Acórdão do Tribunal da Relação do Porto
Processo:
401/11.9TBVCD.P1
Nº Convencional: JTRP000
Relator: MARIA AMÁLIA SANTOS
Descritores: CONTRATO DE ARRENDAMENTO
RESOLUÇÃO
FALTA DE PAGAMENTO
RENDAS
ILEGITIMIDADE DO EXERCÍCIO DO DIREITO DE RESOLUÇÃO
OBRAS NO LOCADO
LIQUIDAÇÃO POSTERIOR DOS PREJUÍZOS
Nº do Documento: RP20140114401/11.9TBVCD.P1
Data do Acordão: 01/14/2014
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Privacidade: 1
Meio Processual: APELAÇÃO
Decisão: REVOGADA EM PARTE
Indicações Eventuais: 2ª SECÇÃO
Área Temática: .
Sumário: I – É ilegítimo o exercício do direito, por parte do senhorio, de resolução do contrato de arrendamento com base na falta de pagamento das rendas, após ter sido o mesmo notificado pela arrendatária de que iria deixar de pagar as rendas, invocando, para o efeito, o instituto da excepção do incumprimento do contrato, com base no incumprimento do mesmo, por parte do senhorio
II – Sendo da responsabilidade do senhorio fazer as obras no locado, a fim de o inquilino poder usufruiu do gozo do imóvel para os fins contratados, deve aquele proceder também a todas as obras que contendam com a reparação do mesmo, nomeadamente retirando do local todos os equipamentos que ali foram colocados pela arrendatária e voltando a colocá-los no seu local, findas as obras.
III- A falta de elementos a que alude o artº 661º nº 2 do CPC deverá resultar, não do fracasso da prova na acção declarativa sobre o objecto ou quantidade, mas sim como consequência de ainda não se conhecerem com exactidão as unidades componentes da universalidade ou de ainda não se terem revelado ou estarem em evolução algumas ou todas as consequências do facto ilícito no momento da propositura da acção declarativa.
IV – Pelo que, é violadora do princípio do caso julgado a decisão que remete para liquidação, quando o A., não obstante formular o pedido, não logrou provar as consequências do facto danoso.
Reclamações:
Decisão Texto Integral: Processo nº 401/11.9TBVCD.P1 – Apelação 1ª
Tribunal Judicial de Vila do Conde
Relatora: Maria Amália Santos
1º Adjunto: Desembargador José Igreja Matos
2º Adjunto: Desembargador João Diogo Rodrigues
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Acordam no Tribunal da Relação do Porto:
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“B…, Lda.”, com sede na … ., . e ., Viana do Castelo intentou a presente acção declarativa de condenação, com forma de processo ordinário, contra “C…, S.A.”, com sede na Rua …, nº …, …, Vila do Conde, pedindo a sua condenação:
a) A executar as obras de reparação e/ou substituição da cobertura do imóvel e respectiva estrutura de suporte do imóvel locado descrito sob o artigo 2.º da presente petição, de modo a assegurar o respectivo gozo pela autora, e a permitir a respectiva utilização para os fins previstos no contrato;
b) A repor o estabelecimento instalado no locado no estado em que se encontra nesta data, suportando a suas expensas todos os trabalhos necessários à reposição das obras e benfeitorias executadas pela autora e, bem assim, à remoção, armazenagem e subsequente remontagem de máquinas e equipamentos nele instalados, mormente os elencados sob artigos 53.º a 56.º do presente articulado precedentes, que sejam afectados pela execução da obra que vai requerida na alínea a);
c) A executar as obras e trabalhos peticionados sob as alíneas a) e b) precedentes, em prazo útil não superior a trinta dias, por si directamente, suportando integralmente os respectivos custos, sob pena de não o fazendo poderem os mesmos ser executados por terceiro a expensas da ré;
d) A reconhecer a legitimidade da autora de invocação de excepção de não cumprimento do contrato e, consequente recusa de pagamento da renda devida pelo arrendamento enquanto se mantenha impedida de utilizar o locado;
e) A indemnizar a autora de todos os prejuízos sofridos em razão do incumprimento contratual, que compreendem:
1. A quantia de € 160,20 (cento e sessenta euros e vinte cêntimos), correspondente ao custo de aluguer de escoras do vigamento, conforme alegado sob artigo 40.º, a que acrescerá o valor de € 17,80, por cada mês, contado a partir de Dezembro de 2010 em que as mesmas se mantiverem aplicadas no local, a liquidar em tempo;
2. A quantia de € 102.800,00 (cento e dois mil e oitocentos euros), correspondente às receitas da exploração do estabelecimento instalado no locado que a autora deixou de auferir no período de Maio a Dezembro de 2010 e alegados sob os artigos 44.º a 49.º precedentes, acrescidos dos demais que seriam percebidos após essa data e até à reposição do locado em normais condições de exploração e funcionamento do estabelecimento, a liquidar em tempo;
3. A quantia de € 24.400,00 (vinte e quatro mil e quatrocentos euros), correspondente às despesas de manutenção do estabelecimento - custos fixos e de estrutura que lhe estão associados - alegados sob os artigos 50.º a 51.º precedentes, acrescidos dos demais em que incorrerá após essa data e até à reposição do locado em normais condições de exploração e funcionamento do estabelecimento, a liquidar em tempo.
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Alegou para tanto, em súmula, que em 30 de Abril de 2006, Autora e Ré subscreveram o documento particular denominado “Contrato de Arrendamento Comercial”, no qual a ré declarou dar de arrendamento à A. o seguinte imóvel de sua propriedade: um armazém com a área coberta de 800 m2, sito na …, nº …, em Vila do Conde, descrito na Conservatória do Registo Predial de Vila do Conde sob o n.º 34573, Livro B e inscrito na respectiva matriz predial urbana sob o artigo 2627.
As partes fixaram o valor da renda mensal em € 2.646,94 (dois mil seiscentos e quarenta e seis euros e noventa e quatro cêntimos), a qual foi reduzida para o montante mensal de € 1.470,58, a partir da que se venceria em Setembro de 2010.
O prazo estipulado pelas partes para o contrato foi de doze anos e cinco meses, tendo-se o contrato iniciado em 1 de Maio de 2006, destinando-se o locado à actividade de bowling, lazer e entretenimento, tendo a autora aí instalado um estabelecimento misto de animação e diversão familiar, o qual é integrado por diverso tipo de máquinas de jogos e outras diversões, girando sob a firma/marca “D…”.
A Autora instalou nele diversas obras e benfeitorias, nomeadamente, quadros eléctricos, cablagem e instalação eléctrica, sistema de iluminação adequada às actividades a desenvolver no locado, revestimentos de paredes e tectos falsos, aplicação de sistemas de ventilação e de ar condicionado em condutas adequadas para o efeito, pintura e decoração do locado por aplicação de telas de revestimento e outras pinturas.
Acontece que a ré, durante a vigência do contrato, nunca procedeu à realização de quaisquer obras de reparação e manutenção da estrutura do edifício, nomeadamente da sua cobertura, sendo este um armazém com mais de cinquenta anos, edificado em estrutura de paredes de alvenaria e tijolo, encimadas por uma cobertura em telha “Lusalite”, aplicada sobre uma estrutura de vigamento em madeira.
Em 14 de Dezembro de 2006, a autora, por escrito, denunciou à ré a existência de infiltrações de águas pluviais a partir da cobertura do locado, causadas pelo seu estado de deficiente conservação, mas a Ré, apesar de ter recebido a dita comunicação, não procedeu a qualquer reparação no locado.
Na primeira semana de Maio de 2010, após ter detectado defeitos na estrutura de suporte da cobertura do imóvel, resultantes da deterioração das respectivas vigas e vigamentos de madeira, a autora de imediato deu deles conhecimento à ré, os quais até então não se mostravam visíveis, e, como tal desconhecidos da A., sendo os mesmos causados por falta de pontual e devida manutenção das vigas e vigamento de madeira.
Devido ao risco de ruína da estrutura de cobertura do imóvel, a autora suspendeu desde essa data as suas actividades no local, mantendo-se impossibilitada de o utilizar, tendo colocado suportes de escoramento da estrutura de vigamento em diversos pontos do locado, para minimizar o risco de ruína.
A A. veio também a consignar a denúncia dos defeitos à ré, em comunicação a ela remetida por carta datada de 17 de Maio de 2010.
A ré não procedeu a quaisquer reparações no locado, apesar de ter tomado conhecimento directo dos defeitos apresentados pela estrutura da sua cobertura e ter recebido a comunicação referida.
Em 15 de Junho de 2010, a autora comunicou à ré que considerava vencida e em mora a obrigação de realização das reparações urgentes destinadas a eliminar os vícios existentes no locado e já antes denunciados, não tendo contudo esta procedido a quaisquer reparações do imóvel.
A ré recebeu a comunicação referida e não procedeu a qualquer reparação, alegando não aceitar custear a reconstrução das benfeitorias aplicadas, a desmontagem e armazenamento de máquinas e equipamentos existentes no local e bem assim rejeitando assumir a responsabilidade pelos prejuízos decorrentes da impossibilidade de utilização do mesmo, decorrente do risco iminente de ruína que apresenta.
A A. enviou nova comunicação à ré em 30 de Agosto de 2010.
Enumera depois as despesas com a aplicação das escoras, alegando ter despendido com o aluguer das mesmas, até Dezembro de 2010, o montante de € 160,20 ao qual acrescerá o valor de € 17,80 por cada mês em que se mantiverem aplicadas as escoras no local.
Diz ainda que após o final de Agosto de 2010 não efectuou o pagamento da renda, com fundamento na impossibilidade de utilização total do locado.
E afirma que em consequência da impossibilidade de utilização do estabelecimento no período de Maio a Dezembro de 2010, deixou de auferir as receitas da sua exploração em montante não inferior a € 102.800, suportando, no entanto, os custos fixos que lhe estão associados, nomeadamente salários e encargos sociais com os funcionários, fornecimentos de electricidade e água e despesas de manutenção que totalizam o quantitativo de € 24.400,00, valores esses que serão agravados enquanto se mantiver a impossibilidade, por parte da A., da normal utilização do locado para os fins previstos no contrato.
Defende que se mostra necessário proceder à remoção da estrutura de vigamento existente e cobertura do imóvel, colocando em sua substituição uma outra nova, encargo que constitui obrigação da senhoria ré.
Por sua vez o trabalho de remoção da estrutura de vigamento existente implica a necessária destruição das obras nela aplicadas pela A., nomeadamente as que respeitam aos tectos falsos, pinturas e revestimentos de paredes e chão, sistema eléctrico e de iluminação e as condutas de ventilação e ar condicionado.
E após a remoção da estrutura de cobertura do imóvel será necessário proceder à recolocação dos tectos falsos e revestimentos em todo o estabelecimento, reconstrução da instalação eléctrica que se encontra aplicada na estrutura de vigamento, recolocação da estrutura de ventilação e ar condicionado, pintura e aplicação de revestimentos de todo o estabelecimento.
Para além disso, a realização das obras de reconstrução da estrutura de cobertura obrigarão á desmontagem, transporte e armazenagem das oito pistas de bowling e sistemas de controlo eléctricos.
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A ré, regularmente citada, contestou invocando desde logo, como questão prévia, que a A. foi por si notificada, em 17.11.2010, nos termos e para os efeitos do artº 15º do NRAU, comunicando-lhe a ré a resolução do contrato caso se mantivesse a situação de incumprimento do mesmo, por falta de pagamento das rendas desde Agosto de 2010. Em razão da manutenção da falta de pagamento de rendas e, portanto, da resolução do contrato pela ré, foi, com data de 17.12.2010 aduzida acção de despejo da A. do local arrendado, a correr termos no 3º Juízo Cível deste tribunal.
Ou seja, nos termos legais, foi o contrato de arrendamento resolvido, pelo que inexiste qualquer arrendamento, inexistindo objecto do pedido.
Se assim não fosse, considerar-se-ia inepta a petição inicial por inexistência de causa de pedir.
Mesmo que assim se não entendesse, a acção de despejo seria causa prejudicial que implica a suspensão dos presentes autos, para evitar decisões contraditórias ou vazias de qualquer efeito útil.
Por impugnação, afirma desconhecer se os danos impossibilitam ou não a manutenção do estabelecimento em pleno funcionamento, tanto mais que muito antes aquele se mantinha muitas vezes encerrado.
Acrescenta que a Autora arrendou um local vazio nas exactas condições em que o mesmo se encontrava, sem qualquer reserva.
Nos termos da cláusula 6ª do contrato qualquer obra dependia de autorização prévia e escrita da ré, e nos termos da cláusula 7ª a A. comprometia-se a fazer um uso prudente do arrendado, assim como a contratar e manter actualizada uma apólice de seguros multi-riscos. Nenhuma destas cláusulas foi cumprida.
O local arrendado era uma das três secções de uma unidade industrial que existiu há muitos anos na zona, sendo certo que nenhuma outra estrutura teve qualquer problema similar ao do agora arrendado.
O estado da estrutura era do inteiro conhecimento da Autora na data da outorga do contrato e perceptível à vista desarmada pois a cobertura e os vigamentos encontravam-se despidos e sem qualquer cobertura ou tecto falso.
Foi a instalação, sem qualquer estudo prévio da Autora, e que era da sua única responsabilidade, quem conduziu à instabilidade da estrutura, que colocou excessiva carga na mesma.
Ou seja, a mesma passou, por via das instalações da A., a suportar, por si, toda a cobertura do tecto com placas de gesso com (cada) uma dimensão aproximada de 60 x 60 cm e um peso aproximado de 2,5 Kg (cada) em toda a extensão do arrendado, que ainda suportavam dezenas de aparelhos de televisão com dimensões e peso apreciáveis.
Sobre a estrutura pendia ainda o peso das calhas, lã de vidro para insonorização, ar condicionado, fios eléctricos e sistema de iluminação.
Foi a A. que temerariamente e sem qualquer estudo prévio ou necessário reforço da estrutura de suporte criou as condições para o problema de deficiência das estruturas.
Inexiste, assim, qualquer responsabilidade da ré pelo sucedido.
De todo o modo, a ré, num espírito de boa fé e colaboração, sem assumir qualquer responsabilidade, predispôs-se, por sua iniciativa, a reformular a cobertura do arrendado, com a condição da retirada pela A. de todo o equipamento a seu cargo, o que a A. não fez.
Inexiste assim qualquer responsabilidade da ré pelo encerramento do estabelecimento da A. ou alegados prejuízos.
Pede a procedência das excepções aduzidas ou a suspensão da instância, nos termos do artº 279º do CPC e caso assim se não entenda, a improcedência da acção.
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A Autora apresentou réplica, na qual sustenta que inexistindo o fundamento que conferia à Ré o direito a por termo ao contrato por sua iniciativa (falta de pagamento de rendas), deve como tal ter-se a comunicação resolutiva do arrendamento como inválida e ineficaz para a produção dos visados efeitos, devendo como tal considerar-se o contrato como subsistente.
Pois diz-se impossibilitada de utilizar o locado na exploração do estabelecimento que ali possui desde a data em que foi identificado o risco de ruína da cobertura do imóvel, mostrando-se como tal legitimada a decisão da autora de suspender o pagamento da renda, com fundamento na excepção de não cumprimento do contrato, o que expressamente invocou perante a Ré para fundamento do seu não pagamento.
O incumprimento do locador ora Réu, que determina o impedimento total de gozo do imóvel por parte da Autora é anterior à recusa de pagamento da renda por parte da mesma, não se encontrando esta em mora relativamente à senhoria quanto a essa ou a qualquer outra obrigação.
Pelo que ampliou a causa de pedir, por via do aproveitamento dos factos aduzidos pela Ré, ao abrigo do disposto no artigo 273.º n.º 1 do Código de Processo Civil.
E ampliou também o pedido formulado na alínea d) do petitório do articulado inicial, pela forma seguinte:
“d.) A reconhecer a legitimidade da autora de invocação de excepção de não cumprimento do contrato e consequente recusa de pagamento da renda, declarando-se inválida a declaração resolutiva do contrato de arrendamento formulado pela ré com fundamento em tal facto e o mesmo subsistente com todas as consequências legais.”
Pugna pela improcedência das excepções invocadas pela Ré e ainda pela rejeição da pretendida suspensão da instância.
Defende ademais que, como a ré bem sabe, à data da celebração do contrato o imóvel encontrava-se ocupado por outro arrendatário que exercia actividade idêntica à explorada pela A. tendo sido esse arrendatário quem efectuou as obras no local arrendado, com o conhecimento, a autorização e a intervenção directa da ré, mormente no seu licenciamento camarário.
Ou seja, a ré conhecia o teor das obras efectuadas e a sua adequação para a estrutura no locado, nunca se tendo oposto às mesmas.
A ruína da estrutura de cobertura do locado não resulta de incompatibilidade ou insuficiência estrutural mas da corrosão dos vigamentos de madeira, decorrente da sua idade e de falta de adequada conservação que cabia à Ré efectuar.
Conclui pela improcedência das excepções invocadas, assim como pela admissão da ampliação da causa de pedir e da alteração do pedido.
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Na tréplica a Ré defende que a alteração do pedido e da causa de pedir da réplica não devem ser admitidas por o meio adequado se subsumir ao âmbito da execução em sede de eventual oposição.
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Foi proferido despacho saneador, no qual se admitiu a ampliação da causa de pedir e do pedido formulada na réplica, se julgou improcedente a excepção de inexistência de objecto do pedido em virtude de já se encontrar resolvido o contrato de arrendamento em que a Autora se suporta para solicitar a realização de obras no arrendado, bem como a ineptidão da petição inicial por inexistência de causa de pedir.
Baseou-se o tribunal no facto de que “com a ampliação da causa de pedir e do pedido formulado pela A. na réplica, já admitida pelo tribunal, a validade da declaração resolutiva do contrato de arrendamento passou a integrar o objecto da presente acção e, por essa via, nenhum obstáculo se coloca ao prosseguimento dos autos…”
Foi também indeferida a requerida suspensão da instância.
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Foi proferida decisão a julgar a acção parcialmente procedente por provada e, em consequência a:
1. Condenar a Ré a executar as obras de reparação e/ou substituição da cobertura do imóvel e respectiva estrutura de suporte do imóvel locado supra descrito, de modo a assegurar o respectivo gozo pela Autora “B…, Lda.”, e a permitir a respectiva utilização para os fins previstos no contrato;
2. Condenar a Ré a repor o estabelecimento instalado no locado ao estado em que se encontra nesta data, suportando a expensas suas, todos os trabalhos necessários à reposição das obras e benfeitorias executadas pela autora, e bem assim à remoção, armazenagem e subsequente remontagem de máquinas e equipamentos nele instalados, que sejam afectados pela execução da obra aludida no número precedente;
3. Condenar a Ré a executar as obras e trabalhos peticionados aludidos nos números precedentes, em prazo útil não superior a trinta dias, por si directamente, suportando integralmente os respectivos custos, sob pena de não o fazendo poderem os mesmos ser executados por terceiro a expensas da Ré;
4. Reconhecer a legitimidade da Autora de invocação de excepção de não cumprimento do contrato e, consequente recusa de pagamento da renda, declarando ainda inválida a declaração resolutiva do contrato de arrendamento formulado pela ré com fundamento em tal facto e o mesmo subsistente com todas as consequências legais;
5. Condenar a Ré a indemnizar a Autora de todos os prejuízos sofridos em razão do incumprimento contratual, concretamente a quantia de € 160,20 (cento e sessenta euros e vinte cêntimos), correspondente ao custo de aluguer de escoras do vigamento, a que acrescerá o valor de € 17,80 por cada mês, contado a partir de Dezembro de 2010 em que as mesmas se mantiverem aplicadas no local, a liquidar oportunamente;
6. Condenar a Ré a indemnizar a Autora de todos os prejuízos por esta sofridos correspondentes às receitas da exploração do estabelecimento instalado no locado que deixou de auferir no período de Maio a Dezembro de 2010, acrescidos dos demais que seriam percebidos após essa data e até à reposição do locado em normais condições de exploração e funcionamento do estabelecimento, cuja liquidação se relega para o competente incidente, ao abrigo do disposto no artº 661º, nº 2, do Código de Processo Civil;
7. Absolver a Ré do demais pedido pela Autora.
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Não se conformando com a decisão proferida, veio a Ré dela interpor recurso de Apelação, apresentando Alegações e formulando as seguintes Conclusões:
I - Inexiste objecto do pedido não podendo a Autora, bem sabendo da resolução contratual, vir, nesta sede, solicitar obras num arrendado que cessou por via do que dispõe o artigo 1084.º, nº. 1 do Código Civil.
II - Estando resolvido o contrato de arrendamento, a presente acção encontra-se desprovida de qualquer sustentação de facto ou de direito.
III - A alteração do pedido e causa de pedir, para além de não serem o meio adequado – que deveria ser no âmbito da execução em sede de eventual Oposição - altera substantivamente a relação jurídica controvertida, o que está proibido pelo n.º 6 do artigo 263.º do CPC.
IV - Posto que devem os doutos despachos em que se admite a alteração da causa de pedir e pedido e que indefere a invocada inexistência do objecto do pedido ab initio em causa, ser revogados.
V - PONTOS DE FACTO INCORRECTAMENTE JULGADOS: A aqui Apelante julga incorrectamente julgados os pontos de facto sob o n.º 32 dos factos provados e os Quesitos 26, 29 e 31 da Base Instrutória sendo o primeiro tido por não provado e os demais como provados.
VI - DOS MEIOS PROBATÓRIOS QUE IMPUNHAM DECISÃO DIVERSA: O Tribunal a quo deveria ter dado como (não) provado o facto acima descrito sob o ponto 32, quer por via do que a perícia refere, quer pelos Esclarecimentos dos Peritos (depoimento gravado em suporte digital 10:23:13 – 10:35:54 /registo 00:00:00 a 00:12:39) e dado como provados os Quesitos 26, 29 e 31 pelos mesmos meios probatórios e, quanto aos Quesitos 26 e 31, ainda pelo depoimento da testemunha E… (depoimento gravado em suporte digital 12:11:03 – 12:19:47 /registo 00:00:01 a 00:08:43).
VII - Ponto 32 dos factos provados: Em sentido contrário (não prova) retira-se o firmado em Laudo pelos Peritos e seus Esclarecimentos Orais (depoimento gravado em suporte digital 10:23:13 – 10:35:54 /registo 00:00:00 a 00:12:39).
VIII - Não há qualquer evidência técnica – e é do que estamos a falar e razão pela qual foram chamados Peritos a Juízo – de que as deficiências apuradas sejam em razão da falta de manutenção.
IX - Aliás, como se depreende no afirmado por último – Peritos – a haver deterioração a mesma deve-se ao esforço que foi provocado pelo material (material identificado nos pontos 45 e 46 dos factos provados) que esforçou a estrutura e alterou as condicionantes.
X - Em última instância, pelo menos, não era causa exclusiva, tendo sido potenciada pela adaptação e materiais que passaram a pender na estrutura.
XI - Do Quesito 26 da Base Instrutória: Do Laudo e do depoimento da Testemunha E… (depoimento gravado em suporte digital 12:11:03 – 12:19:47 /registo 00:00:01 a 00:08:43) pode inferir-se a sua prova.
XII - De todo o modo, mais não fosse, deveria ter-se provado – porque relevante – que sobre a estrutura pendiam, pelo menos, dezenas de suportes de aparelhos de televisão.
XIII - Do Quesito 29 da Base Instrutória: O presente Quesito tido por não provado encontra-se intimamente ligado com os Quesitos 25 a 28 da Base Instrutória os quais foram tidos como provados com excepção do 26.
XIV - As respostas dos Peritos vão ao encontro do facto quesitado e é clarificado por estes em Audiência (depoimento gravado em suporte digital 10:23:13 – 10:35:54 /registo 00:00:00 a 00:12:39).
XV - Do Quesito 31 da Base Instrutória: O Tribunal a quo grassa numa errada conclusão no que tange à prova do quesito, nomeadamente, no que concerne com o depoimento da testemunha E… (depoimento gravado em suporte digital 12:11:03 – 12:19:47 /registo 00:00:01 a 00:08:43) e que se prende com o simples facto da testemunha não poder contrariar outras quaisquer que tenham sido inquiridas no processo.
XVI - A Testemunha E… foi a única a responder ao facto!
XVII - Não pode desconsiderar-se um depoimento apenas com base em conclusões e generalidades vazias de conteúdo e, portanto, insindicáveis.
XVIII - Não se logra apreender dos epítetos genéricos e, sobretudo conclusivos, presentes na motivação da resposta aos Quesitos qualquer sustentação objectiva e concreta das razões da falta de credibilidade da testemunha.
XIX - É mister compreender a realidade, enquadrá-la juridicamente e explicá-la de forma lógica e clara.
XX - O lançar-se o anátema da falta de credibilidade por razões vácuas como as que, com o devido respeito, foram apresentadas pelo Tribunal a quo não cumpre o dever de fundamentação!
XXI - A interpretação do nº. 2 do artigo 653º. do CPC no sentido do dever da fundamentação se bastar com a indicação dos factos provados, dos meios de prova e conceitos genéricos e conclusivos de credibilidade da prova testemunhal sem indicação da razão das regras da experiência ou de critérios lógicos que constituem o substrato racional que conduziu a convicção do tribunal viola os artigos 20.º, n.º 4 e 205.º da CRP pelo que é inconstitucional!
XXII - Não se evidencia do texto da motivação qualquer laivo de explicação das conclusões retiradas pelo Tribunal a quo quanto às invocadas “faltas” da testemunha.
XXIII - O Tribunal a quo analisa de forma, com o devido respeito, distorcida a afirmada ligação laboral da testemunha à Ré pois que aquela testemunha está deontologicamente obrigada a salvaguardar princípios de integridade, idoneidade e independência – vide artigo 3.º do Código Deontológico dos TOC (DL 310/2009 de 26-10).
XXIV - Sendo certo que – no que contende com o presente Quesito (e é o que nos importa) – a testemunha foi a única a pronunciar-se e fê-lo clara e veementemente (depoimento gravado em suporte digital 12:11:03 – 12:19:47 /registo 00:00:01 a 00:08:43).
XXV - No pressuposto da alteração da matéria de facto nos termos supra temos que a responsabilidade pela deterioração dos vigamentos existentes no arrendado não é do Senhorio ou, pelo menos, só deste.
XXVI - Não é exigível que à Ré se impusesse outra atitude diferente da que teve.
XXVII - É da mais elementar Justiça e Equidade que disponibilizando-se – ponto 48 dos factos provados – a fazer as reformulações necessárias no locado com a prévia retirada (pela Arrendatária) dos equipamentos e adaptações feitas e a seu cargo.
XXVIII - Considerando-se, ademais, provado o Quesito 31 da Base Instrutória mais obrigação teria aquela de fazê-lo porque com tal concordou sendo, assim, abusiva a sua posição ulterior.
XXIX - Mesmo a admitir ser da Ré a responsabilidade da realização das obras indicadas pela Autora em juízo não se compreende, à luz da lei e do princípio da boa fé que norteia os contratos e sua execução, a imposição da obrigação de remoção de equipamentos e benfeitorias e a seu cargo que não foram autorizadas como impunha o contrato.
XXX - Face a uma eventual necessidade de reparação do arrendado o Tribunal a quo chancela – erradamente dizemos nós – o custeio da remoção e reconstrução futura daquilo que não foi autorizado e, portanto, daquilo que está em violação contratual!
XXXI - A responsabilidade de quaisquer prejuízos só à Autora deve ser assacada.
XXXII - Não é entendível à luz do contrato, da lei e de princípios de Justiça e Equidade dever ser a Autora responsável pela retirada dos equipamentos e benfeitorias quando os mesmos não são da sua área de actividade nem, sequer, os tinha autorizado.
XXXIII - Acresce que a Arrendatária devia ter feito um uso prudente do arrendado o que se julga – em oposição do afirmado pela Sentença – não ter sido o caso pois a Autora conhecia o estado do mesmo e sua vetustez e, ainda assim, sem autorização da Senhoria aqui Ré e sem qualquer estudo prévio, colocou um peso considerável a ser suportado pela estrutura (vigamentos).
XXXIV - Neste contexto de incumprimento contratual da Ré (que foi alegado e importa na concatenação dos prejuízos e responsabilidades) o Tribunal a quo deveria ter tido em consideração – o que não teve – outra questão de, salvo melhor opinião, singular importância: A obrigação de contratação pela Arrendatária de um seguro multi-riscos.
XXXV - Na verdade, estivesse cumprida aquela obrigação e – a haver prejuízos – os mesmos estariam cobertos por um seguro, posto que é também aqui abusivo e ilegítimo – o que se invoca nesta sede – da parte da Autora vir pretender ser ressarcida pela Ré quando, caso tivesse cumprido o contrato, o poderia e deveria exigir a terceiro segurador.
XXXVI - A finalizar e a aceitar-se a responsabilidade da Ré – o que respeitosamente se discorda – nunca a mesma poderia vir a ser condenada nos termos do ponto 6 da douta decisão ora recorrida, isto é, nos prejuízos cuja liquidação se relegou para o incidente respectivo.
XXXVII - Não pode a Autora provar em sede de liquidação o que não logrou provar na Acção.
XXXVIII - O que a Sentença a quo faz não é mais do que sancionar esta possibilidade (nova possibilidade) da Autora, no Incidente de Liquidação, fazer nova prova daquilo que não conseguiu (porque o tentou) na acção principal.
XXXIX - Viola, assim, a decisão da 1ª. Instância os artigos 378.º, nº. 2, 380.º e 661.º do CPC, bem assim os artigos 236.º do Código Civil por referência ao artigo 295.º do mesmo diploma.
Pede, a final, que seja revogada a sentença recorrida com as consequências legais.
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Pela recorrida foram apresentadas Contra-Alegações, nas quais pugna pela manutenção da decisão recorrida.
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Cumpre decidir, sendo certo que o objecto do recurso está delimitado pelas conclusões da recorrente, acima transcritas, no qual se apreciam apenas as questões invocadas e relacionadas com o conteúdo do acto recorrido e não sobre matéria nova, excepção feita para o que for do conhecimento oficioso.
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Nessa linha de orientação, as questões a decidir, suscitadas pela recorrente no recurso de Apelação são:
- A de saber se inexiste objecto do pedido, por resolução do contrato de arrendamento;
- Se não deveria ter sido admitida a alteração da causa de pedir e do pedido;
- Se foi bem decidida, na 1ª Instância, a Matéria de Facto;
- Se mesmo a admitir ser da responsabilidade da ré a realização das obras, não deveria ser imposto àquela a obrigação de remoção de equipamentos e benfeitorias feitas pela A;
- Se a responsabilidade da ré pode ser afastada pela realização das obras pela A. sem autorização do senhorio e pela não contratação pela A. de um seguro multi-riscos, nos termos previstos no contrato; e
- Se, a aceitar-se a responsabilidade da Ré, a mesma não poderia ser condenada nos prejuízos decorrentes do encerramento do estabelecimento, cuja liquidação se relegou para o incidente respectivo.
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Foram dados como provados na 1ª Instância os seguintes factos:
1. Em 30 de Abril de 2006, autora e ré subscreveram o documento vertido em escrito particular, nominado como “Contrato de Arrendamento Comercial”, constante de fls. 35 a 37 dos autos, cujo teor se dá aqui por integralmente reproduzido para todos os efeitos legais. (al. A) da matéria de facto assente)
2. Nesse documento a ré declarou dar de arrendamento à autora e esta declarou tomar de arrendamento o imóvel propriedade da primeira, que é um armazém com a área coberta de 800 m2, e se encontra sito à …, número …, na cidade de Vila do Conde, estando o mesmo descrito na Conservatória do Registo Predial de Vila do Conde sob o n.º 34573, Livro B e inscrito na matriz predial urbana da mesma freguesia sob o artigo 2627. (al. B) da matéria de facto assente)
3. Nesse documento, as partes declararam também fixar o valor da renda mensal devida pelo arrendamento, no montante de € 2.646,94, a ser paga até ao oitavo dia do mês anterior a que disser respeito, por transferência bancária para conta da senhoria ré. (al. C) da matéria de facto assente)
4. Declararam também as partes que a renda indicada no artigo anterior ficaria sujeita às actualizações periódicas, de acordo com os coeficientes publicados por Portaria Governamental, podendo a primeira ocorrer no dia 1 de Outubro de 2006. (al. D) da matéria de facto assente)
5. A renda estipulada pelas partes naquele contrato sofreu efectivamente actualizações, operadas por iniciativa da ré senhoria, em Outubro e Novembro de 2006, fixando-se então no valor de € 2.729. (al. E) da matéria de facto assente)
6. Posteriormente, as partes acordaram ainda alterações ao valor da renda devida pelo arrendado, nas datas de 27/10/2008 e 18/02/2010. (al. F) da matéria de facto assente)
7. Por força desta última alteração, ocorrida em Fevereiro de 2010, as partes acordaram em isentar a autora inquilina da obrigação de pagamento da renda dos meses de Março a Agosto de 2010. (al. G) da matéria de facto assente)
8. Declaram ainda as partes nesse documento que a renda mensal seria reduzida para o montante mensal de € 1.470,58, a partir da que se venceria em Setembro de 2010, sendo esse o valor actual da renda devida pelo locado. (al. H) da matéria de facto assente)
9. O prazo estipulado pelas partes para a vigência do contrato foi de doze anos e cinco meses, com início em 1 de Maio de 2006. (al. I) da matéria de facto assente)
10. No contrato as partes declararam que o imóvel arrendado se destinava à actividade de bowling, lazer e entretenimento. (al. J) da matéria de facto assente)
11. A autora instalou no locado um estabelecimento misto de animação e diversão familiar, que gira sob a firma/marca “D…”, integrado por diverso tipo de máquinas de jogos e outras diversões, nomeadamente: uma secção de bar/cafetaria para prestação de serviços de bebidas e refeições ligeiras, com mesas para utilização dos clientes; zona de jogos electrónicos, jogos de mesa, dardos, jogos e máquinas de diversão infantil e várias mesas de bilhar; uma zona afecta à actividade de bowling, composto por oito pistas, uma zona de atendimento e aluguer de equipamentos, zonas de jogadores, e sistemas de controle electrónico; uma área destinada a palco de espectáculos musicais e animação de festas. (al. L) da matéria de facto assente)
12. No locado encontram-se instaladas diversas obras da pertença da autora, nomeadamente: colocação de quadros eléctricos, cablagem e instalação eléctrica; sistema de iluminação adequada às actividades a desenvolver no locado; aplicação de revestimentos de paredes e tectos falsos; aplicação de sistemas de ventilação e de ar condicionado canalizado em condutas adequadas para o efeito; pintura do locado e sua decoração, por aplicação de telas de revestimento e outras pinturas. (al. M) da matéria de facto assente)
13. No estabelecimento da autora eram prestados aos seus clientes serviços de bebidas e refeições ligeiras, facultada a utilização de máquinas de jogos electrónicos ou de mesa e a actividade de bowling, e bem assim desenvolvidas actividades de animação e entretenimento, como espectáculos com música ao vivo e animação a festas de aniversários. (al. N) da matéria de facto assente)
14. O imóvel locado é um armazém com mais de cinquenta anos, edificado em estrutura de paredes de alvenaria e tijolo, encimadas por uma cobertura em telha “Lusalite”, aplicada sobre uma estrutura de vigamento em madeira. (al. O) da matéria de facto assente)
15. Durante toda a vigência do contrato a senhoria ré nunca procedeu à realização de quaisquer obras de reparação e manutenção da estrutura do edifício, nomeadamente da sua cobertura. (al. P) da matéria de facto assente)
16. Na data de 14 de Dezembro de 2006 a autora remeteu à ré a comunicação escrita constante de fls. 53 dos autos, cujo teor se dá por integralmente reproduzido para todos os efeitos legais, denunciando a existência de infiltrações de águas pluviais a partir da cobertura do locado, causadas pelo seu estado de deficiente conservação. (al. Q) da matéria de facto assente)
17. Apesar de ter recebido aquela comunicação, a ré não procedeu a qualquer reparação no locado. (al. R) da matéria de facto assente)
18. No decurso da primeira semana de Maio de 2010 a Autora deu conhecimento à ré de vários defeitos na estrutura de suporte da cobertura do imóvel através de contacto directo com os serviços desta sociedade, a qual fez acompanhar as inspecções efectuadas ao locado por representantes por si designados. (al. S) da matéria de facto assente)
19. Em 11 de Maio de 2010 foi elaborado por F… o “relatório e parecer técnico” de fls. 46/47 dos autos, cujo teor se dá aqui por integralmente reproduzido para todos os efeitos legais. (al. T) da matéria de facto assente)
20. A autora enviou à Ré a carta datada de 17 de Maio de 2010, constante de fls. 42 a 45 dos autos, cujo teor se dá aqui por integralmente reproduzido para todos os efeitos legais, comunicando-lhe o seguinte: “(…) tem a presente por finalidade proceder à denuncia formal de tais defeitos, nos termos e tendo em vista os efeitos legais tidos por úteis e/ou convenientes, mormente os resultantes do postulado por artigo 1038 al. g) do Código Civil. Na conformidade do que vai dito, tem a presente igualmente por finalidade interpelar V. Exas. para a imediata realização das obras de reparação e de substituição da cobertura do imóvel que se mostrem necessárias a assegurar a estabilidade e segurança do mesmo e a garantir a sua cabal utilização para os fins previstos no contrato, o que, atentas as razões evidentes que justificam a urgência na realização de tais obras, se deve ter como vencido e, imediatamente exigível a partir do momento de recepção da presente missiva por parte de V. Exas. Devem igualmente V. Exas. atentar que, face à impossibilidade de utilização total do imóvel locado para as finalidades pressupostas no contrato de arrendamento, temos o mesmo como incumprido de v. parte, o que legitima a recusa do cumprimento das obrigações pecuniárias a n. cargo, em particular do pagamento da renda, até que se mostrem sanados os impedimentos à sua cabal utilização.
A par disso e, porque o impedimento de utilização do imóvel determina a ocorrência de prejuízos directos resultantes da perda de receitas provenientes da exploração do estabelecimento e das receitas de patrocínio publicitário e de contratos de distribuição exclusiva de bebidas, bem como o custo com a remuneração de funcionários e outros de natureza financeira associados à impossibilidade de funcionamento do mesmo, consignamos a n. intenção de reclamar os mesmos de V. Exas., o que atenta a sua natureza ilíquida e ainda indeterminada se protesta efectuar em momento oportuno.
Tal sem prejuízo da reclamação de reparação integral de todos os danos já sofridos, e de outros que venham a ocorrer, durante o processo de reparação da cobertura do imóvel, nomeadamente a reparação ou substituição de máquinas e, equipamentos de n. pertença, bem como do tecto falso, sistema eléctrico (cablagem, quadros e iluminação), sistema de ventilação e ar condicionado, telas, revestimentos e pinturas, bem como de quaisquer outros que a execução dos trabalhos poderão afectar.” (al. U) da matéria de facto assente)
21. Em 15 de Junho de 2010, a autora remeteu à ré uma segunda comunicação, constante de fls. 56 e seguintes dos autos e cujo teor se dá por reproduzido para todos os efeitos legais, declarando considerar vencida e, em mora, a obrigação de realização das reparações urgentes destinadas a eliminar os vícios existentes no locado e que antes tinha denunciado, do seguinte modo: “(…) Recuperamos pelo presente o teor da nossa comunicação escrita datada de 17 de Maio de 2010, através da qual, reiterámos perante V. Exas. a denúncia já antes efectivada directamente, da existência de risco de colapso na cobertura do locado referenciado em epígrafe. Verificado que, no período de tempo entretanto decorrido, se mostra vencido o prazo ali consignado para a realização das obras urgentes de v. responsabilidade, adequadas à eliminação de tal vicio, sem que tenham as mesmas sido sequer iniciadas, temos como tal cumprida e em mora a obrigação a cargo de V. Exas. Neste pressuposto e, sem prejuízo dos demais fundamentos legais atinentes ao caso, consideramos V. Exa. responsáveis pela totalidade dos prejuízos advenientes do impedimento total da utilização do locado, até que o mesmo se encontre em condições de normal utilização para as finalidades previstas no contrato. Tais prejuízos em valor ainda ilíquido e, em fase de apuramento, serão oportuna e periodicamente reclamadas de V. Exas., entendendo-se dever contudo desde já alertar V. Exas., que, atendendo ao carácter sazonal da actividade registada no estabelecimento, o montante do lucro cessante na vertente de receitas perdidas quando o impedimento do uso do locado persista pelo período de Julho a Setembro, ascendera a quantitativo não inferior a € 21.007,68 por mês. De igual modo e, considerando que a obra de substituição da cobertura do locado a realizar, deverá contemplar a necessária reposição do estabelecimento no estado em que se encontrava à data do encerramento consequente do colapso da estrutura da cobertura, mostra-se assim também necessária reposição de benfeitorias existentes no mesmo cuja reconstrução deve ser custeada integralmente por V. Exas. Neste pressuposto, passamos a enviar em anexo o orçamento de reparação, das estruturas e tectos falsos, iluminação e climatização (AVAC) do estabelecimento, solicitando de V. Exas. a confirmação da aceitação do custeamento de tais obras. Oportunamente, e após liquidação da integralidade dos demais prejuízos comunicaremos a V. Exas. o custo das demais reparações e substituições que se mostrem necessárias. (…)” (al. V) da matéria de facto assente)
22. A ré recebeu as comunicações referidas nas duas alíneas anteriores, não tendo contudo procedido a quaisquer reparações do imóvel. (al. X) da matéria de facto assente)
23. A ré vem recusando a realização das obras de reparação do imóvel, alegando não aceitar custear a reconstrução das benfeitorias aplicadas, a desmontagem e armazenamento de máquinas e equipamentos existentes no locado e, bem assim rejeitando assumir a responsabilidade pelos prejuízos decorrentes da impossibilidade de utilização do mesmo decorrente do risco iminente de ruína que apresenta. (al. Z) da matéria de facto assente)
24. Por esse motivo, e na data de 30 de Agosto de 2010, a autora fez remeter à ré a comunicação constante de fls. 61 e seguintes, cujo teor se dá por reproduzido para todos os efeitos legais, nela exarando o seguinte: “(…) Damos por recebidas as v. comunicações datadas de 28 de Junho e 5 de Agosto passado, cujo teor – apesar de merecer a nossa integral rejeição - mereceu a nossa melhor atenção, e às quais passamos a dar resposta. a.) Conforme é do conhecimento de V. Exas. já em 17 de Maio do ano corrente, dirigimos a V. Exas. uma missiva, reiterando a denúncia antes efectuada, relativa à existência de deficiências na estrutura de suporte da cobertura do imóvel de v. propriedade que é objecto de contrato de arrendamento vigentes entre estas sociedades. b.) Tais vícios, detalhada e rigorosamente documentados nas comunicações que vos foram então remetidas, são conforme os relatórios elaborados por peritos, impeditivas da utilização total do locado, porquanto existindo risco de colapso, colocam em risco a segurança dos ocupantes do imóvel. c.) Em cabal coerência com tal denúncia, interpelámos nessa data V. Exas. para que procedessem de imediato à realização das obras de reparação e de substituição da cobertura do imóvel que se mostrem necessárias a assegurar a estabilidade e segurança do mesmo e a garantir a sua cabal utilização para os fins previstos no contrato. d.) A par disso, em integral espírito de cooperação e boa fé e, tendo em vista a rápida execução dos trabalhos de reparação, de forma a minimizar os prejuízos decorrentes do encerramento do n. estabelecimento, diligenciamos e oferecemos a V. Exas. Dois orçamentos de execução dos trabalhos de reparação, quer no que respeita aos trabalhos de remoção e substituição da estrutura de cobertura, quer no tocante aos de reparação ou substituição de máquinas e equipamentos de n. pertença, bem como do tecto falso, sistema eléctrico (cablagem, quadros e iluminação), condutas do sistema de ventilação e ar condicionado (AVAC), telas, revestimentos e pinturas, bem como de quaisquer outros cuja reconstrução se mostrará necessária pela execução daquela obra. e.) Ora, não obstante decorridos que vão quase quatro meses da data de tal interpelação, verifica-se que nenhuma diligência ou trabalho de reparação foi iniciado, nem sequer efectuados trabalhos de levantamento das reparações a efectuar, o que bem evidencia o total desinteresse por parte de V. Exas. na regularização do trato contratual. f.) Tal facto bem evidencia que a responsabilidade pela persistência da situação de mora de V. Exas. no cumprimento das obrigações de reparação do locado, necessárias ao asseguramento do respectivo gozo para as finalidades previstas no contrato, se deve única e exclusivamente à vontade declarada de não pretender assumir as responsabilidades pelo encerramento do locado e pelas reparações que nele se mostram necessário efectuar. g.) Com efeito e, ao contrário do que é por V. Exas. afirmado nas missivas ora em resposta, o locado encontra-se disponível e à v. ordem desde a indicada data de Maio de 2010, para a execução de todos e quaisquer trabalhos que mostrem necessários à cabal reparação do imóvel. h.) Na verdade e ao contrario do que vem falsamente afirmado na comunicação de V. Exas. datada de 11/8/2010, tal disponibilidade foi naquela ocasião materializada pela entrega a V. Exas. de um conjunto de chaves do locado, para permitir a execução dos trabalhos, pelo que se os mesmos não foram iniciados tal se ficará a dever unicamente à declarada intenção dessa sociedade pelo ressarcimento integral dos danos e prejuízos emergentes da paralisação do estabelecimento e pela destruição de partes integrantes do locado. i.) Com efeito, já em reunião mantida com os representantes dessa sociedade, no seguimento do envio da comunicação indicada em a.), foi por V. Exas. declarado que não pretendiam assumir o custo de reparação das estruturas de revestimentos, tecto falso, sistema eléctrico (cablagem, quadros e iluminação), condutas do sistema de ventilação e ar condicionado (AVAC), telas, revestimentos e pinturas tectos falsos, AVAC, e instalação eléctrica e circuitos electrónicos instalados na estrutura a demolir cuja reconstrução se mostrará necessária pela execução da demolição da cobertura e vigamento de suporte. j.) Ora, tratando-se, como é o caso, de partes integrantes do imóvel cuja destruição é determinada pela execução dos trabalhos de reconstrução da estrutura de vigamento, cobertura onde se encontram colocados, devem por tal facto V. Exas. Custear integralmente a respectiva reconstrução, tal como fizemos consignar naquela ocasião e assim reiteramos em integral coerência com a posição antes tomada. k.) Também em respeito com a verdade que pauta a n. conduta, reiteramos a proposta então veiculada, no sentido de admitir a compensação do custo de reparação de tais estruturas e, bem assim dos lucros cessantes incorridos em razão do encerramento forçado do estabelecimento, com as rendas vincendas da execução do contrato. l.) No pressuposto do que vai dito, e para registo em memória futura, anexamos com a presente cópia dos orçamentos de trabalhos em causa, cujo custo devera ser integralmente suportado por V. Exas. m.) Os defeitos apresentados no locado são de natureza estrutural e decorrem da ausência de cabal manutenção às estruturas de suporte da cobertura comum aos três pavilhões que integram o imóvel que nos foi (parcialmente) dado em arrendamento, conforme resulta confessadamente consignado por V. Exas. na comunicação de 11/8, na qual se afirma que também o pavilhão confinante onde se encontra instalado um … de propriedade explorado por empresa integrante do v. grupo empresarial foi objecto de intervenção idêntica àquela que é necessária no locado. n.) Como tal e, atenta a denuncia já efectuada de tais defeitos e a interpelação de V. Exas. para a respectiva regularização, manteremos até que se mostrem integralmente repostas as condições de funcionamento do estabelecimento, pressuposto no contrato de arrendamento, a legitima recusa do cumprimento das obrigações pecuniárias a n. cargo, em particular do pagamento da renda, até que se mostrem sanados os impedimentos à sua cabal utilização. o.) Reiteramos igualmente, que uma vez que o impedimento de utilização do imóvel determina a ocorrência de prejuízos directos resultantes da perda de receitas provenientes da exploração do estabelecimento e das receitas de patrocínio publicitário e de contratos de distribuição exclusiva de bebidas, bem como o custo com a remuneração de funcionários e outros de natureza financeira associados à impossibilidade de funcionamento do mesmo, consignamos a n. intenção de reclamar os mesmos de V. Exas. p.) Para tanto e, atento o seu constante e gradual agravamento, consignamos ser nossa intenção recorrer à via judicial, caso os trabalhos de reparação do locado não sejam iniciados no prazo de uma semana contados da presente data, nele se reclamando o ressarcimento integral dos danos sofridos e dos lucros cessantes já registados e dos demais que serão deixados de auferir até ao restabelecimento do normal funcionamento do n. estabelecimento. Tal sem prejuízo da reclamação de reparação integral de todos os danos já sofridos e de outros que venham a ocorrer durante o processo de reparação da cobertura do imóvel cujo apuramento se remete para momento oportuno. (…)” (al. AA) da matéria de facto assente)
25. Em 17/11/2010 a Autora foi notificada do teor da “notificação para pagamento de rendas em atraso (Artigo 15.º NRAU) constante de fls. 104/105, cujo teor se dá aqui por integralmente reproduzido para todos os efeitos legais. (al. BB) da matéria de facto assente)
26. Em 17/12/2010, a Ré, na qualidade de exequente, intentou contra a Autora, na qualidade de executada, execução comum para entrega de coisa certa nos termos constantes do requerimento executivo de fls. 92 e seguintes, cujo teor se dá aqui por integralmente reproduzido para todos os efeitos legais. (al. CC) da matéria de facto assente)
27. A Ré enviou à Autora as cartas constantes de fls. 108 e seguintes e 115 e seguintes dos autos, cujo teor se dá aqui por integralmente reproduzido para todos os efeitos legais. (al. DD) da matéria de facto assente)
28. A Autora manteve instalado no imóvel referido em B) o estabelecimento comercial descrito em L). (item 1º da base instrutória)
29. Continuando a prestar aos seus clientes os serviços descritos em N) até 4 de Maio de 2010. (item 2º da base instrutória)
30. Os defeitos referidos em S) existem e foram detectados pela Autora no momento temporal aí mencionado. (item 3º da base instrutória) (No decurso da primeira semana de Maio de 2010 a Autora deu conhecimento à ré de vários defeitos na estrutura de suporte da cobertura do imóvel através de contacto directo com os serviços desta sociedade, a qual fez acompanhar as inspecções efectuadas ao locado por representantes por si designados. (al. S) da matéria de facto assente)
31. Resultando da deterioração das vigas e vigamentos de madeira de suporte à estrutura da cobertura do imóvel. (item 4º da base instrutória)
32. Sendo causados por falta de manutenção dessas vigas e vigamentos de madeira. (item 5º da base instrutória)
33. Até 4 de Maio de 2010, esses defeitos não se mostravam visíveis e não eram de conhecimento da autora. (item 6º da base instrutória)
34. O risco de derrocada da estrutura de vigamento e cobertura do edifício obrigou ao encerramento do espaço comercial e à interdição de circulação de pessoas no interior do locado desde essa data. (item 7º da base instrutória)
35. Para minimizar o risco de ruína a autora fez escorar a estrutura de vigamento da cobertura do imóvel, por aplicação de escoras adequadas em número de nove. (item 8º da base instrutória)
36. No aluguer dessas escoras, a autora despendeu, até à data de Dezembro de 2010, o montante de € 160,20. (item 9º da base instrutória)
37. A que acrescerá o valor de € 17.80, por cada mês em que se mantiverem aplicadas as escoras no local. (item 10º da base instrutória)
38. O circunstancialismo descrito em 7) levou a que a autora deixasse de auferir, desde Maio de 2010, as receitas provenientes da actividade do estabelecimento. (item 11º da base instrutória)
39. Para a retoma do funcionamento e exploração do estabelecimento da Autora será necessário proceder à remoção da estrutura de vigamento existente e cobertura do imóvel, colocando em sua substituição, uma outra nova. (item 19º da base instrutória)
40. O trabalho de remoção da estrutura de vigamento existente implica a destruição das obras nela aplicadas pela autora, nomeadamente as que respeitam aos tectos falsos, pinturas e revestimentos de paredes e chão, sistema eléctrico e de iluminação e as condutas de ventilação e ar acondicionado. (item 20º da base instrutória)
41. Após a reconstrução da estrutura de cobertura do imóvel, será necessário: -proceder à recolocação dos tectos falsos e revestimentos em todo o estabelecimento; -proceder à reconstrução da instalação eléctrica que se encontra aplicada na estrutura de vigamento, ainda que com o reaproveitamento das armaduras de iluminação quando tal se mostre possível; -proceder à recolocação da estrutura de ventilação e ar condicionado; -proceder à pintura e aplicação de revestimentos de todo o estabelecimento. (item 21º da base instrutória)
42. A execução desses trabalhos e trabalhos aos mesmos complementares e/ou acessórios, tais como a protecção de máquinas e equipamentos e limpeza de obra, está orçamentado no montante de € 39.722,50. (item 22º da base instrutória)
43. A realização das obras de reconstrução da estrutura de cobertura obrigarão à desmontagem, transporte e armazenagem das oito pistas de bowling e sistemas de controlo electrónicos, o que se mostra orçamentado pelo custo de € 18.204,00. (item 23º da base instrutória)
44. A adaptação do espaço do imóvel referido em B) ao estabelecimento mencionado em L) foi feita sob a inteira responsabilidade da Autora, a seu encargo, fiscalização, responsabilidade técnica e de segurança. (item 24º da base instrutória)
45. Por via das instalações da Autora, a estrutura do imóvel passou a suportar, por si, toda a cobertura do tecto com placas de gesso com (cada) uma dimensão aproximada de 60 x 60 cm e um peso aproximado de 2,5 Kg (cada) em toda a extensão do arrendado. (item 25º da base instrutória)
46. Sobre a estrutura pendia o peso de calhas, lã de vidro para insonorização, ar condicionado, fios eléctricos, sistemas de iluminação. (item 27º da base instrutória)
47. Essas adaptações foram efectuadas sem qualquer estudo prévio ou reforço da estrutura de suporte. (item 28º da base instrutória)
48. A Ré predispôs-se, por sua iniciativa, a reformular a cobertura do arrendado, com a condição da retirada pela Autora de todo o equipamento e a seu cargo. (item 30º da base instrutória)
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Da inexistência do objecto do pedido e da ampliação da causa de pedir e pedido:
Alega a recorrente (ré na acção) que comunicou à A. em 17.11.2010 a resolução do contrato de arrendamento, por falta de pagamento das rendas, com efeitos a partir de Setembro de 2010. Assim sendo, aquando da propositura da acção inexistia objecto do pedido, não podendo a autora, bem sabendo da resolução contratual, vir nesta sede solicitar obras num arrendado que cessou por via do que dispõe o artigo 1084.º, nº. 1 do Código Civil. Estando resolvido o contrato de arrendamento, a presente acção encontra-se desprovida de qualquer sustentação de facto ou de direito.
Alega ainda que a alteração do pedido e da causa de pedir, para além de não serem o meio adequado – que deveria ser feito no âmbito da execução em sede de eventual oposição - altera substantivamente a relação jurídica controvertida, o que está proibido pelo n.º 6 do artigo 273.º do CPC.
Conclui assim que os despachos proferidos nos autos em que se admite a alteração da causa de pedir e do pedido e que indeferem a invocada inexistência do objecto do pedido devem ser revogados.
Mas sem razão, cremos.
É certo que, de acordo com a matéria de facto provada, em 17/11/2010 a Autora foi notificada pela ré, nos termos e para os efeitos do artigo 15.º do NRAU, comunicando-lhe a resolução do contrato de arrendamento, caso se mantivesse a situação de incumprimento, por falta de pagamento de rendas e, portanto, da resolução do contrato. E que com data de 17/12/2010 foi deduzida execução contra a A. para restituição do local arrendado, com base na resolução do contrato.
Acontece porém que já desde 14 de Dezembro de 2006 que a autora vem remetendo à ré comunicações escritas (juntas aos autos), denunciando a existência de infiltrações de águas pluviais a partir da cobertura do locado, causadas pelo seu estado de deficiente conservação, e de vários defeitos na estrutura de suporte da cobertura do imóvel, interpelando a mesma para a imediata realização das obras de reparação e de substituição da cobertura do imóvel que se mostrem necessárias a assegurar a estabilidade e segurança do mesmo e a garantir a sua cabal utilização para os fins previstos no contrato.
E já em 17 de Maio de 2010 a A. comunicava à ré que face à impossibilidade de utilização total do imóvel locado para as finalidades pressupostas no contrato de arrendamento considerava o mesmo como incumprido, o que lhe legitimava a recusa do cumprimento das obrigações pecuniárias a seu cargo, em particular do pagamento da renda, até que se mostrassem sanados os impedimentos à sua cabal utilização.
Posição que reiterou em 30 de Agosto de 2010, afirmando que “atenta a denuncia já efectuada de tais defeitos e a interpelação de V. Exas. para a respectiva regularização, manteremos, até que se mostrem integralmente repostas as condições de funcionamento do estabelecimento, pressuposto no contrato de arrendamento, a legitima recusa do cumprimento das obrigações pecuniárias a n. cargo, em particular do pagamento da renda, até que se mostrem sanados os impedimentos à sua cabal utilização.
E na presente acção, intentada em 10.2.2011, vem a A. demandar a ré pedindo que a mesma seja condenada a reparar o tecto do local arrendado, para poder nele exercer a sua actividade e gozar o imóvel arrendado, como é objecto do contrato.
Além desse pedido – principal -, formula outros, entre eles o de que lhe seja reconhecida legitimidade para deixar de pagar as rendas desde Setembro de 2010 em diante, com recurso ao instituto da excepção do incumprimento do contrato.
Alega para fundamentar os referidos pedidos que o local arrendado não está em condições de poder servir para a sua actividade, por falta de solidez da estrutura, devido à falta de manutenção da mesma, nomeadamente da cobertura do arrendado.
Ora, como decorre da cronologia dos factos relatados, a ré havia já recebido da A. as comunicações de que ia deixar de pagar as rendas, a partir de Setembro de 2010, excepcionando dessa forma o incumprimento do contrato por parte da senhoria, muito antes daquela lhe ter enviado a comunicação de resolução do contrato, precisamente com base nesse fundamento.
Não faz, assim, qualquer sentido a alegação da recorrente de que inexistia objecto do pedido, aquando da propositura da acção, por comunicação de resolução do mesmo à A., quando a ré já havia tomado conhecimento, previamente àquela resolução, de que a A. iria deixar de pagar as rendas a partir de Setembro de 2010, com fundamento no incumprimento do contrato por parte da mesma.
No fundo, a ré, ignorando tudo quanto lhe havia sido comunicado pela A., nomeadamente o incumprimento do contrato da sua parte, e a recusa, justificada, daquela, para o não pagamento das rendas, comunicou à A. a resolução do contrato, pretendendo agora beneficiar dessa comunicação.
O exercício de tal direito apresenta-se, assim, ilegítimo, sendo tal ilegitimidade suficiente para julgar improcedente a alegação da recorrente.
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De referir no entanto que a A., em face da alegação da ré, requereu na réplica a ampliação do pedido, no sentido de ser declarada “inválida a declaração resolutiva do contrato de arrendamento formulado pela ré com fundamento em tal facto e o mesmo subsistente com todas as consequências legais.”
E requereu também a alteração da causa de pedir, alegando que inexistindo o fundamento que conferia à Ré o direito a por termo ao contrato por sua iniciativa (falta de pagamento de rendas), deve, como tal, ter-se a comunicação resolutiva do arrendamento como inválida e ineficaz para a produção dos visados efeitos, devendo como tal considerar-se o contrato como subsistente.
Trata-se, no fundo, de mera ampliação do pedido (e não de qualquer alteração da causa de pedir – que consistia já, quanto aos pedidos inicialmente formulados, na existência e validade do contrato de arrendamento). E mesmo quanto à ampliação do pedido, ela apresenta-se como desnecessária perante o pedido inicial - de que se considerasse válida a recusa da A. no pagamento da renda, por falta da realização das obras no local arrendado.
Foi no entanto admitida a alteração (do pedido e da causa de pedir) no despacho saneador, e julgou-se também improcedente a excepção de inexistência de objecto do pedido, bem como a ineptidão da petição inicial.
Baseou-se o tribunal no facto de que “com a ampliação da causa de pedir e do pedido formulado pela A. na réplica, já admitida pelo tribunal, a validade da declaração resolutiva do contrato de arrendamento passou a integrar o objecto da presente acção e, por essa via, nenhum obstáculo se coloca ao prosseguimento dos autos…”
Ora, também por esta via, nenhum reparo temos a fazer à decisão proferida agora posta em causa pela recorrente, uma vez que a causa de pedir pode ser alterada livremente pelo A. na réplica, assim como pode ser alterado o pedido (artº 273º do CPC) e pode também ocorrer a alteração simultânea do pedido e da causa de pedir.
Consagrando a posição já anteriormente defendida por Antunes Varela (Manual de Processo Civil, 2ª ed., pág. 359) a reforma processual de 1996 veio permitir a modificação simultânea do pedido e da causa de pedir, desde que tal não implique convolação para relação jurídica diversa da controvertida (nº 6 do citado artº 273º).
Ora, compulsados os autos, verificamos que a relação jurídica definida na acção pela A. não foi alterada; ela sustentou na réplica os mesmos factos alegados na p.i., alegando sempre a existência e validade do contrato de arrendamento, que pretende manter, pedindo apenas que a ré seja condenada a proporcionar-lhe o gozo do imóvel arrendado para os fins contratados.
Nesta perspectiva, é admissível, legalmente, a alteração do pedido e da causa de pedir, nos termos em que foi feita, sendo estes autos o local adequado para fazer tal alteração.
Mostram-se, assim, válidos os despachos proferidos, improcedendo, desde logo, as conclusões das alegações da recorrente.
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Da impugnação da matéria de facto:
Impugna também a recorrente a decisão proferida sobre a matéria de facto no que respeita à resposta positiva dada ao artº 5º da Base Instrutória, que no entender da recorrente deveria ser negativa, assim como à resposta negativa dada aos artºs 26º, 29º e 31º, que no entender da recorrente deveria ser positiva.
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É de referir, desde logo, que assiste à recorrente o direito de impugnar a matéria de facto, já que a prova testemunhal foi registada, tendo sido dado cumprimento ao disposto no art.º 685º-B, nº 1, als a) e b) do C.P.C., encontrando-se também nos autos todos os documentos a apreciar, pelo que está este tribunal em condições de reapreciar a prova produzida na 1ª Instância (artº 712º nº1, alínea a) do CPC).
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Partindo dos princípios enunciados, apreciemos então a prova produzida, a fim de apurar se os artigos da matéria de facto apontados pela recorrente foram bem decididos pela 1ª Instância.
Constava do Artº 5º da BI: “Sendo causados (os defeitos da estrutura do edifício) por falta de manutenção dessas vigas e vigamentos de madeira?”
O tribunal respondeu positivamente a este artº com base no relatório e parecer técnico junto aos autos a fls. 46 e 47, acrescentando que “Também os documentos juntos aos autos a fls. 182 a 194 e o relatório da prova pericial realizada e constante de fls. 259 a 261, em conjugação com os esclarecimentos dos srs. Peritos prestados em audiência de julgamento (…) complementou toda a restante prova produzida, permitindo assim habilitar este tribunal a decidir nos termos supra expostos, já que se mostraram unânimes e concordantes no sentido de que a deterioração das vigas e vigamentos de madeira de suporte à estrutura de cobertura do imóvel ocorrida, é, em grande parte causada pela sua falta de manutenção e reparação…”
Entende a recorrente que o tribunal deveria ter dado como não provado o facto acima descrito (levado à matéria de facto sob o ponto 32), quer por via do que a perícia refere, quer pelos esclarecimentos dos peritos.
Mas cremos que sem razão.
O tribunal deu por provado o nexo de causalidade entre os defeitos referidos na alínea S) da matéria assente - que corresponde ao ponto 18 dos factos provados - e a falta de manutenção das vigas e vigamentos de madeira.
Sobre esta matéria existem nos autos três pareceres técnicos, cujos autores prestarem em audiência os seus esclarecimentos.
Um desses pareceres técnicos foi feito no decurso do processo (doc. de fls. 259 a 261), consistindo numa perícia colegial (com três peritos, um nomeado pelo tribunal e os outros dois nomeados por cada uma das partes), no qual os senhores peritos responderam afirmativamente ao quesito 2º da Autora (se os defeitos identificados na estrutura de suporte da cobertura do imóvel resultaram da deterioração das vigas e vigamentos de madeira que suportam essa mesma estrutura) acrescentando que a carga que foi colocada sobre as vigas e vigamentos de suporte também implicou a deterioração das mesmas.
Constando ainda do ponto 5 dos quesitos da ré se as adaptações efectuadas no local arrendado criaram instabilidade na estrutura do edifício, os peritos responderam que “qualquer subcarga na estrutura provoca um acréscimo de risco. No caso em apreço esse risco é agravado pelo estado da estrutura em madeira. Se o mesmo é suficiente para criar instabilidade, só uma análise mais pormenorizada das subcargas colocadas e do actual estado da estrutura do telhado, só assim se pode afirmar que a cobertura se tornou instável. Um facto que aconteceu é que efectivamente existem pelo menos duas asnas que torceram e partiram…”
Os peritos confirmaram em audiência de julgamento as deficiências que encontraram na estrutura do imóvel, nos apoios e cedência do próprio material, com a curvatura que demonstrava.
Sobre a origem de tais deficiências, se derivava de um factor físico evidente ou de um factor químico, nomeadamente a putrefacção da madeira, dizem que desconhecem o estado inicial da estrutura; mas mesmo considerando que estava tudo bem de início, a exposição que (a madeira) tem, as ampliações térmicas e a carga que se coloca em cima do material favorece aquele tipo de situações.
Sobre a reposta dada, em concreto, ao quesito 2º, dizem não se poder estabelecer um nexo causal entre uma causa concreta e o estado da estrutura; que não é possível estabelecer a origem causal do facto.
Confirmaram que as placas – tecto falso - estavam suspensas na estrutura de madeira que lá existia e que as deficiências decorrem, também, da carga que se põe em cima do material que “favorece este tipo de situações”.
Dizem ainda que deveria ter sido feito um estudo prévio à colocação de materiais a pender da estrutura, desconhecendo, no entanto, se esse estudo foi feito.
Esclarecem que as placas de gesso, só por si, não constituem uma carga exagerada, mas que o conjunto todo, acoplado a uma estrutura daquelas, ainda que não na sua totalidade (pois os monitores tinham a carga descarregada autonomamente da estrutura), e dado o estado do edifício (com muita idade), aconselhava a que tivesse havido algumas cautelas prévias antes de instalar aquele tipo de equipamentos.
Por outro lado, confirmaram que a falta de manutenção do material também pode provocar essas situações. Referiram as questões térmicas e as humidades, assim como o desgaste do material - que também provocam a deficiência verificada.
Ou seja, da resposta dada pelos peritos à questão colocada sobre a causa da cedência da estrutura do edifício resulta que, na opinião dos peritos, houve uma comparticipação de causas: o desgaste do material e a carga que lhe foi acoplada, resultante das obras que foram feitas no locado pela A.
Mas o tribunal atendeu também ao doc. de fls. 46 e 47, (relatório e parecer técnico elaborado em 11 de Maio de 2010), logo após a ocorrência dos factos, do descolamento de duas placas do tecto falso, do qual consta o seguinte: “Após vistoria à referida cobertura do edifício, logo após o sinistro, foi verificado o seguinte: a) trata-se de uma cobertura cuja estrutura foi executada em madeira; b) as asnas existentes de todo o pavilhão apresentam um elevado estado de degradação devido à existência quer de fungos quer de germes afectos a madeira; c) foi verificado que algumas das asnas estão totalmente fissuradas ou até mesmo partidas, logo, como consequência, todas as madres foram deslocadas das paredes; d) devido a estas circunstâncias todo o tecto existente sofreu vários danos o que implica a substituição integral do mesmo…”
Assim como ao doc. de fls. 182 – vistoria de salubridade elaborada pela Câmara Municipal … efectuada em 17 de Março de 2011 – do qual consta também que “…o estabelecimento está encerrado ao público; grande parte do tecto falso foi retirado estando visível a estrutura da cobertura em madeira; algumas das asnas em madeira da cobertura estão em ruptura, tendo o arrendatário efectuado escoramentos nos locais em risco de queda; o revestimento da cobertura pontualmente apresenta-se danificado permitindo a entrada de água da chuva; na parte confinante com o G… são visíveis junto ao lambrim manchas de humidade …”
E ao doc. de fls. 189 e ss. (relatório e parecer técnico) do qual consta ainda que “após retirada do tecto falso foi verificado que a 1ª asna visível (a contar da entrada principal do recinto) encontra-se em estado de degradação avançada e já fissurada, provocando o abatimento das madres e consequentemente da cobertura. É visível o desprendimento e deslocação das madres na alvenaria que suporta uma das suas extremidades (…). Após análise aos restantes elementos estruturais de toda a cobertura verifica-se que todos eles apresentam o mesmo aspecto, ou seja, elementos deformados, desprendidos, e num estado de degradação considerável, conforme é visível nas fotografias e vídeo em anexo a este relatório…”
Das conclusões de tal relatório consta o seguinte: “Pelo descrito, considero que a principal causa da ocorrência foi o abatimento da asna com ruptura dos perfis de madeira que a compõem, provocado pelo avançado estado de degradação do material (podridão visível). Com essa ruptura provocou o abatimento e arrastamento dos restantes elementos da estrutura e consequentemente o desmonte e desprendimento do tecto falso”.
Resulta assim dos relatórios periciais transcritos que a causa da cedência da estrutura que suporta a cobertura do imóvel foi provocada pelo estado de degradação do material (madeira) dada a falta de manutenção da mesma.
Ora, o tribunal deu a resposta positiva ao artº 5º da BI considerando as conclusões técnicas destes últimos relatórios, divergentes, em parte, do relatório pericial elaborado no decurso do processo.
E podia fazê-lo, de acordo com os preceitos legais que regem a prova pericial.
Segundo o artigo 388º do Código Civil, “a prova pericial tem por fim a percepção ou apreciação de factos por meio de peritos, quando sejam necessários conhecimentos especiais que os julgadores não possuem, ou quando os factos, relativos a pessoas, não devam ser objecto de inspecção judicial”, determinando o artigo 389º do mesmo diploma legal que “a força probatória das respostas dos peritos é fixada livremente pelo tribunal”.
Livre apreciação da prova que, como sem oscilações tem entendido a doutrina e a jurisprudência, não se confunde com apreciação arbitrária, ou mesmo discricionária, da prova, significando antes a ausência de critérios fixos nessa apreciação, que deverá apenas subordinar-se a critérios de racionalidade, de bom senso, tendo ainda por base regras de experiência comum com suporte nos elementos objectivos vertidos no processo.
Decorre do exposto que o tribunal recorrido podia ter dado como provado o facto constante do artº 5º da BI com base nos pareceres técnicos de fls. 46 e 47 e de fls. 189 e ss elaborado pelo engenheiro F….
Trata-se de relatórios periciais elaborados imediatamente a seguir à ocorrência dos factos, mostrando-se os mesmos bem fundamentados e revelando o seu autor, a testemunha F…, um conhecimento profundo da matéria, apresentando-se o seu depoimento, prestado em audiência, isento e descomprometido.
Efectivamente, em depoimento prestado em audiência de julgamento, a testemunha referiu que tomou conhecimento da cedência da cobertura em Maio de 2010; que foi chamado para ver o que se passava e que fez uma análise de risco. Que o tecto tinha cedido. Que foi o subscritor do 1º relatório onde relatou o risco de colapso de parte da cobertura.
O que observou, aquando da inspecção ao local, foi que um dos elementos principais que suportava a cobertura – a asna - tinha partido; daí a necessidade de escoramento, que colocaram logo na altura para evitar a cedência da cobertura.
Verificou também que havia partes da estrutura – de madeira – que estavam podres e que foi nessa zona que a cobertura havia cedido. Que é uma estrutura muito antiga em madeira a suportar uma cobertura em fibrocimento.
Confirmou que os elementos da estrutura cederam porque estavam podres; que estavam em estado de putrefacção. Que a estrutura está lá para suportar o peso da cobertura. Acha que a estrutura não estava em condições de suportar peso. Havia sinais de térmitas e de fungos na estrutura de madeira.
Confirmou a existência, no local, de obras levadas a cabo pela A., nomeadamente um tecto falso constituído por placas, mas que as fixações do tecto falso são pontuais e que nesse elemento em concreto, fissurado, não estava qualquer carga concentrada. Estava apenas a carga da cobertura.
Esclareceu também a testemunha que não é o peso do tecto falso ou de outra estrutura qualquer que provoca a degradação visível daquele elemento; havia sinais de térmitas – situações que afectam a madeira. Que as fotografias juntas com o relatório mostram isso.
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Ou seja, com base nos pareceres técnicos mencionados, corroborados pelo depoimento da testemunha F…, o tribunal concluiu, bem, em nosso entender, que a deterioração das vigas e vigamentos de madeira de suporte à estrutura da cobertura do imóvel foi causada pela degradação dos próprios materiais, decorrentes da falta de manutenção e reparação dos mesmos.
Aliás, nem os peritos que elaboraram a perícia colegial foram em sentido diverso; apenas acrescentaram que a carga que sobre elas se colocou contribui também para a ruptura da estrutura.
Atente-se que a resposta dada pelos peritos às questões colocadas pelas partes se baseia mais numa concepção geral do que é normal acontecer do que numa análise concreta do que realmente aconteceu.
A confirmar isso está a resposta dada pelos peritos ao quesito 5º da ré sobre se adaptações efectuadas no local arrendado criaram instabilidade na estrutura do edifício, ao que os peritos responderam que “qualquer subcarga na estrutura provoca um acréscimo de risco. No caso em apreço esse risco é agravado pelo estado da estrutura em madeira. Se o mesmo é suficiente para criar instabilidade, só uma análise mais pormenorizada das subcargas colocadas e do actual estado da estrutura do telhado, só assim se pode afirmar que a cobertura se tornou instável. Um facto que aconteceu é que efectivamente existem pelo menos duas asnas que torceram e partiram…”
A essa conclusão também não se opõe o facto – provado – de que a adaptação do espaço do imóvel ao estabelecimento explorado pela A. foi feita sob a inteira responsabilidade da mesma, a seu encargo, fiscalização, responsabilidade técnica e de segurança e de que essas adaptações foram efectuadas sem qualquer estudo prévio ou reforço da estrutura de suporte.
Tendo ficado provada a relação causal entre a ruína da estrutura e a degradação da mesma, a demandar manutenção e reparação por parte do senhorio, dono do imóvel, que para isso foi alertado, por diversas vezes, pela arrendatária, nenhuma relevância assume o facto de a A. não ter elaborado um estudo prévio às obras de adaptação do imóvel.
Nenhum reparo temos pois a fazer à resposta que o tribunal deu ao artº 5º da BI – levado à matéria de facto sob o nº 32.
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Quanto aos artºs 26º, 29º e 31º, os mesmos foram dados como não provados.
Era a seguinte a sua redacção:
Artº 26º “Que ainda suportavam dezenas de aparelhos de televisão?”
Artº 29º “criando instabilidade nessa estrutura?”
Artº 31º “tendo a Autora anuído a tal proposta” (A ré predispôs-se, por sua iniciativa, a reformular a cobertura do arrendado, com a condição da retirada pela A. de todo o equipamento e a seu cargo?)
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A Apelante julga incorrectamente julgados os pontos de facto acima reproduzidos, dizendo que o tribunal deveria tê-los dado como provados, quer com base na perícia efectuada, quer pelos esclarecimentos dos peritos, e, quanto ao último, ainda pelo depoimento da testemunha E….
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Quanto ao artº 26º da Base Instrutória, não temos dúvidas de que o mesmo deveria ter sido dado como provado.
Os peritos, questionados sobre esta matéria responderam o seguinte: “Neste momento não existem aparelhos de televisão. Existem os suportes para os mesmos, que têm o apoio distribuído pelas madres e asnas e por uma estrutura autónoma encastrada nas paredes laterais”
Ou seja, não negam a existência da quantidade de aparelhos, ou de que antes havia existido aparelhos de televisão mas, apenas, do material existente, que, no momento, se limitava a suportes de aparelhos de televisão.
Torna-se evidente que se existiam suportes, existiam, quando o estabelecimento esteve a funcionar, as respectivas televisões. É do conhecimento público e da experiência que o tipo de estabelecimento em causa possui televisões nas pistas de bowling onde são apresentadas as pontuações dos respectivos jogos.
Aliás, nenhuma das testemunhas ouvidas em audiência negou a existência dos aparelhos de televisão (sem os quantificar).
O próprio legal representante da A., H…, no depoimento de parte que prestou na audiência de Julgamento de 21.2.2013 (fls. 329 e ss.), quando questionado sobre o facto quesitado no ponto 26º, sobre o mesmo disse: “esclarece que tinha 8 aparelhos de televisão montados numa viga de ferro que estava colocada de uma parede à outra”.
Ou seja existe prova suficiente nos autos de que existiam no local aparelhos de televisão, sendo, assim, de alterar a matéria de facto nessa parte, dando-se como provado o artº 26º da BI.
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O mesmo se não passa quanto ao quesito 29º.
Importava saber se as adaptações efectuadas pela Autora no local arendado criaram, ou não, instabilidade na estrutura do mesmo.
Contrariamente ao alegado pela recorrente, nenhuma prova foi feita nesse sentido. Auditada toda a prova testemunhal produzida, nenhum depoimento afirmou tal facto.
Por outro lado, os peritos, no relatório pericial elaborado, questionados quanto ao ponto 5º dos quesitos da ré, se as adaptações efectuadas no local arrendado criaram instabilidade na estrutura do edifício, os peritos responderam que “qualquer subcarga na estrutura provoca um acréscimo de risco. No caso em apreço esse risco é agravado pelo estado da estrutura em madeira. Se o mesmo é suficiente para criar instabilidade, só uma análise mais pormenorizada das subcargas colocadas e do actual estado da estrutura do telhado, só assim se pode afirmar que a cobertura se tornou instável. Um facto que aconteceu é que efectivamente existem pelo menos duas asnas que torceram e partiram…”
Ou seja, não se pode concluir do relatório pericial a prova do artº em questão, pelo que é de manter a resposta negativa dada ao artº 29º da BI
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E o mesmo se passa quanto ao artº 31.
A única testemunha que depôs sobre o mesmo foi E…, tendo o tribunal recorrido considerado que a mesma depôs “de forma vaga, imprecisa e inconsistente, revelando mesmo um depoimento interessado e tendencial face à ligação laboral que o une à Ré”.
Ouvido o mesmo depoimento, a testemunha afirmou, de facto, que quem tratou sempre com a B… foi directamente o Senhor I… e que esteve presente nalgumas reuniões que ele teve com o Sr. H….
E que numa reunião em que assistiu, em que estava presente o Senhor I… e o Senhor H…, o Senhor I… disse ao Senhor H…: “Senhor H…, eu monto-lhe um telhado novo e um vigamento novo mas na condição do Senhor tirar todo o seu material para eu poder pôr o tecto novo. E o Senhor H…, na altura, disse sim Senhor, que concordava. Ele disse que estava bem”.
Auditado o depoimento da testemunha, não estamos em condições de poder afirmar com segurança, como o fez o tribunal recorrido, de que a testemunha depôs “de forma vaga, imprecisa e inconsistente, revelando mesmo um depoimento interessado e tendencial face à ligação laboral que o une à Ré”.
Consideramos, no entanto, que se trata de uma prova pouco consistente, baseada apenas num único depoimento, sem qualquer apoio, nomeadamente documental, o que não deixa de ser estranho, dada a quantidade de correspondência trocada entre as partes, onde é referida a questão da retirada do material do local arrendado e nenhuma referência é feita à anuência, feita pela A., a essa retirada do material a expensas suas.
Ora, resultando dos autos que a questão da retirada dos materiais colocados pela A. no locado era um dos pontos de discordância das partes, causa-nos estranheza que se tal reunião ocorreu, e houve da parte da A. concordância com as exigências da ré, nenhuma referência lhe seja feita na correspondência – abundante – trocada entre as partes.
Ou seja, consideramos que apenas com base no depoimento da testemunha E…, a prova do artº em questão se afigura pouco consistente e daí mantermos a decisão proferida na 1ª Instância quanto à resposta dada ao artº 31º da BI.
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Perante a matéria de facto dada como provada, temos como certo que a responsabilidade pela deterioração dos vigamentos existentes no arrendado é da ré, na qualidade de senhoria, sobre quem recaía o dever de manter em bom estado a estrutura do imóvel arrendado.
Consequentemente, sobre a ré recai também o dever de repor esse vigamento em bom estado, assim como o telhado, para o que tem de levantar as obras que foram levadas a cabo pela A. e repô-las novamente no estado em que se encontravam, após efectuada a reparação.
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A presente acção foi instaurada em 10.2.2011, altura em que se encontrava já em vigor o NRAU, aprovado pela Lei n.º 6/2006, de 27/02 (cfr. art. 65º, n.º 2 deste diploma legal, onde se estatui que as disposições previstas no mesmo, à excepção do regime legal enunciado nos seus artigos 63º e 64º - irrelevantes para o objecto do presente litígio -, entram em vigor 120 dias após a sua publicação – logo, em 27/06/2006) pelo que, em função do disposto no seu art. 26º, a pretensão de tutela judiciária deduzida nos autos pela Autora se encontra submetida ao regime legal enunciado no NRAU.
E de acordo com a matéria de facto provada, em 30 de Abril de 2006, autora e ré subscreveram o documento vertido em escrito particular, nominado como “Contrato de Arrendamento Comercial”, através do qual a ré declarou dar de arrendamento à autora e esta declarou tomar de arrendamento o imóvel propriedade da primeira, que é um armazém com a área coberta de 800 m2, e se encontra sito à …, número …, na cidade de Vila do Conde.
Nesse documento as partes declararam também fixar o valor da renda mensal devida pelo arrendamento, no montante de € 2.646,94, sendo o prazo estipulado pelas partes para a vigência do contrato de doze anos e cinco meses, com início em 1 de Maio de 2006.
No contrato as partes declararam ainda que o imóvel arrendado se destinava à actividade de bowling, lazer e entretenimento, tendo a autora instalado no locado um estabelecimento misto de animação e diversão familiar, que gira sob a firma/marca “D…”, integrado por diverso tipo de máquinas de jogos e outras diversões.
Estamos perante um contrato de arrendamento urbano, que é o contrato pelo qual uma das partes concede à outra o gozo temporário de um imóvel, no todo ou em parte, mediante retribuição, tendo o arrendamento como fim o comércio, ou seja, trata-se de um arrendamento para fins não habitacionais (no caso, para fins comerciais).
O contrato de arrendamento é configurável como um contrato bilateral ou sinalagmático, uma vez que dele decorre, entre outras obrigações acessórias, a obrigação para o senhorio de entregar e assegurar ao arrendatário o gozo temporário da coisa arrendada para os fins a que se destina (cfr. art. 1031º do Código Civil), mediante a obrigação deste de lhe pagar a renda (art. 1038º, al. a) do mesmo Código).
A doutrina e a jurisprudência admitem que na locação (e, portanto, no arrendamento em especial) existe correspectividade entre as obrigações do senhorio de entregar ao locatário a coisa locada e de lhe assegurar o respectivo gozo e a obrigação de pagamento de renda por parte deste (ver, entre outros, Vaz Serra, “Excepção de contrato não cumprido (exceptio non adimpleti contractus)”, BMJ, nº 67,1957, pp. 22 e 23, Antunes Varela, “Das Obrigações em Geral”, Vol. I, 10ª edição pg. 400, Calvão da Silva, “Cumprimento e Sanção pecuniária Compulsória”, 4ª ed. p. 332, nota 599, e José João Abrantes, “A Excepção de Não Cumprimento do contrato no Direito Civil Português, Conceito e fundamento, Coimbra, 1986, pag. 43. Na jurisprudência, Ac. RP de 11.12.2003 (ww.dgsi.pt), citados por Gravato Morais em “Falta de pagamento da renda no arrendamento urbano”, Almedina, pag. 204 e ss.).
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Ora, como resulta da decisão recorrida – a cuja fundamentação, nesta parte, aderimos, sem reservas -, “…Para além da entrega ao locatário da coisa locada (cfr. al. a), de harmonia com o disposto no artigo 1031.º al. b) do Código Civil (…), constitui obrigação do senhorio assegurar ao inquilino o gozo desta para os fins a que a coisa se destina.
Dispõe por sua vez o artigo 1032.º que, quando a coisa locada apresentar vício que lhe não permita realizar cabalmente o fim a que é destinada, ou carecer de qualidades necessárias a esse fim ou asseguradas pelo locador, considera-se o contrato não cumprido: b) se o defeito surgir posteriormente à entrega, por culpa do locador. Já se o defeito for da responsabilidade do locatário não é aplicável o disposto no artigo anterior – cfr. artigo 1033.º al. c).
Devendo considerar-se incluído naquele dever genérico pressuposto do artigo 1031.º citado, a obrigação específica a cargo do locador de efectuar as obras e reparações necessárias a assegurar o gozo e fruição da coisa locada por parte do inquilino para a satisfação do fim previsto no contrato.
Daí que se preveja no artigo 1074.º n.º 1, quais as obras a cargo da responsabilidade do senhorio, isto é, as obras de conservação, ordinárias ou extraordinárias, requeridas pelas leis vigentes ou pelo fim do contrato, salvo estipulação em contrário.
Na situação vertente, apurou-se que, a autora instalou no locado que a ré lhe deu de arrendamento um estabelecimento misto de animação e diversão familiar, que gira sob a firma/marca “D…”, integrado por diverso tipo de máquinas de jogos e outras diversões.
Por sua vez, o imóvel locado, é um armazém com mais de cinquenta anos, edificado em estrutura de paredes de alvenaria e tijolo, encimadas por uma cobertura em telha “Lusalite”, aplicada sobre uma estrutura de vigamento em madeira, no qual a autora instalou: quadros eléctricos, cablagem e instalação eléctrica, sistema de iluminação adequada às actividades a desenvolver no locado, aplicação de revestimentos de paredes e, tectos falsos, aplicação de sistemas de ventilação e, de ar condicionado canalizado em condutas adequadas para o efeito, pintura do locado e sua decoração, por aplicação de telas de revestimento e outras pinturas.
Provado está ainda que durante toda a vigência do contrato, a senhoria ré nunca procedeu à realização de quaisquer obras de reparação e manutenção da estrutura do edifício, nomeadamente da sua cobertura.
E que em 14 de Dezembro de 2006, a autora remeteu à ré, a comunicação escrita constante de fls. 53 dos autos, denunciando a existência de infiltrações de águas pluviais a partir da cobertura do locado, causadas pelo seu estado de deficiente conservação e, esta, apesar de ter recebido tal comunicação, não procedeu a qualquer reparação no locado.
Já no decurso da primeira semana de Maio de 2010 a Autora deu conhecimento à ré de vários defeitos na estrutura de suporte da cobertura do imóvel através de contacto directo com os serviços desta sociedade, a qual fez acompanhar as inspecções efectuadas ao locado por representantes por si designados.
Acabando por enviar à Ré uma carta, datada de 17 de Maio de 2010, constante de fls. 42 a 45 dos autos na qual lhe comunica formalmente tais defeitos, tendo em vista os efeitos legais, mormente os resultantes do postulado por artigo 1038º al. h) e igualmente interpelar para a imediata realização das obras de reparação e, de substituição da cobertura do imóvel que se mostrem necessárias a assegurar a estabilidade e segurança do mesmo e, a garantir a sua cabal utilização para os fins previstos no contrato.
Em 15 de Junho de 2010, a autora remeteu à ré uma segunda comunicação, constante de fls. 56, declarando considerar vencida e, em mora, a obrigação de realização das reparações urgentes destinadas a eliminar os vícios existentes no locado e que antes tinha denunciado.
A ré, apesar de ter recebido as referidas comunicações, não procedeu contudo a quaisquer reparações do imóvel e vem recusando a realização das obras de reparação do imóvel, alegando não aceitar custear a reconstrução das benfeitorias aplicadas, a desmontagem e armazenamento de máquinas, e equipamentos existentes no locado e, bem assim rejeitando assumir a responsabilidade pelos prejuízos decorrentes da impossibilidade de utilização do mesmo decorrente do risco iminente de ruína que apresenta.
Por esse motivo, e em 30 de Agosto de 2010, a autora comunica à ré que, atenta a denuncia já efectuada dos defeitos e, a interpelação para a respectiva regularização, mantém, até que se mostrem integralmente repostas as condições de funcionamento do estabelecimento, a recusa do cumprimento da obrigação do pagamento da renda (…).
Ora, a autora manteve instalado no imóvel em causa o aludido estabelecimento comercial, em funcionamento até 4 de Maio de 2010 e os defeitos que detectou na primeira semana de Maio de 2010 resultaram da deterioração das vigas e vigamentos de madeira de suporte à estrutura da cobertura do imóvel, sendo causados por falta de manutenção dessas vigas e vigamentos de madeira, conforme resultou demonstrado, sendo que até àquela data os mesmos não se mostravam visíveis e não eram de conhecimento da autora.
Para além disso, o risco de derrocada da estrutura de vigamento, e cobertura do edifício, obrigou ao encerramento do espaço comercial e à interdição de circulação de pessoas no interior do locado desde essa data.
Acresce que, para minimizar o risco de ruína a autora fez escorar a estrutura de vigamento da cobertura do imóvel, por aplicação de escoras adequadas em número de nove.
Por outro lado, não resultou provada a factualidade invocada pela ré no sentido de imputar ao inquilino/autora, pela imprudente utilização do locado, o estado de degradação ou deterioração das vigas e vigamentos de madeira de suporte à estrutura da cobertura do imóvel (…)
Na verdade, o facto de se ter apurado que a adaptação do espaço do imóvel ao estabelecimento instalado pela autora foi feita sob a sua inteira responsabilidade, a seu encargo, fiscalização, responsabilidade técnica e de segurança e que tais adaptações foram efectuadas sem qualquer estudo prévio ou reforço da estrutura de suporte, não permite imputar àquela uma imprudente utilização do locado e a sua posterior deterioração impeditiva da sua plena fruição não só em termos de dignidade mas sobretudo em termos de segurança.
Pelo que se conclui, inevitavelmente, que as obras de reparação da estrutura da cobertura do imóvel constitui obrigação da senhoria ré, porque integra o cumprimento da obrigação principal, qual seja, a de assegurar o gozo do locado ao locatário, como atrás se fez referência.
Com efeito, competia à senhoria ré, a obrigação de assegurar o gozo do imóvel arrendado para os fins previstos no contrato, mormente assegurando que o mesmo possui as condições necessárias ao desenvolvimento da actividade comercial nele visada durante toda a sua vigência.
Sendo certo que a autora, em obediência ao estatuído no artigo 1038º al. h), assim que tomou conhecimento dos assinalados defeitos, notificou a ré da sua existência, solicitando a respectiva reparação, o que não surtiu qualquer efeito, pois esta nada fez, até ao momento presente.
Tem pois indiscutível fundamento legal a pretensão da autora quanto à condenação da ré na realização das obras necessárias à devolução ao locado das condições necessárias ao desenvolvimento da actividade comercial nele desenvolvida.
Resultando da omissão da ré, ou seja da sua total inércia, que a mesma se encontra em mora relativamente á obrigação de efectuar as reparações necessárias a assegurar o gozo do locado, pelo menos desde Maio de 2010.
Assiste, deste modo, à autora o direito de requerer ao tribunal a condenação da ré na execução específica da obrigação violada, através da sua condenação na execução da prestação devida, traduzida na realização das obras de reparação e/ou substituição da cobertura do imóvel e respectiva estrutura de suporte, a expensas suas.
E como na situação em apreço, o incumprimento do locador ora ré, determina o impedimento total de gozo do imóvel por parte da autora, já que o risco de ruína da cobertura impede a sua utilização total, demonstra-se legitima a decisão desta de suspender o pagamento das rendas, com fundamento na excepção de não cumprimento do contrato, atento o disposto nos artigos 428º, 762º, 1031º als. a) e b) e 1038º al. a), o que aliás expressamente invocou perante a ré como fundamento do seu não pagamento.
Acresce que, mostrando-se incumprida a obrigação do senhorio de assegurar o gozo do locado para o fim contratualmente previsto, devendo efectuar todas as reparações ou outras despesas essenciais ou indispensáveis, se o não fizer após aviso do locatário, falta culposamente ao cumprimento de tal obrigação, sendo responsável pelos prejuízos que causa ao credor, conforme resulta do preceituado nos artigos 562º e seguintes.
Não existem pois dúvidas de que a ré, para além da execução das obras de reparação e/ou substituição da cobertura do imóvel e respectiva estrutura de suporte, tem obrigação de repor o imóvel no estado em que se encontrava, suportando a suas expensas, todos os trabalhos necessários à reposição das obras e benfeitorias executadas pela autora, e que supra se referiu”.
Perante a matéria de facto provada – mesmo com a alteração que foi feita ao artº 26º da BI – temos de concluir que nenhum reparo nos merece a decisão proferida quanto à obrigação da ré de proceder às obras de reparação da estrutura da cobertura do imóvel (e da própria cobertura) sendo da sua responsabilidade também a execução das obras que forem necessárias levar a cabo para repor o local arrendado no estado em que se encontrava antes da ocorrência das deficiências e do encerramento do estabelecimento.
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Da inexistência de autorização para a realização das obras:
Alega ainda a recorrente, para afastar a sua responsabilidade pela reparação do locado, que o contrato de arrendamento outorgado entre as partes impunha vários deveres para a arrendatária, de entre os quais se destaca a necessidade de autorização para efectuar obras no locado.
Nenhum facto consta, no entanto, da matéria de facto provada que nos leve a concluir que as obras levadas a cabo pela A., de adaptação do locado ao fim a que o mesmo se destinava – que ficou consignado expressamente no contrato (No contrato as partes declararam que o imóvel arrendado se destinava à actividade de bowling, lazer e entretenimento) -, tenham sido realizadas sem o conhecimento ou o consentimento da senhoria.
Aliás, pela testemunha J…, autor do projecto de arquitectura do estabelecimento foi dito que o projecto de arquitetura tem um requerente e, no caso, esse requerente foi a ré C…, embora a sua cliente fosse a A. Além disso, os projectos da especialidade foram feitos pela C….
Improcedem, assim, também nesta parte as conclusões das alegações da recorrente.
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Alega também a recorrente que era dever da A., nos termos do contrato celebrado (cláusula 7ª nº 2), contratar e manter actualizado, para o local a arrendar, e durante o tempo em que vigorasse o arrendamento em questão, um seguro multi-riscos.
Que, se estivesse cumprida aquela obrigação – a haver prejuízos – os mesmos estariam cobertos por um seguro.
Efectivamente, nos termos do ponto 2 da cláusula 7ª do contrato, a arrendatária obriga-se a contratar um seguro multi-riscos cobrindo equipamento, mobiliário, mercadorias, outro material próprio e benfeitorias realizadas nas instalações contra riscos decorrentes da actividade da segunda.
Não há, no entanto, qualquer nexo causal entre a obrigação de segurar (da única conveniência da A.) e a questão em análise, que se prende com as obras necessárias a realizar no locado, pelo que improcedem, igualmente, quanto a esta questão, as conclusões das alegações da recorrente.
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Da questão da liquidação dos prejuízos da A. em sede de liquidação posterior:
Alega finalmente a recorrente que mesmo a aceitar-se a sua responsabilidade nunca a mesma poderia vir a ser condenada nos prejuízos cuja liquidação se relegou para o incidente respectivo.
Diz que a Ré alegou factos e quantificou um pedido respeitante a alegados prejuízos de exploração e carreou meios de prova para o efeito, mas não os provou.
Ora, o tribunal recorrido parte de uma construção que implica a possibilidade da autora refazer a prova que não logrou fazer na acção de condenação, o que significaria subverter princípios fundamentais em Processo Civil. Ou seja, a ré considera não poder a autora provar em sede de liquidação o que não logrou provar na acção.
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E temos de concordar com a recorrente nesta parte.
Nos termos do artº 661º nº2 do CPC “Se não houver elementos para fixar o objecto ou a quantidade, o tribunal condenará no que vier a ser liquidado, sem prejuízo da condenação imediata na parte que já seja líquida”.
Ou seja, sempre que o tribunal verificar o dano mas não tiver elementos para determinar o seu valor, quer se tenha pedido um montante determinado ou formulado um pedido genérico, cumprir-lhe-á relegar a fixação do quantum indemnizatório para o que se vier a liquidar em sede de incidente de liquidação. Não se está a conceder ao A. do pedido uma nova possibilidade de provar os danos, porque esses já ficaram provados na acção declarativa, mas somente de os quantificar. Só no caso de não se ter provado a existência dos danos é que se forma caso julgado material sobre tal objecto, impedindo nova prova do facto na acção executiva (Ac STJ de 20.9.2005, www.dgsi.pt).
A falta de elementos a que alude o artº 661º nº 2 do CPC deverá resultar, no entanto, não do fracasso da prova na acção declarativa sobre o objecto ou quantidade, mas sim como consequência de ainda não se conhecerem com exactidão as unidades componentes da universalidade ou de ainda não se terem revelado ou estarem em evolução algumas ou todas as consequências do facto ilícito no momento da propositura da acção declarativa.
A carência de elementos não se refere à inexistência de prova dos factos já produzidos e que foram alegados e submetidos a prova, embora se não tivessem provado, mas sim á inexistência de factos provados, porque estes ainda não eram conhecidos ou estavam em evolução aquando da propositura da acção, ou que, como tais se apresentavam no momento da decisão de facto. A interpretação do artº 661º nº2 do CPC aludida é a única que torna harmonizáveis o dito preceito com os artºs 471º nº 1e 672º do CPC com o artº 342º nº1 do CC.
No caso presente, todos os acontecimentos ocorrerem antes da propositura da acção declarativa; a A. tinha então ao seu dispor todos os elementos para fazer a prova dos factos por si articulados. Se a prova fracassou, a lei não permite às partes que vão à procura de melhor prova, para, numa segunda oportunidade, virem a conseguir o objecto e a quantidade pensados mas não provados no momento e local próprios (Ac STJ, de 17.1.2006, Sumários, Jan. 2006).
Como bem refere a recorrente, essa segunda oportunidade que o tribunal desse à parte acarretaria o desrespeito manifesto pelas regras que estabelecem os momentos e lugares próprios para as diferentes fases processuais (Ac STJ de 6.7.2005, AD 532º 707).
Só nos casos em que no momento da formulação do pedido ou da prolação da sentença não haja elementos para fixar o objecto ou a quantidade do pedido pode aplicar-se a norma do artº 661º nº2 do CPC, ou seja, relegar para momento posterior a liquidação de um crédito. A remissão para liquidação não pode fazer-se em razão da falta de prova dos factos, mas tão somente por inexistência de factos provados, por estes não serem conhecidos ou estarem em evolução no momento em que foi instaurada a acção ou em que foi proferida a decisão que dirimiu a matéria de facto controvertida (Ac RL de 20.4.2005 dgsi.pt).
É violadora do princípio do caso julgado a decisão que remete para liquidação, quando o A., não obstante formular o pedido, não consegue provar as consequências do facto danoso (Ac RP de 29.9.1997: BMJ, 469º, 655).
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Fazendo aplicação dos preceitos e princípios enunciados ao caso dos autos vemos que a A. alegou os prejuízos nos artºs 37º a 41º e 44º a 51º da p.i.
Alegou essencialmente que:
- O risco de derrocada da estrutura de vigamento e cobertura do edifício obrigou ao encerramento do espaço comercial e à interdição de circulação de pessoas no interior do locado desde essa data. (artº 38º da p.i. e 7º da base instrutória)
- Para minimizar o risco de ruína a autora fez escorar a estrutura de vigamento da cobertura do imóvel, por aplicação de escoras adequadas em número de nove. (artº 39º da p.i. e 8º da base instrutória)
- No aluguer dessas escoras, a autora despendeu, até à data de Dezembro de 2010, o montante de € 160,20. (artº 40º da p.i. e 9º da base instrutória)
- A que acrescerá o valor de € 17.80, por cada mês em que se mantiverem aplicadas as escoras no local. (artº 41º da p.i. e 10º da base instrutória)
- O circunstancialismo descrito em 7) levou a que a autora deixasse de auferir, desde Maio de 2010, as receitas provenientes da actividade do estabelecimento. (artº 45º da p.i. e 11º da base instrutória)
- Considerando o valor de receitas bruto, com IVA incluído, ponderado dos anos de 2010 e no primeiro quadrimestre de 2011, a receita média resultante da exploração normal do estabelecimento é de € 12.850,00. (artº 46º da p.i. e 12º da Base Instrutória)
- Nos primeiros quatro meses do ano de 2010 a A. registou no estabelecimento um volume de vendas acumulado de € 46.665,43 (incluindo o IVA na prestação de serviços). (artº 47º da p.i. e 13º da BI)
- Sendo de € 168.389,12 o valor das vendas do ano de 2010. (artº 47º da p.i. e 14º da BI)
- Nos meses de Verão - de Junho a Setembro – os valores de facturação do estabelecimento são superiores em cerca de 23,5% relativamente à média apurada do primeiro quadrimestre do ano de 2010. (artº 48º da p.i. e 15º da BI)
- Em consequência da impossibilidade de utilização do estabelecimento no período de Maio a Dezembro de 2010, a A. deixou de auferir as receitas da sua exploração em montante não inferior a € 102.800. (artº 49º da p.i. e 16º da BI)
- A A tem vindo a suportar os custos fixos e de estrutura que estão associados ao estabelecimento, nomeadamente salários, fornecimentos de electricidade e água, salários e encargos sociais com funcionários, e despesas de manutenção que montam ao valor de € 3.050,00 por mês. (artº 50º da p.i. e 17º da BI)
- Totalizando o quantitativo de € 24.400,00 no período compreendido entre Maio e Dezembro de 2010. (artº 50º da p.i. e 18º da BI)
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Tais factos foram levados à Base Instrutória, porque impugnados pela ré na contestação e sobre os mesmos incidiu a prova respectiva – a cargo da A -, tendo os mesmos merecido do tribunal a resposta de “Não provado” (os itens 12, 13, 14, 15, 16, 17 e 18).
O tribunal fundamentou a sua convicção da seguinte forma: “No que tange à factualidade vazada nos itens 12º a 18º da BI a testemunha K…, que presta serviços de contabilidade para a A. não logrou esclarecer com exactidão e com rigor toda essa matéria de facto, e daí a resposta negativa que obtiveram.
Com efeito a mesma relatou factos contraditórios e não credíveis, pouco consistentes, não alicerçados em documentos contabilísticos oficiais e daí não alcançou o convencimento deste tribunal.
Limitou-se pois a extrair conclusões e deduções por estimativa e médias de documentos particulares por si elaborados”.
Ou seja, a A. deduziu um pedido líquido na alínea e): A condenação da ré a indemnizar a autora de todos os prejuízos sofridos em razão do incumprimento contratual, que compreendem:
1. A quantia de € 160,20 (cento e sessenta euros e vinte cêntimos), correspondente ao custo de aluguer de escoras do vigamento, conforme alegado sob artigo 40.º, a que acrescerá o valor de € 17,80, por cada mês contado a partir de Dezembro de 2010 em que as mesmas se mantiverem aplicadas no local, a liquidar em tempo;
2. A quantia de € 102.800,00 (cento e dois mil e oitocentos euros), correspondente às receitas da exploração do estabelecimento instalado no locado que a autora deixou de auferir no período de Maio a Dezembro de 2010 e, alegados sob os artigos 44.º a 49.º precedentes, acrescidos dos demais que seriam percebidos após essa data e até à reposição do locado em normais condições de exploração e funcionamento do estabelecimento, a liquidar em tempo;
3. A quantia de € 24.400,00 (vinte e quatro mil e quatrocentos euros), correspondente às despesas de manutenção do estabelecimento - custos fixos e de estrutura que lhe estão associados - alegados sob os artigos 50.º a 51.º precedentes, acrescidos dos demais em que incorrerá após essa data e, até à reposição do locado em normais condições de exploração e funcionamento do estabelecimento, a liquidar em tempo.
Além de deduzir um único pedido líquido (composto por vários pedidos líquidos parcelares), a A. indicou prova para os factos substanciados nesse pedido: arrolou, pelo menos uma testemunha – K… – que presta serviços de contabilidade para a A., e não logrou convencer o tribunal quanto á veracidade dos factos a que depôs.
Ora, cabia à A. não só a alegação como a prova dos factos que fundamentam o seu pedido: factos esses consistentes nos danos sofridos em consequência da actuação da ré.
Como consta da sentença recorrida “Já no que concerne ao pedido de indemnizatório formulado pela autora, no sentido de que a ré seja condenada a pagar-lhe o valor das receitas cessantes que deixou de auferir, em razão do encerramento do estabelecimento, bem como nas que deixará de auferir enquanto persistir o incumprimento da obrigação locativa a seu cargo, ao abrigo do disposto no artigo 564º, dir-se-á que apenas resultou demonstrado líquido o custo do aluguer de escoras do vigamento, no montante de € 160,20 (cento e sessenta euros e vinte cêntimos), a que acrescerá o valor de € 17,80, por cada mês contado a partir de Dezembro de 2010 em que as mesmas se mantiverem aplicadas no local, a liquidar posteriormente – vide respostas dadas aos quesitos 8º, 9º e 10º da base instrutória.
Pois no que se refere às calculadas receitas da exploração do estabelecimento instalado no locado que a autora deixou de auferir no período de Maio a Dezembro de 2010, estas não ficaram apuradas – cfr. respostas negativas que mereceram os quesitos 12º a 18º da base instrutória (…)”.
“Por último, e no que tange às invocadas despesas de manutenção do estabelecimento - custos fixos e de estrutura que lhe estão associados - não ficou provado que a Autora tenha vindo a suportar esse tipo de despesas, concretamente as mencionadas no quesito 17º da base instrutória, pelo que não é devida a quantia de € 24.400,00 peticionada, improcedendo o pedido nessa parte”.
Concordamos integralmente com o raciocínio exposto quanto à falta de prova dos factos quesitados.
Não podemos já concordar com a conclusão que se extrai da falta de prova das receitas da exploração do estabelecimento instalado no locado que a autora deixou de auferir no período de Maio a Dezembro de 2010: “e daí que em relação aos prejuízos atinentes às perdas de receitas provenientes da actividade desenvolvida pela autora, não é possível quantificá-los, relegando-se a sua liquidação para o competente incidente, ao abrigo do disposto no artº 661º, nº 2, do Código de Processo Civil”.
Aliás, não vemos nenhuma razão para distinguir as duas situações: a falta de prova das receitas e a falta de prova dos alegados custos fixos da A.
À luz do que acima se disse, quanto à aplicação do artº 661º nº 2 do CPC, a improcedência dos pedidos, em ambas as situações, impunha-se.
Merece assim a sentença recorrida ser alterada nesta parte.
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Sumário do Acórdão (artº 713º nº 7 do CPC):
I – É ilegítimo o exercício do direito, por parte do senhorio, de resolução do contrato de arrendamento com base na falta de pagamento das rendas, após ter sido o mesmo notificado pela arrendatária de que iria deixar de pagar as rendas, invocando, para o efeito, o instituto da excepção do incumprimento do contrato, com base no incumprimento do mesmo, por parte do senhorio
II – Sendo da responsabilidade do senhorio fazer as obras no locado, a fim de o inquilino poder usufruiu do gozo do imóvel para os fins contratados, deve aquele proceder também a todas as obras que contendam com a reparação do mesmo, nomeadamente retirando do local todos os equipamentos que ali foram colocados pela arrendatária e voltando a colocá-los no seu local, findas as obras.
III- A falta de elementos a que alude o artº 661º nº 2 do CPC deverá resultar, não do fracasso da prova na acção declarativa sobre o objecto ou quantidade, mas sim como consequência de ainda não se conhecerem com exactidão as unidades componentes da universalidade ou de ainda não se terem revelado ou estarem em evolução algumas ou todas as consequências do facto ilícito no momento da propositura da acção declarativa.
IV – Pelo que, é violadora do princípio do caso julgado a decisão que remete para liquidação, quando o A., não obstante formular o pedido, não logrou provar as consequências do facto danoso.
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Decisão:
Pelo exposto:
Julga-se Parcialmente Procedente a Apelação, alterando-se a decisão recorrida no seguinte sentido:
1. Condena-se a Ré a executar as obras de reparação e/ou substituição da cobertura do imóvel e respectiva estrutura de suporte do imóvel locado, de modo a assegurar o respectivo gozo pela Autora e a permitir a respectiva utilização para os fins previstos no contrato;
2. Condena-se a Ré a repor o estabelecimento instalado no locado no estado em que se encontra nesta data, suportando a expensas suas, todos os trabalhos necessários à reposição das obras e benfeitorias executadas pela autora, e bem assim à remoção, armazenagem e subsequente remontagem de máquinas e equipamentos nele instalados, que sejam afectados pela execução da obra aludida no número precedente;
3. Condena-se a Ré a executar as obras e trabalhos peticionados aludidos nos números precedentes, em prazo útil não superior a trinta dias, por si directamente, suportando integralmente os respectivos custos, sob pena de não o fazendo poderem os mesmos ser executados por terceiro a expensas da Ré;
4. Reconhece-se a legitimidade da Autora de invocação de excepção de não cumprimento do contrato e consequente recusa de pagamento da renda, declarando ainda inválida a declaração resolutiva do contrato de arrendamento formulado pela ré com fundamento em tal facto e o mesmo subsistente com todas as consequências legais;
5. Condena-se a Ré a indemnizar a Autora dos prejuízos sofridos em razão do incumprimento contratual, concretamente a quantia de € 160,20 (cento e sessenta euros e vinte cêntimos), correspondente ao custo de aluguer de escoras do vigamento, a que acrescerá o valor de € 17,80 por cada mês, contado a partir de Dezembro de 2010 em que as mesmas se mantiverem aplicadas no local, a liquidar oportunamente.
6. Absolve-se a Ré do demais pedido pela Autora.
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Custas (da Apelação) por Recorrente e Recorrida, na proporção de 3/4 para a 1ª e 1/4 para a 2ª.

Porto, 14.1.2014.
Maria Amália Santos
José Igreja Matos
João Diogo Rodrigues