Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça
Processo:
8/11.0YGLSB.S2
Nº Convencional: 3ª SECÇÃO
Relator: ARMINDO MONTEIRO
Descritores: INSTRUÇÃO
REQUISITOS
FACTOS GENÉRICOS
OBJECTO DO PROCESSO
PRINCÍPIO DA VINCULAÇÃO TEMÁTICA
DIREITOS DE DEFESA
PRINCÍPIO DO CONTRADITÓRIO
REJEIÇÃO
REQUERIMENTO
ABERTURA DA INSTRUÇÃO
JUÍZ DE INSTRUÇÃO
CONVITE AO APERFEIÇOAMENTO
NULIDADE
INQUÉRITO
TAXA DE JUSTIÇA
PROCESSO RESPEITANTE A MAGISTRADO
Data do Acordão: 06/20/2012
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Privacidade: 1
Meio Processual: RECURSO PENAL
Decisão: NEGADO PROVIMENTO
Área Temática: CUSTAS PROCESSUAIS - RESPONSABILIDADE POR CUSTAS
DIREITO PROCESSUAL PENAL - ACTOS PROCESSUAIS / NULIDADES - FASES PRELIMINARES / INQUÉRITO / INSTRUÇÃO - JULGAMENTO
Doutrina: - Figueiredo Dias, Direito Processual Penal, Coimbra Editora, 1974, p.145.
- Frederico de Lacerda da Costa Pinto, “Segredo de Justiça e Acesso ao Processo”, in Jornadas de Direito Processual Penal e Direitos Fundamentais, Almedina, 90ª, 92.
- Germano Marques da Silva, Curso de Processo Civil, III, p. 139.
- José António Barreiros, Manual de Processo Penal, 1989, p.424.
- Leones Dantas, in R M P, 1977, p.111 e segs..
- Paulo Pinto de Albuquerque, Comentário do Código de Processo Penal, p. 320.
Legislação Nacional: CÓDIGO DE PROCESSO PENAL (CPP): - ARTIGOS 4.º, 118.º, 119.º, AL. D), 120.º, N.º1, 283.º, N.º3, 287.º, N.ºS2 E 3, 288.º, N.ºS 2 E 4, 308.º, N.ºS 2 E 3, 311.º.
CONSTITUIÇÃO DA REPÚBLICA PORTUGUESA (CRP): - ARTIGO 32.º, N.ºS1, 4 E 7.
REGULAMENTO DAS CUSTAS PROCESSUAIS (RCP): - ARTIGO 8.º, N.º2.
Jurisprudência Nacional: ACÓRDÃO DO TRIBUNAL CONSTITUCIONAL:
-N.º 385/2004, IN DR, II SÉRIE, DE 28.6.2004.
ACÓRDÃO DO TRIBUNAL DA RELAÇÃO DE LISBOA:
-DE 2.3.2004, PROCESSO N.º 9261/2003 -5 ª SECÇÃO.
ACÓRDÃOS DO SUPREMO TRIBUNAL DE JUSTIÇA:
-DE 13.1.2001, IN CJ, STJ, 2011, I, 177;
-DE 22.10.2003, PROCESSO N.º 03P2608;
-DE 18.6.2008, PROCESSO N.º 1514/08-3.ª SECÇÃO;
-DE 12.3.2009, PROCESSO N.º 08P3168.
AUJ 7/05, DE 12-05-2005, DR I, SÉRIE - A, DE 04-11-2005.
Sumário :

I - O requerimento de abertura de instrução, não estando sujeito à observância de quaisquer formalidades, deve, por imposição de lei – n.º 2 do art. 287.º do CPP – conter uma narração sintética das razões de facto e de direito de discordância da acusação, narrar os factos e indicar as normas jurídicas violadas, pois é ele que vai delimitar o objecto do processo, pela vinculação temática que desempenha, e especificar os meios de prova adequados, quer os não valorados em inquérito, quer os que o foram.
II - No caso vertente, o requerimento de abertura de instrução não se aproxima sequer da conformação de uma acusação à luz da exigência da lei – art. 283.º, n.º 3, do CPP –, pois deixa ao tribunal a tarefa, vedada, de sondar nas entrelinhas quais os concretos autores dos ilícitos que se diz terem sido cometidos, a sua concreta quota parte de responsabilidade neles, os concretos e muito claros factos em que incorreram, em ordem ao pleno exercício do seu direito de defesa, que não prescinde dessa enunciação balizada, não passando de um bloco de afirmações genéricas, difusas, sem conexão evidente com pessoas visível e individualmente discriminadas e sequência temporal.
III -E porque a falta de imputação de factos concretos não satisfaz, de forma alguma, a exigência, nos termos do art. 32.º, n.º 1, da CRP, da vertente inabdicável do direito de defesa, por esta não consentir acusação sem factos, vazia de conteúdo substantivo a que se equiparam os factos genéricos, resta concluir pela inadmissibilidade legal da instrução, seu motivo de rejeição, nos termos do art. 287.º, n.º 3, do CPP.
IV -Embora ao juiz caiba investigar autonomamente o caso sujeito a instrução, tem de mover-se dentro do quadro factual fornecido, que constitui o limite material e formal da sua actuação, qual linha de força, estando-lhe vedado completar o requerimento ou convidar o apresentante a fazê-lo (neste sentido, AUJ 7/05, de 12-05-2005, DR I Série-A, de 04-11-2005).
V - Está ao alcance do JIC sindicar, nos termos do art. 308.º, n.º 3, do CPP, as nulidades cometidas a montante da instrução, no inquérito, em ordem a alcançar a finalidade de tal fase processual, judicial, situada a meio caminho entre o inquérito e o julgamento. Mas esse conhecimento tem que ser útil, o que não sucede quando a instrução não é admitida e o arquivamento do inquérito adquiriu, por isso mesmo, foros de definitividade.
VI - A abertura de instrução leva ao pagamento de 1 UC de taxa de justiça, podendo ser corrigida, a final, pelo juiz, para um valor entre 1 e 10 UCs, tendo em conta o propósito a atingir, a utilidade prática da instrução. Nesta situação, está em causa a incriminação de três magistrados e a obtenção de pressupostos condenatórios em vista da liquidação da indemnização, a pedir-lhes, no futuro. Por isso, a taxa de justiça acolhida (5 UCs) não se mostra desajustada – art. 8.º, n.º 2, do RCP.
Decisão Texto Integral:

Acordam em conferência na Secção Criminal do Supremo Tribunal de Justiça :

AA , assistente e advogado em causa própria , participou criminalmente contra os Desembargadores junto do Tribunal da Relação de Lisboa , Drs. BB , CC e DD , imputando-lhes a prática de crimes de uso de documento falso , p. e . pelo art.º 256.º , do CP , prevaricação , p. e p . pelo art.º 369.º n.ºs 1 e2 , do CP , de difamação e injúria agravados , p. e . p. pelas disposições conjugadas dos art.ºs 180.º , 181.º , 182.º , 183.º e 184.º , do CP ,porém o Exm.º Magistrado do M.º P.º junto deste STJ , arquivou o inquérito , a fls. 193 , requerendo o assistente a abertura de instrução que lhe foi liminarmente recusada , com o fundamento em ser inadmissível à face da lei .

Recorreu , de seguida , o assistente , que apresentou as seguintes conclusões :

1ª - O despacho recorrido é nulo por não haver, antes de mais, como resulta da disciplina do artigo 287°, n° 2, do CPP, apreciado as arguidas nulidades do inquérito e do despacho de arquivamento do MP.

2ª  - Sendo tal poder/dever conferido pelo artigo 288°, n° 4, do CPP, o despacho recorrido viola também este preceito.

3ª  - O despacho recorrido é nulo por não haver apreciado o pedido de requisição de peças dos autos cíveis, com o que viola o disposto no artigo 288°, n° 4, do CPP.

4ª  - O despacho recorrido viola o disposto no artigo 288°, n° 4, do CPP, por não conter pronúncia sobre os factos narrados que o requerimento de abertura de instrução diz esperar provar.

5ª  - A escolha feita pelo despacho recorrido, de factos de 6 das 40 alíneas da narração imposta pelo artigo 287°, n° 2, do CPP, viola o disposto no artigo 288°, n° 4, do mesmo código.

6ª  - O despacho recorrido viola o disposto no artigo 288°, n° 4, do CPP, ao omitir pronúncia sobre o alegado na parte VI do requerimento de abertura de instrução.

7ª  - O despacho recorrido viola o disposto no artigo 288°, n° 4, do CPP, ao omitir pronúncia sobre a matéria da parte VII do requerimento de abertura de instrução.

8ª - O despacho recorrido viola o disposto no artigo 288°, n° 4, do CPP, ao omitir pronúncia sobre a matéria da parte VIII do requerimento de abertura de instrução.

9ª - Todas as exigências feitas no despacho recorrido sobre a forma e o conteúdo do requerimento de abertura de instrução apresentado, violam o disposto no artigo 287°, n° 2, do CPP, conforme a parte II, n°s 23 a 39 do corpo da presente motivação.

10ª - O despacho recorrido viola o disposto no artigo 287°, n° 3, do CPP, no seu sentido restritivo dos poderes do juiz de instrução, sendo nulo por haver decidido contra legem.

11ª - O sentido com que, no despacho recorrido, foi interpretado o disposto no artigo 287°, n° 3, infringe o disposto na Constituição e os princípios nela consignados designadamente no seu artigo 32°, n°s 4 e 7.

12ª - A exigência de 5 UC não tem fundamento legal, ferindo de nulidade o despacho recorrido.

Termos em que o assistente pede sejam:

1)         supridas as nulidades arguidas, nos termos das disposições conjugadas dos artigos 379°, n° 2, do CPP, e 670°, n°s 1 e 5, do CPC;

2)         revogada a decisão que exige o pagamento de 5 UC;

3)         ordenada a admissão da instrução por o requerimento respectivo satisfazer o disposto na lei, e cumprir ao juiz de instrução investigar autonomamente os factos neles narrados imputados aos arguidos, e os que constituem o seu contexto e motivação.

Colhidos os legais vistos , cumpre decidir :

Circunscrito o poder cognitivo deste STJ às conclusões do recurso, importa por em destaque que o despacho recorrido rejeitou a instrução requerida por carência de factos que sustentassem a denúncia da prática dos crimes descritos pelos Magistrados visados pelo assistente .

O requerimento de abertura de instrução , não estando sujeito à observância de quaisquer formalidades , deve , por imposição de lei –n.º2 , do art.º 287.º , do CPP –conter uma narração sintética das razões de facto e de direito de discordância da acusação , narrar os factos e indicar as normas jurídicas violadas , pois é ele que vai delimitar o objecto do processo pela vinculação temática , que desempenha e especificar os meios de prova adequados , quer os não valorados em inquérito , quer os que o foram .

O requerimento de abertura de instrução deduzido pelo assistente consubstancia uma autêntica acusação , como é entendimento doutrinário e jurisprudencial sem discrepância , assim o sustentando Germano Marques da Silva , in Curso de Processo Civil , III , pág. 139 , Frederico de Lacerda da Costa Pinto , Segredo de Justiça e Acesso ao Processo , in Jornadas de Direito Processual Penal e Direitos Fundamentais , Almedina , 90ª 92 e jurisprudencialmente o Ac. do TC n.º 385/2004 , in DR , II Série , de 28.6.2004

E da acusação sob pena de ser julgada por manifestamente infundada , nos termos do art.º 311.º n.ºs 1 e 2 a) e 3 b) , do CPP, deve constar a descrição factual , pois ela não pode deixar de obedecer aos princípios da suficiência e clareza , para que o arguido conheça os factos que lhe são imputados , se possa defender, o tribunal compreender a imputação , numa óptica de cooperação intersujeitos processuais e o objecto do processo fique todo definido –cfr. José António Barreiros , Manual de Processo Penal , 1989 , 424 e Leones Dantas , in R M P , 1977 , 111 e segs .

Por analogia , visto o disposto no art.º 308.º n.º 2 , do CPP , este deve ser , pois , o teor do requerimento de abertura de instrução , que , como a acusação,  realiza o princípio da vinculação temática , com o alcance , em Figueiredo Dias , in Direito Processual Penal , Coimbra Editora , 1974 , 145 ., de que nele se integram os princípios da identidade , unidade ou indivisibilidade e da consumpção do objecto do processo penal , com o significado de que o objecto do processo deve manter-se o mesmo da acusação ou trânsito , deve ser conhecido e julgado na sua totalidade de forma unitária e indivisível e mesmo quando o não tenha sido deve ter-se por irrepetívelmente decidido .

A instrução é uma comprovação judicial do acerto decisório do M.º P.º em não acusar , daí que , para introdução do facto em juízo , há-de o assistente , se intenta consegui-lo , substitui-se-lhe , procedendo , além do mais , àquela narração , precisa e concisa , cabendo ao juiz dirigir o andamento do processo .

O assistente começa por proceder a uma enumeração de 40 pontos ( n.º 6 , da parte I ) em que diz , que deviam ter sido estes os “ especificados “  , mas não o foram, e que se transcrevem :

“1)       a «deliberação» de 25.5.2010 a que se refere o documento de 20.7.2010, a fls 638 e 639, foi tomada a pedido de Belmiro Mendes de Azevedo e Outros, de 28.4.2010, apresentado no âmbito do proc. n° 1384/2009, emergente de participação dos mesmos de 2.11.2009, entre os quais se contam interessados no processo cível em que foram proferidas as decisões que constituem objecto do inquérito e do presente requerimento;

2)         em 28.6.2010, foram apresentadas alegações de recurso para o STJ, admitido por despacho de 31.5.2010, para subir imediatamente;

3)         em 5.8.2010, a fís 638 e 639, foí junto aos autos, um documento com data de 30.7.2010, de que não foi feita notificação ao nele visado;

4)         invocando tal documento, o denunciado Relator proferiu despacho em 5.8.2010, a fls 640, em que fàz imputação ao visado de haver sido «sancionado», e logo marca prazo aos Recorrentes para constituírem novo mandatário;

5)         em 6.8.2010, o Exmo Bastonário da Ordem dos Advogados mandou subir recurso da «deliberação» de 25.5.2010, ao Conselho Superior da Ordem;

6)         o recurso do Exmo Bastonário tem o efeito suspensivo especificamente consignado no artigo 159°, n° 2, do EOA;

7)         em 19.8.2010 (data do registo postal), a fls 645, o visado pede para lhe ser feita notificação do documento cm que se estriba o despacho de 5.8.2010;

8)         em 7.9.2010, o Exmo Vice-Presídente da Relação de Lisboa, mandou divulgar a todos os Juizes Desembargadores da Relação e a todas as suas Secções, certidão do Conselho Geral da Ordem dos Advogados, de 3.9.2010, com despacho do Exmo Bastonário, de 2.9.2010, declarando a inscrição do Advogado ora Assistente, activa;

9)         em 17.9.2010, o denunciado Relator tomou conhecimento da comunicação do Exmo Presidente do STJ, de 16.9.2010, sobre o despacho do Exmo Bastonário de 2.9.2010;

10)       em 20.9.2010, a fls 649, o denunciado Relator proferiu despacho em que imputa ao mandatário dos Recorrentes, ter «suspensa a qualidade profissional que invoca», ordena o desentranhamento dos autos do seu requerimento de 19.8.2010 (data do registo postal), a fls 645, e manda comunicar esses factos ao Conselho de Deontologia de Lisboa da Ordem dos Advogados;

11)       por requerimento de 13.10.2010, a fls 652 a 657, nos seus n° 4 e 5, argui ocultação de conhecimento, pelo denunciado, do teor do despacho do Exmo Vice-Presidente da Relação de Lisboa, de 7.9.2010, e do teor do documento junto, em que aquele despacho foi exarado, contendo despacho do Exmo Bastonário da Ordem dos Advogados, de 2.9.2010, em que é declarada a inscrição activa do visado, e impugna a imputação de "sanção aplicada";

12)       idem nos seus n°s 6 e 7, informa que a publicação de fls 638 e 639, é proibida por lei, argui a sua falsidade e oferece prova documental dela;

13)       idem no seu n° 8, oferece prova da validade e eficácia do documento oferecido pela Ordem dos Advogados, objecto do despacho do Exmo Vice-Presidente da Relação de Lisboa, de 7.9.2010, segundo decisão do Exmo Juiz Desembargador da Ia Secção da mesma Relação, de 21.9.2010, documentada nos autos com esse requerimento;

14)       o acórdão de 17.2.2011, a fls 683 e 684, ignora a divulgação feita na Relação do despacho do Exmo Bastonário, de 2.9.2010;

15)       mantém, a recusa em ordenar notificação do documento de fls 638 e 639 em que se estribam os despachos de 5.8.20IOe 20.9.2010;

16)       idem, a fls 684, reitera a imputação de «situação de sancionamento» ao visado;

17)       idem, a fls 684, ignora o disposto no artigo 159°, n° 2, do EOA, e o despacho sobre ele proferido pelo Ilustre Juiz Desembargador Dr. João Aveiro Pereira da Ia Secção da mesma Relação;

18)       idem, a fls 684, recusa notificação do documento de fls 683 e 684, com o fundamento de que não faria sentido que «se notificasse o sancionado para o questionar sobre se aceita a sanção, se o seu processo foi ou está a ser regular ou se a sua Ordem actua ou actuou como entidade responsável, nos termos da lei, e sem diplopias»;

19)       idem, fundamenta a recusa em notificar o visado do documento de fls 683 e 684, dizendo não dever «consultar o mandatário cuja condição profissional estava suspensa segundo declaração emitida pela sua Ordem»;

20)       em 28.10.2010, o Tribunal Administrativo de Círculo de Lisboa, advertiu a Ordem dos Advogados de executar a «deliberação» de 25.5.2010;

21)       em 25.7.2010, o mesmo Tribunal, por ordem do respectivo Juiz de Direito, certificou a vigência da decisão de 28.10.2010;

22)       o prazo de seis meses referido no documento de fls 638 e 639 esgotou-se em 9.1.2011 por força do disposto nos artigos 279°, alínea c), e 296° do CC, e a respectiva «deliberação» caducou por força do disposto no artigo 85°, alínea b), do Código de Procedimento Administrativo (CPA);

23)       o requerimento de 28.2.2011 (data do registo postal), a fls 689 a 693, no seu n.º 1, é de interposição de recurso de agravo para o STJ, do acórdão de 17.2.2011;

24)       idem, no seu n° 2, é de apresentação de queixa c denúncia crime de factos subsumíveis ao disposto nos artigos 180° a 184°, 188°, n° 1, alínea a), do Código Penal (CP), para efeito do disposto no artigo 245° do CPP;

25)       idem, no seu n° 3, é de apresentação de queixa e denúncia crime contra PEDRO RAPOSO subscritor do documento de fls 638 e 639, por factos subsumíveis ao disposto nos artigos 180°, 182° a 184°, e 188°, n° 1, alínea a), e 256°, n° 1, alíneas d) e e), do CP;

26)       idem, é de apresentação de denúncia e queixa crime contra o autor do despacho de 5.8.2010, a fls 640, por uso de falsificação de documento do artigo 256°, n° 1, alínea e), epor factos dos artigos 181° a 184° e 188°, n° 1, alínea a), do CP;

27)       idem, é de apresentação de denúncia crime do artigo 369°, n°s 1 e 2, do CP, por sonegação do conhecimento do despacho do Exmo Vice-Presidente da Relação de Lisboa, de 7.9.2010, e do teor da comunicação do Conselho Geral da Ordem dos Advogados, de 3.9.2010, e do despacho do Exmo Bastonário, de 2.9.2010;

28)       idem, é de denúncia e queixa crime contra o autor do despacho de 20.9.2010, a fls 649, por uso de falsificação de documento do artigo 256°, n° 1, alínea e), e por factos dos artigos 180° a 184°, e 188°, n° 1, alínea a), do CP;

29)       idem, é de denúncia e queixa crime contra os autores do acórdão de 17.2.2011, por manterem a sonegação do conhecimento do despacho do Exmo Vice-Presidente da Relação de Lisboa, de 7,9.2010, e por confirmarem o despacho de 20.9.2010, a fls 649, fazendo uso de falsificação de documento do tipo do artigo 256°, n° 1, alínea e), por factos dos artigos 180° a 184° e 188°, n° 1, alínea a), e 369°, n°s 1 e 2, do CP;

30)       o despacho de 21.3.2011 contem a falsa declaração de que, até 20.9.2010, não fora requerida a junção de quaisquer documentos para instruir alegação cm sentido oposto;

31)       idem, idem, de que o acto que se consubstancia na redacção e subscrição do texto de fls 689 e 690 da autoria do Sr. Advogado AAe, é susceptível de configurar a prática de ilícitos criminais, designadamente do crime de denúncia caluniosa previsto e punível pelo artigo 365° do CP que não poderão deixar de ser objecto de inquérito e adequada acusação pelo Ministério Público bem como a devida punição penal;

32)       idem, idem, que a intervenção processual de fls 6S9 e 690 visa intimidar e condicionar o Tribunal da Relação c o STJ em qualquer futura decisão sobre a matéria comprimindo a liberdade de julgamento, e por via dessa compressão, tentando atingir a possibilidade de administrar justiça, c o exercício do múnus de tutelar os direitos dos cidadãos e das pessoas colectivas, o prestígio e a força do Estado e o próprio Estado de Direito Democrático;

33)       idem, idem, que a apresentação do aludido requerimento materializa aparente vontade de violação do princípio da irresponsabilidade dos magistrados judiciais;

34)       idem, idem, que a conduta descrita põe em causa e agride, de forma por demais injustificada, inqualificável e insuportável, a honra, o reconhecimento pessoal e profissional e a actividade de 3 juízes de Tribunal superior e funcionários judiciais;

35)       idem, idem, que a actuação sob referência, se lograsse intimidar e condicionar esse órgão de soberania, geraria complementarmente, a distorção do próprio mercado da advocacia e o livre acesso a essa nobre actividade, sendo susceptível de violar deveres estatutários dos senhores advogados.

36)       o recurso alegado em 28.6.2010, com regime de subida imediata, continua na Relação;

37)       nenhum dos documentos oferecidos pelo visado foi apreciado;

38)       sobre o recurso de agravo interposto do acórdão de 17.2-2010, por requerimento de 28.2.2010, ainda não foi proferida decisão;

39)       a Reclamação deduzida pelo visado na «deliberação» de 25.5.2010, em 21.7.2010, para o Presidente do Conselho Superior da Ordem dos Advogados, ainda não foi decidida e os respectivos autos foram feitos desaparecer;

40)       tais factos foram objecto de certidão remetida ao Diap de Lisboa, por ofício de 28.10.2011, por decisão da Exma Procuradora-Geral Adjunta autora do despacho de arquivamento, para instauração do respectivo inquérito .”

A SÍNTESE DOS FACTOS QUE FUNDAMENTAM A INSTRUÇÃO (acusação em sentido material), consta do Cap.V , onde se alega , transcreve-se :

“ Dão-se aqui por reproduzidos os factos acima narrados (parte 1, n° 6), sublinhando o seguinte;

1)         o recurso para o STJ alegado em 28 de Junho de 2010, não pode ser afectado por comunicação do Conselho de Deontologia de Lisboa da Ordem dos Advogados, feita em 4.8.2010, com relação a documento datado de 30.7.2010, e reportado a 9.7.2010;

2)         constituí questão de direito de conhecimento oficioso, que o documento de fls 638 e 639 constitui facto proibido por lei, por inexistir norma legal que permita a sua emissão;

3)         idem, que a junção de documentos a autos cíveis, tem de ser notificada às partes na pessoa dos seus mandatários:

4)         idem, que a recusa de tal notificação impediu o visado de provar, logo em 19.8.2010, a falsidade do documento de fls 638 e 639;

5)         idem, que a divulgação mandada fazer, em 7.9.2010, pelo Exmo Vice Presidente da Relação de Lisboa, com o despacho do Exmo Bastonário de 2.9-2010, a todos os Juízes Desembargadores da Relação e suas Secções, tinha de ser junta aos autos antes do despacho de 20.9.2010? e nele considerada;

6)         idem, que cabe ao Conselho Geral da Ordem dos Advogados informar sobre a inscrição de Advogados e sobre a situação dessa inscrição;

7)         constitui imperativo legal e constitucional a pronúncia dos tribunais sobre arguição de falsidade e de falsificação de documentos probatórios juntos a autos cíveis;

8)         constitui questão de conhecimento oficioso por imperativo legal e constitucional, que as comunicações do Exmo Presidente do STJ aos Tribunais e aos Magistrados Judiciais não constituem fonte de direito nem podem restringir ou afectar a sua independência no exercício da função jurisdicional;

9)         o despacho de 20.9.2010, a fls 649, foi motivado pela comunicação do Exmo Presidente do STJ, referida no acórdão de 21.3.2011, a fís 702, como neste se pode ver;

10)       o despacho de 20.9.2010, a fls 649, constitui afronta a informação do Conselho Geral da Ordem dos Advogados, prestada em 3.9.2010, e mandada divulgar pelo Exmo Vice-Presidente da Relação em 7.9.2010;

11)       o despacho de 20.9.2010, a fls 649, constitui uma tomada de posição na «controvérsia» provocada pelo Exmo Presidente do STJ, com a sua comunicação de 16.9.2010, para prejudicar o Advogado visado;

12)       o despacho de 20.9.2010, a fls 649, viola ostensivamente o estatuído no artigo 159°, n°2, do EOA;

13)       um dos fins visados pelos despachos de 5.8.2010 c 20.9.2010 foi o de impedir a subida dos autos ao STJ para julgamento do recurso alegado em 28.6.2010 - que continua "paralisado" na Relação;

14)       o acórdão de 17.2.2011 foi motivado pela comunicação do Exmo Presidente do STJ, de 16.9.2010, referida no despacho de21.3.201I;

15)       o requerimento de interposição de recurso, de 28.2.2011, continua por decidir. ”

O requerimento de instrução , nos termos do n.º 2 , do art.º 287.º n.º 2 , do CPP , além de dever conter uma súmula das razões de facto e de direito de discordância relativamente à acusação ou arquivamento , bem como , e além do mais , a indicação dos factos que , através dos meios de prova contidos no inquérito e a realizar , espera provar .

Os factos que pretende provar são pois , se bem entendemos o assistente , os constantes da Parte 1 , n.º 6 e os que figuram na parte V.

A  especificação de factos a que se faz na Parte I , n.º 6 , que intencionalmente se transcreveu , não passa de uma descrição de factos sem qualquer identificação pessoal , nominativa dos seus autores ( é o “ denunciado relator “ como por vezes se alega ) , caso dos factos n.ºs 8 a 19 , por vezes sem que se vislumbre neles qualquer utilidade para a causa, quando , por ex.º se refere a P... R..., à margem de uma enumeração temporalmente ordenada , sinteticamente deduzida , sem se perceber bem qual o sentido dos que constam sob os n.ºs 39 e 40 , ignorando-se pela descrição quem seja o autor , pessoa concreta , com identidade individualizada,  das imputações sob os n.ºs 31 a 35, em ordem a que um leitor mediano –e por maioria de razão os visados magistrados de 2.ª instância –apreenda sem esforço qual ou quais os magistrados infractores à lei e depois , e em que medida , quais os factos cometidos por cada um deles que fundam a sua responsabilidade pessoal por facto penalmente relevante, limitando-se o assistente a fazer remissão para documentos nos n.ºs 22 a 29 em lugar de retirar e objectivar  naqueles os factos materiais relevantes à instrução .

O requerimento que apresentou não se aproxima sequer da conformação de uma acusação à luz da exigência da lei, deve realçar-se –cfr. art.º 283.º n.º 3, do CPP .

E o ciclo de  imperfeição estruturante do requerimento fecha-se com a Parte V transcrita onde se continua  , frisa-se , sem se trazer à luz do dia , deixando ao tribunal a tarefa , vedada , de ter de sondar nas entrelinhas , quais os concretos autores dos ilícitos que se diz terem sido cometidos , a sua concreta quota parte de responsabilidade neles, os concretos e muito claros factos em que incorreram em ordem ao pleno exercício do seu direito de defesa que não prescinde dessa enunciação balizada, não passando , com o devido respeito , de um bloco de  afirmações genéricas , difusas, sem conexão evidente com pessoas visível e individualmente discriminadas e sequência temporal , formando um todo inteligível e obediente aos termos simples , elucidativos , porém incontornáveis da lei , do art.º 287.º n.º 2 , do CPP .

Razão assiste ao autor do despacho recorrido quando afirma , transcreve-se ,”  … o requerente ( …) enumera situações desconexas , ( …) , com profusa referência a documentos , cujo conteúdo não é explicitado (…) , e mais que se trata de alinhamento de factos “ prolixo “ e despido de  lógica , confundindo o recorrente , factos , que não pode deixar de alegar , com os meios de prova em que se fundam .

E porque a falta de imputação de concretos factos nos dois segmentos em exposição não satisfaz  de forma alguma à exigência ,  nos termos do art.º 32.º n.º 1 , da CRP ,   da vertente inabdicável do direito de defesa,  por não esta não consentir acusação sem factos , vazia de conteúdo substantivo a que se equiparam os factos genéricos , resta concluir pela inadmissibilidade legal da instrução , seu motivo de rejeição , nos termos do artº 287.º n.º 3 , do CPP .

Embora ao juiz caiba investigar autonomamente o caso sujeito a instrução tem de mover-se dentro do quadro factual fornecido , que constitui o limite material e formal da sua actuação , qual linha de força , estando-lhe vedado completar o requerimento ou convidar o apresentante a fazê-lo , neste sentido se decidindo   no Ac. de Fixação de Jurisprudência , n.º 7/05 , de 12.5.2005 , DR I Série , A , de 4.11.2005 .

Este o entendimento sem tibieza deste STJ , nos seus Acs. de 22.10.2003 , P.º 03P2608 ,de 12.3.2009 , Rec.º n.º 08P3168 , como ainda a resultante do Ac. de Fixação de Jurisprudência , n.º 7/05 , antes citado . Idem no Ac deste STJ , de 13.1 .2001 , in CJ , STJ , 2011, I , 177 , se decidiu que , se a simples análise do requerimento de abertura de instrução , sem recurso a outros elementos ,  de per si , suficientemente,  aponta para a falta de factos sustentáculo do elemento objectivo e subjectivo do tipo , então , por razões de economia processual , não se justifica a sua abertura , impondo-se rejeição por manifesta inadmissibilidade legal , por pura inutilidade a prosseguir .

Nestes termos a rejeição liminar do requerimento instrutório por inadmissibilidade legal não merece qualquer censura .

E rejeitado liminarmente o requerimento desinteressa analisar se o despacho recorrido viola o disposto no artigo 288°, n° 4, do CPP, por não conter pronúncia sobre os factos que deviam ser “ especificados “ , ou seja , e se bem entendemos, já assentes ,por indiciados, e os que esperava provar como igualmente está prejudicada a apreciação do pedido de requisição de documentos dos autos cíveis para instrução do processo , na medida em que o juiz só deve resolver as questões suscitadas com excepção daquelas cuja decisão esteja prejudicada pela solução dada a outras  –art.º 660.º n.º 1 c) , do CPC , aplicável “ ex vi “ do art.º 4.º , do CPP .

Os Caps. VI , VII e VIII , nenhum interesse relevava a sua apreciação porque o VI limita-se  à consignação pura simples e exclusiva de que os acusados são os identificados no inquérito , decisões dele objecto , com o grau de participação neles expressas , relegando para o tribunal a tarefa que  a si claramente lhe competia , de os identificar, um a um , clarificando os factos pertinentes, à semelhança do que sucede no art.º 311.º n.º 3 a) e b) , 283.º n.º 3 , b) e c) , do CPP , por força do art.º 287.º n.º 2 , do CPP; no Cap VII   faz o assistente questão de peticionar indemnização aos acusados , caindo a utilidade da formulação e apreciação , por a instrução rotundamente sucumbir  , por falta de factos , que assim a não podiam suportar ; o Cap . VIII é a contenção de provas , desnecessárias , pelo desfecho a dar ao pedido de abertura de instrução .

O assistente argui nulidades do despacho de arquivamento e vícios vários ocorridos ao longo do inquérito , na modalidade de omissão de diligências , recolha de meios de prova , sua apreciação , não apreciação de documentos , requerimento , não audição do ofendido e denunciante , tudo a determinar a nulidade de insuficiência de inquérito , que deve ser suprida nos termos do art.º 288.º n.º 4 , do CPP

Ao assistente não lhe faltaram oportunidades para arguir os vícios que aponta ao longo do inquérito, naquele intervindo , debruçando-se , contudo , o despacho recorrido , contra o que diz , no seu ponto 9,  sobre tais vícios , em sentido desfavorável ao seu , não conhecendo deles e nem dos que afectam o despacho de arquivamento pela solução derivada de se rejeitar a instrução , prejudicando a rejeição a sua apreciação,  não havendo , pois , omissão de pronúncia

De consignar que a falta de inquérito é a falta absoluta , esse não sendo o caso –art.º 119.º d) do CPP -, tanto mais que nem sequer a invoca .

Os casos de insuficiência de inquérito determinantes de nulidade são os casos de realização de diligência obrigatória e essencial  , omitida naquela forma de indagação criminal . como doutrina Paulo Pinto de Albuquerque , in Comentário do Código de Processo Penal , pág. 320, cognoscíveis no limite temporal com previsão no art.º 120.º n.º 1 , do CPP .

Está ao alcance do JIC sindicar , nos termos do art.º 308.º n.º 3 , do CPP , as nulidades cometidas a montante no inquérito , em ordem a alcançar a finalidade de tal fase processual , judicial , situada a meio caminho entre o inquérito e o julgamento .

Mas esse conhecimento tem que ser útil , o que não sucede quando a instrução não é admitida e o arquivamento do inquérito , adquiriu , em princípio , por isso mesmo , foros de definitividade

Consectariamente a inadmissibilidade legal de instrução impedindo a prossecução dos autos para a fase processual , judicial , seguinte, que não atinge ,  impede , naturalmente , o conhecimento dos vícios do inquérito e despacho de arquivamento , a montante , como bem se decidiu ( cfr. Acs. deste STJ , de 18.6.2008 ,Pº n.º 1514/08-3.ª Sec. e da Rel.Lisboa , de 2.3.2004 , P.º n.º 9261/2003-5 ª Sec. ) .

Quanto à condenação em custas e à nulidade apontada , de dizer que não é uma simples inobservância  da lei que gera nulidade , como é entendimento  do recorrente , visto o disposto no art.º 118.º , do CPP .

O princípio a observar –n.º 1 -é o de que a violação ou a inobservância das disposições do processo só determinam nulidade do acto quando esta for expressamente cominada na lei .

A inobservância da lei dá lugar , fora desse contexto , à correcção do decidido e não à automática proclamação de nulidade , fundamento sempre do correspondente incidente .

A abertura de instrução leva ao pagamento de 1 UC , podendo ser corrigida , a final  , pelo juiz para um valor entre 1 e 10 Uc,s , tendo em conta o propósito a atingir ,  a utilidade prática da instrução , aqui a incriminação de  3 Magistrados e obtenção de pressupostos condenatórios em vista da liquidação da indemnização, a pedir-lhes , no futuro , por isso que não se mostra desajustada a taxa acolhida –art.º 8.º n.º 2 , do RCP.

O art.º 32.º n.ºs 4 e 7 , da CRP , não foi ofendido , como qualquer outro preceito , particularmente , e por vezes várias , o art.º 288 .º n.º 4  e n.º2 , bem como o art.º 287.º n.º3 , ambos do CP , porque se a instrução não foi admitida ao assistente se deve , que a estruturou à margem da evidente exigência da lei.  

A atribuição –n.º 4 , do art.º 288.º , do CPP - de o juiz poder investigar autonomamente o caso submetido a instrução tem o  natural limite definido pelos factos inicialmente articulados pelo requerente, dentro dos quais se move .

A interpretação segundo a qual a falta de indicação de factos deve levar à rejeição da instrução é mesmo a interpretação mais conforme à CRP , em nome do direito de defesa e do arguido a um processo justo ( art.º 32.º n.º 1 , do CPP)  e da obrigação de o assistente , se quiser intervir no processo , dar cumprimento a um ónus mínimo , sequer excessivamente compressor dos seus direitos, que não incumbe ao tribunal suprir .

O assistente não tem razão .

Nega-se , pois , pelo exposto , provimento ao recurso , confirmando-se o despacho recorrido .

Taxa de justiça : 7 UC,s .

  

Lisboa, 20 de Junho de 2012

Armindo Monteiro (Relator)
Santos Cabral