Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça | |||
Processo: |
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Nº Convencional: | JSTJ000 | ||
Relator: | VÍTOR MESQUITA | ||
Descritores: | CONTRATO DE TRABALHO SUBORDINAÇÃO JURÍDICA ENTIDADE PATRONAL ÓNUS DA PROVA SUBCONTRATO FRAUDE À LEI DESPEDIMENTO INTERPRETAÇÃO | ||
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Nº do Documento: | SJ200505040015054 | ||
Data do Acordão: | 05/04/2005 | ||
Votação: | UNANIMIDADE | ||
Tribunal Recurso: | T REL COIMBRA | ||
Processo no Tribunal Recurso: | 1686/03 | ||
Data: | 11/06/2003 | ||
Texto Integral: | S | ||
Privacidade: | 1 | ||
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Meio Processual: | REVISTA. | ||
Decisão: | CONCEDIDA A REVISTA. | ||
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Sumário : | I - A questão de determinar a entidade a quem o trabalhador está laboralmente vinculado não pode ater-se à identificação da entidade patronal em sentido formal (pessoa jurídica que outorga o contrato escrito), exigindo ao intérprete uma análise exaustiva do comportamento das partes na execução do contrato de modo a identificar a entidade sob cujo poder de direcção o trabalhador presta a sua actividade hetero-determinada. II - Estando provados factos demonstrativos de que o A. desenvolveu a sua actividade profissional integrado na estrutura organizativa de uma empresa, a par dos demais trabalhadores denominados "efectivos" desta, e sujeito às ordens, direcção e fiscalização da mesma, deve considerar-se a prestação de trabalho do A. se prestou de forma juridicamente subordinada à mesma e em dessintonia, quer com o que estabeleciam os "contratos de trabalho a termo" sucessivamente celebrados entre o A. e outras sociedades (que identificavam estas como entidade patronal do A. e aludiam na respectivo clausulado à sede das mesmas como local normal de trabalho do A.), quer com os sucessivos "contratos de prestação de serviços" celebrados entre estas sociedades e a sociedade beneficiária da prestação de trabalho do A. (cujo clausulado prescrevia que os trabalhadores encarregados da execução dos serviços pelo segundo outorgante dependerão exclusivamente dele, quer jurídica quer economicamente, recebendo do mesmo as ordens, instruções e informações necessárias à boa prestação do trabalho). III - A subcontratação não pode também constituir um expediente fraudatório, destinado a iludir as normas imperativas de Direito do Trabalho e consubstanciando uma desresponsabilização do empresário principal relativamente a um processo produtivo que se encontrava na sua esfera de direcção e do qual beneficiou de forma que repugna à consciência jurídica. IV - Os negócios jurídicos que permitem a intermediação de terceiras entidades, contrariando normas imperativas, são nulos nos termos do disposto no art. 294º do CC, o que sucede quando se procede ao desdobramento dos vínculos contratuais que formalmente enquadram a prestação de actividade pelo trabalhador para excluir o seu enquadramento num vínculo contratual duradouro materialmente estabelecido entre dois sujeitos sem qualquer vínculo formal entre si, que perdurou entre 1992 e 2000. V - São nulos por fraude à lei, quer os contratos a termo subscritos pelo autor e pelas empresas ditas "subcontratadas", quer os contratos de prestação de serviços subscritos por estas e pelo empresário principal, não produzindo quaisquer efeitos no que diz respeito ao vínculo laboral permanente que se formou entre o autor e o empresário principal (através do exercício estável e continuado da actividade do primeiro de modo juridicamente subordinado ao segundo). VI - Não tem virtualidade extintiva desde contrato por tempo indeterminado o último contrato a termo celebrado (como nenhum dos outros teve), se após a subscrição do mesmo o trabalhador continuou a desenvolver as mesmas funções e no mesmo condicionalismo de subordinação jurídica ao empresário principal, verificando-se que nenhum dos contratos escritos teve qualquer projecção na conformação ou no desenrolar da relação laboral que, entre 1992 e 2000 mantiveram o autor e o empresário principal, a qual permaneceu inalterada para lá dos seus sucessivos inícios e cessações, bem como dos interregnos mais ou menos prolongados em que a prestação de trabalho se manteve sem qualquer contrato escrito com outra entidade. VII - Constitui ónus do trabalhador o de provar os factos constitutivos deste vínculo laboral duradouro, nada mais lhe incumbindo provar, constituindo tarefas de qualificação jurídica que ao tribunal pertencem (art. 664 do CPC) as de saber (se se considerar que tal interessa à composição do litígio) se os contratos a termo consubstanciam contratos de trabalho temporário e se os contratos de prestação de serviços consubstanciam contratos de utilização de trabalho temporário cuja nulidade tem como consequência se considere o trabalho prestado ao utilizador com base num contrato individual de trabalho sem termo. VIII - Não consubstancia um despedimento emitido pelo empresário principal, com a virtualidade de fazer cessar o contrato que o vinculava ao autor, a comunicação efectuada ao autor pela ré com quem celebrou o último denominado "contrato de trabalho a termo", desacompanhada de qualquer outra atitude do empresário principal demonstrativa de que este pretendia fazer cessa o contrato. | ||
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Decisão Texto Integral: | Acordam na Secção Social do Supremo Tribunal de Justiça: 1. Relatório "A", instaurou a presente acção emergente de contrato individual de trabalho com processo comum, contra: - B - Sociedade Portuguesa de Papel, S.A. - C - Construção Civil, Lda., - D - Manutenção e Limpeza Industrial, Lda. e - E - Construção e Prestação de Serviços, Lda., terminando a sua petição inicial com o seguinte pedido: a) se declare que o(s) contrato(s) de trabalho do autor com as 2ª a 4ª rés é (são) contrato(s) de trabalho temporário, em que é utilizadora a ré B; b) se declare que, por as 2ª a 4ª rés não serem possuidoras do respectivo alvará de empresa de trabalho temporário, é (são) nulo(s) o(s) contrato(s) de trabalho do autor com as mesmas; c) se declare que, assim, e por determinação legal, o contrato existente é um contrato sem termo, entre o autor e a ré B; d) se declare que o despedimento do autor é nulo, por não existir justa causa e por não ter sido precedido de processo disciplinar; e) seja condenada a ré B a reintegrar o A. como seu trabalhador, com a categoria de fiel de armazém e as funções e remuneração inerentes, sendo que em momento próprio em sua substituição optou o autor pelo recebimento da indemnização de antiguidade legal; f) seja condenada a ré B a pagar ao A. as diferenças salariais (incluindo de subsídios de férias e de Natal), diferenças de subsidio de turno, diferenças de valor da remuneração horária relativa às horas extraordinárias e ainda as gratificações generalizadas a todos os trabalhadores da B e não pagas ao A., nos montantes, respectivamente, de 6.536.364$00, 72.000$00, 213.871$00 e 1.198.400$00, que perfaz um total de 8.020.635$00; g) seja condenada a ré B a pagar ao autor a importância correspondente às retribuições que o A. deixou de auferir desde 30 dias antes da propositura da presente acção até à data da sentença; h) seja condenada a ré B a-pagar ao autor juros de mora, vencidos e vincendos, à taxa legal, contados desde a data de vencimento de cada uma das diferenças ou prestações em falta, relativos aos últimos cinco anos, e até efectivo embolso. Para tanto, alegou, em síntese: que começou a trabalhar na B através de contrato de trabalho temporário celebrado com a terceira R. que cessou em 22 de Outubro de 1992, continuando o A. na B com as mesmas funções embora formalmente vinculado a uma das segunda a quarta RR., mas recebendo ordens de encarregados da B, sendo nulos os contratos de trabalho a termo certo que celebrou entretanto por se traduzirem em contratos de trabalho temporário e não possuírem as RR. o respectivo alvará, o que tem como consequência considerar-se o trabalho prestado ao utilizador com base em contrato sem termo, constituindo um despedimento ilícito aquele de que foi alvo em 31 de Dezembro de 2000. Alegou, ainda, que ao longo do tempo em que trabalhou para a B auferiu retribuições inferiores às pagas aos demais trabalhadores da B com a categoria profissional correspondente às suas funções, tendo direito a diferenças salariais, de subsídios de férias, de Natal e de turno, horas extraordinárias e gratificações pagas ao comum dos trabalhadores daquela. Notificadas pessoalmente as rés B - Sociedade Portuguesa de Papel, S.A. e E- Construção e Prestação de Serviços, Lda.., e editalmente as rés C - Construção Civil, Lda. e D - Manutenção e Limpeza Industrial, Lda., contestou a primeira por excepção, invocando a prescrição dos eventuais créditos do autor desde a data da cessação dos supostos contratos sem termo e por impugnação, sustentando que não existiram contratos de utilização de trabalho temporário mas contratos de prestação de serviços celebrados entre a B e as outras RR., com excepção do de 1991, que a B nunca utilizou de facto o trabalho do A. mas apenas o resultado do seu trabalho consubstanciado no objecto dos contratos de prestação de serviços celebrados com as outras RR. e que a não renovação do último contrato foi da iniciativa e concretizada pela Ré E. A Ré E- Construção e Prestação de Serviços, Lda. também contestou invocando a sua ilegitimidade e sustentando que ao contrato individual de trabalho por si celebrado com o A. não são aplicáveis as causas de nulidade previstas no DL n.º 358/89, sendo válida a cessação nos termos em que a efectuou dando cumprimento ao disposto no art. 46º do DL n.º 64-A/89 de 27.2. Terminaram ambas pedindo a procedência da defesa por excepção ou, se assim não se entender, a improcedência da acção. O A. respondeu nos ternos de fls. 220-221, defendendo a improcedência das excepções suscitadas. Após a audiência de discussão e o julgamento, e proferida decisão sobre a matéria de facto em litígio (fls. 808 a 810), que não foi objecto de qualquer reclamação, o A. veio a optar pela indemnização por antiguidade em substituição da reintegração (fls. 812). Foi então proferida sentença que julgou a acção procedente e, em consequência: a) declarou que os contratos de trabalho do autor com as 2ª a 4ª rés é (são) contrato(s) de trabalho temporário, em que é utilizadora a ré B; b) declarou que, por as 2ª a 4ª rés não serem possuidoras do respectivo alvará de empresa de trabalho temporário, são nulo o contrato de trabalho do autor com as mesmas; c) declarou que, assim, o contrato existente é um contrato sem termo, entre o autor e a ré B; d) declarou que o despedimento do autor é nulo, por não existir justa causa e por não ter sido precedido de processo disciplinar; e) condenou a ré B a pagar ao autor as diferenças salariais (incluindo de subsídios de férias e de Natal), diferenças de subsídio de turno, diferenças de valor da remuneração horária relativa às horas extraordinárias e ainda as gratificações generalizadas a todos os trabalhadores da B e não pagas ao mesmo, nos montantes, respectivamente, de € 32.603,25 (6.536.364$00); € 359,13 (72.000$00); € 1.066,78 (213.871$00) e € 5.977,94 (1.198.400$00); f) condenou a ré B a pagar ao autor a importância correspondente às retribuições que o autor deixou de auferir desde 30 dias antes da propositura da presente acção até à data da sentença, deduzida das importâncias relativas a rendimentos de trabalho auferidos pelo trabalhador em actividades iniciadas posteriormente ao despedimento, a liquidar em execução de sentença; g) condenou a ré B a pagar a o autor a título de indemnização de antiguidade a quantia de € 7.198,65 (1.443.200$00- 180.400$00 x 8); h) condenou a ré B a pagar ao autor os juros de mora, vencidos e vincendos, à taxa legal, contados desde a data de vencimento de cada uma das diferenças ou prestações em falta, relativos aos últimos cinco anos, e até efectivo embolso. O A. e a Ré B recorreram da sentença para o Tribunal da Relação de Coimbra, vindo este pelo acórdão de fls. 896 e ss. a julgar o recurso interposto pela Ré B procedente, revogando a sentença da 1ª instância e absolvendo esta R. da totalidade dos pedidos contra si formulados, não conhecendo do recurso interposto pelo A.. Desta feita apenas inconformado o A., recorreu de revista para o STJ, terminando as alegações que apresentou com as seguintes conclusões: A) Não houve qualquer coincidência entre o objecto dos contratos (aliás, muitos deles, não assinados) de prestação de serviços entre a B e cada uma das demais RR., por um lado, e as funções reais e efectivas desempenhadas pelo A., por outro lado; B) O autor sempre recebeu ordens da B, por ela eram definidas as suas funções e as tarefas concretas a realizar em cada momento, (designadamente as de motorista), com ela acertava férias, por ela era controlada a sua assiduidade; C) Como tal, sempre o autor foi trabalhador da B, sendo a sua actividade concretizada através de contratos de trabalho temporário com as outras RR., que o cediam à utilizadora B; D) Não tendo essas empresas o respectivo alvará de empresas de trabalho temporário, são tais contratos nulos; E) Da nulidade desses contratos de trabalho temporário e da directa subordinação do A. à Ré B, resulta a sua conversão em contrato de trabalho sem termo directamente com a B, desde 23.10.1992; F) Ainda que, porventura, se não considerem tais contratos como de trabalho temporário, estando provada a directa subordinação do A à Ré B, sempre se tratará de cedência ilegal, do que resulta, igualmente, a sua conversão em contrato de trabalho sem termo, directamente com a B, desde 23.10.1992; G) Como o Acórdão recorrido lucidamente afirma - na sua pág. 19 - Há, assim, que concluir que todo o desempenho funcional do A. se processava à margem de qualquer intervenção das co Rés A. C, Lda, D e E portanto fora do âmbito de execução dos designados "contratos de prestação de serviços" que a recorrente celebrou com essas Rés. H) Não há que distinguir - e a Relação não explica por que razão distingue - entre o último "contrato", assinado pelo trabalhador e pela E, e os demais, uma vez que não ocorre, a partir da data de "início" do mesmo - 1 de Abril de 2000 - qualquer alteração das funções do A. ou da sua subordinação jurídica à B; I) Não existe, portanto, em consequência da assinatura e "início" do mesmo, qualquer ruptura da continuidade ou, sequer, alteração da relação laboral entre o A. e a B; J) Esse "contrato" surge, assim, no mesmo quadro relacional dos anteriores, significando a sua assinatura pelo A. a forma de manter o emprego; L) Em consequência, o mesmo não tem virtualidade extintiva, não podendo operar a cessação do contrato, por tempo indeterminado, que vigorava entre o A. e a B, o qual, portanto, se manteve incólume; M) Sendo de natureza excepcional as normas que permitem a intermediação de terceiras empresas entre o trabalhador e o utilizador da prestação, torna-se evidente que ficou indemonstrada qualquer razão válida, legítima e legal para essa interposição; N) O ónus da alegação e prova de que a intermediação das empresas 2ª, 3ª e 4ª RR. era uma intermediação lícita, cabia às RR., ónus que, manifestamente, não cumpriram; O) Igualmente lhes cabia o ónus da alegação e prova de que com a assinatura do "contrato" com a E teria o A. intenção de fazer cessar o contrato existente que o ligava directamente à B, ónus que, também, manifestamente, não cumpriram; P) Em consequência do exposto, foi ilícito o despedimento do A., sem justa causa nem precedência de processo disciplinar; Q) Ao entender de modo diverso, violou o Tribunal da Relação, entre outras, as normas do art. 342° do Código Civil, arts. 3°, 12° e 13° do D.L. 64-A/89, de 27.2, arts. 4°, 7°, 10°, l6º e 26° do D.L. 358/89, de 17.10; R) E ao admitir a intermediação ou interposição fictícia de terceiras empresas, definindo a natureza dos contratos em função do objecto social das empresas interpostas e não do seu real conteúdo e objectivo, fez uma interpretação das leis de trabalho, designadamente do art. 3° do D.L. 358/89, de 17.10, que viola o princípio constitucional da segurança no emprego, expressamente consagrado no art. 53° da Constituição; S) E ainda, ao admitir essa intermediação ou interposição fictícia de terceiras empresas, aceitando a diferenciação de remuneração do A. em relação aos trabalhadores da B com a mesma função, fez uma interpretação das leis de trabalho, designadamente do art. 19 b) do D.L. 49408, de 24.11.1969, que viola o direito à retribuição do trabalho segundo o princípio de que para trabalho igual salário igual, expressamente consagrado no art. 59º, n° 1 a) da Constituição; T) Quanto à indemnização de antiguidade (questão cuja apreciação pela Relação ficou prejudicada pela decisão ora em revista), a mesma deve corresponder a um mês de remuneração de base por cada ano de antiguidade ou fracção; U) Tendo o A. começado a trabalhar para a B, através de contratos de trabalho temporário inválidos com as outras RR. em 23 de Outubro de 1992 e tendo a sentença sido proferida em 13 de Dezembro de 2002, deveria a indemnização atribuída pela mesma ter sido a correspondente a 11 meses de remuneração de base (dez anos completos e fracção de um ano) segundo o salário de 2002; V) Tendo em conta o Acórdão de Uniformização de Jurisprudência 1/2004, a sentença a que se referem os n.ºs 1 a 3 do artigo 13° do Decreto-Lei 64-A/89, de 27 de Fevereiro, não será necessariamente a de 1ª instância, mas sim aquela - sentença ou acórdão - que venha em definitivo a julgar a ilicitude do despedimento, pelo que deverá o quantum da remuneração de base e a antiguidade ser reportados à data da prolação do acórdão desse Supremo Tribunal. X) Em consequência do exposto, o montante da indemnização de antiguidade a atribuir ao A. deverá ter em conta todo o tempo que venha a decorrer até ser proferido o acórdão, bem como a remuneração que, então, vigore (€ 1.042 mensais, em 2004; 12 anos, neste momento). Z) Ao ter atribuído apenas o valor correspondente a 8 meses, e segundo o salário de 2001, violou a douta sentença recorrida os arts. 13º, n.º 1 do Decreto-Lei 64-A/89 e 663º do CPC, violação que o Tribunal da Relação não fez cessar, prejudicada que ficou tal questão pelo teor da decisão proferida. Sustenta, a final, a revogação do acórdão recorrido, determinando-se a total procedência da acção e apreciando-se a questão objecto da prejudicada apelação do A. da quantificação da indemnização de antiguidade. A recorrida B apresentou contra-alegações suscitando a questão prévia de as alegações terem sido apresentadas fora de prazo e pugnando pela improcedência do recurso de revista e pela manutenção do acórdão proferido na 2ª instância. Requereu ainda nos termos do art. 684º-A do CPC que a excepção de prescrição dos créditos peticionados pelo A. que arguiu na contestação e suscitou no recurso de apelação seja apreciada por este Supremo Tribunal, terminando as suas alegações com as seguintes conclusões: 1 - Verifica-se a pluralidade de fundamentos da defesa da Ré B, ora recorrida; 2 - Esses fundamentos são: a) a excepção da prescrição, em que a recorrida decaiu; b) a impugnação em que a recorrida venceu; 3 - Deste modo, verificam-se os requisitos legais do n.º 1 do art. 684.º-A do CPC para que a recorrida possa requerer, mesmo subsidiariamente, que este Supremo Tribunal conheça da referida excepção da prescrição; 4 - Porque o A. se vinculou em 1 de Abril de 2000 à 4.ª Ré E por contrato dessa data, segue-se que todos os créditos e direitos anteriores a essa data prescreveram em 1 de Abril de 2001, nos termos do art. 38.º do Regime do contrato individual de trabalho; 5 - Isto porque tal prescrição se verificou antes da citação da Ré B que teve lugar em 6 de Abril; 6 - Sendo certo que não aproveita ao A. a interrupção presuntiva prevista no n.º 2 do art. 323º do CC; 7 - É que para se verificar tal interrupção é indispensável que a demora da citação seja por causa não imputável ao A.; 8 - E não foi esse o caso já que o A. só propôs a acção em 30 de Março de 2001, ou seja, na antevéspera da consumação da prescrição em 1 de Abril; 9 - Acresce que, de qualquer forma, a referida interrupção presuntiva só viria a verificar-se depois de decorrerem os 5 dias (n.º 2 do citado art. 323) ou seja, em 4 de Abril de 2001; 10 - E, portanto, irrelevante, por surgir já depois da consumada a prescrição em 1 de Abril; 11 - E, assim, ao não proceder a invocada prescrição forma violados os arts. 38º do Regime Jurídico do contrato individual de trabalho e 323, n.ºs 1 e 2 do Código Civil. 12 - Pelo que deverá este Supremo Tribunal conhecer subsidiariamente da referida prescrição, julgando-a procedente, tudo de harmonia com o n.º 1 do art. 684-A do CPCivil. O A. juntou entretanto um "parecer" (fls. 1016 e ss.) subscrito por ilustres jurisconsultos. A Exma. Procuradora Geral Adjunta emitiu douto Parecer no sentido de que a revista deve ser concedida. Por decisão do Relator de fls. 1076 e verso foi indeferida a questão prévia suscitada pela R., concluindo-se que o acto de apresentação das alegações foi tempestivamente praticado. Colhidos os "vistos" legais, cumpre apreciar e decidir. 2. Fundamentação de facto As instâncias deram como provada a seguinte factualidade, que se aceita por se não verificar fundamento legal para a sua alteração: 2.1. A 1ª ré é uma empresa (sociedade anónima) que se dedica à produção de papel. 2.2. A 2ª ré é uma sociedade comercial por quotas, cujo objecto social consiste na "indústria de construção civil, compra e venda de propriedades". 2.3. A 3ª ré (anteriormente denominada D - Empresa de Cedência de Pessoal da Figueira da Foz, Lda.) é uma sociedade comercial por quotas, hoje sem actividade conhecida, mas cujo objecto social consiste em "actividades de limpeza industrial e manutenção fabril". 2.4.Tendo tido como objecto social, anteriormente, a cedência de pessoal e, até 1994, dispunha do respectivo alvará de empresa de trabalho temporário. 2.5. A 4ª ré é uma sociedade comercial por quotas cujo objecto social consiste na "prestação de serviços na área da construção civil e grandes unidades fabris. Construção civil". 2.6. Empresa recém constituída em 28.03.2000. 2.7. O autor começou a trabalhar na primeira ré a 23 de Outubro de 1991, admitido ao serviço da terceira ré, ao tempo denominada D, Empresa de Pessoal da Figueira da Foz, Lda, por contrato de trabalho temporário, para prestar ao utilizador B, nas suas instalações em Leirosa, Lavos, as funções de motorista. 2.8. Mediante a remuneração inicial de 94.500$00 mensais, aumentada em Janeiro de 1992 para 104.000$00. 2.9. Contrato que cessou em 22 de Outubro de 1992. 2.10. Continuando, porém, o exercício das mesmas funções, na B, recebendo da segunda ré, sem contrato escrito, nem descontos para a previdência, à "hora", num valor médio mensal de 65.000$00. 2.11. Só em 1 de Julho de 1994 a ré C, Lda. fez um contrato escrito com o A. , "a termo certo" em 31.12.1994. 2.12. Com as funções de "indiferenciado", e mediante a remuneração mensal de 72.500$00. 2.13. Que, desde Novembro de 1994, passou a ser de 95.000$00, constando dos recibos a função de "servente". 2.14. Em 1 de Janeiro de 1995 foi assinado novo contrato "a termo certo", válido até 31.3.1995, com a Ré C, Lda. , com a função de servente e pela remuneração mensal de 75.762$00. 2.15. Alteradas em Março, no papel, as funções para "operador" e a remuneração para 93.000$00. 2.16. Que se mantiveram até 31.12.1995, não obstante a assinatura de mais três contratos: de 1.4 a 30.6 (cfr. doc. 10); de 1.7 a 30.9 (cfr. doc. 11) e de 1.10 a 31.12 (cfr. doc. 12, como os demais juntos com a petição inicial). 2.17. Em 1.1.1996 assinou novo contrato com a C, Lda., válido até 30.6, com a remuneração mensal de 96.720$00. 2.18. Que se prolongou mediante novo contrato, agora por dois meses, de 1.7 a 31.8 e outro de 1.9 a 31.12. 2.19. E mesmo sem assinatura de nenhum contrato em Janeiro de 1997, agora com a remuneração de 99.621$00. 2.20. O mesmo trabalho que o A. continuou a exercer, como sempre na B, e pela mesma remuneração mensal de 99.621$00. 2.21. Apesar de assinar um novo contrato, válido de 01.02.1997 a 30.06.1997, agora com a D - Manutenção e Limpeza Industrial, Lda. (que já não se denominava "de cedência de pessoal", porque havia perdido o respectivo alvará). 2.22. Prolongado por dois novos contratos, com iguais funções e remuneração, um de 01.07.1997 a 30.09.1997, e outro de 01.10.1997 a 31.12.1997. 2.23. E, sem mais contratos escritos, com iguais funções e a remuneração de 102.112$00, durante todo o ano de 1998. 2.24. Com alteração da remuneração para 104.870$00, em 01.01.1999. 2.25. E para 120.000$00 de 01.11.1999 a 31.12.1999. 2.26. Em 01.01.2000, sem qualquer alteração contratual, passou a ter a categoria de "fiel de armazém", com alteração da remuneração para 123.000$00. 2.27. Funções e remuneração essas que se mantiveram, bem como o local de trabalho, não obstante a assinatura, em Abril de 2000, de um novo contrato com a ré E, Lda.. 2.28. Contrato, como todos os demais, assinado, em nome da entidade patronal, por F, agora formalmente sócio da nova "empresa". 2.29. Ao longo de todo este lapso de tempo as reais funções do autor foram (pese embora a categoria utilizada nos contratos celebrados) de motorista, recuperador de papel, operador de empilhadores e fiel de armazém. 2.30. Sempre e ininterruptamente exercidas, ainda que de forma alternada, todas elas na B. 2.31. Cujas carrinhas conduzia com frequência, e mesmo diariamente quando em férias e doenças dos motoristas do quadro, que então substituía. 2.32. Onde recuperava o papel. 2.33. E cujos empilhadores manobrava. 2.34. E em cujos balcões, tanto de recepção como de aviamento, trabalhou. 2.35. Até finais de 1999, no armazém geral. 2.36. Passando a fazer, desde Novembro de 1999 - ainda formalmente vinculado à D, Lda. e, desde Abril de 2000, vinculado à E, Lda, de forma mais sistemática e habitual, o aviamento ao balcão, no armazém geral. 2.37. Por carta datada de 11 de Dezembro de 2000 a E comunicou ao A. não pretender renovar o "contrato de trabalho a termo certo" celebrado em 1 de Abril de 2000, pelo que o mesmo caducaria em 31 de Dezembro de 2000. 2.38. Pelo que o A. deixou de trabalhar na B na indicada data de 31 de Dezembro de 2000. 2.39. Durante o tempo que o autor trabalhou na B, recebeu ele ordens quer de um empregado das 2ª e demais rés que ali se encontrava, quer, fundamentalmente, do encarregado de armazém da B, G. 2.40. Bem como de H, fiel de armazém qualificado da B. 2.41. E mesmo, por uma ou outra vez, do Eng. I. 2.42. Sendo estes três últimos que lhe indicavam, directamente, quais os serviços a executar. 2.43. O mandavam conduzir uma das carrinhas da B a fim de ir buscar ou levar qualquer mercadoria. 2.44. Bem como quem determinava, por vezes, a necessidade de o A. realizar horas extraordinárias. 2.45. E também com quem - Sr. G - eram sempre combinadas as férias do autor. 2.46. O que só posteriormente comunicava ao representante da 2ª ou 3ª ré. 2.47. Por várias vezes sucedeu o Sr. G dar ordem ao autor, quando este estava no balcão de aviamento, para ir ajudar na recepção de materiais. 2.48. Ou, quando na mesma situação, para manobrar o empilhador. 2.49. Ou ainda, estando o autor a exercer tarefas na recepção de materiais ou a manobrar o empilhador, o Sr. G o mandava ajudar no balcão de aviamento, por aí estar uma grande fila de funcionários a solicitar o aviamento de requisições. 2.50.Em todas essas funções, sempre o autor trabalhou lado a lado com trabalhadores efectivos da B. 2.51. Exercendo as mesmas funções que eles. 2.52. Quer na condução das carrinhas, também conduzidas por efectivos da B, quer dentro do armazém. 2.53. Isto tanto na recepção de bens. 2.54. Como no fornecimento de bens a funcionários de outros sectores de produção, que os solicitavam ao armazém. 2.55. Até finais de 1998, o autor era, na área do armazém, o único trabalhador formalmente vinculado com empresa diversa da B. 2.56. Não havendo, assim, diferenciação de tarefas entre um trabalhador "efectivo" e o autor, salvas as inerentes à qualificação e categoria profissional de cada um. 2.57. Só nessa altura (finais de 1998) entrou, para fazer o inventário, um trabalhador "da cedência" (J). 2.58. E, mais tarde, com o acréscimo de trabalho resultante do arranque da PM2 foram contratados diversos trabalhadores através dessas empresas (D, até Abril de 2000 e E após esta data). 2.59. E só com a entrada de todos estes trabalhadores "da cedência" (assim eram denominados na empresa) é que os trabalhadores efectivos deixaram de fazer o aviamento ao balcão. 2.60. E o A. ficou, com os demais "da cedência", nessa tarefa. 2.61. Durante todo o tempo que o A. trabalhou na B "picou" o ponto numa máquina pertencente à B, instalada dentro das suas instalações fabris. 2.62. Sendo o Sr. G, que, quando a máquina estava avariada, atestava no cartão de ponto a hora de entrada e/ou saída do autor, rubricando-obrigação 2.63. Ou, na falta deste G, outro funcionário da B, de categoria profissional superior à do A. , o Sr. H, o atestava e rubricava. 2.64. A partir de fim de Setembro de 2000, quando se soube que um outro trabalhador "da cedência", de nome K, despedido em 13 de Setembro de 2000, com efeitos a partir de 30, iria propor uma acção contra a E e a B, é que foram modificados procedimentos. 2.65. Foram dadas ordens estritas para que os trabalhadores "da cedência" não se dirigissem aos efectivos da B. 2.66. E que estes lhes não dessem quaisquer ordens ou instruções. 2.67. Assim, passaram os trabalhadores da cedência a contactar sempre o Sr. A (então "encarregado" da E. antes da D - até Março de 2000 -, antes da C - até princípio de 1997 - e, antes ainda, da D - ao tempo do contrato de trabalho temporário com o A. referido supra em 2.7. a 2.9.). 2.68. O qual. depois de contactar o Sr. G, dava as ordens ou instruções necessárias. 2.69. E, do mesmo passo, algumas ordens do Sr. G passaram a ser sempre dadas por intermédio do Sr. A. 2.70. Durante todo o tempo que o autor trabalhou na B foi transportado de e para a B num autocarro alugado pela empresa à Avic, no qual igualmente eram transportados os demais trabalhadores da B. 2.71. C, Lda e E, Lda nunca possuíram alvará para o exercício da actividade de trabalho temporário. 2.72. Durante os anos de 1993 a 2000, o autor auferiu as remunerações referidas nos artigos 106° a 113° da petição inicial. 2.73. Durante o ano de 2000, o autor fez turnos nos meses de Maio a Setembro, auferindo o correspectivo subsídio de 30.750$00. 2.74. Durante os anos de 1996 a 2000, o autor realizou o número de horas extraordinárias descriminadas nos artigos 118° a 122° da petição inicial, pagas de acordo com as remunerações auferidas como supra. 2.75. Os trabalhadores da B vêm recebendo, desde que assíduos (e o autor manteve a assiduidade), uma gratificação, no final de cada ano, conforme a produtividade da empresa, definida entre o correspondente a meio salário e o correspondente a um salário e meio. 2.76. Sendo que tal gratificação foi nos anos de 94 a 2000 de 0,5; 1; 0,5; 1,5; 1; 1,5 e 1,5, respectivamente. 2.77. A ré B e a antecessora da 3ª ré estipularam o contrato que constitui folhas 80/81, prorrogado e válido até 22 de Outubro de 1992. 2.78. A ré B celebrou com as 3ª e 4ª rés os contratos que constituem folhas 85/119, aqui reproduzidos para os devidos efeitos. 2.79. Os recibos da D e da E são exactamente iguais (mudando apenas a entidade pagadora), com o autor em ambos, como trabalhador n° 21 e ainda com referência à apólice n° 14951671, da Companhia L, S.A. 2.80. A E recorreu aos mesmos serviços de contabilidade utilizados pela D, e à mesma seguradora para o seguro de acidentes de trabalho. 2.81. Durante o período de tempo a que se reportam os autos, nunca a ré B pagou ao autor qualquer remuneração salarial, ou teve qualquer intervenção na fixação dos respectivos montantes junto das rés que a foram pagando. 2.82. A ré B disponibilizou, ao longo desse período, os balneários, vestiários, refeitórios, serviços médicos, transportes de e para a Figueira da Foz aos assalariados das empresas contratantes nos contratos mencionados em 2.78. 2.83. Além de prestar serviços à B, a co-ré E presta-os a outros clientes, igualmente. 2.84. A co-ré E chegou a pedir à co-ré B que empregados desta rubricassem o cartão de ponto de assalariados daquela. 3. Fundamentação de direito Sendo o âmbito do recurso delimitado pelas conclusões do recorrente - arts. 690º, nº1 e 684º, nº3 do C.Processo Civil aplicáveis "ex vi" do art. 1º, nº2, al. a) do C.Processo Trabalho - as questões que fundamentalmente se colocam à apreciação deste tribunal são as seguintes: 1ª - Do enquadramento jurídico dos factos provados relativamente ao exercício laboral do A. entre 23 de Outubro de 1992 e 31 de Dezembro de 2000 e da relevância, quer dos escritos denominados "contrato de trabalho a termo" subscritos pelo A. e pelas 2ª a 4ª RR., quer dos escritos denominados "contrato de prestação de serviços" subscritos pela 1ª R. e pelas demais, em tal enquadramento; 2ª - Do alegado despedimento e das suas consequências; 3ª - Da prescrição dos créditos peticionados pelo A. 3.1. Do enquadramento jurídico do exercício laboral do A. 3.1.1. A questão fundamental em apreciação na revista é a de proceder à qualificação da relação contratual laboral (ou relações contratuais) ao abrigo da qual o A. exerceu as suas funções nas instalações da R. B entre 23 de Outubro de 1992 e 31 de Dezembro de 2000. Para tanto, há que ter presente que o contrato de trabalho é um negócio não formal, meramente consensual (art. 6º da LCT) (1), pelo que é possível alcançar a determinação da sua existência e dos seus contornos pelo comportamento das partes, pela análise da situação de facto. É pois fundamental para proceder à operação de qualificação apreciar os factos apurados relativamente ao modo como se desenvolveu a prestação de trabalho do A. durante o período temporal em análise. 3.1.2. Ora o que ressalta à evidência dos factos provados é que o A., após trabalhar nas instalações da R. B entre 23 de Outubro de 1991 e 22 de Outubro de 1992 ao abrigo de um contrato de trabalho temporário celebrado com a 3ª R (2.7. e 2.8.) (2) , ali continuou no exercício das mesmas funções em benefício da Ré B e no mesmo condicionalismo funcional, o que sucedeu entre 23 de Outubro de 1991 e 31 de Dezembro de 2000, tendo neste período celebrado com as 2ª a 4ª RR. sucessivos contratos de trabalho "a termo certo", intercalados por três hiatos em que o A. continuou a trabalhar nos mesmos termos, independentemente de qualquer contrato escrito, de acordo com a seguinte sequência cronológica: - 91.10.23 a 92.10.22 - contrato de trabalho temporário com a 3ª R (2.7. e 2.8.) - 92.10.23 a 94.06.30 - sem contrato escrito (2.9.) - 94.07.01 a 94.12.31 - contrato de trabalho a termo com a 2ª R (2.11. a 2.13.) - 95.01.01 a 95.03.31 - contrato de trabalho a termo com a 2ª R (2.14.) - 95.04.01 a 95.06.30 - contrato de trabalho a termo com a 2ª R (2.16.) - 95.07.01 a 95.09.30 - contrato de trabalho a termo com a 2ª R (2.16.) - 95.10.01 a 95.12.31 - contrato de trabalho a termo com a 2ª R (2.16.) - 96.01.01 a 96.06.30 - contrato de trabalho a termo com a 2ª R (2.17.) - 96.07.01 a 95.08.31 - contrato de trabalho a termo com a 2ª R (2.18.) - 96.09.01 a 96.12.31 - contrato de trabalho a termo com a 2ª R (2.18.) - 97.01.01 a 97.01.31 - sem contrato escrito (2.19. e 2.20.) - 97.02.01 a 97.06.30 - contrato de trabalho a termo com a 3ª R (2.21.) - 97.07.01 a 97.09.30 - contrato de trabalho a termo com a 3ª R (2.22.) - 97.10.01 a 97.12.31 - contrato de trabalho a termo com a 3ª R (2.22.) - 98.01.01 a 2000.03.31 - sem contrato escrito (2.23. a 2.27.) - 2000.04.01 a 2000.12.31 - contrato de trabalho a termo com a 4ª R (2.27.) Ao longo de todo este lapso de tempo, as funções do autor foram (pese embora a categoria utilizada nos contratos a termo celebrados) de motorista, recuperador de papel, operador de empilhadores e fiel de armazém (2.29.), sempre e ininterruptamente exercidas, ainda que de forma alternada, na instalações da Ré B (2.30.), cujas carrinhas conduzia com frequência, e mesmo diariamente quando em férias e doenças dos motoristas do quadro, que então substituía, onde recuperava o papel, cujos empilhadores manobrava e em cujos balcões, tanto de recepção como de aviamento, trabalhou, o que sucedeu até finais de 1999, no armazém geral, e passando a fazer, desde Novembro de 1999 - ainda formalmente vinculado à D, Lda. e, desde Abril de 2000, vinculado à E, Lda, - de forma mais sistemática e habitual, o aviamento ao balcão, no armazém geral (2.31 a 2.36.). O A. exerceu pois as suas funções profissionais com continuidade e sempre em benefício da R. B e nas instalações desta. Além disso, como expressamente se apurou, durante o tempo que o autor trabalhou na B, recebeu ele ordens, fundamentalmente, do encarregado de armazém da B, G - que, por várias vezes, dava ordens ao autor, quando este estava no balcão de aviamento, para ir ajudar na recepção de materiais, ou para manobrar o empilhador, ou ainda, estando o autor a exercer tarefas na recepção de materiais ou a manobrar o empilhador, mandava-o ajudar no balcão de aviamento, por aí estar uma grande fila de funcionários a solicitar o aviamento de requisições -, bem como de H, fiel de armazém qualificado da B e mesmo, por uma ou outra vez, do Eng. I, sendo estes três últimos que lhe indicavam, directamente, quais os serviços a executar e o mandavam conduzir uma das carrinhas da B a fim de ir buscar ou levar qualquer mercadoria (2.39. a 2.43. e 2.47. a 2.49.). Acresce que, como se apurou, em todas essas funções, sempre o autor trabalhou lado a lado com trabalhadores efectivos da B, exercendo as mesmas funções que eles, quer na condução das carrinhas, também conduzidas por efectivos da B, quer dentro do armazém, quer na recepção de bens, quer no fornecimento de bens a funcionários de outros sectores de produção, que os solicitavam ao armazém (2.50. a 2.54.). Finalmente, ficou provado que era o encarregado de armazém da R. B quem determinava a necessidade de o A. realizar trabalho extraordinário, o mesmo sucedendo relativamente à combinação das férias do A. e ao próprio controlo da assiduidade e pontualidade deste (2.44. a 2.46. e 2.61. a 2.63.). Todos estes factos são sobejamente demonstrativos de que o A. desenvolveu a sua actividade profissional integrado na estrutura organizativa da R. B, a par dos demais trabalhadores denominados "efectivos" desta, e sujeito às ordens, direcção e fiscalização da mesma. 3.1.3. Ou seja, é inequívoco em face da factualidade apurada, que a prestação de trabalho do A. no período de tempo em análise se prestou de forma juridicamente subordinada à R. B e em dessintonia, quer com o que estabeleciam os "contratos de trabalho a termo" sucessivamente celebrados entre o A. e as 2ª a 4ª RR. (que identificavam estas como entidade patronal do A. e aludiam na respectiva cláusula 5.ª à sede das mesmas como local normal de trabalho do A.), quer com os sucessivos "contratos de prestação de serviços" celebrados entre estas RR. e a R. B (cuja cláusula 3ª prescrevia que os trabalhadores encarregados da execução dos serviços pelo segundo outorgante dependerão exclusivamente dele, quer juridica quer economicamente, recebendo do mesmo as ordens, instruções e informações necessárias à boa prestação do trabalho). Como também se refere no acórdão recorrido, a realidade apurada no processo e que terá de constituir suporte da decisão de direito não é minimamente demonstrativa de que os acordos celebrados pela Ré B se revestem das características dos denominados "contratos de prestação de serviços", ou seja, que foi na execução desses contratos e sob a autoridade, direcção e fiscalização dos restantes outorgantes (as 2ª a 4ª RR.) que o A. desenvolveu a sua actividade laboral. E, por esta mesma razão, a realidade apurada no processo não traduz também a execução dos diversos "contratos de trabalho a termo" celebrados entre o A. e as 2ª a 4ª RR. Pode assim afirmar-se que existe uma acentuada divergência entre o nomen atribuído aos contratos escritos, o seu clausulado e a realidade. Perante esta divergência, e tendo presente que o contrato individual de trabalho tem natureza consensual, bem como que o traço caracterizador deste tipo contratual (enquanto facto gerador da situação jurídico-laboral) reside na circunstância de a actividade do trabalhador ser prestada de forma juridicamente subordinada, a questão de determinar a entidade a quem o trabalhador está laboralmente vinculado não pode ater-se à identificação da entidade patronal em sentido formal (pessoa jurídica que outorga o contrato escrito), exigindo ao intérprete uma análise exaustiva do comportamento das partes na execução do contrato de modo a identificar a entidade sob cujo poder de direcção o trabalhador presta a sua actividade hetero-determinada: será essa a entidade patronal. Como refere Abel Ferreira" (3), "no estado actual do Direito do Trabalho e no plano da determinação do empregador, sempre que a lei não indique expressamente noutro sentido, a subordinação jurídica continua a constituir o único critério disponível de averiguação da existência da relação de trabalho para efeitos de aplicação da legislação laboral". Neste sentido de que o que releva fundamentalmente numa relação contratual desta natureza é a existência de subordinação jurídica em relação ao dador de trabalho, também se tem orientado a jurisprudência deste Supremo Tribunal (4), admitindo que o pagamento da retribuição, assim como a realização de outras diligências, possa ser efectuado por outras entidades (como sucedeu no caso "sub-judice" - vide 2.81.), sem que tal ponha em causa a natureza laboral da relação em que se verifica a heterodeterminação da actividade do trabalhador. Conclui-se, assim, que se estabeleceu e esteve em vigor entre o A. como trabalhador e a R. B como entidade patronal a partir de 23 de Outubro de 1992 um contrato individual de trabalho, tal como esta figura contratual vem definida no art. 1º do DL n.º 49408 de 24 de Novembro de 1969 (LCT). 3.1.4. Perante esta realidade, a interposição das 2ª a 4ª RR. (que na verdade não dirigiam a actividade laboral do A.) no contexto das relações que efectivamente perduraram no tempo entre o A. e a 1ª R., mais não pode significar do que um artifício jurídico com vista a encobrir verdadeiras relações laborais entre a Ré B e o A. (que, formalmente, era trabalhador da 2ª a 4ª RR.). É certo que a necessidade de colocar à mão das empresas instrumentos que lhes permitam satisfazer necessidades de mão de obra pontuais, imprevistas ou de curta duração, justifica figuras como o "trabalho temporário" ou a "cedência ocasional de trabalhadores", mas o legislador demonstrou bem o carácter excepcional destas figuras que se afastam do chamado modelo de trabalho típico e rodeou a sua admissibilidade de parâmetros rígidos e particulares cuidados. Assim, o DL n.º 358/89 de 17.10, alterado pela Lei n.º 146/99 de 2.9 (LTT) veio claramente combater a interposição fictícia e em fraude à lei, estabelecendo um conjunto de regras, das quais se destacam as que dispõem taxativamente sobre as formas jurídicas ao abrigo das quais é lícita a cedência (contrato de trabalho temporário e cedência ocasional de trabalhadores) - arts. 9.º, 17.º, 18.º, 26.º e 27.º - e as que responsabilizam o beneficiário do trabalho (utilizador ou empresa cessionária) desconsiderando a empresa interposta em caso de ilicitude - arts. 10.º, 11.º, n.º 4, 16.º, n.º 2, 18.º, n.º 5 e 30.º. Estas regras têm carácter imperativo, não admitindo que se constituam esquemas de cedência de mão de obra à margem do que nelas se estabelece. É também certo que as empresas vêm recorrendo recentemente a processos de externalização ou "subcontratação", recorrendo a empresas externas para satisfação de necessidades que não se prendem directamente com o seu objecto principal, o que fazem muitas vezes através de contratos de prestação de serviços que estas últimas empresas executam com trabalhadores a elas vinculados e que exercem a actividade laboral sob a direcção das mesmas. Contudo, a subcontratação não pode também constituir um expediente fraudatório, destinado a iludir as normas imperativas de Direito do Trabalho e consubstanciando uma "desresponsabilização do empresário principal relativamente a um processo produtivo que se encontrava na sua esfera de direcção e com o qual se avantajou de forma que repugna à consciência jurídica" (5) . É esta situação que ocorre no caso dos autos. É patente, perante a factualidade apurada, o desdobramento dos vínculos contratuais que formalmente enquadram a prestação de actividade pelo trabalhador para excluir o seu enquadramento num vínculo contratual duradouro que perdurou entre 1991 e 2000, materialmente estabelecido entre dois sujeitos sem qualquer vínculo formal entre si (o A. e a B), e que perdurou inalterado apesar dos sucessivos escritos e de vários interregnos em que não existia nenhum contrato a termo formalmente em vigor. Os negócios jurídicos que permitem a intermediação de terceiras entidades, contrariando normas imperativas, são nulos nos termos do disposto no art. 294º do CC. É absolutamente demonstrativa de que, sob a capa de uma aparente "subcontratação", o que se pretendia era colocar o A. à disposição da R. B para trabalhar para esta - através de um esquema de intermediação à margem daqueles que a lei admite e para afastar a prestação de actividade do A. à B durante mais de 9 anos do regime do contrato individual de trabalho -, a evidente desconformidade entre o estabelecido nos clausulados dos contratos a termo e dos contratos de prestação de serviços, por um lado, e a apurada actuação dos seus outorgantes, por outro. E são também reveladores deste intuito fraudatório os factos que se verificaram em Setembro de 2000 no sentido da modificação de procedimentos na transmissão de ordens aos trabalhadores da "cedência" após um trabalhador intentar uma acção judicial contra a B (2.64. a 2.69.), sendo certo que, mesmo com esta modificação de procedimentos, as ordens e instruções necessárias eram dadas por um trabalhador da E, que para o efeito contactava o encarregado de armazém, passando do mesmo passo, algumas ordens do Sr. G a ser sempre dadas por intermédio daquele trabalhador (2.68. e 2.69.), o que denota um procedimento tendente a mostrar algo de diverso do que realmente ocorre. Igualmente é significativo que todos os contratos a termo celebrados tenham sido sempre assinados, em nome das diversas entidades patronais identificadas nos escritos, pela mesma pessoa : F, agora formalmente sócio da E, Lda. (vide 2.28.). São pois nesta perspectiva nulos por fraude à lei, quer os contratos a termo subscritos pelo A., quer os contratos de prestação de serviços subscritos pelas RR., não produzindo quaisquer efeitos no que diz respeito ao vínculo laboral permanente que se formou entre o A. e a R. B através do exercício estável e continuado da actividade do primeiro de modo juridicamente subordinado à segunda. Em virtude desta nulidade, não têm estes escritos quaisquer relevância para a apreciação do caso "sub-judice", persistindo apenas como facto jurídico genético dos direitos invocados pelo A. o contrato individual de trabalho sem termo que se estabeleceu entre si e a Ré B. 3.1.5. Perante esta constatação de que se firmou entre a Ré B e o A. um contrato individual de trabalho, só por si suficiente para se proceder à apreciação dos pedidos condenatórios formulados pelo A. que pressupõem a vigência de um vínculo contratual com tal natureza, entendemos que perdem relevo os pedidos relativos à declaração de que os contratos de trabalho a termo celebrados consubstanciam "contratos de trabalho temporário" e à declaração de que os contratos de prestação de serviços celebrados entre as RR. consubstanciam "contratos de utilização de trabalho temporário". Esta construção jurídica - tendente à declaração de que estes efectivos contratos de trabalho temporário e contratos de utilização de trabalho temporário são nulos e determinam nos termos do disposto nos arts. 10º e 16.º, n.º 3 da LTT que se considere prestado o trabalho ao utilizador com base em contrato individual de trabalho sem termo - além de ser de difícil sustentação em face das regras interpretativas estabelecidas no CC para os negócios formais (6), revela-se destituída de interesse face à consideração de que se firmou e desenvolveu entre o A. e a R. B um contrato individual de trabalho sem termo e de que os contratos de trabalho a termo e os contratos de prestação de serviços formalmente celebrados são nulos por fraude à lei nos termos do art. 294.º do CC. 3.1.6. De acordo com o entendimento expresso no acórdão recorrido, o contrato de trabalho por tempo indeterminado existente entre o A. e a B terminou com a celebração entre o A. e a E, Lda., em 1 de Abril de 2000, do último contrato a termo. Como resulta do exposto, é de subscrever a afirmação constante do acórdão recorrido de que "todo o desempenho funcional do A. se processava à margem de qualquer intervenção das co Rés A. C, Lda, D e E portanto fora do âmbito de execução dos designados "contratos de prestação de serviços" que a recorrente celebrou com essas Rés." Contudo, não se vislumbra razão válida para distinguir de todos os contratos a termo celebrados até Abril de 2000 o último "contrato", assinado pelo A. e pela E. Foi esta fundamental distinção do acórdão em revista que determinou a absolvição do pedido da B. De acordo com a tese sufragada pela Relação, a partir de Abril de 2000 o A. estava vinculado à co-R, E através do último contrato a termo celebrado e esta era a sua entidade patronal, não obstante a disponibilidade da força de trabalho do A. em relação à B, vindo o dito contrato a termo a caducar por iniciativa daquela co-R. Ora o que os factos provados denotam é que a actividade do A., que à data da celebração deste último contrato se desenvolvia nas instalações da B sem nenhum contrato escrito que formalmente estivesse em vigor, continuou a desenvolver-se no mesmo condicionalismo de subordinação jurídica à R. B, não tendo ocorrido, a partir da data de "início" do mesmo - 1 de Abril de 2000 - qualquer alteração nas funções do A. ou no circunstancialismo em que ele desenvolvia a sua actividade laboral (2.29. a 2.36.). A situação laboral do A. na B permaneceu inalterada apesar da subscrição do novo contrato, como anteriormente sucedera sempre que, mais de uma dezena de vezes, foram sendo celebrados sucessivos contratos a termo com as segunda e terceira RR. Como se refere no douto parecer junto aos autos (a fls. 1051), este contrato a termo é afinal "mais um de uma série de contratos celebrados entre os AA. e as co-RR. no presente processo com o intuito, não de modelar uma relação laboral entre as partes, mas antes de iludir a realidade, defraudando a aplicação de dispositivos legais que ao caso caberia". Tem pois razão o recorrente quando afirma que este "contrato" surge no mesmo quadro relacional dos anteriores e, em consequência, não tem virtualidade extintiva (como nenhum dos outros teve), não podendo operar a cessação do contrato por tempo indeterminado que vigorava entre o A. e a B desde 23 de Outubro de 1992, o qual, portanto, se manteve em execução e incólume. 3.1.7. Haverá ainda que fazer uma referência às regras do ónus da prova, uma vez que o acórdão recorrido não fez uma aplicação correcta das mesmas. Na verdade, ao invés do que refere o acórdão recorrido, o A. invocou e demonstrou em juízo uma relação de facto que constitui o suporte de um contrato individual de trabalho por tempo indeterminado que, assim, se firmou entre si e a B a partir de 23 de Outubro de 1992, relação de trabalho efectiva esta que se manteve e continuou a desenrolar após 1 de Abril de 2000. Cumpriu pois o que estabelece o art. 342.º, n.º 1 do CC no que respeita aos pedidos que se fundavam na existência de um vínculo contratual daquela natureza. A R. B, por seu turno, não demonstrou - como alegara na sua contestação e, consequentemente, tinha o ónus de provar - que estiveram em execução meros contratos de prestação de serviços, através dos quais as demais RR. asseguravam o funcionamento de determinados sectores ou áreas de serviço da B, utilizando os seus trabalhadores admitidos por contrato de trabalho a termo, cuja actividade dirigiam e organizavam com vista à prestação do serviço. O que é patente é que os "contratos" escritos não tiveram qualquer projecção na conformação ou no desenrolar da relação laboral que, entre 1992 e 2000 mantiveram o A. e a R. B, vínculo laboral este que, como se refere no douto parecer junto aos autos (a fls. 1042) "permaneceu inalterado para lá dos seus sucessivos inícios e cessações, bem como dos interregnos contratuais mais ou menos prolongados." Demonstrados os factos constitutivos deste vínculo laboral duradouro, nada mais incumbia ao A, provar, constituindo tarefas de qualificação jurídica que ao tribunal incumbem (art. 664.º do CPC) as de saber (se se considerar que tal interessa à composição do litígio o que, já vimos, não ocorre) se os contratos a termo consubstanciam contratos de trabalho temporário e se os contratos de prestação de serviços consubstanciam contratos de utilização de trabalho temporário cuja nulidade tem como consequência se considere o trabalho prestado ao utilizador com base num contrato individual de trabalho sem termo. Procedem pois, também, as conclusões das alegações da recorrente quanto ao problema da repartição do ónus da prova. 3.1.8. Em face do exposto, deverá concluir-se que subsiste a decisão da 1ª instância na parte em que declarou ter-se estabelecido entre o A. e a R. B um contrato individual de trabalho sem termo a partir de 23 de Outubro de 1992 e em que, considerando o A. como assalariado da B, e ponderando as funções por ele exercidas e os grupos de remunerações e escalões definidos no Guia do Trabalhador dessa R., lhe reconheceu o estatuto profissional de GR 11, escalão 3 até Outubro de 1999 e de GR 10, escalão 3, desde essa data até 31 de Dezembro de 2000, enquadramento este que não foi posto em causa pela recorrida B (nem na apelação, nem na revista), pelo que não deverá nesta sede ser reapreciado. Impõe-se assim manter a condenação da R. B, em consequência da vigência no período apontado de um contrato individual de trabalho sem termo com o A. e do reconhecimento do aludido estatuto profissional, no pagamento das diferenças salariais (incluindo de subsídios de férias e de Natal), diferenças de subsídio de turno, diferenças de valor da remuneração horária relativa às horas extraordinárias e ainda as gratificações generalizadas a todos os trabalhadores da B e não pagas ao mesmo nos montantes, respectivamente, de € 32.603,25 (6.536.364$00); € 359,13 (72.000$00); € 1.066,78 (213.871$00) e € 5.977,94 (1.198.400$00), bem como juros de mora vencidos e vincendos sobre estas prestações à taxa legal, contados desde a data do vencimento de cada uma das diferenças ou prestações em falta, relativos aos últimos cinco anos e até efectivo reembolso. E, deste modo, fica prejudicada a apreciação das suscitadas inconstitucionalidades, todas elas relacionadas com a interpretação de regras legais - os arts. 3.º do DL n.º 358/89 e 19.º, al. b) da LCT - efectuada pelo Tribunal da Relação de modo que não foi acolhido por este Supremo Tribunal. 3.2. Do alegado despedimento e das suas consequências Alega o A. ter sido alvo de um despedimento nulo e, com base nesse despedimento peticiona uma indemnização de antiguidade que, na revista, pretende ver fixada em montante equivalente a um mês de remuneração de base por cada ano de antiguidade ou fracção contando-se todo o tempo até à data do presente acórdão (conclusões T a Z). A recorrida a este propósito invoca que não houve qualquer despedimento do A. por parte da B, nem esta tinha legitimidade para o fazer por não ser sua entidade patronal. Ora se, como resulta do exposto, a B tinha absoluta legitimidade para despedir o A. - já que era efectivamente sua entidade patronal -, já não pode afirmar-se, em face da factualidade apurada, que a B tenha procedido ao despedimento do A. por não se ter apurado que o A. deixasse de prestar trabalho à R. B na sequência de esta ter emitido uma declaração negocial (expressa ou tácita) que demonstrasse a sua vontade de extinguir o vínculo laboral. Na verdade, o despedimento constitui estruturalmente um negócio jurídico unilateral receptício, através do qual a entidade patronal revela a vontade de fazer cessar o contrato de trabalho, estando o despedimento individual regulamentado nos arts. 9º e ss. do D.L. nº64-A/89 de 27 de Fevereiro. A declaração negocial extintiva da entidade patronal pode ser expressa, quando realizada directamente através de palavras, escrito ou qualquer outro meio directo de comunicação, conforme dispõe o art 217º do C.Civil. Estabelece ainda a lei civil a possibilidade de a declaração negocial ser meramente tácita, ou seja, a possibilidade de se considerar como válida uma declaração negocial que se deduza de factos que "com toda a probabilidade" a revelem (cfr. o art 217º do C.Civil). No domínio do despedimento promovido pela entidade patronal, tem a jurisprudência entendido que a vontade de pôr termo ao contrato há-de ser "inequívoca", razão por que se não tem admitido o despedimento tácito com a amplitude que é conferida à declaração negocial tácita pelo art. 217º, aceitando-se apenas os chamados "despedimentos de facto" quando há uma atitude inequívoca da entidade patronal que configura a manifestação da vontade de fazer cessar a relação laboral e assim é entendida pelo trabalhador ao abrigo do nº1 do art. 236º do C.Civil, preceito que dispõe valer a declaração negocial com o sentido que um declaratário normal, colocado na posição do real declaratário, possa deduzir do comportamento do declarante (7). O despedimento de facto tem assim que ser expresso ou extraído de factos que, inequivocamente, revelam a vontade da entidade patronal de fazer cessar o contrato (art. 217º citado) perante o homem normal (art. 236º citado) e, para ser eficaz, tem de ser levado ao alcance da outra parte em condições de esta poder tomar conhecimento da respectiva declaração de vontade (art. 224º do C.Civil). Há pois que proceder à análise da situação fáctica e verificar se a mesma denota a existência de uma declaração de vontade da R. B no sentido de fazer cessar o vínculo laboral que mantinha com o A., ou seja, se a B teve uma qualquer atitude que inequivocamente denuncie a intenção de despedir, seja por palavras (escritas ou meramente verbalizadas), atitudes ou por omissões que, segundo a experiência comum, tenham o significado equivalente ao despedimento (8). Ora o que se provou foi tão só que por carta datada de 11 de Dezembro de 2000 a E comunicou ao A. não pretender renovar o "contrato de trabalho a termo certo" celebrado em 1 de Abril de 2000, pelo que o mesmo caducaria em 31 de Dezembro de 2000 (2.37.), pelo que o A. deixou de trabalhar na B na indicada data de 31 de Dezembro de 2000 (2.38.). Em face destes factos, é manifesto que não pode afirmar-se ter a R. B rescindido unilateralmente o contrato de trabalho "sub-judice". Não está de modo algum demonstrado que a Ré B tenha tido qualquer intervenção naquele acto, ou que de qualquer forma tenha procedido ao despedimento do A. através dos seus legais representantes, ou que tenha delegado em alguém o poder disciplinar que tinha sobre o A. (designadamente na emitente da carta datada de 11 de Dezembro de 2000). Poder-se ía objectar a esta conclusão com a afirmação de que o próprio exercício laboral do A. se desenrolou na sequência da celebração formal de contratos a termo com as 2ª a 4ª RR., ou seja, independentemente de qualquer declaração negocial da Ré B. Contudo, há que ter presente que a vinculação laboral do A. não tem como facto jurídico genético a subscrição daqueles escritos mas, sim, o exercício continuado de uma actividade laboral em benefício da Ré B e uma situação de subordinação jurídica à mesma (vide 2.7., 2.10., 2.29. a 2.36., 2.39. a 2.49. e 2.61. a 2.63.) É em virtude de atitudes concretas da Ré B que, através dos seus encarregados, dirigia, fiscalizava e organizava a actividade laboral que o A. exercia ao seu serviço, que se afirmou a sua vinculação laboral ao A. e a sua persistência a parir de 1 de Abril de 2000. Quanto ao alegado despedimento, provou-se tão só a factualidade constante dos números 2.37. e 2.38., o que é manifestamente insuficiente para se concluir que a Ré B procedeu ao despedimento do A. com efeitos a partir de 31 de Dezembro de 2000. Tal não significa que o contrato individual de trabalho "sub-judice" não tenha cessado, neste ou noutro momento. O que não pode é afirmar-se que a missiva remetida pela R. "E" ao A., desacompanhada de qualquer outra atitude da Ré B, consubstancie uma declaração negocial extintiva emitida por esta última com a virtualidade de fazer cessar o contrato que a vinculava ao A. e que este desempenhava já desde 1992 (9). Era ao A. que competia provar os factos integradores da hipótese legal do art. 13º do D.L. nº 64-A/89 de 27 de Fevereiro, para beneficiar dos direitos indemnizatório e retributivo aí previsto, factos nos quais se incluía a ocorrência do despedimento, como resulta da regra geral estabelecida no art. 342º, nº1 do C.Civil. Assim, porque inexistiu o alegado despedimento no dia 31 de Dezembro de 2000 - despedimento cuja ocorrência incumbia ao A. provar nos termos do art. 342º do C.Civil, enquanto facto constitutivo do seu direito -, não pode este considerar-se ilícito, conforme invoca o A. nestes autos, nem tão pouco pode atribuir-se-lhe as peticionadas indemnização por antiguidade e retribuições até à data do presente acórdão . Improcedem, nesta parte, as conclusões das alegações do recorrente, ficando também prejudicada a apreciação da questão da quantificação da indemnização de antiguidade (conclusões T a Z). 3.3. Da prescrição Nas alegações apresentadas na revista, a recorrida requereu ainda nos termos do art. 684º-A do CPC que a excepção de prescrição dos créditos peticionados pelo A. - que arguiu na contestação e suscitou no recurso de apelação - seja agora apreciada. Nos termos do preceituado no art. 38º, nº1 do DL 49408 de 24 de Novembro de 1969, todos os créditos emergentes de contrato de trabalho e da sua violação ou cessação extinguem-se por prescrição decorrido um ano a partir do dia seguinte aquele em que cessou o contrato. Na tese da recorrida, sendo a acção proposta em 5 de Março de 2001 e não tendo o A. qualquer vínculo jus-laboral com a B a partir de 1 de Abril de 2000, data em que celebrou um contrato individual de trabalho a termo com a 4ª R., todos os créditos e direitos do A. provenientes dos contratos por ele invocados até 31 de Março de 2000 prescreveram pelo decurso do prazo de mais de um ano até 6 de Abril de 2001, data da citação da recorrida para a acção. Como resulta do exposto, é manifesta a improcedência desta tese. No caso "sub-judice", o contrato individual de trabalho por tempo indeterminado que se estabeleceu entre o A. e a Ré B em virtude da ininterrupta prestação de trabalho do A. em subordinação jurídica à recorrida manteve-se em vigor, pelo menos, até 31 de Dezembro de 2000. Assim, quando em 6 de Abril de 2001 a recorrida foi citada para a presente acção, ainda não havia decorrido o prazo fixado no art. 38.º da LCT, não se verificando assim a prescrição dos créditos peticionados pelo A. e reconhecidos neste aresto. Improcedem pois, nesta parte em que requereu a ampliação do objecto do recurso, as conclusões das alegações da recorrida. 4. Decisão Termos em que se decide conceder provimento à revista, revogando-se o acórdão recorrido, ficando a subsistir a decisão da 1ª instância na parte em que declarou ter-se estabelecido entre o A. e a Ré B um contrato individual de trabalho sem termo e em que condenou a Ré B a pagar ao autor as diferenças salariais (incluindo de subsídios de férias e de Natal), diferenças de subsídio de turno, diferenças de valor da remuneração horária relativa às horas extraordinárias e ainda as gratificações generalizadas a todos os trabalhadores da B e não pagas ao mesmo nos montantes, respectivamente, de € 32.603,25 (6.536.364$00), € 359,13 (72.000$00), € 1.066,78 (213.871$00) e € 5.977,94 (1.198.400$00), bem como juros de mora vencidos e vincendos sobre estas prestações à taxa legal, contados desde a data do vencimento de cada uma das diferenças ou prestações em falta, relativos aos últimos cinco anos e até efectivo reembolso. Custas por recorrente e recorrida na proporção do respectivo decaimento. Lisboa, 4 de Maio de 2005 Vítor Mesquita, Fernandes Cadilha, Mário Pereira . ----------------------------------- (1) Actualmente, nos mesmos termos, o art. 106.º do Código do Trabalho. (2) O recorrente não fundamenta os pedidos que formula no trabalho prestado ao abrigo deste contrato de trabalho temporário até 92.10.22. (3) "Grupos de Empresas e Relações Laborais" in I Congresso de Direito do Trabalho, Memórias, p. 289" (4) Vide, particularmente significativo a este propósito, o recente Ac. do STJ de 2004.10.07 (Revista n.º 1002/04, da 4ª Secção) (5) Vide J.N. Zenha Martins, "A descentralização produtiva e os grupos de empresas ante os novos horizontes laborais", in Questões Laborais, 18, p. 232, e também pp. 194 e ss. e 225 e ss. Também o douto parecer junto aos autos a fls. 1025, citando Däubler, alude às situações em que o cedente de mão de obra se apresenta como "empresário autónomo com organização própria" que envia os seus trabalhadores para outra pessoa, mas dando a impressão de que estes "vão trabalhar segundo as instruções do cedente" cumprindo obrigações por este contratualmente assumidas com o empresário através de contratos de prestação de serviços ou de empreitada. (6) Estabelecendo o art. 238º do CC que a declaração negocial não pode valer com um sentido que não tenha um mínimo de correspondência no texto do documento ainda que imperfeitamente expresso, não se vê como extraír dos textos dos contratos de trabalho a termo e dos contratos de prestação de serviços documentados nos autos, com estipulações contratuais consentâneas com os títulos neles apostos, que a vontade dos seus outorgantes fosse no sentido da celebração de contratos de trabalho temporário e de contratos de utilização de trabalho temporário. Por outro lado, a factualidade apurada nos autos é absolutamente omissa quanto à vontade das partes contratantes, não permitindo afirmar ter ocorrido divergência entre essa vontade e a declaração ou qualquer dos vícios da vontade previstos na lei civil (arts. 240.º e ss. do CC). Só a realidade da execução da prestação laboral do A. leva a considerar não terem os vínculos negociais concretamente estabelecidos correspondência com as estipulações contratuais constantes dos documentos. (7) Vide os Acórdãos do Supremo Tribunal de Justiça de 83.12.16, in B.M.J. 332/410, de 99.04.14 (Revista nº 72/99, 4ª secção), de 2000.11.15 (Revista nº 219/99, da 4ª secção), de 2001.02-01 (Revista nº 3432/00, da 4ª secção), de 2001.02.21 (Revista nº 3109/00, da 4ª secção) e de 2004.03.09 (Revista nº 4675/02, da 4ª secção). (8) Vide o Ac. do STJ de 2000.6.7 (Revista nº 281/99, da 4ª secção), (9) Em caso similar, no sentido de que é inócua no âmbito da relação de trabalho sem termo surgida "ope legis" entre o trabalhador e uma empresa utilizadora, a declaração de caducidade do contrato de trabalho emitida pela empresa de trabalho temporário em consequência de alegada caducidade do contrato de utilização, vide o Ac. do STJ de 98.03.03 (Revista n.º 84/97, da 4ª Secção). |