Acórdão do Tribunal da Relação do Porto | |||
Processo: |
| ||
Nº Convencional: | JTRP00042457 | ||
Relator: | AIRISA CALDINHO | ||
Descritores: | SUSPENSÃO PROVISÓRIA DO PROCESSO RECURSO | ||
Nº do Documento: | RP200904202033/08.0PBMTS-A.P1 | ||
Data do Acordão: | 04/20/2009 | ||
Votação: | UNANIMIDADE | ||
Texto Integral: | S | ||
Privacidade: | 1 | ||
Meio Processual: | REC PENAL. | ||
Decisão: | REJEITADO O RECURSO | ||
Indicações Eventuais: | 4ª SECÇÃO - LIVRO 366 - FLS 192. | ||
Área Temática: | . | ||
Sumário: | A decisão do juiz de instrução de não concordância com a suspensão provisória do processo proposta pelo Ministério Público, durante o inquérito, é irrecorrível. | ||
Reclamações: | |||
Decisão Texto Integral: | DECISÃO SUMÁRIA * I. No processo sumário n.º 2033/08.PBMTS do ..º Juízo Criminal do Tribunal Judicial de Matosinhos, o Ministério Público interpôs recurso da decisão do JIC que não deu a sua concordância à suspensão provisória do processo por si proposta.Da motivação do recurso extrai as seguintes conclusões: - “… 1 - O consentimento judicial à suspensão provisória do processo justifica-se pela necessidade de evitar a aplicação de injunções ou regras de conduta arbitrárias ou desproporcionadas; 2 - Num processo de estrutura acusatória, o poder judicial está, sob pena de perder à sua imparcialidade e de «agir em causa própria», vinculado pelo pedido do Ministério Público/assistente; 3 - Assim, ao discordar da suspensão provisória do processo por entender que, em concreto, a culpa do arguido é elevada e as injunções e regras de conduta insuficientes, a Ma juíza excedeu os seus poderes, substituiu-se ao Ministério Público e violou o princípio do acusatório, consagrado no artigo 32.°, n.° 5, da CRP; 4 - A referida decisão violou, ainda, os artigos 11.° e 12.° da Lei n.° 51/2007, de 31 de Agosto (que definiu os objectivos, prioridades e orientações de política-criminal para o biénio de 2007-2009) que preconizam a aplicação da suspensão provisória do processo ao crime de condução de veículo em estado de embriaguês ou sob a influência de estupefacientes ou substâncias psicotrópicas; 5- Ainda que, porventura, assim não seja, sempre se dirá que, no caso concreto nem a culpa do arguido é elevada, nem as injunções e regras de conduta propostas insuficientes para satisfazer as necessidades preventivas; 6 - sendo que, não só eventual (e provável) condenação em pena de multa e inibição de conduzir não satisfaz as exigências de prevenção geral melhor do que as injunções pelo M°P° decididas e pelo arguido aceites -- sendo de notar que a decidida e aceite obrigação de frequência do curso sobre condução segura é o que os Juízes costumam aplicar, nas respectivas sentenças, a arguidos não primários e para casos de suspensão de execução de penas de prisão --, como na fundamentação das prioridades e orientações da política criminal - cfr. o ponto 3 do anexo à citada Lei n° 51/2007, de 31/8 --, pensou o legislador dever a pretendida redução da sinistralidade rodoviária ser obtida com recurso às medidas enumeradas no art° 12° da mesma Lei, sendo a primeira de tais medidas, no que ao crime de condução de veículo em estado de embriaguês respeita, infracção que vem prevista no artigo anterior, a agora indeferida suspensão provisória do processo; 7 – e sendo que, conforme dispõe o artº 9º, nº 3, do C.Civil, “na fixação do sentido e alcance da lei, o intérprete presumirá que o legislador consagrou as soluções mais acertadas e soube exprimir o seu pensamento em termos adequados”. 8 – Por isso mesmo, a discordância judicial com a suspensão provisória do processo violou o disposto nos artigos 384º e 281º do Código de Processo Penal, 11º e 12º, da referida Lei nº 51/2007 e artº 9º, nº 3, do C.Civil.” Neste Tribunal, o Ex.mo Procurador-Geral Adjunto deu o seu parecer, defendendo o não provimento do recurso. II. Apreciando a questão tal como ela emerge dos autos temos que o Ministério Público propôs a suspensão provisória do processo em condições que não mereceram a concordância do JIC, com o que o Digno Magistrado do Ministério Público não se resignou, com fundamentos segundo os quais, em síntese, o juiz tem de dar sempre a sua concordância quando o Ministério Público decide suspender provisoriamente um processo. Dispõe o art. 281.º, nº 1, do CPP: “Se o crime for punível com pena de prisão não superior a 5 anos ou com sanção diferente da prisão, o Ministério Público, oficiosamente ou a requerimento do arguido ou do assistente, determina, com a concordância do juiz de instrução, a suspensão provisória do processo, mediante a imposição ao arguido de injunções e regras de conduta, sempre que se verificarem os seguintes pressupostos: …” A argumentação do recorrente premeia o juiz de instrução com uma capitis diminutio que não foi intenção do legislador definir, ao exigir a sua concordância para a suspensão provisória do processo. Citando o Ex.mo Procurador-Geral Adjunto, “Impor ao juiz de instrução que se vincule à apreciação do Ministério Público sobre a culpa e o grau de culpa ou a uma decisão acéfala é que será ingerência na função que o Processo Penal reserva ao Juiz de Instrução Criminal de garantia dos direitos do arguido e das vítimas.” Um outro reparo ao recorrente: Nos termos dos art.s 8.º e 9.º da Lei n.º 51/2007, de 31.08, compete ao Procurador-Geral da República aprovar directivas e instruções genéricas sobre as acções de prevenção da competência do Ministério Público, com vista à realização dos objectivos da referida lei, bem como às destinadas a fazer cumprir as prioridades previstas no seu art. 4.º, as quais vinculam ao magistrados do Ministério Público e os órgãos de polícia criminal que os coadjuvarem. Do mesmo modo, nos termos do art. 12.º, n.º 2, da mesma lei, compete ao Procurador-Geral da República aprovar directivas e instruções genéricas destinadas à aplicação das medidas enunciadas no n.º 1, as quais vinculam os magistrados do Ministério Público, nos termos do respectivo estatuto (n.º 3). Só por confusão de estatuto o recorrente pode pretender que o juiz de instrução violou seja que artigo for da citada lei. Voltando ao art. 281.º do CPP, dele se retira que a suspensão provisória do processo pode ser determinada verificados que sejam certos pressupostos e mediante certas injunções e regras de conduta que poderão fundamentar o juízo de concordância ou de discordância do juiz de instrução. De acordo com Maia Gonçalves (“Código de Processo Penal”, 1996, pág. 446, em anotação ao art. 281.º), a suspensão provisória do processo é decidida pelo Ministério Público, embora fique sujeito à condição sine qua non da concordância do juiz, a qual se apresenta como acto homologatório. Caso não se verifique a concordância, tudo se passará como se não tivesse havido a decisão do Ministério Público de suspender o processo que deverá seguir os seus trâmites normais. Por outro lado, seguindo o ensinamento de José António Barreiros citado no acórdão da Relação de Lisboa de 01.06.1999 (CJ, ano XXIV, tomo III, pág. 144), a concordância do juiz de instrução é um mero pressuposto de validade da suspensão provisória do processo e, por isso, trata-se de acto judicial que não dá lugar a recurso, uma vez que só há recurso dos acórdãos, das sentenças e dos despachos cuja irrecorribilidade não esteja prevista na lei (art. 399.º do CPP). Veja-se, ainda, que a não concordância do Ministério Público à suspensão provisória do processo proposta pelo juiz de instrução nos termos do art. 307.º, n.º 2, do CPP, não tem outro efeito que não seja o prosseguimento dos autos para a fase de julgamento, mal se compreendendo que a discordância do juiz de instrução em sede de inquérito seja motivo de conflito, como se refere no citado acórdão da RL, num instituto que privilegia o consenso. De resto, tratando-se de instituto aplicável à pequena criminalidade, mal se compreenderia também que as razões de celeridade que, entre outras, lhe presidem sejam desvirtuadas por essa possibilidade de conflito. Deste modo, tratando-se de decisão irrecorrível, o recurso é de rejeitar, nos termos do disposto nos art.s 414.º, n.º 2, e 420.º, n.º 1, al. b), do CPP. III. Pelo exposto, rejeita-se o recurso, por se verificar causa que devia ter determinado a sua não admissão nos termos sobreditos. Elaborado e revisto pela signatária. Porto, 20 de Abril de 2009 Airisa Maurício Antunes Caldinho |