Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça | |||
Processo: |
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Nº Convencional: | 3ª SECÇÃO | ||
Relator: | RAUL BORGES | ||
Descritores: | BURLA QUALIFICADA VÍCIOS DO ART.º 410 DO CÓDIGO DE PROCESSO PENAL QUALIFICAÇÃO JURÍDICA CONCURSO DE INFRACÇÕES CRIME CONTINUADO CULPA | ||
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Data do Acordão: | 06/22/2011 | ||
Votação: | UNANIMIDADE | ||
Texto Integral: | S | ||
Privacidade: | 1 | ||
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Meio Processual: | RECURSO PENAL | ||
Decisão: | PROVIDO EM PARTE | ||
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Sumário : | I - Os fundamentos de recurso consagrados no artigo 410.º, n.º 2, do CPP, constituem deficiências da decisão, e não do julgamento, assumindo-se como vícios de lógica jurídica ao nível da matéria de facto, que tornam impossível uma decisão logicamente correcta e conforme à lei. II - Não integra qualquer desses vícios, designadamente o constante da al. b) do n.º 2 do citado art. 410.º, a invocação por parte do recorrente de uma diferente qualificação dos factos conducente ao cometimento do ilícito criminal nos quadros da unidade criminosa ou do crime continuado (por oposição à qualificação operada pelo tribunal que considerou o concurso efectivo de crimes). III -.É de afastar a continuação criminosa nos casos em que patentemente houve apenas uma acção, em que de todo não é possível um tal enquadramento, que supõe uma multiplicidade de condutas. Nos dezasseis episódios dados por provados teve lugar apenas uma transacção, um único negócio, ou melhor, uma proposta de negócio, ou mais rigorosamente, um negócio fictício, isolado, autónomo, independente e sem qualquer conexão entre si e com os demais. IV -.Dos factos assentes resultou que: - a arguida abordou, directamente, ou através de colaboradores, os potenciais clientes, sugeriu negócios, convencendo-os de que os mesmos se teriam de fechar muito rapidamente, no máximo em 2 ou 3 dias, preferindo entregas em numerário, fazendo crer que propiciava bons investimentos, oferecendo preços convidativos e projectando a possibilidade de lucros significativos. - perante cada novo cliente, a arguida tinha de fazê-lo acreditar nas suas explicações, na sua condição de proprietária de uma imobiliária e de solicitadora de execução, onde estavam penhorados os bens oferecidos a negócio. - de cada vez que actuava a arguida tinha de fazer crer que os bens oferecidos a negócio estavam penhorados e que poderiam ser adquiridos antes da venda judicial, pagando o interlocutor apenas o valor da dívida exequenda. - a arguida tinha de convencer de que tinha bons contactos nos tribunais, junto de bancos e empresas de leasing e que, graças a esses privilegiados contactos, conseguia transaccionar os bens a valor inferior ao do mercado. V - Assim, a cada nova oportunidade de encaixe financeiro, a arguida renovava a resolução criminosa, de modo a arrecadar as várias quantias monetárias, sem qualquer elemento exógeno ou exterior que facilitasse a repetição da actividade criminosa, isto é, que diminuísse ou mitigasse a sua culpa. Pelo contrário, foi a própria arguida a contribuir para a repetição de situações novas, que foram por si desejadas, procuradas e queridas. VII - É, deste modo, de afastar a possibilidade de redução à unidade, isto é, considerando um único crime de burla qualificada, por se entender que ficou demonstrado a existência de um concurso efectivo de crimes de burla qualificada. Do mesmo modo, é de considerar arredada a integração da conduta da arguida na figura da continuação criminosa, por falecerem os requisitos que fundamentam essa menor exigência de que o agente se comporte de acordo com a norma. | ||
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Decisão Texto Integral: |
No âmbito do processo comum com intervenção do Tribunal Colectivo n.º 3776/0.5TALRA, do 3.º Juízo do Tribunal Judicial da Comarca de Leiria, foram submetidos a julgamento os arguidos: - AA, divorciada, nascida em 03-06-1970, natural da freguesia de Reguengo do Fetal, concelho da Batalha, residente na Rua ..., n.º …, … - A, …, Leiria, actualmente em cumprimento de pena de prisão à ordem do PCC n.º 76/07.0JALRA (fls. 8569), no Estabelecimento Prisional de Santa Cruz do Bispo; - BB; - CC; - DD; - EE; - FF; - GG; - HH, todos com os demais sinais dos autos.
Todos os arguidos haviam sido pronunciados, pela prática, de: · Um crime de associação criminosa, p. e p. pelo artigo 299.º, n.º s 1 e 2, do Código Penal; · 126 crimes de burla qualificada, p. e p. pela conjugação dos artigos 217.º, n.º 1 e 218.º, n.º 2, alíneas a) e b), do Código Penal; · Um crime de falsificação de documento, na forma continuada, p. e p. pelo artigo 256.º, n.º 1, alínea a) e n.º 3 e 30.º, n.º 2, do Código Penal; · Um crime de abuso de confiança, p. e p. pelo artigo 205.º, n.º s 1 e 4, alínea a), do Código Penal.
Realizado o julgamento, por acórdão do Colectivo da Comarca de Leiria, datado de 17 de Junho de 2010, constante de fls. 7779 a 8241, do 25.º volume, foi deliberado: I - Absolver a arguida AA da prática do crime de associação criminosa, p. e p. pelo artigo 299.º, n.º s 1 e 2, do Código Penal, de cento e vinte seis crimes de burla qualificada, p. e p. pelos artigos 217.º, n.º 1 e 218.º, n.º 2, alíneas a) e b), do Código Penal, e de um crime de abuso de confiança, p. e p. pelo artigo 205.º, n.º s 1 e 4, alínea a), do Código Penal, que lhe eram imputados; II – Condenar a mesma arguida, pela prática dos seguintes crimes: 1) Um crime de burla qualificada, na forma continuada, p. e p. pelos artigos 30.º, n.º 2 e 218.º, n.º 2, alíneas a) e b), do Código Penal (ofendidos II e JJ) numa pena de 6 anos de prisão; 2) Um crime de burla qualificada, na forma continuada, p. e p. pelos artigos 30.º, n.º 2 e 218.º, n.º 2, alíneas a) e b), do Código Penal (ofendidos KK e LL), numa pena de 5 anos e 6 meses de prisão; 3) Um crime de burla qualificada, na forma continuada, p. e p. pelos artigos 30.º, n.º 2 e 218.º, n.º 2, alíneas a) e b), do Código Penal (ofendido MM), numa pena de 5 anos e 4 meses de prisão; 4) Um crime de burla qualificada, na forma continuada, p. e p. pelos artigos 30.º, n.º 2 e 218.º, n.º 2, alíneas a) e b), do C. Penal (ofendido NN), numa pena de 4 anos e 6 meses de prisão; 5) Um crime de burla qualificada, na forma continuada, p. e p. pelos artigos 30.º, n.º 2 e 218.º, nº 2 alínea b) do Código Penal (ofendido OO) numa pena de 2 anos e 6 meses de prisão; 6) Um crime de burla qualificada, na forma continuada, p. e p. pelos artigos 30º nº 2 e 218º nº 2 alíneas a) e b) do Código Penal (ofendidos PP e QQ) numa pena de 4 anos e 6 meses de prisão; 7) Um crime de burla qualificada, na forma continuada, p. e p. pelos artigos 30º nº 2 e 218º nº 2 alíneas a) e b) do Código Penal (ofendido RR) numa pena de 3 anos de prisão; 8) Um crime de burla qualificada, na forma continuada, p. e p. pelos artigos 30º nº 2 e 218º nº 2 alíneas a) e b) do Código Penal (ofendidos SS e TT) numa pena de 5 anos e 2 meses de prisão; 9) Um crime de burla qualificada, na forma continuada, p. e p. pelos artigos 30º nº 2 e 218º nº 2 alíneas a) e b) do Código Penal (ofendido UU) numa pena de 6 anos de prisão; 10) Um crime de burla qualificada, na forma continuada, p. e p. pelos artigos 30º nº 2 e 218º nº 2 alínea b) do Código Penal (ofendido VV) numa pena de 2 anos e 6 meses de prisão; 11) Um crime de burla qualificada, na forma continuada, p. e p. pelos artigos 30º nº 2 e 218º nº 2 alíneas a) e b) do Código Penal (ofendido XX) numa pena de 2 anos e 9 meses de prisão; 12) Um crime de burla qualificada, na forma continuada, p. e p. pelos artigos 30º nº 2 e 218º nº 2 alíneas a) e b) do Código Penal (ofendido ZZ) numa pena de 3 anos e 4 meses de prisão; 13) Um crime de burla qualificada, na forma continuada, p. e p. pelos artigos 30º nº 2 e 218º nº 2 alíneas a) e b) do Código Penal (ofendido AAA) numa pena de 3 anos de prisão; 14) Um crime de burla qualificada, na forma continuada, p. e p. pelos artigos 30º nº 2 e 218º nº 2 alíneas a) e b) do Código Penal (ofendidos BBB e CCC) numa pena de 7 anos de prisão; 15) Um crime de burla qualificada, na forma continuada, p. e p. pelos artigos 30º nº 2 e 218º nº 2 alíneas a) e b) do Código Penal (ofendido DDD) numa pena de 5 anos e 2 meses de prisão; 16) Um crime de burla qualificada, na forma continuada, p. e p. pelos artigos 30º nº 2 e 218º nº 2 alínea b) do Código Penal (ofendido EEE) numa pena de 2 anos e 4 meses de prisão; 17) Um crime de burla qualificada, na forma continuada, p. e p. pelos artigos 30º nº 2 e 218º nº 2 alíneas a) e b) do Código Penal (ofendido FFF), numa pena de 2 anos e 7 meses de prisão; 18) Um crime de burla qualificada, na forma continuada, p. e p. pelos artigos 30º nº 2 e 218º nº 2 alíneas a) e b) do Código Penal (ofendido GGG) numa pena de 5 anos e 3 meses de prisão; 19) Um crime de burla qualificada, na forma continuada, p. e p. pelos artigos 30º nº 2 e 218º nº 2 alíneas a) e b) do Código Penal (ofendido HHH) numa pena de 2 anos e 7 meses de prisão; 20) Um crime de burla qualificada, na forma continuada, p. e p. pelos artigos 30º nº 2 e 218º nº 2 alíneas a) e b) do Código Penal (ofendida III) numa pena de 2 anos e 9 meses de prisão; 21) Um crime de burla qualificada, na forma continuada, p. e p. pelos artigos 30º nº 2 e 218º nº 2 alínea b) do Código Penal (ofendido JJJ) numa pena de 2 anos e 6 meses de prisão; 22) Um crime de burla qualificada, na forma continuada, p. e p. pelos artigos 30º nº 2 e 218º nº 2 alínea b) do Código Penal (ofendido KKK) numa pena de 2 anos e 4 meses de prisão; 23) Um crime de burla qualificada, na forma continuada, p. e p. pelos artigos 30º nº 2 e 218º nº 2 alíneas a) e b) do Código Penal (ofendido LLL), numa pena de 3 anos de prisão; 24) Um crime de burla qualificada, na forma continuada, p. e p. pelos artigos 30º nº 2 e 218º nº 2 alíneas a) e b) do Código Penal (ofendido MMM) numa pena de 6 anos de prisão; 25) Um crime de burla qualificada, na forma continuada, p. e p. pelos artigos 30º nº 2 e 218º nº 2 alíneas a) e b) do Código Penal (ofendidos NNN e OOO), numa pena de 3 anos e 5 meses de prisão; 26) Um crime de burla qualificada, na forma continuada, p. e p. pelos artigos 30º nº 2 e 218º nº 2 alíneas a) e b) do Código Penal (ofendido PPP) numa pena de 2 anos e 7 meses de prisão; 27) Um crime de burla qualificada, na forma continuada, p. e p. pelos artigos 30º nº 2 e 218º nº 2 alíneas a) e b) do Código Penal (ofendida QQQ) numa pena de 3 anos de prisão; 28) Um crime de burla qualificada, na forma continuada, p. e p. pelos artigos 30º nº 2 e 218º nº 2 alíneas a) e b) do Código Penal (ofendido RRR) numa pena de 3 anos e 4 meses de prisão; 29) Um crime de burla qualificada, na forma continuada, p. e p. pelos artigos 30º nº 2 e 218º nº 2 alíneas a) e b) do Código Penal (ofendida SSS) numa pena de 4 anos e 6 meses de prisão; 30) Um crime de burla qualificada, na forma continuada, p. e p. pelos artigos 30º nº 2 e 218º nº 2 alíneas a) e b) do Código Penal (ofendida TTT) numa pena de 2 anos e 10 meses de prisão; 31) Um crime de burla qualificada, na forma continuada, p. e p. pelos artigos 30º nº 2 e 218º nº 2 alíneas a) e b) do Código Penal (ofendido UUU) numa pena de 5 anos de prisão; 32) Um crime de burla qualificada, na forma continuada, p. e p. pelos artigos 30º nº 2 e 218º nº 2 alíneas a) e b) do Código Penal (ofendido VVV) numa pena de 5 anos e 2 meses de prisão; 33) Um crime de burla qualificada, na forma continuada, p. e p. pelos artigos 30º nº 2 e 218º nº 2 alínea b) do Código Penal (ofendido XXX) numa pena de 2 anos e 6 meses de prisão; 34) Um crime de burla qualificada, na forma continuada, p. e p. pelos artigos 30º nº 2 e 218º nº 2 alíneas a) e b) do Código Penal (ofendida ZZZ) numa pena de 2 anos e 7 meses de prisão; 35) Um crime de burla qualificada, na forma continuada, p. e p. pelos artigos 30º nº 2 e 218º nº 2 alíneas a) e b) do Código Penal (ofendidos MMM e AAAA) numa pena de 6 anos e 9 meses de prisão; 36) Um crime de burla qualificada, na forma continuada, p. e p. pelos artigos 30º nº 2 e 218º nº 2 alíneas a) e b) do Código Penal (ofendido BBBB) numa pena de 3 anos e 4 meses de prisão; 37) Um crime de falsificação de documento, na forma continuada, p. e p. pelos artigos 30º nº 2 e 256º nº 1 alínea a) e nº 3 do Código Penal, numa pena de 2 anos e 6 meses de prisão; 38) Um crime de abuso de confiança, p. e p. pelos artigos 205º nº 1 do Código Penal, numa pena de 1 ano de prisão. III - Em cúmulo jurídico, condenar a arguida AA, na pena única de dezasseis anos de prisão. IV - Absolver o arguido BB da prática do crime de associação criminosa, p. e p. pelo artigo 299º nº 1 e 2 do Código Penal, de cento e vinte seis crimes de burla qualificada p. e p. pela conjugação dos artigos 217º nº 1 e 218º nº 2 alíneas a) e b) do Código Penal, de um crime de falsificação de documento, na forma continuada, p. e p. pelo artigo 256º nº 1 alínea a) e nº 3 e 30º nº 2 do Código Penal e de um crime de abuso de confiança, p. e p. pelo artigo 205º nºs 1 e 4 alínea a) do Código Penal, que lhe eram imputados, mas condenar o mesmo arguido nos seguintes termos: 1) Pela prática de um crime de burla qualificada, p. e p. pelo artigo 218.º, n.º 2, alínea a) do Código Penal (lote de terreno nos Marrazes e lote de terreno na Cova das Faias), numa pena de 3 anos de prisão; 2) Pela prática de um crime de burla qualificada, p. e p. pelo artigo 218.º, n.º 2, alínea a), do Código Penal (venda à I...), numa pena de 2 anos e 6 meses de prisão; 3) Pela prática de um crime de burla qualificada. p. e p. pelo artigo 218.º, n.º 1, do Código Penal (venda ao ofendido CCCC), numa pena de 2 anos de prisão. V - Em cúmulo jurídico, pela prática de tais crimes, condenar o arguido BB numa pena única de quatro anos e seis meses de prisão e suspender a execução de tal pena de prisão por igual período, ao abrigo dos artigos 50.º, 51.º e 53.º do Código Penal, mediante a condição do mesmo ser sujeito a regime de prova. VI - Absolver os demais arguidos da prática de todos os crimes que lhe eram imputados. VII - Condenar a demandada AA a pagar: - Ao demandante XXX a quantia de € 15.000,00, acrescida de juros de mora à taxa legal de 4%, desde a notificação do pedido de indemnização civil até integral e efectivo pagamento. - À demandante ZZZ a quantia de € 22.500,00, acrescida de juros de mora à taxa legal de 4%, desde a notificação do pedido de indemnização civil até integral e efectivo pagamento. - A cada um dos demandantes NNN e OOO, a quantia de € 32.400,00, acrescida dos juros à taxa legal desde a notificação do pedido de indemnização civil até integral e efectivo pagamento. - Aos demandantes AAAA e MMM quantia a apurar em liquidação de sentença, nos termos do disposto no artigo 661º nº 2 do Código de Processo Civil, a titulo de indemnização por danos patrimoniais, tendo por limite o montante peticionado e absolver de todo o pedido os restantes demandados, condenando ainda a demandada AA e os demandantes no pagamento das custas do pedido de indemnização civil, na proporção de 90% para a primeira e de 10% para os segundos, sem prejuízo de eventual acerto se e quando for instaurado o incidente de liquidação de sentença para apuramento da responsabilidade total da demandada. - Ao demandante QQ a quantia de € 39.000,00, a titulo de danos patrimoniais e a quantia de € 5.000,00 a titulo de danos não patrimoniais, acrescidas de juros de mora à taxa legal de 4%, desde a notificação do pedido de indemnização civil até integral e efectivo pagamento. - Ao demandante LLL a quantia de € 48.114,50, a título de danos patrimoniais e a quantia de € 750,00, a título de danos não patrimoniais. - À demandante SSS a quantia de € 75.000,00, a titulo de danos patrimoniais. - Ao demandante XX a quantia de € 28.240,00, a título de danos patrimoniais e a quantia de € 750,00 a título de danos não patrimoniais, acrescidas de juros de mora à taxa legal de 4%, desde a notificação do pedido de indemnização civil até integral e efectivo pagamento. - Aos demandantes CCC e BBB quantia a apurar em liquidação de sentença, nos termos do disposto no artigo 661º nº 2 do Código de Processo Civil, a titulo de indemnização por danos patrimoniais, tendo por limite o montante peticionado. - Ao demandante NN a quantia de € 65.207,00, a título de danos patrimoniais e a quantia de € 5.000,00 a título de danos não patrimoniais, quantias acrescidas de juros de mora à taxa legal de 4%, desde a notificação do pedido de indemnização civil até integral e efectivo pagamento. - Ao demandante PP a quantia de € 40.000,00, a título de danos patrimoniais, acrescida de juros de mora à taxa legal de 4%, desde a notificação do pedido de indemnização civil até integral e efectivo pagamento. - Ao demandante RR a quantia de € 40.800,00, a título de danos patrimoniais e a quantia de € 1.000,00 a título de danos não patrimoniais, acrescidas de juros de mora à taxa legal de 4%, desde a notificação do pedido de indemnização civil até integral e efectivo pagamento. - Aos demandantes BBBB e DDDD a quantia de 52.600,00, a título de danos patrimoniais e a quantia de € 2.000,00 a cada um dos referidos demandantes, a título de danos não patrimoniais, quantias essas ainda acrescidas de juros de mora à taxa legal de 4%, desde a notificação do pedido de indemnização civil até integral e efectivo pagamento. - À demandante EEEE – …, Lda. a quantia de € 5.543,00, a pagar ao demandante TT a quantia de € 27.300,00 e a pagar ao demandante SS a quantia de € 61.800,00, acrescidas de juros de mora à taxa legal de 4%, desde a notificação do pedido de indemnização civil até integral e efectivo pagamento - Ao demandante RRR a quantia de € 58.100,00, acrescida de juros de mora à taxa legal de 4%, desde a notificação do pedido de indemnização civil até integral e efectivo pagamento. E condenar o demandado BB a pagar ao demandante SS a quantia de € 16.550,00, acrescida de juros de mora à taxa legal de 4%, desde a notificação do pedido de indemnização civil até integral e efectivo pagamento.
Inconformada, a arguida AA interpôs recurso, dirigido ao Tribunal da Relação de Coimbra, conforme fls. 8368, posteriormente corrigido a fls. 8411 como dirigido a este Supremo Tribunal, apresentando a motivação de fls. 8368 a 8406, que remata com as seguintes conclusões: «1. Por sentença proferida nestes autos foi a arguida AA condenada pela prática dos crimes constantes no ponto 1 a 38 da página 362 a 399 do Douto Acórdão recorrido. 2. Dão-se por reproduzidos os factos dados como provados e não provados e a respectiva motivação da matéria de facto constantes da sentença. 3. Quanto ao enquadramento Jurídico-legal, relativamente à quantidade de Crimes de Burla praticados pela arguida AA, o Tribunal Colectivo fundamentou a sua decisão na motivação apresentada nos termos expostos desde o parágrafo 2º da página 371 ao 4º parágrafo da página 379. B) DO ÂMBITO DO RECURSO 1. Quanto ao Crime Continuado - O recurso tem como fundamento nesta parte a discordância com a interpretação que foi dada pelo Tribunal Colectivo à norma constante no artigo 30° n° 2 do código penal e à forma como esta foi aplicada, nos termos do disposto no artigo 412.°, n.° 2 al. a), do CPP. - O crime continuado é punível com a pena aplicável à conduta mais grave que integra a continuação (artigo 79.° do CP). São pressupostos do crime continuado: f) a realização plúrima do mesmo tipo de crime ou g) a realização plúrima de vários tipos de crime que fundamentalmente protejam o mesmo bem jurídico; h) executados de forma essencialmente homogénea; i) no quadro de uma mesma situação exterior; j) a diminuição considerável da culpa do agente por via da actuação homogénea e da solicitação exterior idêntica. - Relativamente ao preenchimento dos pressupostos do crime continuado, o Colectivo no que concerne à conduta da arguida AA, colocou a tónica nos dois últimos pressupostos anteriormente apontados ou seja, na execução dos crimes no quadro de uma mesma situação exterior idêntica e na diminuição considerável da culpa do agente. - Não se tendo sequer referido aos restantes pressupostos, cremos que não o fez por considerar que esses se verificam. Pois existe uma realização plúrima de mesmo tipo de crime (crime de Burla) executado de forma essencialmente homogénea (às vítimas era dito que os bens provinham de processos judicias e que eram vendidos a tão baixo preço porque era o valor da dívida que o executado teria à instituição de crédito, sendo a urgência sempre justificada pela necessidade de adquirir o bem antes da venda do mesmo em hasta pública). - Assenta colectivo a motivação do afastamento da existência de uma mesma situação exterior que diminua consideravelmente a culpa da arguida, na existência, segundo o colectivo de uma situação exterior promovida pela própria arguida no quadro de um esquema complexo que ela proporia terá criado. - Salvo do devido respeito por opinião inversa, não está correcto, a nosso ver, o raciocínio efectuado. - A circunstância apontada pelo Tribuna Colectivo como sendo uma situação criada pela própria arguida e que portanto não pode relevar, não exclui a existência de paralela de uma ou mais circunstâncias exteriores que diminuam consideravelmente a culpa do agente. Circunstâncias essas que são claramente alheias á vontade da arguida mas que esta naturalmente aproveitou e a empurraram para a repetição do indevido. - Desde logo a circunstância de todas as vítimas constantes nos presentes Autos terem procurado a arguida. Apenas se encontram no processo vítimas da actuação da arguida numa fase posterior e todas elas têm em comum uma circunstância exterior que as une e que facilita a repetição pela arguido do indevido que é o facto de terem sido as próprias vítimas a procurar a arguida, já sabendo de antemão que tipo de negócio se tratava, poucas ou nenhuma explicações exigindo. - Rsulta da matéria dada como provada que eram as vítimas que procuravam a arguida na sua totalidade. Chegando até si, apenas necessitavam que lhe fosse confirmada a história que já lhe tinha sido contada pelo familiar ou amigo que também tinha feito um suposto negócio. - Nos factos provados não consta que a arguida tivesse previsto esta forma de angariação espontânea de clientes por outros clientes, uns a troco de nada, outras na expectativa de ganharem também eles algum dinheiro facilitavam a prática pela arguida do ilícito, ainda que sem consciência da ilicitude do facto. - Era o caso dos co-arguidos FF, GG e DD, os quais na maioria das vezes e consta dos factos provados, levavam os investidores junto da AA apenas para lhe entregarem as quantias e lhes serem emitidas declarações - Cfr pontos X, XIV, XV, XVI, XVII, XXII, XXIV, XXV, XXVI, XXIX, XXXI e XXVII, dos factos provados no Douto Acórdão que se referem apenas a título de exemplo. - Não consta da acusação que os co-arguidos tenham sido convencidos pela arguida AA a angariarem clientes em troca de uma percentagem nos lucros. - Pelo contrário, segundo o arguido GG, nunca a arguida lhe propôs que angariasse clientes, - Cfr pag 181, parágrafo 2 do Douto Acórdão de que se recorre. - A circunstância de se ter criado, através da prática do primeiro ilícito, um certo mecanismo em que quem investia comentava e trazia novos investidores, famintos de investimentos pequenos com resultados milionários, à custa da desgraça alheia, ofereceu à arguida a possibilidade de alargar o âmbito da actividade criminosa. - A acrescer que como resulta dos factos provados, a maioria das vítimas acreditou que a arguida conseguia estes negócios por ter privilégios e conhecimentos junto dos tribunais, ou seja, por ser de alguma forma "ajudada" pelos juízes, ou funcionários do Tribunal. Ora, é do censo comum que quando as coisas se passam desta forma, é porque se está a falar de uma forma de praticar uma determinada actividade menos legal, caso contrário não seria necessário recorrer a amigos e favores. E as vítimas acreditavam que era através desta conduta "menos legal" que a arguida lhe conseguia os bons negócios, razão pela qual não faziam muitas perguntas, nem queriam saber muitos pormenores. - Apenas desta forma se justifica que mais de 90% das vítimas não conheça a casa/s que comprou, muitas vezes nem saiba onde ficava ou sequer qual era o prédio a que pertencia a fracção de supostamente adquirida. A única coisa que lhes interessava era efectivamente o lucro que através da arguia e dos tais "bons conhecimentos" que esta teria, estes iram conseguir obter. - Em nada a arguida contribuiu para que estas circunstâncias se desenrolassem, pois não foi ela que mandou anunciar a sua actividade ou propôs a quem quer que fosse que angariasse clientes, pelo que, todas estas circunstâncias eram externas á actuação da arguida e não foram por ela previstas, muitos menos seria de prever que as vítimas chegassem até si já conhecedoras da situação e apenas de cheque ou dinheiro na mão para lhe entregar. E naturalmente que tal circunstância diminui especialmente a culpa da arguida na exacta proporção que estas circunstâncias externas e até as próprias vítimas concorrem com ela. - Considera a recorrente que a arguida praticou apenas um crime de burla qualificada, na forma continuada, p. e p. pelos artigos 30° n° 2 e 218 n° 2 alínea a) e b) do Código penal. Violando o referido artigo 30° n° 2 do código penal a Douta decisão de que se recorre. - Ou ainda assim, por mera hipótese se coloca, sempre seria crime continuado, pelo menos em relação àqueles ofendidos que foram trazidos até á arguida pelos restantes co-arguidos. - Ou seja, um crime de burla qualificada na forma continuada praticada pela arguida em relação a RR, VV, XX, ZZ, AAA, FFF, NNN e OO e UUU, uma vez que a ambos é comum a circunstância de terem sido levados ao contacto com a arguida através do arguido GG e por, na presença daquela apenas terem confirmado a história de que já estavam convencidos e entregue o dinheiro solicitado, sendo que em relação a alguns deles nem isso foi feito. - O mesmo em relação a todos aqueles que foram trazidos ao contacto da arguida pelos arguidos FF (XXX, ZZZ, PP e QQ) e DD (AAAA e MMM, BBBB, VVV, KKK, LLL e SSS). - Considera-se que a arguida. Quanto muito terá praticado três crimes de burla qualificada da forma continuada e não os vinte em que foi condenada. Por tais circunstâncias serem exteriores e idênticas entre si, facilitando a repetição do ilícito pela arguida, diminuindo-lhe consideravelmente a culpa. 2. Quanto à Decisão - O recurso tem como fundamento, nesta parte, a contradição insanável entre a fundamentação e a decisão a que se refere o artigo 410.°, n.°2, al. b) do CPP. - Não podemos concordar que a arguida AA tenha sido condenada pela prática de um crime continuado por cada uma das vítimas sendo que numa grande parte das vítimas apenas se tratou de um negócio. Sendo certo que em alguns casos relativos a vários imóveis mas houve apenas uma resolução criminosa. - São os casos dos ofendidos RR, VV, XX, ZZ, AAA, EEE, FFF, GGG, HHH, JJJ, KKK, MMM, NNN e OOO, QQQ, RRR, SSS, XXX, e ZZZ. Em qualquer um destes ofendidos apenas consta nos factos provados uma única resolução criminosa. - Assim sendo os factos praticados pela arguida integram apenas um crime de burla qualificada p. e p. no 218 n° 2 alínea a) e b) do Código Penal e não na forma continuada. - Violando o douto Acórdão o disposto no artigo 30° n° 2 do Código Penal. 3. Quanto à medida da pena: - O recurso tem como fundamento nesta parte a discordância com a interpretação que foi dada pelo Tribunal Colectivo aos artigos 70° e 71° do código penal e à forma como estes foram aplicados, nos termos do disposto no artigo 412.°, n.° 2 al. a), do CPP.: - O Tribunal considerou, que a arguida cometeu trinta e seis crimes de Burla Continuada, um crime de falsificação de documento e um crime de abuso de confiança. - Por tais crimes decidiu o tribunal condenar a arguida nas penas parcelares constantes nos pontos 1 a 38 da Decisão do Douto Acórdão de que se recorre. - E em cúmulo jurídico, pela prática de tais crimes, numa pena única de dezasseis (16) anos de prisão. 3.1. Quanto à medida de algumas das penas parcelares: - Ainda que se considerasse o cometimento pela arguida de um crime de burla único ou da sua forma continuada por cada um dos ofendidos, algumas das penas parcelarmente aplicadas são absolutamente desajustadas tendo em conta o que atrás foi dito. - É o caso da pena aplicada ao crime de Burla qualificada, na forma continuada constante no ponto 18. e relativa ao ofendido GGG. - Analisados os factos provados relativamente a este ofendido (pontos 331 a 322 dos "Factos Provados" constata-se que o arguido teve um prejuízo de cerca de 28.312€, relativo a uma fictícia compra de um imóvel. - Não se compreende qual o critério utilizado pelo Tribunal Colectivo para aplicação de uma pena de 5 anos e três meses de prisão, sendo que a qualificação do crime pela alínea a) do art. 218° do código penal tem como limite mínimo 200 unidades de conta, ou seja, 20,400Euros (vinte mil e quatrocentos Euros). Considera a recorrente que, a considerar-se a prática isolada do presente crime, o que por mera hipótese académica se coloca, nunca a pena aplicada deveria exceder os dois anos e sete meses, aliás, á semelhança do que foi aplicada no crime de que a arguida vem condenada relativamente ao ofendido HHH (ponto 19.). - O mesmo acontece na pena aplicada ao crime de Burla qualificada, na forma continuada constante no ponto 16. e relativa ao ofendido EEE. - Ê que relativamente a este ofendido a qualificação da burla apenas acontece pela aplicação da alínea b) do n° 2 do artigo 218° do código penal, razão pela qual não merece a arguida pena superior a 2 anos de prisão. 3.2. Quanto á pena única aplicada discorda necessariamente a recorrente da pena aplicada em cúmulo, por considerar que esta é excessiva. - Desde logo porque se defende a prática pela arguida de apenas um crime de burla qualificada, na sua forma continuada, como atrás se expôs, considerando que em concreto a pena por esse crime nunca deveria ser superior a seis anos de prisão. - Pelo que em cúmulo a considerar a prática dos restantes crimes por que foi condenada, do cúmulo nunca resultaria uma pena superior a sete anos e meio de prisão. - Mas ainda que assim não se considerasse sempre a pena única em que a arguida foi condenada é substancialmente superior á medida da sua culpa e às exigências de prevenção que delimitam a pena, nos termos do disposto no artigo 71° n° 1 do código penal. - Deverá ser ponderado, como atrás se disse a natureza que o grau de ilicitude do facto, impõe maior ou menor conteúdo de prevenção geral, conforme tenham provocado maior ou menor sentimento comunitário de afectação de valores. - E nesta medida recordamos a crença de todos os ofendidos de que os "bons negócios" eram conseguidos porque a arguida mantinha bons conhecimentos no Tribunal, conhecia juízes e procuradores e que por isso teria acesso a informações "facilitadas" as quais não eram acessíveis aos restantes cidadãos, que lhe permitiam comprar os imóveis apenas pelo preço da dívida à instituição de crédito, antes que aqueles fossem vendidos em hasta Pública. Ou seja, os ofendidos tinham consciência que o negócio a que se propunham não era de todo legal, ou pelo menos feito da forma mais correcta. - Também merece censura a conduta dos ofendidos que se preparavam para obter benefícios sem olhar a meios. - O juízo de censura relativamente á conduta da arguida é tão menor quanto maior o é em relação à conduta dos ofendidos. - Considera a recorrente que a admitir-se a condenação nos termos explanados no acórdão, nunca o cúmulo das penas parcelares a aplicar á arguida deveria ser superior a 10 anos de prisão. - Na concretização das penas aplicadas o Douto Acórdão de que recorre violou o disposto nos Artigos 70° e 71° do código penal.
Respondeu o Ministério Público junto do Tribunal recorrido, conforme fls. 8505/6 verso, dizendo que relativamente a cada um dos lesados não há uma realização plúrima do crime de burla, mas uma única resolução criminosa por parte da arguida que consistiu na captação de cada lesado ou grupo de lesados para o investimento na aquisição de imóveis e viaturas. A arguida cometeu, por cada um dos lesados, ou conjunto de lesados no mesmo negócio, um crime de burla e não um crime continuado. Embora alguns ofendidos tivessem celebrado vários negócios, em vários momentos, com entregas de dinheiro em diversas ocasiões à arguida para a compra de imóveis ou viaturas, o certo é que os crimes foram todos cometidos da mesma forma, com o mesmo artifício fraudulento e, por isso, com uma única resolução criminosa por parte da arguida e, causando todos eles, a final, um prejuízo patrimonial de valor consideravelmente elevado. Termina a resposta concluindo: I) - Dos factos assentes decorre que a arguida cometeu, além do mais, 36 crimes de burla qualificada p. e p. no art. 218° n°2 alínea a) do C.Penal, correspondente a igual número de resoluções criminosas da arguida, consistentes na angariação de lesados ou conjunto de lesados para investirem nos negócios fraudulentos de compra de imóveis e viaturas mencionados nos autos; II) - Atendendo ao passado criminal da arguida com condenações anteriores por idênticos crimes, aos elevados prejuízos patrimoniais que provocou nas diversas vítimas, sem que as ressarcisse, as exigências de prevenção geral e especial são no caso vertente bastante elevadas, pelo que as penas parcelares e a pena única resultante do cúmulo jurídico, aplicadas pelo tribunal recorrido mostram-se adequadas e justas e, na medida da culpa da arguida, face aos limites mínimo e máximo a considerar; III) - Consequentemente, deve manter-se a decisão recorrida no que respeita ao “quantum” das penas aplicadas, mormente, da pena única resultante do cúmulo jurídico.
O recurso foi admitido por despacho de fls. 8518.
O Exmo. Procurador-Geral Adjunto neste Supremo Tribunal de Justiça emitiu douto parecer, de fls. 8572 a 8617, pronunciando-se no sentido de não se verificar qualquer vício, ser de afastar o crime continuado e ser concedido provimento parcial quanto à pena do crime de burla em que é lesado GGG, defendendo dever ser de aplicar a pena de 4 anos de prisão por tal crime, e quanto à pena única, entende dever ficar próxima dos 12 anos de prisão. Relativamente à questão do crime continuado finaliza deste modo, a fls. 8611-2: «Da matéria de facto assente, cremos não haver dúvidas de que a arguida agiu sempre de forma homogénea e lesou sempre o mesmo bem jurídico. Só que dos factos assentes não resulta a existência de um condicionalismo exterior ao agente que facilitou a acção daquele, que facilitou a repetição da actividade criminosa e que, por isso, diminua a culpa da arguida. Dos factos provados resulta antes que foi sempre a arguido que abordou, sugeriu e/ou convenceu os clientes da I... ou outras pessoas que se lhe dirigiam ou a quem elas se dirigia a entregar-lhe várias e avultadas quantias monetárias, assim obtendo muito dinheiro, mas querendo obter sempre mais, sem que qualquer elemento ou factor exterior ou exógeno diminua ou mitigue a sua culpa. Na verdade, resulta da matéria de facto assente que foi sempre a própria arguido quem criou as condições necessárias para a prática dos factos/crimes, formulando várias resoluções criminosas, agindo e concretizando-as em função de cada caso concreto, “adaptando o modus operandi às circunstâncias específicas dos seus desígnios” (como se refere no acórdão recorrido)». Debita ainda o parecer, longamente, de fls. 8593 a 8605, sobre uma questão que em seu entender “paira sobre a impugnação do acórdão recorrido” e que se prenderia “com a verificação, ou não, in casu dos elementos típicos de burla qualificada”, o que na realidade não se verificava, com se alcança das conclusões, não questionando a recorrente a integração das condutas no referido tipo legal de crime.
Cumprido o disposto no artigo 417.º, n.º 2, do Código de Processo Penal, a recorrente silenciou.
Não tendo sido requerida audiência de julgamento, o processo prossegue com julgamento em conferência, nos termos dos artigos 411.º, n.º 5 e 419.º, n.º 3, alínea c), do Código de Processo Penal.
Colhidos os vistos, realizou-se a conferência, cumprindo apreciar e decidir.
Como é jurisprudência pacífica, sem prejuízo das questões de conhecimento oficioso – detecção de vícios decisórios ao nível da matéria de facto emergentes da simples leitura do texto da decisão recorrida, por si só ou conjugada com as regras da experiência comum, referidos no artigo 410.º, n.º 2, do Código de Processo Penal - acórdão do Plenário da Secção Criminal, de 19-10-1995, no processo n.º 46580, Acórdão n.º 7/95, publicado no Diário da República, I Série - A, n.º 298, de 28-12-1995 (e BMJ n.º 450, pág. 72), que fixou jurisprudência, então obrigatória, no sentido de que “É oficioso, pelo tribunal de recurso, o conhecimento dos vícios indicados no artigo 410º, nº 2, do Código de Processo Penal, mesmo que o recurso se encontre limitado à matéria de direito” e verificação de nulidades, que não devam considerar-se sanadas, nos termos dos artigos 379.º, n.º 2 e 410.º, n.º 3, do CPP - é pelas conclusões que o recorrente extrai da motivação, onde sintetiza as razões de discordância com o decidido e resume o pedido (artigo 412.º, n.º 1, do Código de Processo Penal), que se delimita o objecto do recurso e se fixam os limites do horizonte cognitivo do Tribunal Superior.
******* Questões a decidir
Atento o teor das conclusões apresentadas pela recorrente, que traduzem de uma forma condensada, as razões da sua divergência com a decisão impugnada, as questões suscitadas pela impugnante propostas a debate e reapreciação no presente recurso reportam-se aos seguintes aspectos: I Questão – Vício da contradição insanável entre a fundamentação e a decisão - artigo 410.º, n.º 2, alínea b), do CPP. II Questão – Burla qualificada – Crime (s) continuado (s) em dois planos, como considera o acórdão recorrido? – Crime continuado único? - Um único crime? – Pluralidade de crimes? III Questão - Medida das penas parcelares IV Questão - Medida da pena única
FACTOS PROVADOS
Foi dada como provada a seguinte matéria de facto, que é de ter-se por imodificável e definitivamente assente, já que da leitura do texto da decisão, por si só considerado, ou em conjugação com as regras de experiência comum, não emerge a ocorrência de qualquer vício decisório ou nulidade de conhecimento oficioso, mostrando-se a peça expurgada de insuficiências, erros de apreciação ou contradições que se revelem ostensivos, sendo o acervo fáctico adquirido suficiente para a decisão, coerente, sem contradição, harmonioso, e devidamente fundamentado. Como veremos não procede a arguição de vício de contradição insanável. Optou-se por reduzir o tipo de letra relativamente a factos respeitantes em exclusivo aos co-arguidos, que nenhum interesse tem para a apreciação em curso. 2) Após escolhido o potencial cliente, este era convencido de que a aquisição do imóvel cuja venda lhe era proposta, muitas vezes sem que fosse mostrado e apenas com uma vaga indicação a respeito da localização, constituía uma excelente oportunidade de investimento. 3) Para tanto, a arguida indicava um preço muito inferior ao valor de mercado tendo em conta as características que imputava ao imóvel em questão, designadamente a localização e também, muitas vezes, usando os desejos e necessidades do cliente, de que havia tido conhecimento, “vendendo-lhe”, exactamente o que pretendia. 4) Para obter tais desígnios, a arguida escolheu diversos imóveis cujo aspecto permitisse fazer crer a terceiros que estavam devolutos, onde estavam maioritariamente incluídos apartamentos, mas também moradias e, ainda que em menor número, terrenos destinados a construção. 5) No supra referido período, a arguida procedeu igualmente a vendas de veículos, algumas das quais se concretizaram efectivamente, o que apenas serviu para dar credibilidade ao papel de negociante séria que pretendia criar para si e angariar clientes. 6) Para dar credibilidade e aparência de absoluta legalidade aos negócios que ia propor, a arguida AA tratou de arranjar um local onde os clientes se pudessem deslocar e ver o que julgavam ser uma vulgar agência imobiliária, a qual foi denominada “I... – Agência de Mediação Imobiliária” e não possuía qualquer registo de licença emitido em seu nome junto pelo Instituto dos Mercados de Obras Públicas e Particulares e do Imobiliário (I.M.O.P.P.I.), actualmente Instituto da Construção e do Imobiliário, I.P. (INCI, I.P.). 7) E nem a arguida AA estava inscrita no referido organismo, quer na actividade de angariação imobiliária, quer como representante legal de empresa de mediação imobiliária. 8) A arguida AA abriu tal agência imobiliária fictícia, sem existência legal, no lote …, loja …, na Quinta ..., ..., Leiria, que publicitou com o nome de “I... – Agência de Mediação Imobiliária” e que era tida, por qualquer cidadão, como o escritório de uma imobiliária, onde nem faltavam anúncios a apartamentos e moradias. 9) Aí a arguida AA recebia os clientes e fazia-se passar por vezes por solicitadora de execuções, salientando os bons contactos que tinha junto de tribunais, leiloeiras ou bancos, e as relações privilegiadas que mantinha com advogados, funcionários judiciais e até juízes. 10) Algumas vezes, diante dos clientes, simulava conversas telefónicas com estes supostos interlocutores, referindo-se por vezes a uma tal Dra. FFFF que não se apurou que tivesse existência real. 11) Como contava a alguns clientes, a actividade de solicitadora aliada a estes seus conhecimentos privilegiados, permitia-lhe saber com antecedência, de imóveis que iam ser vendidos no âmbito de processos judiciais ou fiscais, adquirindo-os antes que fossem vendidos em hasta pública. 12) E, desta forma, como explicava, conseguia que o preço fosse reduzido, por apenas ter de ser pago o valor da dívida ao exequente, nunca se atingindo o preço que poderia atingir caso chegasse a ter lugar a venda judicial. 13) Porém, nalguns casos avisava logo os clientes que todo o procedimento tinha de ser muito rápido, caso contrário não conseguiria impedir a venda judicial, dando àqueles um prazo muito curto para procederem ao pagamento do preço que lhes indicava, com vista a pressionar os mesmos a celebrar o negócio. 14) Algumas vezes a arguida AA conduzia as vítimas às imediações de edifícios previamente seleccionados e indicava-lhes o exterior de uma das fracções, dizendo que só depois da escritura poderiam ter acesso ao interior. 15) Pondo em prática toda esta encenação, com uma ou outra variante, a arguida AA logrou convencer um vasto número de cidadãos a entregar-lhe quantias, muitas vezes em numerário, como contrapartida da aquisição de bens que nunca teve intenção de lhes vender ou vendeu, o que fez da seguinte forma:
I. II e II. JJ.
16) Em data incerta, em meados de 2005, II tomou conhecimento, por intermédio de GGGG, da possibilidade de adquirir viaturas a preço inferior ao valor de mercado, por serem, segundo lhe explicou aquele, provenientes de vendas judiciais. 17) Nas palavras do GGGG, tais vendas seriam feitas por intermédio da sua irmã, a arguida AA, por esta ter bons conhecimentos junto dos tribunais. 18) Em consequência dessa conversa, comprou por intermédio do GGGG um veículo marca Mercedes, de matrícula não apurada, tendo essa transacção decorrido sem incidentes. 19) Mas o GGGG dissera-lhe ainda que a arguida AA conseguia também saber de processos que tinham por objecto imóveis que iriam ser vendidos em hasta pública, sendo o preço de aquisição inferior ao de mercado. 20) II contactou então a arguida AA, no escritório desta, na “I...”, para saber pormenores. 21) Na altura a arguida AA confirmou as explicações fornecidas pelo GGGG, a propósito da forma como decorriam as aquisições de bens e justificação para o respectivo valor. 22) A arguida AA explicou-lhe que tinha contactos privilegiados junto de Tribunais, através dos quais obtinha informações a respeito de bens que iam ser vendidos em hasta pública, antecipando-se a essa venda e evitando-a, assim proporcionando a aquisição dos bens, aos seus clientes, apenas pelo valor da dívida, sem outros encargos. 23) O II acreditou na legalidade dos negócios descritos, não vendo motivo para duvidar, até porque a arguida dispunha de um escritório aberto ao público, onde recebia clientes e onde existia publicidade vária a imóveis, tudo como se fosse uma normal agência imobiliária. 24) Animado com a perspectiva de lucros elevados e rápidos, decidiu investir na aquisição de alguns imóveis, conforme lhe foi sendo proposto pela arguida. 25) Para tanto aliou-se a JJ. 26) Os ofendidos II e o JJ aceitaram a proposta de aquisição do que a arguida AA lhes disse ser um apartamento tipo T3, sito na zona do Calhau, na Nazaré, pelo preço de € 45.000,00 (quarenta e cinco mil euros). 27) A arguida exigiu de imediato a entrega da quantia de € 4.500,00 (quatro mil e quinhentos euros) a pretexto de que precisava de sinalizar o apartamento, sob pena de o negócio não ser concretizado. 28) Essa quantia foi logo paga através do cheque nº … da conta nº … do B.N.C. titulada pelo ofendido II, com data de 12/09/2005. 29) Pouco depois, a arguida AA disse-lhes que tinha um comprador para aquele apartamento que oferecia € 90.000,00 (noventa mil euros) pelo mesmo. 30) Os ofendidos II e JJ aceitaram de imediato realizar a venda por aquele valor, mas nunca tiveram intervenção em qualquer acto relacionado com a suposta venda, nem receberam aquela quantia. 31) Isto porque, entretanto, a arguida lhes foi propondo a compra de outros prédios, aliciando-os com a realização de novos lucros, dizendo que aquele valor poderia ser aplicado logo nessas aquisições. 32) Tal quantia, a que se somaram outras entretanto exigidas pela arguida, foi assim destinada à aquisição, no período compreendido entre Setembro e inícios de Outubro de 2005, do que a arguida AA disse ser: 1. Um apartamento tipo T3 na Quinta do Bispo em Leiria, para cujo pagamento foi entregue o cheque nº … no montante de € 5.500,00 (cinco mil e quinhentos euros) sacado sobre a conta nº … do B.N.C. titulada pelo II. 2. Dois apartamentos do tipo T3 na Urbanização de Belmonte, em Leiria, para cujo pagamento foi entregue o cheque nº …, no valor de € 20.843,00 (vinte mil oitocentos e quarenta e três euros) sacado sobre a conta nº … do B.N.C. titulada pelo II. 3. Duas lojas em Fátima e uma moradia em Aljustrel, sem qualquer outra indicação a respeito da localização, cujo pagamento foi efectuado através da entrega da quantia de € 22.000,00 (vinte e dois mil euros) em numerário, conforme exigência da AA. 4. Dois apartamentos do tipo T3 sitos em Fátima, sem outra indicação quanto à localização, cujo pagamento foi efectuado através da entrega da quantia de € 18.290,00 (dezoito mil duzentos e noventa euros) em numerário. 33) O ofendido JJ adquiriu ainda à arguida AA um apartamento sem outra indicação a respeito da localização que não seja, Sete Rios, Lisboa, que se destinava aos seus cunhados, cujo pagamento foi efectuado através da entrega, pelo mesmo, da quantia de € 75.000,00 (setenta e cinco mil euros) em numerário, conforme exigência da arguida AA. 34) Paralelamente às aquisições de imóveis que julgaram efectuar em conjunto, os ofendidos II e JJ, manifestaram intenção de fazer investimentos idênticos, desta vez aliando-se ainda com HHHH. 35) Assim, ainda no mês de Setembro de 2005, aqueles aceitaram as propostas de aquisição efectuadas pela arguida AA, do que esta lhes disse serem quatro apartamentos, na cidade de Coimbra, sem que outros pormenores fossem dados a respeito da sua identificação, pelo preço de € 150.000,00 (cento e cinquenta mil euros). 36) Os ofendidos entregaram então à arguida AA, para pagamento do preço de tais apartamentos, pelo menos, a quantia de € 75.000,00 mediante entrega do cheque nº … da conta nº … titulada por HHHH. 37) A arguida AA nunca diligenciou pela realização das escrituras referentes aos prédios acima enumerados, cuja compra propôs aos ofendidos e estes julgaram ter efectuado. 38) Com efeito, a realização de tais escrituras era impossível, sendo certo que a arguida AA sempre o soube, por ter conhecimento que, dos ditos prédios, uns não existiam e os demais não estavam em condições de serem vendidos, nas circunstâncias que foram relatadas aos ofendidos, ou quaisquer outras circunstâncias, aliás, visto que os respectivos proprietários não tinham intenção de os negociar, nem a haviam mandatado a arguida para tal. 39) Verificando que as escrituras não eram realizadas, nem qualquer documento lhes era entregue ou, sequer, lhes era fornecida a concreta localização dos imóveis ou permitido o acesso aos mesmos, os ofendidos começaram a recear terem sido vítimas de um logro, convicção que acabaram por manifestar à arguida AA. 40) Inicialmente, esta persistiu na versão que todos os negócios eram legítimos e que todos os documentos seriam entregues, mas a determinada altura deixou de conseguir convencer os ofendidos II e JJ. 41) Então, face à constante pressão daqueles e receando que a notícia do embuste se espalhasse, a arguida AA acabou por lhes devolver (em numerário e cheques de terceiros) a quantia que deles tinha recebido.
III. KK e IV. LL
42) O KK e o LL, amigos e sócios, prestavam serviço de contabilidade a GGGG e, no final de 2004, aquele disse-lhes, em várias conversas, que a irmã AA, negociava veículos e imóveis a preços inferiores aos valores de mercado, proporcionando bons negócios. 43) O GGGG fazia-se transportar numa viatura de marca e modelo B.M.W. 530 D que mostrou aos ofendidos e informou-os tê-la comprado por intermédio da AA. 44) Assim curiosos com tal negócio, os ofendidos KK e LL quiseram saber mais do mesmo, e informou-os que a AA tinha um escritório e negociava viaturas provenientes de processos de execução, originados pelo incumprimento dos contratos, possibilidade que lhe era facultada pela circunstância de ter conhecimentos privilegiados junto de empresas de leasing e bancos. 45) Exibiu-lhes mesmo uma lista com a descrição de vários veículos e respectivo preço de comercialização, veículos que segundo lhes disse estavam disponíveis para venda, através da AA. 46) Convencidos que a arguida AA, tinha de facto possibilidades de comercializar viaturas a reduzido preço, tanto mais que tinham visto aquele com um B.M.W. de último modelo, os ofendidos decidiram adquirir, através da AA, três veículos. 47) A título de sinal, tal como lhes foi exigido, entregaram-lhe a quantia de € 15.000,00 (quinze mil euros) através de cheque, correspondendo a € 5.000,00 por cada carro, mas apenas lhes foi entregue um B.M.W., cuja matrícula e demais características não foram apuradas, altura em que pagaram, em numerário, a quantia de € 16.500,00 (dezasseis mil e quinhentos euros). 48) Ora, como as restantes viaturas não lhes fossem entregues nem o sinal devolvido, decidiram chegar à fala com a AA, para resolver tal questão. 49) A arguida AA disse-lhes então que não haveria problema e que tinha outro negócio muito melhor que a compra e venda de automóveis, negócio esse no ramo imobiliário e que tinha bons contactos junto dos Tribunais, nos quais se incluíam mesmo alguns juízes e, em virtude desses contactos privilegiados, tinha conhecimento antecipado dos imóveis que iam ser negociados em hasta pública, os quais podiam assim ser adquiridos, antes daquela venda, por preço muito inferior ao que normalmente o bem atingiria. 50) E sugeriu-lhes então que investissem na aquisição de imóveis nestas circunstâncias, negócio que seria feito por seu intermédio, argumentando que, esses sim, eram negócios geradores de elevados lucros. 51) A explicação fornecida aos ofendidos pareceu-lhes plausível, pelo que acreditaram no que a arguida lhes disse, até porque ela era irmã do GGGG, pessoa em quem depositavam confiança. 52) Animados com a perspectiva de fazer bons negócios no ramo imobiliário, tal como lhes prometera a arguida AA, os ofendidos decidiram aliar-se, para mais facilmente reunirem o capital necessário e investir na aquisição de imóveis. 53) Em 20/07/2005 a arguida AA propôs a ambos os ofendidos a aquisição, do que disse serem, quatro apartamentos do tipo T3 sitos em Coimbra, pelo preço de € 38.932,00 (trinta e oito mil novecentos e trinta e dois euros). 54) A arguida não forneceu outros elementos que permitissem identificar os prédios, prometendo fazê-lo mais tarde, acrescentando que a escritura seria feita rapidamente, no prazo de 45 dias. 55) E logo nesse dia, emitiram e entregaram à arguida AA o cheque nº … sacado sobre a conta nº … da C.C.A.M de Leiria titulada pelo LL. 56) Dias depois, a 25/07/2005, a arguida AA apresentou-lhes nova proposta, renovando as promessas de bons lucros, sugerindo-lhes desta vez, a aquisição do que disse ser um apartamento do tipo T3 sito na Quinta ..., Leiria e um apartamento do tipo T3 sito na Rua do Operário, nos Marinheiros, em Leiria, pelo preço de € 16.800,00 (dezasseis mil e oitocentos euros). 57) E ainda, um apartamento do tipo T3 situado na Urbanização das Pimenteiras, ..., em Leiria, pelo preço de € 6.980,00 (seis mil novecentos e oitenta euros) 58) Efectuaram esses pagamentos através da entrega dos cheques nºs … e … da conta nº … do B.P.N., titulada pelo LL. 59) Algum tempo depois, no início do mês de Agosto de 2005, a arguida AA propôs-lhes a aquisição de sete apartamentos situados em Leiria, pelo preço global de € 78.380,00 (setenta e oito mil trezentos e oitenta euros). 60) Procederam ao respectivo pagamento, mediante entrega à arguida AA do cheque nº …, datado de 09/08/2005, sacado sobre a conta nº … da C.C.A.M. da Batalha titulada pelo KK. 61) A arguida AA nunca diligenciou pela realização das escrituras referentes aos prédios acima enumerados, cuja compra propôs aos ofendidos e este julgaram ter efectuado. 62) Com efeito, a realização de tais escrituras era impossível, sendo certo que a arguida AA sempre o soube, por ter conhecimento que, dos ditos prédios, uns não existiam e os demais não estavam em condições de serem vendidos, nas circunstâncias que foram relatadas aos ofendidos, ou quaisquer outras circunstâncias, aliás, visto que os respectivos proprietários não tinham intenção de os negociar, nem haviam mandatado a arguida AA para tal. 63) Entretanto, à medida que o tempo ia passando, verificando que as escrituras não eram realizadas, nem qualquer documento lhes era entregue ou, sequer, lhes era fornecida a concreta localização dos imóveis ou permitido o acesso aos mesmos, os ofendidos começaram a recear terem sido vítimas de um logro, convicção que acabaram por manifestar à arguida AA. 64) Inicialmente, esta persistiu na versão que todos os negócios eram legítimos, mas a determinada altura deixou de conseguir convencer os ofendidos, acabando por admitir que os havia enganado e que nenhuma das compras que eles julgavam ter feito, acontecera. 65) Os ofendidos começaram a pressionar a arguida AA exigindo a devolução das quantias entregues e devido a essa pressão, receando que a notícia do embuste se espalhasse, acabou por lhes devolver (em numerário e cheques de terceiros) a quantia que deles recebera e que perfez a quantia de € 143.800,00 (cento e quarenta e três mil e oitocentos euros). 66) Tal devolução teve lugar mediante entrega de diversas parcelas em numerário e mediante entrega dos cheques nºs … e … ambos de conta titulada por MM; nº … titulado por JJJ; nº … de conta titulada por PPP; nº … de conta titulada por IIII; nº … da conta de JJJJ; nºs … e … da conta de SS; nºs … e …da conta de QQ; nº … da conta titulada por OO; nº … da conta titulada por “... -Compra e Venda de Imóveis Lda.”. 67) Tais cheques haviam sido entregues aos arguidos, por outros “clientes”, destinando-se ao pagamento de imóveis que também eles julgavam ter adquirido por intermédio da arguida AA. 68) Além dos referidos cheques, a arguida entregou ainda aos ofendidos o cheque nº … da conta nº … titulada pelo arguido FF no Banco Millenium, com data de 03/01/2006, no valor de € 53.000,00, cheque esse que viria a ser devolvido na compensação por vicio na formação da vontade.
V. MM
69) O ofendido MM, conversando com o seu cunhado, pai da arguida AA, soube por este que a AA trabalhava no ramo imobiliário e que “a vida lhe corria bem.” 70) Algum tempo depois, porque estava com ideias de comprar um apartamento em Coimbra, para uma sua filha, o MM abordou a sobrinha, a arguida AA, e deu-lhe conta das suas intenções, perguntando-lhe se tinha algum apartamento disponível. 71) A AA propôs-lhe então a aquisição de três apartamentos em Coimbra, sendo, segundo lhe disse, dois deles do tipo T3, sitos na Avenida de Celas e Avenida Sá da Bandeira e um outro, do tipo T4 sito na Avenida do Brasil, tudo pela quantia de € 72.800,00 (setenta e dois mil e oitocentos euros). 72) E que ainda tinha para venda uma moradia nova sita na Urbanização da Sobreira, em Ançã, Cantanhede pelo preço de € 62.000,00 (sessenta e dois mil euros). 73) Na referida ocasião a arguida AA disse a MM que os imóveis eram provenientes de execuções judiciais e que os adquiriria antes de serem vendidos pelo valor da dívida, assim justificando os preços mais reduzidos que os normalmente praticados no mercado. 74) Pouco esclarecido a respeito dos meandros das vendas judiciais e sem motivos para desconfiar da sobrinha, o ofendido acreditou na explicação que a AA lhe deu e aceitou a proposta de compra dos apartamentos de Coimbra. 75) Dias depois a arguida telefonou-lhe para lhe dizer que tinha de entregar nesse mesmo dia o preço total combinado, ou seja, € 72.800,00 (setenta e dois mil e oitocentos euros) porque se não o fizesse, perdia o negócio. 76) Mantendo a confiança que tinha na arguida AA, convicto que esta lhe proporcionava uma boa oportunidade de negócio, MM entregou àquela o cheque nº …, sacado sobre a sua conta nº ..., com data de 30/11/2005, cheque esse emitido ao portador, conforme instruções da AA. 77) Logo nessa ocasião, a arguida AA disse-lhe ainda que também tinha de entregar a quantia de € 62.000,00 (sessenta e dois mil euros) referente à aquisição da moradia em Ançã, porque o prazo estava a acabar. 78) De nada desconfiando, no dia 05/12/2005, MM entregou à arguida AA o cheque nº … sacado sobre a sua conta nº …, cheque esse que também emitiu ao portador. 79) Nenhum dos cheques entregues pelo MM teve o destino mencionado pela arguida AA, sendo certo que esta nunca teve qualquer intenção de proporcionar ao ofendido a aquisição de nenhum dos prédios que lhe referiu. 80) Com efeito tais cheques foram entregues a KK que entretanto havia descoberto ter sido enganado pelos arguidos e começara a exigir a devolução das quantias pagas. 81) Nenhuma das descritas aquisições se concretizou, ficando o ofendido MM privado da quantia global de € 134.800,00 (cento e trinta e quatro mil e oitocentos euros) que entregou à arguida AA, como contrapartida da aquisição de bens que aquela nunca teve intenção de lhe proporcionar. 82) As escrituras relativas às referidas aquisições nunca foram realizadas, nem os imóveis entregues ao ofendido, sendo certo que a arguida AA sempre soubera que tal não seria possível, visto que não existiam nos locais referidos, quaisquer imóveis em situação de serem vendidos, nas circunstâncias relatadas ao ofendido, ou em quaisquer outras circunstâncias, nem a mesma estava mandatada por quem quer que fosse para negociar qualquer prédio ali localizado.
VI. NN 83) O ofendido NN é proprietário de um restaurante em Lagos, local onde em dia indeterminado de Agosto de 2005 o GGGG foi jantar, após ter travado conhecimento com ele, pouco tempo antes, por intermédio de um amigo. 84) Durante o jantar, enquanto conversavam, o GGGG disse-lhe que conhecia uma senhora de nome AA, solicitadora, que tinha bons contactos no Tribunal de Leiria e conseguia obter imóveis que estavam em processo de execução judicial, apenas pelo valor da dívida, adquirindo-os antes que fossem vendidos em hasta pública. 85) Tendo-se NN mostrado interessado, dias depois, o GGGG telefonou-lhe, dizendo que a AA tinha à venda um apartamento na Avenida dos Combatentes, em Albufeira que custaria entre os trinta e sete e os trinta e oito mil euros. 86) Avisou-o logo que caso estivesse interessado tinha de efectuar o pagamento até ao dia seguinte e deu-lhe o número de telefone da AA, a quem o ofendido NN telefonou, manifestando interesse na aquisição daquele apartamento. 87) Constatando tal interesse, a arguida AA disse-lhe que tinha de pagar o preço até ao dia seguinte – 17/08/2005 – sob pena de o apartamento ser vendido e se perder o negócio. 88) O NN convenceu-se que teria de entregar aquele valor no prazo indicado, sob pena de perder o negócio e, por isso, logo nessa noite viajou até Leiria, hospedou-se num hotel nesta cidade. 89) Travou então conhecimento com a AA, confirmando esta ser solicitadora de execução e que ele teria de passar um cheque no valor da execução, embora só trinta ou quarenta dias depois fosse feito o registo. 90) Tendo-lhe a arguida AA referido igualmente que só após tal prazo poderia ver o apartamento. 91) O NN então preencheu, assinou e entregou à arguida AA o cheque nº … sacado sobre a sua conta nº … do B.P.I, no valor de € 38.530,00, com data de 17/08/2005. 92) Este cheque foi emitido à ordem de BB, tudo conforme instruções da arguida, que lhe disse tratar-se do credor do executado. 93) Dias depois, a arguida AA telefonou ao NN, falando-lhe na possibilidade de aquisição de doze apartamentos sitos na Urbanização Nova Leiria, em Leiria, por um preço concretamente não apurado mas não inferior a € 100.000,00. 94) O NN ficou interessado, mas deu conta à arguida de que não tinha disponível, no momento, a totalidade da quantia referida. 95) A arguida propôs-lhe então que adquirisse os imóveis “em sociedade” com o GGGG e com um outro seu cliente, caracterizado pela AA como pessoa abastada. 96) O NN aceitou e como a arguida voltou a insistir na necessidade de o pagamento ser feito rapidamente, sob pena de se gorar o negócio, entregou-lhe a 29/08/2005, o cheque nº … sacado sobre a sua conta nº …, do B.P.I. no valor de € 40.677,00 (quarenta mil seiscentos e setenta e sete euros) quantia que corresponderia à sua quota na tal sociedade. 97) Tal como antes, não lhe foi fornecida qualquer documentação referente aos imóveis, mas como insistiu em vê-los, GGGG levou-o até uma zona urbanizada indicando-lhe um edifício que afirmou ser o objecto do negócio, explicando-lhe que o interior só poderia ser mostrado depois de realizada a escritura, conforme lhe informara a arguida AA. 98) Tal edifício corresponde ao lote … sito na Rua …, Urbanização Nova Leiria, nesta cidade, com o artigo matricial urbano …, descrito na Conservatória do registo Predial de Leiria sob o nº …, compondo-se de cave, rés-do-chão, primeiro, segundo e terceiro andares para habitação e sótão, com as fracções autónomas A,B,C,D,E,F,G,H,I,J,K,L,M, a confrontar do norte e nascente com arruamento, sul com lote 43 e poente com logradouro 99) Entretanto o ofendido ia insistindo pela marcação da escritura, pela entrega das chaves e documentação, o que a arguida AA ia adiando com sucessivas desculpas. 100) A arguida AA, em 23 de Outubro de 2005, altura em que lhe telefonou, disse a NN que tinha ainda para venda dois apartamentos tipo T3, com garagem individual, sitos na Rua …, Manta Rota, em Leiria, pelo preço de € 31.000. 101) Porque já se encontrava desconfiado de que estaria a ser enganado, o NN perguntou em nome de quem deveria passar o cheque, dizendo-lhe a arguida que deveria ser emitido á ordem de MMM. 102) E após averiguações o NN descobriu que na rua que lhe havia sido indicada não havia qualquer imóvel registado em nome de MMM, suposto vendedor do prédio. 103) A partir de então, o NN ficou ainda mais desconfiado com a genuinidade das aquisições que fizera, duvidando mesmo da existência dos prédios e passou a insistir com mais veemência, com a arguida AA, para fornecer toda a documentação e chaves dos ditos imóveis, o que aquela nunca fez. 104) Ao invés, foi dando sucessivas desculpas ao ofendido NN, tendo inclusive dito ao mesmo que tinha já um comprador para o apartamento de Albufeira, o qual iria em breve ao escritório assinar o contrato promessa e entregar o sinal, o que nunca sucedeu. 105) Finalmente, quando o NN lhe disse que não queria vender o apartamento, mas sim obter as chaves e os documentos, a arguida AA acabou por admitir que tudo não passara de uma burla e que nunca lhe poderia entregar qualquer um dos imóveis que fingira vender-lhe. 106) Nenhuma das descritas aquisições se concretizou, ficando o ofendido NN privado da quantia global de € 79.207,00 (setenta e nove mil duzentos e sete euros) que entregou à arguida AA, como contrapartida da aquisição de bens que aquela nunca teve intenção de lhe proporcionar. 107) As escrituras relativas às supra descritas aquisições nunca foram realizadas, nem os imóveis entregues ao ofendido NN, sendo certo que a arguida AA sempre soube que tal não seria possível, visto que não existiam nos locais referidos, quaisquer imóveis em situação de serem vendidos, nas circunstâncias que relatou ao ofendido, ou em quaisquer outras circunstâncias, nem a mesma estava mandatada por quem quer que fosse para negociar qualquer prédio ali localizado. 108) O ofendido NN sofreu ansiedade e preocupação pelo facto de não conseguir concretizar as supra referidas vendas ou recuperar o dinheiro entregue à arguida AA, tendo ficado ainda mais ansioso e preocupado, bem como triste e com medo de perder todo o dinheiro investido, quando a mesma acabou por admitir que tudo não passara de uma burla e que nunca lhe poderia entregar qualquer um dos imóveis que fingira vender-lhe.
VII. OO
109) O ofendido OO ouviu falar a conhecidos, em meados de 2005, da possibilidade de adquirir viaturas e imóveis, oriundos de penhoras judiciais ou fiscais, a preços inferiores aos correntes, negócios esses que eram feitos por intermédio da arguida AA. 110) Porque estava interessado na compra de um automóvel, em Janeiro de 2006, dirigiu-se à “I...”, escritório da arguida AA, com quem falou a tal respeito. 111) A arguida AA, confirmou que de facto tinha acesso a bens que estavam prestes a ir a hasta pública, mas que podia vendê-los antecipadamente, o que justificava os preços mais reduzidos que os praticados normalmente. 112) A arguida percebeu que o OO era pouco entendido em vendas judiciais e aproveitou esse desconhecimento, convencendo-o que poderia realizar um bom negócio. 113) O ofendido OO aceitou então a proposta que a arguida AA lhe fez para adquirir um Audi modelo A3, TDI, com 80 mil km, pelo preço de € 6.786,00 (seis mil setecentos e oitenta e seis euros). 114) Tal veículo estaria, no dizer da AA, guardado no parque de uma empresa de leasing e que demoraria cerca de 3/4 meses a ser entregue, mas exigiu-lhe logo a entrega da quantia de € 1.357,00 (mil trezentos e cinquenta e sete euros) a título de sinal. 115) Montante que o ofendido OO pagou à arguida AA através do cheque nº … sacado sobre a conta nº … da C.G.D., com data de 12/01/2006. 116) Entretanto a arguida AA propôs-lhe a aquisição do que disse ser um apartamento do tipo T3, no 3º andar de um edifício sito na zona da Guimarota, em Leiria, pelo preço de 11.500€ (onze mil e quinhentos euros). 117) A arguida não lhe deu outros pormenores a respeito da localização de tal apartamento, tendo-lhe dito que não o podia ver dado que não tinha chave e que a escritura demoraria 3/4 semanas. 118) De nada duvidando, OO entregou à arguida AA tal quantia, através do cheque nº … sacado sobre a conta nº … da C.G.D., no dia 3/02/2006. 119) A arguida não deu ao cheque o destino que o ofendido OO julgou que seria dado e que esteve subjacente à sua emissão, não o usando na aquisição de nenhum apartamento a ele destinado. 120) Após, a arguida AA entregou tal cheque aos ofendidos KK e LL, que entretanto lhe haviam exigido a devolução das quantias entregues. 121) Nenhuma das descritas aquisições se concretizou, ficando o ofendido OO privado da quantia global de € 12.857,00 (doze mil oitocentos e cinquenta e sete euros) que entregou à arguida AA, como contrapartida da aquisição de bens que aquela nunca teve intenção de lhe proporcionar. 122) A escritura nunca foi realizada, nem o imóvel foi entregue ao ofendido, sendo certo que a arguida AA sempre soube que tal não seria possível, visto que não existia no local referido, qualquer imóvel em situação de ser vendido, nas circunstâncias relatadas ao ofendido, ou em quaisquer outras circunstâncias, nem aquela estava mandatada por quem quer que fosse para negociar qualquer prédio ali localizado.
VIII. PP e IX. QQ
123) O ofendido PP, em conversa com o seu irmão, QQ, disse-lhe que pretendia adquirir casa própria na zona de Leiria. 124) Algum tempo depois, o irmão disse-lhe que soubera por intermédio de um conhecido – o arguido FF – que havia uma moradia para venda, em Leiria, a preço que lhe conviria, pelo que o encarregou de saber pormenores e mais tarde, de concretizar o negócio que lhe veio a ser proposto. 125) O ofendido QQ conheceu o arguido FF, em data incerta, visto que joga futsal no União de Leiria, onde o arguido trabalhava como massagista. 126) Em conversas casuais, por diversas vezes, o FF havia-lhe proposto a aquisição de veículos a preços muito inferiores aos normalmente praticados, explicando-lhe que os veículos provinham de execuções. 127) Entretanto, no início de 2006, diante do que lhe dissera o PP, o QQ comentou com o FF que tinha um irmão interessado em comprar casa em Leiria. 128) O arguido referiu-lhe então a possibilidade de comprar imóveis que estavam a ser vendidos por uma imobiliária através do tribunal, provenientes de execuções e por isso a preços mais baixos 129) Interessado, o QQ disse-lhe que apresentasse algumas propostas. 130) Verificando o interesse daquele, o arguido não perdeu tempo e disse-lhe logo que o levava a visitar alguns imóveis que tinha disponíveis para venda. 131) Passado algum tempo, o arguido FF mostrou a QQ uma moradia sita na Urbanização ... nº .., em ..., Leiria, a qual, segundo explicou, estaria em vias de ser vendida pelo Tribunal, no âmbito de um processo de execução e que seria de um médico que teria problemas com o jogo. 132) O arguido FF disse-lhe ainda que o preço rondaria os € 100.000,00 (cem mil euros) acrescentando que caso estivesse interessado, tinha de fazer de imediato a entrega da quantia de € 30.000,00 (trinta mil euros) a título de sinal. 133) Combinaram então um encontro no escritório da AA, pessoa que estaria encarregada de dar andamento aos trâmites do processo e redigir o contrato promessa. 134) Nesse encontro, em Janeiro de 2006, a arguida confirmou a versão do FF, mas disse-lhe que o sinal era de € 40.000,00 (quarenta mil euros). 135) Disse-lhe ainda que tinha bons contactos junto do Tribunal e, por intermédio deles, sabia de bens penhorados no âmbito de processos vários, que podia adquirir antes de os mesmos serem vendidos em hasta pública, pagando apenas o preço da dívida à entidade exequente. 136) Como explicou, ao antecipar-se à venda judicial, conseguia um preço mais baixo que aquele que o bem certamente atingiria se chegasse a ser vendido. 137) Residia aí, segundo disse, a razão dos preços serem inferiores aos normais preços de mercado, mas também, a razão da entrega da quantia referida ter de ser feita rapidamente para impedir a venda judicial. 138) Por acreditar em tudo que os arguidos lhe haviam contado, sem razão para duvidar da legitimidade daqueles para realizar a venda, o QQ deu conta da proposta ao irmão. 139) Agradado com o que soube por intermédio daquele, o PP decidiu adquirir o referido imóvel e pediu ao irmão que procedesse ao pagamento da quantia exigida a título de sinal, através do cheque nº … no montante de € 30.000 (trinta mil euros), datado de 26/01/2006, sacado sobre a conta nº … da C.G.D. de que era titular, tendo os restantes € 10.000,00 (dez mil euros) sido pagos pelo QQ mediante a entrega do cheque nº … de conta por si titulada, quantia que posteriormente lhe foi paga pelo ofendido PP através de transferência bancária. 140) O QQ procedeu conforme lhe foi dito e a arguida disse que entregaria a chave logo que a tivesse, o que efectivamente aconteceu uma semana mais tarde, acrescentando que, no máximo, no prazo de dois meses faria a escritura. 141) A arguida AA obtivera a chave da moradia através de uma imobiliária a quem o proprietário encarregara de diligenciar pela respectiva venda, tendo providenciado por uma cópia, precisamente para, em caso de necessidade, ser possível exibir uma moradia ao cliente. 142) Mas, quando entregou a chave ao ofendido, disse que não se deslocassem à moradia e que não convinha sequer serem vistos perto da mesma, para não melindrar os sentimentos dos executados que estavam numa situação delicada. 143) Sucede que o PP teve de contrair um empréstimo bancário para a compra da moradia em causa e, precisava de efectuar registos provisórios, sendo certo que a instituição bancária exigia ainda a avaliação do imóvel. 144) A arguida AA disponibilizou-se então a efectuar o registo provisório da aquisição, o que nunca veio a acontecer dado que aquela, apesar de agendar por várias vezes esses registos, nunca compareceu na Conservatória em qualquer das datas que foi indicando, nem mais atendeu telefonemas. 145) Confrontado com tal situação o arguido FF ia dizendo ao ofendido PP que as coisas estavam a andar, que ia correr tudo bem e que a demora se devia ao facto da arguida AA ter de fazer transfusões de sangue. 146) A arguida AA nunca teve qualquer intenção de proporcionar ao ofendido PP a referida moradia, sendo seu único propósito obter dele a quantia que o levou a entregar-lhe e que usou como entendeu. 147) E, para melhor o conseguir ludibriar, arranjou forma de obter a chave daquela moradia, que sabia estar desocupada e para venda, para a poder exibir ao ofendido dissipando-lhe quaisquer dúvidas que pudesse ter. 148) Certo é que, a referida moradia não era objecto de qualquer processo executivo e, muito embora o referido imóvel estivesse à venda, o preço fixado pelo proprietário era de pelo menos € 180.000,00 (cento e oitenta mil euros). 149) De todo o modo, a arguida AA não havia sido mandatada pelo proprietário para proceder a essa transacção, nem esta seria alguma vez concretizada por seu intermédio nas circunstâncias que foram relatadas ao PP. 150) Depois da entrega da referida chave, aproveitando o clima de confiança criado, o arguido FF contactou de novo o QQ, dizendo-lhe que a AA tinha uma casa para venda que podia constituir um bom negócio. 151) Ainda animado com a forma, como se processara a transacção da moradia do seu irmão, o QQ, mostrou-se interessado nesse negócio. 152) Verificando esse interesse, o arguido FF, adiantou-lhe que se tratava de um imóvel que iria ser vendido no âmbito de um processo de execução fiscal, mas que tinha de ser rápido a decidir a aquisição, porque havia muita gente interessada. 153) E, para melhor o convencer, no dia 07/02/2006 levou-o a ver uma moradia sita na Rua … lote nº …, em Casal de Matos, em Leiria, dizendo ao QQ que se tratava do imóvel de que lhe falara. 154) Informou-o que o preço total era de € 115.000,00 (cento e quinze mil euros) mas que o sinal, no montante de € 39.000,00 (trinta e nove mil euros) teria de ser entregue até ao dia seguinte, caso contrário não poderia impedir a venda da casa. 155) O QQ acreditou e, por isso, logo no dia 08/02/2006 dirigiu-se ao escritório da AA a quem entregou o cheque nº … sacado sobre a sua conta nº … do Millenium B.C.P., no valor de € 39.000,00. 156) O prédio em causa é propriedade de KKKK, está descrito na Conservatória do Registo Predial de Leiria sob o nº …, correspondendo-lhe o artigo matricial urbano … e não estava hipotecada a nenhuma entidade, sobre ela não incidia nenhuma penhora ou arresto, nem estava em vias de ser vendida no âmbito de qualquer processo executivo ou fiscal. 157) E, muito embora a moradia estivesse, efectivamente, para venda, o seu proprietário não encarregara qualquer agência imobiliária ou a arguida AA de diligenciar por essa venda. 158) Mas, assim mesmo a arguida AA levou o ofendido QQ a entregar-lhes a quantia de € 39.000,00 (trinta e nove mil euros) como contrapartida da entrega de um bem que nunca teve intenção de lhe proporcionar. 159) Porque no momento em que o ofendido QQ procurava entrar na referida casa chegou o filho do proprietário, KKKK apresentou queixa-crime contra o ofendido, tendo-se este sentido vexado na sua honra e consideração.
X. RR
160) O ofendido RR, em meados de 2006, soube através de um seu fornecedor, chamado LLLL, que se podiam fazer bons negócios com automóveis e imóveis a preços muito inferiores aos valores de mercado, através de uma amigo seu e de uma senhora que era solicitadora. 161) No dia 05/05/2006, o referido LLLL telefonou-lhe para lhe dizer que o seu amigo, o II, estava em Leiria acompanhado da tal senhora e que ambos tinham disponíveis dois apartamentos que lhe poderiam agradar. 162) Interessado, deslocou-se a Leiria, onde se encontrou com os arguidos GG e AA, junto a um cartório notarial. 163) Aí a arguida AA disse a RR que os referidos dois apartamentos estavam penhorados e tinham de ser vendidos em conjunto porque estavam no mesmo processo, pelo preço total de € 40.800,00 (quarenta mil e oitocentos euros), valor correspondente ao da divida. 164) E disseram-lhe que deveria proceder de imediato ao pagamento porque o dinheiro teria de ser entregue no tribunal para parar a execução e evitar a venda em hasta pública. 165) Pouco entendido nos meandros dos procedimentos executivos, pressionado pela urgência que os arguidos lhe diziam haver no pagamento, e pelo receio de perder um negócio que foi levado a crer ser vantajoso, o RR entregou aos arguidos a quantia exigida. 166) O que fez mediante entrega dos cheques nºs … e …, no valor de € 28.300,00 (vinte oito mil e trezentos euros) e € 12.500,00 (doze mil e quinhentos euros), sacados sobre a sua conta nº … da C.G.D. 167) De seguida, o arguido II levou-o até local que não foi possível determinar, na freguesia de Pousos e junto à Estação de Leiria, indicando-lhe dois apartamentos como sendo os que acabara de comprar. 168) Afirmou que, por ora, apenas os poderia ver pelo exterior já que só teria acesso ao interior após a conclusão do processo quando o Tribunal mandasse mudar as fechaduras, após o que a chave seria entregue à AA, altura em que esta o contactaria, também para fazer a escritura. 169) Os apartamentos exibidos ao ofendido RR não estavam para venda, nem eram alvo de qualquer processo executivo, nem a arguida AA estava mandatada, por quem quer que fosse, para efectuar qualquer transacção que os envolvesse. 170) Na verdade, a arguida AA limitou-se a indicar ao ofendido, dois imóveis ao acaso, apenas para o levar a entregar-lhe a quantia de € 40.800,00 (quarenta mil e oitocentos euros) como contrapartida de um bem que o RR julgava ir obter, mas que a arguida AA nunca teve intenção de lhe entregar. 171) O ofendido RR sentiu-se incomodado pelo facto da arguida não ter legitimidade para transaccionar os imóveis que pagou e nem lhe ter restituído tais quantias.
XI. SS e XII. TT
172) Os ofendidos SS e TT são sócios da “EEEE – Reparação e Pintura Automóvel, Lda.”, empresa que tem por objecto a reparação e comercialização de automóveis. 173) Em finais de 2005 decidiram fazer alguns investimentos em conjunto, depois de terem conhecido a AA de quem tinham ouvido falar, como sendo uma solicitadora com bons conhecimentos e que vinha proporcionando a realização de bons negócios. 174) A arguida AA propôs aos ofendidos a aquisição de diversos veículos e exigiu-lhes o pagamento de sinal. 175) Entre outros, os ofendidos TT e SS adquiriram, cada um e a titulo pessoal, um veículo de marca Audi modelo A4 e um veículo de marca Audi A3, tendo entregue à arguida AA, a título de sinal, respectivamente, as quantias de € 1.800,00 e € 2.400,00. 176) Posteriormente, os ofendidos viriam a pagar o remanescente do preço de tais veículos, entregando para pagamento do referido Audi A4 quantia não inferior a € 16.880,00 e para pagamento do mencionado Audi A3 a quantia de € 17.000,00, tendo sido entregue pela arguida apenas o primeiro dos referidos veículos. 177) Para além dos referidos veículos, os ofendidos SS e TT adquiriram ainda para a sociedade EEEE, sete outros veículos, tendo entregue à arguida AA, a título de sinal, a quantia de € 5.543,00, veículos esses que nunca foram entregues. 178) Algum tempo depois, a arguida exigiu um reforço de sinal, o que os ofendidos fizeram, logo no dia 06/04/2006, através da entrega do cheque nº … da C.C.A.M. de Leiria sacado sobre a conta nº …, emitido à ordem da arguida AA, cheque esse que viria a ser devolvido na compensação por falta ou insuficiência de provisão. 179) Entretanto a arguida AA, propôs-lhes a realização de outros investimentos, desta vez no sector imobiliário, dizendo-lhes que era solicitadora de execuções e que os imóveis cuja aquisição lhes propunha se encontravam em processo de execução judicial e, por isso, a preços muito inferiores aos valores reais. 180) A AA garantiu-lhes que o preço correspondia apenas ao preço base de licitação, isto é, ao montante da dívida à entidade exequente, mencionando que, como tinha muitos conhecimentos junto do Tribunal e leiloeiras, os quais lhe permitiam saber dos imóveis e diligenciar pela sua transacção, numa fase prévia, antes da venda judicial. 181) Tendo convencido os ofendidos de que estava mandatada para proceder à venda de diversos imóveis, a preços muito vantajosos, a arguida AA propôs aos ofendidos a compra do que lhes disse ser: 1. Um apartamento tipo T3 na Praia da Rocha, pelo preço de € 42.400,00 (quarenta e dois mil e quatrocentos euros); 2. Um apartamento do tipo T3 sito na Maligueira, ... em Leiria 3. Um apartamento T2 sito na Quinta do Bispo, Leiria, estes últimos pelo valor global de € 27.300,00 (vinte sete mil e trezentos euros). 182) Para pagamento dos referidos apartamentos sitos em Leiria, o ofendido TT entregou à arguida AA a quantia de € 27.300,00 em numerário. 183) Para pagamento do apartamento sitos na Praia da Rocha, o ofendido SS entregou à arguida AA a quantia de € 42.400,00 em numerário. 184) Posteriormente a arguida AA viria a dizer aos ofendidos que já tinha compradores para tais apartamentos. 185) Em determinado dia, no escritório da arguida AA, esta apresentou o arguido FF, ali presente, como um dos seus clientes a quem vendera um apartamento no Algarve e que sabia, por experiência própria, que as escrituras demoravam pelo menos seis meses. 186) O arguido FF confirmou então aos ofendidos que também ele havia comprado um apartamento no Algarve, que não tinha tido problemas e que as escrituras demorariam 6 meses. 187) Em meados de 2006, o arguido BB propôs-lhes a aquisição de um lote de terreno sito nos Marrazes, em Leiria, junto ao Centro de Inspecções que dizia ser proveniente de uma execução judicial, pelo preço de € 32.000,00 (trinta e dois mil euros) 188) E ainda a aquisição de um terreno correspondendo ao lote 32 sito na Cova das Faias, em Leiria, pela quantia de € 85.000,00 (oitenta e cinco mil euros). 189) No referido terreno dos Marrazes existia uma placa publicitando a sua venda, placa essa que o BB retirou. 190) A titulo de sinal pela compra dos referidos terrenos, o ofendido SS entregou ao arguido BB, a quantia de € 16.550,00, em numerário, e os ofendidos entregaram ainda o cheque nº … da conta nº … do B.P.N., titulada pelo ofendido TT, no valor de € 10.280,00 (dez mil duzentos e oitenta euros). 191) Com excepção do veículo de marca e modelo Audi A4 supra referido, as viaturas e imóveis acima identificados como tendo sido negociados com a arguida AA não foram entregues aos ofendidos, sendo certo que esta nunca teve intenção de vender ou entregar tais bens. 192) Aliás, nenhum dos imóveis exibidos e alegadamente transaccionados pela arguida AA estava para venda ou era alvo de qualquer processo executivo e nem a arguida AA estava mandatada, por quem quer que fosse, para efectuar qualquer transacção que os envolvesse. 193) O arguido BB nunca teve intenção de concretizar as vendas dos identificados terrenos, sabendo que nenhum dos terrenos estava penhorado no âmbito de qualquer processo executivo e que não estava mandatado pelos respectivos proprietários para proceder a tais vendas, tendo actuado com o único propósito de fazer suas as quantias que lhe foram entregues pelos ofendidos SS e TT sem qualquer intenção de lhes transmitir os bens que lhes vendera.
XIII. UU
194) GGGG tendo sabido que o ofendido UU, construtor civil, tencionava vender umas vivendas, informou-o que a sua irmã tinha uma imobiliária e lhe podia tratar desse assunto, acompanhando-o até à referida imobiliária. 195) UU travou assim conhecimento com a arguida AA, a qual lhe disse que se encarregaria de arranjar compradores, dizendo mesmo que até já tinha uns em vista. 196) Mais tarde, a arguida AA perguntou-lhe se não estaria interessado em investir em imóveis automóveis, terrenos ou moradias penhorados no tribunal, explicando-lhe que era solicitadora de execução e que os processos lhe passavam pelas mãos. 197) Acrescentou que tinha bons contactos no Tribunal que lhe permitiam o conhecimento antecipado destas situações, mas que o pagamento teria de ser feito no prazo de 24 horas, em numerário, ou não poderia impedir a venda judicial. 198) Como o ofendido se mostrou interessado, a arguida AA informo-o de que tinha para venda uma fracção autónoma, tipo T3, sita em Leiria, uma fracção localizada em Casal de Matos e um terreno localizado em Moleanos, Benedita, pelo preço de € 62.280,00 199) Convencido que tudo era legal e que a arguida AA estava devidamente mandatada para transaccionar os imóveis, o ofendido UU, em 09/12/2005, entregou a referida quantia (€ 62.280,00), em numerário. 200) Pouco tempo depois, a arguida repetiu o mesmo procedimento e fornecendo as mesmas explicações, propôs-lhe a aquisição do que disse serem, um apartamento em Pombal, um apartamento na Figueira da Foz, outro na Urbanização ..., e um terreno localizado no Calhau, Nazaré. 201) Tal como antes e de nada desconfiando, o ofendido entregou-lhe, em numerário, quantia não inferior a € 150.000,00. 202) Porém, não obstante o pagamento e a promessa da arguida AA, o ofendido nunca realizou qualquer escritura nem recebeu qualquer imóvel, sendo certo que nenhum dos que a arguida lhe referiu, estava em situação de ser vendido, nem aquela estava mandatada para qualquer transacção que os tivesse por objecto. 203) A arguida AA limitou-se a indicar ao ofendido imóveis que aparentavam estar para venda, apenas para o levar a entregar-lhe elevada quantia em dinheiro que aquele, de facto, lhe entregou, como contrapartida de bens que acreditou ir receber, mas que a arguida AA nunca teve intenção de lhe proporcionar.
XIV. VV
204) O VV soube, por intermédio de um conhecido, da possibilidade de adquirir alguns imóveis a preços inferiores aos de mercado por serem provenientes de processos de execução. 205) Disse-lhe aquele seu conhecido, durante uma conversa casual em Abril de 2006, que era um amigo seu, de nome II, quem arranjava esse tipo de negócios. 206) Mais tarde, forneceu-lhe o contacto do arguido GG por este ter uma proposta que lhe poderia interessar e que consistia na aquisição de um apartamento na Praia da Rocha, pelo preço de € 13.900,00 (treze mil e novecentos euros) 207) Por isso, no início do mês de Maio de 2006, marcou encontro com o GG para saber pormenores. 208) Nesse encontro, o arguido II explicou-lhe que trabalhava com uma senhora de nome AA, solicitadora, que em virtude dessa actividade, tinha acesso a processos de execução e arranjava, para venda, imóveis a preços muito baixos, apenas pelo valor da dívida do executado. 209) Mas, o arguido II avisou-o que teria de fazer o pagamento até ao dia seguinte, porque caso contrário o apartamento seria vendido em hasta pública e perderia a oportunidade de fazer o negócio. 210) O arguido acrescentou que o pagamento deveria ser feito em numerário, explicando que “a D. AA” insistia que o pagamento fosse feito, preferencialmente em dinheiro. 211) O arguido GG disse-lhe ainda que no prazo de três semanas tudo estaria pronto para realizar a escritura, recebendo então as chaves. 212) Pouco entendido nos meandros das vendas judiciais, mas porque lhe pareceu plausível o que o arguido dizia, acabou por concordar. 213) Então, entregou ao arguido GG a quantia de € 13.900,00 (treze mil e novecentos euros) em numerário, que este último posteriormente entregou à arguida AA, tendo sido entregue posteriormente ao ofendido a declaração junta a fls. 828. 214) Certo é que, não obstante tal pagamento, nunca a arguida AA providenciou para que fosse entregue o imóvel que disse ter-lhe vendido, pois que, na verdade, nenhum apartamento havia para venda no local e circunstâncias que foram indicadas ao ofendido VV. 215) A arguida AA limitou-se a aludir a um suposto apartamento que estaria à venda em local indefinido, apenas para levar o ofendido a entregar-lhe a quantia de € 13.900,00 (treze mil e novecentos euros) como contrapartida de um bem que julgava ir receber, mas que aquela nunca teve intenção de lhe proporcionar.
XV. XX
216) O ofendido XX travou conhecimento com os arguidos GG e AA, depois de um seu conhecido lhe dizer que uma solicitadora de Leiria vendia apartamentos a bons preços, supostamente provenientes de execuções judiciais, proporcionando-lhe um encontro com aqueles. 217) Veio assim a conhecer aqueles arguidos, com quem se encontrou junto ao cartório notarial em Vale Sepal, Leiria, em meados de Maio de 2006. 218) Os arguidos propuseram-lhe então a aquisição do que disseram ser um apartamento do tipo T3 sito em Buarcos, junto à escola, na Figueira da Foz, pelo preço de € 28.180,00 (vinte e oito mil cento e oitenta euros). 219) Os arguidos não lhe deram outras referências a respeito do imóvel, dizendo que dias depois teria os documentos e que apenas poderia ver o apartamento a seguir à realização da escritura. 220) Os arguidos disseram-lhe que o apartamento era alvo de execução judicial e que, por essa razão, o preço teria de ser pago no prazo máximo de três dias, caso contrário seria vendido em hasta pública, perdendo-se a ocasião de realizar tão bom negócio. 221) Quando o ofendido XX manifestou algumas hesitações, o arguido II disse-lhe que outras pessoas já tinham feito negócios e que tinham corrido bem. 222) Convencido pelas explicações fornecidas e porque a arguida AA se prontificou a entregar-lhe uma declaração com a assinatura reconhecida, o XX aceitou a proposta que lhe fizeram 223) E, no dia 18/5/2006, entregou à arguida a quantia exigida, através dos cheques nºs …, … e …, sacados sobre a conta … da C.C.A.M do Baixo Mondego / Ferreira-a-Nova, respectivamente no valor de € 10.000,00, € 10.000,00 e € 8.180,00, à ordem da arguida AA. 224) Porém, não obstante tal pagamento, nunca a arguida AA providenciou para que fosse entregue o imóvel que dissera ter-lhe vendido, pois que, na verdade, nenhum apartamento havia para venda no local e circunstâncias indicadas ao ofendido. 225) A arguida AA limitou-se a aludir a um suposto apartamento que estaria à venda em local indefinido, apenas para levar o ofendido a entregar-lhes a quantia de € 28.180,00 (vinte e oito mil cento e oitenta euros) como contrapartida de um bem que julgava ir receber, mas que aquela nunca teve intenção de lhe proporcionar. 226) O ofendido XX ao saber que a arguida AA não tinha poderes para efectuar a referida venda ficou transtornado, com um profundo desgosto e vergonha. 227) Parte das quantias entregues à arguida AA eram resultantes de um empréstimo bancário contraído pelo ofendido XX, no valor de € 28.000,00. 228) O referido apartamento destinava-se a habitação do agregado familiar do ofendido composto pelo casal e dois filhos menores. 229) O ofendido deslocou-se duas vezes a Leiria para ser ouvido no âmbito do processo, no que despendeu € 30,00 por cada deslocação.
XVI. ZZ
230) Em finais de Abril de 2006, ZZ, por intermédio de um familiar, conheceu o arguido GG, pessoa que, segundo lhe foi dito, conhecia uma outra pessoa que vendia imóveis e veículos penhorados a preços mais baixos e pretendia negociar um lote de 5 apartamentos, tudo pelo valor de € 52.030,00 (cinquenta e dois mil e trinta euros). 231) Depois de alguns contactos por telefone, acabou por combinar um encontro ao qual compareceu com o seu advogado, conhecendo então pessoalmente, o GG que lhe apresentou a AA. 232) Esta intitulou-se solicitadora, disse que os imóveis estavam penhorados e que estava mandatada para os negociar. 233) Como a AA explicou todo o procedimento ao seu advogado, acreditou piamente que tudo que lhe foi proposto era um negócio legítimo e se iria concretizar. 234) E então, tal como a arguida AA pediu, entregou-lhe a quantia referida (€ 52.030,00), através dos cheques nºs …, …, …, … e … da conta nº … por si titulada no Banco Caja de Badajoz – Sucursal de Lisboa, respectivamente, nos valores de € 8.230,00, € 10.800,00, € 10.500,00, € 11.000,00 e € 11.500,00, todos com data de 27/04/2006. 235) Posteriormente veio a saber que a AA não seria solicitadora e questionou o II a tal respeito, tendo-lhe este referido que conhecia a arguida há vários meses e que nunca tinha tido problemas com os negócios. 236) Não obstante tal pagamento, nunca a arguida AA providenciou para que fosse entregues os imóveis, pois nenhum apartamento havia para venda no local e circunstâncias indicadas ao ofendido. 237) A arguida AA limitou-se a aludir a uns supostos imóveis que estariam à venda em local indefinido, apenas para levar o ofendido a entregar-lhe a quantia de € 52.030,00 (cinquenta e dois mil e trinta euros) como contrapartida de bens que julgava ir receber, mas que aquela nunca teve intenção de lhe proporcionar.
XVII. AAA
238) AAA começou a ouvir falar, através de um conhecido, da possibilidade de fazer bons negócios, com a aquisição de automóveis. 239) Então, em Abril de 2006, foi-lhe sugerida a aquisição de uma viatura Mercedes do ano de 2004, pelo valor de € 25.000,00 (vinte cinco mil euros) preço que achou vantajoso. 240) Combinou encontro com o arguido GG, nas bombas de combustível da Repsol em Pombal, para ver a carrinha e decidir então se a comprava, verificando tratar-se de um Mercedes modelo 220CDI de matrícula BD. 241) Dois dias depois, desse encontro, enquanto ponderava no assunto, o arguido GG, telefonou-lhe dizendo-lhe que o pagamento tinha de ser feito no dia seguinte, sob pena do negócio ficar sem efeito e que o doutor tinha de saber a resposta. 242) O ofendido AAA decidiu então proceder ao pagamento do referido automóvel, o que fez, passados alguns dias, entregando ao GG a aludida quantia (€ 24.500,00), em numerário, quantia que este último posteriormente entregou à arguida AA. 243) Entretanto ficou a aguardar a entrega dos documentos, o que seria alegadamente feito dois dias depois, data em que se encontrou com o arguido II, para se deslocarem ambos à D.G.V. e resolver a questão com a arguida AA, pessoa que seria também intermediária nesse negócio e que acabou por faltar ao encontro. 244) No trajecto, o II mostrou-lhe a fachada de alguns edifícios, sitos na Estação, em Pousos e perto do cemitério, todos na cidade de Leiria, onde dizia haver algumas fracções para venda. 245) O ofendido AAA viria a encontrar-se, no dia 03/05/2006, com a arguida AA, tendo-lhe esta proposto a aquisição de um apartamento junto ao cemitério, dizendo que o preço seria apenas de € 45.000,00 e que tinha de pagar de imediato € 16.800,00 (dezasseis mil e oitocentos euros) para segurar o negócio. 246) E, para melhor o convencer disse-lhe que até já tinha em vista um comprador para o tal apartamento, pelo que poderia logo revendê-lo e desta forma recuperava o investimento e ainda tinha lucro. 247) Adiantou-lhe ainda que ela própria tratava de tudo, tendo ele apenas de comparecer na escritura e receber o dinheiro. 248) O ofendido acreditou no que a arguida AA lhe dizia e aceitou o negócio proposto, entregando-lhe de imediato, em numerário, a quantia de € 4.800,00 (quatro mil e oitocentos euros) que tinha consigo e um cheque no valor de € 7.150,00 (sete mil cento e cinquenta euros) de um seu cliente para pagamento do remanescente, que endossou à AA e que logo foram tentar levantar. 249) O que fez porque a arguida insistira que o pagamento tinha de ser feito rapidamente para evitar que outras pessoas pudessem saber do negócio. 250) Mas não foi possível levantar tal cheque, o ofendido acabou por entregar à arguida AA, no dia 8 de Maio de 2006, a quantia de € 12.000,00 (doze mil euros) em numerário, porque a AA lhe disse que “assim as coisas eram mais rápidas”. 251) Porém, a arguida ficou com o cheque nº … no valor de € 7.150,00 (sete mil cento e cinquenta euros) sacado sobre a conta nº … da C.G.D. que lhe havia sido endossado e que não devolveu. 252) Entretanto o ofendido aguardou pela entrega dos documentos da viatura e pela realização da escritura, o que nunca se veio a concretizar. 253) Com efeito, não obstante o ofendido ter pago as quantias exigidas, nunca a arguida AA providenciou para que lhe fosse entregue a documentação da viatura e do imóvel vendidos, pois nenhum dos bens havia para venda nas circunstâncias indicadas ao ofendido. 254) A arguida AA limitou-se a aludir a um suposto apartamento que estaria à venda em local indefinido, apenas para levar o ofendido a entregar-lhe a quantia acima referida, como contrapartida de bens que julgava ir receber, mas que aquela nunca teve intenção de lhe proporcionar.
XVIII. CCCC
255) O CCCC conheceu o arguido BB por intermédio dos seus tios TT e SS, que lho apresentaram, visto saberem que há algum tempo procurava um lote de terreno para construção de um pavilhão. 256) Conversando com o BB, este mostrou-lhe, no início de 2006, um terreno sito nos Marrazes, Leiria, junto ao Centro de Inspecção de Viaturas, composto por dois lotes. 257) O arguido BB havia-lhe dito que este terreno, tal como outros de que lhe falou e lhe veio a mostrar, provinha de execuções judiciais e que conseguia “tirá-los” antes da venda, pelo preço da dívida ao exequente. 258) Acreditando que o arguido BB tinha legitimidade para proceder à venda, concordou em pagar-lhe o preço pedido para a aquisição de um de tais terrenos e que seria de € 29.000 (vinte e nove mil euros). 259) Para tanto, entregou-lhe a quantia de € 13.000,00 em numerário e o cheque nº … sacado sobre a sua conta … do B.P.N., no valor de € 2.450,00 (dois mil quatrocentos e cinquenta euros), perfazendo a quantia global de € 15.450,00, quantia essa correspondente ao sinal exigido pelo BB. 260) O remanescente deveria ser pago, conforme lhe disse o arguido, quando chegassem “os papéis”, em prazo nunca inferior a seis meses. 261) Dias depois, em Fevereiro de 2006, foi de novo contactado pelo arguido BB que lhe propôs a aquisição de um terreno sito na Cova das Faias, em Leiria, designado por lote 143/9, pela quantia de € 49.500,00 (quarenta e nove mil e quinhentos euros), terreno que o BB o levou a ver. 262) Para melhor convencer o CCCC, o arguido BB ainda lhe entregou cópia de um documento emitido pela secção de obras da Câmara Municipal de Leiria, identificando o lote em causa. 263) Acreditando em tudo que o arguido lhe contava, o CCCC concordou com as condições e entregou ao BB a quantia de € 24.200,00 (vinte e quatro mil e duzentos euros) a título de sinal, através do cheque nº … sacado sobre a sua conta nº … da Caixa de Crédito Agrícola Mútuo de Leiria, em representação da sociedade I... – Armazenista de Equipamentos e Consumíveis para Escritório, Lda., da qual era sócio gerente, com vista à aquisição por parte desta última de tal terreno. 264) Mais tarde, foi-lhe ainda proposta pelo arguido BB a aquisição de um outro imóvel, sito na “ZICOFA” – Zona Industrial da Cova das Faias, designado por lote …, pela quantia de € 85.000,00 (oitenta e cinco mil euros). 265) Voltou o arguido BB a referir o terreno como destinado a venda judicial, mas que conseguia vendê-lo por preço vantajoso, convencendo-o que tinha legitimidade para tratar de todos os trâmites relacionados com a venda. 266) Acreditando em tudo que lhe foi dito, o CCCC acabou por concretizar mais este negócio, adquirindo tal terreno juntamente com os seus tios TT e SS, entregando ao arguido, a título de sinal, a quantia de € 16.550,00 (dezasseis mil quinhentos e cinquenta euros) em numerário, por o arguido insistir que os Tribunais assim o exigiam. 267) Entregou ainda, a pedido do arguido BB, cópia do seu bilhete de identidade e cartão de contribuinte para aquele tratar, segundo disse, da documentação referente às escrituras, o que ainda mais descansou o CCCC a respeito da legalidade de todo o negócio. 268) Certo é que nunca as escrituras foram feitas ou os imóveis entregues, visto que os mesmos não estavam à venda, nas circunstâncias referidas pelo arguido BB, nem este tinha legitimidade para os transaccionar ou, sequer, tinha tal intenção, dado pretender apenas levar os ofendidos a entregar-lhe as quantias que lhe entregaram, como contrapartida da obtenção de bens que julgavam adquirir, mas que aquele nunca teve intenção de lhe proporcionar.
XIX. BBB e XX. CCC:
269) Em meados de Agosto de 2004, CCC soube da existência de uma moradia sita em Marrazes, Leiria, que estaria para venda pelo preço de € 79.000,00 (setenta e nove mil euros) 270) Interessado na sua compra porque lhe pareceu tratar-se de um bom investimento, contactou uns seus amigos, que viriam a ser seus sócios nesse negócio e depois falou com a pessoa encarregada da venda. 271) Tratava-se da arguida AA a qual se lhes apresentou como solicitadora e com quem acabaram por negociar a compra daquele imóvel, entregando-lhe cheque naquele valor. 272) Posteriormente a arguida disse-lhes que existia a possibilidade de vender a moradia, o que veio a fazer, entregando-lhes quantia não apurada mas não inferior a € 123.000,00. 273) Animado com este lucro CCC decidiu fazer novos investimentos, desta vez, em parceria com o seu amigo BBB. 274) Então, em meados de Novembro de 2004 conversaram ambos com a arguida AA, a quem deram conta dessa intenção de realizarem investimentos no ramo imobiliário, o que só fizeram por estarem convictos que esta era proprietária de uma imobiliária, como se anunciava no seu escritório. 275) Vendo esse interesse e percebendo que estava diante de pessoas com posses e com vontade de investirem, a arguida viu nos ofendidos CCC e BBB, uma excelente oportunidade para lucrar quantias vultuosas, à conta da credulidade daqueles. 276) Então, conversando com os ofendidos, contou-lhes que era solicitadora de execuções judiciais, alegando ainda que tinha contactos privilegiados junto dos Tribunais, sendo amiga de vários juízes e, por isso, acedia a imóveis, antes da venda judicial, pelo valor da dívida. 277) Por essa razão, poderia conseguir-lhes diversos prédios, a preços muito inferiores aos valores de mercado, os quais seriam depois vendidos pelo valor real, proporcionando-lhes grandes lucros. 278) A forma desenvolta como a arguida lhe falou da sua actividade e dos conhecimentos que dizia ter, aliado à circunstância de aquela ter um escritório aberto, onde era publicitada a venda de diversos imóveis, como usualmente os ofendidos viam em qualquer imobiliária, levou-os a acreditar que a AA estava legitimada para realizar os negócios que lhes descreveu. 279) Acreditando em tudo que a AA lhes contou, ambos os ofendidos negociaram com ela, no período compreendido entre Novembro de 2004 e Abril de 2005, a compra de diversos imóveis. 280) O que representou um investimento de € 1.124.822,00 (um milhão cento e vinte e quatro mil oitocentos e vinte e dois euros) quantia que foi sendo entregue à arguida AA, ao longo daquele período. 281) Com efeito, durante aqueles meses, a arguida AA ia falando aos ofendidos, a respeito de vários prédios que dizia estarem processo de venda, em processo executivo, tal como antes lhes explicara. 282) Os prédios que a arguida AA negociou com os ofendidos CCC e BBB, não existiam, ou não estavam em situação de ser vendidos, nas condições descritas pela arguida. 283) E, por isso, esta teve o cuidado de nunca identificar devidamente os prédios que se propunha “vender” aos ofendidos, limitando-se, quase sempre, a fornecer uma descrição e localização vagas. 284) Nestas condições vendeu aos ofendidos, em dezoito momentos distintos, o que lhes afiançou serem: 1. Três apartamentos T3, sitos, um na Gândara, um no Planalto e outro na Quinta do Bispo, pelo valor global de € 50.000,00 (cinquenta mil euros); 2. Um apartamento em Vale Grande e outro na Cruz da Areia pelo preço total de € 56.000,00 (cinquenta e seis mil euros); 3. Dois apartamentos em Parceiros, um apartamento em Carloto, um apartamento na Quinta de Santo António, pelo preço total de € 65.400,00 (sessenta e cinco mil e quatrocentos euros); 4. Um apartamento T2 duplex, um apartamento T3 e um escritório, sitos na Nova Leiria, pelo preço total de € 44.130,00 (quarenta e quatro mil cento e trinta euros); 5. Um apartamento T3 na Gândara e dois apartamentos na Gândara, pelo preço total de € 34.580,00 (trinta e quatro mil quinhentos e oitenta euros); 6. Um apartamento na Quinta de Santo António, dois apartamentos T3 e uma casa, pelo preço total de € 53.820,00 (cinquenta e três mil oitocentos e vinte euros); 7. Um apartamento T3 em Sismaria, um T3, um T3 em frente à Proalimentar, pelo preço total de € 50.030,00 (cinquenta mil e trinta euros); 8. Um apartamento T3 em S. Romão pelo preço de € 18.214 (dezoito mil duzentos e catorze euros); 9. Três apartamentos T2, quatro apartamentos T3 pelo preço total de € 71.980,00 (setenta e um mil novecentos e oitenta euros); 10. Uma casa na Vieira, um apartamento em Leiria, um apartamento na Marinha Grande, pelo preço total de € 58.500,00; 11. Um apartamento em Pousos pelo preço de € 12.700,00 (doze mil e setecentos euros); 12. Um apartamento em Pombal, um T2 e um T3 na Cruz da Areia e ainda uma loja, pelo preço total de € 78.320,00 (setenta e oito mil trezentos e vinte euros); 13. Dois apartamentos na Cruz da Areia pelo preço de € 28.000,00 (vinte e oito mil euros); 14. Sete apartamentos pelo preço total de € 101.598,00 (cento e um mil quinhentos e noventa e oito euros); 15. Oito apartamentos pelo preço total de € 99.000,00 (noventa e nove mil euros); 16. Três T3, dois T2 e uma loja pelo preço de € 78.900,00 (setenta e oito mil e novecentos euros); 17. Um edifício em Coimbra pelo preço de € 123.650,00 (cento e vinte e três mil seiscentos e cinquenta euros); 18. Uma casa no Louriçal e um apartamento na Nazaré pelo preço total de € 100.000,00 (cem mil euros);
285) As quantias acima discriminadas foram pagas pelos ofendidos à arguida AA, normalmente em numerário, conforme exigência desta e entregues logo que a arguida o dizia. 286) Com efeito, esta insistia que era necessário efectuar de imediato o pagamento, sob pena de não conseguir evitar a venda do imóvel em hasta pública. 287) Esta forma de pressão surtia efeito, pois que os ofendidos receando perder uma boa oportunidade de negócio, rapidamente lhe entregavam as quantias pedidas. 288) Porém, o tempo foi passando e eles não conseguiam realizar as escrituras nem proceder à venda dos prédios que julgavam ter comprado, pelo que, começaram a pressionar a arguida, querendo saber o que se passava. 289) A arguida AA apresentava desculpas, imputando a terceiros a responsabilidade no atraso na realização das escrituras, por vezes a uma tal Dra. FFFF que dizia ser sua chefe e que andaria muito ocupada ou ausente da cidade. 290) Nenhuma das descritas aquisições se concretizou, ficando os ofendidos privados das quantias que entregaram à arguida AA como contrapartida da aquisição de bens que julgavam estar a adquirir, mas que a arguida AA nunca tencionou proporcionar-lhes, visto que os mesmos não estavam à venda, nas circunstâncias referidas, nem esta tinha legitimidade para os transaccionar ou, sequer, tinha tal intenção. 291) Porém, continuamente pressionada pelos ofendidos, a arguida AA acabou por devolver aos mesmos quantia concretamente não apurada mas não inferior a € 635.148,00 (seiscentos e trinta e cinco mil cento e quarenta e oito euros).
XXI. DDD
292) A arguida AA foi apresentada ao ofendido DDD por um amigo, como sendo solicitadora de execuções judiciais, propondo-lhe aquela a aquisição de imóveis a preços muito inferiores aos valores de mercado. 293) Para o justificar, disse-lhe que tais imóveis eram provenientes de execuções judiciais e que conseguia evitar a venda se pagasse a divida antes de ser dada publicidade à mesma. 294) Acreditando nesta explicação, convencido dos contactos privilegiados que a arguida parecia ter, acabou por negociar com a arguida AA a compra de seis apartamentos, pelo valor total de € 124.700,00 (cento e vinte e quatro mil e setecentos euros) e procedeu ao pagamento da referida quantia através da entrega, em 5 de Novembro de 2004, do cheque nº … sacado sobre a sua conta da C.G.D. e que emitiu à ordem de NNNN, a pedido da AA, pretextando que se tratava de um funcionário judicial. 295) Algum tempo depois, em Agosto de 2005, a arguida AA propôs ao ofendido DDD a compra de dois apartamentos pelo valor global de € 46.040,00 (quarenta e seis mil e quarenta euros). 296) O DDD emitiu então e entregou à AA o cheque nº …, sacado sobre a conta da C.G.D., com intenção todavia de cancelar tal cheque antes do seu pagamento, o que fez, e visando iludir a arguida para que a mesma lhe restituísse as quantias que anteriormente lhe havia entregue. 297) Certo é que nunca as escrituras foram feitas ou os imóveis entregues ao ofendido, visto que os mesmos não estavam à venda, nas circunstâncias, nem a arguida AA tinha legitimidade para os transaccionar ou, sequer, tinha tal intenção, sendo seu único propósito levar o DDD a entregar-lhe as quantias que lhes entregou como contrapartida da obtenção de bens que julgava adquirir.
XXII. EEE
298) O ofendido EEE conheceu a arguida AA por intermédio do seu amigo JJJ, no escritório da mesma. 299) Nessa altura a arguida AA propôs-lhe a aquisição de um automóvel marca e modelo Audi A4 1.9 de 2004, com cerca de 70.000 km, por valor não inferior a € 20.000,00, dizendo-lhe ser solicitadora de execução e ter conhecimentos no tribunal, bem como que o preço era mais barato por tal veiculo ser de pessoas que não tinham pago a divida de leasing mas que tinha de pagar a divida ao tribunal. 300) Convencido da existência daquele concreto automóvel e da legitimidade do negócio proposto, o EEE aceitou-o, altura em que a arguida lhe disse que teria de pagar, de imediato, um depósito no montante de € 3.980,00 (três mil novecentos e oitenta euros). 301) O EEE acreditou em tudo que a arguida AA lhe contou e logo nesse mesmo dia entregou-lhe o cheque nº … no valor de € 3.980,00 (três mil novecentos e oitenta euros) sacado sobre a sua conta nº … da C.C.A.M. de Pombal. 302) Porém, a viatura nunca foi entregue, já que o único objectivo da arguida AA era obter do ofendido a quantia que o levou a entregar-lhe como contrapartida de um bem que ele acreditava estar a adquirir mas que a mesma nunca tencionou proporcionar-lhe.
XXIII. FFF
303) Em Maio de 2006, através de um conhecido, o FFF soube da possibilidade de adquirir imóveis a preços inferiores aos de mercado, por se tratarem de imóveis alvo de execuções e que poderiam ser comprados antes de irem a hasta pública, por intermédio de uma solicitadora do Tribunal, que o arguido II conheceria. 304) Por lhe parecer um bom negócio decidiu então contactar o arguido GG no sentido de confirmar essa possibilidade e saber se este tinha algum apartamento para venda em Leiria, naquelas condições, o que fez a 16 de Maio de 2006. 305) O arguido II disse-lhe logo que tinha vários apartamentos, um dos quais correspondendo ao que o FFF pretendia. Nessa noite, o II levou-o até às traseiras do Edifício 2000, na cidade Leiria, onde lhe indicou um apartamento, aparentando estar desabitado. 306) O arguido GG disse-lhe então que o referido apartamento estava à venda por € 24.800,00 (vinte e quatro mil e oitocentos euros) valor da dívida da execução, mas que o preço teria de ser pago logo na manhã do dia seguinte, caso contrário, o apartamento iria a hasta pública. 307) Explicou-lhe ainda que o negócio era conseguido por intermédio da solicitadora do Tribunal, a arguida AA. 308) Convencido que dito apartamento estava para venda nas condições referidas, fechou o negócio e logo nessa noite ficou marcado um encontro para a manhã seguinte, para irem ao Cartório em Vale Sepal, para arranjarem um documento que comprovasse o pagamento daquela quantia. 309) Junto ao Cartório Notarial conheceu a arguida AA a qual lhe foi apresentada pelo II como a dita solicitadora do Tribunal. 310) No que pretendeu fazer crer tratar-se de uma conversa casual, a arguida AA disse-lhe que naquela tarde ia fazer um despejo e que até teria de levar a polícia, o que convenceu o FFF que estava efectivamente a lidar com profissional ligada ao Tribunal, devidamente mandatada para diligenciar pela venda do apartamento que vira na noite anterior. 311) No cartório notarial foi reconhecida a assinatura da AA, em declaração que aquela redigiu e, logo aí, o FFF entregou-lhe os cheques nºs … e …, cada um no valor de € 12.400,00 (doze mil e quatrocentos euros) sacados sobre a conta nº … da CCAM de Almagreira, titulada pela sua mãe OOOO 312) Certo é que nunca a escritura foi feita ou o imóvel entregue ao ofendido, visto que o mesmo não estava à venda, nas circunstâncias referidas, nem a arguida AA tinha legitimidade para os transaccionar ou, sequer, tal intenção, sendo único propósito da mesma levar o FFF a entregar-lhes as quantias que lhe entregou, como contrapartida da obtenção de um bem que julgava adquirir, mas que aquela nunca teve intenção de lhe proporcionar.
XXIV. GGG
313) O ofendido GGG conheceu a arguida AA em Fevereiro de 2005, por intermédio de um amigo, o JJJ, após ter sabido que este lhe adquirira um veículo a preço muito vantajoso. 314) Quando conheceu a arguida AA, esta explicou-lhe que como tinha bons contactos junto dos tribunais, entidades bancárias e empresas de leasing, tinha acesso aos bens numa fase prévia, pelo preço base de licitação, ou seja, pela quantia em dívida à entidade exequente. 315) Na altura mostrou-lhe uma lista com a descrição de vários automóveis e prédios, alegadamente provenientes de leilões e execuções judiciais, todos eles a preços inferiores aos valores de mercado. 316) Por isso, comprou-lhe um veículo de marca Audi pelo valor aproximado de € 17.000,00 (dezassete mil euros) o qual lhe foi entregue sem que se verificasse qualquer problema. 317) Entregue a viatura e assim reforçada a confiança que depositava na arguida, acabou por negociar com ela a compra de um apartamento. 318) Com efeito, em Maio de 2005, a AA propôs-lhe a aquisição de um apartamento T3 sito, segundo dizia, na Rua Calouste Gulbenkian, em Coimbra, pelo preço de € 28.312,00 (vinte e oito mil trezentos e doze euros), apartamento que pagou à arguida através do cheque nº …. sacado sobre a conta … da CCAM de Coimbra. 319) Na altura, a AA explicou-lhe que não poderia ver o apartamento, porque na circunstância em que era realizado este género de negócio, só após a escritura é que teriam acesso ao interior do mesmo. 320) O ofendido acreditou que o referido apartamento existia de facto e estava para venda, nas circunstâncias relatadas pela arguida, assim como acreditou que a esta cabia realizar a sua venda. 321) E, só por isso lhe entregou o aludido cheque acreditando que o negócio seria realizado, o que nunca aconteceu. 322) Com efeito, apenas lhe foi indicado um imóvel ao acaso pela arguida AA com o propósito de levar o ofendido a entregar-lhe a referida quantia, o que este fez, convencido que se tratava da contrapartida pela aquisição de um bem que, todavia, a arguida AA nunca teve intenção de lhe proporcionar.
XXV. HHH
323) Também o ofendido HHH conheceu a arguida AA em Fevereiro de 2005, por intermédio de um amigo, o JJJ, após ter sabido que este lhe adquirira um apartamento, a preço muito vantajoso, altura em que manifestou interesse em fazer um investimento semelhante. 324) Quando conheceu a arguida AA, que se apresentou como solicitadora, esta referiu-lhe que tinha para venda um apartamento T2 com garagem, em Coimbra, junto ao Continente, pela quantia de € 25.000,00 (vinte cinco mil euros), apartamento esse que estava penhorado em tribunal correspondendo o referido montante ao valor da divida. 325) Embora a questionasse sobre a localização exacta do imóvel e sobre a data em que o poderia ver, a arguida disse-lhe que não podia visitar de imediato o apartamento, argumentando que não tinha a chave. 326) Porque o preço era realmente vantajoso e poderia proporcionar-lhe lucros significativos, o ofendido HHH decidiu aceitar a proposta desta e entregou então à arguida AA, passados alguns dias, através do seu amigo JJJ, a quantia de € 25.000,00 (vinte cinco mil euros), em numerário, quantia que segundo a mesma seria para entregar no tribunal e em numerário para ser mais rápido facilitar o processo. 327) Pouco depois, a arguida AA referiu que era necessário entregar a quantia de € 7.975,00 (sete mil novecentos e setenta e cinco euros) que se destinava às despesas com a escritura, quantia essa que o ofendido JJJ pagou à àquela e que o ofendido HHH, por sua vez, pagou a este, mantendo a confiança e sempre acreditando que o negócio se concretizaria. 328) Porém, não obstante o pagamento e a promessa da arguida, o ofendido nunca realizou qualquer escritura nem recebeu qualquer imóvel, sendo certo que nenhum existia em situação de ser transaccionado por aquela. 329) A arguida AA limitou-se a indicar ao ofendido a vaga localização de um suposto apartamento, apenas para o levar a entregar-lhe a quantia que aquele lhe entregou como contrapartida de um bem que acreditou ir receber, mas que a mesma nunca teve intenção de lhe proporcionar.
XXVI. III.
330) A ofendida III conheceu a arguida AA, em 2005, por intermédio do seu patrão JJJ, após ter sabido que este lhe adquirira uma viatura e um apartamento, a preços muito inferiores aos praticados habitualmente e ter manifestado interesse em investir nesse negócio. 331) Após entrar em contacto com a AA, esta intitulou-se solicitadora de execução e explicou-lhe que a razão para os preços serem reduzidos, devia-se ao facto de tais bens serem oriundos de execuções judiciais, a que teria acesso, numa fase prévia, pelo montante da dívida à entidade exequente, antes da venda judicial. 332) Disse-lhe ainda que mantinha contactos privilegiados nos Tribunais, bancos e empresas de leasing, pelo que conseguia ter conhecimento da existência dos bens, antes que fossem vendidos em hasta pública. 333) Constatando o interesse da III, a arguida AA propôs-lhe a aquisição do que disse ser um apartamento T3 sito na Praia da Vieira. 334) Acreditando na arguida AA, confiando que o negócio proposto era legítimo e, receosa de perder essa oportunidade, a ofendida III entregou à arguida a quantia de € 10.000,00 (dez mil euros), em numerário, para pagamento parcial de tal imóvel, quantia que, segundo o que aquela lhe referiu, corresponderia ao valor em divida. 335) Mais tarde, em Outubro de 2005 a arguida AA soube que a ofendida III tencionava vender a sua casa e então, dispôs-se a arranjar comprador para a mesma, ao mesmo tempo que lhe propôs a aquisição de um apartamento T3 na Urbanização ..., Leiria, pelo preço de € 18.000,00 (dezoito mil euros), apartamento esse que a arguida lhe mostrou apenas por fora. 336) Para melhor a convencer, a arguida disse-lhe que o apartamento provinha de uma execução e que todo o processo seria concluído muito rapidamente. 337) Como no prédio indicado, existia um apartamento cuja venda era publicitada através de uma placa colocada no exterior, a ofendida III não duvidou que todo o negócio se desenrolaria como a arguida dizia e, por isso, entregou-lhe a quantia de dezoito mil euros através do cheque nº … da sua conta no Banco Santander, datado de 19/10/2005, ficando a aguardar a data da escritura. 338) Certo é que nunca as escrituras foram feitas ou os imóveis entregues à ofendida, visto que nenhum deles estava para venda, nas circunstâncias referidas, nem a arguida AA tinha legitimidade para os transaccionar ou sequer tal intenção, sendo seu único propósito levar a III a entregar-lhe a quantia que lhe entregou, como contrapartida da obtenção de bens que julgava adquirir, mas que a arguida AA nunca teve intenção de lhe proporcionar.
XXVII. JJJ
339) Em 2005, JJJ travou conhecimento com a arguida AA, através do companheiro desta e, em conversa, a AA disse-lhe que tinha para venda, a preços excelentes, viaturas e imóveis, provenientes de leilões e execuções judiciais e fiscais, que constituíam um bom investimento. 340) A arguida explicou que conseguia aceder, numa fase prévia, a estas viaturas e imóveis, por ter contactos privilegiados junto de entidades bancárias e de leasing, bem como junto de Tribunais e, por essa razão, podia transaccionar aqueles bens pelo preço base de licitação, isto é, pela quantia em dívida à entidade exequente. 341) O ofendido JJJ acreditou nesta explicação e convenceu-se que a arguida, graças aos contactos que afirmou ter, conseguia transaccionar tais bens a um valor inferior ao valor de mercado. 342) Pouco tempo depois, a arguida AA contactou-o e perguntou-lhe se não queria comprar um veículo marca Audi por € 14.000,00 (catorze mil euros). 343) O JJJ ficou interessado e acabou por comprar o automóvel, tendo o negócio decorrido com toda a normalidade. 344) Por esta razão, o JJJ ficou definitivamente convencido que a AA era uma pessoa de confiança e que os negócios de que lhe falara eram legítimos. 345) Assim, quando a arguida AA lhe propôs a aquisição de um apartamento na Praia da Vieira de Leiria, pelo preço de € 15.000,00 (quinze mil euros) o JJJ confiou que se tratava de um bom negócio e decidiu investir na compra daquele imóvel. 346) O que fez, entregando à arguida, no espaço de um ou dois dias, a referida quantia, em numerário, tudo conforme exigência daquela, pois que lhe dissera que o pagamento deveria ser feito, dessa forma e num curto espaço de tempo, sob pena de o negócio se gorar, que o negócio ficaria concluído em 2 ou 3 meses e que lhe entregaria posteriormente um documento do tribunal. 347) Todas estas explicações, mantiveram o ofendido convencido da legalidade do negócio proposto. Aliás, era tal a confiança que depositava na arguida que falou dela e das boas oportunidades de negócio que poderia proporcionar, a diversos amigos seus. 348) Em Julho de 2005, o ofendido JJJ – a pedido de GGG, pessoa a quem a arguida AA o solicitara alegando destinar-se ao pagamento de despesas com a escritura dos apartamentos vendidos àquele, a si e a HHH – entregou à arguida AA, através de cheque sacado sobre a sua conta do Finibanco, a quantia de € 31.900,00 (trinta e um mil e novecentos euros). 349) Posteriormente, os ofendidos GGG e HHH pagaram ao ofendido JJJ as respectivas partes em tais despesas, entregando-lhe, respectivamente, os montantes de € 15.950,00 e € 7.975,00. 350) Porque não existia qualquer processo em vias de resolução, nenhuma escritura foi feita, nem nenhum imóvel foi entregue, visto que nenhum imóvel estava à venda, nas circunstâncias referidas pela arguida, sendo certo que esta não tinha intenção de proporcionar ao JJJ a aquisição de qualquer apartamento, mas sim o único objectivo de obter daquele, a quantia que lhe foi entregue como contrapartida da obtenção de bens que o JJJ julgava adquirir, mas que aquela nunca teve intenção de lhe proporcionar.
XXVIII. KKK
351) Durante o ano de 2004, o ofendido KKK tomou conhecimento, através da sua filha, a arguida DD, de que era possível adquirir imóveis, a bom preço, provenientes de execuções judiciais. 352) Conheceu então a arguida AA, a qual lhe propôs a aquisição de uma moradia sita na Barosa, em Leiria, pelo valor de € 6.000,00 (seis mil euros), preço que pagou a esta, por intermédio da arguida DD, tendo-lhe a arguida AA feito entrega posteriormente de uma declaração denominada declaração compromisso / termo de responsabilidade, com o teor constante de fls. 1884 dos autos. 353) Nunca foi realizada qualquer escritura referente ao dito imóvel, sabendo a arguida que tal nunca sucederia, porque a mesma não estava legitimada a fazer tal venda. 354) A arguida Sabia que nunca o ofendido seria proprietário do bem que julgava ter adquirido, sendo certo que a arguida apenas teve intenção de o levar a entregar-lhe quantia em dinheiro, como contrapartida da entrega de um bem que aquela nunca tencionou proporcionar-lhe.
XXIX. LLL
355) A arguida DD, sabendo que o seu tio, LLL, tinha por hábito passar férias em Vieira de Leiria, contactou-o, em meados de Julho de 2004, dizendo-lhe que tinha conhecimento que naquela freguesia, havia para venda uma moradia que lhe poderia interessar. 356) Segundo lhe disse, a sua patroa tinha para venda imóveis provenientes de execuções judiciais, a bons preços, acabando por despertar o interesse do ofendido. 357) O LLL mostrou-se interessado, pelo que a DD agendou um encontro com a arguida AA, dizendo àquele que todo o processo decorria por intermédio desta. 358) A arguida AA disse-lhe que tinha bons contactos nos tribunais os quais lhe permitiam proceder à venda directa de imóveis penhorados, antes da venda em hasta pública, pelo montante da dívida, garantindo-lhe que era tudo legal. 359) Mostrou-se interessado pelo que a arguida AA levou-o a visitar a dita moradia, sita na Rua dos …, nº …, Praia da Vieira de Leiria, primeiro apenas pelo exterior, mas numa segunda visita, facultando-lhe a entrada. 360) Disse-lhe que a mesma estava hipotecada, mas que não haveria qualquer problema na sua aquisição, sendo o preço de € 22.500,00 (vinte e dois mil e quinhentos euros). 361) O LLL disse-lhe que iria pensar no assunto e mais tarde a contactaria a dar-lhe conta da sua decisão. 362) Mas, a arguida não esperou e uma semana mais tarde, telefonou-lhe, dizendo-lhe que existiam várias pessoas interessadas na vivenda e que para “segurar o negócio” tinha de entregar a quantia de € 22.500,00 (vinte e dois mil e quinhentos euros) justificando que era esse o valor da hipoteca. 363) Acreditando no que a AA lhe disse e, convencido que a compra da tal moradia era um bom negócio que poderia perder, caso não se apressasse, decidiu pagar a quantia referida pela arguida AA. 364) Para tal, em Setembro de 2004, através da arguida DD, entregou à arguida AA um cheque que emitiu ao portador e a arguida AA entregou-lhe nessa altura, um documento que denominou “declaração compromisso / termo de responsabilidade”. 365) Algum tempo depois, em Fevereiro de 2005, a arguida AA voltou a contactá-lo, propondo-lhe a aquisição de um apartamento que dizia situar-se nos Marinheiros, Leiria e que estaria hipotecado por € 25.600,00 (vinte cinco mil e seiscentos euros). 366) Pressionado pela forma como a arguida descrevia a urgência do negócio, não o querendo perder, no dia 02/02/2005, o LLL fez a transferência da quantia de € 25.600,00 da sua conta para a conta da arguida DD, conforme instruções da AA. 367) Posteriormente, após muitas insistências a respeito da data da realização das escrituras, a arguida acabou por lhe dizer que vendera o apartamento por € 85.000,00 (oitenta e cinco mil euros) e pretendia entregar-lhe tal quantia. 368) A arguida AA veio mais tarde a entregar ao ofendido LLL o cheque nº … sacado sobre a conta nº …, titulada por PPPP, no valor de € 70.000 (setenta mil euros) com data de 05/04/2006, para pagamento parcial de tal quantia, cheque esse que não foi pago, mas sim devolvido por motivo de roubo e chegado às mãos da arguida por forma não apurada e logo usado para enganar o ofendido LLL. 369) Pela devolução do referido cheque o ofendido LLL pagou a quantia de € 14,50 a título de encargos bancários. 370) A arguida AA sabia que nunca o ofendido seria proprietário dos bens que julgava ter adquirido, sendo certo que apenas teve intenção de o levar a entregar-lhes a referida quantia em dinheiro, como contrapartida da entrega de bens que ele julgava adquirir, mas que aquela nunca tencionou proporcionar-lhe, sabendo que os prédios que lhe indicara não estavam para venda nas circunstâncias referidas. 371) O ofendido LLL ao saber que não lhe seriam entregues os imóveis e que nem lhe seriam restituídas as quantias pagas ficou amargurado, angustiado, preocupado e triste, para mais porque as quantias entregues à arguida AA representavam o grosso das suas economias que conseguiu amealhar ao longo de vários anos de trabalho.
XXX. MMM
372) MMM ouvira falar da possibilidade de adquirir alguns bens provenientes de execuções, a preços muito inferiores aos valores de mercado, por intermédio da arguida AA, uma solicitadora de execuções, com escritório aberto, na ..., com quem contactou. 373) A arguida AA explicou-lhe que acedia a viaturas e imóveis alvo de execução, antes da respectiva venda e, por isso, a preços reduzidos, o que lhe era proporcionado pelos bons conhecimentos que dizia ter no Tribunal. 374) O ofendido nunca duvidou que a AA fosse quem dizia ser, ou seja, uma solicitadora de execuções, com contactos privilegiados junto dos tribunais, os quais lhe permitiam adquirir os bens antes da venda judicial em hasta pública. 375) A arguida granjeou então a confiança do ofendido MMM e em Outubro de 2004, propôs-lhe a aquisição de pelo menos oito automóveis, provenientes de leilões, segundo dizia. 376) Aquele aceitou o negócio e entregou à arguida AA, a título de sinal, os cheques nºs …, …, …, …, …, da conta nº … da Caixa Geral de Depósitos, titulada pela sociedade QQQQ, Lda., da qual era sócio gerente, respectivamente nos valores de € 3.759,00, € 4.230,00, € 4.749,00, € 6.270,00 e € 5.814,00, e ainda os cheques nºs …, …, … da conta nº … por si titulada na Caixa Geral de Depósitos, respectivamente, nos montantes de € 1.744,00, € 283,00 e € 1.350,00, num total de € 3.377,00. 377) Para além dos referidos veículos, o ofendido MMM adquiriu ainda à arguida AA, para si e para a QQQQ, Lda., outros veículos, num total não inferior a 20 e no que concerne à referida sociedade, num valor total não inferior a € 57.322,00. 378) A arguida não entregou todos os referidos veículos. 379) Entretanto, em Novembro ou Dezembro de 2005, a arguida AA propôs-lhe a aquisição de cinco apartamentos na ..., em Leiria, pelo preço de € 121.000,00 (cento e vinte e um mil euros). 380) MMM aceitou o negócio e entregou à arguida AA aquela quantia. 381) Pouco tempo depois, ela disse-lhe que já vendera os apartamentos pela quantia global de € 128.000,00 (cento e vinte e oito mil euros), montante que a arguida lhe entregou, contra a entrega de uma comissão correspondente a 3% sobre esse mesmo valor. 382) A arguida AA propôs ainda ao ofendido MMM a aquisição de um apartamento na Praia da Vieira, pelo preço de € 20.320,00 (vinte mil trezentos e vinte euros) e de um prédio na praia da Vieira por valor concretamente não apurado. 383) Agradado com a perspectiva de realizar este negócio que a arguida AA lhe propunha e que sempre julgou que se concretizaria, MMM aceitou as condições. 384) E para pagamento do apartamento na Praia da Vieira entregou à arguida AA o cheque nº … sacado sobre a sua conta nº … no valor de € 20.320,00 (vinte mil trezentos e vinte euros). 385) Nenhum destes prédios estava em vias de ser vendido, nas condições referidas pela arguida AA, nem esta estava mandatada para intervir em qualquer negociação que os tivesse por objecto, o que aquela sempre soube. 386) Sabia bem a arguida AA que nunca o ofendido seria proprietário dos bens que julgava ter adquirido, sendo certo que a mesma apenas teve intenção de o levar a entregar-lhe as referidas quantias como contrapartida da entrega de bens que nunca tencionou proporcionar-lhe.
XXXI. NNN e XXXII. OOO 387) Em Maio de 2006, o ofendido NNN soube, através do seu amigo, RRRR, funcionário numa imobiliária, da possibilidade de adquirir uns imóveis a bom preço, por estarem prestes a ser vendidos em hasta pública, a crer no que lhe havia sido dito. 388) Esse amigo explicou-lhe que uma solicitadora de ..., tinha acesso aos processos de execução judicial numa fase prévia, antes da venda, pelo preço base da licitação, porque possuía contactos privilegiados junto dos tribunais, tudo isto conforme lhe contara GG, filho de uma pessoa com quem trabalhara em tempos e que tinha na conta de pessoa honesta. 389) O ofendido NNN perspectivando a realização de alguns negócios lucrativos, decidiu conversar com o seu vizinho OOO, associando-se ambos para fazerem esse investimento. 390) Para tanto, marcaram encontro com a dita solicitadora, no dia 8 de Maio de 2006, pelas 8h30m, junto à empresa “Ferrus” em Leiria. 391) Porém, na altura apenas compareceu ao encontro o arguido GG, estando a solicitadora impedida, conforme lhes disse, até às 11 horas. 392) Então o arguido II ofereceu-se para os acompanhar a Porto de Mós, onde lhes iria mostrar um dos apartamentos que estavam para venda, conforme disse. 393) Chegados a Porto de Mós, perto do Centro de Saúde, o arguido GG indicou-lhes um apartamento, alegando que não podia mostrar o interior por não ter a chave consigo. 394) De regresso a Leiria, encontraram-se com a arguida AA, junto ao cartório notarial sito em Vale Sepal, onde então conversaram a respeito dos possíveis investimentos. 395) A arguida AA confirmou que era solicitadora de execução e que os apartamentos que vendia, eram provenientes de execuções judiciais e, graças aos seus contactos, conseguia aceder-lhes antes da venda, apenas pelo valor da dívida, ou seja, pelo preço base de licitação. 396) Então, propôs aos ofendidos a aquisição de um T2 em Porto de Mós (aquele que haviam visitado pouco antes) um T3 em Loulé e um T3 em Tavira, no valor total de € 64.800,00 (sessenta e quatro mil e oitocentos euros). 397) E, disse-lhes de imediato que para impedir a venda em hasta pública, aquele montante teria, obrigatoriamente, de entrar nos cofres do Tribunal até às 15 horas desse mesmo dia. 398) Entretanto, a arguida ia reiterando que se tratava de um negócio perfeitamente legal, que já vendera inúmeros imóveis naquelas condições e que se tratava de um bom investimento. 399) Todos estes argumentos eram secundados pelo arguido GG, que confirmava que se tratavam de negócios legítimos, que já haviam realizado muitos outros nas mesmas circunstâncias, sem qualquer problema. 400) Porque lhes pareceu plausível a explicação fornecida pela arguida AA, reforçada pela convicção manifestada pelo arguido GG, sugestionados pela “visita” ao apartamento em Porto de Mós e ainda pressionados pela urgência na entrega do dinheiro sob pena de perderem a oportunidade, os ofendidos aceitaram de imediato realizar o pagamento. 401) E, logo ali, o ofendido NNN entregou à arguida AA os cheques nºs … e …, cada um no valor de doze mil euros e ainda o cheque nº … no valor de € 8.400,00, todos sacados sobre a sua conta nº … do B.E.S. 402) Por seu turno, o ofendido OOO entregou à arguida AA, os cheques nºs …, …, … nos montantes de, respectivamente, € 12.000,00, € 8.400,00 e € 12.000,00, sacados sobre a sua conta nº … do B.E.S. 403) A seguir foram ao cartório notarial, a fim de ser reconhecida a assinatura da AA em documento que redigira e que intitulou de “declaração termo de responsabilidade”. 404) À excepção desta declaração, a arguida AA não lhes entregou qualquer documento, apesar de ter garantido que no prazo máximo de dez dias, lhes entregaria toda a documentação necessária para a realização das escrituras. 405) Porque a arguida não lhes entregou esses documentos, sendo certo que os cheques acima referidos, foram de imediato apresentados a pagamento e pagos, o ofendido NNN tentou, insistentemente, contactar a arguida AA, nunca o conseguindo. 406) Preocupado, telefonou ao arguido GG, tendo-o este descansado, dizendo que a AA andava com muito trabalho e, só por isso, não atendera os telefonemas, nem entregara os documentos, mas garantindo que estava tudo bem e não havia qualquer problema e que muita gente já tinha feito negócio sem problemas. 407) A arguida AA nunca entregou quaisquer documentos para realização das escrituras, nem tivera alguma vez intenção de o fazer, visto que, como sempre soubera, tal não seria possível já que, do conjunto de prédios cuja aquisição propusera aos ofendidos, uns não existiam e outros não estavam na situação que descrevera àqueles, nem ela tinha poderes para realizar qualquer negócio relacionado com os ditos imóveis. 408) Sabia bem a arguida AA, que nunca os ofendidos seriam proprietários dos bens que julgavam ter adquirido, sendo certo que a mesma teve intenção de os levar a entregar-lhe as referidas quantias em dinheiro como contrapartida da obtenção de bens que aquela nunca tencionou proporcionar-lhes.
XXXIII. II PPP
409) O ofendido II PPP conheceu a arguida AA por intermédio do seu amigo SSSS, o qual lhe contou ter adquirido àquela um automóvel marca Audi, por preço muito inferior aos praticados no mercado. 410) Na altura, o seu amigo contou-lhe que a AA lhe proporcionara a realização desse negócio porque, segundo a própria afirmava, era solicitadora de execuções e tinha contactos privilegiados junto dos tribunais, pelo que, tinha acesso aos processos de execução, antes da venda judicial. 411) Algum tempo depois, quando conheceu a arguida AA questionou-a a respeito da forma como se processava tal actividade e como era possível a aquisição de bens, nomeadamente veículos, a preços reduzidos. 412) A arguida referiu-lhe então que trabalhava com execuções, que tais carros estavam penhorados pelo tribunal, que por isso eram mais baratos e que era preferível pagar em dinheiro. 413) Convencido pela arguida que tal procedimento era possível e legítimo, PPP decidiu investir na compra de alguma viaturas, manifestando à arguida AA, interesse na aquisição de dois automóveis marca e modelo Mercedes E220, um por € 25.000,00 e outro por € 26.000,00, destinando-se o primeiro a ser adquirido por um seu colega de trabalho. 414) A arguida AA exigiu a entrega, a título de sinal, de quantia correspondente a 10%, razão pela qual o arguido lhe entregou a quantia de € 5.100,00 (cinco mil e cem euros) em numerário. 415) Na mesma ocasião, a arguida disse-lhe que também tinha um apartamento localizado na Nazaré e um outro, na Quinta da Gordalina, este último que visitou. 416) A arguida voltou a referir que se tratavam de apartamentos em vias de serem vendidos em hasta pública, mas que poderiam ser adquiridos antes da venda, desde que o pagamento fosse feito rapidamente. 417) Acreditando que os imóveis em causa podiam ser adquiridos, da forma descrita pela arguida, o PPP decidiu comprar o que lhe disseram ser o apartamento sito na Quinta da Gordalina, pelo valor de € 20.340,00 (vinte mil trezentos e quarenta euros). 418) Como a arguida AA insistia que o pagamento tinha de ser efectuado naquele mesmo dia, sob pena de se gorar o negócio, o II acabou por lhe entregar nessa altura, o cheque nº … da sua conta no Barclays Bank, naquele valor. 419) Porém, verificando que ao contrário do que prometera, a arguida não lhe entregou, no dia seguinte, qualquer documento relativo à aquisição do imóvel, receou ter sido enganado e cancelou o cheque. 420) A arguida AA não tinha qualquer intenção de lhe proporcionar o bem que diziam estar a vender-lhe, o qual não estava em situação de ser vendido, nas condições referidas ou quaisquer outras, não tendo aquela sido mandatada por quem quer que fosse para diligenciar por qualquer transacção que o envolvesse, tendo apenas intenção de levar o ofendido a entregar-lhe a referida quantia como contrapartida de bem que nunca obteria.
XXXIV. QQQ
421) A ofendida QQQ travou conhecimento com a arguida AA, através do seu amigo PPP, tendo-se aquela apresentado como solicitadora de execuções. 422) Em dia indeterminado, no final de 2005, em conversa com a QQQ e com o PPP, a arguida esclareceu que os veículos que vendia eram provenientes de execuções judiciais, processos a que tinha acesso por ter contactos privilegiados junto dos tribunais. 423) E, através desses contactos, sabia com antecedência dos bens que iam ser vendidos, sendo-lhe entregues alguns para que procedesse à sua venda directa. 424) Esclareceu que este procedimento não se restringia a automóveis, tendo igualmente disponíveis, apartamentos a preços convidativos, os quais também provinham de execuções judiciais e referiu que no momento, tinha para venda um apartamento na Nazaré e um outro na Urbanização ..., em Leiria. 425) Porque acreditaram na arguida e na legitimidade dos negócios que dizia realizar, manifestaram interesse na aquisição de alguns imóveis, pelo que a arguida lhes mostrou aqueles. 426) Constatando esse interesse, a arguida AA propôs à ofendida QQQ a aquisição de um apartamento sito em Casal de Matos e outro na Quinta do Bispo, o primeiro por € 28.000,00 e o segundo por € 11.056,00. 427) A arguida AA não concretizou a localização daqueles imóveis, nem forneceu outros dados que permitissem apurar da mesma. 428) Porém a ofendida acreditou que tais prédios existiam, assim como acreditou que a arguida tinha intenção de concretizar esse negócio nos prazos e condições estabelecidas. 429) E, só por isso, entregou à arguida AA, em 13/12/205, a quantia de € 28.000,00, em numerário, e ainda o cheque nº …, sacado sobre a sua conta nº … do BPN, no montante de € 11.056,00 (onze mil e cinquenta e seis euros) que emitiu ao portador como lhe foi determinado. 430) A arguida entregou-lhe então um escrito que intitulou de “declaração termo responsabilidade” onde afirma ter recebido o aludido montante e que o mesmo se destina a “aquisição de 2 fracções (…) por via judicial”. 431) Porém, a arguida AA nunca entregou quaisquer documentos referentes à aquisição dos prédios, nem tivera alguma vez intenção de o fazer, visto que, como sempre soubera, tal não seria possível já que, dos prédios cuja aquisição propusera, uns não existiam e outros não estavam na situação que descrevera àqueles, nem ela tinha poderes para realizar qualquer negócio relacionado com os ditos imóveis. 432) A arguida AA sabia que nunca a ofendida seria proprietária dos bens que julgava ter adquirido, sendo certo que apenas teve intenção de a levar a entregar-lhe as referidas quantias como contrapartida da entrega de um bem que nunca tencionara proporcionar-lhe.
XXXV. RRR
433) RRR conheceu a arguida AA através da cunhada desta, TTTT, a qual lhe disse que a arguida estava ligada ao tribunal e tinha acesso a bens penhorados. 434) Visto isto, tendo sabido que aquela tinha para venda alguns veículos e imóveis, resultantes de execuções judiciais e por estar interessado na aquisição de uma viatura, marcou encontro com a arguida AA, no escritório daquela, em Outubro de 2005. 435) Nesta reunião, a arguida disse-lhe que era solicitadora de execuções e explicou que tinha bons contactos nos tribunais, os quais lhe permitiam aceder a imóveis numa fase, prévia, anterior à venda judicial em hasta pública, pelo montante da dívida ao exequente. 436) O ofendido acreditou que a arguida fosse efectivamente solicitadora, tanto mais que tinha escritório aberto, assim como acreditou que a mesma tivesse legitimidade para proceder às ditas vendas. 437) Algum tempo depois, a arguida propôs-lhe a aquisição de um apartamento tipo T3, que dizia situar-se em Sete Rios, Lisboa, pelo preço de € 58.100,00 (cinquenta e oito mil e cem euros). 438) Nessa altura a arguida AA disse-lhe que teria de fazer o pagamento rapidamente, sob pena de o apartamento ir a hasta pública e perder o negócio. 439) Dada a urgência que a arguida lhe afirmou haver na entrega daquela quantia, mesmo não tendo visitado o apartamento, nem saber a sua exacta localização, concordou em entregar a dita quantia, até porque confiava na arguida. 440) Para tal emitiu o cheque nº …, ao portador, sacado sobre a sua conta nº … do Banco Santander no montante de € 58.100,00 (cinquenta e oito mil e cem euros) que entregou à arguida, cheque esse que posteriormente viria a ser entregue por esta a MMM. 441) Embora a arguida AA tenha garantido que a escritura seria realizada, tal nunca veio a suceder, visto que como aquela sempre soube, o prédio em causa não estava em situação de ser vendido, nem tinha poderes para realizar qualquer negócio relacionado com o mesmo, tendo levado o ofendido a entregar-lhes a quantia total de € 58.100,00 (cinquenta e oito mil e cem euros) como contrapartida de um bem que nunca teve intenção de lhe proporcionar.
XXXVI. SSS
442) Em data incerta, no início de 2005, a ofendida SSS viu-se na necessidade de adquirir um apartamento na zona de Cascais, tendo comentado tal assunto com um conhecido, de nome UUUU. 443) Algum tempo depois, soube por este da possibilidade de adquirir um apartamento T2 ou um T3, este pelo valor de € 75.000,00 (setenta e cinco mil euros) na baixa de Cascais, a preços convidativos, inferiores aos valores de mercado. 444) Questionado a este respeito, disse-lhe que tinha uma prima que trabalhava para uma advogada, a qual vendia imóveis provenientes de execuções judiciais, conseguindo assim preços vantajosos. 445) A ofendida disse que estava interessada no T3 que aquele mencionara e logo o UUUU se dispôs a telefonar à arguida AA. 446) Porque estava interessada no T3 de que lhe falara o UUUU, decidiu encontrar-se com a arguida AA, deslocando-se a Leiria, em Março de 2005. 447) Altura em que a arguida AA lhe confirmou estar à venda tal imóvel, pelo preço referido, e explicou que o referido T3 estava penhorado e que o dinheiro seria para entregar no Tribunal., insistindo ainda na necessidade do pagamento ser efectuado rapidamente, para ser evitada a venda judicial. 448) Acreditando em tudo que a arguida lhe dissera e fora confirmado pelo UUUU, a ofendida SSS, em 13/05/2003, entregou à arguida AA, a quantia de € 17.300,00 (dezassete mil e trezentos euros) em numerário e ainda a quantia de € 57.700,00 (cinquenta e sete mil e setecentos euros) através do cheque nº …., sacado sobre conta de que é titular no B.E.S. 449) Depois da entrega daquela quantia, a ofendida deixou de conseguir contactar com a arguida AA, o que só conseguiu depois de várias tentativas e depois de se deslocar a Leiria. 450) Embora a arguida AA tenha garantido que a escritura seria realizada no prazo máximo de dois meses, tal nunca veio a suceder, visto que, como aquela sempre soubera, o prédio em causa não estava em situação de ser vendido nas circunstâncias descritas pela arguida, nem a mesma tinha poderes para realizar qualquer negócio relacionado com o mesmo. 451) Na verdade, a arguida AA apenas pretendera levar a ofendida a entregar-lhes a quantia que de facto lhes entregou, como contrapartida de um bem que julgava adquirir, mas que nunca tencionara proporcionar-lhe.
XXXVII. TTT
452) Através de conversas ocasionais com um amigo do seu pai, TTT veio a saber que a arguida AA procedia à venda de viaturas e imóveis a preços inferiores aos de mercado, tendo ele próprio comprado um automóvel, a um bom preço, por intermédio da arguida. 453) Interessada em investir algum dinheiro, acabou por contactar a arguida AA, no escritório desta, no início de 2006, para averiguar se ela sabia de alguns negócios vantajosos e confirmar de que forma estes se processavam. 454) A arguida explicou-lhe que era solicitadora de execuções e mantinha bons contactos junto de tribunais, empresas de leasing e instituições bancárias, o que lhe permitia ter conhecimento da existência de bens penhorados em processos judiciais e, vendê-los pelo valor da dívida ao exequente, antes de ser realizada a venda judicial. 455) A arguida explicou à ofendida TTT que eram negócios muito frequentes e que já havia realizado vários, permitindo aos seus clientes lucros significativos. 456) A TTT não viu motivos para duvidar das explicações fornecidas, até porque, como constatava, a arguida tinha um escritório aberto ao público, com publicidade a vários imóveis e aonde acorriam diversos clientes. 457) Na sequência desse contacto, a arguida AA propôs à ofendida TTT a aquisição de um automóvel que disse ser da marca e modelo Volkswagen Golf, do ano de 2000, e proveniente de um processo de execução judicial, por preço concretamente não apurado e que teria de pagar de imediato, a titulo de sinal, quantia concretamente não apurada, o que esta fez. 458) a arguida AA propôs ainda à ofendida TTT a compra do que disse ser um apartamento T3 com garagem e sótão, sito na Urbanização Nova Leiria, em Leiria, proveniente de um processo de execução judicial. 459) Conforme disse à TTT, o preço fixado era de € 14.420,00 (catorze mil quatrocentos e vinte euros) que teria de ser pago no prazo de dois dias, sob pena de o apartamento ir à hasta pública e se perder o negócio. 460) Assim pressionando a ofendida, insistindo na urgência do pagamento, conseguiu que aquela, no dia a 18 de Janeiro de 2006, lhe entregasse a referida quantia em numerário. 461) A arguida AA não mostrou o apartamento à ofendida TTT, pretextando que só teria a chave após a escritura, mas indicou-lhe um apartamento sito na Urbanização Nova Leiria, dizendo-lhe que se tratava daquele que lhe vendera. 462) Alguns dias mais tarde, veio a saber que a AA teria para venda um apartamento T3 na cidade de Coimbra, pelo que a contactou para saber pormenores. 463) A arguida AA confirmou a existência desse apartamento e propôs à ofendida a compra do que disse ser, um apartamento T3 sito na Rua do Brasil, em Coimbra, proveniente de um processo de execução judicial, pelo preço de € 19.900,00 (dezanove mil e novecentos euros). 464) Então a ofendida, em 03/02/2006, entregou à arguida AA o cheque nº …. sacado sobre a sua conta nº … do B.P.I. no valor de € 19.900,00 (dezanove mil e novecentos euros). 465) Porém, a ofendida nunca realizou qualquer escritura nem recebeu nenhum dos bens que julgara ter adquirido e que pagou, sendo certo que a arguida AA bem sabia que nenhum dos bens cuja aquisição propusera, em diferentes ocasiões, lhe seria entregue. 466) Pois que, a arguida AA apenas quisera com a descrita actuação levar a ofendida a entregar-lhes a referida quantia como contrapartida de bens que julgava estar a adquirir, mas que aqueles nunca tiveram intenção de lhe proporcionar.
XXXVIII. UUU 467) Em data indeterminada de 2006, UUU, através de um mediador imobiliário, soube da possibilidade de adquirir um apartamento em Coimbra por € 44.000,00, apartamento esse que estaria a ser vendido através do tribunal. 468) Agendou então um encontro para o dia 15 de Maio de 2006, junto ao Cartório Notarial, sito em Vale Sepal, em Leiria, ao qual compareceu a arguida AA, pessoa que o arguido GG lhe apresentou como sendo solicitadora de execuções. 469) A arguida AA confirmou ser solicitadora e disse então ao ofendido UUU que conseguia os apartamentos a bom preço porque estavam penhorados e estavam a ser vendidos pelo tribunal. 470) Propôs-lhe então a aquisição, pela quantia de € 44.000,00 (quarenta e quatro mil euros) do que disse ser um apartamento T3 sito na Rua Calouste Gulbenkian, Edifício Primavera, na cidade de Coimbra. 471) Parecendo-lhe ser um bom negócio, o ofendido UUU entregou à arguida AA a referida quantia através do cheque nº … sacado sobre conta nº … do Finibanco, titulada pela sociedade VVVV, Lda., da qual era sócio gerente. 472) Logo na semana seguinte, a arguida tratou de sugerir a UUU novo negócio, contactando-o e propondo-lhe a aquisição do que disse ser um apartamento T3 duplex localizado na Estrada da Pontinha, lote … em Lisboa, pelo preço de € 58.310,00 (cinquenta e oito mil trezentos e dez euros). 473) O ofendido UUU ficou interessado nesse negócio e para pagamento daquela quantia passou e entregou à arguida AA o cheque nº … datado de 24/05/2006 e sacado sobre conta nº … do Finibanco sacado sobre conta nº … do Finibanco, titulada pela sociedade VVVV, Lda., da qual era sócio gerente. 474) A arguida nunca lhe forneceu outras indicações a respeito da localização dos imóveis cuja venda dizia efectuar, nem facultou qualquer documentação, e não tinha qualquer intenção de concretizar o negócio pois que, tal prédio não existe, nem estava em condições de ser vendido nas circunstâncias referidas pela arguida AA, ou quaisquer outras, nem a arguida tinha legitimidade para diligenciar pela venda desses imóveis ou qualquer outro assunto com eles relacionado. 475) A arguida AA, com a descrita conduta, apenas tivera intenção de levar o ofendido a entregar-lhes a quantia que de facto lhes entregou, como contrapartida da aquisição de bens que aqueles nunca tivera intenção de lhe proporcionar.
XXXIX. VVV
476) No verão de 2004, o ofendido VVV foi abordado pela arguida DD que lhe disse trabalhar para uma solicitadora de execuções, a qual dispunha de vários imóveis para venda, provenientes de processos judiciais, entregues pelo Tribunal com vista a diligenciar pela respectiva venda. 477) Ficou interessado, até porque os preços dos imóveis, segundo a arguida DD lhe dizia, eram muito inferiores aos praticados no mercado, podendo assim render lucros substanciais. 478) A arguida DD pediu-lhe o seu número de telefone, para ser contactado pela tal solicitadora – a arguida AA – ao que anuiu. 479) E, poucas semanas mais tarde, foi contactado pela arguida DD, com o propósito de marcar encontro que veio a acontecer e ao qual compareceu, não só a DD, como a AA. 480) A arguida AA apresentou-se-lhe, dizendo que era solicitadora de execuções, acrescentando que mantinha bons contactos junto de tribunais, o que lhe permitia ter conhecimento da existência de bens penhorados em processos judiciais e, vendê-los pelo valor da dívida ao exequente, antes de ser realizada a venda judicial. 481) E, propôs-lhe a aquisição do que disse ser um apartamento tipo T3 sito na Cruz da Areia, junto à Igreja, em Leiria, pelo preço de € 15.693,00 (quinze mil seiscentos e noventa e três euros). 482) As arguidas AA e DD, levaram-no à zona da Cruz da Areia, onde lhe mostraram a fachada exterior do lote … da Rua …, apontando-lhe o 3º andar esquerdo, afirmando ser o tal T3 que poderia adquirir pelo referido preço de € 15.693,00 (quinze mil seiscentos e noventa e três euros). 483) Preço esse que, como dizia a arguida AA, secundada pela arguida DD, teria de ser pago no prazo de 2/3 dias, sob pena de o apartamento ir a hasta pública e assim se perder o negócio. 484) Convencido da legalidade e urgência do negócio e respectivos trâmites, tal qual lhe foram narrados pelas arguidas, o ofendido, levantou da sua conta bancária a quantia de € 15.693,00 (quinze mil seiscentos e noventa e três euros) e entregou-a, em numerário, à arguida AA. 485) Algum tempo depois, a AA contactou-o de novo, propondo-lhe a aquisição de outros dois apartamentos que disse serem do tipo T3 e localizarem-se na Cruz da Areia e outro na Quinta do Bispo, igualmente no âmbito de um processo judicial, pelo preço global de € 31.098,00 (trinta e um mil e noventa e oito euros). 486) Referiu-lhe tratar-se de um lote de dois apartamentos, com origem em processo de execução judicial, renovando as justificações antes fornecidas, a respeito da necessidade de o pagamento ser feito de imediato, sob pena de o negócio se gorar. 487) Convencido, como anteriormente, pela arguida, que era um procedimento normal, o ofendido VVV deslocou-se ao banco onde tinha conta, onde levantou a quantia de € 31.098 (trinta e um mil e noventa e oito euros) referida pela arguida AA. 488) Logo de imediato entregou essa quantia, em numerário, à arguida DD que o acompanhara ao banco, para que esta a entregasse posteriormente à arguida AA, o que aconteceu. 489) Depois a arguida AA voltou a contactar o VVV e propôs-lhe a aquisição do que dizia ser um lote de três apartamentos do tipo T3, sitos, respectivamente, na Guimarota, Avenida Marquês de Pombal e ..., pelo preço global de € 64.942,00 (sessenta e quatro mil novecentos e quarenta e dois euros) 490) Forneceu as mesmas explicações que já antes dera, nomeadamente, a respeito desse lote ter origem em processo executivo e ser necessário proceder rapidamente ao pagamento do preço. 491) Mantendo a confiança na arguida e acreditando nos argumentos que lhe dera, aceitou o negócio e entregou à arguida AA, em numerário, a quantia exigida, ou seja, € 64.942,00 (sessenta e quatro mil novecentos e quarenta e dois euros). 492) Posteriormente, a arguida AA entregou ao ofendido a quantia de € 62.000,00 dizendo-lhe que tal montante era proveniente da venda do apartamento da Quinta do Bispo. 493) Nenhum dos prédios mencionados, supostamente adquiridos pelo ofendido, esteve para venda nas circunstâncias referidas pela arguida AA, ou quaisquer outras, nem a arguida tinha legitimidade para diligenciar pela venda desses imóveis ou qualquer outro assunto com eles relacionado. 494) Como a arguida AA bem sabia, não tinha legitimidade para vender fosse que imóvel fosse, sendo certo que ao exigir do ofendido as quantias que exigiu e dele recebeu, estava ciente que o levava a desapossar-se de tal quantia, sem que existisse perspectiva de obter qualquer contrapartida, pois que a referida arguida não tivera nunca intenção de lhe proporcionar os bens que diziam estar a vender-lhe.
XL. XXX 495) Em finais de 2005 o ofendido XXX travou conhecimento com o arguido FF a quem recorreu por necessitar de um fisioterapeuta e o arguido exercer tal profissão. 496) Ora, no decurso de algumas sessões de fisioterapia, em conversa com o ofendido XXX, o arguido FF propôs-lhe a aquisição de imóveis, penhorados no âmbito de processos de execução judicial, cujo preço era inferior ao valor de mercado, segundo lhe dizia, por intermédio de uma solicitadora de execuções. 497) XXX acabou por aceder acompanhá-lo até ao escritório da alegada solicitadora, a arguida AA, no início de Fevereiro de 2006. 498) Nesse local, a AA apresentou-se como sendo solicitadora de execuções. 499) Tal como já antes o arguido FF lhe garantira, a arguida AA explicou ao XXX que, por via daquelas funções, tinha acesso numa fase prévia, aos processos de execução judicial, antes da venda em hasta pública, pelo preço base da licitação, ou seja, por um valor inferior ao de mercado. 500) Aproveitando o clima de confiança que conseguiu criar no ofendido, a arguida AA propôs-lhe a aquisição do que disse ser um apartamento tipo T3, sito na zona do Calhau, na Nazaré, pelo preço de € 70.000,00 (setenta mil euros). 501) Os arguidos FF e AA prontificaram-se a mostrar-lhe o imóvel, o que fizeram, levando-o até às imediações dum condomínio sito na Estrada 242 ao Calhau, na Nazaré, dizendo-lhe que o apartamento em causa correspondia à fracção F. 502) Porém, aí chegados, a arguida AA disse que não lhe podia mostrar o interior do apartamento porque se esquecera das chaves. 503) Iludido com tudo quanto lhe haviam dito, o ofendido XXX foi levado a acreditar que esse negócio se iria concretizar. 504) Por isso, quando a arguida AA lhe disse que devia fazer a entrega da quantia de € 15.000,00 (quinze mil euros) dentro do prazo de vinte e quatro horas, sob pena do apartamento ir à praça, o ofendido aceitou logo fazer esse pagamento, receoso de perder o que já acreditava ser um bom investimento. 505) Para tal, no dia 8 de Fevereiro de 2006, procedeu ao referido pagamento através do cheque nº … sacado sobre a sua conta nº … do B.P.I. que entregou ao arguido FF, para que este o entregasse posteriormente à arguida AA e que esta recebeu, alegadamente para que a mesma, por sua vez, o entregasse no tribunal. 506) Embora o cheque em causa tenha sido depositado em conta titulada pelo arguido HH, o certo é que, não obstante tal pagamento, o apartamento em causa nunca foi entregue ao ofendido XXX, nem a escritura foi realizada. 507) A referida fracção não estava em situação de ser vendida nas circunstâncias descritas ao ofendido ou em quaisquer outras circunstâncias, nem os respectivos proprietários tinham intenção de as negociar, nem haviam mandatado os arguidos para tal. 508) A arguida AA, com a descrita conduta, apenas tivera o propósito de levar o ofendido a entregar-lhe a referida quantia como contrapartida de um bem que o XXX julgava ir obter mas que aquela nunca tivera intenção de lhe proporcionar.
XLI. ZZZ
509) No início de 2006 o arguido FF após travar conhecimento com XXX, começou a abordar a irmã deste, a ofendida ZZZ propondo-lhe, o que dizia, serem bons investimentos no sector imobiliário. 510) O arguido FF afirmava que vendia apartamentos e também viaturas, através de uma solicitadora de execuções, a Sra. AA, pessoa que garantia ser de toda a confiança e beneficiar de contactos privilegiados junto de Tribunais e Finanças. 511) O arguido explicou-lhe que, graças a esses bons contactos, a AA, no âmbito da sua actividade de solicitadora de execuções, tinha conhecimento antecipado, antes da realização da hasta pública, de diversos bens, provenientes de execuções judiciais, que vendia pelo valor da dívida à entidade exequente. 512) O arguido disse-lhe que, dessa forma, conseguia vender apartamentos e também viaturas, a preços inferiores aos valores praticados no mercado, permitindo, desta forma, aos clientes que contactava, lucros substanciais, traduzidos na diferença entre o valor da aquisição e o valor da posterior venda. 513) O arguido afiançou-lhe que ele próprio já tinha realizado diversos negócios deste género e que estavam a correr bem. 514) E, neste contexto de confiança que gerou, o arguido FF propôs à ZZZ, a aquisição do que disse ser um apartamento do tipo T3 sito na Avenida Marquês de Pombal, na cidade de Leiria, pelo preço de € 60.000,00 (sessenta mil euros) e que teria de pagar a quantia de € 22.500,00 a titulo de sinal. 515) O arguido FF disse-lhe que o apartamento em causa provinha de uma execução e que o valor indicado correspondia ao valor mínimo da licitação, assim justificando o preço do mesmo. 516) Acreditando em tudo que o arguido lhe contara, a ZZZ entregou-lhe, em 16 de Fevereiro de 2006, a referida quantia, através do cheque nº …, sacado sobre a sua conta nº … do B.P.I. 517) Cheque esse que foi depositado nesse mesmo dia na conta nº … titulada pelo arguido FF no BCP. 518) A pretexto de não ter a chave do mesmo, o arguido FF, disse à ZZZ não lhe ser possível mostrar o apartamento e, limitou-se a indicar ao irmão desta, o 2º andar esquerdo, lote …, da Avenida …, em Leiria, dizendo-lhe que se tratava do imóvel cuja aquisição propusera àquela. 519) Algumas semanas mais tarde, a ofendida começou a insistir com o arguido FF, pretendendo saber quando teria lugar a escritura, obtendo sucessivas razões para que a mesma se não realizasse. 520) Certo é que, embora paga a quantia antes referida e que não foi devolvida, a escritura nunca foi realizada, nem o apartamento entregue à ofendida, sendo certo que a arguida AA sempre soube que uma e outra não seriam possíveis, visto que o apartamento não estava em situação de ser vendido nas circunstâncias descritas à ofendida ou quaisquer outras circunstâncias, visto que o seu proprietário não tinha intenção de o negociar, nem mandatara nenhum dos arguidos para tal. 521) A única intenção da arguida AA foi a de levar a ofendia a entregar-lhe a quantia que de facto lhes entregou, como contrapartida de um bem que julgou adquirir, mas que aquela nunca tencionara proporcionar-lhe.
XLII. AAAA e MMM
522) Em finais de 2004, o MMM em conversa com o seu amigo AAAA, falou-lhe da possibilidade fazer bons negócios imobiliários, através da compra e venda de prédios objecto de execuções judiciais. 523) Pouco depois, contou-lhe que realizara um bom negócio com a venda de alguns imóveis comprados por intermédio da arguida AA, pessoa que se intitulava solicitadora de execuções e ter acesso ao tribunal e a pessoas influentes e conseguir comprar apartamentos penhorados em execuções antes de irem a hasta publica. 524) O MMM acreditou nos argumentos da arguida AA, os quais lhe pareceram credíveis, ficando convencido, tal como aquela pretendia e previra, que tais negócios eram legítimos e que aquela estava mandatada para os realizar. 525) Animado com a perspectiva da realização de bons negócios e confiando na arguida AA, o MMM que já fizera alguns negócios com ela, ou assim julgava, contactou o AAAA, pretendendo que ambos se aliassem para a aquisição de alguns imóveis. 526) A respeito da forma como se processavam as ditas aquisições, forneceu ao AAAA a explicação que a AA lhe havia dado, por nela acreditar. 527) Assim convencidos da legalidade dos descritos negócios de compra e venda de imóveis, ambos aceitaram a proposta que lhes fez a AA de adquirirem vários apartamentos na zona de Leiria, sendo que o ofendido AAAA agindo igualmente em representação da sociedade XXXX – Imobiliária e Construções, Lda., da qual era sócio gerente e com intenção de adquirir para esta também alguns de tais imóveis. 528) O que veio a suceder no final do mês de Fevereiro de 2005, altura em que a AA propôs a ambos, a aquisição de um T1 na Avenida Marquês de Pombal, dois T2 na zona do Telheiro, um T3 no Vale da Fonte, dois T2 na Urbanização Dingue e Urbanização Gordalina, um T3 na Urbanização das Pimenteiras em ... e um T3 na Estação. 529) Para melhor os convencer a AA levou-os às referidas zonas, a ver vários prédios, sempre apenas do exterior, nunca entrando em nenhum deles, o que só seria possível, dizia-lhes, depois da escritura. 530) O valor em causa, para o total das fracções, era de € 121.300,00 (cento e vinte e um mil e trezentos euros) e, segundo lhe disse a AA, deveria ser pago de imediato, para que a oportunidade não se perdesse. 531) Com efeito, a arguida AA insistia que se o pagamento não fosse feito rapidamente, não conseguiria evitar a venda em hasta pública dos prédios. 532) Acreditando que os ditos imóveis estavam em situação de serem vendidos, nas circunstâncias narradas pela arguida AA e que esta estava devidamente mandatada para tratar de todos os trâmites relacionados com a venda e ainda que, a rapidez no pagamento era essencial à concretização do negócio, a 07/02/2005, o MMM emitiu, a favor de FFFF Luiza Santos, por indicação da arguida AA, o cheque nº …, sacado sobre a sua conta nº … da C.G.D., no valor de € 121.300, cheque esse que entregou àquela. 533) A 31 de Janeiro de 2005, a arguida AA propôs ainda ao ofendido MMM, a aquisição do que disse ser, uma moradia geminada sita na Urbanização Valverde; um T3 com garagem junto à antiga fábrica da “Proalimentar”; um T3 na Estrada dos Marinheiros Rua 1º de Maio, junto à porta 26; um T3 na Cruz da Areia lote 56, pelo preço total de € 78.900,00 (setenta e oito mil e novecentos euros). 534) Para pagamento de tais imóveis, foi entregue à arguida AA o cheque nº …, com data de 31/01/2005, sacado sobre a conta nº … do Finibanco, titulada pelo ofendido AAAA, no referido montante de € 78.900,00, cheque esse passado à ordem de ZZZZ, conforme orientação da arguida AA. 535) Dias depois, em data concretamente não apurada mas anterior a 03/02/2005, a arguida AA propôs aos ofendidos MMM e AAAA, um terceiro negócio, que consistiria na aquisição do que dizia ser um T3 em Serrada do Pinhal, na Rua dos Loureiros; um T3 na Urbanização Valverde; um T3 na Urbanização Carloto; um T2 na Quinta da Alçada; um T2 na Praceta da Estação; um T3 no Planalto, lote 22 2º dtº e uma loja na Nova Leiria, pelo preço de aquisição foi de € 142.030,00 (cento e quarenta e dois mil e trinta euros), valor que os ofendidos pagaram de imediato através de cheque, cheque esse posteriormente entregue pela arguida ao ofendido CCC e depositado por este, em 03/02/2005, na conta nº 65676577/10 por si titulada no Banif. 536) A 18 de Fevereiro de 2005, a arguida AA propôs novo negócio ao MMM que consistiria na aquisição de três T3 sitos no lote 20 nº 3, na Quinta da Alçada, pelo preço de € 42.920,00 (quarenta e dois mil novecentos e vinte euros). 537) Esse preço foi integralmente pago mediante o cheque nº … sacado sobre a sua conta nº … do B.C.P. titulada pelo ofendido AAAA e emitido à ordem de FFFF, conforme indicação da arguida AA. 538) Ainda no dia 18/2/2005 a arguida AA propôs aos ofendidos MMM e AAAA (este último representado pelo seu filho AAAAA) um outro negócio, traduzido na aquisição de um apartamento T4 sito na Cruz da Areia, junto à Rua … nº…, em Leiria, pelo preço de € 12.124,00 (doze mil cento e vinte e quatro euros). 539) Valor esse que foi pago à arguida AA através do cheque nº … sacado sobre a conta nº … do B.C.P. titulada pelo ofendido AAAA e emitido nessa data à ordem de FFFF, por ordem da arguida AA e posteriormente entregue pela arguida ao ofendido CCC e depositado por este na conta nº … por si titulada no Banif. 540) A 20/2/2005, a AA propôs aos ofendidos MMM e AAAA (este último representado pelo seu filho AAAAA) um outro negócio consistindo na aquisição de um apartamento T3 na Urbanização da Gordalina, um apartamento T3 na Barreira e um apartamento T3 na Nova Leiria. 541) Desta vez o valor do negócio ascendia a € 94.130,00 (noventa e quatro mil cento e trinta euros). 542) Mais uma vez acreditando na legalidade do negócio e que a urgência do pagamento era essencial à sua concretização, os ofendidos entregaram à arguida AA o montante pedido, através da entrega do cheque nº … da conta nº … titulada pela Auto Reparadora Colmeias, Lda. na CCAM de Colmeias, no montante de € 10.000,00, do cheque nº … da conta nº … titulada por MMM na Caixa Geral de Depósitos, no montante de € 37.065,00 e do cheque nº … da conta titulada por AAAA no Banco Millenium, no valor de € 47.065,00. 543) A 4 de Março de 2005, a arguida AA propôs aos ofendidos MMM e AAAA, um outro negócio que consistia na aquisição de duas moradias geminadas sitas na Gândara, junto ao Ulmar, pelo preço de € 75.600,00 (setenta e cinco mil e seiscentos euros). 544) A 8 de Março de 2005, a arguida AA propôs aos ofendidos MMM e AAAA (este último representado pelo seu filho AAAAA), um outro negócio que consistia na aquisição de dois apartamentos T3 sitos, segundo dizia, na Urbanização localizada perto do Aki. 545) A arguida AA, logo nesse dia, levou os ofendidos a visitar o local, sendo certo que apenas avistaram o exterior dos apartamentos, pretextando a arguida que só após a escritura poderiam aceder ao interior. 546) Mantendo a confiança na arguida e sem qualquer dúvida a respeito da legitimidade dos negócios que iam fazendo, os ofendidos efectuaram o pagamento do preço pedido, € 19.540,00 (dezanove mil quinhentos e quarenta euros), através da entrega do cheque visado nº … sacado sobre a conta nº … do Millenium BCP, titulada pelo AAAA, datado de 14/03/2005, passado à ordem da arguida AA e posteriormente endossado por esta ao arguido BB e levantado por este último. 547) A 10 de Março de 2005 a arguida AA propôs aos ofendidos MMM e AAAA (este último representado pelo seu filho AAAAA), um outro negócio que consistia na aquisição de um apartamento T3 sito na Estação, entre o Beco da Paz e a Travessa da Paz; um terreno com cerca de dois mil metros quadrados; sito na Gândara, pelo preço € 67.400,00 (sessenta e sete mil e quatrocentos euros). 548) Para pagamento desta quantia, o MMM emitiu os cheques visados nºs … e …, datados, respectivamente de 02/03/2005 e 10/03/2005, à ordem de FFFF Santos. 549) A 17 de Março de 2005, a arguida AA propôs aos ofendidos MMM e AAAA (este último representado pelo seu filho AAAAA), outro negócio que consistia na aquisição de um apartamento T3 sito na Estrada dos Marinheiros, em Leiria, junto à Sodicentro, pelo valor de € 19.830,00 (dezanove mil oitocentos e trinta euros). 550) Para pagamento desta quantia, foi entregue à arguida AA o cheque visado nº …, no montante de € 19.830,00, datado de 17/03/2005, sacado sobre a conta nº … do BCP, titulada pelo ofendido AAAA, passado à ordem de FFFF e posteriormente pago ao arguido BB. 551) Ainda na mesma data, a arguida propôs aos ofendidos MMM e AAAA (este último representado pelo seu filho AAAAA), um outro negócio que consistia na aquisição de um apartamento T3 sito na Estrada dos Parceiros para Pernelhas, pelo preço de € 21.900,00 (vinte e um mil e novecentos euros). 552) Tal preço foi pago à arguida AA mediante entrega do cheque nº …, sacado sobre a conta … do Millenium BCP, titulada pelo ofendido AAAA, datado de 17/03/2005 e emitido à ordem de FFFF, conforme indicação da arguida AA. 553) Tal cheque foi apresentado a pagamento pelo arguido BB que recebeu a quantia nele aposta. 554) Ainda a 17/03/2005, a arguida propôs aos ofendidos MMM e AAAA (este último representado pelo seu filho AAAAA), um outro negócio que consistia na aquisição de um apartamento T3 sito na Estrada dos Parceiros para o Brogal, pelo valor de € 24.310,00 (vinte e quatro mil trezentos e dez euros). 555) Este preço foi pago à arguida AA, através do cheque nº …, sacado sobre a conta nº … do B.C.P., titulada pelo ofendido AAAA, datado de 17/03/2005, emitido à ordem de FFFF, por indicações da arguida AA e posteriormente pago ao arguido BB. 556) Ainda nessa mesma data, a arguida propôs aos ofendidos MMM e AAAA (este último representado pelo seu filho AAAAA), um outro negócio que consistia na aquisição de um apartamento duplex sito na Nova Leiria, pelo valor de € 38.785,00 (trinta e oito mil setecentos e oitenta e cinco euros). 557) Preço esse que foi pago através do cheque visado nº … sacado sobre a conta … do B.C.P., titulada pelo ofendido AAAA, à ordem de FFFF, por indicações da arguida AA e entregue a esta e posteriormente pago ao arguido BB. 558) A 30/03/2005 a arguida propôs aos ofendidos MMM e AAAA (este último representado pelo seu filho AAAAA), um outro negócio que consistia na aquisição de um apartamento T3 sito em Benfica, Lisboa, junto à Fonte Nova, pelo valor de € 52.000,00 (cinquenta e dois mil euros). 559) Este preço foi pago através do cheque nº … sacado sobre a conta nº …, titulada pela sociedade XXXX Imobiliária e Construções, Lda., datado de 31/03/2005, emitido à ordem de BB, por indicações da arguida AA e entregue a esta. 560) A arguida, em 15/04/2005, propôs ainda aos ofendidos MMM e AAAA (este último representado pelo seu filho AAAAA), um outro negócio que consistia na aquisição de um outro imóvel com localização concretamente não apurada, pelo valor de € 55.996,00 (cinquenta e cinco mil novecentos e noventa e seis euros) preço que foi pago através do cheque nº … da conta da C.G.D. titulada pelo ofendido MMM, com data de 15/04/2005, que o preencheu e entregou à arguida AA. 561) Tal cheque foi nessa mesma data entregue pela arguida ao ofendido CCC e depositado por este na conta nº … por si titulada no Banif e posteriormente devolvido, em 15/04/2005, sem contudo obter pagamento. 562) A 06/05/2005, a arguida propôs aos ofendidos outro negócio, consistindo na aquisição de uma moradia sita em Outeiros da Gândara, Leiria e uma moradia T4 sita na rotunda do Sítio, Nazaré, pelo preço de € 49.300,00 (quarenta e nove mil e trezentos euros). 563) O preço foi pago através do cheque nº … da conta nº … C.G.D. titulada pelo ofendido MMM, datado de 06/05/2005 e emitido por aquele à ordem de FFFF, conforme indicação da arguida AA e nessa data entregue a esta. 564) Alguns dos referidos cheques entregues à arguida AA da conta titulada por AAAA foram passados para pagamento de imóveis que se destinavam à sociedade XXXX – Imobiliária e Construções, Lda. 565) Durante o período acima referido, os ofendidos questionaram diversas vezes a arguida AA, no escritório desta, a respeito da data exacta da realização das escrituras, insistindo pela obtenção de documentação relativa aos imóveis, tanto mais que a arguida continuava a propor-lhes novas aquisições e, consequentemente, impondo-lhes novos pagamentos. 566) Porém, nessas alturas, a arguida desculpava-se com demoras na entrega de documentos por parte do Tribunal, ou dificuldades na marcação de escrituras. 567) Nenhum dos negócios propostos pela arguida AA se concretizou, ficando os ofendidos privados de quantias que entregaram à arguida AA como contrapartida da aquisição de bens que aquela nunca teve intenção de lhes proporcionar. 568) Com efeito nenhum dos imóveis cuja aquisição a arguida propôs aos ofendidos estava em condições de ser negociado, nas circunstâncias descritas pela arguida, ou quaisquer outras, nem a arguida estava mandatada para intervir em qualquer negociação que os tivesse por objecto. 569) A arguida AA, com a descrita conduta, apenas tivera como objectivo, levar os ofendidos a entregar-lhes as somas supra referidas como contrapartida da aquisição de bens que julgavam ir obter, mas que a mesma nunca tivera qualquer intenção de lhes proporcionar. 570) Após muita insistência, os ofendidos conseguiram que a arguida AA lhes devolvesse quantia concretamente não apurada mas não inferior a € 150.000,00 para cada um deles. 571) A arguida DD foi apresentada ao ofendido MMM como funcionária da arguida AA.
XLIII. BBBB
572) O BBBB era colega de trabalho do marido da arguida DD e em 2004, em conversa com aquele, soube que a DD trabalhava para uma senhora de Leiria que vendia apartamentos e viaturas, provenientes de penhoras, a preços muito inferiores aos praticados no mercado. 573) Encontrou-se então com a arguida DD a qual explicou-lhe que trabalhava para uma solicitadora de execuções que, por força dessas funções, tinha acesso a imóveis e também viaturas, em vias de serem vendidos em hasta pública, mas cuja venda podia realizar antes, pelo valor da dívida ao exequente. 574) Então o ofendido BBBB encontrou-se com a arguida AA, no escritório desta, altura em que a AA confirmou tudo quanto a arguida DD dissera, acrescentando que tinha bons contactos nos tribunais, os quais lhe permitiam proceder à venda directa de viaturas ou imóveis penhorados, antes da venda em hasta pública, pelo montante da dívida à entidade exequente, garantindo-lhe que era tudo legal. 575) Convencido que a actividade a que a arguida AA se dedicava era legal, o ofendido BBBB, aceitou a proposta que a arguida AA lhe fez, logo nesse primeiro encontro. 576) Com efeito, a arguida, logo nesse primeiro encontro, propôs-lhe a aquisição de um automóvel marca BMW, modelo 320 por um preço concretamente não apurado mas não inferior a € 14.500,00, pelo qual teria de pagar, a titulo de sinal, a quantia de € 2.622,00, proposta que o BBBB aceitou. 577) Assim, conforme exigência da arguida AA, o ofendido BBBB entregou à arguida DD, para que a mesma o entregasse àquela, o cheque nº … sacado sobre a sua conta nº … da C.C.A.M. de Pombal, no referido montante. 578) A arguida nunca entregou tal veículo ao ofendido BBBB, desculpando-se com problemas de burocracia que tinham provocado a retenção do BMW em Lisboa. 579) Posteriormente, em 25/06/2005, a arguida AA vendeu ao ofendido BBBB uma carrinha da mesma marca pelo preço de € 14.500,00 (catorze mil e quinhentos euros) que este pagou integralmente, através de cheque, carrinha essa que o ofendido efectivamente recebeu devidamente legalizada. 580) Porém, a arguida AA manteve a versão de que o primeiro veículo encomendado lhe seria entregue, como combinado, e que, por isso, não lhe descontaria a quantia já paga (a título de sinal para aquisição desse B.M.W.) da quantia devida pela aquisição da carrinha. 581) O certo é que nunca a arguida lhe entregou o referido B.M.W. modelo 320, nem lhe devolveu a quantia de € 2.622,00 (dois mil seiscentos e vinte e dois euros) sempre argumentando que o problema seria resolvido e a viatura entregue. 582) Quando o ofendido a questionava a respeito da entrega desse B.M.W, a arguida AA ia reiterando as promessas de resolução dos problemas que envolviam aquele veículo, mantendo sempre o BBBB na expectativa de o vir a receber. 583) O que nunca veio a suceder, pois que nunca tal veículo lhe foi entregue, nem a quantia paga lhe foi devolvida. 584) Entretanto, enquanto mantinha o BBBB na ilusão de que o referido automóvel lhe seria entregue, a arguida AA, aproveitava para lhe dizer que também tinha para venda, alguns apartamentos, a bom preço. 585) E, no início de 2005 propôs-lhe a aquisição do que disse ser um apartamento tipo T2 sito na Urbanização Nova Leiria, nesta cidade, pelo preço de € 23.900,00 (vinte e três mil e novecentos euros). 586) A arguida não lhe facultou qualquer documento referente ao imóvel nem lhe deu a conhecer a sua exacta localização, mas explicou-lhe que o preço era inferior ao valor de mercado, porque correspondia ao valor da dívida do executado ao banco, entidade exequente, que o imóvel ia ser vendido em hasta publica e disse-lhe que deveria dar uma resposta no prazo máximo de 4 dias 587) Mas, ainda não tinha decorrido esse prazo quando a arguida AA lhe telefonou, insistindo que deveria dar-lhe imediatamente resposta, argumentando que tinha apenas quarenta e oito horas para a entrega da quantia referida, nos cofres do Tribunal, sob pena de o apartamento ir a hasta pública. 588) E, para afastar qualquer dúvida que o ofendido ainda mantivesse, a arguida disse-lhe que poderia revender de imediato o apartamento por € 80.000,00 (oitenta mil euros) sendo a escritura realizada logo em nome do comprador. 589) Iludido pela promessa de um lucro substancial traduzido na diferença entre o preço da compra e o valor da garantida venda, pressionado pela urgência que a arguida AA lhe dizia haver na concretização do negócio, acreditando que a aquisição do apartamento referido por aquela, poderia realizar-se tal qual ela lhe dissera, o ofendido BBBB, em princípios de 2005, entregou-lhe a quantia de € 23.900,00 (vinte e três mil e novecentos euros) em numerário. 590) Entretanto o ofendido BBBB continuou a insistir com a arguida AA pela devolução da quantia de € 2.622,00 (dois mil seiscentos e vinte e dois euros) entregue a título de sinal, tendo em vista a compra do veículo B.M.W. 320, já que o veículo não era entregue. 591) Mas, ao invés de lhe devolver esse sinal, a arguida propôs-lhe, em Junho de 2005, a aquisição de um veículo Volkswagen Passat pelo preço de € 13.900,00 (treze mil e novecentos euros), abatendo a quantia que havia sido entregue a título de sinal (€ 2.622,00). 592) O ofendido BBBB concordou, pagando aquele preço através da entrega do cheque nº … sacado sobre a sua conta nº … da C.C.A.M. de Pombal, no valor de € 11.278,00 (onze mil duzentos e setenta e oito euros) sendo o remanescente composto pelo valor do sinal anteriormente entregue para aquisição do B.M.W. 593) Embora a viatura lhe fosse entregue algum tempo depois, o BBBB constatou que não estava legalizada e ostentava matrícula alemã, contrariamente ao que lhe havia sido dito. 594) Para evitar ser pressionada para devolver a quantia já recebida, a arguida AA garantiu que iria diligenciar pela legalização do veículo, o que nunca fez. 595) Sendo que posteriormente, não tendo conseguido legalizá-lo, o ofendido acabou por ter de entregar tal veículo. 596) Enquanto aguardava, o BBBB perguntou à AA se tinha para venda um Renault Megane, referindo aquela que tinha disponível um veículo daquela marca e modelo pelo preço de € 14.800,00 (catorze mil e oitocentos euros). 597) Agradado com o preço, o ofendido BBBB disse à arguida que concordava, efectuando o pagamento, através do cheque nº … sacado sobre a sua conta nº … da C.C.A.M. de Pombal. 598) Como a entrega deste veículo estivesse demorada e o BBBB insistisse pela devolução da quantia paga, a arguida AA, a fim de evitar essa devolução que não poderia, em todo o caso, satisfazer, pois que já dera outro rumo à quantia recebida, propôs trocar o Megane por um Audi A4 que lhe disse ter disponível. 599) E, veio a entregar-lhe em dia concretamente não apurado de Dezembro de 2005, uma viatura Audi A4, de matrícula SE sem contudo fazer a entrega, nessa altura ou mais tarde, dos documentos respectivos, a pretexto de ainda estarem na Conservatória do Registo Automóvel. 600) Apesar das insistências a arguida nunca lhe entregou os documentos, apresentando desculpas várias, desta forma inviabilizando a circulação do veículo. 601) Ora, a arguida nunca teve qualquer intenção de lhe entregar os documentos, pois bem sabia que os não ia obter, por não ter pago, nem tencionar pagar, o Audi que entregou ao ofendido BBBB e que, por seu turno, obtivera sob falsos pretextos, do legal representante do stand L..., sito na Rua … nº … na comarca de Leiria. 602) Acresce que o ofendido não recebeu as viaturas que julgava ter adquirido, sendo certo que também não recebeu o imóvel cuja aquisição lhe foi proposta e cujo preço pagou, induzido pela arguida AA que se tratava de uma negociação legal, sendo certo que a mesma apenas quis obter dele a quantia que o levou a entregar-lhe como contrapartida de bens que julgava ir receber, mas que aquela nunca teve intenção de lhe proporcionar. 603) Ao saberem que os bens adquiridos à arguida AA nunca lhes viriam a ser entregues e nem devolvidas as respectivas quantias, BBBB e a sua mulher DDDD passaram a irritar-se um com o outro e discutir com frequência e ficaram revoltados e indignados.
XLIV. BBBBB
604) Em dia concretamente não apurado de Dezembro de 2005, a arguida AA dirigiu-se ao stand de automóveis da sociedade L..., Lda., sito na Rua … nº … na comarca de Leiria. 605) Aí abordou CCCCC, à data director comercial do Stand, pessoa com quem já negociara anteriormente outros veículos e manifestou-lhe interesse em experimentar o automóvel marca e modelo Audi A4 de matrícula SE que ali estava exposto para venda, dizendo ter um comprador para o mesmo. 606) Afirmou que ia experimentar o Audi e logo veria se correspondia ao veículo desejado pelo seu cliente, caso em que fariam negócio, no prazo de dias. 607) Tal veículo era propriedade da sociedade L..., Comércio e Reparação Automóvel. Lda., da qual era sócia a sociedade L..., Lda. 608) Como a arguida AA era já conhecida, o ofendido não pôs objecções e permitiu-lhe que levasse o automóvel, para o experimentar e diligenciar pela sua venda, como pretendia. 609) O certo é que o tempo passou e a arguida não devolveu a viatura, nem procedeu ao seu pagamento, embora sucessivamente interpelada para tal. 610) É que, entretanto, ainda em Dezembro de 2005, a arguida AA entregou o Audi de matrícula SE a BBBB, a quem propusera a aquisição de um veículo e de quem já recebera a quantia de € 14.800,00 (catorze mil e oitocentos euros) nos termos acima descritos. 611) Na verdade, a arguida AA, ao dirigir-se ao referido stand propondo levar o Audi e vendê-lo, não teve nunca intenção de proceder conforme dizia. 612) A arguida apenas pretendia obter um veículo que pudesse entregar a BBBB, de quem já recebera a quantia de € 14.800,00 e a vinha pressionando para entregar o automóvel que adquirira. 613) Ora, como a arguida tivesse integrado essa quantia no seu património, usando-o como entendeu, mas nunca a tendo destinado a pagar fosse que viatura fosse, viu-se na absoluta necessidade de arranjar um veículo para entregar ao BBBB, de forma a mantê-lo na ilusão de que todos os outros negócios que o convencera a realizar, se concretizariam. 614) E, para tal, aproveitando a confiança que nela depositava o referido director comercial do stand, conseguiu que este lhe entregasse o Audi de matrícula SE que nunca teve intenção de pagar ou devolver, como não pagou, nem devolveu, visto que logo o entregou a BBBB.
XLV. DDDDD
615) Em meados de 2005, em circunstâncias concretamente não apuradas, a arguida AA propôs a GGG a aquisição do que disse ser um apartamento, na Avenida do Brasil, em Coimbra e um apartamento T2 na zona de Cruz de Celas, igualmente em Coimbra. 616) GGG falou então a EEEEE no referido apartamento sito na Avenida do Brasil, o qual, mostrando-se interessado, adquiriu tal apartamento, que se destinaria igualmente à sua companheira DDDDD, emitindo para o efeito o cheque nº …, sacado sobre a conta nº … do Montepio Geral, datado de 27/6/2005, no valor de € 40.000,00 (quarenta mil euros). 617) Cheque esse que entregou ao amigo GGG e que este por sua vez depositou na sua conta. 618) Certo é que, embora paga a quantia antes referida e que não foi devolvida, a escritura nunca foi realizada, nem o apartamento entregue, sendo certo que a arguida AA sempre soube que uma e outra não se concretizariam visto que não existia na Rua do Brasil, em Coimbra, qualquer apartamento em situação de ser vendido, nas circunstâncias que descrevera a GGG, ou em quaisquer outras circunstâncias, e nem a arguida AA estava mandatada para negociar tal apartamento.
XLVI. FFFFF
619) Em meados de 2005, em circunstâncias concretamente não apuradas, a arguida AA propôs a GGG a aquisição do que disse ser um apartamento, na Avenida do Brasil, em Coimbra e um apartamento T2 na zona de Cruz de Celas, igualmente em Coimbra. 620) Na sequência do que GGG propôs então ao ofendido FFFFF a compra do referido apartamento tipo T2, na zona de Cruz de Celas, cidade de Coimbra, pelo preço de € 40.000,00. 621) E contou-lhe que ele próprio já sinalizara um apartamento em Coimbra, sendo o preço de aquisição bastante inferior ao habitual, por se tratar de um apartamento penhorado e em processo de venda pelo Tribunal. 622) E foram ambos à zona da Cruz de Celas, muito embora não soubessem em qual dos prédios se situava o apartamento em causa. 623) Para aquisição do referido apartamento, o ofendido FFFFF emitiu o cheque nº … sacado sobre a sua conta nº … do B.E.S. e datado de 27/6/2005, no valor de € 40.000,00, à ordem do GGG, cheque que este último depositou na sua conta 624) Entretanto, o ofendido ficou a aguardar a marcação da escritura e entrega de documentação referente ao imóvel que julgava ter adquirido. 625) Mas, a verdade é que embora paga a quantia antes referida, e que não foi devolvida, a escritura nunca foi realizada, nem o apartamento entregue ao ofendido, sendo certo que a arguida sempre soube que não existia na zona de Cruz de Celas, em Coimbra, qualquer apartamento em situação de ser vendido, nas circunstâncias que descrevera a GGG, ou em quaisquer outras circunstâncias, nem a arguida AA estava mandatada por quem quer que fosse para negociar tal apartamento. * 626) Em data e circunstâncias concretamente não determinadas, a arguida AA entrou na posse dos cheques nºs …, … e …, sacados sobre a conta nº …, titulada por GGGGG e ainda dos cheques nºs … e …, sacados sobre a conta nº … titulada por “F... Lda.”. 627) Tais cheques haviam sido furtados, em Setembro de 2005, das instalações da empresa “F..., Lda.” sita na Zona Industrial de Seia, da qual é sócio gerente GGGGG. 628) Na posse dos mesmos, em data e circunstâncias não determinadas, a arguida AA preencheu o primeiro daqueles cheques (cheque nº …), datando-o de 12/04/2006 e assinou-o, pretendendo fazer crer a terceiros que era a legítima detentora do mesmo, e nele inscreveu a quantia de € 27.500,00 (vinte sete mil e quinhentos euros), após o que entregou o referido cheque para pagamento de uma viatura que adquiriu e posteriormente vendeu ao arguido FF. 629) Também na posse do cheque nº …, a arguida AA, preencheu-o e datou-o de 07/04/2006, nele inscreveu a quantia de € 50.000,00 (cinquenta mil euros) escrevendo ainda pelo seu punho, no local destinado à assinatura do titular da conta o nome PPPP, para fazer crer que o cheque havia sido assinado por este, o que não acontecera. 630) Em data concretamente não determinada, a arguida AA preencheu pelo seu punho o cheque nº …, emitindo-o à ordem de LLL, inscrevendo a quantia de € 70.000,00 (setenta mil euros) e a data 05/04/2006, no qual também apôs, no local destinado à assinatura do titular da conta o nome PPPP, para fazer crer que o cheque havia sido assinado por este, o que não acontecera. 631) Em data concretamente não determinada, a arguida AA preencheu pelo seu punho o cheque nº … e emitiu-o a favor de MMM, apenas apondo quanto à data o ano de 2006, mas inscrevendo a quantia de € 150.000,00 (cento e cinquenta mil euros), cheque esse que assinou com o nome de GGGGG, com o intuito de fazer crer que o cheque havia sido assinado por este o que não acontecera. 632) Em data concretamente não determinada, a arguida AA preencheu pelo seu punho o cheque nº …, datando-o de 27/05/2006 e inscrevendo nele a quantia de € 25.000,00 (vinte cinco mil euros), cheque esse que assinou com o nome de GGGGG, com o intuito de fazer crer que o cheque havia sido assinado por este o que não acontecera. 633) A arguida AA conhecia as circunstâncias em que os cheques chegaram à sua posse e sabia que não era titular ou tinha poderes para movimentar as referidas contas, mas assim mesmo preencheu-os e assinou-os, sabendo que ao utilizá-los e pô-los em circulação, criavam nos demais cidadãos a crença que tais cheques eram válidos e estavam preenchidos e assinados por quem para tal tinha legitimidade. 634) A arguida AA pretendeu com a emissão de tais cheques, usá-los em proveito próprio, destinando-os a enganar os clientes a quem propusera aquisições fictícias. 635) A arguida AA sabia que não detinha legitimamente os cheques na sua posse e que ao agir como agiu, prejudicava a credibilidade que tais documentos devem manter no comércio jurídico e lesava a fé pública que anda associada aos mesmos. * 636) A arguida AA montou uma estrutura que lhe permitia abordar clientes interessados na aquisição de viaturas, mas principalmente imóveis, a quem iludia com a promessa de lucro garantido e rápido, dado o reduzido preço de venda dos bens, fazendo crer que os bens estavam penhorados e eram alvo de processos executivos e que, nalguns casos, dada a sua actividade de solicitadora de execução e proprietária de uma agência imobiliária, com bons contactos, junto de bancos, empresas de leasing e no Tribunal, conseguia impedir a venda judicial, proporcionando aos clientes a sua aquisição pelo valor da dívida. 637) Para dar a toda esta encenação um aspecto verosímil, arrendou um espaço onde instalou um escritório, criando uma empresa imobiliária denominada “I...”, nos termos supra descritos. 638) Os arguidos FF, GG e DD angariaram alguns clientes para a arguida AA, designadamente propondo a compra de alguns imóveis através desta última. 639) A arguida AA agiu de forma livre, voluntária consciente, com o propósito, alcançado, de obter dos ofendidos a quem vendeu veículos e imóveis nos termos supra descritos, as quantias com as quais se enriqueceu. 640) O arguido BB actuou nos termos supra descritos sabendo que nenhum dos imóveis que negociou com os ofendidos SS, TT e CCCC estava penhorado no âmbito de qualquer processo executivo e que não estava mandatado pelos respectivos proprietários para proceder a tais vendas, tendo actuado com o único propósito de fazer suas as quantias que lhe foram entregues por aqueles e sem qualquer intenção de concretizar tais vendas ou entregar tais imóveis aos ofendidos. 642) A arguida AA sabia que o veiculo o Audi de matrícula SE que levou e não devolveu ao seu proprietário nos termos supra descritos, antes o entregando a terceiro, não lhe pertencia. 643) A arguida AA tinha nesta transacção fictícia de bens móveis e imóveis, a sua única fonte de rendimento, não tendo qualquer outra profissão ou actividade da qual obtivesse rendimentos. 644) O arguido GG conheceu a arguida AA através de um seu amigo chamado SSSS, que havia adquirido à mesma um veículo, segundo o mesmo, a um bom preço por ser proveniente de penhoras. 645) Como o pai do arguido GG estava interessado em adquirir um veículo marca Mercedes, o arguido pediu então ao amigo que lhe arranjasse um carro de marca Mercedes. 646) No início de Janeiro de 2006, o arguido GG deslocou-se então à I..., juntamente com o seu pai, local onde existiam diversos anúncios de venda de propriedades e onde conheceu a arguida AA. 647) O arguido GG e o seu pai adquiriram então diversos veículos à arguida AA e posteriormente, em Maio de 2006, adquiriram ainda quatro apartamentos. 648) Para pagamento de veículos, o arguido GG entregou à arguida AA, pelo menos, as quantias de € 35.000,00 e € 13.942,00 e para pagamento dos imóveis, pelo menos, as quantias de € 31.958,00 e de € 6.500,00. * 649) A arguida AA é a mais nova de dois filhos de um casal que se dedicava ao comércio ambulante de calçado, em feiras da região de Leiria. Este tipo de actividade garantia ao núcleo familiar rendimentos superiores ao rendimento médio das famílias assalariadas, residentes naquela área geográfica, o que permitiu garantir aos filhos alguma qualidade de vida, nomeadamente no que se refere ao acesso ao ensino. 650) A arguida, após ter concluído a então designada instrução primária, frequentou o 5° e 6° ano em regime de telescola, ingressando de seguida na Colégio de S. Miguel, pertencente ao Santuário de Fátima, onde concluiu o 12º ano. Durante o seu percurso académico revelou adequados níveis de aprendizagem, tendo reprovado apenas no 7° ano, por doença, uma vez que lhe fora diagnosticada uma hepatite e, consequentemente, fora obrigada a faltar às aulas durante cerca de 2 meses. 651) A arguida concluiu o 12º ano com 18 anos e iniciou então a frequência de um curso técnico-profissional de contabilidade, e, a seguir, passa a trabalhar como empregada de escritório numa empresa de acessórios para automóveis, local onde se manteve durante por período de tempo não inferior a 2 anos. 652) Após abandonar tal emprego, por pressão do marido, a arguida AA passou a dedicar-se à realização de trabalhos precários e sem vínculo contratual. 653) A arguida casou-se pela 1ª vez aos 20 anos, e deste casamento, que durou cerca de um ano, teve um filho, agora com 18 anos, a viver com o pai. 654) Ao fim de dois anos de separação estabeleceu novo relacionamento afectivo com um indivíduo, pintor da construção civil. 655) A arguida actualmente está divorciada, tem cinco filhos, actualmente com 18, 15, 13, 11 e 7 anos de idade, que se encontram entregues aos cuidados dos avós maternos. 656) A arguida, deu entrada no Estabelecimento Prisional Regional de Leiria a 25 de Maio de 2006, tendo sido transferida para o Estabelecimento Prisional Especial de Santa Cruz do Bispo, a 25 de Junho de 2008, onde se encontra em cumprimento de pena de prisão. 657) A arguida AA tem mantido comportamento adequado no estabelecimento prisional, estando enquadrada em tarefas de produção destinadas à "AMBAR", empresa que assumiu protocolo com a Santa Casa da Misericórdia do Porto, que por sua vez assume a iniciativa e gestão da cooperação com as empresas. Do pecúlio auferido satisfaz todas as suas necessidades suplementares, como tabaco, produtos de higiene e outros. 658) Em meio prisional AA conheceu outra reclusa, que se veio a constituir como um elemento de referência e de apoio, sendo com ela que perspectiva residir no futuro e estabelecer uma relação conjugal. 659) Esta, tendo sido colocada já em liberdade, arrendou casa em Matosinhos, vai iniciar um curso de formação profissional na área da geriatria e visita a AA regularmente. 660) Os filhos, que a reclusa deixou a cargo de terceiros e cujo distanciamento formulou como um dos maiores impactos da sua reclusão, não são agora mencionados como preocupação no futuro. * 661) O arguido BB é natural de Figueiró dos Vinhos, onde desenvolveu todo o seu percurso pessoal, inserido numa família numerosa e de parcas condições sócio-económicas e culturais, sendo o mais novo dos 7 filhos do casal progenitor. 662) O seu sistema familiar de origem traduz dificuldades na sua organização e funcionalidade, associadas, sobretudo, ao alcoolismo do progenitor, considerado uma figura ausente no contexto familiar e na formação educativa do arguido. Coube, assim, à figura materna o duplo papel de suporte e orientação do quotidiano familiar, parecendo ter-se verificado uma suficiente qualidade de vinculação por parte da mãe, referenciada como um recurso privilegiado de socialização e de suporte afectivo. 663) A situação económica da família terá sido dificultada pela escassez de recursos, pelo que desde muito cedo os filhos do casal tiveram que prestar apoio pecuniário através dos trabalhos que iam desenvolvendo. 664) Apesar das vicissitudes vivenciadas no contexto familiar, o processo formativo do arguido BB foi orientado com base na responsabilização e na transmissão e interiorização de valores morais e sociais ajustados e proporcionadores de uma conduta individual válida e socialmente positiva. 665) O percurso escolar de BB foi marcado por um frágil investimento, tendo concluído o 7.° ano de escolaridade com 16 anos de idade, havendo a registar 2 reprovações. Não prosseguiu os estudos por dificuldades económicas, mas, também, pela vontade de iniciar uma actividade económica que lhe possibilitasse autonomia e o acesso a determinados bens de consumo que a família não lhe podia proporcionar. 666) A trajectória laboral do arguido, iniciada por volta dos 17 anos de idade, foi marcada pelo desempenho de diversas actividades, nomeadamente empregado comercial, gerente de armazém, vendedor de automóveis, auxiliar de serviços gerais, motorista de pesados, funcionário administrativo. De todas as funções desempenhadas é a de motorista de pesados, aquela para a qual se sente mais vocacionado e que preconiza, no futuro, vir continuar a desempenhar. 667) O percurso laboral do arguido caracteriza-se pelo desempenho de actividades diversificadas e pela ausência de períodos de inactividade, com excepção do tempo em que esteve em prisão preventiva. 668) Ao nível familiar, foi em Novembro de 1992 que constituiu o seu agregado familiar através do casamento com HHHHH, sendo que fruto deste relacionamento o casal possui 2 filhos. 669) Do ponto de vista social, BB é um homem bem inserido, mantém relações de vizinhança cordiais, sendo bem referenciado pela generalidade das pessoas, que realçam o seu trato afável e educado, não havendo a assinalar comportamentos desadequados. 670) O arguido BB beneficia de um enquadramento familiar estável e relativamente ao qual manifesta acentuada centralidade afectiva. Reside com HHHHH mulher, de quem se encontra actualmente divorciado) e os dois filhos, …., 16 anos de idade, e …, 10 anos de idade. 671) O arguido reside com a família em casa própria adquirida com recurso a empréstimo bancário. 672) Em termos profissionais e muito recentemente, o arguido encontra-se a prestar serviços como funcionário administrativo na empresa “L… – Soluções Financeiras”, sendo o seu salário mensal na ordem dos € 650,00. 673) Economicamente a família conta, ainda, com o rendimento obtido da actividade laboral desempenhada por IIIII como proprietária e cabeleireira de um salão situado no Hospital de Santo André, Leiria, que, embora variável, proporciona uma situação estável e equilibrada. As despesas apresentadas pela família centram-se na habitação, cuja amortização de empréstimo, manutenção e despesas do salão de cabeleireiro se cifram em cerca de € 1.000,00 674) Ao nível familiar, há a referir que, embora divorciado, o arguido mantém a relação conjugal, numa perspectiva de organização, coesão e união, dispondo do apoio de todos os elementos da família, quer do contexto mais próximo, como alargado. Trata-se de um elemento importante na estrutura familiar, sendo considerado um recurso privilegiado de suporte afectivo e na qualidade de vinculação. 675) Na esfera social e apesar dos factos terem sido divulgados na comunicação social, não foram sentidas reacções adversas relativamente ao arguido, que continua a beneficiar de uma inserção positiva, pese embora acabe, sempre, por suscitar dúvidas e apreensões relativamente à sua pessoa. * 676) O arguido CC é o segundo elemento de uma fratria de dois filhos. Os seus pais, ambos já falecidos, trabalharam na administração pública, tendo desempenhado tarefas indiferenciadas e de baixa remuneração (o pai jardineiro e a mãe auxiliar dos serviços gerais), com as quais obtiveram recursos financeiros que lhe permitiram vivenciar um nível de vida remediado. 677) A estruturação da personalidade do arguido desenvolveu-se num ambiente descrito de normativo, que valorizava práticas educativas assentes na responsabilização e na proximidade afectiva. 678) O arguido CC frequentou a escola primária de Leiria, até aos 14 anos de idade, tendo apenas ficado habilitado com o 3º ano de escolaridade. O baixo nível de ensino que obteve resultou do frágil investimento escolar que o caracterizava e das frequentes ausências não autorizadas às aulas. A interrupção da escolaridade, com a idade atrás referenciada, foi determinada por vontade própria, tendo-se relacionado com o desejo que o mesmo apresentava de iniciar uma actividade laboral, remunerada, através da qual pudesse prover à satisfação das suas necessidades, sem depender dos seus progenitores. 679) Mais tarde, na situação de adulto, consciente do fraco nível de ensino de que dispunha e das desvantagens dessa insuficiente qualificação, veio a frequentar o ensino escolar destinado à faixa etária na qual se enquadrava, tendo-se habilitado com a 4ª classe, sendo este o nível de ensino que detém na actualidade. 680) A trajectória laboral do arguido iniciada aos 15 anos de idade, numa serração de madeiras, foi marcada pelo desempenho de actividades de fraca diferenciação e baixa remuneração (ajudante de serralheiro, operário fabril, servente de pedreiro), as quais foram interpoladas com alguns períodos de inactividade. A instabilidade laboral que o caracteriza e que o impelia a mudanças sucessivas de trabalho, prendia-se com a necessidade de obter um melhor nível remuneratório. 681) O arguido CC, quando activo para o trabalho, auferia montantes pecuniários, com os quais cooperava com a sua família de origem, procurando não depender integralmente destes, como acontecia nos períodos de inactividade. Contudo, a fraca consistência laboral vivenciada na sua juventude e início de vida adulta, não lhe permitiram, tal como era seu desejo, autonomizar-se marcadamente em relação aos progenitores. 682) Aos 21 anos de idade, o arguido CC contraiu matrimónio, com uma senhora com quem viveu apenas durante um ano. A este relacionamento seguiram-se outros. No decurso dos relacionamentos que manteve, o arguido CC foi pai de duas filhas, actualmente de 26 e 21 anos de idade, com as quais mantém uma relação distante. 683) O arguido CC convive no quotidiano com o seu único irmão (pessoa que também lhe dá algum apoio económico) e família nuclear deste, sendo com estes que desenvolve maioritária e quase em exclusivo as suas relações de sociabilidade. 684) O percurso de vida do arguido CC surge ainda associado à prática desportiva – futebol, modalidade que chegou a praticar, voluntariamente, nos Marrazes e no União de Leiria. 685) À data dos factos pelos quais se encontra acusado, o arguido CC vivia em união de facto com uma senhora, no Vale da Fonte em Leiria, da qual está actualmente separado. 686) Ainda na decorrência da última separação de facto e da situação de desemprego com que então se deparava, o arguido CC, procurou alternativa habitacional e enquadramento laboral. Desde então passou a viver em quartos de renda, sendo que na actualidade o faz na Rua de …, Porta nº …, Bairro …, Marrazes, num quarto, com serventia de cozinha e casa de banho. 687) Profissionalmente, em Janeiro de 2007, após um período anterior de laboração no ramo da construção civil, fixou-se a trabalhar na Associação dos Produtores Florestais do Oeste Estremadura, onde desenvolve as tarefas de sapador florestal, remuneradas com €460,00 mensais. Ao serviço desta entidade cumpriu três contratos de trabalho, estando actualmente na situação de efectivo. 688) O arguido CC é assíduo e cumpridor no trabalho. * 689) A arguida DD é natural da zona da Guarda, onde viveu com os seus pais até aos 26 anos de idade, tendo estado emigrada em França no período compreendido entre os seus 13 e os 18 anos de idade. 690) O seu processo de socialização decorreu no seio de uma família de parcos recursos sócio-económicos e limitadas aquisições culturais. 691) O seu percurso escolar foi marcado por frágil investimento, tendo concluído o 6.º ano com 13 anos de idade. A interrupção da escolaridade foi determinada pelas dificuldades vivenciadas pela família e pela necessidade de iniciar uma actividade laboral que permitisse auxiliar os seus progenitores, uma vez que é a mais velha dos 3 filhos do casal. 692) A trajectória laboral da arguida iniciou-se aos 15 anos de idade, em França, como ajudante de cozinha, conjuntamente com a sua mãe, actividade que manteve até aos 18 anos, idade com que regressou a Portugal. Desde então manteve-se ocupada como empregada doméstica externa, para pessoas particulares, até se ter autonomizado da sua família de origem, o que ocorreu aos 26 anos de idade, através do casamento com JJJJJ e do qual nasceram 3 filhos. 693) A partir de então, DD regista um percurso laboral e de residência marcado por uma itinerância familiar, com uma situação económico-financeira, por vezes, deficitária, tendo vivido em Rio Maior, Colmeias, Cadaval, Barracão e por último na Memória. Ao nível laboral trabalhou em pecuárias, no Intermarché e numa empresa de farinhas e rações. 694) A arguida DD encontra-se actualmente desempregada. 695) A arguida está a ser acompanhada nas consultas externas do Departamento de Psiquiatria (consultas de psicologia e psiquiatria) e na consulta de Diabetes, no Hospital de Santo André, em Leiria. 696) A arguida DD está divorciada e vive com os 2 filhos mais novos (19 e 12 anos de idade) em casa emprestada constituída por 2 pisos, localizada no centro do lugar, a qual beneficiou de obras de conservação. 697) A arguida DD encontra-se desempregada e requereu Rendimento Social de Inserção na Segurança Social, aguardando resposta. * 698) O arguido EE é natural de Sé Nova, Coimbra, cresceu junto de sua mãe e de seus avós maternos, na zona de Figueiró dos Vinhos, não tendo nunca o progenitor assumido a paternidade do mesmo. 699) O arguido é oriundo de uma família de humilde condição socio-económica, tendo beneficiado na infância de um ambiente familiar positivo, assumindo então a sua avó um papel mais activo em termos educativos, sendo coadjuvada pela mãe do mesmo, a qual possuía 18 anos aquando do nascimento do arguido. 700) O arguido EE possuía um relacionamento de maior proximidade com a sua avó materna, tendo esta falecido há aproximadamente 14 anos. 701) Arguido EE efectuou a escolaridade com que se encontra habilitado, designadamente o 8º ano, na zona de Figueiró dos Vinhos, tendo frrequentado ainda o 9º ano em regime nocturno, porém não concluiu, não tendo continuado posteriormente os estudos por falta de motivação. 702) O arguido EE decidiu autonomizar-se da sua família de origem, aos 15 anos de idade, devido aos problemas financeiros vivenciados por essa altura pela família, vindo residir para a zona de Leiria, iniciando então o desempenho de uma actividade profissional numa empresa propriedade de um tio. 703) Posteriormente, desempenhou outras actividades laborais, designadamente no sector da restauração e construção civil, e aos 18 anos foi cumprir como voluntário, o serviço militar nos fuzileiros, onde permaneceu cerca de dois anos. De seguida desempenhou outras actividades profissionais, nomeadamente no sector da electricidade e alumínios e paralelamente aos fins-de-semana, a de segurança em bares e discotecas. Após ter frequentado um curso de vigilante passou a trabalhar apenas neste ramo de actividade. 704) O arguido EE contraiu matrimónio, com 20 anos, passando a residir com a mulher na zona de Pombal, casamento que se manteve durante cerca de 5 anos. 705) O arguido veio residir novamente para Leiria, passando pouco tempo depois a residir junto de seu tio BB. 706) Mais tarde, iniciou novo relacionamento afectivo, situação que se manteve durante cerca de um ano, possuindo um filho desta relação, actualmente com 3 anos de idade, que permanece a residir em Coimbra, junto da ex-companheira. 707) O arguido EE reside actualmente em casa emprestada. 708) E tem desempenhado a actividade profissional de segurança ao serviço da empresa “L…”, sedeada na localidade de Pousos, Leiria, desde há cerca de 2 anos, auferindo salário mensal não inferior a € 600,00. 709) Do ponto de vista das suas relações de sociabilidade, EE privilegia o convívio com um grupo de pares associado à vida nocturna, não investindo no convívio com os elementos do meio de residência, onde goza de uma imagem pouco satisfatória. No que diz respeito aos seus tempos livres, é do agrado do arguido a prática desportiva, nomeadamente de futebol. * 710) O arguido FF nasceu na Alemanha, há 33 anos, País onde os seus pais (oriundos do Fundão) permaneceram durante cerca de 25 anos. Inserido numa família de mediana condição socio-económica, cujo pai era operário e a mãe auxiliar de enfermagem, viveu junto dos pais e único irmão, mais novo, até aos 7 anos de idade. Então, por decisão paterna, foi colocado junto da sua madrinha, residente em Lisboa, com o objectivo de iniciar o seu percurso escolar em Portugal e onde permaneceu durante cerca de 6 anos consecutivos num ambiente que sempre foi entendido como um meio familiar transitório e no qual pouco investiu afectivamente. Esta separação precoce da família de origem provocou algum abalo emocional, com quebra e enfraquecimento dos laços familiares e foi vivida com alguma angústia durante os primeiros anos até à sua aceitação e resignação. Contudo, nas férias de Verão deslocava-se para a Alemanha, vivendo com agrado esse período junto dos familiares. 711) O seu processo de socialização foi, assim marcado pela separação e por contextos pouco vinculativos em termos afectivos, mas materialmente compensatório, não tendo sentido em qualquer momento da sua vida qualquer dificuldade económica ou material. 712) O arguido FF iniciou o seu percurso escolar nas escolas do 1.º Ciclo de Belém e Restelo, onde registou duas retenções, uma no 3.º, outra no 4.º ano, com dificuldades de integração e adaptação. Via a escola como um ambiente hostil, sentia-se ostracizado por ser emigrante e não viver com os pais, tendo deixado de investir na área escolar. Com dificuldades em lidar com o novo modo de vida, depressa se desinteressou, desmotivou e distraiu-se das tarefas escolares. Não obstante, era assíduo, pontual, obediente, mantendo um bom comportamento e respeito pelos outros. Sociável e extrovertido, fazia amizades com facilidade e acompanhava com um grupo de pares heterogéneo com comportamentos pro-sociais. 713) O 2.º Ciclo foi iniciado no Fundão, aos 12 anos de idade, para onde foi viver para junto da avó materna e irmão, ambos regressados da Alemanha, num ambiente mais protector afectivamente mas permissivo em termos de regras. Com a ida para o Fundão intensificou as suas sociabilidades e integrou-se muito bem num grupo de pares numeroso. 714) Depois do 3.º Ciclo ingressou na Escola Profissional de Castelo Branco, onde terminou o ensino secundário no curso de Marketing, aos 19 anos de idade. 715) Face ao desinteresse que persistia em relação à área escolar, iniciou um experiência laboral como vendedor na “F… F…”, até se interessar pela área das massagens, motivado pela sua namorada com quem viveu uma relação marital durante 4 anos (dos 20 aos 24 anos de idade). 716) Nesse período fez curso de massagem de recuperação no SIMAC (Sindicato de 717) Massagistas e Cinesioterapeutas) do Porto, que concluiu com muito bons resultados de aproveitamento. 718) Com cerca de 23 anos de idade ingressa no União Desportiva de Leiria, como massagista de recuperação, onde permanece até ao presente. 719) FF esteve sempre associado a práticas desportivas desde a adolescência, como atleta federado de futebol e basquetebol, tendo feito parte da selecção de basquetebol e considerado como um bom desportista e adepto de uma vida saudável, regrada e com disciplina pessoal. 720) O arguido FF constituiu a sua família, através de uma ligação marital consistente e estável desde há 6 anos (estando previsto o matrimónio para Junho 2010), da qual nasceram 2 filhos, constituindo um agregado familiar composto pela companheira – KKKKK, 28 anos de idade, responsável de loja na PT – e os dois filhos – … e …., respectivamente de 4 e 2 anos de idade, integrado recentemente igualmente pelo seu irmão. 721) O agregado familiar do arguido vive numa vivenda que o arguido adquiriu há cerca de 7 anos, com recurso a empréstimo bancário, situada numa zona limítrofe de Leiria. 722) O arguido FF mantém desde há 11 anos um vínculo contratual estável e efectivo com a União Desportiva de Leiria (UDL), integrando o Núcleo de Futebol SAD, como massagista de recuperação. Simultaneamente, tem gabinete particular de fisioterapia, onde exerce regularmente, bem como avenças mensais protocoladas com diversos Clubes. Colabora ainda com o Núcleo Sportinguista de Futsal de Leiria, Clube da Boavista e em todas as actividades desportivas do Instituto Politécnico de Leiria. 723) De todas estas actividades retira rendimentos variáveis que rondam os € 2.500,00/€ 3.000,00, embora o seu vencimento na UDL seja de € 900,00€ acrescidos de prémios (cerca de € 200,00). 724) A companheira aufere um vencimento de € 900,00 acrescido de comissões (cerca de € 300,00). 725) O agregado apresenta despesas na ordem dos € 1.700,00, centradas sobretudo no pagamento de empréstimos para aquisição da habitação e crédito pessoal, no valor respectivo de € 700,00 e € 300,00 mensais. Suportam ainda o pagamento de Infantário e Creche dos 2 filhos (no valor de € 340,00), bem como despesas com a manutenção da habitação (€ 300,00). 726) O arguido FF é um homem dinâmico, responsável e dedicado à sua profissão, sendo considerado pela sua entidade patronal, como um funcionário dedicado, empenhado e merecedor de toda a confiança. A sua competência e experiência profissional é valorizada e reconhecida por todos com quem trabalha, tendo granjeado uma boa reputação a nível profissional e social. 727) O arguido é um homem sociável e muito bem integrado no meio do futebol (profissional e amador), sendo reconhecidas as suas competências técnicas e capacidades sociais de persuasão, aconselhamento e credibilidade, mantendo diversificados contactos com pessoas de vários escalões e estratos sociais. 728) Embora, outrora tenha mantido uma convivência e frequência intensa em ambientes nocturnos mais ou menos selectivos, actualmente, o arguido abandonou esses meios e centrou os seus interesses e motivações na esfera familiar (alem da profissional), sendo visto como um homem dedicado à família, ao acompanhamento dos filhos, ao seu bem-estar e conforto. Familiarmente muito activo, cooperante e solidário, é tido como um suporte fundamental na organização e funcionamento domestico, mercê do seu horário livre, estando sempre disponível para cuidar, tratar e acompanhar os filhos nas suas actividades e desperto para todas as suas necessidades que tenta satisfazer adequadamente. A sua rotina diária centra-se nessas actividades domésticas, familiares e educativas e todo o restante tempo dedica-o à área profissional. 729) Socialmente está afastado de ambientes de diversão ou ociosidade e o pouco tempo livre que consegue dispor gasta-o na prática desportiva de futebol com um grupo de pares heterogéneo. 730) O arguido FF mantém um estilo de vida socialmente adaptado, manifestando capacidades e recursos pessoais para prosseguir o seu percurso de vida dentro da conformidade social e normativa. * 731) O arguido GG é o segundo de quatro filhos, sendo oriundo de uma família de mediana condição sócio – económica. 732) O seu processo de socialização apesar de se ter desenvolvido num ambiente normativo que valorizava práticas educativas assentes na comunicação, na responsabilização e no afecto, foi condicionado pela super-protecção a que esteve exposto, sobretudo por parte da progenitora, 733) O percurso escolar do arguido GG decorreu em regime diurno até à conclusão do 7º ano de escolaridade, tendo este último ano sido finalizado no seminário de Leiria. A sua capacidade de aproveitamento foi mediana, tendo apenas sido alvo de uma reprovação. A interrupção da escolaridade, ocorrida sensivelmente aos 14 anos de idade, foi determinada pela vontade de iniciar uma actividade laboral, que lhe possibilitasse o acesso a determinados bens materiais, sem ter de depender na íntegra dos seus progenitores. 734) Mais tarde, em adulto, habilitou-se com o 9º ano de escolaridade. 735) A trajectória laboral de GG iniciou-se na olaria de que o seu progenitor ainda é proprietário. À actividade de oleiro, seguiu-se o desempenho de funções numa gasolineira, situada na sua aldeia de origem (Bajouca) das quais é sócio com os seus irmãos e pai, acumulando as funções de gerente. 736) Reconhecido na comunidade como uma pessoa trabalhadora e investida no sentido da melhoria do seu nível e qualidade de vida, o arguido GG, a partir dos 21 anos de idade, ocasião em que terminou o serviço militar e se habilitou com carta de pesados e articulados, em acumulação com as actividades referenciadas, iniciou-se a trabalhar em regime de part-time, por conta de outrem, como motorista internacional de longo curso. 737) Dos 14 aos 17 anos de idade, GG não obteve qualquer remuneração. Desta idade em diante e até se autonomizar em relação aos progenitores, por via do casamento, passou a dispor de ordenado. Este era gerido por si e amontoado em poupanças, não contribuindo, por opção dos seus progenitores, nas despesas tidas com a sua manutenção e com os consumos domésticos. 738) Aos 29 anos de idade, o arguido GG contraiu matrimónio. No decurso deste foi pai de dois filhos, uma menina e um menino, actualmente com 5 e 3 anos de idade, respectivamente. 739) O percurso de vida do arguido GG surge igualmente ligado ao gosto pelo seu envolvimento em actividades de cariz social e cultural, motivo pelo qual é um dos sócios fundadores da Associação Bajouquense para o Desenvolvimento. O mesmo, desde sempre, revelou-se uma pessoa sem ligações a qualquer grupo de risco, sendo referenciado muito positivamente na sua aldeia de origem, a mesma onde sempre trabalhou, pelas características de comunicabilidade e de sociabilidade que desenvolve com os outros. 740) À data dos factos pelos quais se encontra acusado, GG vivia com a sua esposa e filha, na cidade de Leiria, mantendo deslocações diárias para a Bajouca, localidade onde desenvolve a sua principal actividade profissional, nas bombas de gasolina, das quais é sócio gerente. 741) Actualmente, o agregado familiar no qual se insere, para além dos elementos acima referenciados (esposa e filha, esta de 5 anos de idade, aluna no infantário dos Capuchos), está acrescido de mais um elemento, o segundo filho do casal, com de 3 anos de idade, o qual está a ser cuidado pela avó materna, nos períodos de trabalho dos seus progenitores. 742) O arguido reside com a família num apartamento de tipologia T3, adquirido há 7 anos, com recurso a empréstimo bancário, o qual ainda estão a amortizar, pagando cerca de € 300,00 mensais. 743) O arguido aufere quantia não inferior a € 730,00 mensais de remuneração pelo trabalho que desempenha nas bombas de gasolina de que é proprietário e desenvolve um outro trabalho (a tempo parcial) na Associação Bairro dos Anjos – Secção de Natação, em Leiria. Esta actividade consiste no transporte de crianças, para a natação, durante 3 vezes por semana e é remunerada com € 200,00/mês. 744) O agregado familiar do arguido GG tem apoio de ambas as famílias de origem, nomeadamente traduzido no fornecimento gratuito das refeições principais do dia e no pagamento do infantário da filha mais velha do casal. 745) A mulher do arguido GG está desempregada mas colabora com o arguido e família deste, na exploração das bombas de gasolina da família, substituindo-o não só, mas também, enquanto o mesmo efectua os transportes acima referenciados. 746) Socialmente, GG continua a ser referenciado na sua aldeia de origem, a mesma onde passa todos os seus dias da semana e fins-de-semana, como uma pessoa extremamente trabalhadora e investida no sentido da aquisição de um nível de vida estável, sem ligações conhecidas a actividades não normativas ou ilícitas, a quem são ainda imputados atributos de afabilidade no trato, assertividade na comunicação e respeitabilidade para com os outros. 747) O arguido GG apresenta um estilo de vida socialmente adaptado, privilegiando o convívio com um grupo restrito de amigos e com a família, sendo com estes que passa os seus tempos livres. * 748) O arguido HH é oriundo de uma família modesta do Norte do país que se estabeleceu nesta região. 749) O pai, militar da GNR e a mãe, doméstica, conceberam cinco filhos, sendo o arguido o do meio, tendo o mais velho 47 anos e o mais novo 32. 750) Apresentou um desenvolvimento psicomotor próprio dos diversos estágios etários e cresceu num contexto relacional que caracteriza de harmonioso e equilibrado. 751) Frequentou a instrução primária entre os 6 e os 10 anos de idade, tendo concluído a 4ª classe. Prosseguiu os estudos até ao 7º ano, que obteve aos 15 anos de idade, após uma reprovação no 5º e outra no 6º ano. 752) Estes impasses estudantis foram a consequência directa da sua aplicação na preparação de uma carreira de corredor de motocross, onde veio a revelar algum sucesso no campeonato em que participou nos anos de 1984 a 1987. 753) Paralelamente, quando deixou de estudar (aos 15 anos), iniciou de imediato o ciclo laboral numa oficina de motos, perto de casa, onde permaneceu durante os dezasseis anos seguintes. 754) Ao fim deste tempo, estabeleceu-se por conta própria no mesmo ramo. Este empreendimento terminou três anos depois, devido a dificuldades de gestão económica do mesmo. 755) A partir de Setembro de 2006, passou a integrar os quadros de uma empresa de referência do ramo, trabalhando diariamente em Pombal. 756) O arguido HH cumpriu o serviço militar durante oito meses, no decurso de 1991. 757) Contraiu matrimónio em Maio de 1990. Desta união nasceram duas filhas, actualmente com 18 e 9 anos de idade. O arguido HH separou-se em finais de 1995, tendo o divórcio ocorrido no ano seguinte. 758) O arguido HH reside desde Março de 2006 num apartamento de construção recente, de tipologia T3, propriedade da sua actual companheira, adquirido com o recurso ao crédito bancário. 759) O agregado familiar é composto pelo arguido e pela companheira, solteira, 29 anos de idade, auxiliar de um consultório dentário. 760) O arguido HH aufere mensalmente quantia não inferior € 600,00 761) O arguido HH encontra-se integrado socialmente e profissionalmente é um trabalhador especializado e competente no seu sector. * 762) A arguida AA foi condenada: I. Por sentença proferida em 6 de Dezembro de 1999, transitada em julgado a 21 de Dezembro de 1999, no processo comum singular n° 927/96.2TALRA do 2° Juízo Criminal do Tribunal Judicial de Leiria, pela prática, em 2 de Novembro de 1995, de um crime de emissão de cheque sem provisão p. e pelo artigo 11° nº l alínea a) do Decreto-Lei nº 316/97 de 19 de Novembro, na pena de 60 dias de multa. II. Por sentença proferida em 21 de Junho de 2000, transitada em julgado a 29 de Setembro de 2000, no processo comum singular nº 421/97.4PBLRA do 2° Juízo Criminal do Tribunal Judicial de Leiria, pela prática, em 13 de Dezembro de 1996, de um crime de emissão de cheque sem provisão, p. e pelo artigo 11° nº l alínea a) do Decreto-Lei nº 316/97 de 19 de Novembro, na pena de 90 dias de multa. III. Por sentença proferida em 13 de Junho de 2001, transitada em julgado a 10 de Julho de 2001, no processo comum singular nº 457/96.2TALRA do 3° Juízo Criminal do Tribunal Judicial de Leiria, pela prática, em 3 de Novembro de 1995, de um crime de emissão de cheque sem provisão, p. e pelo artigo 11° nº l alínea a) do Decreto-Lei nº 316/97 de 19 de Novembro, na pena de 90 dias de multa. IV. Por sentença proferida em 2 de Fevereiro de 2002, transitada em julgado, no processo comum singular nº 249/00 da 1ª Secção do 4° Juízo Criminal de Lisboa pela prática, em 8 de Agosto de 1995, de um crime de emissão de cheque sem provisão, p. e pelo artigo 11° nº l alínea a) do Decreto-Lei nº 316/97 de 19 de Novembro, na pena de 75 dias de multa. V. Por sentença proferida em 26 de Maio de 2003 transitada em julgado em 11 de Junho de 2003, no processo comum singular nº 3074/02. 6TALRA do 2° Juízo Criminal do Tribunal Judicial de Leiria, pela prática, em 19 de Julho de 2002, de dois crimes de falsificação de documento e de um crime de burla qualificada, respectivamente, p. e p. pelos artigos 256° e 218° do Código Penal, numa pena única de 2 anos e 10 meses de prisão, suspensa na sua execução pelo período de 3 anos, sob a condição de a arguida proceder ao pagamento da quantia dívida e juros no prazo máximo de um ano, suspensão essa que lhe foi revogada. VI. Por sentença proferida em 21 de Fevereiro de 2005, transitada em julgado a 8 de Março de 2005, no processo comum singular nº 2866/03.3TALRA do 2° Juízo Criminal do Tribunal Judicial de Leiria, pela prática de um crime de burla qualificada, p. e p. pelo artigo 218° nº l do Código Penal, praticado em 24 de Abril de 2003, e de um crime de burla qualificada, p. e p. pelo artigo 218° nº 2 alínea a) do Código Penal, praticado em 15 de Maio de 2003, na pena única de 2 anos e 11 meses de prisão, suspensa na sua execução por 4 anos com sujeição a deveres. VII. Por sentença proferida em 14 de Dezembro de 2006, transitada em julgado a 11 de Janeiro de 2007, no processo comum singular nº 3329/04.5TALRA do 3° Juízo Criminal do Tribunal Judicial de Leiria, pela prática, em 25 de Setembro de 2004, de um crime de arrancamento, destruição ou alteração de editais p. e p. pelo artigo 357° do Código Penal, na pena de 7 meses de prisão suspensa na sua execução pelo período de 2 anos. VIII. Por acórdão proferido em 28 de Abril de 2009, transitado em julgado a 18 de Maio de 2009, no processo comum colectivo nº 76/07.0JALRA do 2° Juízo Criminal do Tribunal Judicial de Leiria, pela prática, em Outubro de 2005, de um crime de burla qualificada, p. e p. pelos artigos 217º e 218° nº 2 alínea a) do Código Penal, numa pena de 2 anos e 10 meses de prisão.
763) O arguido BB foi condenado: I. Por sentença proferida em 26 de Novembro de 2001, transitada em julgado a 11 de Dezembro de 2001, no processo comum singular n° 1083/99.0TALRA do 2° Juízo Criminal do Tribunal Judicial de Leiria, pela prática, em 24 de Outubro de 1999, de um crime de ofensas à integridade física simples, p. e p. pelo artigo 143º nº 1do Código Penal, na pena de 75 dias de multa. II. Por sentença proferida em 11 de Abril de 2003, transitada em julgado a 8 de Maio de 2003, no processo comum singular n° 618/99.2TALRA do 3° Juízo Criminal do Tribunal Judicial de Leiria, pela prática, em 18 de Abril de 1999, de um crime de dano, p. e p. pelo artigo 212º nº 1do Código Penal, na pena de 300 dias de multa.
764) O arguido CC foi condenado, por sentença proferida em 4 de Abril de 2006, transitada em julgado a 19 de Junho de 2006, no processo comum singular n° 468/05.9PBLRA do 1° Juízo Criminal do Tribunal Judicial de Leiria, pela prática, em 8 de Agosto de 2004, de um crime de condução sem habilitação legal, p. e p. pelo artigo 3º nºs 1 e 2 do Decreto-Lei nº 2/98 de 3 de Janeiro, na pena de 100 dias de multa. 765) O arguido HH foi condenado, por sentença proferida em 13 de Novembro de 2007, transitada em julgado a 13 de Dezembro de 2007, no processo comum singular n° 265/04.9PBLRA do 2° Juízo Criminal do Tribunal Judicial de Leiria, pela prática, em Dezembro de 2003, de um crime de burla simples, p. e p. pelo artigo 217º do Código Penal, na pena de 200 dias de multa. 766) A arguida DD não tem antecedentes criminais. 767) O arguido Marco FF OO Brás não tem antecedentes criminais. 768) O arguido EE entes criminais. 769) O arguido GG não tem antecedentes criminais.
Apreciando.
I Questão – Vício da contradição insanável entre a fundamentação e a decisão - artigo 410.º, n.º 2, alínea b), do CPP.
Esta questão é colocada pela recorrente após versar sobre o crime continuado, no ponto das conclusões “2. Quanto à Decisão”, dizendo ter o recurso como fundamento, nesta parte, a contradição insanável entre a fundamentação e a decisão a que se refere o artigo 410.°, n.º 2, alínea b), do CPP, afirmando não poder concordar que tenha sido condenada pela prática de um crime continuado por cada uma das vítimas, sendo que numa grande parte das vítimas apenas se tratou de um negócio, sendo certo que em alguns casos relativos a vários imóveis houve apenas uma resolução criminosa, indicando os casos de dezanove (embora sendo dois “em sociedade”) lesados – fls. 8402/3. E conclui que “Assim sendo os factos praticados pela arguida integram apenas um crime de burla qualificada p. e p. no 218 n° 2 alínea a) e b) do Código Penal e não na forma continuada, violando o douto Acórdão o disposto no artigo 30° n° 2 do Código Penal”. Como resulta do exposto, a arguida pretende outra coisa que não impugnar a matéria de facto pela via da alegação dos vícios decisórios previstos no artigo 410.º, n.º 2, do Código de Processo Penal, que são vícios de lógica jurídica ao nível da matéria de facto, que tornam impossível uma decisão logicamente correcta e conforme à lei, determinando o reenvio para novo julgamento. Vícios da decisão, não do julgamento, como se exprime Maria João Antunes, in Revista Portuguesa de Ciência Criminal, Janeiro - Março de 1994, pág. 121 – cfr. acórdão do STJ, de 05-11-1997, processo n.º 549/97-3.ª, CJSTJ 1997, tomo 3, pág. 222. Não podendo ser invocados estes vícios como fundamento do recurso para o Supremo Tribunal de Justiça, nada impede este Supremo Tribunal de conhecer oficiosamente dos vícios decisórios e compreende-se que assim seja. Para proceder a uma adequada revisão da matéria de direito, é necessário que a matéria de facto se encontre perfeitamente estabilizada. Em suma, o STJ conhece oficiosamente desses vícios quando, num recurso restrito exclusivamente à matéria de direito, constate que, por força da inquinação da decisão recorrida por algum deles, não possa conhecer de direito sob o prisma das várias soluções jurídicas que se apresentem como plausíveis. Ora, no caso não é disso que se trata, pois a recorrente não foca qualquer aspecto fáctico que pretenda ver esclarecido, antes alude a uma perspectiva de enquadramento jurídico-penal da sua conduta, focando casos de lesados em que, em seu entender, terá havido uma única resolução. Efectivamente, como veremos infra, na sede própria, na base de dezasseis situações, e não nas dezanove elencadas pela recorrente, esteve uma única resolução, estando em causa um único negócio com um único “cliente”, “investidor”, não se justificando em tais casos falar em continuação criminosa, figura que pressupõe várias resoluções e pluralidade de violações do bem jurídico. De qualquer forma, o que no fundo questiona a recorrente tem a ver com qualificação jurídico-criminal e não com pretensa contradição entre a fundamentação e a decisão. Improcede, pois, a arguição do vício em causa. O Exmo. PGA no seu extenso parecer, a fls. 8591e 8592 (3.º §) debita sobre “a insuficiência para a decisão da matéria de facto provada no que toca à conclusão da matéria de facto indutora em si e por si do crime continuado de burla qualificada”, que teria sido alegada pela recorrente a fls. 8398. A verdade é que em ponto algum da motivação ou conclusões é invocado o vício do artigo 410.º, n.º 2, alínea a), do CPP, maxime, a fls. 8398, onde a norma indicada, igualmente presente em outros locais – fls. 8379, 8388 e 8403 - é a do artigo 412.º, n.º 2, alínea a), do CPP, o que poderá ter feito incorrer em lapso.
II Questão - Burla qualificada – Crime (s) continuado (s) em dois planos, como considera o acórdão recorrido? – Crime continuado único? - Um único crime? – Pluralidade de crimes?
A recorrente foi condenada por trinta e seis crimes de burla qualificada, todos na forma continuada. Havia sido pronunciada, para além do mais, pela prática de 126 crimes de burla qualificada. Como se vê da acta de leitura de acórdão de fls. 8243 a 8258, foi comunicado que da audiência haviam resultado factos que poderiam determinar uma alteração não substancial da factualidade descrita na acusação, tendo sido elencados 57 novos factos. Após, foi referido existir a possibilidade dos factos resultantes da discussão da causa serem subsumíveis à prática de vários crimes de burla qualificada mas na forma continuada, p, p. pelos artigos 30.º, n.º 2 e 218.º, n.º 2, alíneas a) e b) do Código Penal em alternativa aos 126 crimes de burla qualificada que lhe eram imputados, bem como à prática de um crime de abuso de confiança, p. e p. pelo artigo 205.º, n.º 1 do Código Penal, em alternativa ao crime de abuso de confiança, p. e p. pelo artigo 205.º, n.ºs 1 e 4 alínea a), do Código Penal. As alterações foram comunicadas para os efeitos do artigo 358.º, n.º s 1 e 3, do CPP, nada tendo sido requerido.
Pretende agora a recorrente – fls. 8401 - que os factos integram apenas um crime de burla qualificada, na forma continuada, p. p. pelos artigos 30.º, n.º 2, 218.º, n.º 2, alíneas a) e b) do Código Penal. Mas a fls. 8402, já considera que “quanto muito terá praticado três crimes de burla qualificada na forma continuada e não os vinte (!) em que foi condenada” (sic). E como vimos a propósito do vício previsto no artigo 410.º, n.º 2, alínea b), do CPP, a fls. 8403, refere a recorrente que os factos integram apenas um crime de burla qualificada, p. p. pelo artigo 218.º, n.º 2, alíneas a) e b) do Código Penal e não na forma continuada.
Da matéria de facto dada por provada resulta que a recorrente ao longo de cerca de vinte meses – de Outubro de 2004 a Maio de 2006 (cfr. pontos de factos provados n.º 375 e 387) - assumiu variadíssimas condutas violadoras do mesmo bem jurídico, no caso do crime de burla, o património de cada um dos sujeitos passivos da infracção. O que no fulcro está em causa é saber se, no que respeita às condutas integrantes de burlas qualificadas, a arguida praticou 36 crimes de burla qualificada na forma continuada, como foi considerado no acórdão recorrido, ou um único crime de burla qualificada na forma continuada, ou 36 crimes de burla qualificada em concurso efectivo, com afastamento da figura do crime continuado.
Como se extrai do acórdão deste Supremo Tribunal de 25-06-1986, in BMJ n.º 358, pág. 267, a realização plúrima do mesmo tipo de crime pode constituir: - Um só crime, se ao longo de toda a realização tiver persistido o dolo ou resolução inicial; - Um só crime, na forma continuada, se toda a actuação não obedeceu ao mesmo dolo, mas este estiver interligado por factores externos que arrastam o agente para a reiteração das condutas; - Um concurso de infracções, se não se verificar qualquer dos casos anteriores.
Estabelece o artigo 30.º, n.º 2, do Código Penal, que constitui um só crime continuado a realização plúrima do mesmo tipo de crime ou de vários tipos de crime que fundamentalmente protejam o mesmo bem jurídico, executada por forma essencialmente homogénea e no quadro da solicitação de uma mesma situação exterior que diminua consideravelmente a culpa do agente. Para que funcione a unificação das condutas sob a forma de crime continuado há que estar-se perante vários actos entre os quais haja uma certa conexão temporal, sendo por esta que se evidenciará uma diminuição sensível da culpa, mercê de factores exógenos que facilitaram a recaída ou recaídas. A figura do crime continuado supõe actuações diversas, reiteração de condutas, situações que se repetem em função da verificação de determinados quadros factuais. Entre os diversos comportamentos existe um fio sequencial, sendo a reiteração, repetição, sequência dos actos, após a primeira actividade criminosa, ilustrada no quadro exemplificativo de situações exteriores típicas, que arrastam para o crime, apresentado pelo Prof. Eduardo Correia em Unidade e Pluralidade de Infracções, 1945, pág. 338. O mesmo Autor, em Teoria do Concurso em Direito Criminal, 1967 (e 1996), págs. 246 e ss., refere quatro exemplos de situações exteriores, que preparando as coisas para a repetição da actividade criminosa, seriam susceptíveis de diminuir consideravelmente o grau de culpa do agente (reeditadas de forma sintetizada em Direito Criminal, com a colaboração de Figueiredo Dias, II, Reimpressão, Almedina, 1968 – 1971, pág. 210), e que poderão estar na base de uma continuação criminosa, a saber: a) «A circunstância de se ter criado, a partir da primeira actividade criminosa, uma certa relação, de acordo entre os sujeitos» - situação que exemplificava com o caso dos delitos sexuais e nomeadamente o adultério; b) «Voltar a verificar-se a mesma oportunidade que já foi aproveitada ou que arrastou o agente para a primeira conduta criminosa» - situação que exemplificava com os casos, entre outros, do criado que furta vários cigarros ao patrão, deixados ao seu fácil alcance, e do caixa que vai igualmente descaminhando em proveito próprio o dinheiro que lhe foi entregue; c) «A perduração do meio apto para a realização de um crime, que se criou ou adquiriu com vista a executar a primeira conduta criminosa» - situação que exemplificava com os casos, entre outros, do moedeiro falso que, tendo adquirido ou construído a aparelhagem destinada a fabricar notas, se vê sempre de novo solicitado a utilizá-la e do burlão que, tendo alcançado ou falsificado um documento, com que praticou uma primeira burla, é de novo solicitado a cometer com ele uma outra; d) A circunstância «de o agente, depois de executar a resolução que tomara, verificar que se lhe oferece a possibilidade de alargar o âmbito da sua actividade criminosa», situação que exemplificava com o caso do indivíduo que penetra num quarto para furtar jóias e, depois de as subtrair, verifica que no quarto também se encontra dinheiro, de que igualmente se apropria.
Segundo o acórdão do STJ, de 24-11-1993, BMJ n.º 431, pág. 255, são pressupostos do crime continuado: - A plúrima violação do mesmo tipo legal de crime ou de vários tipos legais de crime que fundamentalmente protejam o mesmo bem jurídico; - Que essa realização seja executada por forma essencialmente homogénea; - Que haja proximidade temporal das respectivas condutas; - A persistência de uma situação exterior que facilita a execução e que diminui sensivelmente a culpa do agente; - Que cada uma das acções seja executada através de uma resolução e não com referência a um desígnio inicialmente formado de, através de actos sucessivos, defraudar o ofendido. (cfr., para além do supracitado, os acórdãos do STJ de 05-11-1997, processo n.º 608/97-3.ª e de 04-12-1997, processo n.º 720/97-3.ª, in SASTJ n.ºs 15 e 16, volume II, págs. 154 e 155; de 12-04-2007, processo n.º 814/06 - 5.ª; de 17-05-2007, processo n.º 1133/07 - 5.ª; de 05-07-2007, processo n.º 1766/07 - 5.ª e de 13-09-2007, processo n.º 2170/07 - 5.ª). Como decidiu o acórdão do STJ, de 27-04-1983, processo n.º 36933, verifica-se um crime continuado quando se provem plúrimas violações da mesma norma pelo agente, proximidade temporal das respectivas condutas parcelares e também a manutenção da mesma situação exterior, a proporcionar as subsequentes repetições e a sugerir a sua menor censurabilidade. Como se pode ler no acórdão do STJ de 24-01-2007, processo n.º 4066/06-3.ª, pressuposto da continuação criminosa é, verdadeiramente, a existência de uma relação que, de maneira considerável facilitou a repetição da actividade criminosa, tornando cada vez menos exigível ao agente que se comporte de maneira diferente, isto é, de acordo com o direito. Assim, também o acórdão do STJ de 14-02-2007, no processo n.º 4100/06 - 3.ª refere que «O crime continuado ocorre quando o agente, com unidade de propósito e violando o mesmo bem jurídico – pertencente a uma pessoa ou a várias sempre que o bem ou bens violados não sejam de natureza eminentemente pessoal –, executa em momentos distintos acções diversas, cada uma das quais conquanto integre um comportamento delituoso, não constitui mais do que a execução parcial de um só e único facto típico, sendo que o seu fundamento reside no menor grau de culpa do agente». Ainda nas palavras do mesmo acórdão de 14-02-2007 proferido no processo n.º 4100/06 - 3.ª «Para haver crime continuado é necessário, pois, que se tenha verificado um circunstancialismo exógeno condicionante da conduta do agente, que lhe tenha facilitado (como que tentando-o) a repetição, em termos tais que lhe diminua consideravelmente a culpa. Como expendeu Eduardo Correia, quando se investiga o fundamento desta diminuição da culpa ele deve encontrar-se no momento exógeno das condutas, na disposição exterior das coisas para o facto, pelo que pressuposto da continuação criminosa será, verdadeiramente, a existência de uma relação que, de fora, e de maneira considerável, facilitou a repetição da actividade criminosa, tornando cada vez menos exigível ao agente que se comporte de maneira diferente, isto é, de acordo com o direito. A situação exterior deve ser tal que objectivamente facilite a execução do facto criminoso ou prepare as coisas para a repetição do facto.» Este Supremo Tribunal tem considerado que não integra a figura do crime continuado a realização plúrima do mesmo crime se não forem as circunstâncias exteriores ao agente que o levaram a sucumbir, mas sim o desígnio inicialmente formado de através de actos sucessivos lesar o queixoso, como se elucida no acórdão de 24-01-2007, processo n.º 4347/06-3.ª, onde se afirma: «A noção de crime continuado contida no art. 30.º, n.º 2, do CP é tributária do pensamento do Prof. Eduardo Correia, expressa em Direito Criminal, II, 1992, pág. 209, e pressupõe a realização plúrima do mesmo tipo legal de crime (logo de resoluções criminosas), homogeneidade na sua forma de execução, uma certa conexão temporal entre os actos individuais, na forma de proximidade temporal entre as sucessivas condutas, lesão do mesmo bem jurídico, uma unidade de dolo continuado (que se apresenta como um fracasso psíquico e sempre homogéneo do autor na mesma situação de facto, na lição de Jescheck, in Derecho Penal, Parte General, pág. 216) e a persistência, a manutenção de uma situação externa, de uma mesma situação exterior ao agente, que reduza, de forma substancial, a culpa, o juízo de censura do agente, apta “a gerar um repetido sucumbir” e a fundar um menor juízo de censura”. Num outro registo, o acórdão de 10-12-1997, processo n.º 1192/97 -3.ª, SASTJ n.ºs 15 e 16, volume II, pág. 204, pronunciava-se no sentido de ser de concluir pela existência de concurso real de crimes quando as circunstâncias exógenas ou exteriores não surgem por caso, em termos de facilitarem e arrastarem o agente para a reiteração da sua conduta criminosa, mas, pelo contrário, são conscientemente procuradas e criadas pelo agente para concretizar a sua intenção criminosa. Em sentido semelhante o acórdão de 06-11-1997, processo n.º 1310/96-3.ª, ibidem, pág. 155, ao referir que a figura do crime continuado pressupõe uma multiplicidade de condutas, com multiplicidade de propósitos criminosos, em que a culpa do agente se encontra fortemente diminuída por força da acção de factores estranhos ao agente, e por ele não provocados nem procurados. Como se extrai do acórdão 13-12-2007, processo n.º 3749/07-3.ª, não há razões para subsumir o caso a crime continuado “ (…) se, decomposta a actividade do arguido reconhecida na materialidade considerada provada, se verifica que o mesmo utilizou, em termos gerais, o mesmo tipo de artifício fraudulento em relação a ofendidos distintos e em momentos distintos, não tendo a actuação alicerçada nos três vectores distintos qualquer outra ligação que não o facto de ter sido o arguido o seu autor e de ter utilizado o mesmo processo para induzir em erro, e não ocorrendo, pois, a acentuada diminuição de culpa motivada por factor exógeno transversal à actuação ilícita cometida, mas, antes pelo contrário, uma pluralidade de resoluções autónomas entre si com vista à prática de acto ilícito”. Como se afirma no acórdão deste Supremo de 23-01-2008, no processo n.º 4830/07 - 3.ª, versando caso de abuso sexual de crianças agravado «O fundamento da unificação criminosa consiste na diminuição da culpa do agente, resultante da “cedência” a uma solicitação exterior, e não na unidade de resolução criminosa ou na homogeneidade da actuação delitiva. Esta última, assim como a proximidade temporal das condutas, é um elemento meramente indiciário da continuação criminosa, que deverá ser confirmado pela verificação de uma solicitação exterior mitigadora da culpa. Por sua vez, a unidade de resolução criminosa nem sequer existe no crime continuado, pois o que caracteriza esta figura é precisamente a renovação de tal resolução perante as solicitações externas exercidas sobre o agente. Por isso, sempre que a repetição da conduta criminosa seja devida a uma tendência da personalidade do agente, a quaisquer razões de natureza endógena, que ocorra independentemente de qualquer solicitação externa, ou que decorra de oportunidade provocada ou procurada pelo próprio agente, haverá pluralidade de crimes e não crime continuado». Afastando a continuação criminosa e optando pela punição pelo cometimento de pluralidade de crimes, podem ver-se os acórdãos deste Supremo, de 22-01-2004, processo n.º 4430/03-5.ª, CJSTJ 2004, tomo 1, pág. 179, em caso de furtos qualificados e falsificação de documento (as circunstâncias exteriores invocadas não surgiram por acaso em termos de facilitarem o objectivo tido em vista de modo a arrastarem o arguido para a repetição de condutas, antes foram conscientemente procuradas por ele, o que revela, ao invés, uma inequívoca persistência delituosa, revelando uma manifesta intensidade dolosa que afasta a diminuição da correspondente culpa, reconduzindo-se a actuação do arguido não a um crime continuado, mas antes a um concurso real de crimes); de 22-04-2004, processo n.º 902/04-5.ª, CJSTJ 2004, tomo 2, pág. 165, estando em causa conduta concretizada do arguido com entrada em matas e ateando o fogo, considera-se que a actuação do arguido resultou de uma pluralidade de planos autónomos por si arquitectados, sendo afastado o crime continuado; de 05-12-2007, processo n.º 3989/07-3.ª, onde se refere: “O elemento nuclear e substancial do instituto do crime continuado é a mitigação da culpa resultante de uma situação exógena à vontade do agente que induza ou facilite a repetição da conduta ilícita por parte daquele. Quando os factos revelam que a reiteração criminosa resulta antes de uma predisposição do agente para a prática de sucessivos crimes, ou que estes resultam de oportunidades que ele próprio cria, está evidentemente afastada a possibilidade de subsumir os factos ao crime continuado – ainda que demonstrada a repetição do mesmo crime e a utilização de um procedimento idêntico, num quadro temporal bastante circunscrito – porque se trata então de uma situação de culpa agravada, e não atenuada”; de 01-10-2008, processo n.º 2872/08-3.ª, referindo que sempre que se comprove que a reiteração fique a dever-se a uma certa tendência da personalidade do criminoso, não poderá falar-se numa atenuação da culpa; de 29-10-2008, processo n.º 1612/08-5.ª, CJSTJ 2008, tomo 3, pág. 202, versando prática de furtos, burlas qualificadas e falsificação de documentos, como modo de vida e afastando a continuação quando a actuação corresponde a uma escolha deliberada do arguido, a uma sua predisposição interna para a prática dos factos ilícitos, que inscreve no seu quotidiano como forma de ganhar a vida e de obter rendimentos para custear todas as suas necessidades, não se podendo falar num condicionalismo exterior que, de fora, e com persistência levasse o arguido a cometer os factos; a repetição, sendo hábito ou modo de vida, não atenua, mas agrava a culpa do agente e torna-o mais perigoso do ponto de vista jurídico-criminal; de 05/11/2008, processo n.º 2861/08-3.ª, citando Lobo Moutinho, Da Unidade à Pluralidade dos Crimes no Direito Penal Português, pág. 1226 “A exigência legal de que o agente aja na mesma situação exterior que diminua consideravelmente a culpa significa que aquela tem, além disso, de ser tal que, objectivamente, facilite a execução do facto criminoso ou “prepare as coisas para a repetição” do facto, de modo a afastar do âmbito do instituto do crime continuado aquelas situações em que sejam total ou predominantemente razões endógenas do agente a conduzir ou a “aconselhar” a repetição do facto”; de 13-11-2008, processo n.º 451/07-5.ª, CJSTJ 2008, tomo 3, pág. 224, afastando continuação criminosa em caso de crime de abuso de confiança fiscal e dando por verificada a existência de quatro crimes (em sentido oposto, o acórdão de 04-12-2008, processo n.º 4079/06-3.ª, na mesma CJSTJ, pág. 236); de 19-03-2009, processo n.º 392/09-3.ª, pronunciando-se em caso de burla, refere-se que se o agente concorre para a existência do quadro ou condicionalismo exterior que lhe facilita a acção está a criar condições de que não pode aproveitar-se para que possa dizer-se verificada a figura legal da continuação criminosa, citando os acórdãos do Supremo Tribunal de Justiça de 10-12-1997 (supra referido), de 07-03-2001 e de 12-06-2002 , in SASTJ, n.ºs 49 e 62; No acórdão de 14-05-2009, processo n.º 36/07-5.ª, pode ler-se: “há que distinguir entre a reiteração criminosa que resulta de uma situação externa que subsiste ou se repete sem que o agente para tal contribua e aquela que resulta de uma situação procurada, provocada ou organizada pelo próprio agente. Neste segundo caso, são obviamente razões endógenas que levam à reiteração criminosa e portanto não existe atenuação da culpa, antes uma culpa agravada, estando pois excluído o crime continuado”. Mais recentemente, cfr. acórdão de 18-03-2010, processo n.º 175706.5JELSB-5.ª
Para Paulo Albuquerque, in Comentário do Código Penal, Universidade Católica Editora, 2010, pág. 159, o crime continuado consiste numa unificação jurídica de um concurso efectivo de crimes que protegem o mesmo bem jurídico, fundada numa culpa diminuída, sendo seus pressupostos a realização plúrima de violações típicas do mesmo bem jurídico; a execução essencialmente homogénea das violações e o quadro de solicitação do agente que diminui consideravelmente a sua culpa. A diminuição sensível da culpa supõe a menor exigibilidade de conduta diversa do agente e só tem lugar quando a ocasião favorável à prática do crime se repete sem que o agente tenha contribuído para essa repetição. Isto é, quando a ocasião se proporciona ao agente e não quando ele activamente a provoca. No caso de o agente provocar a repetição da ocasião criminosa – se ele procura de novo a vítima - não há diminuição sensível da culpa – ibidem, nota 29, pág. 162. Ao invés, a culpa pode até ser mais grave, por revelar firmeza e persistência do propósito criminoso.
Revertendo ao caso concreto.
O acórdão recorrido, a fls. 8155-6, afastou a possibilidade de recondução das condutas praticadas a um quadro de uma única resolução subsumível a final à prática de um único crime, mas adiantando ser possível ponderar que, em abstracto, não se encontrava afastada a possibilidade de a arguida ter agido num quadro de continuação criminosa relativamente a alguns dos crimes. E na sequência diz o acórdão: «Tomando por referência as considerações supra expendidas no confronto com o que se provou, entendemos, desde logo, que não nos encontramos no quadro de uma única resolução subsumível a final à prática pelos arguidos AA e BB de um único crime, parecendo-nos inequívoco, por outra parte, atendendo a que nos encontramos perante a violação do mesmo bem jurídico, que, em abstracto, não se encontra afastada a possibilidade dos arguidos terem agido num quadro de continuação criminosa relativamente a alguns dos crimes. No que concerne à conduta da arguida AA, importa notar não se poder afirmar que os crimes perpetrados relativamente a cada um dos ofendidos foram determinados no quadro da solicitação de uma mesma situação exterior que diminua consideravelmente a culpa daquela. Outrossim, entendemos que tais crimes foram perpetradas e facilitados no quadro dum esquema complexo montado pela própria arguida com vista a defraudar não apenas um mas vários e todos os ofendidos cujo “investimento” pudesse captar, utilizando para o efeito não só a agência que montou para tal efeito (I...) mas igualmente as pessoas a que recorreu para captar tais investimentos. Não se pode assim concluir que a arguida tenha sido arrastada para a prática de tais crimes por uma circunstância exógena que não lhe seja imputável e que diminua consideravelmente a sua culpa mas antes que a mesma captou as poupanças dos vários ofendidos de acordo com o plano que traçara e sem prejuízo de renovar as suas resoluções criminosas em cada momento. Não nos repugna, no entanto, considerar que a arguida possa já ter actuado num quadro exterior de continuidade, no que concerne à sua actuação plúrima relativamente a cada um dos ofendidos ou grupo de ofendidos, susceptível de ter diminuído de forma considerável a sua culpa. Considerando ser inequívoco que a realização do(s) primeiro(s) negócio(s) foi (foram) tornando cada vez mais facilitada a actuação da arguida, até pela insistência dos próprios ofendidos em realizarem novos negócios que supunham serem de excelência, tendo-se formado um certo acordo através da primeira actividade criminosa entre a arguida AA e aqueles, que a lançou de forma quase irresistível para celebração de novos negócios, inclusive de forma a encobrir os anteriores e manter a fachada.»
Vejamos.
Como vimos, a arguida foi condenada por trinta e seis crimes de burla qualificada, todos eles na forma continuada, muito embora na fundamentação se tivesse considerado a possibilidade de tal qualificação apenas relativamente a alguns deles. Numa primeira aproximação, há que dizer que é de afastar a continuação criminosa em casos em que patentemente houve apenas uma acção, em que de todo não é possível um tal enquadramento, que pressupõe multiplicidade de condutas. Em dezasseis episódios dados por provados teve lugar apenas uma transacção, um único negócio, ou melhor, proposta de negócio, ou mais exactamente, um negócio fictício. Em todos estes casos, estamos perante uma só conduta, isolada, autónoma, independente, sem qualquer elo que as conecte entre si ou com as demais. Aqui não há pluralidade de acções, que acontecerá apenas nos casos em que a arguida efectuou mais de um contacto comercial, espaçado no tempo, em sucessão, de degrau em degrau, no seguimento de outros anteriores com os mesmos ofendidos, determinando novos contactos, novas propostas de negócio, a determinarem novas entregas em numerário ou cheques. São casos de acção única, isolada, não repetida, os relacionados com os seguintes ofendidos, que no dispositivo estão alinhados, respectivamente, sob os n.º s 7, 10, 11, 12, 16, 17, 18, 19, 21, 22, 25, 27, 28, 29, 33 e 34: - RR - factos provados n.º s 160 a 171 – Pretensa aquisição, em 5-05-2006, de dois apartamentos em Leiria, tendo pago € 40 800,00. - VV – factos provados n.º s 204 a 215 – Pretensa aquisição de um apartamento na Praia da Rocha, pelo preço de € 13.900,00, pago pelo lesado no início do mês de Maio de 2006. - XX – factos provados n.º s 216 a 229 - Pretensa aquisição de um apartamento tipo T3, sito em Buarcos, Figueira da Foz, pelo preço de € 28.180,00, tendo o lesado no dia 18-05-2006 entregue à arguida a quantia exigida, através dos cheques de € 10.000,00, € 10.000,00 e € 8.180,00. - EEE – factos provados n.º s 298 a 302 – Pretensa aquisição de um automóvel Audi A4 1.9 de 2004, com cerca de 70.000 km, por valor não inferior a € 20.000,00, tendo pago cheque no valor de € 3.980,00, sem que a viatura tenha sido entregue. - ZZ - factos provados n.º s 230 a 237 – Pretensa aquisição em finais de Abril de 2006, de 5 apartamentos, por que pagou € 52.030,00. - FFF – factos provados n.º s 303 a 312 - Pretensa aquisição em 16 de Maio de 2006 de apartamento por € 24.800,00, tendo o lesado entregue dois cheques, cada um no valor de € 12.400,00. - GGG – factos provados n.º s 313 a 322 – Após ter comprado um veículo de marca Audi pelo valor aproximado de € 17.000,00, o qual lhe foi entregue sem que se verificasse qualquer problema, em Maio de 2005, pretendeu a aquisição de um apartamento T3, sito na Rua Calouste Gulbenkian, em Coimbra, pelo preço de € 28.312,00, tendo pago tal quantia à arguida através de cheque. - HHH – factos provados n.º s 323 a 329 - Em causa pretensa aquisição em Fevereiro de 2005, de um apartamento T2, com garagem, em Coimbra, junto ao Continente, pela quantia de € 25.000,00, paga em numerário, entregando ainda a quantia de € 7.975,00 que se destinava às despesas com a escritura. - JJJ – factos provados n.º s 339 a 350 – Após a aquisição em 2005 de um Audi por € 14.000,00, tendo o negócio decorrido com toda a normalidade, foi proposta a aquisição de um apartamento na Praia da Vieira de Leiria, pelo preço de € 15.000,00, que o ofendido pagou em numerário, tendo mais tarde, em Julho de 2005, o ofendido procedido a pagamento de despesas com a escritura de apartamentos através de cheque na quantia de € 31.900,00, tendo recebido 23.925,00. - KKK - factos provados n.º s 351 a 354 – Proposta a aquisição em 2004 de uma moradia sita na Barosa, em Leiria, pelo valor de € 6.000,00, preço que pagou. - NNN e OOO – factos provados n.º s 387 a 408 – Pretensa aquisição de um T3 em Porto de Mós, um T3 em Loulé e um T3 em Tavira, tendo pago ambos, em Maio de 2006, a quantia de € 64.800,00. - QQQ - factos provados n.º s 421 a 432 – Pretensa aquisição de dois apartamentos por € 28.000,00 e 11.056,00, pagos em 13-12-2005. - RRR – factos provados n.º s 433 a 441 - Proposta a aquisição de um apartamento tipo T3, que a arguida dizia situar-se em Sete Rios, Lisboa, pelo preço de € 58.100,00, que o ofendido pagou com cheque. - SSS – factos provados n.º s 442 a 451 – Pretensa aquisição de um apartamento T3, pelo valor de € 75.000,00, na baixa de Cascais, tendo a lesada em 13-05-2003 (de 2005, obviamente, face ao contexto), entregue à arguida, a quantia de € 17.300,00 em numerário e ainda a quantia de € 57.700,00, através de cheque. - XXX – factos provados n.º s 495 a 508 – Proposta a aquisição do que a arguida disse ser um apartamento tipo T3, sito na zona do Calhau, na Nazaré, pelo preço de € 70.000,00, o ofendido fez a entrega da quantia de € 15.000,00, no dia 8 de Fevereiro de 2006, através de cheque. - ZZZ – factos provados n.º s 509 a 521 – Proposta a aquisição de um apartamento do tipo T3, sito na Avenida Marquês de Pombal, na cidade de Leiria, pelo preço de € 60.000,00, a ofendida pagou a quantia de € 22.500,00, a título de sinal, entregando, em 16 de Fevereiro de 2006, a referida quantia, através de cheque.
Conclui-se, assim, que nos precedentes dezasseis casos, em que teve lugar apenas uma acção e um só resultado, um único negócio fictício, estamos perante dezasseis crimes de burla qualificada, em concurso real, fora do quadro de crime continuado.
Versando agora a globalidade dos crimes de burla qualificada cometidos é de assentar em que não é possível a pretendida redução à unidade, bem como, por outro lado, não é de confirmar a figura da continuação criminosa nos restantes vinte casos, em que tiveram lugar duas ou mais operações, duas ou mais supostas vendas de veículos automóveis ou de apartamentos ou moradias, a diferentes compradores ou grupos de compradores. Como bem refere o acórdão de Leiria, a fls. 8158, arrancando do que ficou assente nos pontos de factos provados n.º s 636/7, “Resulta dos factos provados que a arguida AA montou uma estrutura que lhe permitia abordar clientes interessados na aquisição de viaturas, mas principalmente imóveis, a quem iludia com a promessa de lucro garantido e rápido, dado o reduzido preço de venda dos bens, fazendo crer que os bens estavam penhorados e eram alvo de processos executivos e que, nalguns casos, dada a sua actividade de solicitadora de execução e proprietária de uma agência imobiliária, com bons contactos, junto de bancos, empresas de leasing e no Tribunal, conseguia impedir a venda judicial, proporcionando aos clientes a sua aquisição pelo valor da dívida. Sendo que para dar a toda esta encenação um aspecto verosímil, arrendou um espaço onde instalou um escritório, criando uma empresa imobiliária denominada “I...”, sem que para tanto estivesse licenciada. E sem que tivesse quaisquer outros rendimentos”. Na verdade, resulta do conjunto dos factos provados que a arguida rodeou-se de uma organização que pretendia aparentar credibilidade, através de montagem do que parecia ser uma agência imobiliária, com colaboradores que contactassem pessoas interessadas em investir em negócios muito favoráveis, não sendo despiciendo considerar que em alguns casos em que tiveram lugar várias operações, o primeiro contacto com o cliente, tendo por objecto veículos automóveis, foi positivo para o interessado, decorrendo o negócio sem incidentes, com normalidade, ganhando o interessado ânimo face ao sucesso da primeira intervenção, à credibilidade da primeira vez, como se verteu no ponto 5 dos factos provados e mais concretamente se assentou nos pontos de facto provados n.ºs 18, 313, 316, 343 e 523. Há que ter em conta que a “actividade negocial” da arguida se prolongou por cerca de vinte meses, tendo, inclusive, a sindicância da sua conduta nesse período extravasado o âmbito do presente processo, pois que, por factos cometidos em 4-10-2005, coevos, pois, dos aqui julgados, e com os quais se encontra em concurso real, foi sancionada por prática de burla qualificada, no processo n.º 76/07.0JALRA, do 2.º Juízo de Leiria, em pena de prisão, que, aliás, ora cumpre. Ao longo desse não curto período, a arguida contactou e conseguiu levar ao engano, nada menos, nada mais, do que quarenta e duas pessoas (embora - reconheça-se - tratar-se de cidadãos abonados, em termos económicos, sequiosos de bons negócios, com expectativas de efectuar bons e proveitosos investimentos, de alcançarem boas e lucrativas novas oportunidades, em determinados nichos de mercado, de conseguirem rápidos retornos do capital investido, aproveitando, propondo-se aproveitar, a desgraça de outros seus concidadãos, mutuários inadimplentes de empréstimos bancários, com dívidas por solver e bens penhorados, inclusive da própria habitação, pelo que, com toda a franqueza, terá aqui pleno cabimento o aforismo popular, que diz que, “à fome se junta a vontade de comer”), mas, tendo de defrontar e resolver, o que fez, a contento, pelo menos momentâneo, alguns afrontamentos de clientes, não muito convencidos com a eficácia da sua actuação, face à ausência de resultados palpáveis, como a entrega da chave do apartamento, e daí, a justificação para algumas das devoluções parciais, que abordaremos infra. De cada vez que surgia um novo cliente, renovava-se a resolução criminosa, colocando-se a questão de modo diferente nas situações em que alcançado o primeiro negócio com êxito para os seus interesses, de pronto a arguida, face ao mesmo cliente, arrancava para novas propostas, outros negócios, que eram aceites pelos “caçadores de pechinchas”, sendo a este nível ilustrativo o que se passou, por exemplo, com AAAA e MMM, entre 31-01-2005 e 06-05-2005 - factos provados n.º s 522 a 571. Da facticidade assente não resulta que a arguida tenha actuado ao abrigo de um condicionalismo exterior, que lhe tenha facilitado a acção, a repetição da actividade criminosa por si levada a cabo e que por isso tenha diminuído a culpa. Diferentemente, o que resulta é que foi sempre a arguida que abordou, directamente, ou através de colaboradores, os potenciais clientes, sugeriu negócios, convencendo-os de que os mesmos se teriam de fechar muito rapidamente, no máximo em 2 ou 3 dias (v. g., pontos de factos provados n.º s 209, 220, 300, 306, 346, 438, 504), preferindo entregas em numerário, fazendo crer que propiciava bons investimentos, oferecendo preços convidativos, e projectando possibilidade de lucros significativos. Perante cada novo cliente, a arguida tinha de fazê-lo acreditar nas suas explicações, na sua condição de proprietária de uma imobiliária e de solicitadora de execução, e que por esse motivo, tinha contacto com processos de execução, onde estavam penhorados os bens oferecidos a negócio. De cada vez que actuava, tinha de fazer crer que os bens oferecidos a negócio estavam penhorados e que poderiam ser adquiridos antes da venda judicial, pagando o interlocutor apenas o valor da dívida exequenda; tinha de o convencer de que tinha bons contactos nos tribunais, junto de bancos e empresas de leasing, e que graças a esses privilegiados contactos, conseguia transaccionar os bens a valor inferior ao do mercado. A cada nova oportunidade de encaixe financeiro, a arguida renovava a resolução criminosa, tinha de engendrar um esquema que conduzisse o potencial cliente ao logro, de modo a arrecadar as várias quantias monetárias, sem qualquer elemento exógeno ou exterior que diminua ou mitigue a sua culpa. Pelo contrário, a própria arguida contribuiu para a repetição, provocou a emergência de situações novas, que foram desejadas, procuradas, queridas. A cada novo momento propício, renascia o propósito criminoso, desencadeando a arguida uma nova acção, dirigida a uma nova perspectiva de negócio, a uma nova oportunidade de negócio, mostrando-se insaciável na demanda de novos clientes, de captação de novos investidores. As razões que conduziram à repetição criminosa foram, pois, sempre endógenas e não exteriores. Como refere Eduardo Correia, Direito Criminal, II, pág. 209, essencial à continuação criminosa será, verdadeiramente, a existência de uma relação que, de fora, e de maneira considerável, facilitou a repetição da actividade criminosa, tornando cada vez menos exigível ao agente que se comporte de maneira diferente, isto é, de acordo com a norma. Concluindo.
É de afastar a possibilidade de redução à unidade, considerado o ilícito global, isto é, a redução a um único crime de burla qualificada, mantendo-se a qualificação do acórdão recorrido, enquanto considera a existência de um concurso efectivo de trinta e seis crimes de burla qualificada. Por outro lado, é de afastar a qualificação como continuação criminosa. Desde logo, a solução é evidente, relativamente aos supra apontados dezasseis casos, por estar em causa, em cada um deles, uma única acção, um único comportamento, uma única abordagem negocial, e a continuação criminosa pressupor uma pluralidade/multiplicidade de infracções. E no que concerne aos restantes vinte casos, é igualmente de afastar a figura, considerando-se que na repetição da conduta face a cada um dos lesados, ou grupos de lesados, esteve na sua base uma resolução que teve uma execução sucessiva, desencadeada, propiciada, “justificada”, não só pelo suposto sucesso do anterior negócio, mas também devido ao “afinco” posto nos contactos pela arguida, ou seja, estamos perante vinte crimes de burla qualificada, em regime de trato sucessivo.
III Questão – Medida das penas parcelares
A recorrente apenas foca a sua divergência neste plano relativamente às penas aplicadas pelos crimes de burla qualificada, e de entre estes, convoca apenas dois casos, como exemplos de excesso de pena “absolutamente desajustadas”, concretamente nos casos em que são ofendidos GGG e EEE, constantes, respectivamente, dos pontos 18 e 16 do dispositivo. Nos trinta e seis casos de burlas a conduta da arguida foi qualificada como cabendo no n.º 2 do artigo 218.º do Código Penal, na esmagadora maioria nas alíneas a) e b), estando, pois, em causa as qualificativas de valor consideravelmente elevado e o facto de fazer da burla modo de vida, com excepção dos casos em que são ofendidos OO, VV, EEE, JJJ, KKK e XXX, constantes dos números 5, 10, 16, 21, 22 e 33 do dispositivo, em que a qualificação é feita apenas pela alínea b).
Estando presente na maioria dos casos a qualificativa de “valor consideravelmente elevado”, por força da alínea a) do n.º 1 do artigo 218.º do Código Penal, há que atender às definições legais de valor constantes do artigo 202.º, alíneas a) e b) do mesmo Código. Sabendo-se que no triénio 2004 a 2006 o valor da unidade de conta (UC) era de € 89,00, teremos que, à data da prática dos factos, “valor elevado” era o que excedesse € 4.450,00 e “valor consideravelmente elevado” o que excedesse € 17.800,00.
A moldura cabível ao crime de burla qualificada, atento o disposto no artigo 218.º, n.º 2, do Código Penal, na redacção dada pelo Decreto-Lei n.º 48/95, de 15 de Março – os factos ocorreram até Maio de 2006, sendo inaplicável a redacção introduzida pela Lei n.º 59/2007, de 04-09 – é de prisão de 2 a 8 anos.
Dentro desta moldura funcionam todas as circunstâncias que, não fazendo parte do tipo de crime, deponham a favor ou contra o agente, designadamente: - O grau de ilicitude do facto, o modo de execução deste e a gravidade das suas consequências, bem como o grau de violação dos deveres impostos ao agente; - A intensidade do dolo ou da negligência; - Os sentimentos manifestados no cometimento do crime e os fins ou motivos que o determinaram; - As condições pessoais do agente e a sua situação económica; - A conduta anterior ao facto e a posterior a este, especialmente quando esta seja destinada a reparar as consequências do crime; - A falta de preparação para manter uma conduta lícita, manifestada no facto, quando essa falta deva ser censurada através da aplicação da pena.
Após defender a opção por pena de prisão, afastando a de multa, prevista em alternativa nos casos dos crimes de abuso de confiança e de falsificação, diz o Colectivo de Leiria na fundamentação da determinação da medida das penas, a fls. 8169 a 8171: Desde logo, importa ponderar que a arguida tem antecedentes criminais, tendo sido condenada anteriormente pela prática de outros crimes contra o património em penas não privativas da liberdade, não tendo tais condenações sido suficientes para evitar o cometimento de novos crimes. O que faz elevar, em concreto, as exigências de prevenção especial, designadamente na prevenção da reincidência. Importando, por outra via, ponderar que o numero e a gravidade de crimes cometidos pela arguida, exigem ao nível da prevenção geral positiva a opção por pena de prisão, de forma a garantir em termos mínimos as expectativas comunitárias, no que concerne à manutenção da validade da norma violada. Tudo para demonstrar que a opção por penas de prisão se revela também adequada relativamente aos crimes que admitem pena de multa. Sem prejuízo de relevar em beneficio da arguida a circunstância de algumas das quantias terem acabado por ser devolvidas a alguns dos ofendidos embora com o sacrifício de terceiros».
Analisando os pontos concretos focados pela recorrente.
No ponto 18 do dispositivo consta a pena aplicada pela burla de que foi vítima GGG, a que corresponde a descrição factual constante dos n.ºs 313 a 322 dos factos provados, estando em causa pretensa aquisição de apartamento, por que o lesado pagou € 28.312,00. Por tal crime foi aplicada a pena de 5 anos e 3 meses de prisão. Considera a recorrente que a pena nunca deveria exceder os 2 anos e 7 meses, à semelhança da que foi aplicada no crime em que foi condenada relativamente ao ofendido HHH, constante do ponto 19 do dispositivo. No caso deste ofendido, segundo a narrativa factual constante dos n.º s 323 a 329, por pretensa aquisição de um apartamento pagou o mesmo € 25.000,00, tendo desembolsado mais € 7.975,00 de despesas. Efectivamente, estando em causa duas condutas muito similares e sendo muito próximos os valores entregues por um e outro dos ofendidos não se justificará que a pena de um seja mais do dobro da do outro. A explicação poderá estar na posição tomada no acórdão em colocar “valor acrescentado” na burla de foi vítima GGG. A fls. 8146/7, ao debruçar-se sobre o caso dos ofendidos DDDDD (factos provados n.º s 615 a 618) e FFFFF (factos provados n.º s 619 a 625), considera o Colectivo de Leiria não resultar que tivessem realizado os negócios directamente com a arguida. (Em ambos os casos pela pretensa aquisição de um apartamento em Coimbra, em 27-06-2005, foram entregues dois cheques, no valor de € 40.000,00, cada). Prossegue o acórdão, afirmando: “Outrossim resulta que tais negócios foram realizados entre o ofendido GGG e a arguida AA, não se tendo provado sequer que os pagamentos efectuados por aqueles se destinassem a ser entregues directamente à arguida mas sim que o ofendido GGG depositou tais quantias na sua própria conta, negociando as compras em causa directamente com a arguida AA e pagando com um cheque seu. Tudo para concluir que relativamente a tais ofendidos não se verificam dois crimes de burla adicionais mas que ao invés a factualidade a eles respeitante reporta-se à prática do crime continuado (nos termos que supra se referirão) referente ao ofendido GGG”. Ora, vista a matéria de facto respeitante a estes dois ofendidos, constante dos n.º 615 a 618 e 619 a 625, o que se retira é que o citado GGG depositou o dinheiro entregue na sua conta, não se justificando vê-lo como um lesado de valor acrescido. Sendo assim, justifica-se intervenção correctiva, reduzindo a pena aplicada por este crime visado no ponto 18 do dispositivo, para dois anos e sete meses de prisão.
Versando agora a pena aplicada no ponto 16 do dispositivo referente ao crime de que foi vítima EEE, um dos casos em que funciona apenas a alínea b) do n.º 2 do artigo 218.º do Código Penal. Como se colhe dos factos provados n.º s 298 a 302, em causa está a pretensa aquisição de um Audi A 4 por € 3.980,00. Considerando que está em causa um valor que não atingia o patamar de “valor elevado”, entende-se ser de reduzir a pena de dois anos e quatro meses para dois anos de prisão. Procede assim o pedido da recorrente neste segmento.
IV Questão - Medida da pena conjunta
A recorrente pretende redução da pena conjunta, dizendo que a admitir-se a condenação nos termos explanados no acórdão, nunca o cúmulo das penas parcelares a aplicar deveria ser superior a 10 anos de prisão. Como vimos o Exmo. PGA no parecer emitido, opinou no sentido de a pena única não ultrapassar os doze anos de prisão. * Estabelece, quanto a regras de punição do concurso de crimes, o artigo 77.º, n.º 1, do Código Penal, na redacção do Decreto-Lei n.º 48/95, de 15 de Março, inalterado pela Lei n.º 59/07, de 4 de Setembro, e pelas seguintes alterações que “Quando alguém tiver praticado vários crimes antes de transitar em julgado a condenação por qualquer deles é condenado numa pena única. Na medida da pena são considerados, em conjunto, os factos e a personalidade do agente”. E nos termos do n.º 2, a penalidade, a moldura do concurso, a pena aplicável tem como limite máximo a soma das penas concretamente aplicadas aos vários crimes, não podendo ultrapassar 25 anos tratando-se de pena de prisão e 900 dias tratando-se de pena de multa; e como limite mínimo a mais elevada das penas concretamente aplicadas aos vários crimes. A medida da pena unitária a atribuir em sede de cúmulo jurídico reveste-se de uma especificidade própria. Por um lado, está-se perante uma nova moldura penal, mais ampla, abrangente, com maior latitude da atribuída a cada um dos crimes. Por outro, tem lugar, porque se trata de uma nova pena, final, de síntese, correspondente a um novo ilícito e a uma nova culpa (agora culpa pelos factos em relação), uma específica fundamentação, que acresce à decorrente do artigo 71.º do Código Penal. Constitui posição sedimentada e segura neste Supremo Tribunal de Justiça a de nestes casos estarmos perante uma especial necessidade de fundamentação, na decorrência do que dispõem o artigo 71.º, n.º 3, do Código Penal, e os artigos 97.º, n.º 5 e 375.º, n.º 1, do Código de Processo Penal, em aplicação do comando constitucional ínsito no artigo 205.º, n.º 1, da CRP, onde se proclama que “As decisões dos tribunais que não sejam de mero expediente são fundamentadas na forma prevista na lei”. Maia Gonçalves, in Código Penal Anotado e Comentado, 15.ª edição, pág. 277, salientava que “na fixação da pena correspondente ao concurso entra como factor a personalidade do agente, a qual deve ser objecto de especial fundamentação na sentença. Ela é mesmo o aglutinador da pena aplicável aos vários crimes e tem, por força das coisas, carácter unitário”. No que concerne à determinação da pena única, deve ter-se em consideração a existência de um critério especial na determinação concreta da pena do concurso, segundo o qual serão considerados, em conjunto, os factos e a personalidade do agente, o que obriga a que do teor da sentença conste uma especial fundamentação da medida da pena do concurso. E no § 421, págs. 291/2, acentua o mesmo Autor que na busca da pena do concurso, “Tudo deve passar-se como se o conjunto dos factos fornecesse a gravidade do ilícito global perpetrado, sendo decisiva para a sua avaliação a conexão e o tipo de conexão que entre os factos concorrentes se verifique. Na avaliação da personalidade – unitária – do agente relevará, sobretudo, a questão de saber se o conjunto dos factos é reconduzível a uma tendência (ou eventualmente mesmo a uma «carreira») criminosa, ou tão só a uma pluriocasionalidade que não radica na personalidade: só no primeiro caso, já não no segundo, será cabido atribuir à pluralidade de crimes um efeito agravante dentro da moldura penal conjunta”. Acrescenta ainda: “ De grande relevo será também a análise do efeito previsível da pena sobre o comportamento futuro do agente (exigências de prevenção especial de socialização)”. Como refere Cristina Líbano Monteiro, A Pena «Unitária» do Concurso de Crimes, Revista Portuguesa de Ciência Criminal, ano 16, n.º 1, págs. 151 a 166, o Código rejeita uma visão atomística da pluralidade de crimes e obriga a olhar para o conjunto – para a possível conexão dos factos entre si e para a necessária relação de todo esse bocado de vida criminosa com a personalidade do seu agente, estando em causa a avaliação de uma «unidade relacional de ilícito», portadora de um significado global próprio, a censurar de uma vez só a um mesmo agente. A pena conjunta tenderá a ser uma pena voltada para ajustar a sanção - dentro da moldura formada a partir de concretas penas singulares – à unidade relacional de ilícito e de culpa, fundada na conexão auctoris causa própria do concurso de crimes. Cremos que nesta abordagem, há que ter em conta os critérios gerais da medida da pena contidos no artigo 71.º do Código Penal – exigências gerais de culpa e prevenção – em conjugação, a partir de 1-10-1995, com a proclamação de princípios ínsita no artigo 40.º, atenta a necessidade de tutela dos bens jurídicos ofendidos e das finalidades das penas, incluída a conjunta, aqui acrescendo o critério especial fornecido pelo artigo 77.º, n.º 1, do Código Penal - o que significa que o específico dever de fundamentação de aplicação de uma pena conjunta, não pode estar dissociado da questão da adequação da pena à culpa concreta global, tendo em consideração por outra via, pontos de vista preventivos, passando pelo efectivo respeito pelo princípio da proporcionalidade e da proibição do excesso, que deve presidir à fixação da pena conjunta, tornando-se fundamental a necessidade de ponderação entre a gravidade do facto global e a gravidade da pena conjunta. Como referimos nos acórdãos de 23-11-2010, processo n.º 93/10.2TCPRT.S1, de 24-03-2011, processo n.º 322/08.2TARGR.L1.S1 e de 13-04-2011, processo n.º 918/09.5JAPRT-5.ª “A determinação da pena do concurso exige um exame crítico de ponderação conjunta sobre a conexão e interligação entre todos os factos praticados e a personalidade do seu autor, de forma a alcançar-se a valoração do ilícito global e entender-se a personalidade neles manifestada, de modo a concluir-se pela motivação que lhe subjaz, se emergente de uma tendência para delinquir, ou se se trata de pluriocasionalidade não fundamentada na personalidade, tudo em ordem a demonstrar a adequação, justeza, e sobretudo, a proporcionalidade, entre a pena conjunta a aplicar e a avaliação conjunta daqueles dois factores. Com a fixação da pena conjunta não se visa re-sancionar o agente pelos factos de per si considerados, isoladamente, mas antes procurar uma “sanção de síntese”, na perspectiva da avaliação da conduta total, na sua dimensão, gravidade e sentido global, da sua inserção no pleno da conformação das circunstâncias reais, concretas, vivenciadas e específicas de determinado ciclo de vida do(a) arguido(a) em que foram cometidos vários crimes, em espaço temporal curto”. Em discussão a questão de saber se pode ou não haver um duplo aproveitamento na mensuração da pena parcelar e depois na pena conjunta.
As circunstâncias do caso em apreciação apresentam um acentuado grau de ilicitude global, manifestado no número, na natureza e gravidade dos crimes praticados, na variedade de bens jurídicos violados, com realce para a burla. No caso presente não se descortina uma próxima conexão ou estreita ligação entre os 36 crimes de burla qualificada e os restantes. Sendo uma das finalidades das penas, incluindo a unitária, a tutela dos bens jurídicos, definindo a necessidade desta protecção os limites daquelas, há que, necessariamente, ter em atenção o bem jurídico tutelado nos tipos legais em causa no caso em apreciação, de natureza bem diferenciada. O conjunto de ilícitos abarca condutas violadoras do património em geral, como na burla, em que o bem jurídico protegido pela incriminação é o património de outra pessoa que numa concepção jurídico-económica inclui todos os direitos, as posições jurídicas e as expectativas com valor económico compatíveis com a ordem jurídica, a propriedade de coisa móvel no crime de abuso de confiança, a segurança e credibilidade na força probatória de documento destinado ao tráfico jurídico. No contexto global do concreto caso os crimes de burla qualificada praticados pela arguida assumem um peso específico no ilícito global, contribuindo com um somatório que atinge os 137 anos de prisão. A arguida procedeu a algumas devoluções das quantias indevidamente recebidas, porque pressionada por alguns dos ofendidos e com receio que a notícia do embuste se espalhasse, mas fazendo-o com numerário e cheques entregues por outros lesados, o que afasta a possibilidade de consideração de reparação das consequências do crime, nos termos do artigo 71.º, n. 2, alínea e), ou artigo 72.º, n.º 2, alínea c), mas já não do artigo 206.º (na redacção anterior à reforma de 2007), todos do Código Penal. Assim a arguida devolveu a quantia total de € 221.133,00 aos ofendidos II e JJ, com entregas de numerário e de cheques de terceiros - facto provado n.º 41. Aos ofendidos KK e LL a arguida devolveu a quantia de € 143.800,00, conforme factos provados n.º s 65 e 66, sendo algumas parcelas com cheques dos ofendidos MM (factos provados n.ºs 66 e 80) e de OO (factos provados n.ºs 66, 118 e 120). A BBB e CCC, ambos com investimento global de € 1.124.822,00, porque pressionada pelos mesmos a arguida devolveu - facto provado n.º 291 - quantia não inferior a € 635.148,00, com cheques emitidos por outros ofendidos, v.g., por AAAA – facto provado n.º 539. A AAAA e MMM, como decorre do ponto de facto provado n.º 570, após muita insistência, a arguida devolveu quantia não inferior a € 150.000,00, para cada um dos ofendidos. Já acima se referiu o modo como o acórdão recorrido versou este ponto, com argumentação que merece concordância.
Decisão
Pelo exposto, acordam na 3.ª Secção do Supremo Tribunal de Justiça em julgar parcialmente procedente o recurso interposto pela arguida AA, reduzindo-se as penas parcelares nos termos supra indicados e reduzindo a pena conjunta, que ora se fixa em onze anos de prisão. Custas pela recorrente, nos termos dos artigos 374.º, n.º 3, 513.º, n.º s 1, 2 e 3 e 514.º, n.º 1, do Código de Processo Penal, na redacção anterior à que lhes foi dada pelo Decreto-Lei n.º 34/2008, de 26 de Fevereiro (objecto de rectificação pela Declaração n.º 22/2008, de 24 de Abril, e alterado pela Lei n.º 43/2008, de 27 de Agosto, pelo Decreto-Lei n.º 181/2008, de 28 de Agosto, pelo artigo 156.º da Lei n.º 64-A/2008, de 31 de Dezembro (Suplemento) e pelo artigo 163.º da Lei n.º 3-B/2010, de 28 de Abril), o qual aprovou – artigo 18.º - o Regulamento das Custas Processuais, publicado no anexo III do mesmo diploma legal, uma vez que de acordo com os artigos 26.º e 27.º daquele Decreto-Lei, o novo regime de custas processuais é de aplicar aos processos iniciados a partir de 20 de Abril de 2009, o que não é o caso, e nos termos dos artigos 74.º e 87.º, n.º 1, alínea a) e n.º 3, do Código das Custas Judiciais, com taxa de justiça de 3 unidades de conta. Consigna-se que foi observado o disposto no artigo 94.º, n.º 2, do Código de Processo Penal.
Lisboa, 22 de Junho de 2011
Raul Borges (Relator) Henriques Gaspar
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