Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça | |||
Processo: |
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Nº Convencional: | 5.ª SECÇÃO | ||
Relator: | MARGARIDA BLASCO | ||
Descritores: | RECURSO DE ACÓRDÃO DA RELAÇÃO HOMICÍDIO QUALIFICADO TENTATIVA OFENSA À INTEGRIDADE FÍSICA QUALIFICADA PENA PARCELAR DUPLA CONFORME RECURSO DA MATÉRIA DE FACTO INADMISSIBILIDADE VÍCIOS DO ARTº 410.º DO CÓDIGO DE PROCESSO PENAL PENA ÚNICA MEDIDA CONCRETA DA PENA | ||
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Data do Acordão: | 01/21/2021 | ||
Votação: | UNANIMIDADE | ||
Texto Integral: | S | ||
Privacidade: | 1 | ||
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Meio Processual: | RECURSO PENAL | ||
Decisão: | JULGADO O RECURSO IMPROCEDENTE. | ||
Indicações Eventuais: | TRANSITADO EM JULGADO | ||
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Sumário : | I - O recurso interposto pelo arguido pode ser conhecido pelo STJ, mas tão só, na medida em que se quadre no âmbito dos respectivos poderes de cognição. Com efeito, por força do disposto nos arts. 432.º, n.º 1, al. b) e 434.º, do CPP, o STJ pode apenas reexaminar a matéria de direito (sem prejuízo do conhecimento oficioso dos vícios previstos nos n.ºs 2 e 3, do art. 410.º, do CPP que sejam evidenciados pela decisão recorrida), tal seja, não pode conhecer das questões inerentes ao julgamento sobre a matéria de facto, nem das questões que concernem à própria formulação da decisão de 1.ª instância (como as nulidades e os vícios de procedimento), que já não estão sob apreciação. Aliás, este regime de recurso para o STJ efectiva, de forma adequada, a garantia do duplo grau de jurisdição, traduzida no direito de reapreciação da questão por um tribunal superior, quer quanto a matéria de facto, quer quanto a matéria de direito, consagrada no artigo 32.º, n.º 1, da CRP, enquanto componente do direito de defesa em processo penal, reconhecida em instrumentos internacionais que vigoram na ordem interna e vinculam o Estado Português ao sistema internacional de protecção dos direitos humanos. O recurso é por isso, a esta luz, e neste segmento, manifestamente improcedente. Pelo exposto, neste segmento, o recurso não é admissível, pelo que vai rejeitado. II - O arguido, neste seu recurso perante o STJ, vem reeditar, na motivação, o alegado perante o Tribunal da Relação. Entende o Recorrente que esta decisão decorreu de uma errada interpretação da matéria de facto e de uma incorrecta aplicação do direito. Ora, como se tem repetidamente afirmado na jurisprudência deste Supremo Tribunal e na doutrina, os recursos judiciais não servem para conhecer de novo da causa. Os recursos constituem meios processuais destinados a garantir o direito de reapreciação de uma decisão de um tribunal por um tribunal superior, havendo que, na sua disciplina, distinguir dimensões diversas, relacionadas com o fundamento do recurso, com o objecto do conhecimento do recurso e com os poderes processuais do tribunal de recurso, a considerar conjuntamente. O que significa que, verificados que se mostrem os fundamentos para recorrer (pressupostos da admissibilidade do recurso), o objecto do conhecimento do recurso delimita-se pelas questões identificadas pelo recorrente que digam respeito a questões que tenham sido conhecidas pelo tribunal recorrido ou que devessem sê-lo, com as necessárias consequências ao nível da validade da própria decisão, assim se circunscrevendo os poderes do tribunal de recurso, sem prejuízo do exercício, neste âmbito, dos poderes de conhecimento oficioso necessários e legalmente conferidos em vista da justa decisão do recurso. Como se tem insistido, o recurso constitui apenas um “remédio processual” que permite a reapreciação, em outra instância, de decisões sobre matérias e questões submetidas a decisão do tribunal de que se recorre. III - Feito o necessário saneamento e enquadrando a peça recursória em análise, esta tem por objecto um acórdão proferido em recurso pelo TRL que confirmou a decisão da 1.ª instância “in totum” e aplicou, em cúmulo jurídico, pena de prisão superior a 8 anos, visando exclusivamente o reexame de matéria de direito, da competência deste tribunal (nos termos do disposto nos arts. 432.º, n.º 1, al. b) e c) e 2, 434.º e 400.º, n.º 1, als. e) e f), todos do CPP), nos termos supra expostos. IV - Em 1.º lugar, quanto à questão retomada neste recurso e já discutida nas Instâncias, em que põe em causa o modo como o tribunal valorou a prova (nomeadamente a prova testemunhal e o vídeo), embora não invoque expressamente os vícios do n.º 2, do art. 410.º, do CPP, “pretextua” o vício de insuficiência para a decisão da matéria de facto provada - n.º 1, al a), daquela norma -, e questionando o uso que o tribunal recorrido fez do princípio da livre apreciação da prova (conforme o disposto no art. 127.º, do CPP). Por um lado, ressalta-se que os vícios previstos no art. 410.º, n.º 2, do CPP não podem ser confundidos com uma divergência entre a convicção pessoal do recorrente sobre a prova produzida em audiência e a convicção que o tribunal firme sobre os factos, no respeito pelo princípio da livre apreciação da prova inscrito no art. 127.º do CPP. Por outro lado, em vista do recorte conceitual daquele princípio, tal como sedimentado na doutrina e na jurisprudência, e atenta a factualidade provada e a fundamentação respectiva (supra transcritas), não se divisa que o Tribunal da Relação de Lisboa tenha ficado com qualquer dúvida relativamente à culpabilidade do arguido, relativamente a cada um dos crimes em que foi condenado (a dúvida relevante é, necessariamente, a do Tribunal, que não a do recorrente), e muito menos que tenha resolvido qualquer non liquet em desfavor deste. V - Neste particular, o que releva, necessariamente, é a convicção que o tribunal forme perante as provas produzidas em audiência, sendo ineficaz, no âmbito da ponderação exigida pela função do controlo ínsita na identificação dos vícios do art. 410.º, n.º 2, do CPP, a convicção pessoalmente formada pelo recorrente e que ele próprio alcançou sobre os factos. VI - Em síntese: quanto a vícios de procedimento, importa deixar expresso que, no caso, mesmo oficiosamente, do texto da decisão revidenda, não se evidencia qualquer dos vícios previstos no art. 410.º, n.º 2, do CPP. Com efeito, investigada que foi a materialidade sob julgamento, não se vê que a matéria de facto provada seja insuficiente para fundar a solução de direito atingida, não se vê que se tenha deixado de investigar toda a matéria de facto com relevo para a decisão final, não se vê qualquer inultrapassável incompatibilidade entre os factos julgados provados ou entre estes e os factos julgados não provados ou entre a fundamentação probatória e a decisão, e, de igual modo, não se detecta na decisão recorrida, por si e com recurso às regras da experiência comum, qualquer falha ostensiva na análise da prova ou qualquer juízo ilógico ou arbitrário. VII - Sem embargo, dando por adquirido que o STJ pode, mesmo de ofício, pronunciar-se sobre qualquer desrespeito pelas regras atinentes à escolha e medida da pena [no caso, tão apenas da pena unitária, face à medida das penas parcelares e por referência ao disposto nos arts. 432.º n.ºs 1, als. b) e c) e 2, e 400.º, n.º 1, al. e) e f), do CPP], vejamos. VIII - Nos termos do disposto no art. 77.º, do CP, a pena unitária abstracta situa-se entre o limite mínimo 6 anos, e o limite máximo de 15 anos e 6 meses de prisão, foi concretizada, nas instâncias, em 8 anos e 6 meses de prisão. IX - O art. 77.º, n.º 1, do CP, estabelece que o critério específico a usar na fixação da medida da pena única é o da consideração em conjunto dos factos e da personalidade do agente. X - Não tendo o legislador nacional optado pelo sistema de acumulação material (soma das penas com mera limitação do limite máximo) nem pelo da exasperação ou agravação da pena mais grave (elevação da pena mais grave, através da avaliação conjunta da pessoa do agente e dos singulares factos puníveis, elevação que não pode atingir a soma das penas singulares nem o limite absoluto legalmente fixado), é forçoso concluir que, com a fixação da pena conjunta, se pretende sancionar o agente, não só pelos factos individualmente considerados, mas também e especialmente pelo respectivo conjunto, e não como mero somatório de factos criminosos, mas enquanto revelador da dimensão e gravidade global do comportamento delituoso do agente, visto que a lei manda se considere e pondere, em conjunto (e não unitariamente), os factos e a personalidade do agente, como se o conjunto dos factos fornecesse a gravidade do ilícito global perpetrado. O todo não equivale à mera soma das partes e, além disso, os mesmos tipos legais de crime são passíveis de relações existenciais diversíssimas, a reclamar uma valoração que não se repete, de caso para caso. A este novo ilícito corresponderá uma nova culpa (que continuará a ser culpa pelo facto) mas, agora, culpa pelos factos em relação – afinal, a valoração conjunta dos factos e da personalidade, de que fala o Código Penal. XI - Na avaliação da personalidade– unitária – do agente relevará, sobretudo, a questão de saber se o conjunto dos factos é reconduzível a uma tendência ou, eventualmente, mesmo a uma “carreira” criminosa, ou tão-só a uma pluriocasionalidade que não radica na personalidade: só no primeiro caso, não já no segundo, será cabido atribuir à pluralidade de crimes um efeito agravante dentro da moldura penal conjunta. XII - Acresce que importará relevar o efeito previsível da pena sobre o comportamento futuro do agente (exigências de prevenção especial de socialização). Realce-se ainda que na determinação da medida das penas parcelar e única não é admissível uma dupla valoração do mesmo factor com o mesmo sentido: assim, se a decisão faz apelo à gravidade objectiva dos crimes está a referir-se a factores de medida da pena que já foram devidamente equacionados na formação das penas parcelares. Será, assim, o conjunto dos factos que fornece a gravidade do ilícito global perpetrado, sendo decisiva para a sua avaliação a conexão e o tipo de conexão que entre os factos concorrentes se verifique. Um dos critérios fundamentais em sede daquele sentido de culpa, numa perspectiva global dos factos, é o da determinação da intensidade da ofensa e dimensão do bem jurídico ofendido, sendo certo que assume significado profundamente diferente a violação repetida de bens jurídicos ligados à dimensão pessoal, em relação a bens patrimoniais. XIII - Por outro lado, importa determinar os motivos e objectivos do agente no denominador comum dos actos ilícitos praticados e, eventualmente, dos estados de dependência, bem como a tendência para a actividade criminosa expressa pelo número de infracções, pela sua permanência no tempo, pela dependência de vida em relação àquela actividade. Na avaliação da personalidade expressa nos factos é todo um processo de socialização e de inserção, ou de repúdio pelas normas de identificação social e de vivência em comunidade, que deve ser ponderado. XIV - O art. 77.º, n.º 2, do CP, por seu turno, estabelece que pena aplicável tem como limite máximo a soma das penas concretamente aplicadas aos vários crimes, não podendo ultrapassar 25 anos tratando-se de pena de prisão e 900 dias tratando-se de pena de multa; e como limite mínimo a mais elevada das penas concretamente aplicadas aos vários crimes. Será, assim, o conjunto dos factos que fornece a gravidade do ilícito global perpetrado, sendo decisiva para a sua avaliação a conexão e o tipo de conexão que entre os factos concorrentes se verifique. O concurso de crimes tanto pode decorrer de factos praticados na mesma ocasião, como de factos perpetrados em momentos distintos, temporalmente próximos ou distantes. Por outro lado, o concurso tanto pode ser constituído pela repetição do mesmo crime, como pelo cometimento de crimes da mais diversa natureza. Por outro lado, ainda, o concurso tanto pode ser formado por um número reduzido de crimes, como pode englobar inúmeros crimes. XV - Revertendo ao caso, não pode deixar de sublinhar-se a elevada gravidade, da conduta do recorrente, a justificar pelas penas parcelares concretizadas na instância e relativas ao objecto do recurso (homicídio qualificado, na forma tentada). Quanto à pena do cúmulo, afigura-se que, na ponderação conjunta dos factos e da personalidade do arguido recorrente, se mostra concretizada em medida adequada e proporcionada às circunstâncias de facto apuradas. Salienta-se o facto de as penas parcelares terem sido concretizadas em medida próxima dos correspondentes limites mínimos e de a pena única se ter estabelecido em medida ligeiramente inferior ao ponto médio da pena abstractamente aplicável. Vale, assim, por dizer que o exame da concreta medida da pena estabelecida na instância, suscitado pelo presente recurso, não deve aproximar-se desta, senão quando haja de prevenir-se e emendar-se a fixação de um determinado quantum em violação dos princípios e regras pertinentes, cumprindo precaver qualquer pena abusiva, relativamente a uma concreta pena que ainda se revele congruente e proporcionada. XVI - Na determinação da medida concreta da pena, as instâncias levaram em conta e ponderaram adequada e fundadamente, todas as circunstâncias concretas em que os crimes foram cometidos, nomeadamente quanto ao significativo grau de ilicitude do facto (inapelável foi a tentativa de eliminação directa de uma vida), considerando o modo de execução (tendo sido empregue uma energia criminosa significativa, tendo agido de uma forma pensada, mas incontida e sem percepção dos limites, não sabendo avaliar a dimensão da conduta que levou a cabo ), o valor (supremo) do bem jurídico violado – a vida – e as suas consequências, o dolo directo e intenso, (tendo o arguido agido em circunstâncias que fizeram com que a tensão ou pulsão dos instintos primários não tivesse siso vencida por uma solidez de personalidade que não podia, nem devia deixar de estar presente) na conduta do arguido anterior e posterior aos crimes, as condições pessoais e económicas do arguido (alguma inserção laboral) e os seus antecedentes criminais. XVII - Há que, como se acentuou, ponderar as exigências antinómicas de prevenção geral e de prevenção especial, em particular as necessidades de prevenção especial de socialização “que vão determinar, em último termo, a medida da pena”, seu “critério decisivo”, com referência à data da sua aplicação, tendo em conta as circunstâncias a que se refere o art. 71.º do CP, nomeadamente as condições pessoais do agente e a sua situação económica e a conduta anterior e posterior ao facto, especialmente quando esta tenha em vista a reparação das consequências do crime, que relevam por esta via. Destacam-se, no caso, nestas circunstâncias, as reveladoras de acentuadas exigências de prevenção especial, decorrentes do trajecto de vida do arguido e das suas condições pessoais, de anteriores condenações reveladoras da não sensibilidade às penas, o que não permite a formulação de um juízo razoável de prognose positivo de preparação para manterem uma conduta ilícita (como se diz na decisão recorrida : (…) denota fraca capacidade de descentração e consciência crítica procurando desvincular-se da mesma e atribuindo a factores externos, a sua origem. (…). XVIII - Assim, considerando os factos na sua globalidade, as circunstâncias anteriormente referidas e as qualidades de personalidade do arguido manifestada na sua prática, em que se destaca a violência de comportamento, devidamente circunstanciado e descrito no acórdão recorrido, e sem necessidade de mais considerandos, tudo ponderado em conjunto, como impõem os arts. 40.º, 71.º e 77.º, do CP, não se encontra fundamento que permita justificar a redução da pena aplicada, na base da consideração de esta não se mostrar adequada e proporcional à gravidade dos factos e às necessidades de prevenção e de socialização que a sua aplicação visa realizar (art. 40.º, n.º s e 2, do CP). | ||
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Decisão Texto Integral: | Proc.º 537/17.2PLLRS.L2. S1 Recurso penal
Acordam, precedendo conferência, na 5.ª Secção Criminal do Supremo Tribunal de Justiça
I. 1. No processo comum 537/17….. do Juízo Central Criminal …....., Comarca ..…., de entre outros, os arguidos AA[1], BB e CC foram submetidos a julgamento, após terem sido acusados da prática: - Em co-autoria, um crime de homicídio qualificado, na forma tentada, previsto e punível (p. e p.) pelos artigos 131.º, 132.º, n.ºs 1 e 2, alíneas e), h) e 1), 22.º, 23.º todos do Código Penal (CP), em concurso aparente com um crime de ofensa à integridade física grave qualificada, p. e p. pelos artigos 143.º, 144.º, alínea b), 145.º, n.º 1, alíneas a) e c) e n.º 2, por referência ao artigo 132.º, n.º 2, alíneas e), h) e 1), todos do CP (na pessoa de DD); - Em co-autoria, um crime de homicídio qualificado, na forma tentada, p. e p. pelos artigos 131.º, 132.º, n.ºs 1 e 2, alíneas e), h) e 1), 22.º, 23.º todos do CP, em concurso aparente com um crime de ofensa à integridade física qualificada, p. e p. pelos artigos 143.º, 145.º, n.º 1, alínea a) e n.º 2, por referência ao artigo 132.º, n.º 2, alíneas e), h) e 1), todos do CP (na pessoa de EE); - Em co-autoria, um crime de ofensa à integridade física qualificada, p. e p. pelos artigos 143.º, 145.º, n. º 1, alínea a) e n.º 2, por referência ao artigo 132.º, n.º 2, alíneas e), h) e 1), todos do CP (na pessoa de FF); - Em co-autoria, um crime de ofensa à integridade física qualificada, p. e p. pelos artigos 143.º, 145.º, n.º 1, alínea a) e n.º 2, por referência ao artigo 132.º, n.º 2, alínea h), todos do CP (na pessoa de GG). 2. Na sequência da anulação do 1.º acórdão, proferido em 1.ª Instância, pelo Tribunal da Relação ….. (TR….), realizou-se audiência e proferiu-se novo acórdão em que foi decidido, na parte ora relevante, condenar o arguido AA como: - co-autor material de um crime de homicídio qualificado, na forma tentada, p. e p. pelos artigos 131. °, 132.º, n.º s 1 e 2, alíneas h) e 1), 22.º, 23.º todos do CP, na pena de 6 (seis) anos de prisão (vítima DD); - co-autor material de um crime de homicídio qualificado, na forma tentada, p. e p. pelos artigos 131.º, 132.º, n.ºs 1 e 2, alíneas h) e 1), 22º, 23º todos do CP, na pena de 5 (cinco) anos e 9 (nove) meses de prisão (vítima EE); - co-autor material de um crime de ofensa à integridade física qualificada, p. e p. pelo artigo 143.º, 145.º n.º 1, alínea a) e n.º 2, por referência ao artigo 132.º, n.º 2, alíneas, h) e 1), todos do CP, na pena de 2 (dois) anos de prisão (vítima FF); - co-autor material de um crime de ofensa à integridade física qualificada, p. e p. pelo artigo 143.°, 145.°, n.º 1, alínea a) e n.º 2, por referência ao artigo 132.º, n.º 2, alínea h), todos do CP, na pena de 1 (um) ano e 9 (nove) meses de prisão (vitima GG); - nos termos do artigo 77.º do CP, operar o cúmulo jurídico entre as penas impostas e condenar o arguido AA na pena única de 8 (oito) anos e 6 (seis) meses. Mais foram condenados os arguidos: - BB como co-autor material de um crime de homicídio qualificado, na forma tentada, p. e p. pelos artigos 131.º, 132.º, n.ºs 1 e 2, alíneas h) e 1), 22.º, 23.º todos do CP, na pena de 5 (cinco) anos de prisão (vítima DD); como co-autor material de um crime de homicídio qualificado, na forma tentada, p. e p. pelos artigos 131.º, 132.º, n.ºs 1 e 2, alíneas h) e 1), 22.º, 23.º todos do CP, na pena de 4 (quatro) anos e 9 (nove) meses de prisão (vítima EE); como co-autor material de um crime de ofensa à integridade física qualificada, p. e p. pelo artigo 143.º, 145.º, n.º 1, alínea a) e n.º 2, por referência ao artigo 132.º, n.º 2, alíneas, h) e 1), todos do CP na pena de 1 (um) ano e 4 (quatro) meses de prisão (vitima FF); como co-autor material de um crime de ofensa à integridade física qualificada, p.e p. pelo artigo 143.º, 145.º, n.º 1, alínea a) e n.º 2, por referência ao artigo 132.º, n.º 2, alínea h), todos do CP na pena de 1 (um) ano e 3 (três) meses de prisão (vitima GG); e, nos termos do artigo 77.º do CP, operar o cúmulo jurídico entre as penas impostas e condenar o arguido BB na pena única de 7 (sete) anos de prisão; - e CC como co-autor material de um crime de homicídio qualificado, na forma tentada, p. e p. pelos artigos 131.°, 132.º, n.º s 1 e 2, alíneas h) e 1), 22.º, 23.º todos do CP, na pena de 5 (cinco) anos e 6 (seis) meses de prisão (vitima DD); como co-autor material de um crime de homicídio qualificado, na forma tentada, p. e p. pelos artigos 131.º, 132.º, n.ºs 1 e 2, alíneas h) e 1), 22.º, 23.º todos do CP, na pena de 5 (cinco) anos e 2 (dois) meses de prisão (vitima EE); como co-autor material de um crime de ofensa à integridade física qualificada, p. e p. pelo artigo 143.°, 145.º, n.º 1, alínea a) e n.º 2, por referência ao artigo 132.°, n.º 2, alíneas, h) e 1), todos do CP na pena de 1 (um) ano e 8 (oito) meses de prisão (vitima FF); como co-autor material de um crime de ofensa à integridade física qualificada, p. e p. pelo artigo 143.°, 145.º, n.º 1, alínea a) e n.º 2, por referência ao artigo 132.º, n.º 2, alínea h), todos do CP na pena de 1 (um) ano e 6 (seis) meses de prisão (vitima GG): operado, nos termos do artigo 77.° do CP, o cúmulo jurídico entre as penas impostas foi condenado na pena única de 7 (sete) anos e 6 (seis) meses de prisão;
3. Inconformados com esta decisão, vieram os arguidos AA, BB e CC interpor recurso da mesma para o TR…., que por acórdão de 14 de Abril de 2020, negou provimento aos recursos e confirmou o acórdão recorrido. 4. Deste acórdão veio o arguido AA interpôr recurso para este Supremo Tribunal de Justiça, apresentando as seguintes conclusões na sua motivação de recurso que se transcrevem: (…) 1. O Recorrente foi condenado pela prática de dois crimes de homicídio na forma tentada e dois crimes de ofensas corporais. 2. A prova produzida em audiência, nomeadamente a prova testemunhal e o vídeo que a corrobora, não permite entender os factos levados a juízo senão como uma rixa grupal, sendo certo que um dos grupos era de agentes que representavam a autoridade do Estado. 3. É no quadro dessa rixa que um dos assistentes é atingido por uma pedra com as consequências que constam dos autos. 4. A versão do Tribunal de que o Recorrente teria “desferido uma pancada” na cabeça do assistente é falsa. 5. Mas foi essencial para o Tribunal poder convocar o crime de homicídio na forma tentada. 6. Na verdade, o Tribunal recorrido, na senda da primeira instância, abdicou de detalhar a responsabilidade individual de cada agente na prática da infração, por via da imputação de uma situação de comparticipação, em que todos são responsáveis por tudo, e ficou, assim, impossibilitado de sindicar a culpa específica de cada um dos arguidos em termos de dolo eventual. 7. Na verdade, era preciso que o Tribunal indicasse os concretos meios de prova, para além do resultado, que permitissem aquilatar da previsão, por parte do Recorrente, da possível consequência do facto e, ainda, da sua conformação com esse eventual resultado. 8. As generalidades do Acórdão nesta matéria são insuficientes para que se possa considerar verificada a factualidade típica do homicídio na forma tentada, pelo que o Recorrente só poderá ser condenado, no que se refere aos agentes DD e EE, pelas ofensas corporais previstas e punidas nos arts. 143.º e 145.º do Código Penal, devendo, por isso, ser revogada a decisão recorrida e substituída por outra que, em cúmulo, condene o Recorrente a uma pena de prisão nunca superior a cinco anos. 9. Sem conceder, a pena aplicada ao recorrente é manifestamente exagerada, tendo em conta de que se trata de uma pessoa integrada social e familiarmente, e também com actividade profissional regular, pelo que se justifica a aplicação de uma pena, em cúmulo jurídico, não superior a cinco anos de prisão. Normas violadas – arts. 14.º, 131.º e 143.º todos do Código Penal. (…). 5. O recurso foi admitido por despacho de 15.09.2020. 6. O Magistrado do Ministério Público junto do TR…., na sua resposta, pugnou pela improcedência do recurso e a manutenção do acórdão recorrido, suscitando a questão prévia da incompetência do STJ para conhecer da matéria de facto, sendo neste segmento manifestamente improcedente. No mais, entendeu pela improcedência do recurso. 7. Subiram os autos ao Supremo Tribunal de Justiça, onde a Sra. Procuradora-Geral Adjunta emitiu parecer nos termos do disposto no artigo 416º, n.º 1, do CPP, no sentido da improcedência do recurso. 8. Cumprido o disposto no n.º 2, do artigo 417.º do CPP, nada foi dito. 9. Colhidos os vistos, de acordo com o exame preliminar, foram os autos presentes a conferência. II. 10. O âmbito do recurso delimita-se pelas conclusões da motivação (artigos 402.º, 403.º e 412.º, do CPP), sem prejuízo dos poderes de conhecimento oficioso quanto a vícios da decisão recorrida – que devem resultar directamente do texto desta, por si só ou em conjugação com as regras da experiência – e a nulidades processuais não sanadas, a que se refere o artigo 410.º, n.ºs 2 e 3, do CPP (acórdão de fixação de jurisprudência n.º 7/95, DR-I, de 28.12.1995), bem como quanto a nulidades da sentença (artigo 379.º, n.º 2, do CPP, com a alteração introduzida pela Lei n.º 20/2013, de 21 de Fevereiro). Tendo em conta as conclusões da motivação de recurso, as questões colocadas são as seguintes: Por seu turno, o MP no tribunal recorrido vem suscitar uma questão prévia sobre a limitação do recurso apenas à matéria de direito, sendo apenas esta que deve ser do conhecimento deste Tribunal. 11. Examinadas a motivação e as conclusões do recorrente, conclui-se que parte da sua argumentação se reconduz e confina, á discussão da matéria de facto. Tal questão é suscitada como questão prévia pelas Magistradas do Ministério Público junto do TR….. e deste Supremo Tribunal de Justiça, sobre a limitação do recurso apenas à matéria de direito, sendo apenas esta que deve ser do conhecimento deste Tribunal. Para tal argumenta(m) que, e cita-se: (…) Examinadas a motivação e as conclusões do recorrente, fácil se mostra concluir que parte da sua argumentação se reconduz e confina, à discussão da matéria de facto. Só que, e como é sabido, o STJ conhece apenas de direito (art. 434. ° do CPP). O objecto do recurso de revista tem de circunscrever-se pois, apenas, a questões de direito. As questões de facto são decididas definitivamente pelos Tribunais da Relação. O recurso é por isso, a esta luz, e neste segmento, manifestamente improcedente. (…) Ora, nos temos do art. 434.º do CPP, o recurso interposto para o STJ visa exclusivamente o reexame de matéria de direito, sem prejuízo da apreciação oficiosa dos vícios do art. 410. º do CPP. Sendo tal apreciação, por oficiosa, apenas do critério do Supremo Tribunal, quando considere que há motivos para conhecer dos referidos vícios, a invocação destes não pode constituir fundamento de recurso. E, de qualquer modo, também não vem invocado no recurso qualquer fundamento que se possa integrar em alguma das categorias que a lei de processo enuncia do referido artigo 410.°, n.º 2, do CPP. Discutindo apenas matéria de facto, o recurso é, assim, manifestamente improcedente, e deve ser rejeitado, como determina o art. 420, n.º 1 do CPP. (…). Pelo exposto, neste segmento, o recurso não é admissível, devendo ser rejeitado.”.
Com razão, tal questão. Com efeito, Tendo presente o objecto do recurso, tal como demarcado pelo recorrente, importa enquadrar o mesmo processualmente, em vista dos poderes de cognição do Supremo Tribunal de Justiça quanto à decisão sobre a matéria de facto levada nas instâncias (artigo 434.º, do CPP). O recurso interposto pelo arguido pode ser conhecido pelo Supremo Tribunal de Justiça, mas tão só, na medida em que se quadre no âmbito dos respectivos poderes de cognição. Com efeito, por força do disposto nos artigos 432.º, n.º 1, alínea b) e 434.º, do CPP, o Supremo Tribunal de Justiça pode apenas reexaminar a matéria de direito (sem prejuízo do conhecimento oficioso dos vícios previstos nos n.ºs 2 e 3, do artigo 410.º, do CPP que sejam evidenciados pela decisão recorrida), tal seja, não pode conhecer das questões inerentes ao julgamento sobre a matéria de facto, nem das questões que concernem à própria formulação da decisão de 1.ª instância (como as nulidades e os vícios de procedimento), que já não estão sob apreciação. Aliás, este regime de recurso para o Supremo Tribunal de Justiça efectiva, de forma adequada, a garantia do duplo grau de jurisdição, traduzida no direito de reapreciação da questão por um tribunal superior, quer quanto a matéria de facto, quer quanto a matéria de direito, consagrada no artigo 32.º, n.º 1, da Constituição[2], enquanto componente do direito de defesa em processo penal, reconhecida em instrumentos internacionais que vigoram na ordem interna e vinculam o Estado Português ao sistema internacional de protecção dos direitos humanos[3]. Como tem sido repetido pelo Tribunal Constitucional (TC), em jurisprudência firme, o artigo 32.º, n.º 1, da Constituição “não consagra a garantia de um triplo grau de jurisdição” ou de “um duplo grau de recurso”, “em relação a quaisquer decisões condenatórias”[4] . O recurso é por isso, a esta luz, e neste segmento, manifestamente improcedente. E este, de resto, o sentido da jurisprudência contida, entre outros, no Acórdão do STJ, de 16.10 2008[5], e por mais recente, no acórdão, do Supremo Tribunal de Justiça, de 27 de Novembro de 2019 (Proc. 232/16.0JAGRD.C1. S1). Pelo exposto, neste segmento, o recurso não é admissível, pelo que vai rejeitado, procedendo a questão prévia suscitada pelas Magistradas do Ministério Público. 12. Ademais, o arguido, neste seu recurso perante o Supremo Tribunal de Justiça, vem reeditar, na motivação, o alegado perante o Tribunal da Relação. Entende o Recorrente que esta decisão decorreu de uma errada interpretação da matéria de facto e de uma incorrecta aplicação do direito. Ora, como se tem repetidamente afirmado na jurisprudência deste Supremo Tribunal e na doutrina, os recursos judiciais não servem para conhecer de novo da causa. Os recursos constituem meios processuais destinados a garantir o direito de reapreciação de uma decisão de um tribunal por um tribunal superior, havendo que, na sua disciplina, distinguir dimensões diversas, relacionadas com o fundamento do recurso, com o objecto do conhecimento do recurso e com os poderes processuais do tribunal de recurso, a considerar conjuntamente[6]. O que significa que, verificados que se mostrem os fundamentos para recorrer (pressupostos da admissibilidade do recurso), o objecto do conhecimento do recurso delimita-se pelas questões identificadas pelo recorrente que digam respeito a questões que tenham sido conhecidas pelo tribunal recorrido ou que devessem sê-lo, com as necessárias consequências ao nível da validade da própria decisão, assim se circunscrevendo os poderes do tribunal de recurso, sem prejuízo do exercício, neste âmbito, dos poderes de conhecimento oficioso necessários e legalmente conferidos em vista da justa decisão do recurso. Como se tem insistido [7], o recurso constitui apenas um “remédio processual” que permite a reapreciação, em outra instância, de decisões sobre matérias e questões submetidas a decisão do tribunal de que se recorre. 13. Em síntese: feito o necessário saneamento e enquadrando a peça recursória em análise, esta tem por objecto um acórdão proferido em recurso pelo TR…. que confirmou a decisão da 1.ª instância “in totum” e aplicou, em cúmulo jurídico, pena de prisão superior a 8 anos, visando exclusivamente o reexame de matéria de direito, da competência deste tribunal (nos termos do disposto nos artigos 432.º, n.º 1, al. b) e c) e 2, 434.º e 400.º, n.º 1, alíneas e) e f), todos do CPP), nos termos supra expostos. 14. São os seguintes os factos provados nas instâncias, que assim se mostram estabelecidos e assentes: (…) Discutida a causa provou-se que: 1. No dia 03.07.2017, os agentes da PSP DD, EE, FF e HH deslocaram-se, em missão de serviço de remunerado, no desempenho das suas funções de agentes de autoridade e devidamente uniformizados, ao ….., à Rua ……, área desta comarca. 2. A fim de assegurar a manutenção da segurança e ordem pública numa festa….., organizada pela …….., que ali se realizava, onde participavam cerca de duzentas pessoas. 3. Nas mesmas circunstâncias e local encontravam-se todos os arguidos, os quais integravam um grupo composto por, pelo menos, 10 indivíduos. 4. Pelas 00h30m, encontrando-se os referidos agentes policiais no recinto da festa, os arguidos AA e BB, que integravam o grupo acima referido, mantinham uma postura provocatória com os elementos policiais. 5. Os arguidos AA e BB aproximaram-se dos agentes da PSP colocando-se a cerca de 3 a 5 metros de distância do agente DD mantendo um olhar fixo ao mesmo e postura provocatória, tendo o arguido AA avançado na sua direcção. 6. E, quando já se encontrava a cerca de meio metro de si, o arguido AA parou e de frente para o agente DD disse-lhe, em tom desafiador, “’tás a olhar para mim para quê, ó bófia... porque é que estás a olhar assim para mim?”. 7. Em acto contínuo, aproximou-se ainda mais do agente DD pelo que este levantou o braço, tocando-lhe no peito, para o afastar. 8. Nessa altura, os arguidos BB, AA, II e CC acompanhados dos restantes indivíduos que integravam o grupo, avançaram na direcção do agente DD com o claro desiderato de o agredir. 9. Assim, de modo conjunto e sempre de acordo com a mesma vontade, os arguidos BB, AA, II e CC e os demais elementos do grupo cuja identificação não se logrou apurar, agindo de modo uniforme, rodearam-no e empurraram-no, tendo o arguido AA desferido um forte empurrão no corpo do agente DD, logrando a sua imediata queda no solo. 10.O agente DD veio a cair no interior de uma barraca e quando se levantou foi atingido por um objecto não identificado na cabeça lançado ou pelo arguido CC ou pelo arguido II, não tendo sido possível identificar qual dos o lançou. Contudo, tal impacto fez com que o agente caísse ao chão. O arguido AA, estando o agente DD caído no chão, desferiu-lhe um violento murro na boca e nariz, provocando-lhe fortes dores 11. Acto contínuo, quando tentava socorrer o seu colega, o agente EE foi rasteirado e projectado ao solo por um dos elementos do grupo, enquanto um outro comparsa lhe desferia vários socos e pontapés, atingindo-o em toda a zona do corpo, incluindo a cabeça. 12. Pontapés que em simultâneo eram também infligidos pelo arguido CC, atingindo o corpo do agente EE que, desamparado, se mantinha caído no chão. 13. Tendo o agente DD conseguido levantar-se e procurado entrar na roda onde o EE estava a ser agredido impedido de ali aceder tendo sido rasteirado pelo arguido CC tendo caído de quatro, altura em que levou um pontapé do II. 14. (...) 15. O arguido AA, por sua vez, fazendo uso de uma pedra da calçada de grandes dimensões, arremessou a mesma assim lhe desferindo uma pancada, atingindo o agente DD na parte esquerda da cabeça. 16. Apesar da pancada com que foi atingido, o agente DD ainda esboçou perseguição ao arguido AA, porém, sentindo-se combalido, agarrou-se ao tronco de uma árvore para se manter em pé, 17. Nesse momento, o arguido BB desferiu-lhe um violento pontapé na cabeça, atingindo-o com maior incidência na parte lateral esquerda, o que o fez cair ao chão inanimado. 18. Vendo o seu colega DD prostrado no solo, o agente EE levantou-se e dirigiu-se na direcção daquele, 19. Porém, foi impedido de se aproximar do mesmo por um dos elementos que constituía o grupo que, violentamente, lhe arremessou uma pedra da calçada que atingiu o agente EE na face, o qual começou a sangrar abundantemente, com perda imediata dos sentidos seguido de desmaio. 20. O agente FF aproximou-se, também, do agente DD quando alguém daquele grupo arremessou na sua direcção uma pedra da calçada que o atingiu na omoplata do lado direito, provocando-lhe fortes dores. 21. Acto contínuo, o mesmo indivíduo que fazia parte do grupo e que havia arremessado a pedra mencionada em 19, lançou outra pedra da calçada, desta vez atingindo GG, cidadão que ali se encontrava junto do agente DD, provocando-lhe pancada violenta na zona direita da cabeça com imediato sangramento do nariz. 22. (...). 23. Por causa das agressões de que foram alvo, os agentes DD e EE necessitaram de tratamento hospitalar, para onde foram dirigidos de imediato. 24. Os agentes DD e EE deram entrada no Hospital ….. pelas 01h38 e 01h29m, respectivamente. 25. O agente FF foi assistido pelos Bombeiros e deu entrada no Hospital ... pelas 12h31m. 26. O ofendido GG foi assistido no Hospital ……. onde deu entrada pelas 01h34. 27. Em consequência directa e necessária das agressões narradas o agente da PSP DD sofreu as lesões melhor descritas nos elementos clínicos de fls. 104 e exame médico de fls. 653 e 831, cujo teor se dá aqui por integralmente reproduzido, destacando-se traumatismo crânio-encefálico com perda de conhecimento, fractura dos ossos próprios do nariz com desvio do septo, cervicalgia, escoriações nos dedos da mão direita, escoriações da região anterior do joelho direito, submetido a intervenção cirúrgica efectuando rinosepnoplastia. 28. Tais lesões demandaram ao agente DD um período de 261 dias de doença com 261 dias de incapacidade para o trabalho profissional, que o afectaram de maneira grave na sua capacidade de trabalho, as capacidades intelectuais, de procriação ou fruição sexual, ou possibilidade de utilizar o corpo, sentidos ou linguagem. 29. Em consequência directa e necessária das agressões narradas o agente da PSP EE sofreu as lesões melhor descritas nos elementos clínicos de fls. 101 e 830 e no exame médico de fls. 828, cujo teor se dá aqui por integralmente reproduzido, destacando-se traumatismo na hemiface esquerda, com rebordo orbitrário esquerdo afundado, afundamento do maxilar esquerdo, ferida contusa pálpebra inferior e supra ciliar, ferida contusa supra ciliar e pálpebra inferior esquerda com hematoma perio orbitario, fractura da arcada zigmática esquerda, fez cirurgia com redução e osteossintese, as quais demandaram um período de 180 dias de doença com 180 dias de incapacidade para o trabalho profissional. 30. Em consequência directa e necessária das agressões narradas o agente da PSP FF sofreu as lesões melhor descritas nos elementos clínicos de fls. 511 e exame médico de fls. 651, cujo teor se dá aqui por integralmente reproduzido, destacando-se cicatriz lesão na omoplata direita 22 por 18 mm nacarada estabilizada não dolorosa, as quais lhe demandaram um período de 21 dias de doença sem incapacidade para o trabalho profissional. 31. Em consequência directa e necessária das agressões narradas o ofendido GG sofreu as lesões melhor descritas nos elementos clínicos de fls. 99 e exame médico de fls. 649, cujo teor se dá aqui por integralmente reproduzido, destacando-se escoriação temporal direita e hepostesias na hemi face direita, fractura da arcada zigmática direita, epiremia da região parietal direita, cicatriz de 12 por 1, déficit de mobilidade da mandíbula na extensão máxima, as quais lhe demandaram um período de 21 dias de doença sem incapacidade para o trabalho profissional. 32. Os arguidos BB, AA, II e CC, em comunhão de esforços e vontades com os demais indivíduos que constituíam o grupo onde se integravam, fazendo uso da respectiva superioridade numérica em se encontravam relativamente às vítimas, agiram com a firme motivação de afrontar e de atentar contra a integridade física e a vida dos agentes de autoridade que ali se encontravam no exercício das suas funções policiais, qualidade e exercício profissional que todos os arguidos e demais indivíduos conheciam. 33. Sabendo da qualidade profissional dos agentes e do respectivo exercício no local, agiram os arguidos em absoluto desprezo e desconsideração pelas suas funções enquanto garante da manutenção da ordem pública e segurança da comunidade. 34. Ao agirem do modo narrado, ao desferirem pontapés no corpo e na cabeça dos agentes policiais DD e EE, todos os arguidos não ignoravam que tais condutas eram susceptíveis de lhes provocar lesões cerebrais com perda de sentidos ou perigo para a vida. 35. Ao desferirem, em conjugação de esforços e de vontades, diversas pancadas usando pés, mãos e pedras na cabeça e no corpo dos agentes DD e EE, sabiam que iriam provocar as lesões e o mal-estar físico e psíquico de que aqueles vieram a sofrer, resultado que desejaram e que lograram alcançar e admitiram como possível que tal comportamento fosse susceptível de lhes causar a morte, resultado que aceitaram e que só não se verificou por circunstâncias alheias à sua vontade. 36. Quiseram os arguidos ao agir da forma narrada atingir a integridade física do agente FF e do cidadão GG, provocando-lhes dores e as lesões referidas, o que conseguiram. 37. Ademais, bem conheciam os arguidos as características dos instrumentos de que se muniram e utilizaram, sabendo da potencialidade das mesmas para empregadas da forma como o fizeram, causar no corpo dos visados, graves lesões, até capazes de causar a morte. 38. Os arguidos vincularam-se todos entre si, com os restantes elementos do grupo mencionado, mediante uma resolução comum sobre o facto, assumindo cada qual dentro do plano conjunto uma tarefa parcial, mas essencial na execução de todo o processo. 39. Agiram os arguidos de forma livre, deliberada e consciente bem sabendo que todas as suas condutas eram proibidas e punidas por lei penal. 40. Em consequência da conduta dos arguidos BB, AA, II e CC, a PSP suportou até ao momento a seguinte despesa no valor de 12.449,46 €: A - Agente DD, incapacitado para o serviço por um período de 114 dias: Referente a vencimentos e abonos (referente ao período de incapacidade) no valor de 5.959,79 €uros; Despesas de saúde suportadas pelo sinistrado, no valor de 407,93 €uros; B - Agente EE, incapacitado para o serviço por um período de 114 dias: Referente a vencimentos e abonos (referente ao período de incapacidade) no valor de 5.747,63 €; Despesas de saúde suportadas pelo sinistrado, no valor de 334,11 €uros; 41. Logo após o sucedido o assistente DD foi conduzido para o Hospital …... padecendo de fortes dores. 42. Tendo-lhe sido detectado traumatismo crânio encefálico com perda de conhecimento, fractura dos ossos próprios do nariz com desvio do septo, cervicalgia, escoriações nos dedos da mão direita, escoriações na região anterior do joelho direito, submetido a intervenção cirúrgica efectuando rinosepnoplastia. 43. Manteve-se internado sob observação durante vários dias. 44. Após o sucedido o demandante foi sujeito a vários tratamentos, exames e medicação. 45. Teve e ainda tem que fazer fisioterapia. 46. O assistente despendeu o valor total de € 987,45 (Novecentos e oitenta e sete euros e quarenta e cinco cêntimos) relativo a despesas de saúde. 47. Por outro lado, em função das lesões em causa, o assistente sofreu uma diminuição da sua capacidade de trabalho, apresentando uma Incapacidade Temporária Absoluta (ITA) facto que o impossibilitou de regressar até à da dedução do pedido de indemnização civil (05.12.2017). 48. O Assistente exercia as funções de agente da PSP e realizava Serviços Gratificados, auferindo um salário base de €1.020 (mil e vinte euros) mensais, mais €300 (Trezentos euros) mensais a título dos Serviços Gratificados que realizava 49. Desde os factos supra descritos o assistente permanece impossibilitado de regressar ao serviço tendo deixado de auferir a quantia média mensal de 1.500,00€ (Mil e quinhentos euros) correspondente a 5 meses sem trabalhos gratificados (de 03 de Julho de 2017 até 30 de Novembro de 2017). 50. Para além da verba supra o assistente está privado da quantia média mensal de 300,00€ que receberia a título de serviço remunerado, vulgarmente denominado por gratificado, até se apresentar ao serviço; 51. O que nunca deverá acontecer antes dos 261 dias, ou seja, durante mais, pelo menos, 100 dias; 52. Sendo expectável que, durante o período de convalescença, o assistente deixe de auferir a quantia de 1.500,00€ (mil e quinhentos euros); 53. Em virtude do sucedido, o assistente sofreu traumatismo crânio encefálico com perda de conhecimento, fractura dos ossos próprios do nariz com desvio do septo, cervicalgia, escoriações nos dedos da mão direita, escoriações na região anterior do joelho direito, submetido a intervenção cirúrgica efectuando rinoseptoplastia; 54. A gravidade das lesões foi de tal modo intensa que o período de convalescença se prolongou não tendo, até à data da dedução do pedido de indemnização civil, regressado ao serviço; 55. Causando-lhe um enorme transtorno e perturbação, quer porque afectou o seu ritmo de vida e hábitos adoptados, quer porque tais tratamentos, realizados numa zona sensível e delicada como é o crânio e o septo nasal, causaram lhe enorme sofrimento. 56. Acresce que depois do sucedido, o ora demandante apresenta dores de cabeça frequentes, maior cansaço, um enorme desconforto quando está deitado por períodos mais longos, incómodos e dores que se fazem sentir especialmente aquando das variações climatéricas, perturbações essas que se manterão para sempre. 57. O que lhe causa uma diminuição da capacidade para o trabalho e redução na qualidade de vida. 58. Tendo, inclusive, ficado impedido de aceder ao curso de chefe da PSP que havia candidatado, o que lhe provocou um acentuado estado de frustração e angústia. 59. Por outro lado, a cicatriz/marca no nariz, produz um dano estético considerável, que o irá perseguir para o resto da sua vida assim como as lesões na dentição. 60. Tal circunstância envergonha o assistente que, assim, o faz sentir inferiorizado do ponto de vista estético. 61. O assistente ficou visivelmente perturbado com o sucedido. 62. Traduzindo-se em vergonha, desgosto, pesar, tristeza e abatimento psicológico. 63. Sentiu-se e ainda se sente ofendido na sua honra e consideração. 64. Nos dias imediatamente posteriores aos factos o assistente chorava compulsivamente, com sentimento de raiva e impotência pelas agressões que tinha sido alvo; 65. Tais danos afectaram com grande repercussão no seu bem-estar, nas suas expectativas, na capacidade e qualidade dos seus relacionamentos pessoais, na auto-estima, na liberdade de movimentos. 66. Não tendo saído à rua sozinho nos meses imediatamente posteriores aos factos, com receio de sofrer algum golpe nas zonas afectadas. 67. Deixando de praticar desporto como era frequente até à data dos factos. 68. Evitando estar em espaços públicos. 69. Logo após o sucedido o assistente EE foi conduzido para o Hospital …… padecendo de fortes dores. 70. Tendo-lhe sido detectado traumatismo na hemiface esquerda, com rebordo orbitário esquerdo afundado, afundamento do maxilar esquerdo, ferida contusa pálpebra inferior e supraciliar, ferida contusa supraciliar e pálpebra inferior esquerda com hematoma peri orbitário, fractura da arcada sigmática esquerda, fez cirurgia e osteossíntese, as quais demandaram um período de 180 dias de doença com 180 dias de incapacidades para o trabalho profissional. 71. Manteve-se internado sob observação durante vários dias. 72. Após o sucedido o demandante foi sujeito a vários tratamentos, exames e medicação. 73. Teve e ainda tem que fazer fisioterapia. 74. O assistente despendeu o valor total de € 647,38 (Seiscentos e quarenta e sete euros e trinta e oito cêntimos) relativo a despesas de saúde; 75. Por outro lado, em função das lesões em causa, o assistente sofreu uma diminuição da sua capacidade de trabalho, apresentando uma Incapacidade Temporária Absoluta (ITA) facto que o impossibilitou de regressar até à data da dedução do pedido de indemnização civil (05.12.2017); 76. O assistente exercia as funções de agente da PSP e realizava Serviços Gratificados, auferindo um salário base de €1.020 (mil e vinte euros) mensais, mais €300 (Trezentos euros) mensais a título dos Serviços Gratificados que realizava; 77. Desde os factos supra descritos o assistente permanece impossibilitado de regressar ao serviço tendo deixado de auferir a quantia média mensal de 1.500,00€ (Mil e quinhentos euros) correspondente a 5 meses sem trabalhos gratificados (de 03 de Julho de 2017 até 30 de Novembro de 2017); 78. Para além da verba supra o assistente está privado da quantia média mensal de 300,00€ que receberia a título de serviço remunerado, vulgarmente denominado por gratificado, até se apresentar ao serviço o que nunca deverá acontecer antes do 180° dia ou seja, durante mais, pelo menos, 30 dias por reporte a 05.12.2017; 79. Sendo expectável que, durante o período de convalescença, o assistente deixe de auferir a quantia de 300,00€ (Trezentos euros); 80. Em virtude do sucedido sub judice, o assistente sofreu traumatismo na hemiface esquerda, com rebordo orbitário esquerdo afundado, afundamento do maxilar esquerdo, ferida contusa pálpebra inferior e supraciliar, ferida contusa supraciliar e pálpebra inferior esquerda com hematoma periorbitário, fractura da arcada sigmática esquerda, fez cirurgia e osteossíntese. 81. A gravidade das lesões foi de tal modo intensa que o período de convalescença se prolongou não tendo, até à presente data, regressado ao serviço por reporte a 05.12.2017; 82. Causando-lhe um enorme transtorno e perturbação, quer porque afectou o seu ritmo de vida e hábitos adoptados; 83. Quer porque tais tratamentos, realizados numa zona sensível e delicada como é o crânio e os olhos, causaram lhe enorme sofrimento. 84. Acresce que depois do sucedido, o ora demandante apresenta dores de cabeça frequentes, maior cansaço, um enorme desconforto quando está deitado por períodos mais longos, incómodos e dores que se fazem sentir especialmente aquando das variações climatéricas, perturbações essas que se manterão para sempre. 85. O que lhe causa uma diminuição da capacidade para o trabalho e redução na qualidade de vida. 86. O que lhe provocou um acentuado estado de frustração e angústia. 87. Por outro lado, as dores que sente nos olhos impossibilitam o ofendido de ler por períodos mais prolongados. 88. Tal circunstância envergonha o assistente que, assim, o faz sentir inferiorizado do ponto de vista estético. 89. O assistente ficou visivelmente perturbado com o sucedido. 90. Traduzindo-se em vergonha, desgosto, pesar, tristeza e abatimento psicológico. 91. Sentiu-se e ainda se sente ofendido na sua honra e consideração. 92. Nos dias imediatamente posteriores aos factos o assistente chorava compulsivamente com sentimento de raiva e impotência pelas agressões que tinha sido alvo. 93. Tais danos afectaram com grande repercussão no seu bem-estar, as suas expectativas, a capacidade e qualidade dos seus relacionamentos pessoais, a sua auto- estima, a sua liberdade de movimentos. 94. Não tendo saído à rua sozinho nos meses imediatamente posteriores aos factos, com receio de sofrer algum golpe nas zonas afectadas. 95. Deixando de praticar desporto como era frequente até à data dos factos. 96. Evitando estar em espaços públicos. 97. Sequelas psíquicas que ainda perduram. 98. Em razão das agressões de que foi alvo, FF recebeu tratamento hospitalar no Hospital ….., em episódio de urgência e duas incidências radiográficas no ombro, cujo custo ascendeu a 92,75 € o qual foi suportado pela Sociedade Gestora do Hospital …… S.A.; 99. Em razão das agressões de que foram alvo os assistentes EE e DD, o Centro Hospitalar de ……, no desempenho da sua actividade e obrigação legal de assistência médica forneceu: a) Ao assistente DD a. cuidados médicos em consulta de urgência nos dias 03.07.2017, 04.07.2017, 05.07.2017, 08.07.2017 e 11.07.2017, e meios complementares de diagnóstico e terapêutica, nos dias 03.07. (RX coluna dorsal, RX punho, Rx joelho, estudo axial da rótula, TC crânio, TC maxilofacial, TC coluna cervical e análises clínicas), 04.07.2017 (TC crânio) e 05.07.2017 (injecções por via IM) no valor de 876,82 €; b. Cuidados médicos em consulta de otorrinolaringologia, nos dias 18.09.2017, 19.10.2017 e 24.10.2017, e meios complementares de diagnóstico e terapêutico nos dias 19.10.2017 (Rx tórax e EGG simples de 12 derivações), no valor de 139,84 €; c. Cirurgia ambulatória no âmbito de otorrinolaringologia no dia 21.10.2017 no valor de 1.343,58 €; d. Consulta externa de otorrinolaringologia nos dias 29.10.2017 e 05.11.2017 no valor de 65,10 €; b) Ao assistente EE: a. Cuidados de saúde em episódio de internamento, no serviço de cirurgia plástica de 03.07.2017 a 05.07.2017 no valor de 2.979,64 €; b. Cuidados médicos em consulta externa de cirurgia plástica e recuperação maxilofacial nos dias 10.07.2017, 21.07.2017 e 16.08.2017 e meios complementares de diagnóstico e terapêutica nos dias 10.07.2017 (extracção de pontos incluindo penso simples) e 10.08.2017 (TC maxilo-facial) no valor de 167.60 €; c. Consulta externa de cirurgia plástica em 05.10.2018 no valor de 31 € c). Ao ofendido GG a. Cuidados médicos em consulta de urgência, nos dias 03.07.2017, e 10.07.2017 e em consulta externa de cirurgia plástica e reconstrução maxilo facial, nos dias 13.07.2017, 19.07.2017, 02.08.2017, 30.08.2017 e 17.10.2017, bem como meios complementares de diagnóstico e terapêutica nos dias 10.07.2017 (Rx órbita, RX ossos da face e RX da mandibula), 10.11.2017 (TC maxilo-facial) e 12.10.2017 (TC maxilo- facial), no valor de 529,34 €; b. Cuidados médicos, em consulta externa de cirurgia plástica e reconstrução maxilo-facial no dia 14.11.2017 no valor de 31 €. Dos antecedentes e das condições sociais dos arguidos Do arguido AA Do CRC do arguido consta: a) Uma condenação proferida em 23.03.2012 pela …… Vara de Competência Mista do Tribunal de Família, Menores e Comarca ….., no âmbito do NUIPC 270/11…., transitada em 02.05.2012, pela comissão, em 21.02.2011, de um crime de roubo p. e p. pelo art 210º nº 1 e 2 al. b) do Código Penal na pena de 4 anos e 6 meses de prisão e um crime de detenção de arma proibida p. e p. pelo artº 86º nº 1 al. c) da Lei 5/2006, de 23.02., na pena de 1 ano e 10 meses de prisão, e, em cúmulo jurídico, 5 anos de prisão com regime de prova, pena esta extinta nos termos do artº 57º do Código Penal; b)Uma condenação proferida em 29.03.2017 pelo Juízo Local de …. de Pequena Criminalidade do Tribunal da Comarca ……, no âmbito do NUIPC 572/16…., transitada em 08.05.2017, pela comissão, em 07.07.2016, de um crime de condução de veículo em estado de embriaguez p. e p. pelo artº 292º nº 1 do Código Penal na pena de 60 dias de multa à razão diária de 5 €; AA, natural de …., é oriundo de uma família de fracos recursos socio-económicos e culturais, tendo sido educado num contexto precário, pobre em transmissão de regras e valores. O agregado era constituído pelos progenitores e o arguido. Aqueles dedicavam-se à…….., vivendo um quotidiano centrado na satisfação das necessidades básicas. O ambiente familiar caracterizou-se pela existência de laços de reciprocidade afectiva. Quando AA contava 4 anos de idade, o agregado deslocou-se para Portugal, em busca de melhores condições de vida. Fixaram-se sempre em meios socio-comunitários desfavorecidos, conotados com a existência de problemáticas sociais relevantes e elevado índice de marginalidade e delinquência, tendo sido realojados na ….…... Em termos de sociabilidades, o quotidiano do arguido foi precocemente marcado pela integração em grupos de pares maginais, oriundos do seu meio de residência, relativamente aos quais demonstrou permeabilidade. Terá sido neste contexto que se iniciou, por volta dos 16 anos, no consumo de haxixe, hábito que refere ter mantido até ao ano transacto. O arguido iniciou os estudos numa escola próxima de casa, experimentando algumas dificuldades de adaptação, registando uma primeira reprovação no 1° ano de escolaridade. A partir do 5º ano de escolaridade, passou a revelar crescente desmotivação e absentismo prolongado, que veio a comportar várias reprovações, aparentemente facilitadas com a convivência com o grupo de pares da área de residência. Mais tarde, efectuou um curso de formação profissional de instalação e ……… que lhe conferiu a equivalência ao 9º ano de escolaridade. Abandonou o sistema de ensino por volta dos 20 anos e emigrou para …., onde começou a trabalhar na …….., à semelhança do pai e onde se manteve até 2015. Após o regresso ao nosso país, exerceu a actividade de ….. para uma …… de que foi dispensado poucos dias antes do presente processo, por motivos de redução pessoal. AA regista contactos anteriores por crime de detenção de arma proibida e roubo agravado, tendo sido condenado numa pena de 5 anos de prisão, suspensa na sua execução por período idêntico com regime de prova até Maio de 2017 que decorreu de forma irregular. O arguido esteve ainda sujeito a duas suspensões provisórias do processo com injunção de prestação de serviços de interesse público, por crimes de condução em estado de embriaguez e consumo de estupefacientes. À data dos factos, o arguido residia com a progenitora, a avó e dois irmãos na morada presente nos autos. O progenitor encontrava-se emigrado em ….. O relacionamento familiar era próximo e de entreajuda, desenrolando-se num registo aparentemente funcional. O arguido encontrava-se inactivo há cerca de um mês, após a empresa onde trabalhava não ter ganho o concurso para continuar a operar no…., centrando-se o seu quotidiano no convívio com pares do seu meio residencial e na procura de emprego. Há referências a consumos de álcool excessivo, em contexto de convívio com pares, efectuados ao fim de semana. Actualmente, reside apenas com a avó e com os dois mais novos uma vez que a progenitora emigrou, há cerca de 2 meses, para ….. onde se encontra o marido. É ele que tem assegurado, desde então, os cuidados diários à avó que, dada a idade avançada, apresenta alguns problemas de saúde. Em termos pessoais, o arguido apresenta-se como um indivíduo com facilidades ao nível da comunicação e do relacionamento interpessoal, mostrando-se afável no trato, centrando o seu discurso num registo de desejabilidade social. Apresenta dificuldades em antever as consequências dos seus actos bem como permeabilidade à influência do grupo de pares marginal. A nível familiar, não se perspectivam alterações significativas, beneficiando de apoio por parte da família, que assume uma atitude protectora relativamente ao arguido. AA refere que assim que sua situação jurídico-penal estiver resolvida tem uma proposta de trabalho, através de um amigo, para uma empresa de …..……. O arguido encontra-se sujeito à medida de obrigação de permanência na habitação desde 13 Dez 2017, tendo, até ao momento, revelado capacidade de adaptação às regras a que se encontra sujeito. Relativamente à matéria constante na acusação, denota fraca capacidade de descentração e consciência crítica procurando desvincular-se da mesma e atribuindo a factores externos, a sua origem. Ainda assim, adianta conceber uma eventual condenação privativa da liberdade atendendo aos seus antecedentes. O processo de socialização do arguido decorreu num contexto de precariedade social e económica. Após a sua vinda para Portugal, o agregado fixou residência em meios socialmente desfavorecidos e problemáticos ao nível da marginalidade, sofrendo influências negativas da comunidade envolvente. A sua adaptação ao nosso país processou-se de forma deficitária e num contexto de integração de um grupo de pares com características desviantes, com quem passou a consumir haxixe e praticar alguns ilícitos e a privilegiar o convívio, facilitando o contacto com o sistema da administração da justiça. Neste contexto, a manutenção de sociabilidades pró-criminais, aliada às características pessoais do arguido, nomeadamente a deficiente capacidade de raciocínio crítico e de autocontrolo, apresentam-se como factores de risco a ter em consideração, acentuados pelo facto dos anteriores contactos com o sistema de administração da justiça não terem tido um efeito suficientemente dissuasor. Estes riscos surgem potenciados pela circunstância do arguido se manter integrado num meio social muito problemático onde mantém referências. Como factor de protecção, destacasse a ligação à família, em especial à avó, a quem presta cuidados diários. Factos não provados Não se provou que: a) Depois de atingido com um soco no nariz pelo arguido AA, os restantes indivíduos que integravam o grupo desferiram-lhe ainda, em conjunto, pontapés contra o corpo, atingindo-o com maior incidência na região da cabeça. b). Tendo o agente DD conseguido levantar-se e procurado com o seu bastão policial evitar novas agressões, foi empurrado e rasteirado pelo arguido BB c). Estando prostrado no chão, os arguidos II e BB, que integravam o grupo mencionado, desferiram vários pontapés por todo o corpo com maior incidência na região da cabeça do agente DD. d) Depois de assim terem actuado, os arguidos e os demais elementos do grupo, lograram fuga do local, dirigindo-se para locais distintos e) O arguido JJ praticou qualquer um dos factos descritos na acusação; f). Em razão dos factos, a PSP suportou o custo de uma urgência hospitalar no valor de 92,75 Euros referente ao agente FF. (…). 15. A decisão em matéria de facto encontra-se fundamentada nos seguintes termos: (…) O Tribunal formou a sua convicção e me toda a matéria de facto analisada de forma concatenada e com recurso a juízos de experiência comum. Assim, todos os arguidos, com excepção do arguido JJ se remeteram ao silêncio e o JJ declarou não haver participado nos factos arribados contra si pese embora haja estado na festa. Ouvido o assistente DD este foi claríssimo nas suas declarações tendo deposto de uma forma que não deixou, seja pela solidez do depoimento, seja pela sua conjugação com outros meios de prova, designadamente o vídeo junto na contracapa do volume 3 e os reconhecimentos operados, quaisquer dúvidas ao Tribunal. Referiu o assistente que no dia 03.07.2018 estava de serviço remunerado no ... Estava ele, o EE, o chefe FF e o HH (este último a alguns metros). A dada altura o AA colocou-se, ele, o BB e outro, a cerca de 5 metros do depoente e dos colegas que consigo estavam. Durante cerca de 5 minutos os dois arguidos e a terceira pessoa só olhavam para ele e para os colegas e, a dada altura, o AA avançou direito a ele e perguntou lhe “o que é que tu queres, ó bófia?” Ele respondeu “O que é que queres não. Eu olho para ti como olho para toda a gente Tu diz' me o que queres” O AA avançou mais e foi aí que o depoente meteu as mãos no peito do arguido e o empurrou para trás. Quando o fez veio o BB pela esquerda e empurra-o. Alguém vem pela direita e empurrai e ele cai ao chão. Apercebe' se então que há um grupo de indivíduos à sua volta. É empurrando para dentro de uma barraquinha e entra pelo chão. Quando se levanta saca do bastão e é quando passa pelo II e pelo CC. Quando passa ao lado deles há um desses dois que lhe bate. Sabe que foi um deles porque os demais (os três iniciais) estavam à sua frente. Não sabe qual dos dois o atingiu mas foi ao chão. Deitado no chão tentou levantasse e quando estava levantasse levou um soco na boca e no nariz do AA. Foi então que viu o agente EE de costas, no chão e rodeado de indivíduos, a levar pontapés por todo o corpo sendo um dos indivíduos que agredia o arguido CC. Esta descrição respeita aos factos constantes de 8 a 9 e que levaram ao douto Tribunal Superior a considerar existir contradição e falta de fundamentação quanto a estes. Competindo a esta instância apenas dissipar quaisquer dúvidas que assaltem o Tribunal superior dir-se-á: Como ressalta das declarações do assistente DD existiu um grupo de indivíduos que se acercaram dos agentes da PSP. Vamos seguir, passo a passo, as declarações do assistente gravadas na aplicação media studio e acessível no citius, incluindo no Tribunal Superior, ficheiro …._….._ …..wmw, as quais, repete-se não suscitaram quaisquer dúvidas a este Tribunal O assistente diz que estava de gratificado à festa. A dada altura um grupo de indivíduos onde se encontrava o AA (3’22”) parou a cerca de 5 metros dele. O AA estava na companhia de dois indivíduos sendo um deles o BB e um outro (510”). Reconhece os dois indivíduos. O AA avança (5’28”). O assistente empurra o AA para trás quando ele avança para ele e o assistente lança-o para trás (6’40”). O BB surge pela esquerda do assistente (7’20”) e o assistente empurra-o (7’40”), e alguém vem pela direita e empurram na zona do ombro/costas e empurra-o sendo projectado ao chão (8’20”). Já no chão vê um grupo de indivíduos à volta dele (9’02”). Nesta altura é empurrado para dentro de uma barraquinha para onde entra (9’50”). Quando se levanta tira o bastão e vai tentar interceptar alguém (10’09”). Quando sai da barraca os arguidos II e CC - que reconhece de anteriores serviços - estão na saída da mesma, passa por eles e eles estavam parados e é então atingido por algo que julga ser uma pedra atirado por um deles. Sabe que foi um deles pois que estas eram as únicas pessoas que estavam atrás de si sendo que os demais estavam à frente e foi atingido na cabeça (10’44” a 11’29”). Caiu com a pancada (15’40”) e foi aí que levou um soco na boca e no nariz do AA (15’53”). Foi nesta altura que viu o agente EE de costas no chão a ser agredido com pontapés numa roda de indivíduos (16’56”). De entre os indivíduos que agrediam o EE reconhece o CC que agredia o colega nas pernas. Tentou entrar na roda para ajudar (18’00”) mas posto de fora e é nesta altura que leva uma rasteira do CC e cai de quatro sendo que é então que o II lhe dá um pontapé (1915”). Ora, aqui estão os quatro arguidos que constam como presentes ab initio. E ab initio porque o assistente refere que vê de início o BB e o AA e que quando cai na barraca estão lá o II e o CC por quem passa. Ora, a presença destes dois, atrás da vítima, só é explicável se os mesmos estivessem no grupo inicial. O terem aceite um plano comum não só decorre da actuação conjunta de todos, funcionando como um grupo como ainda das regras da experiência já que alguém de vê uma refrega da jaez daquela aqui em causa e nela não quer participar afasta-se. Mais mais e como se verá infra, a testemunha FF, é categórica em colocar no local, pelo menos, o AA, o BB e o CC. Assim e sem qualquer dúvida nesse grupo estavam os quatro arguidos: BB, AA, II e CC. Esclarece mesmo e como referido que os indivíduos rodeavam o colega e tentou auxiliar o mesmo rompendo a roda, mas não a consegue penetrar antes sendo dela expulso. É então que o CC lhe passa uma rasteira e ele cai de quatro. Neste momento consegue identificar como seus agressores o CC, o BB e o II sendo que este último lhe dá um pontapé. Foi aí que o HH o veio ajudar e ele se levantou. Já em pé vê o AA e enceta perseguição ao mesmo. Quando se aproxima deste ele lança-lhe uma pedra a cerca de 2-3 metros e acerta-lhe na cabeça. Continuou, não obstante, a correr até chegar a uma árvore à qual se agarrou, pois, sentia-se a desfalecer e foi aí que o BB, aproveitando estar de cabeça baixa, lhe deu um pontapé na zona esquerda da face tendo desmaiado. Acordou quando ia na ambulância. Foi confrontado com o vídeo junto aos autos e nele identificou o AA, que tinha a T-Shirt branca, a agredir numa primeira fase e a lançar a pedra noutra. Identificou o BB como o individuo de camisola azul bebé e que agredia também. É importante referir que a afirmação dos factos se baseia no depoimento prestado e na memória do depoente e que o vídeo apenas reforça o depoimento e não o contrário. Foi peremptório em referir que não viu o arguido JJ no local. Instado disse ainda que de 3 de Julho a 4 de Janeiro esteve de serviços moderados tendo regressado a serviço total em 14.03. tendo recebido o seu salário da PSP. Contudo, deixou de fazer gratificados e nos mesmos ganhava cerca de 300 a 350 €/mês. Disse sentir-se impotente. Não falava com ninguém, não saia de casa, tinha o nariz torto. Até era complicado fazer a barba. Sentiu dores. Deixou de praticar full contact e futebol, desportos que praticava até aí. Não lhe dá para fazer desporto, disse. Ouvido o assistente EE, assistente nos autos e vítima das agressões aqui em causa, este referiu que reconhece o AA da situação e que os demais arguidos não conhece. Disse que os factos ocorreram no dia 03.07. cerca das 0.30 h. numa altura em que estava de gratificado na festa do ........ Referiu que no local, da PSP, estava ele, o DD, o chefe FF e o agente principal HH. O agente HH estava afastado e os todos os três estavam juntos e a conversar. Apercebeu-se de um grupo de indivíduos e neste o AA olhava fixamente o DD e o DD não desviou o olhar e então o AA diz “estás a olhar para onde, ó bófia?” e avançou para o colega com outros indivíduos ao seu lado. No total seriam 5 ou 6. O AA aproximou-se e ficou a cerca de meio metro do DD. Este empurrou o AA para trás, mas é empurrado de lado e de frente pelos indivíduos e cai dentro da barraca tendo os indivíduos começado a agredir o colega com murros e pontapés. Tentou ajudar, mas ele próprio caiu ao chão e os indivíduos ao verem-no caído começaram a bater-lhe com pontapés e socos. Segundos depois o DD levantou-se da barraca e veio ter com ele para o ajudar. Conseguiu levantar-se mas deixou de ver o colega pois estava rodeado pelos indivíduos. Ainda tentou dar um tiro para o ar, mas não o chegou a fazer. Lembra-se de ouvir uma senhora a gritar e a dizer que há polícia no chão. Ainda vê o colega DD junto a uma árvore. O chefe está com ele assim como dois populares. Afastou-se para chamar o 112 e é nesta altura que leva uma pedrada do lado esquerdo. Não sabe quem a lançou. Ficou com dores e a escorrer sangue. Foi retirado por bombeiros. Foi para o Hospital ......, foi visto e operado. Esteve cerca de 6 meses de baixa. O salário foi suportado pela PSP, mas os remunerados não e com eles ganhava cerca de 400 a 450 € mensais. Só retomou os gratificados em Março deste ano por escolha própria. De facto, nos primeiros dias não saiu de casa, teve receio de represálias, relembrava-se da situação. Ficou com a visão reduzida só ficando com 5 % da visão, passou a ter óculos adaptativos, deixou de fazer ginásio e desporto e até hoje na PSP só fez serviço de portaria e não operacional. Do evento disse ainda que no chão foi agredido por todos os indivíduos presentes, mas não os sabe identificar. Suprindo alguma falha inicial dir-se-á que, como resulta das declarações do assistente, este entende que todos os presentes no local o agrediram mas não sabe quem eles foram, razão pela qual não se pode, desta frase extrair qualquer imputação, muito menos ao JJ que não é tido como tendo participado nos factos. Ouvida a testemunha FF, chefe da PSP, este disse reconhecer dos acontecimentos os arguidos AA, BB e JJ. Referiu que estava de gratificado naquele dia (03.07) das 21h às 01h e que receberia 56 € pelo mesmo. Tudo sucedeu entre as 0.30h e as 0.40h. Era o último dia da festa, havia fogo-de- artifício. Estava ele, o DD e o EE. O HH estava a 4-5 metros deles, todos no início do recinto junto a uma barraca onde estava uma senhora. Como a festa estava a acabar as pessoas saíam. Um grupo de indivíduos, no qual estava o AA, o BB e o CC, estava junto a uma roulotte de bifanas. Seriam 8 a 10. O AA avança com uma cerveja na mão e pária a 3-4 metros deles. Pôs-se a olhar fixamente e a rir-se. Sabe que ele disse algo e que houve uma troca de palavras com o DD que lhe respondeu. O AA avançou sozinho. Os três tentaram afastá-lo falando com ele para se ir embora. Os outros indivíduos aproximam-se, entre os quais o BB e o CC e colocam-se de molde a impedir quaisquer movimentos por parte das testemunhas e dos demais colegas policias que estão uniformizados. Empurraram-nos e alguns começaram a fugir. O DD, no entanto, caiu ao chão sem a testemunha se ter apercebido do porquê. Recorda-se que o AA agrediu o DD com, pelo menos, um pontapé. Recorda-se ainda que os demais indivíduos se espalharam por entre as pessoas. O próprio perseguiu um dos indivíduos, mas perdeu-o. O HH afastou o AA que fugiu. Quando a testemunha regressou o DD estava no chão. O HH e o EE estavam nas imediações e regressaram pouco depois. O DD estava desmaiado. Nesta altura o EE estava bem, mas o AA voltou com os outros. Tinha pedras com ele e foi ele quem acertou no EE. Eram 4 ou 5 indivíduos e as pedras da calçada começaram a voar por todo o lado tendo o próprio sido atingido na omoplata conforme documentado a fls. 113 tendo sido assistido no hospital ....... Não esteve de baixa. Levaram o EE para os primeiros socorros onde os bombeiros o assistiram. Confirma o auto de notícia de fls. 23, fez o reconhecimento de fls. 67, 224 e 73 e tem a certeza dos mesmos. Cumpre salientar aqui que no douto acórdão da Relação se fez constar que este Tribunal fez constar que esta testemunha apenas reconheceu o JJ e não o CC e tal corresponde à verdade sendo que o constante do acórdão inicial não corresponde à prova produzida. Regressando ao depoimento desta testemunha a mesma refere que conhece do dia dos factos os arguidos AA, BB, JJ (minuto 1’55” do ficheiro …._......_......wmw), sendo estes os intervenientes. Note-se que ao minuto 731” a testemunha foi peremptório que no grupo inicial de 8 a 10 pessoas que estavam junto da barraca das bifanas estavam os arguidos AA, BB, JJ todos juntos. A testemunha refere que vem o arguido AA (838”) em direcção aos três agentes (ele, EE e DD) e pôs-se a olhar fixamente para o DD e a rir-se. Ele avançou e tentaram afastar o individuo tendo trocado palavras com o DD. No momento em que está a 3 metros do DD ele está sozinho (1112”). A instâncias do Ministério Público esta testemunha esclarece que após um momento inicial em que mo arguido está à frente dos agentes a olhar e a rir-se para estes e ainda antes do empurrão vêm os outros indivíduos que estavam com ele (14’09”). Refere que se aproximaram pelo menos 5 indivíduos (1438”) tendo salientado que eram os indivíduos “que estavam lá em baixo” querendo referir-se àqueles que estavam na roulotte das bifanas (14’42”), reconhecendo entre estes o JJ e o BB (15’06”), referindo que estes cincos começam a rodear os agentes e que então se envolveram e empurraram o colega (15’22”). Ora, assim e mais uma vez se repete: a forma como os arguidos actuaram (os quatro que foram identificados) de acordo com as regras da experiência, não podem senão levar à conclusão que os indivíduos, juntamente com os demais não identificados, actuaram desde sempre de forma concertada desde o primeiro momento. Assim, é de referir que, de facto, no artº 10° dos factos provados se refere e com propriedade que todos os arguidos, os quatro, agiram de forma concertada, tendo os que se aproximaram seguindo o arguido AA rodeado os polícias e tendo o AA empurrado o assistente DD. E é óbvio que o movimento de rodear os agentes foi essencial para desviar atenções dos polícias e potenciar o resultado do empurrão sendo que embora o movimento mecânico seja de um dos arguidos todos eles contribuem para o resultado. Refira-se ainda que, como resulta do escalpelizar das declarações e como resulta dos factos provados o CC num momento inicial está a rodear os agentes, desloca-se para o lado quando o DD cai no interior da barraca, deixa-se estar na companhia do II quando o DD se levanta e vai tentar deter o AA. Ele, CC, ou o II acertam com algo no DD que cai ao solo e é agredido com um soco pelo AA e neste entretanto o II e o CC vão formar uma roda à volta do EE (onde o agridem) e quando o DD tenta ajudar o CC e o II desferem pontapés no DD, tudo resultante dos depoimentos do assistente DD e testemunha FF que não suscitaram quaisquer dúvidas. Note-se que embora presentes as testemunhas naquele local tinham diversas solicitações sendo inconcebível que tivessem todas elas visto a mesma coisa. Só a conjugação dos depoimentos permite a conclusão a que se chegou. Repare-se que o II é apenas referido pelo assistente DD mas a forma e convicção com que o faz e a firmeza das suas respostas não nos merecem reparos tanto mais que no seu depoimento o mesmo soube sempre distinguir o que era facto das suas suspeitas indo mesmo ao ponto de referir que não viu sequer um dos arguidos no local. Ouvida a testemunha HH, agente da PSP presente no local, dia e hora dos factos este referiu que os mesmos ocorreram cerca das 0.30 h e que ele e os colegas estavam junto a uma barraca estando o próprio mais afastado dos demais, a cerca de 4-5 metros. Não se apercebeu do início da refrega e a dada altura viu o AA dar um pontapé no DD nas costas tendo este caído ao chão, junto ao lancil do passeio batendo com o nariz no chão. O colega, no chão, continuou a ser agredido pelo AA tendo-se aproximado mais indivíduos, designadamente o BB tendo todos eles agredido o colega que ficou em posição fetal. Foi o próprio a chamar o 112. A testemunha foi afastar os indivíduos que fugiram. Contudo, os mesmos regressaram mais tarde e munidos de pedras, paralelepípedos de basalto, que começaram a atirar e que atingiam o chefe. O próprio não foi atingido. Participou e confirmou os reconhecimentos de fls. 69, 75 e 228. Louvou-se, de igual sorte o Tribunal no depoimento de GG, …….., de 40 anos, o qual estava presente no local. A testemunha disse não conhecer ninguém embora haja referido que no local existia um grupo de pessoas no qual se destacava um alto com t-shirt branca. Disse que cerca de 30 minutos depois do fogo-de-artifício ouviu uma algazarra e foi ver o que se passava sendo que viu civis a agredirem polícias e que um dos polícias estava em apuros pois estava numa roda de indivíduos que entravam e saiam e que davam empurrões murros e pontapés ao polícia. O da T’shirt branca estava presente e agredia. A dada altura vê o polícia por cima de um passeio, junto a uma árvore, inanimado. Um indivíduo bombeiro logo ajudou o polícia e os populares começaram a pedir para se chamar os bombeiros. Foi o que começou a fazer ma sentiu logo uma pancada violenta na cabeça, do lado direito, e o telemóvel caiu ao chão. Não viu ninguém mas viu a pedra no chão, uma pedra de calçada. Sentiu e viu-se a escorrer sangue da têmpora, ficou com os ossos do maxilar e do nariz partidos. Fez os reconhecimentos de fls. 83 e 232 e confirma qua ambos os arguidos - AA e BB' agrediram o polícia. Foi também ouvido LL, irmão do arguido JJ o qual declarou que esteve na festa tendo ouvido uma algazarra e visto o agente DD ser agredido junto a uma árvore com um pontapé na cabeça por um indivíduo de t-shirt branca que reconhece a fls. 244 (arguido AA). Este indivíduo surge ainda a fls. 745 (foto 1) e 572 (seta vermelha). Inquirido disse que o irmão estava na festa, mas que não o viu nem a ele, nem o CC na confusão. Viu a testemunha GG ferida na cara. Ele disse que foi uma pedra e estavam pedras no local que antes da algazarra ali não estavam. Também a testemunha MM que trabalhava na …..junto à entrada disse que viu quatro ….. aproximarem-se de dois polícias. Os quatro interrogaram os policiais “porque é que estão a olhar para nós assim?”. Aproximaram-se e de repente um agente é empurrado para dentro da barraca ao lado da sua e caiu ao chão. Houve uma grande confusão. Recordasse de um indivíduo mais alto agarrar numa pedra que lançou na direcção de um agente e de lhe ter acertado na cara. Há um outro agente que junto a uma árvore se está a levantar e um rapaz de pontas louras dá um pontapé na cara do polícia. Diz que o alto de T-shirt branca foi quem atirou a pedra, o das pontas louras deu o pontapé e um dos indivíduos que agrediu tinha uma t-shirt azul clara. A testemunha NN confirmou a dinâmica dos factos, mas não identificou qualquer um dos agentes. A testemunha OO, da organização da festa, disse que se estava a preparar para sair e que viu 4 indivíduos ….. a discutir com quatro polícias, não tendo percebido o porquê. Os indivíduos começaram a empurrar os agentes e um dele caiu numa barraca e ela caiu. Quando o polícia se levantou levou um pontapé nas costas. Disse que entrou em choque, abandonou o local e nada mais viu. Instada disse que um dos indivíduos tinha as pontas dos cabelos aloirados. A testemunha PP, subintendente da PSP, à data …… da PSP …..., não presenciou os factos tendo visitado os agentes no hospital, encontrando-os num estado lastimável. Refere que os dois assistentes eram operacionais com capacidade elevada e que ainda hoje, na sua opinião, não a recuperaram. Segundo o próprio “o indicie de confiança dos próprios no desempenho das suas funções baixou, tal como os reflexos no desempenho operacional”. Este depoimento foi ainda secundado pelo de QQ, comandante do arguido DD o qual salientou que era uma pessoa proactiva, procurava situações onde estavam a correr crimes ou contra-ordenações e agora os níveis de proactividade baixaram pois que no terreno não é tão voluntarioso, faltando-lhe alegria no trabalho. Impressivo foi o depoimento de RR, esposa do assistente DD, a qual disse que foi ver o esposo no hospital e que apenas o reconheceu pelos pés. No resto não o reconheceu. Ele dizia que não sentia os braços e que só sentia dores no corpo todo. Ficou internado e voltou a trabalhar há cerca de 4 meses. Teve muitas alterações de comportamento. Era uma pessoa muito alegre, sempre a rir, e neste momento é muito fechado, ia de mão dada com ela na rua e agora não sai tanto de casa. Ele tem medo por ela, que lhe aconteça algo, está muito alerta. Quando lhe ia dar um beijo um dia, ele não a ouviu e instintivamente protegeu-se. Ele está muito calado, passa muito tempo ao espelho, diz que tem o nariz torto. Nunca mais ele deu beijos com o nariz. Dá com ele a chorar e a dizer que tem o nariz torto. Já não vai com o mesmo ânimo trabalhar, hoje vai mais receoso, não tem tanta alegria, não tem tanta “garra”. O esposo ganhava gratificados que variavam entre 500-600 € mensais. Deixou de fazer gratificados e ainda hoje não faz. Estava de baixa quando abriu o concurso para chefe e não pode concorrer. Contudo, não havia garantia de ficar Teve se suportar algumas despesas que a ADSE não suportava. Foi ouvido SS, chefe da PSP, e amigo do assistente EE, o qual referiu que o mesmo é um profissional exemplar. Depois do sucedido viu-o revoltado. O mesmo foi afectado em termos de visão e ele isolou-se. A testemunha é mesmo amiga fora da instituição e referiu o amigo afectado estando todos sempre a perguntar o que se passa. Recorda-se que o amigo dormia sempre sentado, as persianas estarem sempre baixas. Tem problemas faciais que as cirurgias não curaram. Este depoimento foi corroborado pela testemunha TT, agente da PSP e amigo do EE O Tribunal considerou ainda o teor do auto de reconhecimento pessoal, fls. 65, do auto de reconhecimento pessoal, fls. 67, do auto de reconhecimento pessoal, fls. 69, do auto de reconhecimento pessoal, fls. 73, do auto de reconhecimento pessoal, fls. 83, do auto de reconhecimento pessoal, fls. 224, do teor do auto de reconhecimento pessoal, fls. 232, do auto de reconhecimento pessoal, fls. 236, do auto de reconhecimento pessoal, fls. 240, do auto de reconhecimento pessoal, fls. 244, do auto de reconhecimento pessoal, fls. 446, do auto de reconhecimento pessoal, fls. 620, do auto de reconhecimento pessoal, fls. 622, do auto de reconhecimento pessoal, fls. 629, do auto de reconhecimento pessoal, fls. 772. Considerámos ainda o teor do auto de notícia, de fls. 23, dos aditamentos, de fls. 26, 30, 207, dos elementos clínicos, de fls. 99 e segs., 469 e segs., 473-489, 510-512, 711 e segs., da reportagem fotográfica, de fls. 107-115, do relatório policial de fls. 162 e segs.. e 774 e segs., dos relatórios de diligência externa, de fls. 426, 425, 626 e 627, dos autos de visionamento de imagens, de fls. 567 e segs., 744 e segs., do CD-DVD contendo imagens na contracapa do 3º volume, o teor dos documentos de fls. 990 a 1077 e 1088 a 1110, o teor dos certificados de registo criminal de fls. 1328 a 1329,1330 a 1331,1332,1335 a 1338 e nos relatórios sociais de fls. 1364 a 1365 (AA), 1366 a 1367 (BB), ref.ª citius …. (II) e ref.ª citius …… (CC). Pericialmente considerámos o teor dos autos de exame médico, de fls. 649, 651, 653, 828 e 831. Os factos não provados resultaram da ausência de prova dos mesmos.”. (…). 16. Com referência ao dito em supra 13. deste acórdão, recorde-se o enquadramento da apreciação do presente recurso. Por acórdão do Tribunal Colectivo de 1ª Instância foi o arguido, ora recorrente, condenado pela prática dos crimes descritos em supra 2., nas seguintes penas parcelares: - 6 anos de prisão (co-autor material de um crime de homicídio qualificado, na forma tentada, na vítima DD); - 5 anos e 9 meses de prisão (co-autor material de um crime de homicídio qualificado, na forma tentada, na vítima EE); - 2 anos de prisão (co-autor material de um crime de ofensa à integridade física qualificada, na vítima FF); - 1 ano e 9 meses de prisão (co-autor material de um crime de ofensa à integridade física qualificada, na vítima GG); E, em cúmulo jurídico, na pena única de 8 anos e 6 meses de prisão. Desta condenação recorreu o arguido para o TR….., onde por acórdão de 14.04.2020, foi negado provimento ao recurso do arguido, e confirmada a decisão recorrida. Inconformado, recorre o arguido para este STJ, alegando que a matéria assente consiste em generalidades que são insuficientes para a sua condenação por homicídio na forma tentada, relativamente aos agentes DD e EE admitindo que só poderá ser condenado, quanto a estes, pelo crime de ofensas corporais previstas e punidas nos artigos 143.º e 145.º do CP (reeditando a sua alegação recursiva junto do TR……, como se disse supra em 12.). Mais considera excessiva a pena aplicada que entende não dever ser superior a 5 anos.
17. Assim,
Na sequência do que ficou dito em 13. este Supremo Tribunal de Justiça apenas conhece de direito. Vejamos. Em 1.º lugar, quanto à questão retomada neste recurso e já discutida nas Instâncias, em que põe em causa o modo como o tribunal valorou a prova (nomeadamente a prova testemunhal e o vídeo), embora não invoque expressamente os vícios do n.º 2, do artigo 410.º, do CPP, “pretextua” o vício de insuficiência para a decisão da matéria de facto provada - n.º 1, alínea a), daquela norma -, e questionando o uso que o tribunal recorrido fez do princípio da livre apreciação da prova (conforme o disposto no artigo 127.º, do CPP). Por um lado, ressalta-se que os vícios previstos no artigo 410.º, n.º 2, do CPP não podem ser confundidos com uma divergência entre a convicção pessoal do recorrente sobre a prova produzida em audiência e a convicção que o tribunal firme sobre os factos, no respeito pelo princípio da livre apreciação da prova inscrito no artigo 127.º do CPP. Por outro lado, em vista do recorte conceitual daquele princípio, tal como sedimentado na doutrina e na jurisprudência, e atenta a factualidade provada e a fundamentação respectiva (supra transcritas), não se divisa que o Tribunal da Relação ….. tenha ficado com qualquer dúvida relativamente à culpabilidade do arguido, relativamente a cada um dos crimes em que foi condenado (a dúvida relevante é, necessariamente, a do Tribunal, que não a do recorrente), e muito menos que tenha resolvido qualquer non liquet em desfavor deste. Neste particular, o que releva, necessariamente, é a convicção que o tribunal forme perante as provas produzidas em audiência, sendo ineficaz, no âmbito da ponderação exigida pela função do controlo ínsita na identificação dos vícios do artigo 410.º, n.º 2, do CPP, a convicção pessoalmente formada pelo recorrente e que ele próprio alcançou sobre os factos. Em síntese: quanto a vícios de procedimento, importa deixar expresso que, no caso, mesmo oficiosamente, do texto da decisão revidenda, não se evidencia qualquer dos vícios previstos no artigo 410.º, n.º 2, do CPP. Com efeito, investigada que foi a materialidade sob julgamento, não se vê que a matéria de facto provada seja insuficiente para fundar a solução de direito atingida, não se vê que se tenha deixado de investigar toda a matéria de facto com relevo para a decisão final, não se vê qualquer inultrapassável incompatibilidade entre os factos julgados provados ou entre estes e os factos julgados não provados ou entre a fundamentação probatória e a decisão, e, de igual modo, não se detecta na decisão recorrida, por si e com recurso às regras da experiência comum, qualquer falha ostensiva na análise da prova ou qualquer juízo ilógico ou arbitrário. 18. Dito isto, passemos a ocupar-nos da apreciação da pena única aplicada. 19. Vem o recorrente pedir a alteração da pena em cúmulo, que considera manifestamente exagerada, entendendo que se justifica a aplicação de uma pena, em cúmulo jurídico, não superior a cinco anos de prisão, alegando que se trata de uma pessoa integrada social e familiarmente, e também com actividade profissional regular. Sem embargo, dando por adquirido que o Supremo Tribunal de Justiça pode, mesmo de ofício, pronunciar-se sobre qualquer desrespeito pelas regras atinentes à escolha e medida da pena [no caso, tão apenas da pena unitária, face à medida das penas parcelares e por referência ao disposto nos artigos 432.º n.ºs 1, alíneas b) e c) e 2, e 400.º n.º 1 alíneas e) e f), do CPP], vejamos.[8] Recorde-se que o recorrente foi condenado pela prática dos crimes descritos em supra 2., nas seguintes penas parcelares (sedimentadas em ambas as instâncias): - 6 anos de prisão (co-autor material de um crime de homicídio qualificado, na forma tentada, na vítima DD); - 5 anos e 9 meses de prisão (co-autor material de um crime de homicídio qualificado, na forma tentada, na vítima EE); - 2 anos de prisão (co-autor material de um crime de ofensa à integridade física qualificada, na vítima FF); - 1 ano e 9 meses de prisão (co-autor material de um crime de ofensa à integridade física qualificada, na vítima GG); E, em cúmulo jurídico, na pena única de 8 anos e 6 meses de prisão.
20. Nos termos do disposto no artigo 77.º, do CP, a pena unitária abstracta situa-se entre o limite mínimo 6 anos, e o limite máximo de 15 anos e 6 meses de prisão, foi concretizada, nas instâncias, em 8 anos e 6 meses de prisão. Vejamos. 21. O artigo 77.º, n.º 1, do CP, estabelece que o critério específico a usar na fixação da medida da pena única é o da consideração em conjunto dos factos e da personalidade do agente. Não tendo o legislador nacional optado pelo sistema de acumulação material (soma das penas com mera limitação do limite máximo) nem pelo da exasperação ou agravação da pena mais grave (elevação da pena mais grave, através da avaliação conjunta da pessoa do agente e dos singulares factos puníveis, elevação que não pode atingir a soma das penas singulares nem o limite absoluto legalmente fixado), é forçoso concluir que, com a fixação da pena conjunta, se pretende sancionar o agente, não só pelos factos individualmente considerados, mas também e especialmente pelo respectivo conjunto, e não como mero somatório de factos criminosos, mas enquanto revelador da dimensão e gravidade global do comportamento delituoso do agente, visto que a lei manda se considere e pondere, em conjunto (e não unitariamente), os factos e a personalidade do agente - Professor Jorge de Figueiredo Dias, em “Direito Penal Português – As Consequências Jurídicas do Crime”, Aequitas, 1993, pp. 290-292, como se o conjunto dos factos fornecesse a gravidade do ilícito global perpetrado. 22. A este novo ilícito corresponderá uma nova culpa (que continuará a ser culpa pelo facto) mas, agora, culpa pelos factos em relação – afinal, a valoração conjunta dos factos e da personalidade, de que fala o Código Penal. Na avaliação da personalidade– unitária – do agente relevará, sobretudo, a questão de saber se o conjunto dos factos é reconduzível a uma tendência ou, eventualmente, mesmo a uma “carreira” criminosa, ou tão-só a uma pluriocasionalidade que não radica na personalidade: só no primeiro caso, não já no segundo, será cabido atribuir à pluralidade de crimes um efeito agravante dentro da moldura penal conjunta. Acresce que importará relevar o efeito previsível da pena sobre o comportamento futuro do agente (exigências de prevenção especial de socialização). Realce-se ainda que na determinação da medida das penas parcelar e única não é admissível uma dupla valoração do mesmo factor com o mesmo sentido: assim, se a decisão faz apelo à gravidade objectiva dos crimes está a referir-se a factores de medida da pena que já foram devidamente equacionados na formação das penas parcelares. Será, assim, o conjunto dos factos que fornece a gravidade do ilícito global perpetrado, sendo decisiva para a sua avaliação a conexão e o tipo de conexão que entre os factos concorrentes se verifique. Um dos critérios fundamentais em sede daquele sentido de culpa, numa perspectiva global dos factos, é o da determinação da intensidade da ofensa e dimensão do bem jurídico ofendido, sendo certo que assume significado profundamente diferente a violação repetida de bens jurídicos ligados à dimensão pessoal, em relação a bens patrimoniais. Por outro lado, importa determinar os motivos e objectivos do agente no denominador comum dos actos ilícitos praticados e, eventualmente, dos estados de dependência, bem como a tendência para a actividade criminosa expressa pelo número de infracções, pela sua permanência no tempo, pela dependência de vida em relação àquela actividade. Na avaliação da personalidade expressa nos factos é todo um processo de socialização e de inserção, ou de repúdio pelas normas de identificação social e de vivência em comunidade, que deve ser ponderado[9]. O artigo 77.º, n.º 2, do CP, por seu turno, estabelece que pena aplicável tem como limite máximo a soma das penas concretamente aplicadas aos vários crimes, não podendo ultrapassar 25 anos tratando-se de pena de prisão e 900 dias tratando-se de pena de multa; e como limite mínimo a mais elevada das penas concretamente aplicadas aos vários crimes. Será, assim, o conjunto dos factos que fornece a gravidade do ilícito global perpetrado, sendo decisiva para a sua avaliação a conexão e o tipo de conexão que entre os factos concorrentes se verifique. O concurso de crimes tanto pode decorrer de factos praticados na mesma ocasião, como de factos perpetrados em momentos distintos, temporalmente próximos ou distantes. Por outro lado, o concurso tanto pode ser constituído pela repetição do mesmo crime, como pelo cometimento de crimes da mais diversa natureza. Por outro lado, ainda, o concurso tanto pode ser formado por um número reduzido de crimes, como pode englobar inúmeros crimes. 23. Revertendo ao caso, não pode deixar de sublinhar-se a elevada gravidade, da conduta do recorrente, a justificar pelas penas parcelares concretizadas na instância e relativas ao objecto do recurso (homicídio qualificado, na forma tentada). Quanto à pena do cúmulo, afigura-se que, na ponderação conjunta dos factos e da personalidade do arguido recorrente, se mostra concretizada em medida adequada e proporcionada às circunstâncias de facto apuradas. Salienta-se o facto de as penas parcelares terem sido concretizadas em medida próxima dos correspondentes limites mínimos e de a pena única se ter estabelecido em medida ligeiramente inferior ao ponto médio da pena abstractamente aplicável. Vale, assim, por dizer que o exame da concreta medida da pena estabelecida na instância, suscitado pelo presente recurso, não deve aproximar-se desta, senão quando haja de prevenir-se e emendar-se a fixação de um determinado quantum em violação dos princípios e regras pertinentes, cumprindo precaver qualquer pena abusiva, relativamente a uma concreta pena que ainda se revele congruente e proporcionada. 24. Na determinação da medida concreta da pena, as instâncias levaram em conta e ponderaram adequada e fundadamente, todas as circunstâncias concretas em que os crimes foram cometidos, nomeadamente quanto ao significativo grau de ilicitude do facto (inapelável foi a tentativa de eliminação directa de uma vida), considerando o modo de execução (tendo sido empregue uma energia criminosa significativa, tendo agido de uma forma pensada, mas incontida e sem percepção dos limites, não sabendo avaliar a dimensão da conduta que levou a cabo ), o valor (supremo) do bem jurídico violado – a vida – e as suas consequências, o dolo directo e intenso, (tendo o arguido agido em circunstâncias que fizeram com que a tensão ou pulsão dos instintos primários não tivesse siso vencida por uma solidez de personalidade que não podia, nem devia deixar de estar presente) na conduta do arguido anterior e posterior aos crimes, as condições pessoais e económicas do arguido (alguma inserção laboral) e os seus antecedentes criminais. (Itálico nosso, referente à transcrição de segmentos do acórdão recorrido). Há que, como se acentuou, ponderar as exigências antinómicas de prevenção geral e de prevenção especial, em particular as necessidades de prevenção especial de socialização “que vão determinar, em último termo, a medida da pena”, seu “critério decisivo”, com referência à data da sua aplicação (assim, acentuando estes pontos, Figueiredo Dias, ob. cit., §309, p. 231, §334, p. 244, §344, p. 249), tendo em conta as circunstâncias a que se refere o artigo 71.º do CP, nomeadamente as condições pessoais do agente e a sua situação económica e a conduta anterior e posterior ao facto, especialmente quando esta tenha em vista a reparação das consequências do crime, que relevam por esta via. Destacam-se, no caso, nestas circunstâncias, as reveladoras de acentuadas exigências de prevenção especial, decorrentes do trajecto de vida do arguido e das suas condições pessoais, de anteriores condenações reveladoras da não sensibilidade às penas, o que não permite a formulação de um juízo razoável de prognose positivo de preparação para manterem uma conduta ilícita (como se diz na decisão recorrida: (…) denota fraca capacidade de descentração e consciência crítica procurando desvincular-se da mesma e atribuindo a factores externos, a sua origem. (…). 25. Assim, considerando os factos na sua globalidade, as circunstâncias anteriormente referidas e as qualidades de personalidade do arguido manifestada na sua prática, em que se destaca a violência de comportamento, devidamente circunstanciado e descrito no acórdão recorrido, e sem necessidade de mais considerandos, tudo ponderado em conjunto, como impõem os artigos 40.º, 71.º e 77.º, do CP, não se encontra fundamento que permita justificar a redução da pena aplicada, na base da consideração de esta não se mostrar adequada e proporcional à gravidade dos factos e às necessidades de prevenção e de socialização que a sua aplicação visa realizar (artigo 40.º, n.º s e 2, do CP). Pelo que não se concede provimento ao recurso interposto por AA. 26. Nos termos do disposto no artigo 513.º do CPP (responsabilidade do arguido por custas), só há lugar ao pagamento da taxa de justiça, que é individual, quando ocorra condenação em 1.ª instância e decaimento total em qualquer recurso. A taxa de justiça é fixada entre 5 e 10 UC, tendo em conta a complexidade do recurso, de acordo com a tabela III anexa ao Regulamento das Custas Processuais. Nestes termos, considera-se adequada a condenação do recorrente em 5 UC. III. 27. Pelo exposto, acordam os juízes na Secção Criminal do Supremo Tribunal de Justiça em: c) Condenar o recorrente em custas, fixando a taxa de justiça em 5 UC - ressalvado apoio judiciário e nos estritos termos de tal benefício.
21 de Janeiro de 2021 Processado e revisto pela relatora, nos termos do disposto no artigo 94.º, n.º 2 do CPP, e assinado eletronicamente pelos signatários.
Margarida Blasco (Relatora) Eduardo Loureiro
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[4] Por todos, os acórdãos do TC 64/2006, 659/2011 e 290/2014) – assim, nomeadamente, os acórdãos deste Supremo Tribunal de 14.03.2018, ECLI:PT: STJ:2018:22.08. 3JALRA.E1. S1.48 e de 30-10-2019, Proc. 455/13.3GBCNT.C2. S1, em www.dgsi.pt, bem como o acórdão de 12.12.2018, Proc. 211/13.9GBASL.E1. S1, www.stj.pt/wp-content/uploads/2019/06/criminal_ sumários _ 2018.pdf, e ainda o acórdão de fixação de jurisprudência n.º 14/2013, n.ºs 11 e 12, de 09.10.2013 (DR 1.ª série, de 12.11.2013). [5] I -Decidido o recurso pela Relação, ficam esgotados os poderes de apreciação da matéria de facto, tomando-se esta definitivamente adquirida, salvo se ocorrer algum dos vícios do art. 410. °, n.º 2, do CPP, de que o STJ deva oficiosamente conhecer. II- O conhecimento desses vícios pelo Supremo Tribunal não constitui mais do que uma válvula de segurança a u/iligar pelo tribunal nas situações em que não seja possível tomar uma decisão sobre a questão de direito, por a matéria de facto se revelar ostensivamente insuficiente, ou se fundar em erro de apreciação, ou estar assente em premissas contraditórias. III- O conhecimento das questões de facto, enquanto tais, encontra-se, assim, subtraído à apreciação do STJ que, sendo um tribunal de revista, apenas conhece de direito - arts. 432.º e 434.º do CPP. [8] Nos termos do disposto no artigo 400.º, al. f), nº 1, do CPP, não é admissível recurso de acórdãos condenatórios proferidos em recurso, pelas Relações, que confirmem decisão de 1ª instância e apliquem pena de prisão não superior a 8 anos. De acordo com esta disposição, nos casos de julgamento por vários crimes em concurso em que, em 1ª instância, por algum ou alguns ou só em cúmulo jurídico, haja sido imposta pena superior a 8 anos e por outros a pena aplicada não seja superior a essa medida, sendo a condenação confirmada pela Relação, o recurso da decisão desta para o STJ só é admissível no que se refere aos crimes pelos quais foi aplicada pena superior a 8 anos de prisão e à operação de determinação da pena única. Isto é, havendo uma decisão do Tribunal da Relação que mantém integralmente a decisão da 1ª instância que aplicou penas parcelares inferiores a 8 anos de prisão – a chamada dupla conforme – o recurso para o STJ só é admissível quanto à medida da pena única caso esta exceda 8 anos de prisão. [9] Ac. deste STJ de 19-09-2019, Processo n.º 101/17.6GGBJA.E1. S1- 5.ª secção. |