Comércio de Lisboa a falência da arguida AA, ascendendo à data a sua dívida para com aquele Banco o valor de 209.454.642$00 (€1.044.755,35).
78) (5)
79) Em Julho de 1997, a arguida AA solicitou ao BCP um crédito no montante de 170.000.000$00 (€847.956,43), invocando o referido em 2.35 a 2.39.
80) Este empréstimo foi-lhe concedido em 29 de Julho de 1997, através de depósito na sua conta de depósitos à ordem nº ... do BCP.
81) Para garantia deste empréstimo, a arguida adquiriu no BCP e deu como penhor a este, unidades de participação no fundo de investimento denominado “ BCP Global”, no valor do crédito concedido.
82) Estes fundos tinham sido adquiridos na mesma data - 29 de Julho de 1997 – com o dinheiro obtido junto do “BPSM”.
83) Em Dezembro de 1997 a arguida solicita um reforço desse empréstimo, no montante de 50.000.000$00 (€249.398,95).
84) Para garantia deste reforço de empréstimo foi, igualmente, dado de penhor pela arguida, uma aplicação financeira denominada “Fortuna 2000” que a mesma adquiriu, no valor de 50 125 000$00 (cinquenta milhões, cento e vinte e cinco mil escudos).
85) Após a aprovação desse reforço de crédito, em 10 de Dezembro de 1997, foi depositado na conta da arguida AA o montante de 50.000.000$00 (€249.398,95).
86) Tais empréstimos foram liquidados pela arguida entre 20 e 23 de Julho de 1999, com o produto obtido no resgate das acima referidas aplicações financeiras oferecidas como penhor e mediante acordo com o “BCP”.
87) Aproveitando a confiança obtida com a concessão dos anteriores financiamentos e das garantias dadas relativamente aos mesmos, a arguida, nos dias 17 e 27 de Outubro de 1997, conseguiu o desconto de duas livranças junto do “BCP” nos montantes respectivos de 40.000.000$00 (€199.519,16) e 20.000.000$00 (€99.759,58), respectivamente, ambas com data de vencimento a 13 de Março de 1998.
88) Constava das mesmas uma assinatura em aval do Dr. PP, então advogado da arguida e já entretanto falecido e de sua mãe, assinatura essa obtida em condições não determinadas.
89) Através de acordo com o “BCP”, no dia 13 de Março de 1998, as referidas livranças foram juntas numa só, no valor de 60.000.000$00 (€299.278,74), da qual igualmente consta uma assinatura em aval do Dr. PP.
88) Tal livrança tinha vencimento em 30 de Junho de 1 999.
89) Tal montante, após a competente aprovação por parte da administração do “BCP”, foi-lhe assim concedido em 13 de Março de 1998, através de crédito na conta nº ... de que a mesma é titular junto daquela instituição bancária.
90) Ainda aproveitando a confiança adquirida, em 27 de Março de 1998, a arguida AA solicitou novamente junto do “BCP” um outro crédito pessoal, agora no valor de 75.000.000$00 (€374.098,42).
91) Tal montante, após a competente aprovação por parte da administração do BCP, foi-lhe assim concedido, através de crédito na conta nº ... de que a mesma é titular junto daquela instituição bancária.
92) Para titular esse empréstimo, a arguida, na mesma data, subscreveu uma nova livrança por esse montante, com vencimento a 10 de Agosto de 1998.
93) Tais quantias, no valor global de 135 000 000$00 (cento e trinta e cinco milhões de escudos) foram pedidas quando a arguida já tinha empréstimos anteriores, um junto do “B.P.S.M.” no valor de 220 000 000$00 (duzentos e vinte milhões de escudos) e outro junto do “B.C.P.” no mesmo valor, ao tempo ainda não pago e tudo no valor global de 555 000 000$00 (quinhentos e cinquenta e cinco milhões de escudos).
94) Nesta altura e como se disse, a avaliação técnica feita a pedido da arguida para a “Quinta das O...” atribuía-lhe o valor de 275 000 000$00 (duzentos e setenta e cinco milhões de escudos.
95) Esta tinha valor que nunca excederia o supra-referido.
96) Igualmente e para garantia destes empréstimos, no valor de 60.000.000$00 (€299.278,74) e de 75.000.000$00 (€374.098,42), em 28 de Março de 1998, a arguida AA celebrou com o “BCP” um contrato promessa de hipoteca, nos termos do qual prometeu constituir a favor do BCP uma hipoteca sobre o imóvel “Quinta das O...”, na Golegã, livre de quaisquer ónus ou encargos, para garantia do pagamento pontual das responsabilidades assumidas ou a assumir por si perante o Banco e até ao montante de 130.000.000$00 (€648.437,27).
97) A arguida tinha perfeita consciência de que a garantia oferecida não correspondia à realidade, uma vez que anteriormente, em Agosto e Dezembro de 1997, já tinha oferecido o mesmo imóvel, para garantia da concessão do empréstimo junto do “BPSM” e não possuía quaisquer outros imóveis disponíveis que pudessem ser penhorados em execução das livranças que havia subscrito.
98) Com o referido contrato promessa de hipoteca a arguida AA entregou ao “BCP” uma procuração irrevogável a seu favor, datada de 20 de Março de 1998, para outorga do aludido contrato de hipoteca, permitindo-lhe a celebração de negócio consigo mesmo.
99) Na data de vencimento das referidas livranças, a arguida convenceu o Banco a conceder-lhe novo prazo, sob o pretexto de aguardar a rentabilidade dos investimentos feitos, através da reformada das livranças, pelos mesmos valores nelas apostas, dando assim origem a duas novas livranças:
- uma, com data de emissão de 30 de Junho de 1998 e data de vencimento de 4 de Janeiro de 1999, no valor de 75.000.000$00 (€374.098,42);
- outra, com data de emissão de 10 de Agosto de 1998 e data de vencimento de 4 de Janeiro de 1999, no valor de 60.000.000$00 (€299.278,74).
100) A arguida nem em 4 de Janeiro de 1999 nem em data posterior, efectuou o pagamento de qualquer uma destas livranças, encontrando-se as mesmas ainda actualmente em dívida.
101) Ao constatar a impossibilidade de satisfazer o seu crédito por acordo com a arguida AA, o “BCP” decide fazer uso da procuração irrevogável que tinha em seu poder e celebra, em nome da arguida, uma escritura pública nos termos da qual constituí a seu favor uma hipoteca sobre o imóvel “Quinta das O...”, na Golegã.
102) Em 21 de Abril de 1999, o “BCP” registou essa hipoteca a seu favor, verificando, apenas nessa data, que os mesmos imóveis tinham sido dados de garantia também ao BPN e ao Banco Mello e que estas instituições de crédito já se tinham antecipado no registos das respectivas hipotecas.
103) No entanto, deliberada, livre e conscientemente actuou a arguida, com o propósito de induzir em erro os funcionários do “BCP” quanto à sua capacidade financeira para solver uma dívida no valor de 135.000.000$00 (€673.377,16), por forma a, por intermédio de tal actuação que sabia ser idónea, receber a quantia monetária referente ao montante por si solicitado a esta instituição bancária.
104) A arguida apenas logrou obter do “BCP” o montante de 135.000.000$00 (€673.377,16) por se encontrarem os funcionários desta instituição bancária convencidos erroneamente de que a arguida, seria pessoa financeiramente capaz de solver as suas dívidas, bem como que os imóveis por si dados de garantia sempre se encontrariam livres de quaisquer outros ónus ou encargos.
105) Na sequência da sua conduta, a arguida logrou obter do “BCP” a quantia de 135.000.000$00 (€673.377,16), que fez coisa sua.
106) Em 20 de Maio de 1998, ou seja, menos de um ano depois de o “BPSM” lhe ter emprestado o montante de 220 000 000$00 (duzentos e vinte milhões de escudos), cerca de dois meses depois de o BCP lhe ter descontado duas livranças no valor de 135.000.000$00 (€673.377,16) e quando deste já tinha também obtido 220 000 000$00 (duzentos e vinte milhões de escudos) que ainda não estava paga – tudo no valor de 575 000 000$00 (quinhentos e setenta e cinco milhões de escudos - a arguida AA pediu mais um financiamento, desta vez, ao Banco Mello.
107) O montante era de 180.000.000$00 (€897.836,21) .
108) Tal financiamento foi, de novo, alcançado através da invocação de se destinar a um “projecto de investimento imobiliário”, sendo solicitado por curto prazo, com vencimento a 5 de Junho de 1999, e de novo como referido em 2.35. a 2.40.
109) Na mesma data de concessão do empréstimo, foi assim efectuado um crédito na conta à ordem nº ..., titulada pela arguida junto da referida instituição bancária, no montante de 180.000.000$00 (€897.836,21).
110) Para aumentar a sua credibilidade junto do Banco e se assegurar que o empréstimo lhe era concedido, a arguida ofereceu como pretensa garantia do pagamento uma procuração irrevogável conferindo ao “Banco Mello” plenos poderes para constituir uma hipoteca a seu favor sobre os imóveis que compunham a “Quinta das O...”, bem como outorgar as escrituras necessárias e praticar todos os demais actos pertinentes à hipoteca dos referidos imóveis.
111) A arguida sabia que a mesma garantia já tinha sido dada aos demais supra-referidos credores, uma vez que, em 12 de Agosto de 1997 e 5 de Dezembro de 1997, já tinham sido emitidas procurações semelhantes, a favor do “Banco Pinto & Sotto Mayor” para garantia do empréstimo no valor de 220.000.000$00 (€1.097.355,37) e ao “B.C.P.” pelo valor de 135 000 000$00 (cento e trinta e cinco milhões de escudos) concedido por esta instituição de crédito.
112) Igualmente para dar uma aparente garantia do pagamento do empréstimo, também na mesma data, a arguida entregou uma livrança por si subscrita à ordem do “Banco Mello” com a respectiva autorização de preenchimento, em caso de incumprimento do contrato de mútuo, pelo valor que fosse devido, sabendo, no entanto que o único bem de valor que tinha era a “Quinta das O...” – “Casas do P...”.
113) Depois de ter já pendente contra si a acção executiva para pagamento de quantia certa intentada pela M... e quando já havia obtido empréstimos do BPSM, do BCP e do BPN, a arguida não pagou ao Banco Mello a quantia referida nos arts. 108º e 109º, no prazo indicado no art. 108º.(6)
114) Em 12 de Abril de 1999, o Banco Mello no uso da procuração que lhe havia sido emitida pela arguida, celebra com esta, representada no acto pelo próprio Banco, a escritura pública de hipoteca dos imóveis que constituem a “Quinta das O...”, para garantia do pagamento mutuado. (7)
115) Tal hipoteca foi registada a favor do “Banco Mello” na data de 13 de Abril de 1999, tendo o Banco então verificado existirem dois registos prévios de hipoteca a favor do “BPN” (datados de 12 de Setembro de 1998 e 24 de Fevereiro de 1999) sobre os mesmos imóveis.
116) Em face da actuação da arguida, na data de 21 de Junho de 1999 o “Banco Mello” instaurou uma acção executiva para pagamento de quantia certa em processo comum ordinário que correu seus termos sob o nº 444/99 do 14º Juízo do Tribunal Cível da comarca de Lisboa.
117) Ao solicitar este empréstimo no valor de 180.000.000$00 (€897.836,21) junto do “Banco Mello”, tomou como possível a arguida não vir a pagá-lo e com isso se conformou.
118) Por outro lado, sabia a arguida que os imóveis dados de garantia a este empréstimo tinham servido já para, meses antes, garantir um empréstimo no valor de 220.000.000$00 (€1.097.355.37) junto do Banco Pinto & Sotto Mayor e de 135.000.000$00 (cento e trinta e cinco milhões de escudos) junto do BCP. (8)
119) No entanto, deliberada, livre e conscientemente, actuou a arguida, com o propósito de induzir em erro os funcionários do Banco Mello quanto à sua capacidade financeira e solvabilidade, para pagamento desta dívida.
120) Na sequência da sua conduta, a arguida logrou obter do Banco Mello a quantia de 180.000.000$00 (€897.836,21), que fez coisa sua.
121) Em data não concretamente apurada, mas seguramente anterior ao mês de Julho de 1998, quando, no decurso do ano anterior a arguida já tinha solicitado ao “BPSM” a quantia de 220.000.000$00 (€1.097.355,37), ao “Banco Mello” a quantia de 180.000.000$00 (€897.836,21) e ao “BCP” a quantia de 135.000.000$00 (€673.377,16) além dos 220 000 000$00 (duzentos e vinte milhões de escudos) garantidos pelos títulos e aplicação financeira, a arguida AA decidiu também procurar obter junto do “BPN”, o montante de 120.000.000$00 (€598.557,48).
122) Assim, com vista a alcançar tal finalidade, a arguida solicitou a um antigo funcionário do Banco de Portugal seu conhecido, de nome QQ que lhe marcasse uma reunião com o Dr. RR, Presidente do “BPN”, pois pretendia falar pessoalmente com este.
123) QQ contactou assim com o Dr. RR e pediu-lhe que este recebesse a arguida, adiantando-lhe, desde logo, que esta pretendia contrair um empréstimo com o “BPN” e que se tratava de uma funcionária da Procuradoria Geral da República.
124) Após alguma insistência por parte de QQ, o Presidente do “BPN” decidiu receber a arguida, tendo esta, nessa reunião, referido que necessitava do montante de 100.000.000$00 (€498.797,90) para dar tornas aos seus irmãos num processo de partilhas.
125) O Dr. RR sugeriu à arguida AA que esta efectuasse um pedido por escrito dirigido ao próprio Banco, a solicitar o montante pretendido com indicação do destino a dar ao mesmo, bem como quais as garantias que dava para o seu cumprimento.
126) Assim, em carta datada de 8 de Julho de 1998 a arguida solicitou ao “BPN” “apoio financeiro com vista a poder licitar em processo judicial de inventário facultativo”, oferecendo como garantia os imóveis que lhe viessem a ser adjudicados nesse inventário e comprometendo-se a liquidar o empréstimo num prazo inferior a 10 anos.
127) Após o recebimento desta carta, o Dr. RR encaminhou-a para o administrador da área comercial, Dr. SS, ficando este encarregue de tratar com todas as questões comerciais respeitantes à instrução do pedido de concessão de crédito solicitado pela arguida.
128) Nas negociações que decorreram entre a arguida AA e o “BPN”, na pessoa de SS, aquela convenceu-o de que estava em fase de acordo de partilhas com os irmãos, relacionadas com a herança aberta por óbito de seu pai, fazendo-o acreditar que o montante do empréstimo solicitado junto do “BPN” seria liquidado a curto prazo.
129) SS pediu assim à arguida AA que esta lhe indicasse um imóvel para servir de garantia ao empréstimo a conceder, tendo a arguida indicado, mais uma vez, a “Quinta das O...”, na Golegã, ocultando que os mesmos já tinham sido oferecidos para garantia de outros empréstimos.
130) Através de certidão da Conservatória do Registo Predial da Golegã, datada de 21 de Julho de 1998, o “BPN” verificou que os referidos imóveis não se encontravam onerados, pese embora a arguida já os tivesse dado de garantia, através de procurações irrevogáveis ao “Banco Mello”, ao “BCP” e ao “BPSM”.
131) Porque à data estes Bancos ainda não tinham registado as hipotecas, circunstância esta que era do conhecimento da arguida e actuando esta sempre como descrito em 2.35. a 2.41., este Banco concedeu o referido empréstimo.
132) Para demonstrar que o imóvel tinha potencialidade financeira para garantir o crédito solicitado, a arguida apresentou a SS, um relatório datado de Maio de 1997 e elaborado pelo Eng. Joaquim MM, nos termos do qual a “Quinta das O...” foi avaliada em 275.000.000$00 (€1.371.694,22).
133) Tendo por correctos os valores constantes de uma avaliação para efeito de partilhas e determinação de tornas, o “BPN” decidiu, em 16 de Julho de 1998, ser aceitável atribuir ao imóvel o valor de 200.000.000$00, para efeitos de crédito hipotecário.
134) Assim, no dia 23 de Julho de 1998, foi celebrado entre o “BPN”, na qualidade de mutuante e a arguida AA, na qualidade de mutuária, um contrato de financiamento destinado a “apoiar a tesouraria familiar da mutuária”, concedendo o primeiro à segunda, um empréstimo no valor 100.000.000$00 (€498.797,90).
135) Tal empréstimo foi concedido pelo prazo de cinco anos a pagar através de prestações mensais.
136) A arguida AA aceitou, no dia 23 de Julho de 1998, entregar ao “BPN” uma livrança em branco, por si subscrita, bem como uma autorização de preenchimento.
137) Igualmente para manter a aparência de dar efectivas garantias do pagamento do valor do empréstimo, no dia 24 de Julho de 1998, no 24º Cartório Notarial de Lisboa, a arguida emitiu uma procuração nos termos da qual constituiu seu bastante procurador o “BPN”, a quem conferiu poderes para em seu nome, constituir hipoteca voluntária de primeiro grau sobre o prédio “Quinta das O...”, sito na Golegã.
138) Através dessa procuração a arguida aceitou ainda comprometer-se a, no prazo de cinco anos, não dar a hipoteca do referido imóvel a terceiros e enquanto se mantivesse em vigor o contrato de mútuo celebrado com o “BPN”, mas continuou a ocultar que já havia dado o mesmo imóvel como garantia de outros empréstimos.
139) Através de tal instrumento, o “BPN” estaria legitimado a constituir hipotecas sobre tal imóvel, logo que a arguida deixasse de pagar as prestações por si assumidas.
140) No dia 28 de Setembro de 1998, no 11º Cartório Notarial de Lisboa foi celebrado entre o “BPN” e a arguida AA, representada no acto pelo próprio “BPN”, uma escritura pública de hipoteca nos termos da qual, para garantia das responsabilidades assumidas por esta, a arguida constituiu a favor do Banco credor uma hipoteca sobre os referidos imóveis para liquidação de toda e qualquer responsabilidade assumida perante o referido banco até ao montante de 100.000.000$00 (€498.797,90).
141) No entanto, já anteriormente a arguida havia emitido procurações a favor do “Banco Pinto & Sotto Mayor”, do “BCP” e do “Banco Mello” para garantia dos empréstimos por estes bancos concedidos no valor respectivo de 220.000.000$00 (€1.097.355,37), 135.000.000$00 (€673.377,16) e 180.000.000$00 (€897.836,21), através das quais concedia a estas instituições de crédito plenos poderes para constituírem hipotecas sobre os mesmos imóveis.
142) (9)
143) Tendo sido obtido assim no período de 10 meses empréstimos no valor total de 555.000.000$00. (10)
144) Em Fevereiro de 1999, a arguida invocando dificuldades no acordo de partilhas e face ao não pagamento de algumas das prestações, pretendeu obter do “BPN” um reforço do empréstimo já concedido em Julho de 1999, pelo montante de 20.000.000$00 (€99.759,58), convertendo em capital as prestações não pagas e ainda lhe permitindo obter um encaixe financeiro para gastos pessoais.
145) O “BPN” , acreditando ainda na idoneidade das garantias oferecidas, aceitou conceder à arguida mais o referido montante que deveria ser pago até ao dia 11 de Setembro de 1999, solicitando apenas que a mesma subscrevesse uma livrança nesse valor, para garantia das responsabilidades por si assumidas junto do “BPN”, o que aquela fez em 12 de Fevereiro de 1999.
146) Assim, no dia 22 de Fevereiro de 1999, foi depositado a crédito na sua acima referida conta junto do “BPN” o montante de 20.000.000$00 (€99.759,58), de que a arguida fez coisa sua.
147) No dia 12 de Fevereiro de 1999, no 11º Cartório Notarial de Lisboa foi celebrada entre o “BPN” e a arguida AA uma escritura de reforço da hipoteca antes efectuada em 28 de Setembro de 1998, procedendo deste modo à ampliação da referida hipoteca no sentido de esta passar a garantir todas as responsabilidades assumidas pela arguida junto do BPN até ao montante de 120.000.000$00 (€598.557,48).
148) A partir de 23 de Maio de 1999 e depois de ter pago apenas nove prestações de 2.113.700$00 (€10.543,09) cada uma, a arguida deixou de cumprir definitivamente o plano de pagamentos referente ao empréstimo no valor de 100.000.000$00 (€498.797,90), tendo então em dívida o montante de 80.976.700$00 (€403.910,08) de capital.
149) Tomou a arguida como possível não vir a poder pagar tais quantias, com isso se conformando.
150) Na realidade, em 2 Fevereiro de 1999, ou seja cerca de 6 meses após o depósito de 100.000.000$00 (€498.797.90) na conta nº ..., titulada pela arguida junto “BPN”, a referida conta apresentava já um saldo negativo no valor de 9.065.652$00 (€45.219,28).
151) Igualmente, no dia 11 de Setembro de 1999, na data do vencimento da livrança para garantia do montante de 20.000.000$00 (€99.759,58) a arguida não efectuou o pagamento da mesma, nem o fez até hoje.
152) Foi constituída e registada a hipoteca a favor do “BPN”, para garantia dos empréstimos nos montantes de 100.000.000$00 (€498.797.90) e 20.000.000$00 (€99.759,58), respectivamente em 29 de Setembro de 1998 e 24 de Fevereiro de 1999.
153) Em face da ausência de pagamentos por parte da arguida, o “BPN”, em Maio de 2000, instaurou uma Acção Executiva Ordinária para pagamento de quantia certa contra esta, a correr no 5º Juízo Cível da Comarca do Porto, com o n.º 543/00, com o valor de 123 115 650$00 (614098.27€).
154) Por outro lado, bem sabia a arguida que os imóveis dados de garantia a este empréstimo tinham servido já para, meses antes, garantir um empréstimo no valor de 220.000.000$00 (€1.097.355.37) junto do “Banco Pinto & Sotto Mayor”, um empréstimo no valor de 135.000.000$00 (€673.377,16) junto do “BCP” e um empréstimo no valor de 180.000.000$00 (€897.836,21) junto do “Banco Mello”, tudo no valor de 535 000 000$00 (quinhentos e trinta e cinco milhões de escudos).
155) Bem sabia a arguida, que o imóvel não tinha valor patrimonial suficiente para a satisfação de todos estes créditos.
156) No entanto, deliberada, livre e conscientemente actuou a arguida, com o propósito de induzir em erro os funcionários do “BPN” quanto à sua capacidade financeira para solver uma dívida no valor de 120.000.000$00 (€598.557,48), por forma a, por intermédio de tal artifício que sabia ser idóneo, receber a quantia monetária referente ao montante por si solicitado a esta instituição bancária.
157) Sabia contudo que poderia vir a não poder pagá-lo, com isso se conformando.
158) Na sequência da sua conduta, a arguida logrou obter do Banco Mello a quantia de 120.000.000$00 (€598.557,48), que fez coisa sua.
159) Entre Outubro e Novembro de 1 998, a arguida deslocou-se à agência do “BES” da Avenida da Liberdade onde teve uma reunião com o banqueiro TT, pessoa sua conhecida atenta a circunstância de este ser seu vizinho no Edifício Embaixador, em Lisboa.
160) Nessa reunião a arguida AA solicitou então, a TT, que, através do BES, lhe fosse concedido um financiamento no montante de 120.000.000$00 (€598.557,48), referindo que o mesmo teria por finalidade a realização de obras de beneficiação no empreendimento turístico denominado “Casas do P...”.
161) Nessa data, já arguida tinha deixado de realizar os pagamentos assumidos perante o “Banco Mello”, não tendo a mesma feito qualquer referência aos anteriores financiamentos.
162) TT, face ao invocado pela arguida, às funções que sabia que a mesma exercia e ao património familiar que conhecia, disse à arguida que não haveria qualquer problema na concessão desse empréstimo, tendo ficado combinado entre ambos que o pagamento desse crédito ficaria garantido através da hipoteca do imóvel denominado “Quinta das O...”, onde funcionava, precisamente, o empreendimento das “Casas do P...”, o qual, pelo seu valor, seria suficiente para assegurar o pagamento desse crédito.
163) A arguida foi assim reencaminhada por TT para UU, director da área comercial de Lisboa do “BES”, tendo este recebido a arguida AA para tratar da efectivação da operação de empréstimo, cujos contornos já tinham sido previamente negociados entre esta e TT, designadamente no que concerne ao montante do crédito solicitado e às garantias reais oferecidas.
164) O imóvel já tinha sido dado de garantia através de procurações para constituir hipotecas, para obrigações contraídas pela arguida junto do BPSM, do BCP, do Banco Mello e do BPN. (11)
165) O BES realizou uma avaliação do imóvel em causa, tendo este banco chegado à conclusão de que o valor do mesmo serviria para cobrir o valor do empréstimo solicitado.(12)
166) Em 23 de Setembro de 1999, a arguida assinou também e entregou no “BES” uma livrança em branco, acompanhada da respectiva autorização de preenchimento, para, à data do seu termo inicial ou das suas prorrogações, ser preenchido com o saldo devido, comissões e juros.
167) Em 22 de Dezembro de 1999, o crédito já concedido foi reestruturado.
168) Tal empréstimo consubstanciou-se assim, numa abertura de crédito, permitindo saques a descoberto, até ao valor de 120.000.000$00 (€598.557,49) na conta à ordem nº 023/66946/251,de que a arguida era titular junto dessa instituição bancária.
169) Aproveitando tal linha de crédito, logo na data em que solicitou o empréstimo, ou seja, no dia 16 de Outubro de 1998, a arguida solicitou um adiantamento no valor de 20.000.000$00 (€99.759,58) que lhe foi concedido.
170) Em 30 de Outubro de 1998, a arguida solicitou ao BES nova utilização do crédito pedido, agora no montante de 35.000.000$00 (€ 174.579,26), a qual, face à credibilidade já gerada, foi autorizada. (13)
171) Em 30 de Novembro de 1998, 19 de Outubro de 1999 e 18 de Janeiro de 2000, a arguida solicitou a utilização respectiva dos montantes de 49.800.000$00 (€248.401,35), 11.423.584$00 (€56.980,60) e 3.576.416$00 (€17.839,09), os quais, face à convicção da idoneidade das garantias, lhe foram sendo também concedidos pelo “BES”.
172) O crédito seria pago através de 20 prestações trimestrais, tendo sido concedido à arguida um ano de carência.
173) (14)
174) (15)
175) A arguida não pagou tal montante ao “BES” até hoje sendo que, em 22 de Dezembro de 2000, o montante em dívida era de €599.327,48 de capital.
176) Ao solicitar o empréstimo no valor de 120.000.000$00 (€598.557,48) junto do “BES”, tomou a arguida como possível que pudesse vir a não poder pagá-lo, com isso se conformando.
177) (16)
178) A estes empréstimos acrescia outro, obtido junto do “B.C.P.” no valor de 220 000 000$00 (duzentos e vinte milhões de escudos) contra o penhor de títulos “Fortuna 2 000” e “B.C.P. – Global” de valor semelhante e já antes referido.
179) O que tudo ao tempo somava de empréstimos anteriores, o montante global de 875 000 000$00 (oitocentos e setenta e cinco milhões de escudos), só em montantes mutuados por Bancos, no espaço de um ano e três meses.
180) No entanto, deliberada, livre e conscientemente, actuou a arguida, com o propósito de induzir em erro os funcionários do “BES” quanto à sua capacidade financeira para solver uma dívida no valor de cerca de 120.000.000$00 (€598.557,48), por forma a, por intermédio de tal artifício que sabia ser idóneo, receber a quantia monetária referente ao montante por si solicitado a esta instituição bancária.
181) A arguida apenas logrou obter do “BES” o montante de 119.800.000$00 (€597.559,88) por se encontrarem os funcionários desta instituição bancária convencidos erroneamente de que a arguida seria pessoa financeiramente capaz de solver as suas dívidas, bem como de que os imóveis por si dados de garantia se encontravam livres de quaisquer outros ónus ou encargos.
182) Dando a arguida uma ideia de solvabilidade, que não tinha.
183) Na sequência da sua conduta, a arguida logrou obter do “BES” a quantia de 119.800.000$00 (€597.559,88), que fez coisa sua.
184) Em data não concretamente determinada mas anterior a 30 de Novembro de 1998, a arguida decidiu comprar um apartamento no Campo Grande, “Edifício Plaza”, também através de empréstimo bancário.
185) Assim solicitou, então, junto do “Banco Investimento Imobiliário, S.A.” um empréstimo no montante de 81.000.000$00 (€404.026,30), alegando que o mesmo se destinava à aquisição e realização de obras de beneficiação na fracção autónoma designada pela letra «GV», correspondente ao apartamento T-5-A, no décimo segundo andar, para habitação, com arrecadação e três estacionamentos, situado no Campo Grande, números 10 a 18, freguesia do Campo Grande.
186) Este empréstimo foi porém solicitado aos balcões do “B.C.P.” e na sequência do anterior relacionamento com este banco.
187) Com efeito, o “B.I.I.” pertence ao grupo “B.C.P.”, funcionando como o Banco de investimento imobiliário do grupo.
188) Na ponderação sobre a concessão do empréstimo relevaram os factos narrados em 2.35. a 2.39.
189) Tendo por base estas circunstâncias e ainda a circunstância de o “Banco Investimento Imobiliário, S.A.” garantir o pagamento do empréstimo através da hipoteca do bem a adquirir, foi decidida a concessão do empréstimo.
190) Assim, através de escritura pública datada de 30 de Novembro de 1998, a arguida AA adquiriu à sociedade “FRAB – Construções e Promoções Imobiliárias, Lda.”, o acima referido imóvel, sito no Campo Grande, pelo preço de 54.000.000$00 (€269.350,86), quantia acrescida de 27 000 000$00 (vinte e sete milhões de escudos) a título de obras, constituindo-se, no mesmo acto, devedora do “Banco Investimento Imobiliário, S.A.” da importância de 81.000.000$00 (€404.026,30), garantindo o pagamento e liquidação da quantia mutuada através da hipoteca da fracção adquirida.
191) Tal empréstimo efectivou-se deste modo, no referido dia 30 de Novembro de 1998 através de depósito na conta nº ..., titulada pela arguida junto do “Banco Investimento Imobiliário, S.A.”.
192) A quantia mutuada seria amortizada em trezentas prestações mensais de capital e juros, com vencimento até ao dia 15 de cada mês.
193) Com os 81 000 000$00 (oitenta e um milhões de escudos), logo a arguida procedeu ao pagamento de um anterior empréstimo, no valor de 63 500 000$00 (sessenta e três milhões e quinhentos mil escudos).
194) A arguida apenas procedeu ao pagamento da 1ª prestação vencida em 15 de Dezembro de 1998, e, só após insistência do “Banco Investimento Imobiliário, S.A.”, efectuou o pagamento das sete prestações que posteriormente se tinham vencido, tendo cessado todo e qualquer pagamento em 15 de Julho de 1999.
195) Entretanto, cerca de dois meses após a aquisição do imóvel, ou seja, no dia 30 de Janeiro de 1999, a arguida havia já contactado a agência imobiliária “Predial Liz, Lda.”, solicitando os seus serviços para a intermediação da venda do imóvel sito no Campo Grande, por si comprado.
196) Tendo a “Predial Liz, Lda.” encontrado uma compradora interessada na aquisição desse imóvel e por seu intermédio, no dia 22 de Março de 1999 é celebrado um contrato-promessa de compra e venda do referido imóvel do Campo Grande, entre a arguida AA, na qualidade de promitente-vendedora e VV, na qualidade de promitente-compradora.
197) Nos termos desse contrato, a arguida prometia vender e VV prometia comprar o imóvel do Campo Grande, pelo preço de 92.500.000$00 (€461.388,05), tendo para o efeito, nessa data, a segunda entregue à primeira a quantia de 60.000.000$00 (€299.248,74) a título de sinal e início de pagamento do imóvel.
198) A escritura de compra e venda seria celebrada no prazo de 120 dias a contar da data da celebração do contrato-promessa.
199) Com este contrato a arguida logrou, assim, desde logo, obter para si o montante de 60.000.000$00 (€461.388,05).
200) Competia-lhe agora o encargo de proceder ao expurgo da hipoteca que pendia sobre o imóvel a favor do “Banco Investimento Imobiliário, S.A.”, através do pagamento da dívida de 81.000.000$00 (€404.026,30) que tinha para com esta instituição bancária, de modo a que, no prazo máximo de 4 meses, pudesse celebrar com VV a escritura pública de compra e venda do imóvel objecto do negócio.
201) Tendo tomado conhecimento, em finais do mês de Abril de 1999, através da “Predial Liz, Lda.” que existiam outros compradores interessados no imóvel já prometido vender a VV e que estes novos compradores estavam dispostos a pagar 120.000.000$00 (€598.557,48) pelo andar sito no Campo Grande e que não tinham pressa na realização da escritura pública, a arguida decide celebrar um novo contrato-promessa de compra e venda do mesmo imóvel com estes novos interessados.
202) Na verdade, este novo contrato-promessa representava para si uma maior margem de lucro na revenda do imóvel e, por outro lado, não lhe seria exigido pelos novos compradores a celebração da escritura pública de compra e venda num curto espaço de tempo, pelo que a arguida não se veria pressionada, pelos menos de imediato, a proceder ao pagamento da sua dívida perante o “Banco Investimento Imobiliário, S.A.”.
203) A arguida AA disse então a VV que tinha prometido vender o referido apartamento sem o consentimento do seu marido e que este agora pretendia ir habitá-lo, solicitando por isso que desfizessem o negócio.
204) Assim, no dia 7 de Maio de 1999 a arguida rescindiu o contrato-promessa celebrado com VV, entregando-lhe o montante correspondente ao valor por esta já entregue a título de sinal e princípio de pagamento, acrescidos de mais 22.500.000$00 (€112.229,53) correspondentes a indemnização acordada para esta rescisão.
205) Deste modo, liberta do contrato-promessa celebrado com VV, em 30 de Junho de 1999, nas instalações da Procuradoria Geral da República e com a mediação da imobiliária “P...AAA...L..., Lda.”, a arguida AA celebrou com XX e ZZ um novo contrato-promessa de compra e venda, sobre a referida fracção autónoma, estipulando um preço para a prometida compra e venda de l20.000.000$00 (€598.557,48).
206) Nessa data, a título de sinal e princípio de pagamento do imóvel XX emitiu e entregou à arguida AA os cheques nº ----- e -------, sacados sobre a conta à ordem nº 000... do “BES”, agência do Lumiar, titulada pelo próprio XX, datados do referido dia e preenchidos no montante respectivo de 69.063.000$00 e 5.937.000$00.
207) Os acima referidos cheques foram endossados pela arguida AA e entregues a BBB, representante da "P...AAA...L..., L.da" que os depositou nas contas nº ---/---/---.- do “BES” e nº 000... do “BIC”, respectivamente, ambas por si tituladas.
208) No dia 1 de Julho de 1999, BBB voltou a entregar à arguida AA o montante de 69.063.000$00 (€344.484,79), titulado pelo cheque visado nº ---------, sobre a acima aludida conta do “BES”, quantia essa que a arguida depositou na conta por si titulada junto da “Caixa Geral de Depósitos”, agência do Calhariz.
209) Em 14 de Junho de 1999, já XXX havia entregue na “P...AAA...L..., Lda.”, também a título de sinal e início de pagamento do referido imóvel, o cheque nº ------, sacado sobre a conta nº 000... do “BES”, agência do Lumiar, titulada pela sua secretária CCC, datado do próprio e referido dia e preenchido pelo valor de 5.000.000$00.
210) Tal cheque foi depositado no dia 16 de Junho de 1999 na conta nº 000... do Banco Internacional de Crédito, titulada por BBB.
211) O remanescente do preço, no montante de 40.000.000$00 seria pago na data da outorga da escritura pública de compra e venda, ou seja, no prazo de 24 meses, de acordo com o convencionado.
212) Para garantia do pagamento deste montante e para que os promitentes compradores pudessem passar de imediato a habitar o imóvel, no dia 23 de Julho de 1999, XX prestou, junto do “BES”, uma garantia bancária no montante de 40.000.000$00 (€199.519,16), destinada a caucionar o bom pagamento dessa importância.
213) Após a data da celebração do contrato-promessa e a entrega da referida caução, XX e ZZ entraram de imediato na posse da fracção autónoma em causa e receberam da arguida uma procuração irrevogável, com inclusão da faculdade da prática de negócio consigo mesmo, que lhes permitiria outorgar a escritura a seu favor, quando tal lhes fosse mais conveniente.
214) Pese embora a celebração deste negócio e a circunstância de ter sido entregue à arguida, pelo menos, a quantia de 69.063.000$00 (€344.484,79), esta, a partir de 15 de Julho de 1999, deixa de efectuar o pagamento de qualquer prestação ao Banco Investimento Imobiliário, S.A., por conta do empréstimo contraído para a aquisição do imóvel do Campo Grande, desinteressando-se de uma eventual expurgação da hipoteca que pendia sobre o imóvel, uma vez que o mesmo estava agora na posse de XX e de ZZ.
215) Em face do incumprimento definitivo do contrato de mútuo, em 25 de Maio de 2000 o “Banco Investimento Imobiliário, S.A.” instaurou uma acção executiva para pagamento de quantia certa contra a arguida junto da 4ª Vara Cível da Comarca de Lisboa, à qual foi atribuído o nº 63/00, pelo valor de 86.204.340$00 (€429.985,44).
216) A arguida AA fez a referida aquisição com recurso a novo empréstimo, tomando como possível que pudesse vir a não poder pagá-lo e com isso se conformando.
217) O Banco Investimento Imobiliário, S.A. apenas emprestou o referido montante à arguida por se encontrar na convicção errónea que era intenção da mesma habitar a referida fracção autónoma e não fazer negócio com o mesmo, designadamente através da celebração de um contrato-promessa com tradição da coisa.
218) Na sequência da sua conduta, a arguida logrou obter do “B.I.I.” a quantia de 81.000.000$00 (€404.026,30), que fez coisa sua.
219) Assim e em Março de 2 004 e só quanto aos Bancos referidos, foram justificados e reconhecidos por sentença proferida na Reclamação de Créditos apensa ao Proc.º de Falência da arguida AA, os seguintes montantes:
- “B.C.P.” (que inclui o “B.P.S.M.”, o “Banco Melo” e o “B.C.P.”) – 3 355 206.98€ (três milhões, trezentos e cinquenta e cinco mil, duzentos e seis euros e noventa e oito cêntimos);
- “B.E.S.” – 705 933.55€ (setecentos e cinco mil, novecentos e trinta e três euros e cinquenta e cinco cêntimos);
- “B.I.I.” – 500 728.45€ (quinhentos mil, setecentos e vinte e oito euros e quarenta e cinco cêntimos);
- “B.P.N.” – 690 854.34€ (seiscentos e noventa mil, oitocentos e cinquenta e quatro euros e trinta e quatro cêntimos),
tudo no valor global de 5 252 723.32€ (cinco milhões, duzentos e cinquenta e dois mil, setecentos e vinte e três euros e trinta e dois cêntimos).
220) Depois de obtido o empréstimo junto do “B.I.I.”, a arguida passa a pedir dinheiro a particulares sabendo que os não podia pagar, dado o montante da sua dívida bancária e também por estar já em incumprimento.
221) Na senda de endividamento por si desenvolvido, em Maio de 1999 a arguida solicitou ainda a DDD, o montante de 50.000.000$00 (€249.398,95) sob o pretexto de precisar de tal montante para anular o contrato-promessa de compra e venda de um imóvel no Campo Grande, o qual lhe foi concedido e nunca restituído pela arguida.
222) Assim é que, em dia não apurado de Abril de 1999, em dia de sessão do “Conselho Superior do Ministério Público”, AA dirigiu-se a HH, membro do referido Conselho.
223) Referindo-lhe estar com problemas financeiros, mas passageiros, pediu-lhe que a apresentasse ao Eng.º II, pessoa que pensava poder emprestar-lhe quantias monetárias.
224) Este não tinha porém contactos com tal pessoa, insistindo a arguida que tinha problemas de liquidez passageiros, na busca de alguém que lhe pudesse emprestar dinheiro.
225) Acabando HH por proporcionar o contacto entre a arguida e o assistente BB, seu amigo pessoal e que poderia fazer face às necessidades da arguida.
226) Assim, no dia 7 de Maio de 1 999, uma 6.ª feira, AA compareceu no escritório daquele, local onde também estava presente HH.
227) Aí, a arguida referiu ao assistente que necessitava com urgência da quantia de 50 000 000$00 (cinquenta milhões de escudos), actualmente 249398.95€, por um período de 90 dias, para anular um contrato-promessa de compra e venda de um apartamento que possuía, no “Edifício Plaza”, Campo Grande, Lisboa.
228) Referiu ainda a arguida que se encontrava já a decorrer um processo de partilhas através do qual entrariam na sua posse vários imóveis de valor, que garantiam valor “muito superior” ao montante referido.
229) Dado o supra-exposto, as funções desempenhadas pela arguida e que a mesma lhe fora apresentada pelo seu amigo HH, membro do “Conselho Superior do Ministério Público”, BB acreditou na sua solvabilidade e decidiu ajudá-la.
230) Assim e por acordo verbal, concordou em arranjar-lhe 270 000 USD, correspondentes na data à referida quantia de 50 000 000$00 (cinquenta milhões de escudos).
231) Tal quantia foi conseguida pelo assistente, junto da “West and Aeronautical”.
232) Tendo sido BB quem ficou como garante a esta sociedade, do pagamento da quantia indicada.
233) E quem acordou com AA o pagamento do referido montante, sem juros e no prazo de 150 (cento e cinquenta) dias.
234) Tal pagamento deveria ser feito por esta arguida em USD, para a conta que o assistente lhe indicara, ficando a cargo da arguida a responsabilidade pelo risco cambial.
235) Assim em 17 de Maio de 1 999 e como ficara combinado, através de BB foi transferida do “Hill Samuel Bank” a quantia de 270 000 USD, para a conta n.º 00----------------, da “Caixa Geral de Depósitos”, agência do Calhariz, pertencente à arguida.
236) Depois da referida transferência bancária, a arguida não mais contactou com o assistente, pelo que no início de Outubro de 1999, a pedido deste, HH contactou telefonicamente a arguida, para saber se a mesma estava em condições de efectuar o pagamento.
237) A arguida disse então que no dia 25 de Outubro de 1999 seria efectuado o pagamento por transferência bancária, tal como ficara combinado.
238) Dado que no dia 28 do referido mês não havia sido transferida qualquer quantia, nesse dia mais uma vez HH contactou com a arguida, a qual lhe referiu que dera ordem bancária, para a transferência do capital em dívida.
239) Foi-lhe então sugerido e pela mesma aceite, que efectuasse o pagamento em escudos.
240) Apesar disso, só em data não apurada, mas que terá sido dias 11/12 de Dezembro de 1999 a arguida fez chegar à caixa de correio do assistente em envelope fechado dirigido àquele, sem remetente, o cheque n.º --------, emitido com data de 99/12/11 a favor daquele e sacado sobre a conta 00----------, de que é titular, na agencia do calhariz da “C.G.D.”, no montante de 54 000 000$00 (cinquenta e quatro milhões de escudos).
241) O referido cheque, que se destinava a pagar ao assistente a quantia em dívida foi apresentado a pagamento em 99/12/14 e veio a ser devolvido por falta de provisão, no dia 99/12/16, como do verso consta por declaração do “Banco de Portugal”.
242) Depois daquela data, só na tarde de 14 de Janeiro de 2000, sexta-feira, a arguida voltou a contactar, comparecendo então no escritório de HH.
243) Fez então entrega do cheque n.º ------- para pagamento imediato da quantia em dívida, sacado sobre a mesma conta e no montante de 54 000 000$00 (cinquenta e quatro milhões de escudos), solicitando a devolução do cheque referido em 240).
244) Pretendia assim sanar a anterior devolução, por falta de provisão.
245) Uma vez que o assistente se encontrava no estrangeiro, o mencionado cheque foi emitido a favor de HH, que o guardou.
246) Não reparou porém que do mesmo constava a data do dia seguinte, embora tivesse sido apresentado pela arguida, para pagamento imediato.
247) Apresentado por diversas vezes a pagamento, veio por várias vezes a ser devolvido por falta de provisão, designadamente nos dias 00/1/18, 00/1/21, 00/1/25, 00/2/26, 00/1/31 e 00/3/22, conforme respectivas declarações do “Banco de Portugal”que constam do seu verso.
248) Montante que a arguida AA jamais pagou.
249) E que assim obteve os referidos 270 000 USD que, à data do respectivo pagamento ascendiam, devido a diferenças cambiais, à quantia de 54 000 000$00 (cinquenta e quatro milhões de escudos).
250) BB proporcionou à arguida tal quantia, para assim satisfazer e descansar o seu amigo, HH, que com isso estava preocupado. Ainda em finais de 1999, a arguida AA necessitou de obter, para a satisfação das suas despesas pessoais, mais 45.000.000$00 (€224.459,05), decidindo-se então, mais uma vez, por executar o plano fraudulento concebido, procurando novo particular a quem pedir tal montante emprestado.
251) A arguida decidiu então recorrer a um outro seu vizinho, CC, abordando-o no sentido de que lhe emprestasse o montante de 45.000.000$00 (€224.459,05), pretextando que necessitava, para si e para a sua mãe, desse dinheiro, para concluir o processo de partilhas de uma herança da família.
252) Com efeito, CC era vizinho da arguida no Edifício E..., sito na Avenida I... S..., nº ..., Lisboa e, nas diversas vezes em que ambos se cruzaram no referido edifício, a arguida AA pediu-lhe dinheiro emprestado.
253) Depois, com ele comentou que exercia funções na Procuradoria Geral da República e que descendia de uma família ilustre da Golegã.
254) Sendo sensível às razões apresentadas pela arguida e confiando na seriedade e solvabilidade da mesma, não só pelas funções que desempenhava, mas também por pertencer a uma família ilustre da Golegã e ter uma herança litigiosa para receber, CC aceitou conceder-lhe um empréstimo pelo montante solicitado.
255) Para o efeito, CC pediu ao seu Advogado, Dr. EEE, para negociar com a arguida AA as condições do empréstimo, bem como as respectivas garantias de pagamento.
256) Assim nessa sequência, e a pedido do Advogado EEE foram elaborados pelo solicitador FFF, os seguintes documentos, que a arguida AA aceitou, alcançando já não poder vir a satisfazer nenhuma das obrigações assumidas o que quis:
- um documento de reconhecimento de dívida, nos termos do qual NN se reconhece devedora de CC pelo montante de 45.000.000$00 (€224.459,05), comprometendo-se a efectuar o pagamento de tal montante no prazo de um mês, dando como garantia de pagamento dessa dívida um prédio rústico denominado “C... de A.. de Cima”, sito na freguesia e concelho da C..., descrito na Conservatória do Registo Predial da Golegã sob o nº ..., do Livro B-... e inscrito ma matriz cadastral sob o nº ..., Secção ... e o prédio rústico denominado “C... F...”, sito na freguesia de U..., concelho da C..., que faz parte do descrito na Conservatória do Registo Predial da Golegã sob o nº ..., do livro B-..., inscrito na matriz cadastral sob o nº...,da secção;
- uma procuração, datada de 3 de Dezembro de 1999, celebrada perante a Sr.ª Segunda Ajudante do Vigésimo Cartório Notarial de Lisboa, GGG, nos termos da qual NN constituía seu bastante procurador o Advogado EEE, ao qual conferia poderes para vender e ou constituir hipoteca voluntária a favor de CC, até ao montante de 45.000.000$00 (€224.459,05), relativamente às quotas ideias e indivisias, que aquela detinha na compropriedade dos prédios acima descriminados.
257) No mesmo escritório do Advogado EEE, por funcionário não identificado, foi também elaborado um outro documento de reconhecimento de dívida nos termos do qual a arguida AA se reconhecia devedora de CC pelo montante de 45.000.000$00 (€224.459,05), comprometendo-se a efectuar o pagamento de tal montante no prazo de um mês, dando como garantia de pagamento dessa dívida um prédio urbano sito na Golegã, Rua R...da C..., descrito na Conservatória do Registo Predial da Golegã, sob a ficha 0..., inscrito na respectiva matriz predial urbana sob o artigo ..., da freguesia da Golegã, um prédio urbano sito na Golegã, Rua do T..., descrito na Conservatória do Registo Predial da Golegã sob a ficha 0..., inscrito na respectiva matriz predial urbana sob o artigo ..., da freguesia da Golegã e um prédio urbano sito em Setúbal, na P... do B..., número ... a ..., descrito na respectiva matriz predial urbana, da Freguesia de S... M... da G..., sob o número ... – de novo, o imóvel denominado “Quinta das O...” e o da P... do B..., que não pertenciam à arguida.
258) Todos os elementos matriciais e registais referentes ao imóveis dados de garantia, bem como um documento indicando o valor patrimonial dos mesmos, foram fornecidos ao solicitador FFF, via fax, pelo Dr. PP, advogado de NN, a solicitação da arguida AA.
259) Igualmente todos os dados de identificação pessoal da arguida AA e de sua mãe, NN, necessários para a elaboração dos acima mencionados documentos de reconhecimento de dívida e procuração foram fornecidos pela arguida AA, junto de funcionários do escritório do Advogado EEE.
260) Os documentos acima referidos foram entregues, por pessoa não determinada do referido escritório de advogados à arguida AA.
261) A arguida, na posse dos documentos mencionados e de modo a manter a aparência de garantia que se traduzia na intervenção da sua mãe, apresentou os mesmos à NN, dizendo-lhe para a mesma os assinar por se tratarem de documentos relacionados com as partilhas das heranças.
262) A NN assinou os referidos documentos.
263) Estes documentos foram entregues no escritório do Advogado EEE.
264) No dia 3 de Dezembro de 1999, sobre o documento intitulado “procuração”, assinado por NN, a Segunda Ajudante do Vigésimo Cartório Notarial de Lisboa, GGG atestou publicamente que, nessa data, perante si, havia comparecido NN e que lhe havia sido explicado todo o conteúdo do documento.
265) Os imóveis acima referidos valiam, em conjunto, já em 1991, cerca de 168.900.000$00 (€842.469,65).
266) Igualmente para garantia do montante em dívida a arguida AA entregou ao Advogado EEE um cheque no valor de 45.000.000$00 (€224.459,05), sacado sobre uma conta titulada pela sua mãe, aparentemente assinado por esta, cheque esse que depois foi pelo Advogado entregue a CC.
267) Convencido de estarem, aparentemente, asseguradas todas as garantias para o bom pagamento do empréstimo, designadamente com o “reconhecimento de dívida” e com uma “procuração com poderes para venda dos bens dados em garantia”, no dia 7 de Dezembro de 1999, CC emitiu o cheque nº ---------, sacado sobre a conta de depósitos à ordem nº ---------, por si titulada junto do “Banco Mello”, emitido a favor de NN.
268) Após, entregou este cheque à arguida AA.
269) A mesma, na posse do referido cheque, de modo não concretamente apurado, logrou que fosse escrito o nome da sua mãe NN no verso, endossando-o e depositando-o, no dia 10 de Dezembro de 1999, numa conta por si titulada junto da “Caixa Geral de Depósitos”.
270) Conforme havia planeado, a arguida AA nada entregou a CC para pagamento do empréstimo alcançado.
271) Face às insistências para que os pagamentos fossem realizados, visando retardar e se possível impedir a reacção do ofendido, designadamente por via judicial, a arguida, em data não determinada de inícios de 2000, deslocou-se aos escritórios de CC, sob o pretexto de pretender renegociar o pagamento da dívida.
272) Nessa data, a arguida, no decurso da conversa que mantinha com o ofendido, verificando estar em cima da mesa o cheque pretensamente assinado pela sua mãe, de modo não determinado entornou, um copo cheio de um líquido não determinado sobre o cheque que tinha sido dado como garantia, ficando o mesmo inutilizado.
273) A arguida comprometeu-se, de imediato, a entregar a CC um novo cheque, o que, na realidade, nunca pretendeu fazer e não fez até hoje, mantendo-se a totalidade do montante em dívida e conseguindo assim inutilizar o cheque inicialmente entregue.
274) Atenta esta circunstância e tendo por base os documentos assinados pela arguida AA e pela sua mãe, NN, no dia 11 de Dezembro de 2003, CC deu entrada na Vara Mista do Funchal de um requerimento executivo contra as visadas, solicitando a penhora dos bens dados em garantia para pagamento coercivo do montante de €281.969,76.
275) Tal requerimento deu origem ao Processo de Execução nº 656/03.2TCFUN, a correr seus termos na 1ª Secção da Vara de Competência Mista do Funchal.
276) NN embargou, tendo os Embargos sido procedentes em 1ª instância, não tendo até agora a respectiva decisão transitado em julgado.
277) Através da sua actuação acima descrita procurou a arguida induzir em erro CC quanto à real capacidade do seu património para solver a dívida contraída.
278) Ao dar como garantia de pagamento do montante mutuado os imóveis que compõem a “Quintas das O...” procurou a arguida induzir em erro CC quanto à capacidade patrimonial de esses imóveis pagarem a dívida, uma vez que os mesmos, à data, já se encontravam onerados com hipotecas registadas a favor do “Banco Mello”, do “BPN” e do “BCP”, para garantia de empréstimos contraídos junto destes Bancos.
279) Através deste estratagema que sabia ser idóneo, actuou a arguida com o único e exclusivo propósito de determinar CC a entregar-lhe o montante de 45.000.000$00 (€224.459,05).
280) O que conseguiu apenas por aquele estar erroneamente convicto de que era intenção da arguida devolver-lhe, num curto espaço de tempo, o montante mutuado e que as garantias oferecidas pela mesma eram boas para assegurar o pagamento do crédito em caso de incumprimento.
281) Através da descrita conduta, causou a arguida a CC uma diminuição patrimonial de 45.000.000$00 (€224.459,05).
282) Em meados de 2000, na ausência de outros particulares que pudesse enganar com pedidos de empréstimo e porque precisava de dinheiro para manter em funcionamento as “Casas do P...” a arguida formulou novo propósito de obtenção de meios financeiros, desta feita valendo-se do património indiviso da herança de seu pai.
283) Assim, prometeu vender parte do mesmo, sabendo que não possuía legitimidade para dispor de tais bens, mas visando tão só receber adiantamentos sobre o preço de venda, enganando os promitentes adquirentes com a perspectiva de virem a adquirir os imóveis.
284) Na execução de tal propósito, em data não concretamente apurada, mas seguramente anterior a Agosto de 2000, AA contactou de novo com a sociedade imobiliária “P...AAA... L..., Lda.”, sita na Avenida da R..., nº ..., ... andar, em Lisboa e solicitou a esta agência que encontrasse um cliente interessado na aquisição do prédio urbano sito na Praça do B..., ns.º ..., ..., ...A da freguesia de S. S..., em Setúbal, descrito na ...ª Conservatória do Registo predial de Setúbal sob o nº ... do Livro B-..., inscrito na matriz sob o nº ... da freguesia de Santa Marta.
285) Para isso, a arguida afirmou ser este bem propriedade da sua família, referindo a existência de um acordo de partilha.
286) O imóvel ainda se encontrava em nome de HHH, pai da arguida e fazia portanto parte da herança aberta por óbito deste e tinha, já em 1995 o valor de 127.600.000$00 (cento e vinte e sete milhões e seiscentos mil escudos).
287) A arguida já realizara, anteriormente, outros contratos imobiliários com a “P...AAA...L..., Lda.”, arrogando-se sempre descendente de uma família ilustre da Golegã, jurista e funcionária técnica superior da Procuradoria – Geral da República.
288) Mais, alegava a arguida que um dos seus irmãos era Presidente da Câmara Municipal da Golegã e um outro um conceituado engenheiro da região.
289) Assim, em Agosto de 2000, a funcionária da “P...AAA...L..., Lda.”, III contactou com DD, cliente dessa sociedade há já alguns anos e perguntou-lhe se o mesmo não estaria interessado na compra desse imóvel, dando-lhe todas as referências acima elencadas sobre a arguida AA e sua família.
290) III referiu a DD que o prédio tinha vaga a casa da porteira e o ...º andar.
291) Que o imóvel seria vendido no estado de conservação em que se encontrava, livre de quaisquer ónus ou encargos.
292) De que o rendimento mensal proveniente das rendas do imóvel era de 277.467$00 (€1.384).
293) De que a escritura de compra e venda seria celebrada logo que os inquilinos tivessem sido notificados para exercer preferência e os vendedores tivessem a documentação em ordem para outorga daquela.
294) E que o referido prédio constituía bem de uma herança da qual eram herdeiros a arguida AA, a sua mãe e irmãos, estando o processo de partilha em fase de conclusão.
295) Na sequência das informações que lhe haviam sido transmitidas por III e após se ter deslocado a Setúbal para ver o imóvel, DD aceitou comprá-lo pelo preço de 100.000.000$00 (€498.797,90).
296) Nessa sequência, no dia 26 de Agosto de 2000, DD celebrou com a sociedade “P...AAA...L..., Lda.” o contrato de mediação imobiliária/ declaração de venda sob o nº ..., nos termos do qual entregou, desde logo, a esta agência, a título de sinal e de reserva do imóvel, o cheque nº -----------, sacado sobre a sua conta de depósitos à ordem nº 00..., do BES, Agência do Rossio, datado do próprio e referido dia e preenchido pelo valor de 30.000.000$00 (€149.639,37).
297) O contrato-promessa de compra e venda seria assinado nos escritórios da “P...AAA...L..., Lda.”, no prazo máximo de 8 dias.
298) O remanescente do preço seria pago no acto da realização da escritura pública de compra e venda.
299) Após ter redigido o contrato-promessa de compra e venda, de acordo com as indicações dadas pela arguida AA e por DD e de acordo com as condições entre estes negociadas, a “P...AAA...L..., Lda.” convocou os promitentes-vendedores e o promitente -comprador para se deslocarem ao seu escritório, para assinatura do referido contrato.
300) Assim, no dia 4 de Setembro de 2000,DD, a arguida AA e JJ, deslocaram-se às instalações da “P...AAA...L..., Lda.” para então procederem à assinatura do acima referido contrato-promessa de compra e venda e respectivo aditamento entretanto elaborado.
301) De acordo com esse contrato-promessa e respectivo aditamento, NN - mãe da arguida AA - por si, e na qualidade de gestora de negócios dos seus filhos JJJ e LLL e respectivas mulheres e a arguida AA prometiam vender, livre de quaisquer ónus ou encargos, à sociedade “A... S...MMM... e J...S..., Lda.”, representada por DD, o prédio urbano sito na Praça do B..., nºs ..., .., ...A da freguesia de S. S..., em Setúbal, descrito na ...ª Conservatória do Registo predial de Setúbal sob o nº ... do Livro B-..., inscrito na matriz sob o nº ... da freguesia de S... M..., pelo preço de 100.000.000$00 (€498.797,90).
302) DD assinou o referido contrato em nome e em representação da sociedade “A... S... MMM...J...S..., Lda.”.
303) Entregue o mesmo contrato a AA, a mesma apôs nele o seu nome.
304) O nome de NN foi igualmente aposto pela arguida AA no referido contrato, em data e local não concretamente determinados, como se da assinatura daquela se tratasse – ficando assim o contrato-promessa como se assinado em seu nome pessoal e em gestão de negócios dos seus filhos e noras.
305) Na mesma data, pelo funcionário da “P...AAA...L..., Lda.”, NNN foi entregue a DD o cheque nº ------------ que este tinha entregue à imobiliária no dia 26 de Agosto de 2000 e solicitado que este emitisse dois cheques que, conjuntamente perfizessem o valor total do primeiro.
306) Assim, DD, nesse dia, emitiu e entregou à arguida AA os cheques nsº -------- e -------, emitidos a favor desta, ambos sacados sobre a sua conta de depósitos à ordem nº --------, do “BES”, Agência do Rossio, datados de dia 1 de Setembro de 2000, preenchidos pelo valor respectivo de 26.197.500$00 (€130.672,58) e 3.902.500$00 (19.465,59), a título sinal e princípio de pagamento pelo referido imóvel.
307) O cheque nº -------, no valor de 26.197.500$00 , foi entregue pela arguida AA à arguida JJ e depositado por esta, no balcão do BES das Amoreiras, na conta à ordem nº ---/---/---.-, por esta última titulada.
308) A utilização das contas da JJ já há algum tempo havia sido acordada com a arguida AA por esta última ter verificado que não podia utilizar contas bancárias em seu nome, sob pena de os credores bancários imediatamente se fazerem pagar dos valores que viesse a depositar.
309) O cheque nº ------ foi nessa data endossado pela arguida e entregue ao legal representante da “P...AAA...L..., Lda.” para pagamento da comissão referente à venda do imóvel.
310) Nessa mesma data, AA disse a DD que, no prazo máximo de 90 dias, teria pronta toda a documentação necessária para a celebração da escritura pública de compra e venda, uma vez que já tinha chegado a acordo com todos os interessados na partilha de bens por óbito do seu pai, o que, porém, não correspondia à verdade.
311) O contrato definitivo respeitante ao contrato-promessa datado de 1 de Setembro de 2000 nunca chegou a ser celebrado, pese embora as diversas diligências efectuadas por DD junto da arguida AA e da “P...AAA... L..., Lda.”, nesse sentido.
312) Na verdade, NN (mãe da arguida AA) nunca se deslocou às instalações da “P...AAA...L..., Lda.” para a celebração de qualquer contrato-promessa do imóvel sito em Setúbal.
313) A assinatura do contrato – promessa em nome de NN, na verdade, não era a sua, nem esta actuou como gestora de negócios dos seus filhos e cunhadas na elaboração de tal contrato.
314) Com tal actuação ficou DD prejudicado no montante de 30.000.000$00 (€149.639,37).
315) Ao escrever o nome de NN no contrato-promessa e respectivo aditamento acima indicados agiu sempre a arguida movida pelo mesmo propósito de obter para si um benefício económico a que sabia não ter direito, a saber: receber de DD o montante de 30.000.000$00 (€149.639,37) a título de sinal e início de pagamento pela compra de um imóvel que a arguida não tinha legitimidade para dispor, bem sabendo que, com a sua actuação provocava necessariamente uma diminuição no acervo patrimonial deste.
316) Bem sabia a arguida que a assinatura aposta nesses documentos como sendo de NN não tinha sido realizada pela mesma e que ao forjá-la o fez com o desconhecimento e contra a vontade da mesma, tendo perfeita consciência de que estava vedado a qualquer pessoa inscrever em tal documento, assinatura que não lhe pertencia.
317) Com a sua actuação procurou a arguida fazer crer perante terceiros que os elementos constantes do referido contrato eram verdadeiros e, consequentemente, colocou a arguida em causa a veracidade que revestem perante a generalidade das pessoas os elementos constantes de documentos emitidos por particulares, assim causando um prejuízo a terceiros.
318) Na celebração de tal contrato promessa actuou a arguida com o propósito de induzir em erro DD, quanto à vontade contratual de NN e seus filhos, irmãos da arguida, por forma a, por intermédio de tal artifício, lograr obter deste o montante respeitante ao sinal do referido contrato, benefício económico que sabia não lhe ser devido.
319) Com a sua conduta, bem sabia a arguida que causava, como causou, uma diminuição patrimonial a DD, no valor de 30.000.000$00 (€149.639,37).
320) Face à necessidade de dinheiro, AA decidiu continuar a fazer valer os seus conhecimentos profissionais, decorrentes do seu exercício de funções na Procuradoria Geral da República, com a consequente facilidade em proporcionar contactos e agilizar decisões, mesmo em sede de processos pendentes nos Tribunais e no Ministério Público.
321) A arguida formulou assim novo plano apesar de saber que pendia contra si um pedido de falência, apresentado pelo “BPSM”, tendo sido citada para o contestar na data de 18 de Janeiro de 2001.
322) Ora, em Março de 2002, a arguida foi apresentada por OOO a EE, sócio gerente de uma sociedade de mediação imobiliária denominada “M...PPP...V..., Lda.”.
323) O conhecimento entre a OOO e AA havia sido proporcionado pela arguida JJ, de quem a primeira era amiga.
324) A arguida JJ sabia que a referida OOO era colaboradora de EE junto da referida sociedade imobiliária e introduziu a arguida AA como sendo uma pessoa que teria ligações ao poder e que poderia ajudar EE a encontrar um imóvel, que este tinha interesse em adquirir para um seu cliente.
325) Na sequência desta informação e após ter confirmado junto de AA que esta tinha conhecimento de um imóvel na Junqueira e outro na Avenida D. H..., em Lisboa, que estariam para venda e sabendo que esses imóveis poderiam interessar ao cliente de EE, OOO decidiu apresentá-lo à arguida.
326) Num encontro que decorreu numa pastelaria da Avenida I... S..., em Lisboa, a arguida AA apresentou-se perante EE como sendo funcionária da Procuradoria Geral da República.
327) Em momento anterior já OOO tinha referido a EE que a arguida exercera funções de Secretária, da Procuradoria Geral da República.
328) Tais factos geraram em EE uma grande confiança nos negócios que eventualmente viesse a celebrar e em que a arguida AA fosse interveniente.
329) Por sua vez, esta logo identificou em EE a pessoa indicada para procurar enganar, de modo a sacar-lhe montantes financeiros para os seus gastos pessoais.
330) Nesse primeiro encontro, a arguida AA abordou diversos assuntos relativos à actividade do EE, tendo este acabado por lhe referir que tinha um litígio com a Câmara Municipal de Cascais devido a uma expropriação de que tinha sido alvo e que tinha apresentado junto do “IGAT” uma exposição dando conhecimento de uma reclamação apresentada junto da Câmara Municipal de Cascais e sobre a qual ainda não obtivera qualquer resposta.
331) EE referiu também à arguida que tinha apresentado uma queixa crime contra o seu ex-Advogado QQQ pela prática de crimes de abuso de confiança, tendo o mesmo sido acusado pelo Ministério Público.
332) EE explicou ainda que o Dr QQQ havia requerido a abertura da instrução e que havia sido proferido despacho de não pronúncia pela Juiz de Instrução Criminial do Tribunal de Instrução Criminal de Lisboa.
333) EE informou que havia recorrido desse despacho, encontrando-se, naquela data, a questão pendente de recurso junto do Tribunal da Relação de Lisboa.
334) EE transmitiu à arguida a angústia que sentia com a morosidade da resolução desses assuntos que tanto o preocupavam, tendo o mesmo ficado muito sensibilizado com a atenção que lhe estava a ser dispensada pela arguida, sobre tal matéria.
335) De imediato, a arguida AA se prontificou a tentar saber a situação de ambos os processos respectivamente junto do IGAT e do Tribunal da Relação de Lisboa, pedindo a EE que este lhe entregasse toda a documentação que tivesse sobre o assunto.
336) Na verdade, a arguida alegou perante EE conhecer um RRR-“Dr. T...” junto do IGAT e uma SSS-“Dr.ª F...” e que poderia, junto dos mesmos, tentar obter informações sobre o andamento de ambos os processos.
337) EE, crente de que AA lhe dizia a verdade, entregou-lhe dois dossiers contendo, cada um deles, documentação referente ao litígio que o opunha à Câmara Municipal de Cascais e ao Advogado QQQ.
338) Em Maio de 2002, AA conseguiu que EE tivesse uma reunião com o Dr. RRR, Director do “IGAT”, através do respectivo Inspector-Geral, Dr. TTT que é Procurador de carreira e que consigo trabalhara – numa perspectiva de colaboração institucional.
339) O Dr. RRR remeteu-o para um inspector do “IGAT” o qual, poucos meses mais tarde, elaborou um relatório a favor da Câmara Municipal de Cascais e contra as pretensões de EE.
340) Em relação ao processo crime que opunha EE ao seu ex-Advogado, a arguida AA nunca lhe prestou qualquer informação.
341) Ainda com o propósito de conquistar a confiança do EE, a arguida AA facultou a EE o seu número de telefone móvel pessoal, dizendo que era para que sempre que o mesmo pretendesse entrar em contacto consigo não tivesse que passar por nenhuma secretária sua, factor este que aumentou ainda mais a consideração que este tinha pela arguida.
342) Ao mesmo tempo que desenvolvia tais diligências, visando e conseguindo granjear a simpatia de EE, no dia 2 de Maio de 2002, AA dirigiu-se a casa deste, sita em A..., e pediu-lhe emprestado o montante de €39.903,83 (equivalente a oito mil contos) alegando que estava em curso um processo de partilhas de uma herança da sua família e que precisava desse dinheiro para dar tornas aos irmãos.
343) Sucede porém que já antes, em 20 de Fevereiro de 2002 tinha sido declarada falida, por sentença judicial, o que não a inibiu de assim proceder.
344) Acreditando que o que lhe fora dito pela arguida era verdade, EE disse-lhe que tinha possibilidade e disponibilidade monetária para lhe fazer esse favor, mas que seria condição essencial desse empréstimo que a arguida lhe devolvesse tal montante até ao final de Setembro de 2002.
345) A arguida declarou aceitar prontamente tal condição, o que determinou EE a entregar-lhe o cheque nº ---------------, sacado sobre a sua conta de depósitos à ordem nº ---/-------------, do BBVA, agência de Cascais, datado do próprio e referido dia e preenchido pelo valor de €39.903,83.
346) Já então a arguida visualizava não poder pagar qualquer montante a EE.
347) Pese embora esse seu íntimo propósito, a arguida AA actuou sempre visando dar a aparência de garantir o pagamento do empréstimo na forma acordada, tendo assinado, nesse mesmo dia 2 de Maio de 2002, um documento de confissão de dívida.
348) Tal como já acontecera noutras ocasiões, o cheque entregue pelo EE foi depositado, nessa data, na conta de depósitos à ordem nº ----/---/----, titulada pela arguida JJ, junto da Caixa Geral de Depósitos, o qual foi depois dividido pelas duas , em montantes que não é possível concretizar..
349) Aproveitando a confiança conquistada, no dia 16 de Maio de 2002, AA, com o mesmo propósito de sacar dinheiro para seu próprio proveito, dirigiu-se novamente à residência de EE e pediu-lhe mais uma vez emprestado o montante de €12.469,95 (doze mil, quatrocentos e sessenta e nove euros e noventa e cinco cêntimos), alegando novamente, que necessitava desse dinheiro para dar tornas aos irmãos.
350) EE frisou mais uma vez à arguida que só lhe poderia emprestar tal quantia se esta a pudesse devolver dentro do prazo acordado, ou seja, até ao final de Setembro de 2002, ao que a arguida acedeu.
351) Em face do alegado pela arguida e crente de que a mesma lhe iria devolver tal montante logo que pudesse ou, o mais tardar, até finais de Setembro de 2002, EE entregou-lhe o cheque nº ------, sacado sobre a sua conta de depósitos à ordem nº ---/---------, do “BBVA”, agência de Cascais, datado do próprio e referido dia e preenchido pelo valor de €12.469,95.
352) Por sua vez, a arguida AA, visando manter a aparência de garantir o pagamento da dívida, escreveu, no documento de confissão de dívida já por si assinado, um aditamento admitindo ter recebido este novo montante e considerando-se também devedora do mesmo.
353) Este último cheque foi levantado em numerário ao balcão do BBVA, no dia seguinte ao da sua emissão, pela arguida JJ.
354) No final de Setembro de 2002, a arguida não devolveu a EE a quantia em dinheiro que este lhe emprestara.
355) Bem como deixou de atender os telefonemas que este lhe efectuava.
356) Em 14 de Março de 2003 EE requereu, perante o 7º Juízo Cível de Lisboa a notificação judicial avulsa de AA para proceder ao pagamento da quantia em dívida ou, em alternativa, fornecer indicações sobre a sua identificação pessoal de modo a poder ser celebrada uma escritura de confissão de dívida a seu favor, sem que porém, a arguida tenha sido localizada pelo Tribunal para se proceder à requerida notificação, pese embora tenha sido procurada nas instalações da PGR.
357) Em 6 de Abril de 2003, a arguida AA, em resposta a diversas cartas que lhe haviam sido enviadas por EE e pelo seu Advogado e de modo a retardar procedimentos que estes diziam ir desenvolver nas instalações da própria PGR, escreveu uma carta dirigida ao Advogado de EE dizendo que tinha enviado uma carta para o seu banco a determinar o seu gerente de conta a efectuar transferências sucessivas de várias prestações para satisfação e cumprimento da dívida em causa.
358) No entanto, tal não correspondia à verdade já que nenhuma transferência foi efectuada a favor de EE.
359) Acresce que, ainda em Abril de 2003, EE escreveu pelo menos uma carta pessoal, dirigida ao Sr. Procurador Geral da República, onde lhe dava conta dos comportamentos que estavam a ser tomados por AA, visando chamar a atenção para o desprestígio que isso implicava para a instituição Procuradoria – Geral da República.
360) Tal carta entrou no normal circuito de papéis da PGR.
361) O desaparecimento da referida carta apenas foi notado, no princípio do ano de 2004, após EE ter mantido entrevista com o então Secretário da PGR, Dr. UUU, a quem expôs a situação ocorrida com AA e deu conhecimento da exposição que tinha apresentado.
362) A arguida AA, até à presente data ainda não devolveu a EE o dinheiro que este lhe entregou.
363) Igualmente a arguida não utilizou tal montante para dar tornas a quem quer que fosse da sua família, fazendo desse montante coisa sua e gastando-o em despesas, repartindo ainda uma parte com a JJ em retribuição da permissão de utilização de contas desta última.
364) A arguida sabia que, ao dizer a EE que era funcionária da Procuradoria Geral da República e que tinha a receber uma herança de família, mostrando-se atenciosa e preocupada com os processos que o mesmo tinha pendentes, gerava neste a confiança de que era uma pessoa que cumpria os seus compromissos negociais, ao ponto de este aceitar conceder-lhe um empréstimo.
365) Sucede, porém, que sabia não poder vir a pagar tais montantes.
366) Na verdade, na data em que solicitou ambos os empréstimos a EE, a arguida AA já tinha sido declarada falida por sentença datada de 20 de Fevereiro de 2002, no âmbito do Processo de Falência 683/00 do Tribunal de Comércio de Lisboa.
367) Com a sua acima descrita conduta procurou, assim, a arguida induzir em erro EE quanto à sua real vontade e capacidade do seu património para solver esta dívida, determinando-o, através deste estratagema, que sabia ser idóneo, a entregar-lhe o montante de €52.373,78, o que logrou alcançar.
368) Através da descrita conduta, causou a arguida a EE o prejuízo de €52.373,78 (cinquenta e dois mil, trezentos e setenta e três euros e setenta e oito cêntimos).
369) Ao receber nas suas contas montantes financeiros que sabia terem origem nas actividades ilícitas da arguida AA , pretendeu a arguida JJ ajudá-la e também obter um ganho através da facilidade concedida àquela, para se apropriar das quantias monetárias que lograra que lhe fossem entregues por terceiros.
370) Em 24 de Novembro de 2000, FF apresentara uma queixa crime junto dos Serviços do Ministério Público do Tribunal Judicial da comarca de Cantanhede, contra o seu ex-sócio VVV, pela alegada prática dos crimes de abuso de confiança e infidelidade, o qual veio a obter o NUIPC 349/00.2TACNT.
371) No decurso do ano de 2002, FF e a sua mulher XXX manifestaram perante uma sua amiga, de nome ZZZ, o seu desconforto com a circunstância de, decorrido tanto tempo, tal processo ainda não se encontrar findo.
372) A referida ZZZ disse então a FF e a XXX que era amiga de uma senhora chamada OOO, que conhecia umas pessoas da Procuradoria Geral da República e que estas talvez os pudessem ajudar na resolução do problema.
373) Efectivamente, cerca de dois meses após esta conversa, em data não determinada do mês de Julho de 2002, a acima mencionada ZZZ apresentou a FF e a XXX a OOO.
374) Sem que tal lhe tenha sido expressamente solicitado, passados uns dias OOO levou as arguidas AA e JJ à residência de FF e de XXX, sita na Rua T... R..., nº ..., ...º Esq., em Lisboa e apresentou-as a estes como sendo “altas funcionárias da Procuradoria Geral da República”.
375) As arguidas AA e JJ tinham sido informadas pela OOO de que o FF tinha interesse no andamento de um processo crime pendente.
376) As arguidas AA e JJ ao saberem que seriam apresentadas ao FF logo acordaram num plano para procurar obterem um ganho à conta da imagem que podiam transmitir por trabalharem na Procuradoria – Geral da República e ainda da promessa de fazerem movimentar o referido Processo no sentido da satisfação dos interesses do referido FF, embora soubessem que não tinham possibilidades funcionais para cumprir tal promessa.
377) Assim, logo na data do primeiro encontro, após terem puxado a conversa para o tema, as arguidas AA e JJ, em execução do previamente combinado, disseram ao FF e à sua mulher XXX, que os poderiam ajudar a fazer avançar o processo com o NUIPC 349/00.2TACTN, no qual FF era queixoso, até mesmo no sentido de ser deduzida acusação nesse processo.
378) A arguida AA explicou mesmo ao FF e a XXX que poderia falar com alguém dentro da Procuradoria Geral da República que por sua vez contactaria o Magistrado titular do processo, para fazer com que o mesmo andasse.
379) De acordo com o plano previamente traçado por ambas as arguidas e de modo a dar credibilidade às suas promessas, a arguida AA referiu ainda que era habitual fazer este tipo de “diligências” e que costumava ter sucesso.
380) Logo que julgaram ter obtido a confiança nas suas capacidades, as arguidas AA e JJ deram a conhecer ao FF e à XXX que só actuariam se estes últimos estivessem dispostos a pagar-lhe a quantia de 3.500.000$00 (€17.457,93).
381) FF disse, no entanto, às arguidas que não estava na disposição de lhes efectuar qualquer pagamento para que o seu processo avançasse, uma vez que tinha um advogado a trabalhar no processo e acreditava que a justiça lhe iria dar razão.
382) Assim, em face da recusa destes em lhes entregar a quantia de 3.500.000$00 (€17.457,93) pela suposta ajuda no avanço do inquérito de Cantanhade, as arguidas AA e JJ decidiram, conforme anteriormente haviam projectado, continuar a agir concertadamente, com vista a, aproveitando a confiança adquirida nas suas pessoas, obterem outros proveitos económicos, a que sabiam não ter direito, em prejuízo de FF e XXX.
383) Com efeito, as arguidas AA e JJ haviam-se apercebido que FF e XXX se dedicavam à venda de quadros originais e outras obras de arte, logo tendo formulado o projecto de virem a adquirir algumas pinturas sem terem que pagar o respectivo preço, tendo em vista procederem de imediato à sua venda a terceiros, obtendo assim os montantes financeiros que desejavam.
384) O plano concebido pelas arguidas passava pela utilização de cheques de uma conta da JJ – a arguida AA já tinha sido declarada falida -, que seriam entregues para pagamento, mas que seriam dados sem efeito perante o Banco, de modo a evitar o seu pagamento, assumindo, por outro lado, a arguida AA o papel de negociação com o FF.
385) Assim, na concretização do plano previamente gizado por ambas as arguidas, em data não determinada do mês de Agosto de 2002, AA voltou à residência de FF e manifestou-lhe o desejo de adquirir duas xilogravuras sobre tela que esta tinha visto em sua casa, a saber:
- uma denominada “Fernando Pessoa”, da autoria de Júlio Pomar, com as dimensões de 150x66cm, com tiragem “prova de autor”, VI de XX, assinada pelo autor no canto inferior direito e não datada, com o valor comercial de pelo menos €3.500,00 ; e
- outra denominada “O Corvo”, também da autoria de Júlio Pomar, com as dimensões de 65x54cm, tiragem 50 de 150, assinada pelo autor no canto inferior esquerdo e não datada, com o valor comercial de pelo menos €1.500,00.
386) A arguida AA alegou que a xilogravura representando a figura de Fernando Pessoa seria para oferecer ao seu marido, que iria fazer anos, e a xilogravura denominada “O Corvo” seria para decorar a sua casa.
387) De início FF mostrou alguma relutância em vender as referidas xilogravuras à arguida AA, até porque se tratavam de obras oferecidas à sua filha, mas acabou por aceitar vendê-las pelo preço de €7.500.
388) AA disse aceitar o referido preço, uma vez que conforme havia planeado com JJ, não pretendia pagar qualquer valor.
389) Em execução desse plano, a arguida AA, alegou que não trazia consigo cheques seus e entregou ao FF um cheque titulado pela arguida JJ, já previamente assinado por esta, conforme havia sido combinado entre as arguidas.
390) Tal cheque tinha o nº -----------, sacado sobre a conta à ordem nº -------- da “Caixa Geral de Depósitos” agência do Calhariz, titulada pela arguida JJ e foi preenchido, em execução do acordo entre as duas, pela arguida AA, pelo valor de €7.500, pré-datado para o dia 30 de Setembro de 2002 .
391) De modo a manter a coerência com a versão apresentada sobre o destino dos quadros, que seriam para a própria arguida, AA disse a FF que, posteriormente, trocaria aquele cheque por um outro da sua própria conta logo que possuísse cheques por si titulados.
392) Pese embora tal situação não fosse muito usual nas transacções comerciais por si efectuadas, FF acabou por a aceitar uma vez que tinha conhecido a arguida JJ e sabia que ambas as arguidas eram altas funcionárias da Procuradoria Geral da República e que lhe mereceriam toda a confiança.
393) A arguida AA abandonou assim a casa de FF na posse das duas xilogravuras acima referidas.
394) Face ao êxito das suas condutas, as arguidas decidiram de imediato voltar a insistir junto do FF no sentido de o levarem a aceitar a venda de outros quadros, utilizando o mesmo tipo de pagamento fraudulento e com o mesmo propósito de procurarem, de seguida, vender as obras a terceiros.
395) Assim, passadas cerca de duas horas, a arguida AA, de acordo com o previamente combinado com a arguida JJ, deslocou-se novamente a casa de FF e disse-lhe que também pretendia comprar dois desenhos do Júlio Pomar que tinha visto na sua casa, a saber:
- um denominado “Camaleão”, em papel colado sobre tela, com as dimensões de 105x75,5,cm, assinado no canto inferior direito e datado de 1982 e com o valor comercial de, pelo menos, €7500; e
- um outro, denominado “Desenho Erótico”, também em papel colado sobre tela, com as dimensões 100x73cm, assinado no canto inferior esquerdo e datado de 1976 e com o valor comercial de, pelo menos, €5000,
alegando, pois, que tinha estado a falar com a arguida JJ e esta havia-lhe dito que era melhor oferecer um desenho original ao marido.
396) Convencido de que estava perante pessoas de bem e que os desenhos lhe seriam pagos, FF aceitou vender os desenhos originais de Júlio Pomar à arguida AA pelo preço de €17.500.
397) Para pagamento do desenho a arguida voltou a entregar a FF um cheque titulado pela arguida JJ, já previamente assinado por esta, conforme tinha sido combinado entre as arguidas.
398) Tal cheque tinha o nº ---------, sacado sobre a mesma conta nº -------------- da Caixa Geral de Depósitos agência do Calhariz, titulada pela arguida JJ, e foi preenchido, conforme acordo entre as arguidas, pela AA pelo valor de €17500, pré-datado para o dia 30 de Setembro de 2002.
399) A arguida AA abandonou assim a casa de FF na posse dos dois desenhos acima referidos.
400) Na posse das duas xilogravuras e dos dois desenhos, as arguidas AA e JJ desde logo procuraram vendê-los de modo a assim poderem vir a obter dinheiro com os mesmos.
401) Para o efeito, ainda nesse mês de Agosto de 2002, a arguida AA contactou, então, com AAAA, um antiquário seu conhecido e perguntou-lhe se o mesmo não estaria interessado em comprar as xilogravuras e os desenhos de Júlio Pomar que a mesma conseguira obter de FF.
402) AAAA respondeu à arguida AA que não comercializava em pintura moderna, encaminhando-a para uma sua amiga chamada BBBB, proprietária de uma galeria de arte moderna em Colares.
403) Assim, no dia 20 de Agosto de 2000, as arguidas AA e JJ deslocaram-se à residência de BBBB, em Lisboa, onde a arguida JJ referiu as características das duas xilogravuras e dos dois desenhos de Júlio Pomar à potencial compradora das obras, acrescentando esta arguida que estava com um problema pessoal e que necessitava de dinheiro imediatamente.
404) Após negociações entre as três, BBBB acabou por aceitar comprar as quatro obras de Júlio Pomar às arguidas pelo preço de €4.857,00, sendo certo que as arguidas exigiam como condição da venda o pronto e integral pagamento por parte da compradora.
405) Para o efeito, nesse mesmo dia, BBBB entregou à arguida JJ o cheque nº ----------, sacado sobre a conta à ordem nº --------- do Banco Atlântico, por si titulada, datado do próprio e referido dia e as arguidas entregaram a BBBB as duas xilogravuras e os dois desenhos de Júlio Pomar.
406) A arguida JJ procedeu ao levantamento do montante titulado pelo cheque em instituição bancária não determinada, em data próxima à da sua data de emissão, entregando metade desse valor à arguida AA.
407) Chegada a data do vencimento dos cheques que a arguida AA tinha entregue a FF e como esta arguida nunca mais o contactou no sentido de proceder à troca dos cheques titulados por JJ por outros seus, aquele telefonou-lhe, tendo a arguida dito que poderia apresentar os cheques no banco para pagamento, que não haveria qualquer problema.
408) Em data não determinada, mas seguramente posterior à data aposta nos cheques (ou seja, após 30 de Setembro de 2002), FF apresentou os referidos cheques a pagamento na agência do BES da Avenida da Liberdade, em Lisboa, tendo os mesmos sido devolvidos ao seu apresentante com a menção “vício na formação da vontade”.
409) Na verdade, conforme o planeado entre as duas arguidas, já no dia 26 de Setembro de 2002, a arguida JJ se havia deslocado à agência do Calhariz da Caixa Geral de Depósitos e aí solicitado o cancelamento dos cheques por si titulados com o nº -------- e ---------, alegando “acordo estabelecido com os beneficiários”.
410) Nem na data da emissão dos cheques, nem da data do seu respectivo vencimento a arguida JJ dispunha de montante suficiente na sua conta para que os mesmos viessem a ser cobrados.
411) Nem a arguida AA, nem a arguida JJ pagaram, até hoje, o montante das xilogravuras e dos desenhos a FF, fazendo dos mesmos coisa sua.
412) FF ficou assim prejudicado mo montante de €25.000, correspondente ao valor da venda das xilogravuras e dos desenhos que entregou à arguida AA.
413) Ao solicitar a FF o montante de 3.000.000$00 (€14963.94) para que fosse deduzida uma acusação, a curto prazo, no processo com o NUIPC 349/00.2TACNT, bem sabia a arguida AA que, pelas funções que exercia na Procuradoria Geral da República, gerava naquele uma falsa expectativa de que fosse proferido tal despacho no inquérito no qual era queixoso.
414) Pretendeu a arguida AA obter para si proveito económico, valendo-se da sua posição de funcionária da Procuradoria Geral da República para fazer crer a que teria influência suficiente sobre o Magistrado do Ministério Público titular do referido inquérito, para que nele fosse deduzida brevemente uma acusação.
415) Mais sabia ainda a arguida que, com esta sua actuação, punha em causa a fé pública nas instituições judiciais e no normal prosseguimento da acção penal.
416) A arguida apenas não logrou alcançar os seus objectivos, em virtude de FF ter declinado a proposta que lhe foi efectuada.
417) Ao solicitar a FF que este lhe vendesse as xilogravuras e os desenhos de Júlio Pomar, a arguida AA agiu sempre de comum acordo com a arguida JJ, em execução de um plano por ambas previamente traçado, com vista a alcançarem proventos económicos a que sabiam não ter direito.
418) Com a sua actuação, e segundo esse plano, procuraram as arguidas induzir em erro FF quanto ao seu real interesse em adquirir para si as referidas xilogravuras ou os desenhos de Júlio Pomar, bem como quanto à sua real vontade de efectuar o pagamento dessas obras.
419) Através do esquema montando, confiando que as arguidas, sendo “altas” funcionárias da Procuradoria Geral da República, seriam pessoas de confiança, a quem poderia, com segurança, vender os referidos objectos, FF aceitou os cheques titulados pela arguida JJ, embora fossem pré-datados e entregou à arguida AA as xilogravuras e os desenhos.
420) Bem sabiam as arguidas AA e JJ que os cheques entregues para pagamento desses objectos nunca iriam ser pagos, tendo a arguida JJ, para o efeito, solicitado junto do Banco o cancelamento desses cheques quatro dias antes da data neles apostas.
421) Através da descrita conduta, causaram ambas as arguidas a FF o prejuízo de €25.000.
422) No dia 21 de Setembro de 2000 o Banco Pinto & Sotto Mayor (actualmente incorporado no Banco Comercial Português, SA), intentou uma acção especial de falência que corre seus termos no Tribunal de Comércio de Lisboa sob o nº 683/00, onde requereu que fosse declarada a falência de AA .
423) Por decisão datada de 20 de Fevereiro de 2002 a referida arguida foi declarada falida e, consequentemente, ordenada a apreensão da totalidade dos seus bens, incluindo, necessariamente, o prédio na Golegã denominado “Quinta das O...” e já acima melhor descrito, bem como os bens móveis, pertença da falida, que se encontrassem no seu interior.
424) Tendo tomado conhecimento dessa decisão, desde logo a arguida AA e a um dos seus Advogados cuja identidade não foi possível apurar, elaboraram um plano com vista a frustar a efectiva apreensão dos bens móveis existentes na “Quinta das O...” e que fariam do empreendimento turístico denominado “Casas do P...”.
425) Com efeito, em 14 de Agosto de 1998 havia sido constituída a sociedade “B... Investments Limited”, com sede em Gibraltar tendo por objecto “levar a cabo os negócios de uma sociedade financeira e de investimentos e com este fim adquirir participações sociais, nomeadamente quotas, acções, bens e outros valores de outras sociedades, adquirir por compra ou de outra forma e vender propriedades, terrenos e imóveis ou quaisquer outros bens móveis, direitos e interesses das mesmas em qualquer parte do mundo”.
426) Em data não determinada, mas seguramente entre 14 de Agosto de 1998 e Março de 2002, a arguida AA tornou-se a única titular desta “off-shore”.
427) Em 19 de Dezembro de 2000 foi conferido pela “B... Investments Limited” à arguida LL os mais amplos poderes para vincular esta sociedade nos negócios que entendesse celebrar.
428) Assim, tendo em carteira a referida “B... Investments Limited”, a arguida AA e o referido Advogado que não foi possível identificar, lembraram-se de utilizar esta sociedade para frustrar a efectiva apreensão do imóvel.
429) Tendo conhecimento que a apreensão iria ter lugar no dia 26 de Março de 2002, no dia 25 de Março de 2002, o referido Advogado com o conhecimento e aprovação da arguida AA solicitou ao colaborador do seu escritório, CCCC que este, a partir dessa data, passasse a representar em Portugal a sociedade “B... Investments Limited”, sendo-lhe proposto um vencimento mensal num valor entre 130.000.000$00 a 150.000.000$00, para o exercício dessa função.
430) Eram Advogados da arguida AA, a ora arguida LL e o seu colega de escritório, DDDD.
431) O arguido CCCC aceitou tal proposta, tendo, nessa mesma data, assinado um documento que o constituía como representante da “B... Investments Limited”.
432) Na noite desse mesmo dia 25 de Marçode 2002, alguém que não foi possível apurar falou com CCCC e disse-lhe que este teria de comparecer, no dia seguinte, na “Quinta das O...”, na Golegã, na qualidade de representante da sociedade “B... Investments Limited”, para acompanhar uma diligência que aí teria lugar.
433) Com efeito, no dia 26 de Março de 2002, EEEE, liquidatária judicial da falência, acompanhada de um oficial de justiça do Tribunal de Comércio de Lisboa e de dois membros da Comissão de Credores, deslocou-se à “Quinta das O...”, na Golegã, a fim de, no cumprimento da sentença datada de 20 de Fevereiro de 2002, proceder à elaboração do auto de apreensão dos bens móveis e imóveis existentes naquela propriedade e que pertencessem à arguida.
434) Nessa data, na “Quinta das O...”, encontrava-se CCCC, colaborador do arguida LL e DDDD, o qual, seguindo as instruções recebidas de um destes, se apresentou perante a liquidatária judicial, o oficial de justiça do Tribunal de Comércio e credores da massa falida, como representante de uma sociedade denominada “B... Investments Limited”, alegando que esta seria cessionária da exploração do empreendimento turístico ali existente, ou seja, das “Casas do P...”.
435) Em face desta alegação a Sr.ª Liquidatária Judicial decidiu-se pela apreensão de todos os bens móveis e imóveis “ficando, no entanto, suspensa a apreensão dos bens móveis até ser entregue documento autenticado do contrato de cedência para análise e veracidade da sua legalidade” .
436) Dias após a diligência, tendo recebido uma carta da Sr.ª Liquidatária Judicial a solicitar cópia do contrato de cedência de exploração das “Casas do P...”, um dos referidos Advogados da arguida AA, com o consentimento e aprovação desta, elaborou um documento denominado “Contrato de Cessão de Exploração”, na qual foi aposta a data de 15 de Maio de 2000.
437) Nos termos desse contrato, a arguida AA declarava ceder à sociedade “B... Investments Limited”, com sede em Gibraltar, representada pelo referido CCCC, a exploração do empreendimento denominado “Casas do P...” .
438) Tal documento foi, nessa data, apresentado a CCCC que o assinou.
439) Acompanhando esse documento assim assinado, alguém do escritório da arguida LL e seu colega DDDD, enviou para a Sr. Liquidatária judicial um documento com o seguinte conteúdo:
“Na sequência do seu fax de 28 de Março p. p., sou a enviar cópia certificada do contrato de cessão de exploração do estabelecimento existente na Rua do T... e Rua R... da C..., na Golegã, denominado “Casas do P...”.
440) Aproveito para referir que nada ficou combinado no local “Aquando da apreensão”, a não ser a entrega de cópia deste contrato, que nesse dia mostrei a quem o quis ver.
Sem outro assunto, subscrevo-me, com cumprimentos”.
441) Tal carta finaliza com uma rubrica como se da rubrica de CCCC se tratasse.
442) No entanto, o mesmo nunca escreveu nem assinou esse documento.
443) A partir daí CCCC nunca mais representou a “B... Investments Limited”, nunca tendo recebido qualquer remuneração pelas funções de representação que lhe haviam sido solicitadas.
444) Ao elaborar o documento denominado “Contrato de Cessão de Exploração” acima mencionado, agiu um dos referidos Advogados não obstante bem saber que a arguida AA, em 15 de Maio de 2000, nunca cedera a exploração do empreendimento das “Casas do P...” a quem quer que fosse e muito menos à “B... Investiments Limited”.
445) Pretendeu esse Advogado, através do fabrico de tal documento, fazer crer perante terceiros, designadamente, perante a Sr.ª Liquidatária Judicial da massa falida, que os bens móveis existentes na “Quinta das O...” não estavam, há já dois anos, na posse da falida.
446) Tal como o não estava a referida exploração, dela estando despojado o direito de propriedade da arguida.
447) Estando assim afectos a outra entidade, visando que os mesmos não fossem apreendidos ou no caso do imóvel, a posse e exploração o não fosse também, no âmbito dos autos de falência e consequentemente, mantendo-se a arguida AA na posse e fruição dos mesmos.
448) Termos em que, foi colocada em causa a veracidade que revestem perante a generalidade das pessoas os elementos constantes de documentos emitidos por particulares, assim se pretendendo causar um prejuízo aos credores da massa falida.
449) Em continuação do seu propósito de utilizar a sua situação funcional, em sede da PGR, para conseguir alcançar proveitos económicos, a arguida AA decidiu procurar abordar pessoas conhecidas a fim de as enganar com a falsa informação de estarem a ser investigadas criminalmente, com o propósito de fazer com que as mesmas realizassem pagamentos a seu favor .
450) Para o efeito, em data não concretamente determinada do mês de Fevereiro de 2004, a arguida AA telefonou para um seu conhecido de nome GG e disse-lhe que necessitava de se encontrar com ele com muita urgência, nas “Casas do P...”, na Golegã, para tratar de um assunto do interesse do referido GG.
451) (17)
452) Na data e hora combinados, GG deslocou-se ao local acima indicado onde se encontrou com a arguida AA.
453) Nesse encontro a arguida disse a GG que tinha dado entrada na Procuradoria Geral da República uma denúncia anónima contra si, cujo conteúdo desconhecia, e que, caso este estivesse interessado, poderia dar o seu contacto telefónico a uma pessoa sua conhecida que o ajudaria.
454) Cerca de uma semana depois, GG recebeu um telefonema de uma pessoa do sexo masculino, que lhe disse que vinha da parte da arguida AA e que GG já saberia do que se tratava.
455) GG marcou então um encontro com o referido indivíduo, para uma data próxima, na esplanada da pastelaria “Mexicana”, em Lisboa.
456) Na data e hora marcados compareceu perante GG um indivíduo que lhe disse ser Magistrado e que estava a investigar uma denúncia contra ele apresentada que se encontrava em fase de inquérito.
457) Durante a conversa que ambos tiveram, o referido indivíduo mostrou a GG uma folha com o timbre da Procuradoria Geral da República onde se encontrava o nome de “GG”.
458) O mencionado indivíduo disse ainda a GG que a denúncia contra si apresentada estava relacionada com um alegado tráfico de influência por si exercido junto do Presidente da Câmara Municipal da Golegã e relacionado com um alcatroamento junto a uma unidade de eventos, propriedade da sociedade da qual é sócio, denominada “V... – Sociedade Agrícola e Imobiliária, S.A.”, bem como relativa à compra de diversos terrenos na zona da Golegã efectuados por aquele GG – exposição que dera entrada na “P.G.R.”, mas que não deu origem a qualquer Inquérito.
459) GG disse ao referido indivíduo que tal denúncia não fazia qualquer sentido, tendo este respondido que GG não se devia esquecer de agradecer à arguida AA.
460) O referido indivíduo repetiu por diversas vezes a ideia de que GG deveria agradecer à arguida AA a informação prestada.
461) Porém, GG nunca mais contactou com esta arguida.
462) (18)
463) (19)
464) (20)
465) Conforme resulta da narração supra, entre 1996 e 2002, AA solicitou à banca e a particulares diversos empréstimos em situação de incumprimento, os quais perfizeram, na totalidade, o montante global de 1 321 200$00 (um milhão, trezentos e vinte e um mil e duzentos escudos).
466) No entanto, e pese embora esses créditos que sobre si pendiam, a arguida AA na posse dos montantes pecuniários conseguiu arranjar, dissipou-os em gastos, basicamente no arranjo e decoração do empreendimento turístico “Casas do P...”.
467) Entrando numa espiral de endividamento.
468) Dispondo-se a obter dinheiro a qualquer preço.
469) A partir do ano de 1996, tendo a arguida AA deixado de proceder ao pagamento pontual das suas obrigações, decidiu então arranjar formas de ocultar os montantes por si recebidos de terceiros e que impossibilitavam aos seus credores a cobrança dos créditos que tinham sobre a mesma.
470) Por seu turno, a arguida JJ, mantinha com ela uma relação de admiração e amizade, amizade com a arguida AA, embora nunca tenha sido visita de sua casa e a tratasse sempre de “Sr.ª Dr.ª”.
471) Tinha perfeito conhecimento de todos os gastos efectuados por esta arguida, bem como de todos os seus encargos financeiros, acima elencados, apercebendo-se, com clareza, que as despesas realizadas pela arguida AA eram superiores às suas receitas.
472) Atenta essa relação de amizade, a arguida AA sabia, assim, que podia contar com a colaboração da arguida JJ para ocultar o recebimento e utilização dos montantes mutuados, bem com para, mais tarde, evitar que os Bancos se fizessem pagar pelas quantias depositadas nas suas contas, já que aí mantinha saldos negativos.
473) Deste modo, em data não determinada do ano de 1997, a arguida AA solicitou à arguida JJ que esta disponibilizasse as suas contas bancárias para aí efectuar depósitos de parte dos montantes angariados nos moldes acima descritos, ao que esta acedeu.
474) A partir de 1999, o mesmo esquema foi também utilizado para fazer circular as receitas do empreendimento denominado “Casas do P...”, explorado pela arguida AA, que, para o efeito, endossava e entregava à arguida JJ os cheques e quantias em numerário recebidas no âmbito daquela actividade.
475) Evitando assim que tais rendimentos pudessem ser retidos pelos Bancos para pagamento das suas dívidas.
476) Assim, desde 1997, a AA fez creditar na conta nº ---------, titulada pela arguida JJ junto do BCP, os seguintes montantes em cheque:

Cheque nºDataValorOrigem (Banco e nº de conta)
---------10-11-19971.650.000$00
(€8.230,17)
Caixa Geral de Depósitos
---/---/---
---------1-8-19976.500.000$00
(€32.421,86)
BCP
-------------
----------24-2-19981.000.000$00
(€4.987,98)
Caixa Geral de Depósitos
---/---/---
----------21-4-199810.235.000$00
(€51.051,96)
Caixa Geral de Depósitos
Cheque bancário
----------20-5-19986.000.000$00
(€29.927,87)
Caixa Geral de Depósitos
---/---/---
----------24-7-19983.500.000$00
(€17.457,93)
B.Mello
-----------
----------30-7-19983.500.000$00
(€17.457,93)
B.Mello
-----------
----------12-11-19981.050.000$00
(€5.237,38)
Caixa Geral de Depósitos
---/---/---
----------4-12-19981.360.000$00
(€6.783,65)
Caixa Geral de Depósitos
396/211917/300
----------14-12-19981.150.000$00
(€5.736,18)
Caixa Geral de Depósitos
---/---/---
----------27-1-19991.038.750$00
(€5.181,26)
BCP
Cheque de terceiro endossado
----------20-7-19991.100.000$00
(€5.486,78)
Caixa Geral de Depósitos
---/----/---
----------20-6-1999 18.000$00
(€89,78)
BES
Cheque de terceiro endossado
----------24-7-1999500.000$00
(€2.493,99)
Montepio
Cheque de terceiro endossado
----------17-9-19992.000.000$00
(€9.975,96)
BES
Cheque de terceiro endossado
-TOTAL :40.601.750$00
(€202.520,68)
-

477) Igualmente o cheque nº ---------- do “BES”, no valor de 26.197.500$00, emitido por DD e entregue à arguida AA a título de sinal e início de pagamento pela promessa de compra do imóvel sito em Setúbal, foi entregue por esta à arguida JJ e depositado por esta, no balcão do BES das Amoreiras, na sua conta à ordem nº ---/---/---.-.
478) Por outro lado, entre os anos de 1998 e 2004, a arguida AA efectuou também inúmeras transferências bancárias de contas suas para a conta nº ---/---/---, titulada pela arguida JJ, junto da Caixa Geral de Depósitos, a saber:

Tipo de movimentoDataValorOrigem
transferência4-6-19983.500.000$00
(€17.457,93)
Conta Caixa Geral de Depósitos ---/---/---
cheque24-7-19981.000.000$00
(€4.987,98)
Conta Banco Mello
------------
cheque3-8-199830.000$00
(€149,64)
Cheque de terceiro endossado
cheque30-10-19984.000.000$00
(€19.951,92)
Conta Caixa Geral de Depósitos ---/---/---
transferência7-12-1998800.000$00
(€3990,38)
Conta Caixa Geral de Depósitos ---/---/---
transferência13-1-19991800.000$00
(€8.978,36)
Conta Caixa Geral de Depósitos ---/---/---
transferência19-2-1999750.000$00
(€3.740,98)
Conta Caixa Geral de Depósitos ---/---/---
transferência17-9-19991000.000$00
(€4987,98)
Conta Caixa Geral de Depósitos ---/---/---
cheque19-10-1999834.000$00
(€4.159,97)
Cheque de terceiro endossado
transferência11-7-2000570.000$00
(€2.843,15)
Conta Caixa Geral de Depósitos
---/---/---
cheque30-4-2002€5.900,00Cheque de terceiro endossado
cheque2-5-2002€39.903,83Conta no BBVA do
EE
transferência30-7-2002€1.762,71Conta Caixa Geral de Depósitos ---/---/---
transferência24-9-2002€5.280,00Conta Caixa Geral de Depósitos ---/---/---
transferência3-10-2002€1.500,00Conta Caixa Geral de Depósitos ---/---/---
transferência11-2-2003€2.726,18Conta Caixa Geral de Depósitos ---/---/---
transferência21-10-2003€2.000,00Conta Caixa Geral de Depósitos ---/---/---
transferência19-3-2004€2.000,00Conta Caixa Geral de Depósitos ---/---/---
-TOTAL€132.321,01-

479) Para além destes valores acima descritos, foram igualmente depositados pela arguida AA nas contas junto do Crédito Predial Português e da Caixa Geral de Depósitos, tituladas pela arguida JJ diversos montantes em numerário, em valores não concretamente apurados.
480) Estes montantes, assim depositados nas contas da arguida JJ eram posteriormente devolvidos à arguida AA, quer através de cheques emitidos sobre essas contas para pagar aquisições desta arguida, quer através de levantamentos em numerário que aquela arguida entregava a esta, sempre que solicitada para o efeito.
481) Pelo menos a partir de 1999, as contas da arguida JJ foram também utilizadas para a emissão de cheques de garantia dos empréstimos que a arguida AA contraiu junto de outros particulares, designadamente do casal FFFF e GGGG.
482) Tais cheques eram emitidos com datas futuras, pelo menos de um mês, e por valores correspondentes ao capital mutuado, acrescido do juro do primeiro mês, devendo a arguida AA garantir a provisão da conta da arguida JJ ou, pelo menos, o pagamento parcial do empréstimo e a emissão de novo cheque para garantia do remanescente do capital acrescido de um novo montante a título de juros.
483) Assim, a maior parte dos cheques de garantia, emitidos pela arguida JJ e entregues a FFFF e GGGG com referência a empréstimos concedidos à arguida AA, não chegavam a ser presentes a pagamento por serem pagos parcialmente em numerário com a emissão de um novo cheque pelo remanescente de capital e juros em dívida.
484) Ainda na execução do mesmo propósito de ocultar os montantes por si recebidos aos seus credores, a arguida, mal recebia esses montantes em conta, retirava-os de imediato da mesma, não mantendo as suas contas provisionadas, pese embora os montantes que recebeu, desde 1996, da banca e de terceiros.
485) Em consequência destes actos praticados pela arguida AA sendo que em alguns dos quais teve a colaboração da arguida JJ, criaram ambas as arguidas a situação de insolvência da primeira, a qual veio a ser decretada por sentença proferida no dia 20 de Fevereiro de 2002, nos autos de falência n.º 63/00 do Tribunal de Comércio de Lisboa, transitada em julgado.
486) Nessa sentença foi decidido que AA se encontrava em situação de impossibilidade de cumprir pontualmente as obrigações, não tendo ficado demonstrada a existência de qualquer activo líquido disponível, nem a existência de meios próprios e/ou crédito para satisfazer o seu passivo.
487) Para efeito de liquidação e graduação de créditos, o montante que se veio a apurar como justificado nesses autos de falência foi de €6.045.606,71 (seis milhões, quarenta e cinco mil, seiscentos e seis euros e setenta e um cêntimos), montante no qual se não incluem as quantias obtidas junto de terceiros particulares, que as não reclamaram na falência.
488) As arguidas AA e JJ conheciam todos os factos descritos e quiseram agir da forma como agiram.
489) O que fizeram com o propósito concretizado de prejudicar os credores da arguida AA e de obter para esta um benefício patrimonial correspondente, propósito esse que, efectivamente, concretizaram, na sequência da execução do plano entre ambas anteriormente delineado.
490) As arguidas agiram em proveito da arguida AA, muito embora soubessem que as condutas por ambas assumidas, individualmente ou de comum acordo, e tal como foram gizadas e desencadeadas, eram aptas a prejudicar os interesses dos seus credores.
491) Os factos tiveram repercursão social, com o que foi afectada a imagem da “Procuradoria Geral da Repíublica”.
492) Ao procederem assim, as arguidas actuaram sempre de forma livre, deliberada e consciente e também em conjugação de vontades e esforços, bem sabendo que tais práticas eram censuráveis e puníveis por lei.
493) No ano de 2001, JJ entrou em período de dificuldades económicas.
494) Assim, contactou OOO, que conhecia há vários anos e trabalhava com instituições financeiras, a quem solicitou que diligenciasse pela obtenção de crédito junto da banca, entidades com quem trabalhava.
495) Com efeito, ainda no decurso de 2001, OOO tinha conseguido transferir o crédito à habitação de que aquela era titular junto do “Montepio Geral” para a “Caixa Geral de Depósitos”, com aumento do valor do crédito.
496) Conseguiu assim esta crédito bancário, no valor de 200 000€ (duzentos mil euros).
497) Com efeito, decidira fazer obras, na casa da Mãe.
498) No entanto, pese embora tivesse conseguido obter tal montante junto da banca, no Verão de 2001 contactou a referida OOO, a quem referiu necessitar de mais dinheiro.
499) Sabendo da dificuldade que a mesma teria em obter um novo empréstimo da Banca, OOO disse-lhe que seria melhor obter um financiamento junto de um particular, dispondo-se a apresentar-lhe o seu amigo EE.
500) Assim, em 27 de Setembro de 2001, JJ, acompanhada de OOO, deslocou-se a casa de EE, em Alcabideche, onde foi apresentada como funcionária da Procuradoria-Geral da República.
501) O que gerou em EE confiança, nos negócios que eventualmente viesse a celebrar com a arguida.
502) E, nesse próprio dia JJ pediu emprestada a EE a quantia de 2 300 000$00 (dois milhões e trezentos mil escudos), para realizar O... em casa de que era dona.
503) EE com isso concordou e disse-lhe que lhe emprestaria tal quantia, mas que seria condição essencial do negócio que a arguida lhe devolvesse tal montante, quando lho solicitasse.
504) Porque a arguida JJ aceitou, EE entregou-lhe a quantia de 2 300 000$00 (dois milhões e trezentos mil escudos).
505) Tendo a arguida, em contrapartida, preenchido e entregue a EE o cheque n.º --------, sacado dobre o “B.B.V.A.”, agência de Cascais, pelo mesmo valor do empréstimo.
506) Servia o mesmo para garantir ao mutuante, o respectivo pagamento.
507) O cheque entregue por EE a JJ foi por esta apresentado a pagamento, logo no dia seguinte, conseguindo JJ a quantia que o mesmo titulava.
508) Em 4 de Dezembro de 2 001, JJ, com o mesmo propósito e porque necessitava de mais dinheiro dirigiu-se novamente à casa de EE e aí, pediu-lhe emprestados mais 4 000 000$00 (quatro milhões de escudos).
509) Referiu novamente que precisava de dinheiro, para as O... que vinha fazendo.
510) EE frisou mais uma vez à arguida que só lhe poderia emprestar tal quantia, se esta pudesse devolver-lhe tal montante quando este o solicitasse, no que a arguida acedeu.
511) Crendo nisso, EE entregou-lhe a quantia referida, através do cheque n.º -------, sacado sobre o “B.B.V.A.”, agência de Cascais, datado do próprio dia e no valor de 4 000 000$00 (19951.91€).
512) Na mesma data, JJ preencheu, assinou e entregou ao assistente um cheque de garantia, com o n .º ------------, sacado sobre a conta ------------, do “Montepio Geral”, agência da Rua do Ouro, sem data preenchida e no mesmo valor de 4 000 000$00 (19 951.91€).
513) O cheque entregue por EE a JJ foi por esta apresentado a pagamento, tendo a arguida obtido para si o montante nele aposto.
514) Em meados de 2003, JJ que até à data se mostrara próxima de EE, deixou de o contactar, revelando-se também incontactável para este, quer através do telemóvel quer do telefone da Procuradoria Geral da República, onde a mesma pedia para informarem que já aí não se encontrava.
515) Passou então EE a desconfiar da liquidez e solvabilidade da arguida.
516) Dado o lapso de tempo entretanto decorrido e a mudança de moeda, de escudos para euros, os cheques que tinham sido entregues por JJ não podiam já ser apresentados a pagamento pelo que o mesmo com eles não se podia pagar.
517) Assim e por essa data, EE pediu a OOO que efectuasse diligências junto de JJ para que esta, não podendo pagar-lhe, lhe prestasse nova garantia, trocando os cheques em escudos, por um outro com o valor em euros.
518) Assim, em data não apurada de 2003, mas seguramente anterior a 10 de Novembro de 2003, a arguida deslocou-se a casa de EE e aí, entregou-lhe o cheque n.º --------, sacado sobre a conta n.º ---------------, da “Caixa Geral de Depósitos”, agência do Calhariz, no valor de 29 929.00€ (vinte e nove mil, novecentos e vinte e nove euros).
519) Tal cheque substituiu os anteriormente entregues pela arguida.
520) Que assegurou a EE que lhe pagaria o montante em dívida, o que faria logo que obtivesse um empréstimo da “Caixa Geral de Depósitos”.
521) Em Novembro de 2003, EE necessitou do dinheiro que tinha emprestado a JJ, para concretizar um negocio que tinha planeado.
522) Tentando, quer pessoalmente quer através de OOO, que a arguida lhe devolvesse o dinheiro emprestado.
523) Sentindo-se responsável pelo sucedido, OOO chegou a efectuar um pedido de empréstimo junto da “C.G.D.”, em nome de JJ.
524) Pedido que foi indeferido liminarmente, dado o montante do seu vencimento e dadas bancárias já contraídas pela arguida.
525) Entendendo como ultrapassado o prazo razoável sem que esta arguida lhe devolvesse o montante emprestado, em 10 de Dezembro de 2003, EE apresentou a pagamento o cheque n.º ---------, sacado sobre a conta n.º -----------, titulada por JJ e sedeada na agência do Calhariz.
526) O pagamento de tal cheque foi recusado pela “C.G.D.”, por o cheque ter sido cancelado e devolvido, com a menção “acordo estabelecido com os seus beneficiários”.
527) Na verdade, já em 8 de Outubro de 2002 JJ tinha dado ordem ao seu Banco para proceder ao cancelamento do referido cheque, alegando falsamente “acordo estabelecido com os seus beneficiários”.
528) JJ nunca devolveu o referido montante, a EE.
529) AA descende de uma família de proprietários rurais da Golegã, também ligados à criação do cavalo lusitano e com ferro próprio – “V...” e “V...M...”.
530) O Pai era Médico Cardiologista, além de explorar as propriedades da família.
531) AA era a mais velha de três irmãos.
532) Licenciou-se em Direito.
533) Após a licenciatura e por convite do então Senhor Procurador Geral da República Dr. HHHH, ingressou na função pública, como sua Secretária.
534) Aos 24 (vinte e quatro) anos inicia relação de namoro com um vizinho, também proprietário agrícola e médico, com quem viria a casar cinco anos depois.
535) Tem mantido vivência conflitual com a Mãe e irmãos.
536) Casada com o marido em regime de Separação de Bens, nunca lhe deu total conhecimento da situação económica que atravessava, mentindo-lhe mesmo quanto ao facto de estar a receber benefícios da herança familiar.
537) Com efeito, fez da transformação da “Quinta das O...” no empreendimento de turismo rural “Casas do P...” um projecto pessoal.
538) Com as obras e compras para o referido empreendimento, foi acumulando dívidas.
539) Obsessiva na continuação grandiosa do seu projecto, ao saber que um Português ganhara prémio de jogo de valor nos E.U.A., não hesitou em convencer a co-arguida JJ a ir consigo junto do mesmo, na pretensão de conseguir dinheiro emprestado.
540) Tal como, não obstante declarada falida em 20 de Fevereiro de 2002, manteve a exploração comercial das “Casas do P...” até 2004, onde se manteve a sua funcionária IIII com ordenado pago por AA.
541) Há cerca de pelo menos 20 (vinte) anos, altura em que faleceu o Pai, que mantém conflito com a Mãe e irmãos, quanto à partilha da herança.
542) A própria co-arguida JJ chega a emprestar-lhe dinheiro, tal como a referida funcionária IIII, mantendo pelo menos com a primeira também dívida, no valor de cerca de 5 000€ (cinco mil euros).
543) Vive com o marido, Médico e Proprietário Agrícola e duas filhas maiores, Estudantes Universitárias.
544) Confirmou parcialmente os factos de que vem acusada, mas sempre e só na sua vertente objectiva e nunca ao nível do dolo ou intenção.
545) Capaz de negar a evidência, para tudo arranja explicação com rapidez, frieza e convicção.
546) Era profissionalmente considerada e apresentava capacidade de liderança.
547) Não tem antecedentes criminais registados.
548) Já na fase final do julgamento, o marido da arguida adquiriu os créditos do “B.C.P.” sobre esta – que incluíam os do “B.P.S.M.” e do “Banco Melo” – que, em Março de 2004 tinham sido reconhecidos na Falência, no valor de 3 355 206.98€ (três milhões, trezentos e cinquenta e cinco mil, duzentos e seis euros e noventa e oito cêntimos).
549) Para isso, entregou valor não concretamente apurado, mas em montante não superior a 500 000€ (quinhentos mil euros).
550) JJ é a mais nova de duas irmãs, tendo crescido num contexto socio-económico estável.
551) Presa no E.P. de Tires desde Abril de 2004, antes residia com o Marido, Funcionário de Seguradora Reformado e que ganhava cerca de 1 500€ (mil e quinhentos euros)/mês e duas filhas, de 24 (vinte e quatro) e 27 (vinte e sete) anos de idade, actualmente.
552) Fez já uma histerectomia e sofre de hipo-tiroidismo.
553) Vem sofrendo de processo depressivo, estando medicada com ansiolíticos, anti-depressivos e hipnóticos.
554) Na sequência da sua prisão, a sua família passou por dificuldades económicas.
555) Na sequência da sua prisão, as suas filhas sofreram de graves depressões, ambas com tentativas de suicídio num espaço de poucos meses.
556) Tem uma condenação anterior, no Proc.º 23/04, por factos de Março/Abril de 2004 e condenação de Julho de 2005, nos seguintes termos:
- pelo crime de extorsão tentada – pena de 1 (um) ano e 6 (seis) meses de prisão;
- pelo crime de corrupção passiva para acto ilícito – pena de 3 (três) anos e 9 (nove) meses de prisão;
- pelo crime de violação de segredo de justiça – pena de 1 (um) ano de prisão e, em cúmulo, na pena única de 4 (quatro) anos e 6 (seis) meses de prisão.
557) Demonstra arrependimento, pelos factos praticados.
558) Encara e assume, na generalidade, a gravidade dos factos praticados.
559) Via na co-arguida AA um exemplo de educação e compostura, tudo fazendo para lhe agradar.
560) Tinha um sentimento de inferioridade social relativamente à mesma, a par de amizade e consideração.
561) No entanto, aquela sempre manteve para com ela formas de tratamento formais, nomeadamente deixando que a mesma a tratasse por “Dr.ª” e nunca a tendo convidado para sua casa – embora esta não fosse dela hierarquicamente dependente.
562) A arguida JJ deixou que AA utilizasse as suas contas, para lhe agradar e por amizade.
563) Era também profissionalmente considerada e apresentava capacidade de liderança.
564) O marido visita-a regularmente no estabelecimento prisional e aguarda a sua libertação para com ela viver – as filhas, entretanto, autonomizaram-se.
565) Quando sair da cadeia perspectiva ir trabalhar como Secretária para o seu Advogado, Sr. Dr. JJJJ.
566) Mantém ocupação e tem bom comportamento prisional.
567) LLLL é Advogada.
568) Tinha escritório conjunto com o Sr. Dr. MMMM, que fora colega de Faculdade. da arguida AA.
569) Desde Maio/Junho de 2000 que acompanhava juridicamente AA como Advogada, nomeadamente em Execuções e na Falência.
570) Vive com o Marido, que trabalha no Departamento de Compras do “Santander” e ganha cerca de 1 000€ (mil euros)/mês.
571) Como Advogada, ganha pelo menos cerca de 1 600€ (mil e seiscentos euros)/mês.
572) Tem dois filhos, actualmente com 10 (dez) e 6 (seis) anos de idade, que vivem com o casal.
573) Não tem antecedentes criminais registados.
574) A arguida pediu aos seus irmãos JJJ e LLL, a quantia de 40 000 000$00 (quarenta milhões de escudos), já em finais do ano de 1999.
575) JJJ e LLL concordaram em entregar-lhe tal quantia, desde que a arguida assinasse um contrato-promessa de compra e venda nos termos do qual se comprometesse a vender-lhes a sua quota em alguns dos imóveis que constituíam parte da herança aberta por óbito de seu pai.
576) NN doou aos seu dois filhos, irmãos da arguida, com dispensa de colação, a “Quinta do S...”.
577) Já anteriormente ao caso dos autos, CC trinha emprestado 30 000 000$00 (trinta milhões de escudos) a AA, quantia que esta pagou, embora tardiamente.
578) Ao “Banco Mello” estavam disponíveis registos dos financiamentos anteriores, no mapa de centralização das responsabilidades do “Banco de Portugal”, embora não na sua real dimensão.
579) AA pediu dinheiro emprestado ao casal C..., a juros.
580) Estes davam então à arguida peças de ouro, material em que negociavam, para esta vender e, com a sua margem pagar o capital e juros em dívida.
581) As “Casas do P...” eram um empreendimento de qualidade reconhecida e apreciada.
582) Antes destes factos serem públicos, AA era considerada respeitadora, trabalhadora, honesta e vertical.
583) Vivendo do seu trabalho e património.
584) AA e JJ sempre se movimentaram em meios sociais diferentes, nunca partilharam a casa uma da outra, nem amizades.
585) A primeira sempre tratou esta como Sr.ª D.ª T....
586) E esta sempre tratou aquela como Sr.ª Dr.ª AA.
587) Por ela tendo respeito e admiração, nomeadamente pela educação, “charme” e fortuna.
588) Aliás partilhada por Funcionários e Magistrados da Procuradoria Geral da República.
589) Por isso lhe tendo também emprestado dinheiro.
590) E por isso, quando AA foi retirada de Secretária para Assessora e colocada num sótão com outros assessores, JJ cedeu-lhe o seu próprio gabinete, passando a partilhar a sala com todos os funcionários que dirigia.
591) JJ sentia-se honrada quando AA se lhe dirigia.
592) Sendo que esta por vezes lhe dava vestidos, por não serem do gosto de NNNN.
593) Tal como móveis.
594) Pelas contas de JJ passou dinheiro da arguida AA obtido, nuns casos licitamente e noutros, obtido de forma ilícita.
595) Até ao ano de 2000, já AA obtivera empréstimos de mais de 5 500 000€ (cinco milhões e quinhentos mil euros).
596) Mesmo antes do despoletar público deste caso, JJ sabia que a arguida AA pagava tarde e tinha problemas de liquidez.
597) Muito embora desconhecesse o total das quantias emprestadas a AA e que constam destes autos.
598) JJ tentou ajudar AA, que sabia inibida do uso do cheque e com problemas de crédito bancário e junto de particulares.
599) Já no ano de 1999, muito antes da declaração de falência, AA recorria a empréstimos de particulares, como o casal C....
600) Que sempre foi pagando, pois sabia que se não o fizesse, deixaria de aos mesmos poder acorrer, em momentos de aflição.
601) Na “P.G.R.”, toda a correspondência pessoal devia ser entregue fechada, nos gabinetes dos respectivos destinatários.
602) JJ entrou na “P.G.R.” em 1976, como Auxiliar de 1ª classe.
603) Em 1977, foi nomeada Primeiro-Oficial do quadro de pessoal da Secretaria da Procuradoria geral da República, por lista nominativa.
604) No ano de 1978, foi nomeada Técnica Auxiliar Principal do mesmo quadro, ascendendo ao cargo de Chefe de Secção no ano de 1987, mediante concurso no qual foi classificada em 1º lugar, com 18 (dezoito) valores.
605) Em 1995 foi nomeada Chefe de Repartição do mesmo quadro, mediante concurso em que foi classificada em 1º lugar.
606) Desde 2001 que JJ sofre de tiroidite multi-nodular com hipo-tiróidismo, para o que toma 2 (dois) comprimidos diários de “Letter” (tiroxina).
607) Em 2002, fizera histerectomia total.
608) Teve alguns episódios de perda do equilíbrio, súbita e momentânea bem como cefaleias.
609) Sofre também e actualmente, de quadro depressivo.
610) Tem também um quisto aracnóideu (cerebral).
611) Tal estado de saúde debilitou a arguida que fez por vezes esforço para trabalhar.
612) LL é Advogada desde 1991, exercendo ininterruptamente a sua profissão, desde essa data.
613) Teve vários e sucessivos domicílios profissionais, com colegas mais velhos.
614) Um deles, OOOO solicitou-lhe em Julho de 2000 que patrocinasse AA, sua colega de curso na Faculdade de Direito da Universidade de Lisboa.
615) Patrocinou-a em três Acções e na Falência, sendo que numa delas, proposta por XX esclareceu a cliente de que não tinha fundamentos para contestar o que esta aceitou, não tendo sido deduzida oposição..
616) LL agiu, única e exclusivamente enquanto Advogada de AA, exercendo o patrocínio de acordo com os factos narrados pela cliente.
617) A sociedade “off-shore” “B...” foi constituída em 1998, sem a intervenção de LL, que ao tempo não conhecia AA.
618) LL recebeu a totalidade das acções da “off-shore” em Junho de 2 001, que foram enviadas por PPPP, que imediatamente entregou a AA.
619) Esta já as tinha pago.
620) A “B...” está registada no “Registo Nacional de Pessoas Colectivas”.
621) As acções foram entregues por LL a AA, quando as recebeu de PPPP.
622) LL recebeu uma procuração a seu favor da “B...” em 00/12/19, mas que caducou ao fim de um ano sem que LL tenha feito uso dela ou recebido instruções para praticar qualquer acto.
623) Sendo que a “B...” nunca teve qualquer actividade.
624) Quando LL conheceu a arguida AA, em meados de 2000, já a mesma tinha contraído numerosas dívidas.
625) E só à medida a que foram aparecendo as dívidas, na medida em que os credores tomavam iniciativas contra a devedora, a sua Advogada delas vem a tomar conhecimento.
626) Nessa altura, já a arguida tinha comprado a “Quinta das O...”, onde se encontrava instalado o empreendimento “Casas do P...”.
627) Empreendimento que era referido e publicitado, em revistas da especialidade.
628) A arguida tentava esclarecer os aspectos jurídicos dos actos da sua cliente.
629) CCCC era e é amigo, do Dr. JJJJ, Advogado.
630) LL foi sócia e administradora da sociedade de Advogados “M... de A... R... e Assoc.”, desde a sua constituição em Junho de 2002 até à sua dissolução, em 30 de Dezembro de 2002.
631) Por indicação do Sr. Dr. JJJJ, CCCC prestou serviços àquela sociedade, entre 1 de Julho e 30 de Novembro de 2 002.
632) No dia e acto da apreensão no processo de Falência, CCCC telefonou a LL dizendo o que se passava e esta disse-lhe que não se opusesse a qualquer apreensão.
633) As arguidas AA e JJ agiram livre, deliberada e conscientemente.
633) Sabiam da ilicitude dos seus actos, na parte em que constituem ilícitos criminais.
634) Quando contraiu os empréstimos junto de particulares, AA sabia já que os não podia pagar”.

7.2. Factos dados como não provados:
“A) Em execução de um plano, a arguida procurou obter dos seus irmãos JJJ e LLL um empréstimo no montante de 40.000.000$00 (199.519,16), sem ter porém de proceder ao respectivo reembolso.
B) A arguida, embora tal como planeado não pretendesse cumprir o prometido, manifestou concordar com as requeridas condições e no dia 20 de Dezembro de 1999 celebrou com os seus irmãos JJJ e LLL um contrato promessa nos termos do qual estes prometiam comprar e aquela prometia vender o direito e acção de 1/6 de que a mesma era titular sobre os imóveis denominados “Casal de A... de C...”, “Casal F...”, “M... dos C...” e “Vinha do M... dos C...”.
C) Como não pretendia respeitar o prometido, a arguida, no limite da data possível para a celebração da escritura pública de compra e venda, enviou uma carta registada para os seus irmãos declarando a sua pretensão em desistir da venda da sua parte nos referidos imóveis, sem no entanto proceder à devolução do sinal em dobro ou sequer à devolução do montante de 40.000.000$00 (€199.519,16) que estes lhe haviam entregue.
D) AA não celebrou contrato definitivo referente ao contrato-promessa datado de 20 de Dezembro de 1999 e não lhes foi devolvida qualquer quantia pela rescisão do contrato-promessa acima referido.
E) Com a sua actuação procurou a arguida induzir em erro os seus irmãos, levando-os a crer, que era sua vontade vender o direito e acção de 1/6 de que a mesma era titular sobre os imóveis denominados “Casal de A... de C...”, “Casal F...”, “M... dos C....” e “Vinha do M... dos C...” ou, não o fazendo, devolver aos seus irmãos a quantia de 40.000.000$00 (€199.519,16).
F) Através deste estratagema, que sabia ser idóneo, actuou a arguida com o único e exclusivo propósito de determinar os seus irmãos a entregar-lhe o montante de 40.000.000$00 (€199.519,16) a título de sinal e início de pagamento pelo referido quinhão hereditário.
G) O que sucedeu, apenas por aqueles estarem erroneamente convictos de que era intenção da arguida vender-lhes o seu direito sobre os acima referidos imóveis ou, não o fazendo, devolver-lhes o montante de 40.000.000$00 (€199.519,16).
H) Através da descrita conduta, causou a arguida aos seus irmãos JJJ e LLL uma diminuição patrimonial de 40.000.000$00 (€199.519,16).
I) NN apenas em 12 de Março de 2004, aquando da sua notificação, como executada, no âmbito do Processo de Execução acima referido, tomou conhecimento de que CC a tinha como devedor da quantia de €281.969,76, na sequência dos factos supra descritos.
J) AA levou CC a crer que a sua mãe também era interessada no empréstimo por si solicitado e que esta dava de garantia imóveis de sua propriedade, quando tal não correspondia à verdade.
K) Alguém que não foi possível apurar, foi apresentada a DD como sendo a mãe da arguida AA.
L) NN não teve conhecimento da celebração do contrato-promessa com DD, sendo totalmente alheia ao negócio.
M) Igualmente JJJ e LLL e respectivas mulheres (irmãos e cunhadas da arguida) não tinham conhecimento ou deram o seu consentimento à celebração do referido contrato-promessa, nunca tendo dado quaisquer poderes de representação à sua mãe ou irmã para qualquer acto de administração ou disposição do seu património.
N) A carta escrita por EE ao Sr. Procurador Geral da República chegou, já dentro da Procuradoria Geral da República, às mãos de JJ.
O) Porém, JJ apercebeu-se do conteúdo da missiva e que o mesmo seria lesivo para a reputação funcional de AA e para a sua própria.
P) A arguida JJ decidiu então desviar a referida carta do circuito normal do expediente, começando por dar conhecimento da mesma à AA e retendo-a depois na sua posse, visando ocultá-la perante as instâncias que sobre a mesma deveriam tomar posição.
Q) Ao desviar a correspondência dirigida por EE ao Exmº Sr. Procurador- Geral da República, a arguida JJ sabia que estava a desrespeitar as funções que lhe estavam atribuídas.
R) Actuou com o propósito de evitar que contra si e contra a arguida AA viesse a ser instaurado qualquer tipo de procedimento.
S) Foi LL quem engendrou a cessão de exploração à “B...” das “Casas do P...”.
T) Foi esta quem disse a CCCC para comparecer na Golegã, no dia da apreensão, para em nome da “B...” referir que estava a explorar a “Quinta do P...” e exibir o respectivo contrato de cessão de exploração.
U) Na Procuradoria – Geral da República nunca dera entrada uma denúncia contra GG.
V) No ano de 1998, a arguida AA adquiriu diverso mobiliário na loja “C... do C...”, sita em Campo de Ourique, no valor de cerca de 30.000.000$00 (€149.639,37), dos quais cerca de 4.000.000$00 (€19.951,92) ficaram por pagar.
X) No ano de 1998 iniciaram-se obras de restauro na “Quinta das O...” levadas a cabo por QQQQ, sendo certo que a arguida AA não solicitou orçamento, nem deu as mesmas de empreitada, deixando simplesmente decorrer tais obras, o que as encareceu.
Y) O total das obras foi cerca de 30.000.000$00 (€149.639,37), sendo que ficou em dívida o valor de 3.000.000$00 (€14.963,94).
Z) Em materiais de construção a arguida terá gasto cerca de 40.000.000$00 (€199.519,16).
AA) Por outro lado, só entre 1999 e 2000 a arguida AA adquiriu a FFFF e a GGGG, vendedores de jóias e antiguidades, diversas jóias e antiguidades no valor global de 60.000.000$00 (€299.278,74).
BB) Em data não determinada mas necessariamente anterior a 30 de Março de 2000, a arguida adquiriu a RRRR uma frente de altar, uma colcha de damasco amarelo, louça com risca dourada e verde e um faqueiro em prata com a letra “M”, no montante global de 790.000$00 (€3.940,50).
CC) Também em datas não concretamente apuradas, mas necessariamente entre 1999 e 2004 a arguida adquiriu a SSSS dona de uma loja de antiguidades, diversos bens no valor global de 4.145.000$00 (€20.675,17).
DD) No decurso do ano de 2001 a arguida adquiriu na loja “T...” tapeçarias no valor de 5.828.911$00 (€29.074,49).
EE) Quando contraíu os empréstimos perante EE, JJ já sabia que não os poderia pagar.
FF) Não sendo os cheques de garantia por si preenchidos e entregues, mais que uma aparência da sua solvabilidade e uma forma ilusória de enganar o assistente.
GG) Sabendo ou tomando como possível o não pagamento e actuando mesmo assim.
HH) Querendo ou tomando como possível, com isso se conformando, que tais quantias nunca seriam por si pagas.
II) Visando e querendo aumentar o seu património, enquanto o de EE diminuía.
JJ) Entregando cheques de garantia que nunca quis pagar, forma que usou para ludibriar o ofendido.
KK) Sabendo, neste ponto, da ilicitude dos seus actos.
LL) A criação do empreendimento “Casas do P...” mais não foi que um pretexto para que AA viesse a solicitar vários empréstimos.
MM) Tendo AA logo “a priori” pensado em obter vários empréstimos, sempre usando como isco, a referida “Quinta das O...”.
NN) Utilizando-os em gastos pessoais.
OO) Desde o início que AA não pretendia cumprir o contrato-promessa firmado com VV.
PP) A casa do Campo Grande, no “E... P...” apenas foi comprada para que a arguida obtivesse o empréstimo do “B.P.I.”.
QQ) NN assinou os documentos exigidos pelo Advogados de CC, sem os ler.
RR) No dia 3 de Dezembro de 1 999, NN não esteve com GGG, de modo a que esta não pudesse certificar presencialmente a letra e assinatura daquele, no documento entregue a CC..
SS) NN nunca se deslocou ao escritório do Advogado EEE.
TT) AA voluntariamente deixou cair um copo de água, sobre o cheque que deixara como garantia a CC.
UU) AA disse a EE que a Dr.ª F.. estava no Tribunal da Relação de Lisboa.
VV) Todos os financiamentos de que beneficiou AA foram canalizados na íntegra, para as “Casas do P...”.
XX) Onde investiu – além dos 120 000 000$00 (cento e vinte milhões de escudos) na aquisição – o total de 147 763 911$00 (cento e quarenta e sete milhões, setecentos e sessenta e três mil, novecentos e onze escudos).
VV) O património que a arguida visava vir a adquirir por herança dos seus Avós maternos e seu pai e ainda pela partilha em vida dos bens de sua Mãe valia, em Maio de 2000, pelo menos a quantia de 380 000$00 (trezentos e oitenta milhões de escudos).
YY) Sendo que os irmãos da arguida nunca com ela dividiram os rendimentos da herança.
ZZ) AA sempre pensou poder solver os seus compromissos.
AAA) Quando deixou de pagar ao “B.P.S.M.”, a arguida já tinha liquidado 16 000 000$00 (dezasseis milhões de escudos).
BBB) O cheque entregue ao “B.P.S.M.” pela arguida e no valor de 240 000 000$00 (duzentos e quarenta milhões de escudos) era de garantia.
CCC) O valor do imóvel dado em garantia ascendia a 380 000 000$00 (trezentos e oitenta milhões de escudos), excluído o valor das “Casas do P...”, empreendimento hoteleiro.
DDD) O “B.C.P.” sabia da anterior procuração para hipoteca da “Quinta das O...”, outorgada ao “B.P.S.M.”.
EEE) Todos os Bancos que emprestaram dinheiro a AA sabiam, nomeadamente através da base de dados do “Banco de Portugal”, das suas anteriores responsabilidades bancárias.
FFF) A arguida sempre acreditou que o valor do empreendimento “Casas do P...”, a sua rentabilização futura e a partilha da herança chegariam para cobrir os valores em dívida a qualquer dos Bancos e particulares referidos nos autos.
GGG) No que se refere ao “B.P.N.” e à pessoa do seu funcionário, Sr. Dr. Rui de Melo, a arguida não ocultou a existência de outros financiamentos, nem o facto de apenas poder dispor da “Quinta das O...”, como bem.
HHH) AA acordou com o “BPN” apenas proceder ao registo da hipoteca, caso ocorresse algum incumprimento.
III) Acordo que este não respeitou.
JJJ) Quando comprou o imóvel do Campo Grande, a arguida esperava ir para lá viver, com a família.
KKK) A pedido de AA, foi TTTT quem levou a NN os papéis necessários à concessão do empréstimo, por CC.
LLL) NN assinou o contrato-promessa celebrado com DD.
MMM) Para isso, AA levou-lhe tal documento a assinar, no fim de semana anterior ao dia 4 de Setembro de 2000, no qual se celebrava o aniversário da morte do Pai da arguida.
NNN) AA sempre acreditou que se fariam as partilhas na herança em que é interessada, a tempo de solver todas as dívidas referidas nos autos.
OOO) O contrato de cessão de exploração firmado com a “B...” visava criar uma “mais-valia” empresarial.
PPP) Além de conceder um suporte jurídico autónomo às “Casas do P...” , sem o qual seria juridicamente impossível alienar ou ceder o negócio, sem que isso implicasse a venda do imóvel.
QQQ) AA tem intervindo na Falência, no sentido de aumentar o seu património apreendido.
RRR) O prejuízo por si causado foi involuntário e fruto das vicissitudes e revezes da vida.
SSS) O casal C... emprestava dinheiro a juros de 30% (trinta por cento) ao mês.
TTT) Todos os dias JJ colocava flores, a expensas suas, na jarra de AA.
UUU) JJ nunca actuou concertadamente, com AA.
VVV) E apenas movimentou cerca de 4,13‰ (quatro vírgula treze por cento) das receitas da falida.
XXX) Só a partir de 2000 é que JJ se envolve nos negócios de AA.
YYY) JJ desconhecia por completo, o grau de endividamento de AA.
ZZZ) Mesmo antes do despoletar destes casos, era facto público na “Procuradoria Geral da República” que AA tinha problemas de liquidez.
AAAA) JJ ajudou AA, mas sem o propósito de enganar credores.
BBBB) O montante de cerca de 187 000€ (cento e oitenta e sete mil euros), movimentado através de JJ, em nada contribuiu para a situação de insolvência de AA.
CCCC) JJ apenas conheceu e falou com FF e mulher, XXX, depois de 17 de Outubro de 2002.
DDDD) Toda a correspondência pessoal na “P.G.R.” não passava pelas mãos de JJ.
EEEE) A carta remetida por EE ao Sr. Procurador Geral da República não passou pelas mãos de JJ.
FFFF) Apenas por lapso, tal correspondência era entregue na Secção que JJ coordenava.
GGGG) A arguida nunca teve em seu poder qualquer carta remetida por EE.
HHHH) JJ foi ou está medicada com 3 (três) comprimidos de “Letter”.
IIII) Tem tumores na tiróide.
JJJJ) LL não elaborou o contrato de cessão de exploração a que os autos se referem.
KKKK) A autonomização da exploração das “Casas do P...” na “B... valorizava o património desta, com benefício para os seus credores.
LLLL) LL é alheia à certificação do dito contrato de cessão de exploração.
MMMM) Cujo original terá sido enviado á liquidatária judicial por CCCC e de sua casa, sem intervenção de LL.
NNNN) Foi o Sr. Dr. HH que se ofereceu para ajudar AA, de modo a obter o financiamento de que necessitava.
OOOO) Não tendo AA feito qualquer solicitação, nesse sentido.
PPPP) Na reunião com BB, aquela contou a sua situação efectiva e real.
QQQQ) AA ou alguém em seu nome pagou a FF , LLL e JJJ os montantes totais ou parciais dos prejuízos causados.
RRRR) AA nada pediu a BB.
SSSS) Foi HH que, de forma solícita se prestou a ajudá-la.
TTTT) E a quem a arguida contou a sua situação económica, real e efectiva.
UUUU) A arguida pagou as suas dívidas ao “B.I.I.” e à “C.G.D”.

7.2.1.Devem ainda ter-se por não provados os seguintes factos, constantes do acórdão do Tribunal da Relação:
“26) Com o que pretendia ganhar algumas dezenas de milhar de contos.
78) No entanto, deliberada, livre e conscientemente, actuou a arguida, com o propósito de induzir em erro os funcionários do “Banco Pinto & Sotto Mayor” quanto à sua capacidade financeira para solver essa dívida por forma a, por intermédio de tal artifício que sabia ser idóneo, receber as quantias monetárias referentes aos montantes por si solicitados a esta instituição bancária.
142) Tinha ainda outro empréstimo perante o “B.C.P.”, no valor de 220 000 000$00 (duzentos e vinte milhões de escudos), garantido pelos já referidos fundos e aplicação financeira.
173) Em meados de 2000, a arguida deixou de pagar quaisquer prestações, tendo então o “BES” decidido fazer uso da procuração irrevogável que tinha em seu poder e celebrando, em nome da arguida AA uma escritura pública nos termos da qual constituiu a seu favor uma hipoteca sobre o imóvel que compõe a “Quinta das O...”, na Golegã.
174) Quando porém, os serviços do “BES” tentaram registar a hipoteca a seu favor verificaram que esse imóvel já se encontrava onerado por outras hipotecas de outros bancos, nos valores antes referidos.
177) Por outro lado, bem sabia a arguida que os imóveis dados de garantia a este empréstimo tinham servido já para, meses antes, garantir um empréstimo no valor de 220.000.000$00 (€1.097.355.37) junto do “Banco Pinto & Sotto Mayor”, de um empréstimo no valor de 180.000.000$00 (€897.836,21) junto do “Banco Mello”, de um empréstimo no valor de 135.000.000$00 (673377.16€) junto do “BCP”, outro de 120 000 000$00 (€598557.48) junto do “B.P.N.” o que com este, perfaz o montante global de 655 000 000$00 (seiscentos e cinquenta e cinco milhões de escudos), bem sabendo a arguida que o imóvel não tinha valor patrimonial suficiente para a satisfação de todos estes créditos.
451) Era propósito da arguida, através deste contacto, obter de GG, uma quantia idêntica à anteriormente solicitada a FF, o equivalente a cerca de €17.500.
462) Ao contactar, por intermédio de um terceiro, com GG, alegando a existência de uma queixa contra este junto da Procuradoria – Geral da República, pretendeu a arguida, através deste estratagema, que sabia ser idóneo, determinar GG a entregar-lhe uma determinada quantia monetária apurada, com vista a que a mesma lhe fornecesse pormenores dessa suposta investigação.
463) Sucede porém que a arguida agiu com o único e exclusivo propósito de induzir aquele em erro fazendo-o crer que algo podia fazer para, por meio de tal artifício, determiná-lo a entregar-lhe uma soma pecuniária.
464) Tal apenas não sucedeu porque GG não mais contactou com a arguida”.

7.3. Considerou-se não se responder à seguinte matéria, por se ter entendido ser conclusiva:
“A1) Apesar das dívidas, a arguida sempre manteve um alto padrão de vida, com gastos sumptuários em seu proveito próprio.
B1) O marido de AA, NNNN é avarento.
C1) JJ sofre de graves problemas de saúde.
D1) Um contrato de cessão de exploração não implica transferência da propriedade, pelo que nunca seria idóneo para obstar à apreensão dos bens”.

8. Questões a decidir:
- A pena acessória.
8.1. O tribunal “a quo” revogou a que lhe fora aplicada na 1.ª instância – proibição do exercício de qualquer cargo na função pública durante cinco anos.
O fundamento para tal revogação foi assim enunciado:


A fundamentação para a aplicação da referida pena foi somente esta:

“A arguida AA praticou estes factos, muitas vezes invocando a sua qualidade profissional para obter benefícios, tal como, no caso de GG usou dos seus conhecimentos profissionais (a existência de exposição contra o mesmo, na P.G.R.) ilegitimamente”.

Ora, quanto à invocação da qualidade profissional, já se referiu que a mesma não foi relevante para a qualificação jurídica dos factos praticados pela arguida, já que correspondia a facto verdadeiro.

Quanto a GG é certo que permanece provado o ponto 453, do qual resulta que a arguida efectivamente usou os seus conhecimentos profissionais, alegando a existência de uma denúncia anónima na P.G.R..

Mas pelas razões já acima referidas, a arguida não será censurada penalmente pelo seu comportamento relativamente ao referido GG, pelo que não se devem extrair quaisquer consequências em termos de pena, seja ela principal ou acessória (21)

Certamente que o comportamento da arguida tem relevância para efeitos disciplinares (como já teve, pois que foi-lhe aplicada a pena de demissão – cfr. fls. 8010), mas, não sendo a arguida punida a este título, repete-se, não há fundamento legal para, por esta via, lhe ser aplicada qualquer pena.

Por outro lado, nenhum dos crimes foi praticado no exercício da actividade para que foi nomeada.

Como refere Maia Gonçalves, Código Penal Português, 18ª edição, pág. 256, em anotação ao artº 66º, “Para que a proibição do exercício da função, profissão ou actividade seja decretada no processo penal ao abrigo das disposições deste artigo é necessária a verificação do pressuposto geral do corpo nº 1 e, ainda, o condicionalismo de alguma das alíneas deste número.”
Assim sendo, não deve ser mantida a pena acessória que foi aplicada à arguida.

Nos termos do art. 66.º, n.º 1 do CP, na redacção actual, que vem já da alteração introduzida nesta matéria pelo DL 48/95, de 15 de Março, «o titular de cargo público, funcionário público ou agente da Administração, que no exercício da actividade para que foi eleito ou nomeado, cometer crime punido com pena de prisão superior a 3 anos é também proibido do exercício daquelas funções por um período de 2 a 5 anos quando o facto: a) For praticado com flagrante e grave abuso das funções ou com manifesta e grave violação dos deveres que lhe são inerentes; b)Revelar indignidade no exercício do cargo; ou c) Implicar a perda de confiança necessária ao exercício da função.»
São, portanto, dois os pressupostos exigidos, um de natureza formal e outro, de natureza material. O primeiro diz respeito à condenação numa determinada pena: 3 anos de prisão; o segundo relaciona-se com a conexão do crime praticado com as funções exercidas, ou por o crime ter sido cometido com flagrante e grave abuso da função ou com manifesta e grave violação dos deveres que lhe são inerentes (alínea a), ou por o crime praticado, apesar de cometido fora da função, revelar indignidade no exercício do cargo, ou implicar a perda da confiança necessária ao exercício da função (alíneas b) e c).
Como anota FIGUEIREDO DIAS, Direito Penal Português – As Consequências Jurídicas Do Crime, p. 168, o que faz desencadear a pena acessória é a violação grave de deveres relativos à função exercida pelo agente ou a consequência que a prática do crime acarreta do ponto de vista funcional, pela indignidade manifestada na prática do crime ou pela perda de confiança necessária ao exercício da função que dele deriva. Analisando-se no reflexo produzido na função, o aludido pressuposto acresce à prática do crime propriamente dito, sendo aquele o determinante autónomo da aplicação da pena acessória, que assim se distingue da sanção correspondente ao crime – sanção principal, embora pressupondo-a.
A reforma penal de 1995 trouxe uma inovação importante, para além de outras, nesta matéria: a introdução de um mínimo e um máximo – limites dentro dos quais deve ser doseada a pena acessória, conferindo, assim, a esta uma mais vincada natureza de pena (e não já de medida de segurança), pena essa a ser doseada de acordo com critérios ligados ao facto praticado e à culpa do agente. Uma tal reforma não é alheia às críticas tecidas ao regime anterior por FIGUEIREDO DIAS, ob. cit., p. 178 e ss.
Ora, quanto ao pressuposto formal, não há dúvida de que a arguida foi condenada na pena parcelar de 4 anos e 6 meses de prisão pela prática do crime de burla em que é ofendido CC, e na pena parcelar de 3 anos e 6 meses de prisão, pela prática do crime de burla em que é ofendido DD. Deste modo, está preenchido aquele pressuposto formal, pois, num concurso de crimes, pelo qual é aplicada uma pena única, exigindo-se, na lição do citado FIGUEIREDO DIAS, que, pelo menos um dos crimes em concurso tenha sido punido com pena de prisão superior a 3 anos (ob. cit., p. 167), aqui, essa exigência está mais do que satisfeita.
Resta ver o pressuposto material:
Tendo os crimes sido praticados fora do exercício das funções, terão eles reflexo nestas, pela indignidade manifestada ou pela perda da confiança necessária ao seu exercício?
Atendendo à factualidade dada por assente, não pode deixar de se reconhecer que a arguida pôs seriamente em causa os pilares éticos, deontológicos e jurídicos em que assenta o exercício da função, o que. aliás, contraditoriamente com a argumentação aduzida para revogar a pena acessória, foi reconhecido pelo tribunal “a quo”, quando afirmou, a propósito da determinação concreta da pena, o seguinte (supra, 8.1.):

Ora, se não se considerou como fazendo parte do engano a circunstância verdadeira de a arguida ser secretária da P.G.R., tal qualidade exigia, porém, que a arguida se tivesse coibido de actuar como actuou.
(…)
Do que se trata é de fazer reflectir na pena a fixar (principalmente na pena única, em que se deve ter em conta os factos no seu conjunto) que quem desempenha cargos públicos relevantes, como era o da arguida, deve, mais do que qualquer outra pessoa, abster-se da prática de actos que possam pôr em causa, como puseram, o bom nome da instituição onde se inserem.

Na verdade, a actuação geral da arguida afectou de forma grave aqueles fundamentos em que assenta o exercício da função que desempenhava, sendo uma alta funcionária de uma instituição que tem como objectivos a promoção e defesa da legalidade democrática, o exercício da acção penal, implicando o recebimento de denúncias, queixas e participações, a instauração do competente procedimento criminal em caso de ocorrência de crime, a respectiva investigação e a subordinação dos responsáveis a julgamento, mediante a dedução de acusação contra os infractores e a sua sustentação em juízo, como tudo decorre do Estatuto do Ministério Público, aprovado pela Lei n.º 47/86, de 15/10, alterada pelas Leis n.ºs 2/90, de 20/01, 23/92, de 20/08, 33-A/96, de 26/08, 60/98, de 27/08, 42/2005, de 29/8, 67/2007, de 31/12 e 52/2008, de 28/08 (em particular art. 1.º, que conserva, com poucas alterações, a redacção da versão originária), e do CPP (em particular, art.53.º).
A actuação da arguida, reiterada, persistente, em crimes tão graves não deixa de ter pronunciado reflexo em tais funções, implicando a perda da confiança necessária ao seu exercício.
Para além disso, a arguida, em diversas situações, usou da sua função e do prestígio inerente, bem como da confiança que o cargo inspirava nas pessoas que ela contactava, para conseguir obter diversas vantagens ilícitas, não se coibindo de praticar os crimes de burla por que foi condenada, ainda que se considere, como considerou o tribunal “a quo”, que o uso do cargo não fez parte do processo fraudulento Vejam-se a propósito, os factos dados como provados de 221 a 248, referentes ao ofendido BB; 252 a 281, referentes ao ofendido CC; 287, 289 e 319, referentes ao ofendido DD; 320; 324 a 341 e 356 a 368, referentes ao ofendido EE, este caso oferecendo o suplemento de gravidade de a arguida ter insinuado que podia exercer a sua influência para resolver casos litigiosos que o ofendido tinha pendentes em tribunal).
Ora, a actuação da arguida, revelada em todas estas situações, é particularmente lesiva dos deveres inerentes ao cargo, sendo adequada a produzir a tal perda de confiança no exercício da função, para além de revelar indignidade, sendo que, como referem SIMAS SANTOS e LEAL HENRIQUES no seu Código Penal Anotado, Editora Rei dos Livros, em anotação ao art. 66.º «é indigno tudo o que for desprezível, indecoroso, impróprio, inadequado ao prestígio e elevação que o exercício do cargo exige dos seus servidores.»
Por todo o exposto, a arguida não pode deixar de ser punida com a pena acessória de proibição de exercício das funções que desempenhava (e não de qualquer cargo público, como decorre da condenação da 1.ª instância). É que «a proibição do exercício de função pública não impossibilita o titular, funcionário ou agente de ser nomeado para cargo ou para função que possam ser exercidos sem as condições de dignidade e confiança que o cargo ou a função de cujo exercício foi proibido exigem» (art. 68.º, n.º 2 do CP).
Por outro lado, não obsta à condenação a pendência de processo disciplinar contra a arguida, processo esse em que lhe foi aplicada a pena de demissão, mas que ainda se não tornou definitiva, pois foi impugnada por meio de acção administrativa especial no Supremo Tribunal Administrativo, correndo na 1.ª Secção, 1.ª Subsecção, sob o n.º 450/09 (ofício de fls. 9474).
Considerando a gravidade da actuação da arguida do ponto de vista do prejuízo acarretado para a função e o seu reflexo na confiança que deve merecer aos cidadãos, e ainda a culpa da mesma arguida na violação dos deveres impostos pelo exercício do cargo, sendo uma funcionária altamente qualificada e servindo numa instituição como a Procuradoria-Geral da República, acha-se adequado puni-la com a pena acessória de proibição de exercício da função por um período de cinco anos.



III.DECISÃO
9. Nestes termos, acordam em conferência na (5.ª) Secção Criminal do Supremo Tribunal de Justiça em conceder provimento ao recurso interposto pelo Ministério Público, revogando-se a decisão recorrida na parte em que revogou a pena acessória imposta pela 1.ª instância e condenando-se a arguida na pena acessória de proibição de exercício das actividades compreendidas na função pública que desempenhava e para que foi nomeada, pelo período de 5 (cinco) anos.

10. Custas pela arguida com 5 UC de taxa de justiça.

Supremo Tribunal de Justiça,
27 de Maio de 2010

Rodrigues da Costa (Relator)
Arménio Sottomayor
____________________________
(1) Redacção da 1.ª instância: “Conforme adiante se especificará, a arguida AA havia assumido, entre 1995 e 1999, encargos financeiros com o pagamento de vários empréstimos que então contraíu, com o pretexto de realizar obras e adquirir mobiliário para a sua habitação”.
(2) Redacção da 1.ª instância: “Conforme adiante se especificará, a arguida AA havia assumido, entre 1995 e 1999, encargos financeiros com o pagamento de vários empréstimos que então contraíu, com o pretexto de realizar obras e adquirir mobiliário para a sua habitação”.
(3) Redacção da 1.ª instância: “Devendo também referir-se que permaneciam indivisos os patrimónios dos Avós maternos e pai da arguida AA, a dividir por seis interessados, tendo pelos herdeiros sido calculado o quinhão hereditário da mesma, em 67 353 750$00 (sessenta e sete milhões, trezentos e cinquenta e três mil, setecentos e cinquenta escudos)”.
(4) Redacção da 1.ª instância: “A arguida não pagou a totalidade desse crédito, sendo que, em 27 de Dezembro de 2000, ainda tinha em dívida para com a Caixa Geral de Depósitos o montante de 2.287.806$00 (€11.411,53), de capital”.
(5) “Declarado não provado” no acórdão do Tribunal da Relação.
(6) Redacção da 1.ª instância: “Em 5 de Outubro de 1998, quando já tinha pendente sobre si a acção executiva para pagamento de quantia certa intentada pela “M..., S.A.” e quando, nos cinco meses precederam esta data, havia obtido do “Banco Pinto & Sotto Mayor”, do “BCP” e do “BPN”, o valor global de 755 000 000$00 (setecentos e cinquenta e cinco milhões de escudos), a arguida deixou de pagar ao “Banco Mello” toda e qualquer prestação referente ao contrato de mútuo celebrado a 20 de Maio de 1998”.
(7) Redacção da 1.ª instância: “Assim, em face do comportamento da arguida, em 12 de Abril de 1999, o “Banco Mello” no uso da procuração que lhe havia sido emitida pela arguida, celebra com esta, representada no acto pelo próprio Banco, a escritura pública de hipoteca dos imóveis que constituem a “Quinta das O...”, para garantia do montante mutuado”.
(8) Redacção da 1.ª instância: “Por outro lado, bem sabia a arguida que os imóveis dados de garantia a este empréstimo tinham servido já para, meses antes, garantir um empréstimo no valor de 220.000.000$00 (€1.097.355.37) junto do Banco Pinto & Sotto Mayor, de 135 000 000$00 (cento e trinta e cinco millões escudos) e outros 220 000 000$00 (duzentos e vinte mil escudos) junto do “B.C.P.”, sabendo a arguida que o imóvel não tinha valor patrimonial suficiente para a satisfação de todos estes créditos”.
(9) "Declarado não provado" no acórdão do Tribunal da Relação.
(10) Redacção da 1.ª instância: “Tendo obtido assim no período de 10 (dez) meses empréstimos no valor total de 755 000 000$00 (setecentos e cinquenta e cinco milhões de escudos)”.
(11) Redacção da 1.ª instância: “UU perguntou então, à arguida AA qual a situação em que se encontravam o imóvel dado de garantia, tendo a mesma referido que os mesmos se encontrava livre de quaisquer ónus ou encargos, quando, na verdade, esse imóvel já tinha sido dado de garantia através de procurações para constituir hipotecas, para obrigações contraídas pela arguida junto “BPSM”, do “BCP”, do “Banco Mello” e do “BPN”.
(12) Redacção da 1.ª instância: “Acreditando na disponibilidade e ausência de ónus sobre os imóveis, o “BES” realizou uma avaliação do imóvel em causa, tendo esse banco chegado à conclusão de que o valor do mesmo serviria para cobrir o valor do empréstimo solicitado”.
(13) Redacção da 1.ª instância: “Em 30 de Outubro de 1998, a arguida solicitou ao “BES” nova utilização do crédito pedido, agora no montante de 35.000.000$00 (€174.579,26), a qual, face à credibilidade já gerada, foi autorizada contra a entrega de uma procuração irrevogável para constituir a hipoteca sobre o imóvel que compunham a “Quinta das O...”, na Golegã”.
(14) “Declarado não provado” no acórdão do Tribunal da Relação.
(15) “Declarado não provado” no acórdão do Tribunal da Relação.
(16) “Declarado não provado” no acórdão do Tribunal da Relação.
(17) “Declarado não provado” no acórdão do Tribunal da Relação.
(18) “Declarado não provado” no acórdão do Tribunal da Relação.
(19) “Declarado não provado” no acórdão do Tribunal da Relação.
(20) “Declarado não provado” no acórdão do Tribunal da Relação.
(21) Nota da nossa autoria retirada de outra parte da decisão:
Perante o que provado ficou (e agora com a “passagem” de provado a não provado do ponto 451 e, por consequência, dos pontos 462, 463 e 464), ficamos a saber apenas que a recorrente contactou a testemunha GG, a quem disse que tinha dado entrada na P.G.R. uma denúncia anónima contra si, dando-lhe o contacto telefónico de uma pessoa que, segundo ela o iria ajudar.

Sabemos também que na sequência disso, ocorreu um encontro entre a testemunha GG e a testemunha UUUU (repete-se que não é solicitada qualquer alteração quanto aos pontos que a isto se refere, nomeadamente o 454), em que este disse aquele, por várias vezes, que deveria agradecer à recorrente.

Perante esta matéria de facto, não se pode concluir que a arguida praticou actos de execução de um crime de burla.

É que para existir este crime seria necessário que se apurasse que com os contactos que manteve com a testemunha GG, por si ou por intermédio de UUUU, pretendia a recorrente que aquele praticasse actos que lhe causassem a si ou a terceiro, prejuízo patrimonial.

Quais eram os actos que a recorrente pretendia que a testemunha GG levasse a cabo?

Perante o que provado ficou, apenas agradecer-lhe.

Assim, se não há dúvidas que a recorrente utilizou engano sobre factos que astuciosamente provou – indicar à testemunha que haveria de ser contactada por pessoa que a ajudaria relativamente a uma denúncia anónima – não se pode concluir pela intenção de com isso pretender que a testemunha praticasse qualquer acto lesivo do seu património ou de terceiro.

É evidente que sempre se poderá conjecturar sobre o objectivo futuro da recorrente com o contacto que manteve, mas a responsabilidade criminal não pode resultar de meras conjecturas, mas sim da prova de factos concretos que consubstanciam os elementos objectivo e subjectivo do tipo de crime em causa.

Temos, portanto, que quanto à conduta da recorrente relativamente à testemunha GG nenhuma responsabilidade criminal lhe pode ser assacada.