Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça | |||
Processo: |
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Nº Convencional: | JSTJ000 | ||
Relator: | ARMINDO MONTEIRO | ||
Descritores: | ROUBO BEM JURÍDICO PROTEGIDO BENS EMINENTEMENTE PESSOAIS CONCURSO DE INFRACÇÕES CRIME ÚNICO CONSUMPÇÃO CO-AUTORIA CUMPLICIDADE CÚMPLICE | ||
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Nº do Documento: | SJ200705020010243 | ||
Data do Acordão: | 05/02/2007 | ||
Votação: | UNANIMIDADE | ||
Texto Integral: | S | ||
Privacidade: | 1 | ||
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Meio Processual: | RECURSO PENAL. | ||
Decisão: | NEGADO PROVIMENTO. | ||
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Sumário : | I - O crime de roubo é um ilícito complexivo, de concurso entre a vertente patrimonial e pessoal, em que se fusionam as componentes do ataque ao património alheio e à pessoa do sujeito passivo, manifestada polimorficamente nos valores jurídicos da liberdade, integridade física e até mesmo da vida humana.
II - No roubo, enquanto crime complexo, obtido por fusão, em resultado de uma síntese normativa, correspondente a uma norma em concurso aparente com a norma do tipo matriz sobre que prevalece (cf. Lobo Moutinho, Da Unidade à Pluralidade de Crimes no Direito Penal Português, FDUC, 2005, pág. 972), constitui um ilícito pluriofensivo de bens patrimoniais e, essencialmente, de bens pessoais, da integridade física e até da vida da pessoa do visado, que faz dele um crime comunitariamente altamente reprovável, pelo alvoroço e alarme social que causa, por atingir segmentos indefesos socialmente, jovens em idade escolar, idosos e mulheres, indefesa ainda mais vincada porque os seus agentes, em regra, agem em grupo, com grande poder de mobilidade, obedecendo a um plano prévio, onde a actuação de um arguido é diferenciada da dos demais. III - E é essa nota de ataque pessoal à vítima que, contra-distinguindo o roubo do simples furto, ganhando relevo, reclama tutela penal agravada, reflectida no segmento punitivo do descritivo típico. IV - É precisamente o relevo que o elemento pessoal ganha na previsão e punição do crime de roubo, quando comparativamente com o aspecto patrimonial, que tem sido repetidamente afirmado para, sendo diversas as vítimas, se excluir a figuração do crime continuado, sendo peremptório este STJ em afirmar o concurso real, ou seja, tantos crimes quantas as pessoas das vítimas. V - «Trata-se de bens que se não podem desligar da personalidade, que apenas podem ser violados na pessoa que os cria com o só existir. Por isso, salvo fazendo violência às coisas, não pode o legislador protegê-los senão individualmente na pessoa dos seus portadores» – cf. Eduardo Correia, Unidade e Pluralidade de Infracções – Caso Julgado e Poderes de Cognição do Juiz, pág. 122. VI - Dando-se como provado, entre o mais, que: - o arguido N e outros, “em conjugação de esforços e de desígnios”, no dia 23-03-2003, pelas 01h00, deslocaram-se num veículo automóvel conduzido pelo arguido A à residência sita na Rua..., com a “intenção de ali entrarem e subtraírem objectos de valor” que pudessem levar consigo; - um dos co-arguidos tocou à campainha e logo que o residente CL abriu a porta, o A apontou uma arma à cabeça daquele, logo o empurrando para o interior da casa, permitindo a entrada de todos; - uma vez entrados na dita residência, em cujo interior se encontrava CB, o arguido E apontou uma pistola à cabeça do CL, obrigando este a seguir, sob a · ameaça da arma, para a sala onde aquela (CB) se achava, perguntando-lhe aí onde se encontrava a “muamba”, e, como não soubesse responder, um dos arguidos desferiu ao ofendido uma bofetada; - um dos co-arguidos perguntou pelo X, pelas “câmaras do X” e pelo “material de som do X”; - de forma concertada todos percorreram a casa e fizeram seus bens e valores, carregando-os, depois, para o automóvel, deles se apoderando, designadamente: - cerca de € 100 em dinheiro, um casaco corta vento, um telemóvel Nokia, uma mochila preta e outra Adidas e um saco, de que era dono o CL; - cerca de € 400 em dinheiro, uns headphones no valor de € 95, um amplificador no valor de € 400, um equalizador no valor de € 100, um casaco azul no valor de € 10, um frasco de perfume no valor de € 40, uma mochila no valor de € 15 e duas colunas artesanais no valor de € 300, pertencentes a LD; - um leitor de DVD e colunas de som no valor de € 300, um mini-disc portátil no valor de € 250, um blusão azul, um par de óculos e cerca de € 450 em dinheiro, tudo pertença de AG, também conhecido por X; - e, ainda, € 5 em dinheiro e um telemóvel Nokia, pertença da CB, e que esta trazia consigo; - todos os arguidos agiram em comunhão de esforços com o intuito de se apoderarem de bens e dinheiro (...) fazendo uso da ameaça de armas de fogo para, desse modo, obstarem a qualquer resistência por parte dos ofendidos que se encontravam presentes, logrando, assim, atingir os seus intentos; podemos concluir que os arguidos, ao actuarem nos termos descritos, criaram um clima de violência, obstando a qualquer resistência por parte do CL e da CB, mostrando-se concretizados dois crimes de roubo, individualizados nas pessoas daqueles dois ofendidos, pois só num contexto de violência, de impossibilidade de resistir se concebe, justifica e aceita que a CB haja sido desapossada de dinheiro e do telemóvel de que era portadora na altura. VII - Ter por excluído do círculo de possíveis autores ou co-autores, como intenta o arguido recorrente, por consumpção, quem atenta, sendo vários os visados, contra os bens jurídicos eminentemente pessoais, a cuja tutela propende o crime de roubo, seria deixar sem protecção o bem principalmente protegido e muito claramente identificado. VIII - Não se vê, por isso, que no caso dos autos a punição por um crime de roubo agravado (perpetrado na pessoa do CL) afaste a punição por outro, simples, praticado contra a CB, quando se parificam os interesses a acautelar, radicados em sujeitos distintos, em termos de redução a uma unidade de infracções, tanto mais que a unidade de resolução criminosa é inteiramente compatível, à face do art. 30.º, n.º 1, do CP, com uma pluralidade de sentidos ilícitos, considerando o comportamento global. A condenação por um crime mais grave, de roubo, não exprime toda a gravidade da sua conduta, violadora de duas normas jurídicas, e assim a configuração, face aos bens eminentemente pessoais, de tantos crimes quantas as pessoa das vítimas, fundando um concurso real de infracções. IX - Desde que se verifique uma decisão conjunta, e uma execução também conjunta, estamos caídos na figura da co-autoria; tomando o agente parte directa na execução, nos termos do art. 26.º do CP, torna-se comparticipante com os demais – cf. Faria Costa, Formas do Crime, in Jornadas de Direito Criminal, CEJ, I, pág. 170. X - Na co-autoria o co-autor é senhor do facto, que domina globalmente, tanto pela positiva, assumindo um poder de direcção, na execução conjunta do facto, ou seja no plano de execução comum, como pela negativa, podendo impedi-lo, ainda que não se torne necessária a prática de todos os factos que integram o iter criminis – cf. Maria da Conceição Valdágua, in O Início da Tentativa do Co-Autor, 1985, ed. Danúbio, págs. 155-156, na esteira de Roxin, Stratenwerth, Welzel e Jescheck, ali citados, e BMJ 341.º, págs. 202 e ss.. XI - A desnecessidade de prova da prática de todos os factos em que se desdobra a acção comum resulta, por um lado, da não exigência da lei, depois, da dificuldade de comprovação e, por fim, da consequência a que levaria, em termos de ineficácia da punição, quando, pela pluralidade de agentes, agudizando a perigosidade e danosidade sociais, mais se justifica. XII - Por isso, não vindo individualizada, na matéria de facto provada, a acção do recorrente N, mas também não vindo provada qualquer dissolidarização com a acção comum, que esta não fosse querida por ele, justifica-se a sua responsabilização penal pela prática de ambos os crimes de roubo identificados, se bem que em plano diverso, por exemplo, do arguido A, condutor do veículo, onde se transportaram e aos objectos subtraídos, detentor da arma usada para ameaçar o dono da residência, CL, que empurrou para o seu interior, ou da do arguido E, que usou igualmente uma pistola para aquele ameaçar, forçando-o a deslocar-se para a sala onde se achava a CB, naturalmente receosa de que lhe sucedesse mal, só assim se justificando a privação dos bens de que era titular. XIII - O Colectivo apurou um plano executivo criminoso comum, de todos vinculante e, nele, sem afastar a responsabilidade colectiva, discerniu, até onde lhe foi possível, a desigual medida da contribuição de cada no evento comum, mantendo-se fiel à lei e jurisprudência. XIV - A nota distintiva entre a co-autoria e a cumplicidade traduz-se, no que a esta respeita, na ausência de domínio do facto (cf. Jescheck, Tratado de Direito Penal, II, pág. 962), estando a jusante dele, promovendo o facto principal através do auxílio físico e psíquico, abrangendo a prestação de auxílio toda a forma de ajuda ou contribuição no facilitar daquele ou no fortalecimento da lesão do bem jurídico cometido pelo autor da lesão – cf. Wessels, Direito Penal, Parte Geral, Aspectos Fundamentais, trad. de Juarez Tavares, Porto Alegre, 1976, pág. 121. XV - A generalidade dos autores situa a cumplicidade numa posição de alternatividade face à autoria, numa forma secundária, acidental, no sentido de dependente da execução do crime, ou seu começo, e de menor gravidade, não determinante da prática do crime, que sempre se teria praticado embora em condições de tempo, lugar ou circunstâncias diversas, sem deixar de ser concausa do crime. XVI - Ambos, co-autor e cúmplice, concorrem para a acção criminal, cada qual “a seu jeito”, como esclarecedoramente se escreveu no Ac. deste STJ, de 22-03-2001 (CJSTJ, tomo I, pág. 261), sublinhando-se que o cúmplice, pelo seu papel de auxiliator não é causal da acção, no sentido de que esta sempre, apesar de tudo, teria lugar, porém em circunstâncias algo distintas. XVII - O cúmplice é um simples auxiliator, causa non dans (cf. Faria e Costa, Formas de Crime, in Jornadas de Direito Criminal, CEJ, I, pág. 170), um interveniente de feição acessória, que acede ao co-autor, sem o qual a sua comparticipação se não concebe. XVIII - No caso dos autos, sendo o arguido co-autor, um intraneus no processo executivo, que co-desencadeia com os demais, figura essencial à sua materialização, afastada está a auto-reclamada postura de cúmplice, com a marca de acessoriedade e não de essencialidade. | ||
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Decisão Texto Integral: | Acordam em audiência na Secção Criminal do Supremo Tribunal de Justiça: Em P.º Comum com o nº. 172/03.2 JASTB, em tribunal colectivo, no 3º Juízo de Competência Especializada Criminal da Comarca de Almada, foram submetidos a julgamento: AA; BB; CC; DD ; e EE, vindo, a final, a ser condenados: -o AA, como co-autor material e em concurso efectivo, de um crime de roubo agravado, p. e p. pelo artigo 210º, nºs. 1 e 2, al. b), com referência ao artigo 204º, nº 2, al. f), ambos do Código Penal, e de um crime de roubo simples, p. e p. pelo artigo 210º, nº 1, do Código Penal, aplicável ex vi dos artigos 210º, nº 2, al. b) e 204º, nº 4, do mesmo diploma legal, nas penas de: . 4 (quatro) anos de prisão, pelo crime de roubo agravado; . 1 (um) ano e 6 (seis) meses de prisão, pelo crime de roubo simples. Em cúmulo jurídico na pena unitária de 4 (quatro) anos e 6 (seis) meses de prisão. -o arguido BB, como co-autor material e em concurso efectivo, de um crime de roubo agravado, p. e p. pelo artigo 210º, nºs. 1 e 2, al. b), com referência ao artigo 204º, nº 2, al. f), ambos do Código Penal, e de um crime de roubo simples, p. e p. pelo artigo 210º, nº 1, do Código Penal, aplicável ex vi dos artigos 210º, nº 2, al. b) e 204º, nº 4, do mesmo diploma legal, nas penas especialmente atenuadas de: . 3 (três) anos de prisão, pelo crime de roubo agravado; . 1 (um) ano de prisão, pelo crime de roubo simples. Em cúmulo jurídico na pena unitária de 3 (três) anos e 6 (seis) meses de prisão. - o arguido CC, como co-autor material e em concurso efectivo, de um crime de roubo agravado, p. e p. pelo artigo 210º, nºs. 1 e 2, al. b), com referência ao artigo 204º, nº 2, al. f), ambos do Código Penal, e de um crime de roubo simples, p. e p. pelo artigo 210º, nº 1, do Código Penal, aplicável ex vi dos artigos 210º, nº 2, al. b) e 204º, nº 4, do mesmo diploma legal, nas penas de 5 (cinco) anos de prisão, pelo crime de roubo agravado e 2 (dois) anos de prisão, pelo crime de roubo simples. Em cúmulo jurídico das penas parcelares na pena unitária de 6 (seis) anos de prisão. -o arguido DD, como co-autor material e em concurso efectivo, de um crime de roubo agravado, p. e p. pelo artigo 210º, nºs. 1 e 2, al. b), com referência ao artigo 204º, nº 2, al. f), ambos do Código Penal, e de um crime de roubo simples, p. e p. pelo artigo 210º, nº 1, do Código Penal, aplicável ex vi dos artigos 210º, nº 2, al. b) e 204º, nº 4, do mesmo diploma legal, nas penas de 5 (cinco) anos e 6 (seis) meses de prisão, pelo crime de roubo agravado e 2 (dois) anos e 6 (seis) meses de prisão, pelo crime de roubo simples. Em cúmulo jurídico das penas parcelares na pena unitária de 6 (seis) anos e 6 (seis) meses de prisão. - o arguido EE, como co-autor material e em concurso efectivo, de um crime de roubo agravado, p. e p. pelo artigo 210º, nºs. 1 e 2, al. b), com referência ao artigo 204º, nº 2, al. f), ambos do Código Penal, e de um crime de roubo simples, p. e p. pelo artigo 210º, nº 1, do Código Penal, aplicável ex vi dos artigos 210º, nº 2, al. b) e 204º, nº 4, do mesmo diploma legal, nas penas de: . 5 (cinco) anos e 6 (seis) meses de prisão, pelo crime de roubo agravado; . 2 (dois) anos e 6 (seis) meses de prisão, pelo crime de roubo simples. Em cúmulo jurídico na pena única de 6 (seis) anos e 6 (seis) meses de prisão. I. Os arguidos AA, DD e EE interpuseram recurso para o Tribunal da Relação de Lisboa, que lhes negou provimento. II. Ainda irresignado, recorre, agora, o arguido EE para este STJ, apresentando, na motivação, as seguintes conclusões: A imputação do segundo crime de roubo não passa de uma imputação genérica a todos os arguidos e, quando o faz, poucas vezes, não contempla a posição do recorrente, assemelhando-se a uma posição de mero cúmplice. Foi excluída a comparticipação de cada agente, sem individualização da responsabilidade de cada, “preferindo juntá-los num todo“, fazendo-se cair por terra o disposto no art.º 29.º, do CP. A atribuição da medida da culpa a cada um dos comparticipantes é um dos elementos essenciais da medida concreta da pena, devendo o tribunal atender a todas circunstâncias que deponham a favor ou contra o arguido, especialmente o grau de ilicitude, o modo de execução do crime e a gravidade das suas consequências, bem como a intensidade do dolo ou da negligência. O acórdão recorrido considera a existência de um só plano, uma só resolução criminosa e não uma pluralidade de resoluções, não se tendo em conta o princípio da consumpção. E sendo os factos punidos como crimes de roubo o da forma mais grave consome o da forma menos grave; uma norma consome já protecção que outra norma visa acautelar, de acordo com a forma “ Lex consumens derogat legi consumptae “. Deve o arguido ser condenado por um só crime. A pena aplicada ao arguido é desproporcionada e desadequada, sendo que apenas se considerou o seu passado criminal e não considerou que é casado, tem uma filha de menor idade, residentes em Portugal. Torna-se imperioso aplicar uma pena inferior à que lhe foi aplicada e tão só pela prática de um crime de roubo agravado, sempre inferior a 5 anos meio de prisão. Mostram-se violados os art.ºs 29.º, 40.º e 71.º, do CP, bem assim o princípio da consumpção, devendo o arguido ser condenado, apenas, pela prática de um crime de roubo agravado, em pena inferior a 5 anos e meio de prisão. III. O Exm.º Procurador Geral –Adjunto na Relação de Lisboa, contramotivou, defendendo o acerto da decisão recorrida. IV. O M.º P.º neste STJ apôs o seu visto. V. Colhidos os legais vistos, cumpre decidir, considerando que se provou o seguinte factualismo: 1- No dia 23 de Março de 2003, pelas 01h00m, os arguidos, em conjugação de esforços e desígnios, deslocaram-se, num veículo automóvel conduzido pelo arguido AA, à residência sita na Rua Bairro da Boa Esperança, nº..., na Sobreda da Caparica, com intenção de ali entrarem e subtraírem objectos de valor que pudessem levar consigo. 2- Aí chegados, um dos co-arguidos tocou à campainha e, assim que a porta foi aberta por FF, ali residente, o arguido AA, munido de uma pistola exibiu-a e apontou-a à cabeça de FF e empurrou-o para o interior da residência, permitindo a entrada na mesma dos restantes co-arguidos. 3- Já no interior da residência, o arguido DD encostou uma pistola à cabeça de FF e, obrigando-o a dirigir-se para a sala sob a ameaça da arma, e onde se encontrava GG, os arguidos perguntaram-lhe: “onde está a muamba?”. 4- Como o ofendido FF não soubesse responder, um dos co-arguidos desferiu-lhe uma bofetada na cara. 5- De seguida, um dos co-arguidos perguntou pelo “...”, pelo “quarto do..., pelas câmaras do...” e pelo “material de som do...”. 6- Os arguidos, então, de forma concertada, percorreram a casa e subtraíram e fizeram seus, carregando-os para o veículo automóvel onde se fizeram transportar: - cerca de € 100,00 em dinheiro; um casaco corta vento com capuz preto; uma playstation 2 Sony; um telemóvel Nokia com o IMEI 350139803907031; uma mochila Adidas; uma mochila preta e um saco, pertencentes a FF; - cerca de € 400,00 em dinheiro; uns headphones no valor de € 95,00; um amplificador no valor de € 400,00; um equalizador no valor de € 100,00; um casaco azul no valor de € 10,00; um frasco de perfume no valor de € 40,00; uma mochila no valor de € 15,00; e duas colunas artesanais no valor de € 300,00, pertencentes a II; - cerca de € 5,00 em dinheiro e um telemóvel Nokia 8310 com o IMEI 351104100868244, no valor de € 10,00, pertencentes a GG, que ali se encontrava presente, e que esta trazia consigo; - um leitor de DVD e colunas de som, no valor de € 300,00; um mini-disc portátil no valor de € 250,00; um blusão de marca Sanjo, azul e creme; um par de óculos, e cerca de € 450,00 em dinheiro, pertencentes a HH, também conhecido por.... 7- Agiram todos os arguidos em comunhão de esforços, com o intuito de se apoderarem de bens e dinheiro que sabiam não lhes pertencer e que actuavam contra a vontade dos seus donos, que não consentiam aquelas apropriações, fazendo uso da ameaça de armas de fogo para, desse modo, obstar a qualquer resistência por parte dos ofendidos que se encontravam presentes, logrando, dessa forma, atingir mais facilmente os seus intentos. 8- Agiram os arguidos, em todas as descritas circunstâncias, de forma voluntária, livre e consciente, bem sabendo que as suas condutas eram proibidas e punidas por lei. 9- O blusão, pertencente a HH, o casaco, pertencente a II e o telemóvel, pertencente a GG, subtraídos pelos arguidos, e referidos em 6 dos Factos Provados, e que se encontravam na posse dos arguidos AA e CC, e de JJ, respectivamente, foram, entretanto, recuperados, na sequência das apreensões efectuadas pelas autoridades policiais, e restituídos aos seus legítimos proprietários. 10- O arguido AA é solteiro, tem o 12º ano de escolaridade, e vive juntamente com os pais. 11- Este arguido é militar e aufere, por mês, cerca de € 750,00. 12- O arguido BB é solteiro, tem o 6º ano de escolaridade e vive juntamente com os pais e uma filha menor. 13- Este arguido é servente mas encontra-se desempregado há cerca de dois meses. 14- O arguido CC é solteiro, tem o 7º ano de escolaridade e vive juntamente com a mãe, a companheira com quem vive maritalmente, e um filho menor. 15- Este arguido é servente e aufere mensalmente, no exercício dessa actividade, cerca de € 500,00. 16- O arguido DD é solteiro, tem o 6º ano de escolaridade e vive juntamente com os pais. 17- O processo de crescimento e socialização deste arguido decorreu num bairro degradado e problemático, tendo tal circunstancialismo influenciado o seu modo de vida e as suas actuações, revelando uma reduzida consciência crítica sobre os seus actos e repercussões sociais dos mesmos. 18- Actualmente encontra-se em cumprimento de pena de prisão, no Estabelecimento Prisional da Carregueira e, antes de estar preso, trabalhava na construção civil onde auferia, como pedreiro, cerca de e 40,00 por dia. 19- O arguido EE é casado, tem o 7º ano de escolaridade, e, antes de ser preso, encontrava-se desempregado e vivia em união de facto com uma companheira, e tem uma filha menor a residir em S. Tomé. 20- Este arguido, actualmente, encontra-se em cumprimento de pena de prisão no Estabelecimento Prisional do Montijo e a reclusão tem motivado uma equilibrada ponderação do passado e um adequado planeamento do seu futuro, beneficiando de apoio familiar. 21- O arguido AA não tem quaisquer antecedentes criminais registados. 22- O arguido BB foi condenado, por sentença de 16/07/2003, proferida no âmbito do Processo comum singular nº 1285/03.1 TBBRR, do 1º Juízo Criminal do Tribunal Judicial do Barreiro, pela prática, em 08/08/2000, de crime de desobediência e de dano, na pena de 70 dias de multa, à taxa diária de € 3,00. 23- O arguido CC foi condenado, por acórdão de 20/01/2001, proferida no âmbito do Processo comum colectivo nº 386/00.7 GCSXL, do 1º Juízo Criminal do Tribunal Judicial do Seixal, pela prática, em 31/03/2000, de um crime de roubo agravado, com pena especialmente atenuada, na pena de 2 (dois) anos de prisão. 24- O arguido DD foi condenado: a) Por acórdão de 29/01/2001, proferido no âmbito do processo comum colectivo nº. 386/00.7 GCSXL, no 1º Juízo Criminal do Tribunal Judicial do Seixal, pela prática, em 31/03/2000, de um crime de roubo agravado, com pena especialmente atenuada, na pena de 2 (dois) anos de prisão; b) Por acórdão de 18/11/2002, proferido no âmbito do processo comum colectivo nº 86/00.8 GCSXL, do 2º Juízo Criminal do Tribunal do Seixal, pela prática, em 20/01/2000, de um crime de roubo, na pena de 3 (três) anos e 7 (sete) meses; c) Por acórdão de 04/03/2005, proferido no âmbito do processo comum colectivo nº 240/02.8 TAMTJ, do 2º Juízo do Tribunal do Montijo, pela prática, em 03/04/2002, de um crime de dano com violência, na pena de 1 (um) ano e 8 (oito) meses. Em cúmulo jurídico realizado com a pena referida em b), foi o arguido condenado na pena única de 4 (quatro) anos e 2 (dois) meses de prisão. 25- O arguido EE foi condenado: a) Por acórdão de 27/11/1998, proferido no âmbito do processo comum colectivo nº. 599/97.7 GCSXL, no 2º Juízo Criminal do Tribunal Judicial do Seixal, pela prática, em 06/07/1997, de um crime de roubo, na pena de 1 (um) ano e 2 (dois) meses de prisão; b) Por sentença de 23/01/2002, proferida no âmbito do processo sumário nº 19/02.7 GCSXL, no 1º Juízo Criminal do Tribunal Judicial do Seixal, pela prática, em 07/01/2002, de um crime de condução de veículo sem habilitação legal, na pena de 60 dias de multa, à taxa diária de € 3,00; c) Por sentença de 12/12/2003, proferida no âmbito do processo comum singular nº 252/02.1 GCSXL, no 1º Juízo Criminal do Tribunal Judicial do Seixal, pela prática, em 18/02/2002, de um crime de condução de veículo sem habilitação legal, na pena de 4 (quatro) meses de prisão, suspensa na sua execução pelo período de 2 (dois) anos; d) Por sentença de 12/12/2003, proferida no âmbito do processo comum singular nº 58/01.5 GCSXL, no 1º Juízo Criminal do Tribunal Judicial do Seixal, pela prática, em 18/01/2001, de crimes de condução de veículo sem habilitação legal e de condução perigosa de veículo rodoviário, na pena única de 11 (onze) meses de prisão, suspensa na sua execução pelo período de 18 (dezoito) meses, e na pena acessória de proibição de conduzir pelo período de 4 (quatro) meses; e) Por acórdão de 07/07/2004, proferido no âmbito do processo comum colectivo nº 484/03.5 TASXL, no 1º Juízo Criminal do Tribunal Judicial do Seixal, pela prática, em 07/07/2004, de um crime de tráfico de estupefacientes e de um crime de resistência e coacção sobre funcionário, na pena única de 4 (quatro) anos e 8 (oito) meses de prisão. VI. O arguido, ora recorrente, contesta a qualificação jurídico-criminal dos factos que lhe são imputados, sendo essa questão, que no seu entender, se reconduz à configuração de um só crime de roubo, e não dois, como foi condenado, pela afirmação de uma única resolução criminosa, a primeira sobre que este STJ reflectirá, a partir da constatação da matéria de facto, que, numa síntese compreensiva, e ordenada, se explanará. Assim: O arguido, com outros, “em conjugação de esforços e de desígnios “, no dia 23 de Março de 2003, pelas 01 h 00, deslocaram-se num veículo automóvel conduzido pelo arguido AA à residência sita na Rua do Bairro da Boa Esperança n.º..., na Sobreda da Caparica, com a “ intenção de ali entrarem e subtraírem objectos de valor “, que pudessem levar consigo. Um dos co-arguidos tocou à campainha e logo que o residente FF abriu a porta, o AA apontou a arma à cabeça daquele, logo o empurrando para o interior da casa, permitindo a entrada de todos. Uma vez entrados na dita residência, em cujo interior se achava GG, o arguido DD apontou uma pistola à cabeça do FF, obrigando este a seguir, sob a ameaça da arma, para a sala onde aquela se achava, perguntando-lhe aí onde se achava a “ muamba “, e, como não soubesse responder, um dos arguidos desferiu ao ofendido uma bofetada. Um dos co-arguidos perguntou pelo “... “, pelas “ câmaras do...” e pelo material de som do “... “. De forma concertada todos percorreram a casa e fizeram seus, carregando-os, depois, para o automóvel, deles se apoderando, designadamente de: -Cerca de 100 € em dinheiro, um casaco corta vento, um telemóvel Nokia, uma mochila preta e outra Adidas e um saco de que era dono o FF. -Cerca de 400 € em dinheiro, uns “ headphones “ no valor de 95 €, um amplificador no valor de 400 €, um equilizador no valor de 100 €, um casaco azul no valor de € 10, um frasco de perfume no valor de 40 €, uma mochila no valor de 15 € e duas colunas artesanais no valor de 300 €, pertencentes a II. -Um leitor de DVD e colunas de som no valor de 300 €, um mini-disc portátil no valor de 250 €, um blusão azul, um par de óculos e cerca de 450 € em dinheiro, tudo pertença de HH, também conhecido por.... - E, ainda, de 5 € em dinheiro e um telemóvel Nokia no valor de €, pertença da GG, e que esta trazia consigo. E a rematar o colectivo decidente factualizou que “ todos os arguidos agiram em comunhão de esforços com o intuito de se apoderarem de bens e dinheiro ( … ) fazendo uso da ameaça de armas de fogo para, desse modo, obstar a qualquer resistência por parte dos ofendidos que se encontravam presentes, logrando, dessa forma, atingir os seus intentos “. O arguido pondera, citando jurisprudência deste STJ ( o Ac. de 12.6.97, BMJ 468 -116), que movendo-se o agente do crime de roubo em execução de um mesmo desígnio criminoso, embora os bens pertençam a ofendidos diferentes, há um só crime de roubo, decisão que colhe o nosso inteiro apoio ; se, pois, um só é o sujeito passivo do roubo embora os bens pertençam a diferentes pessoas não pode deixar de configurar-se um crime de roubo. E isto porque a norma de previsão do art.º 210.º n.º 1, do CP, ao tipificar o crime de roubo protege a subtracção ou o constrangimento à entrega de coisa móvel alheia, por meio de violência, ameaça com perigo iminente para a vida ou para a integridade física ou colocando a vítima na impossibilidade de resistir, sem distinção entre coisa própria ou alheia, propondo-se assegurar a posse da coisa num clima de tranquilidade. Avançar-se-à, no entanto, que o crime de roubo é um ilícito complexivo, de concurso entre a vertente patrimonial e pessoal, em que se fusionam as componentes de ataque ao património alheio e à pessoa do sujeito passivo, manifestada polimorficamente nos valores jurídicos da liberdade, integridade física e até mesmo da vida humana. No roubo, enquanto crime complexo, obtido por fusão, em resultado de uma síntese normativa, correspondente a uma norma em concurso aparente com a norma do tipo matriz sobre que prevalece ( cfr. Da Unidade à Pluralidade de Crimes no Direito Penal Português, Prof. Lobo Moutinho, ed. Da Faculdade de Direito da UC, 2005, 972), pluriofensivo de bens patrimoniais e, essencialmente, bens pessoais, à integridade física e até à pessoa do visado, que faz dele um crime comunitariamente altamente reprovável, pelo alvoroço e alarme social que causam, por atingir segmentos indefesos socialmente, jovens em idade escolar, idosos e mulheres, indefesa ainda mais vincada porque os seus agentes, em regra, agem em grupo, com grande poder de mobilidade, obedecendo a uma plano prévio, a actuação do arguido é diferenciada dos demais. E é essa nota de ataque pessoal à vítima que, contradistinguindo o roubo do simples furto, ganhando relevo, reclama tutela penal agravada, reflectida no segmento punitivo do descritivo típico -1 a 8, 3 a 15 ou 8 a 16 anos de prisão. E é a partir do relevo que ganha na previsão e punição do crime de roubo o elemento pessoal, quando comparativamente com o aspecto patrimonial, aspecto que tem sido repetidamente afirmado para, sendo diversas as vítimas se excluir a figuração do crime continuado, sendo peremptório este STJ em afirmar o concurso real, ou seja tantos crimes quantas as pessoas das vítimas. “ Trata-se de bens que se não podem desligar da personalidade, que apenas podem ser violados na pessoa que os cria com o só existir. Por isso, salvo fazendo violência às coisas, não pode o legislador protegê-los senão individualmente na pessoa dos seus portadores “, teoriza a propósito o Prof. Eduardo Correia, in Unidade e Pluralidade de Infracções – Caso Julgado e Poderes de Cognição do Juiz, pág. 122. Na jurisprudência, cfr., entre outros, os Acs. deste STJ, de 14.4.83, BMJ 326, 422, 30.11.83, BMJ 331, 345, 15.11.89, BMJ 391, 239, 30.7.86, BMJ 359, 411, 2.5.91, AJ, n.º 19, P.º n.º 41281, 2.10.94, Pº n.º 45265 e de 21.4.93, P.º n.º 4396. Ao dar-se como provado que o arguido AA, munido de uma pistola, ameaçando o ofendido FF, logrou a entrada , a desoras, na residência de tal ofendido; que, em sequência, o arguido DD lhe apontou uma pistola, obrigando-o a dirigir-se para a sala onde se achava o ofendida GG, e mais que, fazendo uso de tais armas criaram um clima de violência, obstando a qualquer resistência por parte de ambos, se mostra, concretizado esse elemento típico, também um individualizado crime de roubo na pessoa da GG. Atentando, ainda, na matéria de facto provada só num contexto de violência, de impossibilidade de resistir se concebe, justifica e aceita que a GG haja sido desapossada de dinheiro e do telemóvel de que era portadora na altura. Ter por excluído do círculo de possíveis autores ou coautores, como intenta o arguido, por consumpção, quem atenta, sendo vários os visados, contra os bens jurídicos eminentemente pessoais, a cuja tutela propende o crime de roubo, seria deixar sem protecção o bem principalmente protegido e muito claramente identificado. Não se vê, como em tal caso, a punição por um crime de roubo agravado afaste a punição por outro, simples, na pessoa da GG, quando se parificam os interesses a acautelar, radicados em sujeitos distintos, em termos de redução a uma unidade de infracções, tanto mais que a unidade de resolução criminosa é inteiramente compatível, à face do art.º 30.º n.º 1, do CP, com uma pluralidade de sentidos ilícitos, considerando o comportamento global. A condenação pelo crime mais grave, de roubo qualificado, não exprime toda a gravidade da sua conduta, violadora de duas normas jurídicas, e assim a configuração, face aos bens eminentemente pessoais de tantos crimes quantas as pessoas das vítimas, fundando um concurso real de infracções. Na verdade, como ensina o Prof. Eduardo Correia a propósito da consumpção, perante valores protegidos por normas jurídicas de hierarquia diferente, entre os quais se verificam "relações de mais e menos: uns contêm-se já nos outros, de tal maneira que uma norma consome já a protecção que a outra visa", pelo que, com fundamento na regra non bis idem, se tem de concluir que lex consumens derogat legi consumtae (cfr. "Direito Criminal",Vol.II,pág.205). E esse não é o caso, ante o perfilar de normas jurídicas que não se anulam entre si de modo a uma só prevalecer, havendo necessidade de proteger interesses pessoais próprios, que se mostram ofendidos. VII. Não se quedando por aqui a crítica ao acórdão recorrido, o arguido controverte a sua posição como co-autor, já que se lhe não imputa a prática de factos concretos, antes uma imputação genérica, assemelhando-se a uma posição de cumplicidade, que nem essa justifica. Desde que se verifique uma decisão conjunta e uma execução também conjunta, estamos caídos na figura da co-autoria ; tomando o agente parte directa na execução, nos termos do art.º 26.º, do CP, torna-se comparticipante com os demais, escreve o Prof. Faria Costa, in Formas do Crime, CEJ, Jornadas de Direito Criminal, I, 170. Na co-autoria o co-autor é senhor do facto, que domina globalmente, tanto pela positiva, assumindo um poder de direcção, na execução conjunta do facto, ou seja no plano de execução comum, como pela negativa, podendo impedi-lo, ainda que não se torne necessária a prática de todos os factos que integram o “ iter criminis “ ( cfr. Dr.ª Maria da Conceição Valdágua , in O Início da Tentativa do Co-Autor, 1985, Ed. Danúbio, 155/156, na esteira de Roxin, Stratenwerth, Welzel e Iescheck, ali citados e BMJ 341, 202 e segs.). A desnecessidade de prova da prática de todos os factos em que se desdobra a acção comum resulta, por um lado, da não exigência da lei, depois, da dificuldade de comprovação e por fim da consequência a que levaria, em termos de ineficácia de punição, quando, pela pluralidade de agentes, agudizando a perigosidade e danosidade sociais, mais se justifica. O próprio art.º 29.º, do CP, ao afirmar que o comparticipante é punido em função da sua culpa, independentemente da sua punição ou do seu grau de culpa, sustenta a desnecessidade de prática de todos os actos, ao fundar a punição no pressuposto diferenciado da medida da culpa de cada comparticipante para o resultado comum, suposto que, como se deu provado, todos os arguidos concorreram para o despojamento, pela violência, de bens e valores achados na casa de FF, que carregaram, depois de deles se terem apropriado, e transportaram no veículo no qual se haviam deslocado para o feito. De certo que não vem individualizada a acção do recorrente, mas também não vem provada qualquer dessolidarização com a acção comum, que esta não fosse querida por ele, se bem que a responsabilidade objectivada no roubo se não situa no mesmo plano da do arguido AA, condutor do veículo, onde se transportaram e aos objectos subtraídos, detentor da arma usada para ameaçar o dono da residência, FF, que empurrou para o seu interior , ou da do arguido DD que usou igualmente uma pistola para aquele ameaçar, forçando-o a deslocar-se para a sala onde se achava a GG, naturalmente receosa de que lhe sucedesse mal, só assim se justificando, e repetindo-o, a privação dos bens, de reduzido valor, é certo, de que era titular. Não se nos afigura exacto afirmar que o Colectivo preferiu, quanto aos arguidos, "juntá-los num todo“ sem individualizar as respectivas condutas, em violação do pré-citado art.º 29.º, do CP, pois o Colectivo apurou um plano executivo criminoso comum, de todos vinculante e, nele, sem afastar a responsabilidade colectiva, discerniu, até onde lhe foi possível, a desigual medida da contribuição de cada no evento comum, mantendo-se fiel à lei e jurisprudência. O arguido entende que a sua responsabilidade criminal se assemelha à do cúmplice. A cumplicidade vem definida no art.º 27.º, n.º 1, do CP, sendo, como tal punível, o que, por qualquer forma, presta auxílio material ou moral à prática, por outro, de um facto doloso. A nota distintiva entre a co- autoria e cumplicidade traduz-se na ausência de domínio do facto ( cfr. Iescheck, Tratado de Direito Penal, II, 962), estando a jusante dele, promovendo o facto principal através do auxílio físico e psíquico, abrangendo a prestação de auxílio toda a forma de ajuda ou contribuição no facilitar daquele ou no fortalecimento da lesão do bem jurídico cometido pelo autor da lesão- cfr. Wessels, Direito Penal, Parte Geral, Aspectos Fundamentais, tradução de Juarez Tavares, Porto Alegre, 1976, 121. A generalidade dos autores situa a cumplicidade numa situação de alternatividade face à autoria, numa forma secundária, acidental, no sentido de dependente da execução do crime ou seu começo e de menor gravidade, não determinante à prática do crime, que sempre se teria praticado embora em condições de tempo, lugar ou circunstâncias diversas, sem deixar de ser concausa do crime. Ambos, co-autor e cúmplice, concorrem para a acção criminal, cada qual “ a seu jeito “, como esclarecedoramente se escreveu no Ac. deste STJ, de 22.3.2001, in CJ, STJ, I, 261, sublinhando-se que o cúmplice, pelo seu papel de “ auxiliator “ não é causal da acção, no sentido d e que esta sempre, apesar de tudo, teria lugar, porém em circunstâncias algo distintas. O cúmplice é um simples “ auxiliator “, “ causa non dans “ –cfr. Prof. Faria e Costa, Formas de Crime, in Jornadas de Direito Criminal, CEJ, I, 170, um interveniente de feição acessória, que acede ao co-autor, sem o qual a sua comparticipação se não concebe. Mas, pelo que se deixa dito, sendo o arguido co-autor, um “ intraneus “ no processo executivo, que co-desencadeia com os demais, figura essencial à sua materialização, afastada está a autoreclamada postura de cúmplice, com a marca de acessoriedade e não essencialidade. VIII. Medida concreta da pena: O arguido manifesta a sua discordância quanto á pena de concurso que lhe foi aplicada, de 6 anos e 6 meses de prisão, resultante das parcelares de 2 anos e 6 meses e 5 anos e 6 meses pelos crimes de roubo simples e qualificado, respectivamente. A irrecorriblidade para este STJ quanto à pena imposta pela prática do roubo simples é imposta por força do disposto no art.º 400.º n.º 1 f), do CPP, que realiza chamada “ dupla conforme “, figura sobejamente conhecida do direito canónico, de onde foi importada, pela confirmação de tal pena nas duas instâncias e a moldura penal pelo roubo simples não exceder 8 anos de prisão. No que ao crime de roubo agravado respeita, a punição, num arco penal de 3 a 15 anos de prisão, foi concretamente doseada em 5 anos e 6 meses de prisão, ponderar-se –à que as vertentes da formação da pena comportam aqui um acentuado peso. A pena tem por finalidade a protecção dos bens jurídicos e, se possível, a ressocialização do agente, em caso algum podendo exceder a medida da culpa, nos termos do art.º 40.º, do CP. A medida concreta da pena depende da culpa e da prevenção e, ainda das circunstâncias que, exemplificativamente enunciadas no art.º 71.º, n.ºs 1 e 2, do CP, atenuam ou exacerbam a responsabilidade criminal do arguido. O legislador penal adopta uma concepção utilitarista da pena, com predilecção pela prevenção geral, norteado pela ideia de que as medidas preventivas especiais, gizadas e aplicadas nas últimas décadas, não alcançaram a eficácia esperada. Foi verificado através do Comité Européen pour les Problèmes Criminels que o resultado da prevenção geral não deriva tanto do estabelecimento de normas de direito penal e da ameaça abstracta das respectivas sanções, mas o mais importante na matéria é, para além da descoberta rápida do agente do crime e do temor da descoberta que sobre ele se exerce, a transformação do sistema penal em instrumento de influência benéfica de motivação daqueles que nunca cometeram qualquer crime, dissuadindo-os da prática de infracções – cfr. Prefácio, Jornadas de Direito Criminal, CEJ, I, assegurando as expectativas comunitárias contra o facto, insegurança e alvoroço social que causa. À prevenção especial pede-se, na componente da medida da pena, a ponderação da reintegração do agente no tecido social ferido, em termos de se corrigir e emendar, interiorizando os nefastos efeitos do crime, mas se não houver esperanças de êxito na socialização do agente, em caso de incorrigibilidade, ficam só em aberto as possibilidades, sempre dentro da medida permitida pela culpa e pelo ponto óptimo de protecção dos bens jurídicos, de “ necessária intimidação individual ou de indispensável segurança individual (inocuização) ” – cfr. Direito Penal Português – As Consequências Jurídicas do Crime, Prof. Figueiredo Dias, § 334. O crime de roubo tem aumentado em todo o mundo e, entre nós, igualmente, demandando revigoramento do direito penal em nome das necessidades de prevenir a sua prática, com origem criminógena, associada, em larga escala, ao tráfico de estupefacientes, causando elevado alarme e alvoroço social, merecendo forte reprovação e censura. O roubo praticado, a coberto da noite, facilitando a execução do crime, numa casa de habitação, onde o arguido com outros, penetrou, irrompendo naquela, denota inegável ousadia, além de desprezo pela inviolabilidade do domicílio alheio, cifrando-se o dinheiro subtraído, aproximadamente em 955 € e em 1520 € o valor dos bens de que ilegitimamente se apoderaram, com algum significado, o que, valorando o modo de execução do crime, suas consequências, caracteriza um grau de ilicitude, ou de contrariedade à lei muito elevado, como o é a intenção criminosa, ou seja o dolo de acção, preordenado ao crime. Sem nada favorecer o arguido posiciona-se o seu passado criminal, marcado por pela prática de um crime de roubo, 3 crimes de condução ilegal de viatura, um de condução perigosa de veículo rodoviário, um de tráfico de estupefacientes e um de resistência e coacção sobre funcionário, prática criminosa que se estende ao longo dos anos de 1997, 2001, 2002 e 2004, pelos quais foi condenado em pena de prisão, efectiva, suspensa e multa. O arguido revela, na reiteração criminosa, insensibilidade à pena e forte insusceptibilidade de por ela ser influenciado, porque não arrepiou caminho e, por aquele trajecto vital assim caracterizado, falta de preparação para manter conduta lícita, circunstância que releva para a medida da pena, tanto pela via da culpa como da prevenção, na medida em que constitui sinal evidente de desconformação da sua personalidade com a do homem fiel ao direito –cfr. Prof. Figueiredo Dias, op. cit., §§ 347 e 348 - a demandar pena mais severa, por um “ plus “ de juízo de censura e de reprovabilidade que acresce aos que não comportam esse passado. E não foi senão por essa razão que os arguidos AA, CC e BB mereceram tratamento diferenciado, “ in mellius “. O arguido –fls. 823-, de resto, também não confessou os factos, não evidenciou qualquer indício de arrependimento ou de auto-censura pelo seu comportamento, carecendo , por todo o exposto, de sentidas necessidades de prevenção pela via da pena, como meio de interiorizar os malefícios do seu crime para que não volte a delinquir readaptando – o ao meio social, de modo a não voltar a prejudicá-lo ( Rodriguez Deveza, Parte General, 884, Madrid, 1995 ). A circunstância de viver com uma companheira não atenua a sua responsabilidade, como não a atenua o facto de ter uma filha menor, que, por viver em S. Tomé, o arguido, desempregado na data dos factos, não providenciaria pelo seu sustento. De todo o modo a pena imposta para o crime de roubo qualificado peca por excesso, sendo mais justa a de 4 anos e meio de prisão, pelo que, em cúmulo jurídico com a de roubo simples aplicada à ofendida, se lhe aplica em cúmulo jurídico, considerados, globalmente, os factos e a personalidade do arguido, se aplica a pena única de 5 anos e meio de prisão. IX Concede-se, pois, provimento ao recurso, alterando-se, em parte, o acórdão recorrido. X. condena-se ao pagamento de 7 Uc,s de taxa de justiça, acrescendo a procuradoria de 1/3 em favor dos SSMJ. Lisboa, 2 de Maio de 2007 Armindo Monteiro (relator) Santos Cabral Oliveira Mendes Maia Costa |