<>
Acordam no Supremo Tribunal de Justiça
No processo com o nº 1649/09.1JAPRT-A, da COMARCA DO ...- Inst. Central- Secção Criminal- ..., vem o arguido AA, com os demais sinais dos autos, apresentar petição de habeas corpus, por intermédio de advogado, com os fundamentos das al. a), b) e c) do nº 2 do art. 222 º do CPP, o que faz nos termos e com os seguintes fundamentos:
1. AA extraditado do Brasil á ordem do processo melhor supra identificado, mormente, Proc. n.º 1649/09.1JAPRT-A da Comarca Do ...- Inst. Central- Secção Criminal- ... e só para esse processo, preso preventivamente, aliás prisão desprovida de previsão legal, como melhor se demonstrará. Cfr. Doc. 1 Mandado de detenção Internacional que se junta e se dá por integralmente reproduzido para os devidos e legais efeitos.
2. Tendo sido presente ao Juiz de Instrução no dia 2/08/2016 para aplicação de medida de coação no âmbito da extradição no processo supra referido foi-lhe determinada a medida de coação de prisão preventiva. Cfr. doc 2 Auto de Interrogatório de arguido que se junta e se dá por integralmente reproduzido para os devidos e legais efeitos.
3. Na sequencia e por impulso da digna Magistrada do Ministério Publico, que promoveu a passagem de mandatos de desligamento dos autos supra referidos ao processo numero 134/99.2TATVD.
4. O MM. Juiz de Instrução proferiu despacho onde ordenou a passagem de mandados de desligamento do arguido, nos termos promovidos, ordenando que o arguido cumprisse o remanescente da pena de prisão, cujo ligamento determinou, mas que em nenhum momento fez parte do mandado de detenção internacional do arguido e que deu origem á sua extradição.
5. O aqui arguido nada requereu pois mesmo que o fizesse alegando que não poderia ser ligado ao processo 134/99.2TATVD, de nada adiantaria pois este continuaria em prisão preventiva á ordem do processo em crise.
6. Sucede que, o arguido foi julgado no presente processo e absolvido.
7. Absolvição esta que transitou em julgado em 06-03-2017. Cfr. doc. 3 certidão de transito em Julgado que se junta e se dá por integralmente reproduzido para os devidos e legais efeitos.
8. Inquirido o arguido detido perante o tribunal Relação do Porto processo n.º 152/17.0YRPRT 1ª secção este não renunciou ao principio da especialidade para efeitos do processo comum singular n.º 108/07.1GACBC, assim como não o pretende fazer para os demais processos. Cfr. doc. 4 Auto de inquirição de detido perante o Tribunal da Relação do Porto, que se junta e se dá por integralmente reproduzido para os devidos e legais efeitos.
9. Assim sendo, o aqui Arguido uma vez que foi absolvido com transito em julgado no processo que deu origem á sua extradição e renunciou ao principio da especialidade nos demais processos.
10. Está preso ilegalmente.
11. A panóplia de constrangimentos - ordinários e extraordinários – que se opõem nestes autos ao arguido, não podem impedir, em todo o caso e em nome do Direito Internacional dos Direitos do Homem, de, com os expostos fundamentos, de o manter preso sem qualquer previsão legal para o efeito.
Nestes termos, requer a V. Exas., a concessão imediata da Providência de Habeas Corpus em razão de prisão ilegal, com as demais consequências legais.
P.E.D.
O Advogado,
<>
Foi prestada a informação a que alude o artigo 223º nº 1 do Código de Processo Penal, que refere:
“Habeas Corpus
Processo Comum Colectivo n.º 1649/09.1JAPRT, do ...º Juízo Central Criminal de ..., Comarca de ...
Venerando Juiz Conselheiro
Presidente do Supremo Tribunal de Justiça
Nos termos do disposto no artigo 223º, n.º 1 do Código de Processo Penal, informa-se V. Exa. do seguinte:
No decurso do inquérito que deu origem aos presentes autos, o arguido AA foi sujeito a primeiro interrogatório judicial em 11/11/2009 (cf. fls. 149 a 164), tendo-lhe sido aplicada a medida de coacção de permanência na habitação com vigilância electrónica.
Em 18/11/2009, contudo, a DGRS informou os autos que o mesmo se havia ausentado da sua habitação e que o seu paradeiro era desconhecido, informação que reiterou a 19/11/2009 (cf. fls. 276 e 281).
Nessa sequência, por despacho de 20/11/2009 (cf. fls. 285) foram emitidos mandados de detenção do arguido nos termos do art. 254.º, n.º 1 al. b) e 258.º ambos do CPP.
O inquérito seguiu, então, os seus termos, tendo o Ministério Público, em 18/05/2010, proferido despacho de acusação, imputando, ao arguido, a prática em co-autoria material de um crime agravado de roubo, p.p. nos art. 210.º, n.º 1 e n.º 2 al. a) do CP.
O Processo foi recebido para julgamento por despacho de 28/06/2010 (cf. fls. 601) e na primeira data designada para o efeito, foi proferido despacho, a ordenar a separação de processos nos termos do art. 30.º, n.º 1 al. c) do CPP relativamente ao arguido AA, tendo, para o efeito, sido extraída certidão de todo o processado e instruído o apenso A aos autos onde prosseguiram as diligências tendentes a apurar o seu paradeiro com vista à sua submissão a julgamento.
Já no âmbito desse apenso A (ao qual pertencem todas as fls. que se mencionarão infra) e depois de cumpridos os respectivos editais, foi o arguido declarado contumaz por despacho de 28/02/2011 (cf. fls. 693), tendo sido emitidos novos mandados de detenção (cf. fls. 696).
Em 26/04/2011, em vista do processo, o Ministério Público promoveu a emissão de Mandado de Detenção Europeu e de Mandado de Detenção Internacional com vista à sua detenção, o que foi determinado por despacho de fls. 715 e subsequentemente cumprido (cf. fls. 751 e ss.).
Por ter sido encontrado no Brasil, foi requerida a sua extradição, tendo o Supremo Tribunal Federal deste país decretado a mesma por decisão de 17/05/2016, que transitou em julgado em 21/06/2016 (cf. fls. 932 e ss).
Nessa sequência, o arguido foi entregue pelas autoridades brasileiras ao Gabinete Nacional da Interpol na Fronteira internacional do Aeroporto Internacional de ... em 01/08/2016, pelas 15.00h (cf. fls. 959), tendo sido apresentado a interrogatório judicial no dia seguinte (02/08/2016), pelas 12.10h (cf. fls. 970 e ss.).
No âmbito desse interrogatório, em que já teve como seu defensor mandatado o Il. Advogado Dr. BB, foi determinada a sua prisão preventiva.
Não obstante, na sequência de promoção imediata do Ministério Público, à qual o Il. Defensor do arguido declarou não se opor, foi determinado o seu desligamento dos nossos autos e o ligamento ao processo 134/99.2TATVD onde o mesmo tinha uma pena de prisão para cumprir (cf. Fls. 974, 975 e 952 a 954).
Tais mandados de desligamento/ligamento foram de imediato emitidos, tendo o arguido deixado de estar em prisão preventiva à ordem dos nossos autos e passado a estar em cumprimento de pena à ordem do Processo 134/99.2TATVD, desde o dia 02/08/2016 (cf. fls. 1016 e 1075), situação que ainda se manterá.
Em 07/10/2016, foi proferido despacho, este já pelo signatário, a agendar a realização da audiência de julgamento para o dia 21/12/2016, sendo que por impossibilidade de comparência do seu mandatário, procedeu-se ao seu reagendamento para as datas de 25/01/2017 e 27/01/2017 (cf. fls. 1079, 1087 a 1089 e 1090).
Nessa sequência, o julgamento realizou-se no dia 25/01/2017, pelas 14.00h, sendo que no dia 01/02/2017 foi proferido, lido e depositado o respectivo acórdão no âmbito do qual se julgou improcedente a acusação deduzida e se absolveu, na íntegra, o arguido, declarando-se, expressamente, a final, a extinção da medida de coacção que lhe havia sido aplicada nestes autos (cf. fls. 1154 e ss., 1160 e ss. a 1168).
A 11/07/2017, foi remetido a este Tribunal o pedido de habeas corpus ora em causa.
Nos termos do artigo 223º, n.º 1 do Código de Processo Penal, remeta-se de imediato (via fax/mail e seguro do correio) a petição de habeas corpus e a presente informação ao Venerando Presidente do Supremo Tribunal de Justiça, acompanhada de certidão de todas as peças processuais identificadas na informação que antecede.
*
Notifique o Ministério Público e o Ex.mo defensor do teor deste despacho e dê conhecimento ao TEP.
<>
Remetida a presente providência com os necessários elementos ao Supremo Tribunal de Justiça, convocou-se a Secção Criminal do mesmo, e efectuadas as devidas notificações, realizou-se a audiência pública, nos termos legais.
<>
A Secção Criminal reuniu seguidamente para deliberação, a qual imediatamente se torna pública:
O artigo 31º da Constituição da República Portuguesa, integrante do título II (Direitos, Liberdades e Garantias) e capítulo I (Direitos, liberdades e garantias pessoais), determina que:
1. Haverá habeas corpus contra o abuso de poder, por virtude de prisão ou detenção ilegal, a requerer perante o tribunal competente.
2. A providência do habeas corpus pode ser requerida pelo próprio ou por qualquer cidadão no gozo dos seus direitos políticos.
3. O juiz decidirá no prazo de oito dias o pedido de habeas corpus em audiência contraditória.
A previsão e, precisão, da providência, como garantia constitucional, não exclui, porém, o seu carácter extraordinário, vocacionado para casos graves, anómalos, de privação de liberdade, de fundamento constitucionalmente delimitado. que se traduzam em abuso de poder, ou por serem ofensas sem lei ou por serem grosseiramente contra a lei, não constituindo no sistema nacional um recurso dos recursos e muito menos um recurso contra os recursos.
Tal não significa que a providência deva ser concebida, como frequentemente o foi, como só podendo ser usada contra a ilegalidade da prisão quando não possa reagir-se contra essa situação de outro modo, designadamente por via dos recursos ordinários (cf. Ac.do STJ de 29-05-02, proc. n.º 2090/02 -3.ª Secção, onde se explana desenvolvidamente essa tese).
Com efeito, a natureza extraordinária da providência não se refere à sua subsidiariedade em relação aos meios de impugnação ordinários das decisões judiciais, mas antes e apenas à circunstância de se tratar de «providência vocacionada a responder a situações de gravidade extrema, com uma celeridade incompatível com a prévia exaustação dos recursos ordinários e com a sua própria tramitação.
A providência visa, pois, reagir, de modo imediato e urgente, contra a privação arbitrária da liberdade ou contra a manutenção de uma prisão manifestamente ilegal, ilegalidade essa que se deve configurar como violação directa, imediata, patente e grosseira dos seus pressupostos e das condições da sua aplicação.
Atento o carácter extraordinário da providência, para que se desencadeie exame da situação de detenção ou prisão em sede de habeas corpus, há que se deparar com abuso de poder, consubstanciador de atentado ilegítimo à liberdade individual – grave, grosseiro e rapidamente verificável – integrando uma das hipóteses previstas no artigo 222º nº 2, do Código de Processo Penal (acórdão do Tribunal Constitucional de 24 de Setembro de 2003 in proc. nº 571/03)
Em suma:
A previsão - e precisão - da providência, como garantia constitucional, não exclui, porém, a sua natureza específica, vocacionada para casos graves, anómalos, de privação de liberdade, como remédio de urgência perante ofensas graves à liberdade, traduzidas em abuso de poder, ou por serem ofensas sine lege ou, grosseiramente contra legem, traduzidas em violação directa, imediata, patente e grosseira dos pressupostos e das condições da aplicação da prisão, que se apresente como abuso de poder, concretizado em atentado ilegítimo à liberdade individual – grave, grosseiro e rapidamente verificável.
<>-
O artigo 222º do Código de Processo Penal, que se refere ao habeas corpus em virtude de prisão ilegal, estabelece:
1. A qualquer pessoa que se encontrar ilegalmente presa, o Supremo Tribunal de Justiça concede, sob petição, a providência de habeas corpus.
2. A petição é formulada pelo preso ou por qualquer cidadão no gozo dos seus direitos políticos, é dirigida, em duplicado, ao Presidente do Supremo Tribunal de Justiça, apresentada à autoridade à ordem da qual aquele se mantenha preso e, deve fundar-se em ilegalidade da prisão proveniente de:
a) Ter sido efectuada ou ordenada por entidade incompetente;
b) Ser motivada por facto pelo qual a lei a não permite; ou
c) Manter-se para além dos prazos fixados pela lei ou por decisão judicial;
<>
O peticionante alega a ilegalidade da sua prisão, acolhendo-se ao disposto nas diversas alíneas do artº 222º nº 2 al. c) do CPP
<>
Verifica-se dos elementos constantes dos supra identificados autos, relevantes para a presente providência, que:
- No decurso do inquérito que deu origem aos presentes autos, o arguido AA foi sujeito a primeiro interrogatório judicial em 11/11/2009 (cf. fls. 149 a 164), tendo-lhe sido aplicada a medida de coacção de permanência na habitação com vigilância electrónica.
Em 18/11/2009, contudo, a DGRS informou os autos que o mesmo se havia ausentado da sua habitação e que o seu paradeiro era desconhecido, informação que reiterou a 19/11/2009 (cf. fls. 276 e 281).
Nessa sequência, por despacho de 20/11/2009 (cf. fls. 285) foram emitidos mandados de detenção do arguido nos termos do art. 254.º, n.º 1 al. b) e 258.º ambos do CPP.
O inquérito seguiu, então, os seus termos, tendo o Ministério Público, em 18/05/2010, proferido despacho de acusação, imputando, ao arguido, a prática em co-autoria material de um crime agravado de roubo, p.p. nos art. 210.º, n.º 1 e n.º 2 al. a) do CP.
O Processo foi recebido para julgamento por despacho de 28/06/2010 (cf. fls. 601) e na primeira data designada para o efeito, foi proferido despacho, a ordenar a separação de processos nos termos do art. 30.º, n.º 1 al. c) do CPP relativamente ao arguido AA, tendo, para o efeito, sido extraída certidão de todo o processado e instruído o apenso A aos autos onde prosseguiram as diligências tendentes a apurar o seu paradeiro com vista à sua submissão a julgamento.
Já no âmbito desse apenso A (ao qual pertencem todas as fls. que se mencionarão infra) e depois de cumpridos os respectivos editais, foi o arguido declarado contumaz por despacho de 28/02/2011 (cf. fls. 693), tendo sido emitidos novos mandados de detenção (cf. fls. 696).
Em 26/04/2011, em vista do processo, o Ministério Público promoveu a emissão de Mandado de Detenção Europeu e de Mandado de Detenção Internacional com vista à sua detenção, o que foi determinado por despacho de fls. 715 e subsequentemente cumprido (cf. fls. 751 e ss.).
Por ter sido encontrado no Brasil, foi requerida a sua extradição, tendo o Supremo Tribunal Federal deste país decretado a mesma por decisão de 17/05/2016, que transitou em julgado em 21/06/2016 (cf. fls. 932 e ss).
Do mandado de detenção internacional referido provindo do Processo: 1649/09.1japrt-A, do 2º Juízo do Tribunal Judicial de Amarante, de 31-05 -2011,Referência: 25284491 constava:
MANDADO DE DETENÇÃO INTERNACIONAL
EM NOME DA JUSTIÇA E AO ABRIGO DAS DISPOSIÇÕES LEGAIS DE COOPERAÇÃO JUDICIÁRIA INTERNACIONAL EM MATÉRIA PENAL:
Solícíta-se a detenção do indivíduo abaixo indicado e a sua entrega às autoridades judiciárias para efeitos de procedimento penal ou de cumprimenta de uma pena ou medida de segurança privativas de liberdadc.
~ Informações relativas à identidade da pessoa procurada
Apelído:...
Nome(s) própno(s): ...Apelido de solteira, se for caso disso:
Alcunha ou pseudónimos, se for caso disso: sexo:...
Naturalidade/Nacíonalidade: natural de: ...
Data de nascimento: nascido em ... i
Residência (e/ou último paradeiro conhecido}: domicílio: ...
[…]
b) Decisão com força executiva que fundamente o mandado de detenção:
1, Mandado de detenção ou decisão judicial:
Tipo: Para ser submetido a interrogatório judicial, para eventual alteração da medida de coação artº"254°,nºl,b) e 258" ambos do” C.P.Penal
[…]
Pena ainda por cumprir: Não aplicável.
Como se lê no relatório da Segunda Turma do Supremo Tribunal Federal do Brasil, referente à EXTRADIÇÃO 1.400 DISTRITO FEDERAL:
“O Governo de Portugal, mediante o Aviso n. 800j2015-MJ, com base no artigo 10º da Convenção de Extradição entre os Estados-membros da Comunidade dos Países da Língua Portuguesa, firmada em 23 de novembro de 2005 e promulgada pelo Decreto n. 7935, de 19 de fevereiro de 2013, requereu a extradição de AA.
Segundo o referido aviso, o estrangeiro tem contra si mandado de prisão expedido pelo ...º Juízo do Tribunal Judicial de ... (fIs. 7-9), para instrução de ação penal pelo crime de roubo qualificado, punido com pena de reclusão de 3 a 15 anos, de acordo com os arts. 210, nº 1 e nl! 2, alínea 'a', do Código Penal Português.”
Nos termos do voto do Relator:
“[…], estão presentes os requisitos da extradição.
Para a entrega do extraditando, ° Estado requerente deverá assumir os compromissos previstos na lei e nos tratados, notadamente o de computar o tempo de prisão preventiva para fins de extradição,”
E nos termos da acta:
“SEGUNDA TURMA
EXTRATO DE ATA
EXTRADIÇÃO 1.400
PROCEDo : DISTRITO FEDERAL RELATOR : MIN. .... (8) GOVERNO DE PORTUGAL EXTDO. (AiS) : AA
ADV. (AiS) ... (148311/SP)
Decisão: A Turma, por vot ação unânime, deferiu o pedido de extradição, observada a restrição estabelecida no voto do Relator
[…]”
Nessa sequência, o arguido foi entregue pelas autoridades brasileiras ao Gabinete Nacional da Interpol na Fronteira internacional do Aeroporto Internacional de ... em 01/08/2016, pelas 15.00h (cf. fls. 959), tendo sido apresentado a interrogatório judicial no dia seguinte (02/08/2016), pelas 12.10h (cf. fls. 970 e ss.).
No âmbito desse interrogatório, em que já teve como seu defensor mandatado o Il. Advogado Dr. BB, foi determinada a sua prisão preventiva.
Não obstante, na sequência de promoção imediata do Ministério Público, à qual o Il. Defensor do arguido declarou não se opor, foi determinado o seu desligamento dos nossos autos e o ligamento ao processo 134/99.2TATVD onde o mesmo tinha uma pena de prisão para cumprir (cf. Fls. 974, 975 e 952 a 954).
Tais mandados de desligamento/ligamento foram de imediato emitidos, tendo o arguido deixado de estar em prisão preventiva à ordem dos nossos autos e passado a estar em cumprimento de pena à ordem do Processo 134/99.2TATVD, desde o dia 02/08/2016 (cf. fls. 1016 e 1075), situação que ainda se manterá.
No processo .N° 134/99.2TATVD, da Comarca de Lisboa Norte -... - Inst. Local- Secção Criminal- ...,foi proferido despacho em - 29-07-2016 em que se determinava
Informe que interessa a prisão do arguido à ordem destes autos para cumprimento do remanescente da pena aplicada, atenta a decisão de revogação da liberdade condicional concedida (fls. 862 a 868), solicitando ainda que seja enviado, oportunamente, o competente mandado de ligamento a estes autos devidamente certificado.
Informe ainda o processo n.º 1134/140TXPRT-B do Tribunal da Execução das Penas do ... da detenção do arguido.
Nos referidos autos de Processo Comum Colectivo n.º 1649/09.1JAPRT, do ... Juízo Central Criminal de ... Comarca de ..., em 07/10/2016, foi proferido despacho, a agendar a realização da audiência de julgamento para o dia 21/12/2016, sendo que por impossibilidade de comparência do seu mandatário, procedeu-se ao seu reagendamento para as datas de 25/01/2017 e 27/01/2017 (cf. fls. 1079, 1087 a 1089 e 1090).
Nessa sequência, o julgamento realizou-se no dia 25/01/2017, pelas 14.00h, sendo que no dia 01/02/2017 foi proferido, lido e depositado o respectivo acórdão no âmbito do qual se julgou improcedente a acusação deduzida e se absolveu, na íntegra, o arguido, declarando-se, expressamente, a final, a extinção da medida de coacção que lhe havia sido aplicada nestes autos (cf. fls. 1154 e ss., 1160 e ss. a 1168).
Em 23 de Novembro de 2016, o ... Juízo do TEP do ..., proferiu o seguinte despacho:
Em resultado de revogação de liberdade condicional, tem o condenado a cumprir o remanescente de 8 anos, 1 mês e 17 dias da pena aplicada no processo nº 134/99.2TATVO, correspondente ao período compreendido entre a data em que foi colocado em liberdade (30.01.2006) e a data então prevista para o termo dessa pena (17.03.2014).
Foi colocado à ordem desse processo em 02.08.2016.
Deste modo, o termo de execução dessa pena será alcançado em 19.09.2024.
O arguido tem ainda as seguintes condenacões por cumprir:
· Proc. 511/09.2GBAMT, da Instância Central de --- - Secção Criminal ... (burla qualificada, falsificação de documento) - 3 anos 4 meses. O processo encontra-se em recurso no tribunal da Relação.
· Proc. 108/07.1GACBC, da Instância Central de ... - ... Secção Criminal - ... (3 crimes de falsificação de documento qualificado) - 3 anos e 6 meses de prisão
· Proc. 29/07.8GCFLG, Instância Local de ... - Secção de Competência Genérica - ... (falsificação) - 1 ano e 6 meses de prisão
O arguido AA encontra-se detido no Estabelecimento Prisional Central do ..., à ordem do Proc. 134/99.2TATVD da Instancia Local de ...-Secção Criminal-Juiz ...
<>
O que tudo visto:
Já nos termos do Tratado de Extradição entre o Governo da República Portuguesa e o Governo da República Federativa do Brasil (Resolução da Assembleia da República n.º 5/94 ), vigorava o princípio da especialidade, dispondo o Artigo 6.º (Regra da especialidade)–
Uma pessoa extraditada ao abrigo do presente Tratado não pode ser detida ou julgada, nem sujeita a qualquer outra restrição da sua liberdade pessoal no território da Parte requerente, por qualquer facto distinto do que motivou a extradição e lhe seja anterior ou contemporâneo.
2 - Cessa a proibição constante do número anterior quando:
a) A Parte requerida, ouvido previamente o extraditado, der o seu consentimento, na sequência da apreciação de pedido nesse sentido apresentado e decidido nos termos previstos para o pedido de extradição;
b) O extraditado, tendo direito e possibilidade de sair do território da Parte requerente, nele permanecer por mais de 45 dias ou aí voluntariamente regressar.
3 - Se os elementos constitutivos da infracção forem alterados na Parte requerente na pendência do processo contra a pessoa extraditada, só prosseguirá procedimento criminal se os elementos constitutivos da infracção permitirem a extradição de acordo com as disposições do presente Tratado.
Por sua vez nos termos da CONVENÇÃO DE EXTRADIÇÃO ENTRE OS ESTADOS MEMBROS DA CPLP (Resolução da AR n.º 49/2008, de 15 de Setembro), segundo o Artigo 6.º
(Princípio da especialidade)
1 - A pessoa entregue não será detida, julgada ou condenada, no território do Estado requerente, por outros crimes cometidos em data anterior à solicitação de extradição, e não constantes do pedido, salvo nos seguintes casos:
a) Quando a pessoa extraditada, podendo abandonar o território do Estado Contratante ao qual foi entregue, nele permanecer voluntariamente por mais de 45 dias seguidos após a sua libertação definitiva ou a ele voluntariamente regressar depois de tê-lo abandonado;
b) Quando as autoridades competentes do Estado requerido consentirem na extensão da extradição para fins de detenção, julgamento ou condenação da referida pessoa em função de qualquer outro crime.
2 - Para os efeitos da alínea b) do número anterior, o Estado requerente deverá encaminhar ao Estado requerido pedido formal de extensão da extradição, cabendo ao Estado requerido decidir se a concede. O referido pedido deverá ser acompanhado dos documentos previstos no n.º 3 do artigo 10.º e de declarações do extraditado prestadas em juízo ou perante autoridade judiciária, com a devida assistência jurídica.
3 – […]
O artº 25º desta mesma Convenção, substituiu as disposições dos tratados, convenções ou acordos bilaterais que, entre dois Estados Contratantes, regulem a matéria de extradição.
A extradição do requerente, do Brasil para Portugal, foi para efeitos de “ser submetido a interrogatório judicial, para eventual alteração da medida de coação artº"254°,nºl,b) e 258" ambos do” C.P.Penal”, relativamente ao proc. n.º 1649/09.1JAPRT-A da Comarca do ...- Inst. Central- Secção Criminal- ... e só para esse processo,
O arguido foi interrogado judicialmente, e no âmbito desse interrogatório, em que já teve como seu defensor mandatado o Il. Advogado Dr. BB, foi determinada a sua prisão preventiva.
Não obstante, a determinação da prisão preventiva, na sequência de promoção imediata do Ministério Público, à qual o Il. Defensor do arguido declarou não se opor, foi determinado o desligamento do arguido desses autos e o ligamento ao processo 134/99.2TATVD onde o mesmo tinha uma pena de prisão para cumprir (cf. Fls. 974, 975 e 952 a 954).
Tais mandados de desligamento/ligamento foram de imediato emitidos, tendo o arguido deixado de estar em prisão preventiva à ordem dos nossos autos e passado a estar em cumprimento de pena à ordem do Processo 134/99.2TATVD, desde o dia 02/08/2016 (cf. fls. 1016 e 1075),
Na verdade, nesses autos tinha sido pedido o ligamento do arguido ao processo nº134/99.2TATVD, da Comarca de ... - Inst. Local- Secção Criminal- ..., por despacho proferido em 29-07-2016, para cumprimento de remanescente de pena de prisão em que aí tinha sido condenado, ficando, por conseguinte o arguido desligado dos autos que motivaram a extradição e de cuja acusação veio a ser absolvido.
Esse desligamento do arguido nos autos n.º 1649/09.1JAPRT-A de ..., e reafectação do arguido a outro processo, passando a cumprir pena à ordem do proc. nº 134/99.2TATVD, da Comarca de... - Inst. Local- Secção Criminal- ..., ultrapassou o fundamento do pedido de extradição, quer na forma em que foi requerido, quer nos termos e limites em que foi autorizado pela Justiça brasileira.
O facto de o Il. Defensor do arguido, na sequência de promoção imediata do Ministério Público, não se opor aodesligamento do arguido desses autos e o ligamento ao processo 134/99.2TATVD onde o mesmo tinha uma pena de prisão para cumprir, é irrelevante juridicamente nos termos legais para modificar o regime e pressupostos da extradição, em causa
Não foi efectuado pedido de extradição para cumprimento de pena pelo arguido em Portugal, mormente para efeitos de cumprimento do remanescente da pena à ordem dos referidos autos nº 134/99.2TATVD, da Comarca de ... - Inst. Local- Secção Criminal-
Face à natureza estrita e restrita do princípio da especialidade, não pode haver qualquer interpretação extensiva ou analógica que derrogue tal princípio, porque é de natureza pública internacional, e destina-se a salvaguardar a segurança dos cidadãos, e a eficiência da cooperação judiciária internacional entre os Estados, limitada sempre pelo Direito, e dignidade da pessoa humana, excluindo-se assim o perigo de arbitrariedade na aplicação das leis e no equilíbrio do sistema jurídico.
Houve pois, nítido abuso do princípio da especialidade, ao desprezar-se no caso concreto a sua finalidade e os seus limites., fazendo do mesmo letra morta, afectando-se o arguido a processo diferente e finalidade diferente, do que justificou o pedido e autorização concretas da extradição.
È pois ilegal a prisão em que o arguido foi colocado, por violação do princípio da especialidade.
<>
Termos em que, decidindo:
Acordam os deste Supremo – 3ª Secção -, em deferir a petição de habeas corpus apresentada pelo condenado AA, através de seu Exmo. Advogado, por ilegalidade da prisão, decorrente da violação do princípio da especialidade, devendo ser comunicado de imediato, ao processo à ordem do qual o arguido peticionante se encontra preso – proc. Nº 134/99.2TATVD, da Comarca de ... - Inst. Local- Secção Criminal- ..., afim de que esse Tribunal proceda à libertação imediata do peticionante.
Sem custas
Supremo Tribunal de Justiça,
Elaborado e revisto pelo relator
Pires da Graça (relator)
Raúl Borges
Santos Cabral