Acórdão do Tribunal da Relação do Porto
Processo:
233/08.1TBARC.P1
Nº Convencional: JTRP000
Relator: VIEIRA E CUNHA
Descritores: SERVIDÃO
DESTINAÇÃO DE PAI DE FAMÍLIA
UTILIDADES DA SERVIDÃO
UTILIDADES FUTURAS
UTILIDADES EVENTUAIS
Nº do Documento: RP20110614233/08.1TBARC.P1
Data do Acordão: 06/14/2011
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Privacidade: 1
Meio Processual: APELAÇÃO.
Decisão: ANULADA A DECISÃO.
Indicações Eventuais: 2ª SECÇÃO
Área Temática: .
Legislação Nacional: ARTº 1544º DO C.C.
Sumário: I - A constituição de servidão por destinação de pai de família sistematiza-se no concurso dos seguintes requisitos:
a) que os dois prédios, ou as duas fracções do mesmo prédio tenham pertencido ao mesmo último dono (identidade de proprietário); b) que exista uma relação estável de serventia de um prédio a outro ou de uma fracção a outra, correspondente a uma servidão aparente, revelada por sinais visíveis e permanentes - destinação, posta pelo proprietário, que não por um detentor de um direito real menor ou por um detentor precário; c) que tenha existido uma separação dos prédios ou fracções em relação ao domínio - separação jurídica - acrescendo a inexistência de qualquer declaração, no respectivo documento, contrária à destinação.
II - A utilização/fruição das utilidades da servidão nada tem a ver com a constituição da mesma, posto que, nos termos do disposto artº 1544° C.Civ., as utilidades da servidão podem apenas ser futuras ou eventuais.
Reclamações:
Decisão Texto Integral: ● Rec.233-08.1TBARC.P1. Relator – Vieira e Cunha. Decisão de 14/1/2011. Adjuntos – Des. Mª das Dores Eiró e Des. João Proença Costa.

Acórdão do Tribunal da Relação do Porto

Os Factos
Recurso de apelação interposto na acção com processo declarativo e forma sumária nº233/08.1TBARC, da comarca de Arouca.
Autores – B… e mulher C….
Réus – D… e mulher E….

Pedido
1 – Que seja reconhecido a favor do prédio dos AA., descrito na petição, o direito à água do furo artesiano existente no prédio do Réu marido, para rega e consumo doméstico.
2 – Serem os RR. condenados a reporem a ligação no prazo de 10 dias, sob pena de, não o fazendo, serem condenados no pagamento da quantia de € 10 por cada dia que vá além do referido prazo.
3 – Serem os RR. condenados a pagarem aos AA. o custo total do consumo de água, desde Junho de 2006 até à data em que for reposta a ligação da água do furo artesiano para o prédio dos AA.

Tese dos Autores
Autor e Réu marido (irmãos) compraram, em comum e partes iguais, em 10/10/91, duas parcelas de terreno, numa das quais procederam à abertura de um furo artesiano, destinado ao abastecimento de água, para consumo doméstico e rega das casas de habitação de A. e R. marido.
Aberto o furo, colocaram nele uma bomba eléctrica submersível, à qual ligaram um cano que direccionaram para o lote 2. Após, em cada uma das parcelas ou lotes, construíram Autor e Réu as respectivas casas de habitação, para eles e respectivas famílias. Do lote 2, onde foi instalado um quadro de comando, partiram canos condutores de água para cada uma das casas.
Por escritura pública de troca, em 29/3/95, Os AA. passaram a ser donos do lote 2 e os RR. donos do lote 1.
Desde 98 que os AA. utilizaram a água do furo artesiano para os aludidos fins.
Em Junho de 2006, os RR. cortaram o cano que conduzia a água do furo artesiano para o quadro de comando no prédio dos AA.

Tese dos Réus
AA. e RR. apenas iniciaram obras após haver sido celebrada escritura de permuta.
O Réu apenas consentiu que o Autor fizesse utilização da água de um poço.
Desde 1998 que a canalização de água deixou de estar à vista (passando a subterrânea) e o quadro eléctrico passou a estar fechado numa arrecadação; à data da separação dos prédios apenas existia uma instalação precária de condução de águas.
Sentença
Na sentença proferida pela Mmª Juiz “a quo”, e por não terem os AA. preenchido o ónus de prova que lhes competia, foi a acção julgada improcedente, por não provada.

Conclusões do Recurso de Apelação dos Réus
1) Para constituição de servidão por destinação do pai de família, prevista no artº 1549º C.Civ., o que releva são os sinais visíveis e permanentes, reveladores da serventia, e não tanto a fruição das utilidades da serventia, ao tempo da separação do domínio.
2) A conduta do Réu, ao cortar o cano condutor de água para o prédio dos AA., de forma inesperada e sem outro propósito que não o de vingança, não se quadra nos ditames da boa fé, constituindo uma afronta às legítimas expectativas criadas pelos AA. na base do princípio da confiança.
3) Impõe-se por isso a condenação do Réu no pagamento da indemnização aos AA.
4) Foi violado o disposto no artº 1549º C.Civ.

Por contra-alegações, os RR. pugnam pela confirmação da sentença recorrida.

Factos Apurados em 1ª Instância
1. Por escritura pública, designada por «Compra e Venda» celebrada a 10.10.1991, no primeiro cartório notarial de Santa Maria da Feira, autor e réu declararam comprar, em comum e em partes iguais, a F… e G…, que declararam vender, os seguintes prédios:
a) Uma parcela de terreno destinada a construção urbana, com a área de 540 m2, sita no …, freguesia de …, inscrita na matriz como parte do artigo 1506 e descrita na Conservatória do Registo Predial sob a ficha n.º 321 da freguesia de …;
b) Uma parcela de terreno destinada a construção urbana, com a área de 590 m2, sita no …, freguesia de …, a destacar do prédio inscrito na matriz sob o artigo 1506 e descrita na Conservatória do Registo Predial sob a ficha n.º 320 da freguesia de … [al. A) dos Factos Assentes].
2. Por escritura pública, designada por «Troca», celebrada a 29.03.1995, no primeiro cartório notarial de Santa Maria da Feira, autores declararam dar ao réu metade indivisa do prédio urbano, com a área de 590 m2, sito no …, freguesia de …, inscrito na matriz sob o artigo 837 e descrito na Conservatória do Registo Predial sob a ficha n.º 321 da freguesia de …; no mesmo acto o réu declarou dar aos autores metade indivisa do prédio urbano com a área de 540 m2, sita no …, freguesia de …, inscrita na matriz sob o artigo 836 e descrita na Conservatória do Registo Predial sob a ficha n.º 321 da freguesia de … [al. B) dos Factos Assentes].
3. Mais declararam autores e réus que depois de operada a troca, os autores ficam donos de todo o prédio inscrito na matriz sob o artigo 836 e o réu fica dono de todo o prédio inscrito na matriz sob o artigo 837 [al. C) dos Factos Assentes].
4. Mostra-se inscrita na conservatória do registo predial de Arouca sob a ficha n.º 320/19910508, em nome do réu, a aquisição do prédio omisso na matriz predial, ao qual correspondia o anterior artigo 837 [al. D) dos Factos Assentes].
5. Mostra-se inscrita na conservatória do registo predial de Arouca sob a ficha n.º 321/19910508, em nome do autor, a aquisição do prédio descrito na matriz predial da freguesia de … sob o artigo 1285 [al. E) dos Factos Assentes].
6. Na parcela de terreno descrita na al. 1. – b) existe um furo artesiano [al. F) dos Factos Assentes].
7. De 1998 a Junho de 2006 os autores utilizaram, para rega do jardim e consumo doméstico, a água proveniente do furo acima referido [al. G) dos Factos Assentes].
8. Os autores e os réus requereram, em conjunto, na Câmara Municipal …, o licenciamento de duas casas de habitação a construir nas parcelas de terreno descritas em 1. – a) e b) [resposta ao quesito 1.º].
9. Em data não concretamente apurada, situada nos anos de 1991 a 1993, foi efectuado o furo referido em 6. [resposta ao quesito 2.º].
10. Tal furo permitiu, até Junho de 2006, o abastecimento de água para consumo doméstico e rega de jardim das casas de habitação referidas em 8. [resposta ao quesito 3.º].
11. No furo referido em 6. foi colocada uma bomba eléctrica submersível [resposta ao quesito 4.º].
12. À referida bomba foi ligado um cano direccionado para a parcela de terreno descrita em 1. -a) [resposta ao quesito 5.º].
13. Após a aprovação do licenciamento autor e réu deram início à construção das referidas casas [resposta ao quesito 7.º].
14. Na parcela de terreno descrita em 1. – a), no local onde desembocava o cano referido em 12. foi instalado um quadro de comando [resposta ao quesito 9.º].
15. Na parede da casa construída na parcela descrita em 1. -b) foi deixada uma abertura para passagem dos canos condutores das águas para a parcela descrita em 1. -a) [resposta ao quesito 11.º].
16. Após a celebração da escritura referida em 2. e 3. autor e réu requereram na Câmara Municipal a alteração da titularidade dos processos de obras [resposta ao quesito 14.º].
17. Ficando o processo relativo à construção implantada no prédio descrito em 1. – a) ficou em nome do autor e o processo relativo à construção implantada no prédio descrito em 1. – b) ficou em nome do réu [resposta ao quesito 15.º].
18. Por volta do ano de 1997 os autores foram habitar a casa construída na parcela descrita em 1. -a) [resposta ao quesito 16.º].
19. Por volta do ano de 1997 os réus foram habitar a casa construída na parcela descrita em 1. -b) [resposta ao quesito 17.º].
20. A água referida em 7. era conduzida para o prédio dos autores através do cano referido em 12. [resposta ao quesito 18.º].
21. Os autores utilizaram tal água de forma contínua até Junho de 2006 [resposta ao quesito 19.º].
22. Os autores utilizavam essa água com o conhecimento e sem oposição dos réus [respostas aos quesitos 20.º e 21.º].
23. Em Junho de 2006, na sequência de desentendimentos ocorridos entre o autor e o réu, este cortou o cano que conduzia a água do furo artesiano para o quadro de comando referido em 14. [resposta ao quesito 23.º].
24. O réu tapou a abertura referida em 15. com uma parede de tijolos [resposta ao quesito 24.º].
25. Tendo os autores ficado sem água do furo que utilizavam para os fins referidos em 10. [resposta ao quesito 25.º].
26. Na sequência doo referido em 25. os autores passaram a consumir água da rede pública para uso doméstico, cujos custos passaram, desde então, a suportar [resposta aos quesitos 26.º e 27.º].
27. Para a reposição da ligação da água no estado em que se encontrava é suficiente o prazo de 10 dias [resposta ao quesito 28.º].

Fundamentos
As questões colocadas pelo presente recurso são as seguintes:
- A matéria factual assente é suficiente para que se conclua que, a favor do prédio dos AA. está constituída uma servidão por destinação do pai de família, consubstanciada no direito à água extraída do furo artesiano existente na actual parcela dos RR., para rega e consumo domésticos?
- Deverão ser os RR. condenados em indemnização pelos prejuízos causados aos AA., decorrentes de uma conduta não conformada com os princípios da boa fé?
Apreciemo-las seguidamente.
I
As servidões prediais, tal como definidas no artº 1543º C.Civ., pressupõem um encargo imposto num prédio em proveito exclusivo de outro prédio pertencente a um dono diferente.
Falamos assim de uma relação entre prédios, que não de uma relação entre pessoas, ou meramente obrigacional.
Tal relação entre prédios pressupõe, todavia, quando nos ocupamos das servidões voluntárias, por contraposição às servidões legais, uma actividade humana constituinte de tal relação.
Daí que as servidões prediais possam ser constituídas por contrato, testamento, usucapião ou destinação do pai de família – artº 1547º nº1 C.Civ.
Ora, nos termos do disposto no artº 1549º C.Civ., constitui-se servidão por destinação do pai de família quando “em dois prédios do mesmo dono, ou em duas fracções de um só prédio, houver sinal ou sinais, visíveis e permanentes, postos em um ou em ambos, que revelem serventia de um para com outro”; e “serão esses sinais havidos como prova da servidão quando, em relação ao domínio, os dois prédios ou as duas fracções do mesmo prédio vierem a separar-se, salvo se ao tempo da separação outra coisa se houver declarado no respectivo documento”.
Pode assim sistematizar-se a constituição da servidão no concurso dos seguintes requisitos: a) que os dois prédios, ou as duas fracções do mesmo prédio tenham pertencido ao mesmo último dono (identidade de proprietário); b) que exista uma relação estável de serventia de um prédio a outro ou de uma fracção a outra, correspondente a uma servidão aparente, revelada por sinais visíveis e permanentes – destinação, posta pelo proprietário, que não por um detentor de um direito real menor ou por um detentor precário; c) que tenha existido uma separação dos prédios ou fracções em relação ao domínio – separação jurídica – acrescendo a inexistência de qualquer declaração, no respectivo documento, contrária à destinação (Tavarela Lobo, Manual do Direito de Águas, II/219; também nos fundamentamos em François Terré e Philippe Simler, Les Biens, Dalloz, 6ª ed., § 901, para o elenco supra).
Diz-se que a servidão por destinação do pai de família se constitui, desta forma, automaticamente, ope legis, logo e no momento em que, preenchidos os demais requisitos, ocorre o acto de separação de domínio dos prédios, posta a aparência de uma servidão, e nada sendo declarado em contrário – cf. S.T.J. 20/1/05 in www.dgsi.pt, pº nº 04B3748, relator: Noronha Nascimento e Ac.R.P. 2/12/08 Col.V/185,
E é precisamente sobre o requisito da destinação que os AA./Recorrentes pretendem que se centre a atenção do Tribunal.
II
Não há dúvida que, em primeiro lugar, os prédios separados, pertenceram, em tempos, em compropriedade, aos mesmos e idênticos donos, que são aqui AA. e RR.
E também não há dúvida que se verificou uma separação das duas parcelas de terreno, em relação ao respectivo domínio – uma delas passou a pertencer aos AA. e a outra passou a pertencer aos RR.
A menor certeza poderá encontrar-se, à face da matéria de facto demonstrada, na existência da relação de servidão estável, de um prédio para outro, no momento da separação.
O quesito 4º foi respondido restritivamente – perguntava-se se “logo que procederam à abertura do furo referido em F)”, isto é, entre 91 e 93, conforme a resposta ao quesito 2º, “colocaram nele uma bomba eléctrica submersível”. A resposta foi restritiva – “provado apenas que no furo referido em F) foi colocada uma bomba eléctrica submersível”.
A questão assume relevo na economia do processo, já que os demais quesitos relativos aos sinais de serventia de aqueduto, de uma das parcelas para a outra (a dos AA.), no momento da separação do domínio – v.g., pontos 11, 12, 14 e 15, entre outros, dos Factos Provados constantes da douta sentença recorrida – dependem do quesito 4º, para se saber qual o momento em que os referidos sinais foram colocados nos prédios em causa.
A questão não foi assumidamente tratada na douta sentença recorrida, a qual, a finalizar o respectivo raciocínio, considerou fundamental o que se extrai da al.G) da Matéria de Facto Assente, isto é, que à data da separação dos lotes não existia utilização/fruição, pelos AA., para rega do jardim e para consumo doméstico, da água do furo existente no prédio dos RR.
Todavia, importa esclarecê-lo, não é de utilização/fruição das utilidades da servidão que cuida o artº 1549º citado, mas apenas da existência de sinais visíveis e permanentes – destinação – postos pelo proprietário.
Na verdade, a utilidade de uma servidão pode apenas ser futura ou eventual, sem prejuízo de a servidão se mostrar constituída – di-lo expressamente o artº 1544º C.Civ.
Se o uso das utilidades da servidão assim disposta eram, ou não, efectuados no momento da separação, irreleva para a constituição da servidão – embora possa relevar, p.e., em matéria de extinção da servidão e cômputo do prazo do “não uso” – artº 1569º al.b) C.Civ. O direito, esse, encontra-se adquirido, pese embora poder vir a ser extinto pelo “não uso” (ut Meneses Leitão, Dtºs Reais, 2011, pg. 392).
Quanto à situação de facto, “deve evidenciar-se por sinais visíveis e permanentes, de tal modo que revelariam a existência de uma servidão se os prédios ou fracções fossem de proprietários diferentes” (Tavarela Lobo, Manual cit., II/224).
Ora, a interpretação das respostas aos quesitos, e no caso curamos da resposta ao quesito 4º, deve ser efectuada em termos idênticos ao da interpretação da declaração negocial, isto é, basicamente deve valer com o sentido que um declaratário normal possa dela deduzir – artº 236º nº1 C.Civ. (em sentido semelhante, mutatis mutandis, S.T.J. 28/5/91 Bol.407/446, S.T.J. 6/12/84 Bol.342/375 e J. Rodrigues Bastos, Notas ao Processo Civil, III/363-al.b).
A resposta aos referidos quesitos baseou-se, sobre o mais, na confissão do Réu, em depoimento de parte, confissão reduzida a escrito em acta de julgamento. Nesse sentido, a confissão do Réu, quanto à matéria do quesito 4º é que “aquando da abertura do furo referido em F), admitiu ter sido colocada uma bomba submersível” e, nessa sequência, diz a mesma confissão que “à bomba referida em 4º foi ligado um cano direccionado para a parcela de terreno descrita em A)-a)” (q. 5º).
Todavia, encontra-se-nos vedado recorrer à fundamentação das respostas aos quesitos para interpretar os mesmos.
No caso dos autos, mostra-se impossível situar a aparência e visibilidade dos sinais de servidão de águas e aqueduto, a favor do actual prédio dos AA., no momento da separação dos domínios, já que a resposta ao quesito 4º foi restritiva quanto ao momento em que tais sinais (a bomba submersível e o cano, a ela acoplado, que era dirigido e terminava no terreno dos RR.) foram colocados in situ pelos anteriores comproprietários de ambos os prédios.
Mas, como visto, a resposta é contraditada pelo meio de prova em que se diz apoiar (as restantes referências a meios de prova são genéricas, e reportam-se apenas a prova testemunhal produzida) e a Mmª Juiz “a quo” não dá importância à resposta na sua fundamentação de direito, preferindo argumentar sobre o “uso” que era feito, ou não, da água em causa, à data da separação dos prédios.
Este conjunto de elementos interpretativos ou de apoio torna a resposta ao quesito 4º obscura, isto é, equivoca e ininteligível (cf. Antunes Varela, J. M. Bezerra e S. e Nora, Manual, 1ª ed., pg. 638).
Impõe-se-nos assim, nos termos do disposto no artº 712º nº4 C.P.Civ., anular a resposta dada ao citado quesito nº 4º, a fim de ser removida a citada obscuridade – saber se efectivamente um tubo acoplado à bomba submersível se dirigia para o prédio dos RR., à data da separação dos domínios, ou não, e quais as concretas provas (a confissão do Réu marido ou outras) que sustentam essa resposta.

A fundamentação poderá resumir-se por esta forma:
I – A constituição da servidão por destinação do pai de família sistematiza-se no concurso dos seguintes requisitos: a) que os dois prédios, ou as duas fracções do mesmo prédio tenham pertencido ao mesmo último dono (identidade de proprietário); b) que exista uma relação estável de serventia de um prédio a outro ou de uma fracção a outra, correspondente a uma servidão aparente, revelada por sinais visíveis e permanentes – destinação, posta pelo proprietário, que não por um detentor de um direito real menor ou por um detentor precário; c) que tenha existido uma separação dos prédios ou fracções em relação ao domínio – separação jurídica – acrescendo a inexistência de qualquer declaração, no respectivo documento, contrária à destinação.
II – A utilização/fruição das utilidades da servidão nada tem a ver com a constituição da mesma, posto que, nos termos do disposto artº 1544º C.Civ., as utilidades da servidão podem apenas ser futuras ou eventuais.

Com os poderes conferidos pelo disposto no artº 202º nº1 da Constituição da República Portuguesa, decide-se neste Tribunal da Relação:
Julgar parcialmente procedente, por provado, o recurso interposto, e, em consequência, nos termos do disposto no artº 712º nº4 C.P.Civ., anular a resposta ao quesito 4º e, em consequência, a sentença recorrida.
O novo julgamento em 1ª instância deverá renovar apenas a resposta ao citado quesito 4º, sem prejuízo de poder igualmente proceder, se for o caso, da forma prevista na parte final do citado artº 712º nº4.
Custas pela parte vencida a final.

Porto, 14/VI/2011
José Manuel Cabrita Vieira e Cunha
Maria das Dores Eiró de Araújo
João Carlos Proença de Oliveira Costa