Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça
Processo:
6659/08.3TBCSC.L1.S1
Nº Convencional: 2ª SECÇÃO
Relator: TOMÉ GOMES
Descritores: AUTORIDADE DO CASO JULGADO
CASO JULGADO
EXTENSÃO DO CASO JULGADO
TERCEIRO
FUNDAMENTOS
PRINCÍPIO DA PRECLUSÃO
ABSOLVIÇÃO DO PEDIDO
ABSOLVIÇÃO DA INSTÂNCIA
Data do Acordão: 03/28/2019
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Privacidade: 1
Meio Processual: REVISTA
Decisão: ALTERADA A DECISÃO DO ACÓRDÃO RECORRIDO
Área Temática:
DIREITO PROCESSUAL CIVIL – ACÇÃO, PARTES E TRIBUNAL / TRIBUNAL / EXTENSÃO E MODIFICAÇÕES DA COMPETÊNCIA – PROCESSO EM GERAL / INSTÂNCIA / EXTINÇÃO DA INSTÂNCIA – PROCESSO DE DECLARAÇÃO / ARTICULADOS / CONTESTAÇÃO / EXCEÇÕES / SENTENÇA / EFEITOS DA SENTENÇA.
DIREITO CIVIL – DIREITO DAS OBRIGAÇÕES / MODALIDADES DAS OBRIGAÇÕES / OBRIGAÇÕES SOLIDÁRIAS / SOLIDARIEDADE ENTRE DEVEDORES / OBRIGAÇÕES DIVISÍVEIS E INDICISÍVEIS.
Doutrina:
- Castro Mendes, Limites Objectivos do Caso Julgado em Processo Civil, Edições Ática, p. 38-39, 43-44;
- Francisco Manuel Lucas Ferreira de Almeida, Direito Processual Civil, Vol. II, Almedina, 2015, p. 626;
- Lebre de Freitas e outros, Código de Processo Civil Anotado, Vol. 2.º, Coimbra Editora, 2.ª Edição, 2008, p. 354 ; Estudos Sobre o Novo Processo Civil, Lex, 1997, p. 578-579;
- Manuel de Andrade, Noções Elementares de Processo Civil, Coimbra Editora, 1976, p. 304;
- Mariana França Gouveia, A Causa de Pedir na Acção Declarativa, Almedina, 2004, p. 399;
- Teixeira de Sousa, O objecto da sentença e o caso julgado material (O Estudo sobre a Funcionalidade Processual), BMJ n.º 325, 1983, p. 49 e ss. e 168 ; Estudos Sobre o Novo Processo Civil, Lex, 1997, p. 572.
Legislação Nacional:
CÓDIGO DE PROCESSO CIVIL (CPC): - ARTIGOS 91.º, N.º 2, 278.º, N.º 1, ALÍNEA E), 573.º, 576.º, N.º 2, 577.º, ALÍNEA F), 581.º E 621.º.
CÓDIGO CIVIL (CC): - ARTIGOS 522.º, 531.º E 538.º, N.º 2.
Jurisprudência Nacional:
ACÓRDÃOS DO SUPREMO TRIBUNAL DE JUSTIÇA:


- DE 13-12-2007, PROCESSO N.º 07A3739;
- DE 06-03-2008, PROCESSO N.º 08B402;
- DE 23-11-2011, PROCESSO N.º 644/08.2TBVFR.P1.S1;
- DE 20-06-2012, PROCESSO N.º 241/07.0TLSB.L1.S1, TODOS IN WWW.DGSI.PT.
Sumário :
I. A autoridade do caso julgado material implica o acatamento de uma decisão de mérito transitada cujo objeto se inscreva, como pressuposto indiscutível, no objeto de outra ação a julgar posteriormente, ainda que não integralmente idêntico, de modo a obstar a que a relação jurídica ali definida venha a ser contemplada, de novo, de forma diversa.

II. Para tal efeito, embora, em regra, o caso julgado não se estenda aos fundamentos de facto e de direito, “a força do caso julgado material abrange, para além das questões diretamente decididas na parte dispositiva da sentença, as que sejam antecedente lógico necessário à emissão da parte dispositiva do julgado”.

III. Além disso, ficam precludidas todas as questões pertinentes não oportunamente suscitadas pela defesa e que o devessem ser, seja como efeito preclusivo autónomo, como entendem uns, seja como efeito integrante do próprio caso julgado, como sustentam outros.

IV. Tal preclusão não contende com o disposto no artigo 91.º, n.º 2, do CPC, uma vez que este normativo o que veda é o efeito de caso julgado material autónomo das decisões sobre questões incidentais ou meios de defesa e não o efeito preclusivo que recaia, nomeadamente, sobre os meios de defesa no âmbito do próprio caso julgado formado sobre a pretensão excecionada ou suscetível de o ser, nos termos conjugados dos artigos 573.º e 621.º do CPC.

V. A autoridade do caso julgado não depende de verificação integral da tríplice identidade prescrita no artigo 581.º do CPC, mormente no plano do pedido e da causa de pedir. Já no respeitante à identidade de sujeitos, esse efeito de caso julgado só vinculará quem tenha sido parte na respetiva ação ou quem, não sendo parte, se encontre legalmente abrangido por via da sua eficácia direta ou reflexa, consoante os casos.

VI. Assim, quem não for parte na ação poderá, todavia, beneficiar do efeito favorável daquele caso julgado em conformidade com a lei, como sucede nas situação de solidariedade entre devedores, de solidariedade entre credores e de pluralidade de credores de prestação indivisível, respetivamente nos termos dos artigo 522.º, 2.ª parte, 531.º, 2.ª parte, e 538.º, n.º 2, do CC.

VII. Verificada a autoridade do caso julgado de uma decisão de mérito que seja incompatível com o objeto a decidir posteriormente noutra ação, o seu alcance não pode deixar de se repercutir no próprio mérito desta, importando, nessa medida, a sua improcedência com a consequente absolvição do réu do pedido.

VIII. Diferentemente sucede no domínio da exceção dilatória de caso julgado como tal incluída no artigo 577.º, alínea f), do CPC, cuja procedência determina a absolvição do réu da instância nos termos dos artigos 278.º, n.º 1, alínea e), e 576.º, n.º 2, do mesmo Código.

Decisão Texto Integral:

Acordam na 2.ª Secção do Supremo Tribunal de Justiça:

I – Relatório  

1. AA(A.) intentou, em 16/09/2008, ação declarativa, sob a forma de processo ordinário, contra:

1.ª R. BB, Ld.ª;  

2.º R. CC,  

3.ª R. DD,  

4.º R. EE,

5.ª R. FF,

6.ª R. GG,

7.º R. HH,

8.º R. II,

a pedir que:

i) - Se declarasse que o bem imóvel correspondente ao prédio urbano sito na Av. ..., n.º …, … e …, concelho e freguesia de ..., inscrito na matriz predial urbana sob o artigo ….º e descrito na Conservatória do Registo Predial de ... sob o n.º …, é propriedade e bem comum da A. e do 2.º R., por ter sido por este adquirido na constância do matrimónio de ambos;

ii) – Em caso de assim não se entender, fosse o 2.º R. condenado a indemnizar a A. pelos prejuízos causados com a interposição abusiva da 1.ª R. como pretensa proprietária do referido imóvel e reconhecido que esta indemnização deve ser paga em espécie e integralmente;

iii) – Ainda subsidiariamente, fossem condenados todos os R.R. a pagar à A. uma indemnização correspondente a metade do valor real do mesmo imóvel, deduzido do preço real de aquisição, de montante nunca inferior a € 563.552,00, devidamente atualizado de acordo com os índices anuais de inflação desde a citação.

       

Alegou a A., para tanto, em síntese, que:

. Contraiu casamento em .../2000 com o 2.º R., segundo o regime da comunhão de adquiridos, o qual foi posteriormente dissolvido por divórcio;

. Na pendência desse casamento, o 2.º R., com dinheiro proveniente de uma conta pessoal, comprou o prédio urbano em causa, destinado a servir de casa de morada de família, o que fez, no entanto, em nome da 1.ª R., sociedade que não desenvolve qualquer atividade comercial ou industrial e que é por ele dominada e utilizada apenas para obtenção de vantagens fiscais.

. Esse prédio foi assim adquirido, mediante escritura outorgada em 16/10/2002, aos 3.º a 8.º R.R.;

. O 2.º R., que celebrou, em seu nome próprio, o contrato pelo qual declarou prometer adquirir o imóvel, fez constar no contrato definitivo o nome da 1.ª R. como sendo a sua adquirente, sem o conhecimento da A., enganando-a quanto à necessidade de realização da respetiva escritura em ..., localidade onde, então, a mesma estava impossibilitada de se deslocar por se encontrar numa situação de gravidez de risco.

. O 2.º R. utilizou abusivamente a personalidade coletiva da 1.ª R., a qual, assim, deve ser desconsiderada;

. Além disso, o 2.º R. atuou de forma ilícita, causando danos à A., pelos quais deve indemnizá-la de acordo com o princípio da reconstituição natural.

. No caso de não ser possível a indemnização por via da reconstituição natural, deve a A. ser indemnizada em dinheiro pelos prejuízos que sofreu com o comportamento ilícito do 2.º R., consistente na utilização abusiva que fez da personalidade da 1.ª R., utilizando-a como veículo para esconder bens comuns do casal, indemnização essa que não deverá ser inferior a metade do valor do imóvel (€ 872.896,00);

. Os demais réus são responsáveis com o 2.º R. pelo pagamento desta indemnização em dinheiro, pois sempre souberam que, ao fazer constar na escritura de compra e venda do imóvel o nome da 1.ª R. como sendo a sua adquirente, aquele 2.º R. abusava da personalidade da sociedade e mesmo assim aceitaram a situação, não se tendo coibido de a outorgar.

2. A 1.ª R. e o 2.º R. contestaram, pugnando pela improcedência da ação, sustentando, no essencial, que o imóvel em causa foi adquirido e pago com dinheiro resultante dos proventos de participações sociais que o 2.º R. obtivera por herança, montante esse adiantado por ele, a título de suprimentos, à sociedade adquirente, não tendo a A. contribuído em nada para a compra daquele imóvel.         

3. Por sua vez, os 3.º e 5.º a 8.º R.R. deduziram contestação, em que, além de impugnarem os factos alegados pela A., invocaram:

   - a ilegitimidade dos R.R. contestantes;

   - a inadmissibilidade do segundo pedido subsidiário contra eles deduzido, porquanto se funda num alegado conluio entre os R.R. com fundamentos de facto e de direito distintos dos respeitantes ao pedido principal e ao primeiro pedido subsidiário;

   - a prescrição, pelo decurso de três anos, do direito de indemnização contra eles deduzido estribada com é em responsabilidade extracontratual.

    4. Também o 4.º R. apresentou contestação, em que impugna, por desconhecimento absoluto, os factos alegados sob os artigos 1.º a 135.º da petição inicial e considera “falsos” os demais fatos alegados nos restantes artigos daquele articulado, concluindo pela sua absolvição do pedido. 

5. A A. deduziu articulado de resposta a sustentar a improcedência das exceções deduzidas.

6. No despacho saneador de fls. 373 e segs., foi julgada improcedente a exceção dilatória de ilegitimidade invocada pelos 3.º e 5.º a 8.º R.R., procedendo-se, de seguida, à seleção da matéria de facto com a organização da base instrutória, prosseguindo assim o processo para julgamento.

7. Já depois disso, vieram a 1.ª R. BB, Ld.ª, e o 2.º R. CC, através do requerimento de fls. 497-504 (Vol. 2.º), de 01/10/2014, suscitar a autoridade do caso julgado emergente da sentença da 1.ª instância, confirmada pela Relação, proferida no processo n.º 3652/09.2TBCSC, instaurado, em 11/05/2009, pela ora 1.ª R. contra a aqui A., alegando que o objeto dessa ação teria alcançado o objeto da presente ação.

8. Realizada a audiência final, foi proferida a sentença de fls. 1353-1376/v.º, datada de 31/08/2017, em que, depois de fixados os factos provados e não provados, se entrou na apreciação da invocada questão de exceção de caso julgado, concluindo-se pela sua procedência com extensão a todos os pedidos formulados, decidindo-se, nessa base, absolver todos os R.R. da instância.

9. Inconformada, veio a A. apelar para o Tribunal da Relação de Lisboa, em sede de facto e de direito, tendo sido proferido o acórdão de fls. 1465-1489/v.º, datado de 13/03/2018, no qual, por unanimidade, se confirmou, sem fundamentação essencialmente diferente, a decisão da 1.ª instância relativamente à procedência da exceção de caso julgado, considerando-se, por esse efeito, prejudicado o conhecimento das demais questões suscitadas pela ali apelante, incluindo a impugnação da decisão de facto e a questão da invocada “fraude à lei”.

10. Desta feita, veio a mesma A. pedir revista, em primeira linha, em termos de revista normal, por considerar não verificada a dupla conforme e, subsidiariamente, a título de revista execional ao abrigo das alíneas a) e b) do n.º 1 do art.º 672.º do CPC.

11. Recebidos os autos neste Supremo, logo em sede de exame preliminar, foi julgada inadmissível a revista em termos normais, por verificação da dupla conforme, ordenando-se, porém, a remessa do processo à formação dos três juízes a que se refere o n.º 3 do indicado 672.º para apreciação preliminar dos requisitos invocados a título de revista excecional, conforme o despacho de fls. 1709-1717, de 20/11/2018.

12. Por aquela formação foi admitida a revista excecional, em face da problemática ainda subsistente sobre a autoridade do caso julgado, mas apenas ao abrigo da alínea a) do n.º 1 do indicado art.º 672.º, considerando-se prejudicado o fundamento previsto na alínea b) do mesmo normativo, conforme acórdão de fls. 1726-1732, datado de 24/01/2019.  

13. Nesta conformidade, o objeto da presente revista passa a circunscrever-se à invocada questão sobre a autoridade do caso julgado, sem prejuízo do efeito adveniente da solução que lhe for dada relativamente à decidida prejudicialidade das demais questões.     

14. Sobre a questão em foco, a A./Recorrente formulou as seguintes conclusões:

1.ª - No respeitante ao mérito da revista excecional e quanto ao caso julgado e à autoridade do caso julgado, veio a Recorrente suscitar perante o Tribunal da Relação a questão que carece aqui de reapreciação: a de formação do caso julgado de decisão proferida no âmbito da ação n.º 3652109.2TBCSC que corre termos no atual Tribunal Judicial da Comarca de Lisboa Oeste, Juízo Central Cível de ..., Juiz 3, no qual a aqui Recorrida BB requereu que o imóvel (onde reside a Recorrente) lhe fosse entregue livre de pessoas e bens;

2.ª – A Relação, confrontado com o pedido da Recorrente, veio negar as suas pretensões, reiterando o decidido na sentença proferida pela 1.a instância: que entre a ação n.º 3652/09.2TBCSC e a presente ação impende a exceção de caso julgado que obsta a que o Tribunal conheça dos pedidos formulados pela Recorrente.

3.ª - Mal andaram ambas as instâncias ao julgarem procedente a exceção de autoridade de caso julgado, na medida em que o pedido e a causa de pedir entre uma e outra ações são diferentes e o próprio Tribunal da Relação naqueloutra ação n.º 3652/09.2TBCSC concluiu que as duas ações eram independentes e nada obstava à sua decisão de forma autónoma, resultando da sentença proferida em 1.a instância o entendimento de que não pode verdadeiramente julgar a questão que lhe foi colocada pela Recorrente, por semelhante questão já ter sido suscitada e alegadamente decidida por decisão transitada em julgado num outro processo judicial.

4.ª - Face a este entendimento, a Recorrente elevou a questão ao Tribunal da Relação, no qual demonstrou que o Tribunal de 1.a instância não procedeu a uma avaliação dos pressupostos da autoridade do caso julgado que se coadune com os princípios basilares do nosso Direito, negando a pretensão das partes de verem os seus pedidos devidamente julgados. Contudo, e contrariamente ao requerido pela recorrente, o acórdão ora recorrido, analisa com alguma profundidade as diferenças entre a figura do caso julgado e a da autoridade do caso julgado sem, contudo, fundamentar adequadamente as razões pelas quais entende que se não verifica no caso sub judice a exceção de autoridade do caso julgado, que sempre se deveria dar por verificada.

5.ª - Esta conduta não pode ser aceite, porquanto, em primeiro lugar, aceitar tal conduta implica aceitar que o mesmo Tribunal (a Relação de Lisboa), proferiu duas decisões contrárias sobre o mesmo tema.

6.ª - Isto porque o Tribunal da Relação de Lisboa entendeu que as questões que se decidiam no âmbito da ação n.º 3652109.2TBCSC eram distintas e, portanto, alvo de serem reapreciadas – das questões que cumpria decidir no âmbito da presente ação. Este mesmo Tribunal, veio agora afirmar, no acórdão recorrido, que as questões que cumpre decidir no âmbito dos presentes autos já foram decidias no âmbito daquela ação.

7.ª - Em segundo lugar, a consequência lógica desta divergência decisória quanto à ação onde devem ser decididos os pedidos resulta numa verdadeira falta de decisão e aparente negação de Justiça. Falta de decisão porque, afinal, nenhuma das instâncias deu resposta aos pedidos formulados pela Recorrente, o que naturalmente tem como consequência uma negação de Justiça.

8.ª - No que respeita à factualidade dos presentes autos, nota-se que veio a Recorrente, na qualidade de A., peticionar que:

i) - se declare o bem imóvel correspondente ao dito prédio urbano sito na Av. ..., n..º …, … e …, concelho e freguesia de ..., inscrito na matriz predial urbana sob o artigo … e descrito na Conservatória do registo Predial de ... sob o n.º …, como propriedade e bem comum do 2.º R. CC e da A. [aqui Recorrente] tendo sido adquirido pelo 2.º R. [Recorrido CC] na constância do matrimónio;

ii) - caso assim não se entenda, que se condene o 2.º R. [Recorrido CC] a indemnizar a A. [Recorrente] pelos prejuízos causados com a interposição abusiva da 1.8 Ré [Recorrida BB] como pretensa proprietária do imóvel sito na Av ... n.º …, … e …, reconhecendo-se que essa indemnização deve ser paga em espécie integralmente;

iii) - caso assim não se entenda, que se condenem todos os RR [Recorridos] a pagar à A. [Recorrente] uma indemnização correspondente a metade do valor real do dito imóvel deduzido do preço real de aquisição, cujo montante nunca é inferior a quinhentos e sessenta e três mil quinhentos e cinquenta devidamente atualizado de acordo com os índices anuais de inflação desde a citação até integral pagamento".

9.ª - Em momento posterior à propositura da presente ação, a R. BB instaurou contra a A. um procedimento cautelar de arrolamento que posteriormente se converteu numa ação de condenação ordinária. Nesta ação n.º 3652109.2TBCSC a R. BB peticionou a condenação da aqui A. a entregar àquela, livre e devoluto, o imóvel cuja propriedade se discute nos presentes autos.

10.ª - A Recorrente que na ação n.º 3652/09.2TBCSC figurou como R. –, entendeu que nessa ação se pretendia o reconhecimento de um direito semelhante ao peticionado na presente ação, tendo, por isso, na sua contestação deduzido (i) uma exceção de litispendência e (ii) uma exceção dilatória inominada fundada no preceito que estatui que “a citação inibe o réu de propor contra o autor ação destinada à apreciação da mesma questão jurídica”.

11.ª - Além das referidas exceções, a ora Recorrente requereu também na ação n.º 3652/09.2TBCSC, em sede de contestação, que o Tribunal ordenasse a suspensão da instância nos termos do então artigo 279.º, n.º 1, do CPC (atual artigo 272.º, n.º 1) e sustentou ainda que caso as exceções dilatórias formuladas naquela ação fossem consideradas procedentes, o pretendido pela ali A., ora Recorrida, BB, não podia merecer acolhimento, na medida em que por recurso à desconsideração da personalidade jurídica da aqui Recorrida BB se chegaria à conclusão que o imóvel era pertença comum do casal constituído pela ora Recorrente e pelo Recorrido CC;

12.ª - As pretensões da Recorrente não procederam na ação n.º 3652/09.2TBCSC, tendo as exceções invocadas em sede de contestação sido julgadas improcedentes.

13.ª - Da sentença da ação n.º 3652109.2TBCSC foi interposto recurso no qual, em sede de contra-alegações a ora Recorrente ali ré e Recorrida – requereu a ampliação do objeto do recurso, voltando a pugnar pelo conhecimento das exceções dilatórias.

14.ª - Tomando posição sobre a ampliação do objeto do recurso, a Relação negou provimento à argumentação aduzida pela aqui Recorrente, ali Recorrida, mantendo o entendimento de que os pedidos formulados na ação n.º 3652/09.2TBCSC e os pedidos formulados na presente ação eram distintos, estando em causa questões jurídicas distintas que mereciam, portanto, julgamentos e decisões distintas.

15.ª - Quanto à alegada autoridade do caso julgado, no respeitante à exceção de litispendência invocada na ação n.º 3652/09.2TBCSC, ambos os Tribunais concluíram que ambas as ações deveriam ser julgadas separadamente, tendo improcedido a exceção de litispendência (por inexistência de pedido de causa de pedir).

16.ª - Quanto à exceção dilatória inominada fundada no artigo 564.º do CPC, tanto a 1.a instância como a Relação, na ação n.º 3652/09.2TBCSC, não concordaram com a argumentação da Recorrente, concluindo que em causa, na presente ação quando comparada com a ação n.º 3652109.2TBCSC, estavam questões jurídicas distintas, que poderiam ser apreciadas em duas ações autónomas.

17.ª - Quanto à exceção dilatória de suspensão da instância, fundada na prejudicialidade entre ambas as ações, ambas as instâncias entenderam que sobre as ações impedia uma manifesta independência, devendo cada uma ser julgada autónoma e independentemente.

18.ª - Tendo o acórdão da Relação de Lisboa proferido na ação n.º 3652109.2TBCSC transitado em julgado (artigo 580.º do CPC), este constitui caso julgado da decisão que comporta. Assim, transitou em julgado a decisão nos ternos da qual se concluiu que nada haveria a obstar a que na presente ação fossem apreciados de forma autónoma e independente os pedidos nela deduzidos independentemente do decidido na ação n.º 3652/09.2TBCSC.

19.ª - Logo, nos presentes autos, a Relação não poderia, na decisão recorrida, concluir pela autoridade do caso julgado e assim não tomar posição sobre o objeto da presente ação. A autoridade do caso julgado que o Tribunal da Relação afirma existir nos presentes autos, configura uma verdadeira inconstitucionalidade (cfr. Prof Remédio Marques) que o Tribunal ad quem não pode permitir;

20.ª - Pelo que sempre o acórdão recorrido deverá ser revogado e substituído por outro que aprecie as questões materiais suscitadas nesta ação, concluindo-se pela inexistência de caso julgado (seja a exceção ou a autoridade de caso julgado), em conformidade com o acórdão transitado em julgado e proferido na ação n.º 3652109.2 TBCSC.

21.ª - Ainda que assim não se entendesse, sempre se diria que os argumentos avançados pela Recorrente na ação n.º 3652109.2TBCSC e no sentido da desconsideração da personalidade jurídica da Recorrida BB o foram a título de exceção.

22.ª - A improcedência das exceções invocadas pela ora recorrente na ação n.º 3652109.2TBCSC não podiam impedir que a Relação, no acórdão recorrido, apreciasse os pedidos formulados pela A. nesta mesma ação (cfr. Prof Remédio Marques), pelo que a Relação deveria ter apreciado as questões suscitadas por ela, ainda que as mesmas houvessem sido invocadas a título de exceção, naquela ação, não podendo concluir pela autoridade do caso julgado.

23.ª - Pelo que sempre o acórdão recorrido deverá ser revogado e substituído por outro que aprecie as questões materiais suscitadas nesta ação, concluindo-se pela inexistência de caso julgado (seja a exceção ou a autoridade de caso julgado) entre as questões alegadas a título de exceção na ação n.º 3652109.2TBCSC e as questões colocadas à apreciação do Tribunal a quo na presente ação;

Pede a A./Recorrente que se revogue o acórdão recorrido e se substitua por decisão que aprecie as questões materiais suscitadas nesta ação e se conclua pela inexistência de caso julgado (seja a exceção ou a autoridade de caso julgado) entre as questões alegadas a título de exceção na ação n.º 3652/ 09.2TBCSC e as questões colocadas na presente ação.

15. A 1.ª R. e o 2.º R. apresentaram contra-alegações em que, além do mais, concluíram pela negação da revista.

Colhidos os vistos, cumpre apreciar e decidir.  

II – Delimitação do objeto do recurso

Como já foi acima dito, o objeto da presente revista excecional confina-se à invocada questão sobre a autoridade do caso julgado, sem prejuízo do efeito resultante da solução que lhe for dada relativamente à decidida prejudicialidade das demais questões.    

Significa isto que será em função da solução dada àquela questão fundamental que se ajuizará da prejudicialidade ou não das demais questões suscitadas e, em caso negativo, se determinará o seu conhecimento pelas instâncias.

III – Fundamentação

1. Contornos do objeto do litígio

Com a presente ação pretende a A. o seguinte:

i) - Em primeira linha, obter o reconhecimento judicial da propriedade sobre o prédio urbano em causa como bem comum do então casal constituído pela mesma A. e 2.º R. fundado em que o referido prédio fora comprado por este, mediante utilização abusiva da personalidade coletiva da 1.ª R., na constância do casamento celebrado sob o regime de comunhão de adquiridos;

ii) - Em segunda linha, por via subsidiária, obter a condenação do 2.º R. em indemnização, na modalidade de reconstituição natural, dos prejuízos que este lhe teria causado com a sobredita  interposição abusiva da 1.ª R. como pretensa proprietária desse prédio;

iii) - Por fim, em 2.ª via subsidiária, obter a condenação de todos os R.R. numa indemnização correspondente a metade do valor real do sobredito prédio, deduzido o preço real de aquisição, em montante nunca inferior a € 563.552,00, atualizado de acordo com os índices de inflação desde a citação, com fundamento em conluio havido entre aqueles R.R. na aludida utilização abusiva, por parte do 2.º R., da personalidade coletiva da 1.ª R. aquando da aquisição o imóvel.

Posteriormente ao despacho saneador, a 1.ª R. e o 2.º R. vieram suscitar a exceção de autoridade do caso julgado, alegando que, no âmbito de uma ação que correu termos no processo n.º 3652/09.2TBCSC, instaurada, em 11/05/2009, pela ora 1.ª R. BB contra a aqui A. AA, em que foi pedida a condenação desta a entregar àquela o imóvel em referência, foi proferida sentença, confirmada pela Relação, a julgar tal ação improcedente no respeitante à pretendida entrega do imóvel, mas julgando-se também improcedentes as questões ali suscitadas pela então ré, ora A., sobre a propriedade do imóvel invocada pela ali autora e aqui 1.ª R. e quanto a pretensa desconsideração da personalidade coletiva desta na aquisição daquele bem. 

  

Depois de fixada a matéria de facto provado e não provada e de exposta a respetiva motivação, a 1.ª instância começou logo por equacionar, em sede de fundamentação de direito, a invocada exceção de autoridade de caso julgado, o que, de resto, condiz com a ordem das questões a resolver indicada no artigo 608.º, n.º 1, do CPC.

Nessa perspetiva, naquela sentença, foi consignado o seguinte (fls. 1356/1357): 

«Cumpre apreciar em primeiro lugar se se verifica a exceção invocada pela Autora de força de caso julgado e caso se decida pela sua improcedência, se é de aplicar ao caso o instituto do abuso da personalidade coletiva e se por via dessa aplicação se há que considerar bem comum ou, quanto aos pedidos subsidiários, se se verificam os pressupostos da responsabilidade aquiliana que justifiquem a condenação dos Réus no pagamento de uma indemnização a favor da Autora (…)» 

Na esteira dessa apreciação, concluiu-se pela procedência da sobredita exceção, considerando-se, no essencial, que, no referido processo n.º 3652/09.2TBCSC, ficou decidida a questão da propriedade do imóvel ora ajuizado ali atribuída à BB, Ld.ª (então A. e aqui 1.ª R.), e não ao casal formado pela ora A. e 2.º R., e que tal efeito de autoridade de caso julgado se estendia às demais pretensões subsidiárias formuladas na presente ação e em relação a todos os R.R. (vide fls. 1374/v.º), muito embora tal conclusão tenha ainda sido reforçada com argumentação subsidiária em torno da questão da desconsideração da personalidade jurídica das pessoas coletivas (vide fls. 1373/v.º e esgs.).   

Seja como for, nessa base, foi decidido absolver os R.R. da instância com o que ficaram, obviamente, prejudicadas as demais questões de mérito suscitadas, aliás, em sintonia com o que decorre do preceituado no art.º 608.º, n.º 2, do CPC. 

Inconformada, a A. recorreu dessa decisão, em sede de facto e de direito, para o Tribunal da Relação de Lisboa, que, através do acórdão de fls. 1465-1489, datado de 13/03/2018, por unanimidade, confirmou, sem fundamentação essencialmente diferente, o julgado na 1.ª instância sobre a procedência da referida exceção de autoridade de caso julgado e a consequente absolvição dos R.R. da instância. E, em função disso, considerou também a Relação prejudicado o conhecimento das demais questões suscitadas, incluindo a impugnação deduzida pela A. sobre a decisão de facto e a invocada questão de “fraude à lei”.

Vem, no entanto, a Recorrente impugnar o assim decidido estribada nas razões constantes das respetivas conclusões recursórias acima transcritas. 

2. Quanto à questão sobre a autoridade do caso julgado  

2.1. Caracterização da autoridade do caso julgado

A obrigatoriedade das decisões dos tribunais proclamada no artigo 205.º, n.º 2, da Constituição da República postula que lhes seja conferida eficácia de caso julgado, o que constitui fator de segurança e certeza jurídica na resolução judicial dos litígios.

Assim, às decisões judiciais que versem sobre a relação material controvertida, quando transitadas em julgado, é atribuída força obrigatória dentro e fora do processo nos limites subjetivos e objetivos fixados nos artigos 580.º e 581.º do CPC e nos precisos termos em que julga, como se preceitua nos artigos 619.º, n.º 1, e 621.º do mesmo Código, com o que se forma o denominado caso julgado material.

Segundo Manuel de Andrade[1], o caso julgado material:

«Consiste em a definição dada à relação controvertida se impor a todos os tribunais (e até a quaisquer outras autoridades) – quando lhes seja submetida a mesma relação, quer a título principal (repetição da causa em que foi proferida a decisão), quer a título prejudicial (acção destinada a fazer valer outro efeito dessa relação). Todos têm que acatá-la, julgando em conformidade, sem nova discussão.»

      Para o mesmo Autor[2], o instituto do caso julgado assenta em dois fundamentos:

a) – o prestígio dos tribunais, que ficaria altamente comprometido “se a mesma situação concreta, uma vez definida por eles em dado sentido, pudesse depois ser validamente definida em sentido diferente”;    

b) – e, mais importante, uma razão de certeza ou segurança jurídica, já que sem a força do caso julgado se cairia “numa situação de instabilidade jurídica (…) fonte perene de injustiças e paralisadora de todas as iniciativas”.

         Nas palavras daquele Autor:

«O caso julgado material não assenta numa ficção ou presunção absoluta de verdade (…), por força da qual (…) a sentença (…) transforme o falso em verdadeiro. Trata-se antes de que, por uma fundamental exigência de segurança, a lei atribui força vinculativa infrangível ao acto de vontade do juiz, que definiu em dados termos certa relação jurídica, e portanto os bens (materiais ou morais) nela coenvolvidos. Este caso fica para sempre julgado. Fica assente qual seja, quanto a ele, a vontade concreta da lei (Chiovenda). O bem reconhecido ou negado pela pronuntiatio judicis torna-se incontestável.

Vê-se portanto que a finalidade do processo não é apenas a justiça – a realização do direito objectivo ou a actuação dos direitos subjectivos privados correspondentes. É também a segurança – a paz social (Schönke)»

No respeitante à eficácia do caso julgado material, desde há muito, quer a doutrina[3] quer a jurisprudência têm distinguido duas vertentes:

a) – uma função negativa, reconduzida a exceção de caso julgado, consistente no impedimento de que as questões alcançadas pelo caso julgado se possam voltar a suscitar, entre as mesmas partes, em ação futura; 

b) – uma função positiva, designada por autoridade do caso julgado, através da qual a solução nele compreendida se torna vinculativa no quadro de outros casos a ser decididos no mesmo ou em outros tribunais.

        A repetição de causas que se pretende evitar por via da exceção do caso julgado material requer sempre, segundo entendimento unânime, a verificação da tríplice identidade hoje estabelecida no artigo 581.º do CPC: a identidade de sujeitos; a identidade de pedido e a identidade de causa de pedir.

        Porém, quanto à autoridade do caso julgado, segundo a doutrina e jurisprudência predominantes, ela não requer a verificação integral daquela tríplice identidade, podendo imperar sobre decisões posteriores, designadamente quanto a questões que sejam antecedente lógico necessário da parte dispositiva do julgado[4].

Quanto à identidade objetiva, segundo Castro Mendes[5]:

«(…) se não é preciso entre os dois processos identidade de objecto (pois justamente se pressupõe que a questão que foi num thema decidendum seja no outro questão de outra índole, maxime fundamental), é preciso que a questão decidida se renove no segundo processo em termos idênticos»         

       Para aquele Autor, constitui problema delicado a “relevância do caso julgado em processo civil posterior, quando nesse processo a questão sobre a qual o caso julgado se formou desempenha a função de questão fundamental ou mesmo de questão secundária ou instrumental, não de thema decidenum.[6]

            Lebre de Freitas e outros[7] consideram que:

   «(…) a autoridade do caso julgado tem (…) o efeito positivo de impor a primeira decisão, como pressuposto indiscutível da segunda decisão de mérito (…). Este efeito positivo assenta numa relação de prejudicialidade: o objecto da pri-meira decisão constitui questão prejudicial na segunda acção, como pressuposto necessário da decisão de mérito que nesta há-de ser proferida.»

Por sua vez, no respeitante aos limites objetivos do caso julgado, Teixeira de Sousa escreve o seguinte[8]:

   «O caso julgado abrange a parte decisória …, isto é, a conclusão extraída dos seus fundamentos (…).

   Como toda a decisão é a conclusão de certos pressupostos (de facto e de direito), o respectivo caso julgado encontra-se sempre referenciado a certos fundamentos. Assim, reconhecer que a decisão está abrangida pelo caso julgado não significa que ela valha, com esse valor, por si mesma e independente dos respectivos fundamentos. Não é a decisão, enquanto conclusão do silogismo judiciário, que adquire o valor de caso julgado, mas o próprio silogismo considerado no seu todo: o caso julgado incide sobre a decisão como conclusão de certos fundamentos e atinge estes fundamentos enquanto pressupostos daquela decisão.

   (…)

   O caso julgado da decisão também possui valor enunciativo: essa eficácia de caso julgado exclui toda a situação contraditória ou incompatível com aquela que ficou definida na decisão transitada. Excluída está, desde logo, a situação contraditória: se, por exemplo, o autor é reconhecido como proprietário, então não o é o demandado (…).

   Além disso, está igualmente afastado todo o efeito incompatível, isto é, todo aquele que seja excluído pelo que foi definido na decisão transitada.»      

Assim, a autoridade do caso julgado material implica o acatamento de uma decisão de mérito transitada cujo objeto se inscreva, como pressuposto indiscutível, no objeto de outra ação a julgar posteriormente, ainda que não integralmente idêntico, de modo a obstar a que a relação jurídica ali definida venha a ser contemplada, de novo, de forma diversa.

         Para tal efeito, embora, em regra, o caso julgado não se estenda aos fundamentos de facto e de direito, “a força do caso julgado material abrange, para além das questões diretamente decididas na parte dispositiva da sentença, as que sejam antecedente lógico necessário à emissão da parte dispositiva do julgado.”[9]

          Em suma, a eficácia de autoridade de caso julgado pressupõe uma decisão anterior definidora de direitos ou efeitos jurídicos que se apresente como pressuposto indiscutível do efeito prático-jurídico pretendido noutra ação no quadro da relação material controvertida aqui invocada.

Outro problema relevante para a delimitação objetiva do caso julgado é o de saber quais os efeitos preclusivos decorrentes da primeira ação no respeitante à defesa em virtude do ónus de concentração estabelecido no artigo 573,º do CPC, cujo n.º 1 determina que toda a defesa deve ser deduzida na contestação ou excecionalmente em momento posterior do processo, nos termos do n.º 2 do mesmo normativo.

Nessa base, a doutrina e a jurisprudência têm vindo a entender que ficam precludidas todas as questões pertinentes não oportunamente suscitadas pela defesa e que o devessem ser, entendendo uns que tal efeito preclusivo se inscreve ainda no âmbito do caso julgado[10], enquanto outros o definem como efeito autónomo[11].

E convém referir que tal preclusão não contenderá com o disposto no artigo 91.º, n.º 2, do CPC, uma vez que este normativo o que veda é o efeito de caso julgado material autónomo das decisões sobre questões incidentais ou meios de defesa e não o efeito preclusivo que recaia, nomeadamente, sobre os meios de defesa no âmbito do próprio caso julgado formado sobre a pretensão excecionada ou suscetível de o ser, nos termos conjugados dos artigos 573.º e 621.º do CPC.

         

2.2. Parâmetros comparativos entre o objeto da ação no processo n.º 3652/09.2TBCSC e a decisão ali proferida e o objeto da presente ação

Consta dos autos (fls. 614-752) que a 1.ª R. BB, Ld.ª, instaurou, em 11/05/2009 (fls. 614-623), uma ação declarativa contra a aqui A. AA, que correu os seus termos no processo n.º 3652/09.2TBCSC, a pedir a condenação desta a entregar-lhe o prédio urbano objeto da presente ação, alegando, para tanto, em resumo, que:

. A ali autora BB adquiriu o referido prédio através de um contrato de compra e venda celebrado mediante escritura pública outorgada em 16/10/2002, ficando assim dona e legítima proprietária do mesmo;

. Em setembro de 2003, aquela autora permitiu, por mera tolerância, que os seus sócios, a ali ré AA, ora A., e o então seu marido CC, aqui 2.º R., à data gerente da BB, residissem nesse prédio;

. Todavia, aquele casal deixou de viver em comunhão conjugal a partir de junho de 2004, tendo o marido deixado de habitá-lo;

. Em face disso, foi deliberado em assembleia geral da BB pôr termo à sobredita permissão da utilização do prédio, por parte dos seus sócios, tendo sido notificada a ali ré AA para o entregar

. No entanto, aquela ré recusou-se a fazê-lo, escudando-se no facto de lhe ter sido atribuída a utilização provisória da referida habitação no âmbito de um processo judicial de divórcio e de ser depositária da mesma no âmbito de uma providência cautelar de arrolamento.

        A ré AA contestou a referida ação, invocando:

  . A exceção dilatória de litispendência entre aquela ação (n.º 3652/09.2TBCSC – instaurada em 11/05/2009) e a presente causa anteriormente proposta (em 16/09/2008); 

   . A exceção dilatória inominada fundada no disposto no então art.º 481.º, alínea c), do CPC, segundo o qual, a ali autora (BB), uma vez citada como ré para a presente ação, estava inibida de propor aquela outra ação;    

   . A desconsideração da personalidade coletiva da BB com vista a considerar-se que o mencionado prédio não era propriedade daquela sociedade, mas sim bem comum do casal;

   . A existência de título para o uso do imóvel por parte da ali ré, por ser a casa de morada de família do casal e por tal uso lhe ter sido judicialmente atribuído durante a pendência do processo de divórcio, conforme acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa de 25/10/2007.

       No referido processo n.º 3652/09.2TBCSC, em sede de saneador, foram julgadas improcedentes as exceções dilatórias invocadas pela ali ré e, prosseguindo aquele processo para julgamento, foi proferida a sentença final, datada de 31/10/2011, reproduzida a fls. 711-725, a julgar aquela ação improcedente com a consequente absolvição do pedido da ali ré AA.

        Nessa sentença, foi considerado, em primeira linha, que a ali autora (BB) beneficiava da presunção da inscrição predial da aquisição do prédio a seu favor e, em segundo plano, que nada decorria da matéria provada que demonstrasse a alegada desconsideração da personalidade coletiva daquela autora, nem, por via disso, a inexistência do direito de propriedade da mesma sobre o imóvel.

       Não obstante isso, na mesma sentença, foi entendido que a decisão proferida no processo de divórcio do casal conferiu à ali ré AA o uso da casa de morada de família, a título provisório, decisão essa que se impunha com força de caso julgado erga omnes. E mais se entendeu que, uma vez decretado o divórcio, a ocupação do imóvel pela ali ré não podia subsistir, não só por ter cessado a finalidade para a qual a casa fora comodatada, como também porquanto, após a dissolução do casamento, o tribunal só poderia atribuir a casa de morada de família a qualquer dos ex-cônjuges se a mesma fosse património comum ou de um deles ou, ainda, se fosse arrendada.  

      Nessa base, concluiu-se que a ação devia “ser julgada improcedente, sem embargo de essa improcedência ser ditada por não estarem ainda verificadas as condições materiais para o exercício do direito do demandante, pelo que não deixará de se aplicar in casu o disposto na 2.ª parte do art.º 673.º do CPC.”

      De tal decisão a autora BB interpôs recurso para o Tribunal da Relação de Lisboa, em que a ré recorrida pediu a ampliação do seu objeto, tendo ali sido apreciadas, no que aqui releva, as questões relativas à qualificação do contrato e à verificação dos pressupostos para requerer a restituição do imóvel, bem como as questões respeitantes às invocadas exceções dilatórias de litispendência e inominada.

       O recurso foi julgado pelo acórdão reproduzido a fls. 727-752, de 18/09/2012, transitado em julgado em 24/10/2012 (fls. 611), no qual se concluiu pela improcedência da apelação e pela não verificação das exceções dilatórias invocadas pela ali ré, confirmando-se a sentença recorrida.

       De referir que, no tocante à litispendência, foi ali entendido que não ocorria identidade de pedidos nem de causas de pedir, com as seguintes considerações:

«Nos presente autos, o pedido formulado pela A. é o da entrega do prédio, que tem subjacente, implicitamente, o reconhecimento do direito de propriedade da A. sobre o mesmo.

No processo n.º 6659/08.3TBCSC, o pedido (principal) é que se declare que o imóvel objecto destes autos é propriedade e bem comum do R. CC e da A., tendo sido adquirido por aquele R. na constância do matrimónio.

Desde logo, os pedidos não são idênticos, mas, antes, contraditórios, estando em causa acções frequentemente denominadas de “cruzadas”.

(…)

Também não há identidade total das causas de pedir.

Na presente acção a causa de pedir é a compra e venda celebrada por escritura de 16.10.2002, através da qual a A. adquiriu o imóvel objecto dos autos e o registo do mesmo a seu favor, e a inexistência de título para a R. o ocupar.

Na acção n.º 6659/08.3TBCSC, a causa de pedir assenta, indirectamente, na referida compra e venda, e, directamente, na interposição abusiva da A. na aquisição do imóvel.

Embora nas duas acções exista coincidência parcial das questões a analisar, os pedidos não são os mesmos, não se apreciando naquela acção o pedido formulado pela A. na presente acção.»

         2.3. Da verificação da autoridade do caso julgado 

Do quadro acima traçado extrai-se que o silogismo judiciário em que se estriba o juízo de improcedência da pretensão restituitória deduzida pela BB no referido processo n.º 3652/09.2TBCSC encerra, nas suas premissas, o reconhecimento do direito de propriedade dessa autora sobre o imóvel ora em causa, perante a ali ré e aqui A. AA, derivado da presunção legal do registo a seu favor, nos termos do artigo 7.º do Código de Registo Predial.

E foi a partir desse reconhecimento que, no entanto, também se reconheceu o direito da ali ré ao uso do mesmo, a título provisório, até à decretação do divórcio do casal constituído pela mesma ré e pelo ora 2.º R. CC. Assim, a atribuição provisória desse uso assenta, em última análise, no facto de o imóvel ter sido cedido, temporária e gratuitamente, pela sua proprietária BB para servir de casa de morada de família dos seus sócios, que integravam aquele casal.

É certo que a ali ré AA procurou, em sede de defesa, demonstrar o seu direito à ocupação do imóvel por via da alegada desconsideração da personalidade coletiva da BB na compra do mesmo, de modo a negar a aquisição do respetivo direito de propriedade por parte desta sociedade e a fazer prevalecer a natureza dele como bem comum do casal, não conseguindo tal desiderato. Logrou apenas demonstrar o seu direito ao uso do imóvel, a título provisório, como casa de morada da família que era, o que levou então à improcedência da pretensão restituitória da BB, apesar de se reconhecer a esta o direito de propriedade sobre o mesmo, fundado na presunção legal baseada na inscrição predial, a seu favor, da respetiva aquisição por compra.       

Nestas circunstâncias, afigura-se que o reconhecimento do direito de propriedade da BB sobre aquele imóvel ínsito no veredito do processo n.º 3652/09.2TBCSC consubstancia decisão de questão fundamental com autoridade de caso julgado, nos termos do 621.º do CPC.

No alcance desse caso julgado devem considerar-se também compreendidas as questões ali suscitadas em sede de defesa que não mereceram procedência, como, no caso, fora a questão respeitante à alegada desconsideração da personalidade coletiva da BB na compra do imóvel. E devem ainda ser consideradas precludidas as questões que incumbia à defesa alegar e provar face ao direito invocado pela ali autora, nos termos do artigo 573.º correspondente ao anterior artigo 489.º do CPC, como acima se deixou exposto.           

Assim, o reconhecimento do direito de propriedade da BB sobre o imóvel em causa, coberto como está pelo efeito da autoridade do caso julgado material decorrente da decisão proferida no processo n.º 3652/09.2TBCSC, mostra-se incompatível com ulterior reconhecimento de que o mesmo imóvel tem a natureza de bem comum do casal formado pela ali ré e aqui A. AA e pelo ora R. CC, tal como se pretende na presente ação.    

Não obsta a tal incompatibilidade o facto de terem sido julgadas improcedentes, naquele processo, as sobreditas exceções dilatórias de litispendência e inominada ali deduzidas pela ré AA.

Como bem, a nosso ver, foi entendido no acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa reproduzido a fls. 727-752, de 18/09/2012, proferido no processo n.º 3652/09.2TBCSC, não ocorre identidades de pedidos nem de causas de pedir entre o objeto daquela ação e o da presente causa.

Com efeito, ali, a BB deduziu uma pretensão de condenação da ré AA na restituição do imóvel, fundada no seu alegado direito de propriedade sobre o mesmo e na falta de título por parte dessa ré para a sua ocupação. Na presente causa, diversamente, é a aqui A. e ali ré AA que pretende o reconhecimento daquele imóvel como bem comum do casal com fundamento em que a BB não teria adquirido o mesmo em virtude da desconsideração da sua personalidade coletiva aquando da respetiva compra. Significa isto que o objeto de uma e outra ação são perfeitamente distintos e até incompatíveis, traduzindo-se no que se designa por “ações cruzadas”, como se refere no acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa proferido no processo n.º 3652/09.2TBCSC.

Por outro lado, sendo tais pretensões incompatíveis entre si, nem tão pouco existe precedência lógica de qualquer delas em relação à outra que implique a verificação de causa prejudicial, nos termos e para os efeitos do disposto no artigo 272.º, n.º 1, 1.ª parte, do CPC; o veredito da ação que primeiro seja decidida, prevalecerá.    

Mas nem por isso, a ora A. ficou diminuído no exercício do seu direito, na medida em que poderia acautelá-lo em sede de defesa impugnativa ou excetiva a deduzir na segunda ação, além de, porventura, poder lançar mão do mecanismo da apensação de ações, nos termos previsto no artigo 267.º, n.º 1, correspondente ao anterior artigo 275.º do CPC, por forma a provocar o julgamento simultâneo das duas ações.  

Importa agora equacionar a extensão do referido efeito da autoridade do caso julgado produzido no processo n.º 3652/09.2TBCSC aos réus da presente causa que não foram demandados naquele processo, como são os 2.º a 8.º R.R..

Como já se disse, a autoridade do caso julgado não depende da verificação integral ou completa da tríplice identidade prescrita no artigo 581.º do CPC, mormente no plano do pedido e da causa de pedir. Já no respeitante à identidade de sujeitos, esse efeito de caso julgado só vinculará quem tenha sido parte na respetiva ação ou quem, não sendo parte, se encontre legalmente abrangido por via da sua eficácia direta ou reflexa, consoante os casos.

Assim, quem não for parte na ação poderá, todavia, beneficiar do efeito favorável daquele caso julgado em conformidade com a lei, como sucede nas situação de solidariedade entre devedores, de solidariedade entre credores e de pluralidade de credores de prestação indivisível, respetivamente nos termos dos artigo 522.º, 2.ª parte, 531.º, 2.ª parte, e 538.º, n.º 2, do CC.

Com efeito, ao devedor solidário aproveitará o caso julgado favorável constituído em relação a um seu condevedor com fundamento não respeitante pessoalmente a este (art.º 522.º, 2.ª parte, do CC), como também aproveitará ao credor solidário o caso julgado favorável a um seu co-credor, sem prejuízo das exceções pessoais que o devedor tenha o direito de invocar em relação a cada um deles (art.º 531.º, 2.ª parte, do CC). E no âmbito de pluralidade de credores de prestação indivisível, o caso julgado favorável a um dos credores aproveita aos demais co-credores, se o devedor não tiver, contra estes, meios específicos de defesa (art.º 538.º, n.º 2, do CC).      

No caso presente, o efeito da autoridade do caso julgado material do reconhecimento do direito de propriedade da BB sobre o imóvel em causa decorrente da decisão proferida no processo n.º 3652/09.2TBCSC, vinculativo para a ali ré e ora A. AA, aproveita ao aqui 2.º R. CC, na medida em que tal reconhecimento lhe é favorável na perspetiva da pretensão contra ele deduzida na presente causa pela mesma A. de reconhecimento do imóvel como bem comum do casal, fundado na alegada intromissão abusiva da personalidade coletiva da ora 1.ª R., aquando da celebração da compra do referido imóvel, imputada ao 2.º R..

Mais precisamente, estando esse reconhecimento do direito de propriedade da BB sobre o mencionado imóvel ancorado, além do mais, na não verificação da alegada intromissão abusiva da personalidade coletiva daquela sociedade e sendo esta intromissão abusiva imputada, na presente ação, a título de ilicitude na modalidade de abuso do direito daquela pessoa coletiva, em co-autoria, à 1.ª R. e ao 2.º R., a este aproveita o assim decidido quanto àquela no processo n.º 3652/09. 2TBCSC, ao abrigo do art.º 522.º, 2.ª parte, do CC, já que dessa pretensa ilicitude resultaria a responsabilidade solidária desses R.R. nos termos dos artigos 490.º e 497.º do mesmo Código.  

Tal aproveitamento favorável, por parte do 2.º R. atingirá, desse modo, quer a pretensão principal de reconhecimento do direito sobre o imóvel em causa como bem comum do casal, invocado pela A., quer as pretensões indemnizatórias, em espécie e por equivalente, subsidiariamente contra o mesmo R. deduzidas com fundamento na alegada intromissão abusiva da personalidade coletiva da 1.ª R..

De igual modo, o sobredito efeito de autoridade de caso julgado aproveita também aos demais R.R. (3.º a 8.º R.R.), relativamente à pretensão indemnizatória contra eles subsidiariamente deduzida também com fundamento em alegado conluio de todos eles na pretensa intromissão abusiva, já que, em tal base, figuram como devedores solidários da 1.ª R. BB, demandante no processo n.º 3652/09.2TBCSC, nos termos e para os efeitos dos artigos 490.º, 497.º e 522.º, 2.ª parte, do CC.  

Em suma, o efeito de autoridade do caso julgado material de reconhecimento do direito de propriedade da BB sobre o imóvel ajuizado decorrente da decisão proferida no processo n.º 3652/09.2TBCSC, nos ter-mos em que ali foi julgado (art.º 621.º do CPC), compreendendo, como compreendeu a não verificação da alegada intromissão abusiva da personalidade coletiva da 1.ª R., não só se mostra vinculativo para a ora A. perante a 1.ª R. BB como ainda aproveita favoravelmente aos demais réus, conforme o acima exposto.

2.4. Quanto à alegada questão de fraude à lei

Veio ainda a A. suscitar, na presente ação, a questão da fraude à lei, por parte da atuação concertada da 1.ª R. e do 2.º R., sustentando que estes se conluiaram para subtrair, ilicitamente, o imóvel em causa ao património do casal, violando o disposto nos artigos 564.º e 580.º do CPC e os artigos 483.º e 1724.º do CC.

As instâncias consideraram tal questão prejudicada pela solução dada à questão pertinente à autoridade do caso julgado.

Ora, na linha do já acima exposto, o caso julgado alcança também a preclusão de todas as questões em relação aos quais impenda sobre o réu o ónus de concentrar toda a defesa conforme o estabelecido no artigo 573,º do CPC.

Assim, não tendo a ora A. suscitado a referida questão aquando da sua defesa deduzida no processo n.º 3652/09.2TBCSC perante a ali A. BB, tal questão encontra-se irremediavelmente precludida, pelo menos no âmbito das pretensões deduzidas na presente ação.

Essa preclusão não só vincula a A. perante a 1.ª R. como também aproveita ao 2.º R. a quem tal ilicitude vem imputada a título de co-autoria, nos termos e para os efeitos dos já indicados artigos 490.º, 497.º e 522.º, 2.ª parte, do CC.

Termos em que tal questão se encontra coberta pela autoridade do caso julgado acima considerada.

3. Conclusão final

Verificada que está a autoridade do caso julgado material constituído pela decisão proferida no processo 3652/09.2TBCSC e sendo tal efeito incompatível com os efeitos prático-jurídicos objeto das pretensões deduzidas na presente ação, o seu alcance não pode deixar de se repercutir no próprio mérito destas pretensões.

Diferentemente sucederia no domínio da exceção dilatória de caso julgado incluída no catálogo exemplificativo do artigo 577.º do CPC, mais precisamente na respetiva alínea f), 2.ª parte, cuja procedência determina a absolvição do réu da instância nos termos dos artigos 278.º, n.º 1, alínea e), e 576.º, n.º 2, do mesmo Código.

Tal diferenciação entre os efeitos decorrentes da autoridade do caso julgado e os emergentes da exceção de caso julgado encontra-se bem traçada por Teixeira de Sousa[12] quando, a tal propósito, refere que:

«[…] os efeitos do caso julgado material projectam-se em processo subsequente necessariamente como autoridade de caso julgado material, em que o conteúdo da decisão anterior constitui uma vinculação à decisão de distinto objecto posterior, ou como excepção de caso julgado, em que a existência da decisão anterior constitui um impedimento à decisão de idêntico objecto posterior.»     

Significa isto que o reconhecimento do direito de propriedade da BB sobre o imóvel em causa, nos termos em que foi julgado no referido processo, impõe-se, na presente ação, como efeito substantivo impeditivo de que o mesmo imóvel seja agora reconhecido como bem comum do casal e que daí decorram os alegados direitos indemnizatórios, com base nos fundamentos invocados, por que vêm demandados todos os R.R..

Assim, tal efeito, inscrevendo-se como se inscreve no plano do mérito da ação, implica necessariamente um juízo de improcedência desta com a consequente absolvição dos R.R. dos pedidos aqui formulados e não uma mera absolvição da instância, conforme o decretado pelas instâncias, como sucederia em caso de exceção dilatória do caso julgado.

Trata-se, no entanto, de um erro de qualificação jurídica que importa aqui suprir e como tal assim decidir.          

 

IV - Decisão

        Pelo exposto, acorda-se em negar a revista, confirmando-se a decisão recorrida, ainda que com fundamentação reforçada, e com o alcance de julgar a ação improcedente, absolvendo-se os R.R. dos pedidos contra eles formulados.

        As custas do recurso são a cargo da A./Recorrente.  

        

Lisboa, 28 de Março de 2019

Tomé Gomes (Relator)

Maria da Graça Trigo


Maria Rosa Tching

_________________
[1] In Noções Elementares de Processo Civil, Coimbra Editora, 1976, 304, 
[2] Ob. cit. pp 305-306.
[3] Vide, entre outros, Castro Mendes, Limites Objectivos do Caso Julgado em Processo Civil, Edições Ática, pp. 38-39; Teixeira de Sousa, Estudos Sobre o Novo Processo Civil, Lex, 1997, p. 572; Lebre de Freitas e outros, Código de Processo Civil Anotado, Vol. 2.º, Coimbra Editora, 2.ª Edição, 2008, p. 354.
[4] Vide, entre outros, os seguintes acórdãos do STJ: de 13/12/2007, relatado pelo Juiz Cons. Nuno Cameira no processo n.º 07A3739; de 06/3/2008, relatado pelo Juiz Cons. Oliveira Rocha, no processo n.º 08B402; de 23/11/2011, relatado pelo Juiz Cons. Pereira da Silva no processo n.º 644/08.2TBVFR.P1.S1, acessíveis na Internet – http://www.dgsi.pt/jstj.
[5] In Limites Objectivos do Caso Julgado em Processo Civil, Edições Ática, pp. 43-44.
[6] Ob. cit. p. 50.
[7] In Código de Processo Civil Anotado, Vol. 2.º, p. 354.
[8] In Estudos Sobre o Novo Processo Civil, Lex, 1997, pp. 578-579.
[9] No sentido exposto, vide, a título de exemplo, o acórdão do STJ, de 20/06/2012, relatado pelo Juiz Cons. Sampaio Gomes, no processo n.º 241/07.0TLSB.L1.S1, acessível na Internet – http://www. dgsi.pt/jstj.
[10] Vide Mariana França Gouveia, in A Causa de Pedir na Acção Declarativa, Almedina, 2004, p. 399, ao escrever o seguinte: “Restringindo o efeito preclusivo às excepções invocáveis, a doutrina maioritária faz integrar no âmbito do caso julgado todas as excepções que o réu poderia ter alegado na primeira acção.” E acrescenta que: “Este efeito preclusivo é normalmente inserido pela doutrina no caso julgado. Entende-se que o caso julgado abrange toda esta matéria, que a sua força abarca tudo aquilo que o réu poderia ter alegado (…)”      
[11] Vide ainda a este propósito Francisco Manuel Lucas Ferreira de Almeida, in Direito Processual Civil, Vol. II, Almedina, 2015, p. 626; e ac. do STJ, de 08/04/2010 (Maria dos Prazeres Beleza). 
[12] In Estudo intitulado O objecto da sentença e o caso julgado material (O Estudo sobre a Funcionalidade Processual), publicado no BMJ n.º 325, 1983, pp. 49 e seguintes, mais precisamente a p. 168.