Acórdão do Tribunal da Relação do Porto
Processo:
288/11.1GDSTS-BA.P1
Nº Convencional: JTRP000
Relator: MARIA LEONOR ESTEVES
Descritores: ESCUTA TELEFÓNICA
CONTROLO JUDICIAL
PRAZO
Nº do Documento: RP20121010288/11.1GDSTS-BA.P1
Data do Acordão: 10/10/2012
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Privacidade: 1
Meio Processual: REC PENAL
Decisão: PROVIDO
Indicações Eventuais: 1ª SECÇÃO
Área Temática: .
Sumário: I - A ratio subjacente ao controlo apertado das escutas telefónicas, em matéria que contende com direitos fundamentais, determina a natureza urgente daqueles atos, impondo que os prazos estabelecidos para a sua prática corram em férias.
II - Tal natureza urgente compagina-se com a realização do ato dentro do período normal de funcionamento dos tribunais, mesmo durante o período de férias.
III – Não há desrespeito do prazo máximo de 48 horas previsto pelo n.º 4 do art. 188.º do CPP se entre o dia em que ele se iniciou e aquele em que foi feita a apresentação ao juiz se interpôs um fim de semana alargado (feriado seguido de sábado e domingo).
Reclamações:
Decisão Texto Integral:

6

Recurso Penal nº 288/11.1GDSTS-BA.P1

Acordam, em conferência, na 1ª Secção Criminal do Tribunal da Relação do Porto:

1.Relatório
No âmbito do inquérito nº 288/11.1GDSTS-BA, a correr termos nos serviços do Ministério Público do Tribunal Judicial de Santo Tirso, a Srª. Juiz do 2º juízo criminal do mesmo Tribunal, funcionando como JIC, proferiu despachos em vários apensos desse processo nos quais, considerando expirado o prazo estabelecido no nº 4 do art. 188º do C.P.P., não validou várias intercepções telefónicas e um registo de imagens que lhe haviam sido apresentados por determinação do MºPº e na sequência de promoções no sentido de ser declarada a sua validade e ordenada a transcrição das primeiras.
Inconformado com tais despachos, deles interpôs recurso o MºPº, pretendendo a sua revogação e substituição por outros que acolham o promovido, para o que formulou as seguintes conclusões:

1. No dia 5 de Abril de 2012 (período de férias judiciais) foram apresentadas nos Serviços do Ministério Público, pelo OPC encarregue das investigações no âmbito do inquérito n.º 288/11.lGDSTS, diversas intercepções telefónicas e registos de imagens com vista à sua apreciação pelo Meritíssimo JIC.
2. No mesmo dia - 5 de Abril de 2012 - a Magistrada do Ministério Público promoveu a validação das intercepções telefónicas consideradas relevantes, junção aos autos dos suportes técnicos e relatórios referentes às comunicações/conversações consideradas relevantes e requerida as transcrições das respectivas sessões, bem como se guardasse os suportes técnicos referentes às conversações/sessões, não consideradas relevantes e não transcritas em envelope lacrado, bem como quanto às imagens recolhidas, a sua validação, junção dos suportes técnicos e relatórios referentes às mesmas imagens consideradas relevantes.
3. O dia 6 de Abril de 2012 foi feriado estando, por isso, encerrados os serviços judiciais, sendo que o dia 7 foi um Sábado com serviço de turno legalmente aprazado e o dia 8 de Abril Domingo.
4. No dia 9 de Abril de 2012, no período de tempo compreendido entre as 09:00 e as 10:00 horas, foi o processo de inquérito agora em causa e os citados vinte e um apensos remetidos para a secção central para distribuição.
5. A Meritíssima JIC não validou as intercepções telefónicas e registos de imagens no entendimento de que o expediente que lhe havia sido apresentado não havia respeitado, na sua apresentação, o prazo a que alude o artigo 188.º, n.º 4, do Código de Processo Penal, determinando, no mesmo passo, a devolução do processo ao Ministério Público.
6. Diverge-se frontalmente deste entendimento porquanto, por um lado, as intercepções telefónicas foram apresentadas pelo órgão de polícia criminal ao Ministério Público no 14.° dia dos 15 dias a que alude o n.º 3 do citado normativo 188.º, do Código de Processo Penal.
7. De facto, as intercepções e o registo de imagens tiveram o seu inicio em 23 de Março de 2012, pelo que, quando deram entrada nos serviços do Ministério Público desta comarca, fizeram-no antecipadamente, pois o dia 5 de Abril de 2012 era o 14.° dia desde o inicio da primeira intercepção,
8. O O.P.G., sempre poderia fazer, e atempadamente, a entrega do expediente processual no Sábado dia 7 de Abril de 2012, pois, apesar de o 15.° dia se perfazer no dia 6 de Abril de 2012, esse dia foi feriado (Sexta-feira Santa) e os tribunais estavam encerrados, tanto mais que recaindo o último dia do prazo num feriado, ou domingo e de acordo com o regime legal sobre a contagem e a prática de actos processuais, a prática do acto pode ser levada a cabo, no dia útil seguinte, conforme dispõem os artigos 104.°, do Código de Processo Penal e o 144,°, n.º 2, do Código de Processo Civil - neste sentido o Acórdão da Relação de Évora de 22.01.2008, Processo 3104/07.1, Relator João Latas.
9. O O.P.C, apresentou em juízo os elementos referidos para validação, tendo-o feito dentro do seu prazo legal, tendo o feito, pois, até antes de expirar o seu prazo legal e a Magistrada do Ministério Público tomou conhecimento daquele, no dia 5 de Abril de 2012 e no mesmo dia ordenou a sua apresentação ao Meritíssimo JIC, sem esgotar as 48 horas previstas no artigo 188.a, do Código de Processo Penal.
10. Os despachos proferidos pela Meritíssima JIC de turno no dia 9 de Abril de 2012, nos vinte e um Apensos citados dos autos de inquérito em referência, não validando as intercepções telefónicas e os registos de imagens, por se ter expirado o prazo de 48 horas a que alude o n.° 4, do artigo 188.º, do Código Penal, merece censura, porquanto é nosso entendimento que ao abrigo do disposto no artigo 144.°, n.º 2, do CPC, o prazo para a prática de acto processual que terminar em dia em que os tribunais estiverem encerrados, transfere-se para o primeiro dia útil seguinte.
11. No caso em apreço, atendendo ao prazo máximo de 48 horas a que alude o artigo 188.º. n.º 4, do Código de Processo Penal para a apresentação efectuada no processo, dos correspondentes suportes técnicos, bem como os respectivos autos e relatórios à Meritíssima JIC, foi essa apresentação efectuada dentro do citado prazo legal, pois o Ministério Público promoveu no referido 14.º dia desde o inicio das intercepções e nas 48 horas seguintes levou-os ao conhecimento da Meritíssima JIC, com a remessa electrónica ao Juízos criminais.
12. Ou seja, apresentados no 14.° dia, desde o início da sua intercepção os correspondentes suportes técnicos, bem como os respectivos autos e relatórios, pelo O.P.C, ao Ministério Público, foram os vinte e um apensos juntamente com os autos principais do citado inquérito, nesse mesmo dia despachados, neles se ordenando que fossem conclusos ao Meritíssimo JIC, o que, como é evidente, não poderia ser cumprido no dia seguinte, sendo feriado e estando o tribunal fechado.
13. A contagem do aludido prazo de 48 horas, de acordo com o citado regime legal de contagem e prática de actos, o prazo interrompe-se e reinicia-se no dia útil seguinte, que atenta a natureza urgente do acto, poder-se-ia entender no Sábado e no tribunal de turno. Assim, reiniciando-se o prazo de 48 horas no sábado dia 7, sendo certo que se iniciou, na Quinta dia 5, temos que desde as 09:00 horas da manhã, até às 24:00 horas desse dia, decorreram 15 horas, a que acrescem as 24 horas de dia 7 Sábado, somando perfaz 39 horas, pelo que faltam 9 horas para que se completem as 48 horas a que alude o citado artigo 188.º, n.º 4, do Código de Processo Penal. Deste modo, as 48 horas terminaram no Domingo dia 8 de Abril, o que significaria que passaria para o dia útil seguinte, ou seja segunda-feira, dia 9, como efectivamente ocorreu, pois, logo que os serviços abriram, foram remetidos electronicamente os vinte e um apensos e inquérito principal para a Meritíssima JIC - o que se encontra plasmado na remessa electrónica do inquérito e dos apensos em referência.
14. Os serviços do Ministério Público, atempadamente e cumprindo o prazo legal constante do n.º 4, do artigo 188.°, do Código de Processo Penal, remeteram electronicamente para os juízos criminais desta comarca, na Segunda dia 9 de Abril, sendo certo que o dia 6 foi feriado, o dia 7 foi Sábado e o dia 8 Domingo e a Meritíssima JIC teve conhecimento dos autos no 17.º dia.
15. Por outro lado, dever-se-á, atender a que o 17.° dia, conjugados os prazo do disposto no n.º 3, do artigo 188.°, do Código de Processo Penal (15.° dia desde o inicio das intercepções) com o do n.º 4, do mesmo normativo (o Ministério Público leva ao conhecimento do juiz no prazo máximo de 48 horas), terminou no dia 8 de Abril de 2012, Domingo, pelo que passou para o dia seguinte, Segunda dia 9 de Abril, data, na qual foi, efectivamente, concluído à Meritíssima JIC.
16. O Ministério Público, no mesmo dia em que o processo deu entrada nos Serviços do Ministério Público e ainda no 14° dia dos 15 dias a partir do início da primeira intercepção (inicio a 23 de Março de 2012 e terminus a 6 de Abril de 2012 -, que sendo feriado, transmite-se para o dia útil seguinte, que atenta a urgência do acto poderia ser dia 7 de Abril de 2012), despachou os autos principais e os vinte e um apensos, acima referidos, no próprio dia que foram apresentados. Todavia, a secção atempadamente cumpriu na Segunda-feira, dia 9 de Abril.
17. Foram, pois, em tempo, remetidos os autos (inquérito com os já referidos Apensos contendo as intercepções telefónicas e os registos de voz e imagens), no prazo de 39 horas, depois de terem sido apresentados ao Ministério Público pelo OPC.
18. Do exposto, se conclui que o prazo de 48 horas previsto no artigo 188º, n.º 4 do Código de Processo Penal não foi ultrapassado e não estava “expirado” aquando da apresentação do expediente à Meritíssima JIC para validação das intercepções telefónicas e das imagens colhidas.
19. A apresentação dos autos em causa à Meritíssima JIC foi feita - tal como se alcança do exposto -, dentro do prazo legalmente estabelecido.
20. Desta feita, não se compreende a não validação pela Meritíssima JIC das intercepções telefónicas e das imagens constantes dos vinte e um apensos e respectivos relatórios, fazendo alusão a que um prazo - o do artigo 188º, n.º 4 do Código de Processo Penal - que foi respeitado.
21. Pelo que, devem os despachos recorridos serem revogados e substituídos por outros que declarem válidas as intercepções telefónicas e determine a transcrição das mesmas e o demais promovido nos Apensos com as letras A, C, E, L, O, Q, S, T, U, W, X, Z, AA, AB, AC, AD, AE, AM, AN e AO e ainda valide as imagens colhidas e constantes do Apenso K, do inquérito n.º 288/11.1GDSTS - por violação do disposto no artigo 188º, n.os 3, 4, 6, 7, 9, al. a) e 12, do Código de Processo Penal e artigo 6.º, n.ºs. l, 2 e 3, da Lei n.º 5/2002, de 11 de Janeiro.

Não foi cumprido o disposto no art. 411º nº 6 do C.P.P. em virtude de se considerar que tal poria em causa o segredo de justiça a que os autos se encontram sujeitos.
O recurso foi admitido, tendo sido ordenada a subida dos autos
O Sr. Procurador-geral Adjunto nesta Relação emitiu parecer no qual, considerando que os autos foram apresentados à Srª JIC dentro do prazo legal na medida em que, não se tratando de processo urgente, o respectivo termo se transferiu para o primeiro dia útil seguinte, precisamente aquele em que tal apresentação foi efectuada, se pronunciou no sentido da procedência do recurso.
Pela mesma razão acima indicada, também não foi determinado o cumprimento do disposto no art. 417º nº 2 do C.P.P.
Colhidos os vistos, foi o processo submetido à conferência.
Cumpre decidir.

2. Fundamentação
Têm interesse para a decisão do recurso as seguintes ocorrências processuais:
- o órgão de polícia criminal competente remeteu aos serviços do MºPº de Santo Tirso, no dia 4/4/12, os autos, relatórios e respectivos suportes técnicos relativos às intercepções em curso, tendo os mesmos dado entrada naqueles serviços no dia imediato (uma 5ª feira, em férias judiciais da Páscoa e véspera do feriado de sexta-feira santa, correspondente ao 14º dia decorrido desde 23/3/12, quando se iniciaram tais intercepções), data em que logo o MºPº lavrou promoções nos anexos apensos A, C, E, L, O, Q, S, T, U, W, X, Z, AA, AB, AC, AD, AE, AM, AN e AO, no sentido, nomeadamente, de ser declarada a validade das correspondentes intercepções telefónicas, e, no anexo K, no de ser validado o respectivo registo de imagens, ordenando que para o efeito os autos fossem conclusos ao JIC;
- na sequência, no dia 9/4/12 (2ª feira), os serviços do MºPº remeteram os autos à secção central do tribunal daquela comarca e logo foram conclusos ao juiz de turno no 2º juízo criminal que, nessa mesma data, proferiu os despachos recorridos, cujo teor é o seguinte:
● (os lavrados nos anexos apensos A, C, E, L, O, Q, S, T, U, W, X, Z, AA, AB, AC, AD, AE, AM, AN e AO)
Na sequência das diligências de investigação realizadas nos autos, veio a Digna Magistrada do Ministério Público requerer a validação das intercepções efectuadas [seja determinada a junção aos autos dos suportes técnicos e relatórios referentes às conversações consideradas relevantes, desde já requerendo a transcrição de tais sessões][1] e que se guardem os suportes técnicos referentes às mesmas em envelope lacrado à ordem do Tribunal, nos termos do nº 12 do art. 188° do Código de Processo Penal.
Apreciando e decidindo:
Nos termos do disposto no art.° 188° nºs 1 a 4 do Código de Processo Civil: “1. O órgão de polícia criminal que efectuar a intercepção e a gravação a que se refere o artigo anterior lavra o correspondente auto e elabora relatório no qual indica as passagens relevantes para a prova, descreve de modo sucinto o respectivo conteúdo e explica o seu alcance para a descoberta da verdade. 2 - O disposto no número anterior não impede que o órgão de polícia criminal que proceder à investigação tome previamente conhecimento do conteúdo da comunicação interceptada a fim de poder praticar os actos cautelares necessários e urgentes para assegurar os meios de prova. 3 - O órgão de polícia criminal referido no n. º 1 leva ao conhecimento do Ministério Público, de 15 em 15 dias a partir do início da primeira intercepção efectuada no processo, os correspondentes suportes técnicos, bem como os respectivos autos e relatórios. 4 - O Ministério Público leva ao conhecimento do juiz os elementos referidos no número anterior no prazo máximo de quarenta e oito horas.”
Tal prazo, in casu, já se encontra expirado, pelo que a promoção da D. M. do M.P. em que sejam validadas as intercepções efectuadas e aludidas no relatório de fls. […][2] não pode ser atendida.
Assim, e por não haver sido respeitado o prazo máximo a que alude o nº 4 do art. 188° do Código de Processo Penal, não valido as intercepções constantes do CD que ora nos foi presente.
Notifique e remeta os autos autos novamente aos Serviços do Ministério Público.
● (o do anexo apenso K)
Na sequência das diligências de investigação realizadas nos autos, veio a Digna Magistrada do Ministério Público requerer a validação do registo de imagens efectuadas e aludidas a fls. 90 a 111/, seja determinada a junção aos autos dos suportes técnicos e relatórios referentes às imagens consideradas relevantes e referidas nos relatórios/autos de captação enviados pelo NIC da GNR e melhor descritas a fls. 90 a 111, desde já requerendo a validação de tais imagens e que se guardem os suportes técnicos referentes às restantes conversações em envelope lacrado à ordem do Tribunal, nos termos do n° 12 do art. 188° do Código de Processo Penal.
Apreciando e decidindo:
A Lei n.° 5/2002, de 11 de Janeiro, veio estabelecer um conjunto de medidas específicas para a investigação da criminalidade organizada e económico-financeira. De acordo com o art.°l.°, n.°l, alínea a), desse diploma, as suas disposições são aplicáveis à investigação do crime de tráfico de estupefacientes.
Os presentes autos destinam-se à investigação da eventual prática de crime de tráfico de estupefacientes por parte dos denunciados.
No art.° 6.° da mesma Lei prevê-se a possibilidade de para investigação de crimes como aquele aqui em causa se recorrer ao registo de voz e imagem, por qualquer meio, sem o consentimento das pessoas visadas por essa diligência. Para tal é também necessário que haja prévia autorização do juiz (art.º6.°, n.°2).
Preceitua o n° 3 do mesmo normativo (art. 6°) que são aplicáveis aos registos obtidos/ com as necessárias adaptações, as formalidades previstas no artigo 188.° do Código de Processo Penal.
Nos termos do disposto no art.° 188° n°s l a 4. do Código de Processo Civil: “1. O órgão de polícia criminal que efectuar a intercepção e a gravação a que se refere o artigo anterior lavra o correspondente auto e elabora relatório no qual indica as passagens relevantes para a prova, descreve de modo sucinto o respectivo conteúdo e explica o seu alcance para a descoberta da verdade, 2 - O disposto no número anterior não impede que o órgão de polícia criminal que proceder à investigação tome previamente conhecimento do conteúdo da comunicação interceptada a fim de poder praticar os actos/ cautelares necessários e urgentes para assegurar os meios de prova. 3 -O órgão de polícia criminal referido no n.° l leva ao conhecimento do Ministério Público, de 15 em 15 dias a partir do início da primeira intercepção efectuada no processo, os correspondentes suportes técnicos, bem como os respectivos autos e relatórios. 4- O Ministério Público leva ao conhecimento do juiz os elementos referidos no número anterior no prazo máximo de quarenta e oito horas.”
Tal prazo, in casu, já se encontra expirado, pelo que a promoção da D. M. do M.P. em que seja validado o registo das imagens efectuadas e aludidas no relatório de fls. 90-111 não pode ser atendida.
Assim, e por não haver sido respeitado o prazo máximo a que alude o n° 4 do art. 188° do Código de Processo Penal, aqui aplicável ex vi art. 6° n° 3 da Lei n°. 3 da lei n° 5/2002, de 11 de Janeiro, não valido o registo das imagens efectuadas e constantes do CD que ora nos foi presente.
Notifique e remeta os autos novamente aos Serviços do Ministério Público.

3. O Direito
Atentas as conclusões do recurso, a única questão submetida a apreciação reside em determinar se, no caso, a apresentação ao juiz dos elementos aludidos no nº 3 do art. 188º do C.P.P. se pode considerar efectuada dentro do prazo estabelecido no nº 4 do mesmo preceito legal.

O recorrente defende que tal prazo foi respeitado, quer porque o mesmo, iniciado na 5ª feira dia 5/4/12, se interrompeu[3] (sic) no dia seguinte por ser feriado e os tribunais terem estado encerrados, reiniciando-se no sábado e transferindo-se para o dia útil seguinte, dia em que os autos foram apresentados ao juiz de instrução sem se haverem esgotado as 48 horas estabelecidas na lei, quer porque o 17º dia, resultante da conjugação dos prazos de 15 dias e de 48 horas estabelecidos naquelas duas normas, coincidiu com um domingo e, por isso, também o prazo se transferiu para a 2ª feira, no início da qual aquela apresentação teve lugar.

No aludido art. 188º vem estabelecido em detalhe o regime de acompanhamento judicial da escuta, instituído pela Lei nº 48/2007 de 29/8, que alterou o C.P.P. De acordo com o mesmo, na parte com interesse para os autos, “O órgão de polícia criminal referido no n.º 1 [aquele que, durante o inquérito, efectuar a intercepção e a gravação de conversações ou comunicações telefónicas autorizadas pelo juiz de instrução dentro do condicionalismo legal estabelecido no art. 187º] leva ao conhecimento do Ministério Público, de 15 em 15 dias a partir do início da primeira intercepção efectuada no processo, os correspondentes suportes técnicos, bem como os respectivos autos e relatórios.” (nº 3), após o que “O Ministério Público leva ao conhecimento do juiz os elementos referidos no número anterior no prazo máximo de quarenta e oito horas.” (nº 4).
Em regra, “os actos processuais praticam-se nos dias úteis, às horas de expediente dos serviços e fora do período de férias judiciais” (nº 1 do art. 103º do C.P.P.). A lei prevê, no entanto, algumas excepções a esta regra, elencadas no nº 2 do mesmo preceito. Embora o caso das escutas em processo em que não haja arguidos detidos ou presos, como sucedia (pelo menos ao tempo) nos autos, não se enquadre rigorosamente em nenhuma delas – a mais próxima seria a da al. f), mas esta contempla um caso de urgência ope judicis[4], que pressupõe declaração prévia e, tanto quanto se colhe dos elementos com que o recurso foi instruído, uma tal declaração não foi proferida -, pensamos que a própria ratio subjacente ao controle apertado estabelecido na lei em matéria que contende com direitos fundamentais determina a natureza urgente daqueles actos, impondo que os prazos estabelecidos para a sua prática corram em férias. De contrário ir-se-iam abrir profundas brechas naquele controle e, dessa forma, frustrar as intenções do legislador, já que a sua suspensão durante aqueles períodos implicaria no geral e na prática uma prolongada ausência de acompanhamento judicial.
No entanto, a natureza da urgência compagina-se perfeitamente com a realização do acto dentro do período normal de funcionamento dos tribunais mesmo durante o período de férias, ou seja, apenas durante os dias úteis, e portanto com exclusão de feriados, sábados e domingos. Conquanto os tribunais não se encontrem encerrados aos sábados, feriados que recaiam à 2ª feira e no 2º dia feriado consecutivo, só funcionam em regime de turnos e para assegurar serviços de carácter urgente que devam ser executados nesses dias (cfr. arts. 73º nº 2 e 122º nº 4 da LOFTJ), como sucede com aqueles que a lei expressamente preveja ou cujo diferimento para o dia útil imediatamente posterior seja susceptível de implicar sérios prejuízos - e já não para levar a cabo toda uma panóplia de actos que, embora relativamente urgentes, de facto ou como tal considerados pela lei, se compadecem com a sua realização dentro dos horários normalizados, como pensamos suceder com o caso que os autos retratam.

Tendo presentes estas considerações, bem como o disposto no nº 2 do art. 144º do C.P.C., aplicável ex vi do nº 1 do art. 104º do C.P.P., facilmente se conclui que, sem necessidade de percorrermos o raciocínio rebuscado, algo sinuoso e até contrário à regra da continuidade do prazo consagrada no nº 1 do referido art. 144º, que vem explanado no recurso, é nosso entendimento que não houve desrespeito do prazo em questão. De facto, com a interposição de um fim-de-semana prolongado (feriado seguido de sábado e domingo) entre o dia em que ele se iniciou e aquele em que foi feita a apresentação ao juiz de instrução, tal prazo ainda não se podia considerar esgotado aquando dessa apresentação.
Assim sendo, e embora não exactamente pelos fundamentos indicados pelo recorrente, não podem manter-se os despachos recorridos.

4. Decisão
Pelo exposto, julgam o recurso procedente e, em consequência, revogam os despachos recorridos e determinam que sejam substituídos por outros que, considerando observado o prazo estabelecido no nº 4 do art. 188º do C.P.P., se pronunciem sobre as promoções do recorrente.
Sem custas.

Porto, 10 de Outubro de 2012
Maria Leonor de Campos Vasconcelos Esteves
José Alberto Vaz Carreto
_________________
[1] Acrescento constante apenas dos despachos proferidos nos anexos A, C, E, S, T, W, AA, AB, AD, AE e AM.
[2] A numeração indicada em cada despacho é a correspondente ao anexo a que respeita.
[3] Considerando a argumentação desenvolvida e tendo em conta que a interrupção implica a inutilização do prazo decorrido e o início de novo prazo, certamente terá querido o recorrente dizer que o prazo se suspendeu.
[4] Assim, Ac. RE 22/1/08, proc. nº 3104/07-1 e P. Pinto de Albuquerque, Comentário do Código de Processo Penal, 2007, pág. 280.